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O Pensamento de Celso Furtado I


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O pensamento desenvolvimentista de Celso Furtado - I
Márcio Bobik Braga
Introdução
Celso Furtado, considerado como desenvolvimentista nacionalista, obteve grande influência teórica da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe – CEPAL.
Assim como a CEPAL, defendeu a industrialização do Brasil como forma de superação do subdesenvolvimento econômico.
O pensamento econômico da CEPAL
A criação da CEPAL
A Comissão Econômica para a América Latina e Caribe – CEPAL, foi criado em 1946 como órgão consultivo ligado a Organização das Nações Unidas.
A partir da gestão de Raul Prebisch, a Comissão passa a desenvolver uma série de documentos que mais tarde vão ser considerados como as bases de uma escola denominada na economia de “estruturalista”. É importante lembrar que a CEPAL nuca teve como pretensão ser uma escola de economia. Mas o impacto dos seus documentos acabou criando a denominação de “estruturalismo cepalino”. No Brasil, o principal representante da CEPAL foi Celso Furtado.
Os “documentos” mais importantes, redigido por Raul Prebisch
“El desarrollo económico de la América Latina y algunos de sus principales problemas” (1949)
“Problemas teóricos y prácticos del crecimiento económico” (1951).
“La cooperación internacional en la política de desarrollo latinoamericana” (1954).
“El mercado común latinoamericano” (1959).
As contribuições iniciais da CEPAL
O ponto de partida: as evidências acerca da deterioração dos termos de troca (documento de 1949)
Evidência empírica: deterioração dos termos de troca:
1876-1880: 100
1989-1900: 87,1
1911-1913: 85,8
1921-1925: 67,3
1931-1935: 62
1946-1947: 68,7
(Fonte:Nações Unidas, Post-war price relations in trade betwenn under-developed and industrialized countries, trabalho este elaborado por Hans Wolfgang Singer )
Definição dos termos de troca
Termos de Troca = Preço das exportações/preço das importações
Ou 
TT = Px/Pm
Para a América Latina: 
Px = preço dos bens primários (que são exportados)
Pm = preço das manufaturas (que são importadas)
Logo: a queda em TT significa que a região tem que exportar cada vez mais produtos primários para importar a mesma quantidade de manufaturas. 
Implicação: o modelo primário exportador representa uma desvantagem econômica relativa para a América Latina. 
As explicações
Primeira explicação (documento de 1949): os frutos do progresso tecnológico no “centro” não estariam sendo exportado para a “periferia”. Esse desequilíbrio se manifesta então na deterioração dos termos de troca.
As explicações
Explicações que passaram a ser consideradas (a partir do documento de 1951):
Baixa elasticidade renda da demanda por bens primários
Observação: a elasticidade é um número que representa a “sensibilidade” da demanda em relação à renda. 
Se a elasticidade renda da demanda for maior do que um, então um aumento na renda provoca um aumento mais do que proporcional na demanda. 
Se a elasticidade renda da demanda for menor do que um, então um aumento na renda provoca um aumento menos do que proporcional na demanda. 
As explicações
Alimentos: 0,76
matérias primas agropecuárias e minerais: 0,68
Combustíveis: 2,8
Bens manufaturados: 1,24
(Fonte: Cepal “El comercio internacional e el dessarrolo de américa latina, 1964)
As explicações da baixa elasticidade renda da demanda por produtos primários no mercado internacional
substituição de vários produtos naturais por sintéticos 
melhor utilização das matérias primas nos processos produtivos industriais em decorrência das inovações tecnológicas 
criação de um novo centro dinâmico – os Estados Unidos, que possuía abundância de terra e baixo coeficiente de importação 
A política proposta: o protecionismo
No documento de 1954, Prebisch destaca: 
“dentro da mesma escola clássica é admitido a proteção na etapa incipiente da indústria nascente ...”
Stuart Mill: Princípios de Economia Política: coleção os economistas 1ª. Edição.
O único caso em que, com base em meros princípios de Economia Política, são defensáveis as taxas protecionistas, é quando são impostas em caráter temporário (sobretudo em um país jovem e que está crescendo), na esperança de nacionalizar a empresa estrangeira, que é em si mesma perfeitamente adequada para as circunstâncias do país. A superioridade de um país sobre outro, em um ramo de produção, muitas vezes vem apenas do fato de ter começado antes. Pode ser que não haja nenhuma vantagem intrínseca de um lado, ou desvantagem do outro, mas apenas uma superioridade momentânea de habilidade e experiência adquiridas. Um país que ainda não adquiriu essa habilidade e essa experiência pode sob outros aspectos ser mais adequado para essa produção do que aqueles que começaram antes no ramo. (Mill, 1983, p.381).
Stuart Mill: Princípios de Economia Política: coleção os economistas 1ª. Edição.
Acreditam que uma nação em que todos estão ocupados com o mesmo ou quase com o mesmo objetivo – uma nação em que todos trabalham na agricultura – não pode atingir alto estágio de civilização e cultura. Ora, essa afirmação fundamenta-se em uma boa base racional. (Mill, 1983 , p. 383)
Frederick List: Sistema Nacional de Economia Política – Coleção os Economistas – 1ª. Edição.
A escola não percebe que, em um regime de total livre concorrência, com nações manufatureiras mais adiantadas, uma nação menos adiantada, embora bem aparelhada para a manufatura, jamais conseguirá atingir uma força manufatureira própria perfeitamente desenvolvida, nem conseguirá sua independência nacional completa, se não recorrer ao sistema protecionista. (...) A escola popular procura aduzir os benefícios resultantes do comércio interno livre como prova de que as nações só podem conseguir o mais alto grau de prosperidade e poderio dentro de um regime de absoluta liberdade de comércio internacional, quando a História em toda parte e sempre demonstra o contrário (List, 1984, p. 213).
A política proposta: o protecionismo
O Protecionismo na “escola clássica”:
	Alexander Hamilton
	Daniel Reymond
	Henry C. Carey
	Friedrich List
	Stuart Mill (defendeu o protecionismo no contexto da indústria nascente e os protecionistas norte-americanos)
Resumo dos argumentos em defesa da industrialização
Baixo dinamismo dos produtos primários no mercado internacional => deterioração dos termos de troca. Explicação: baixa elasticidade-renda da demanda por produtos primários.
Percepção de que as inovações tecnológicas estavam muito mais presentes nas atividades industriais.
Países industrializados possuem instituições mais adequadas ao desenvolvimento do que as instituições de economias primárias exportadoras.
 
