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literatura, que nos instalamos nela, o funcionamento dos atos de linguagem fictícios é exatamente o mesmo que o dos atos de linguagem reais, fora da literatura. (COMPAGNON, 1999, p. 135) O mundo ficcional, portanto, passa a ser a referência do leitor quando este se instala nele, suspendendo sua incredulidade e passando a acompanhar a ação supra-real: Os textos de ficção utilizam, pois, os mesmos mecanismos referenciais da linguagem não-ficcional para referir-se a mundos ficcionais considerados como mundos possíveis. Os leitores são colocados dentro do mundo da ficção e, enquanto dura o jogo, consideram esse mundo verdadeiro, até o momento em que o herói começa a desenhar círculos quadrados, o que rompe o contrato de leitura, a famosa “suspensão voluntária da incredulidade”. (COMPAGNON, 1999, p. 137) Fonte [3] A expressão “suspensão voluntária de incredulidade” (willing suspension of disbelief) foi cunhada pelo poeta inglês Samuel Taylor Coleridge, no início do século XIX, para se referir à relação que se estabelece entre o texto e sua recepção. Há, portanto, uma espécie de pacto entre a obra e o leitor, que garante a credulidade deste, por mais estranho que seja o mundo fictício, que normalmente estabelece uma relação de possibilidade com o universo real, a menos que o texto literário subverta o contrato. Considerando a recepção da obra, a literatura vem a ser aquilo que acontece quando o leitor lê, isto é, os recebedores é que determinam a recepção final do texto. Assim, pode-se considerar que os leitores recriam os textos que lêem. Os textos terminam por ser a leitura que os leitores fazem deles. A experiência da leitura é dual, ambígua, dividida, entre compreensão e amor, entre liberdade e imposição, entre a atenção ao outro e a preocupação consigo mesmo. Normalmente, o conjunto de recepções das obras literárias formam as chamadas comunidades interpretativas, que congregam experiências compartilhadas, tanto literárias como extra- 23