Resumo dos argumentos em defesa da industrialização
Menor uso dos produtos primários nos processos produtivos (o que também explica a deterioração dos termos de troca)
O novo centro, os EUA, não necessariamente conduziria um modelo de divisão internacional do trabalho como conduzido pela Inglaterra antes da primeira guerra.
Evidências: país rico é país industrializado
Crescimento do protecionismos agrícola os países do primeiro mundo => reduz o preço dos bens primários no mercado internacional (resultado das teorias de comércio)
A história: os países hoje industrializados protegeram suas indústrias no passado.
 
A política proposta: o protecionismo
Prebisch via o protecionismo latino-americano inserido em um contexto de cooperação internacional
Afirma que “Essa necessidade de proteção é indispensável em uma política de desenvolvimento e não conspira de forma alguma contra o comércio internacional sempre que se mantenha dentro dos limites exigidos pelo mesmo desenvolvimento”.
A política proposta: o protecionismo
Enfim, o protecionismo deveria contribuir para as mudanças estruturais de forma a permitir uma maior participação da América Latina no comercio internacional.
A consolidação das propostas: a integração econômica regional
No documento de 1959 (O mercado comum latino-americano), Prebisch destaca o contexto internacional do pós-guerra:
Os EUA assumem o papel de “centro”, sendoum país totalmente diferente do “centro” anterior, ocupado pela Inglaterra;
O protecionismo agrícola parecia surgir com força na Europa e nos EUA (uma profecia que iria se confirmar)
O mundo estava sendo dividido em grandes blocos
A consolidação das propostas: a integração econômica regional
Nesse novo contexto, qual seria a melhor estratégia a ser seguida pela América Latina?
Opção 1 – voltar a produzir bens primários e se desfazer de uma estrutura industrial já estabelecida com o “período de ruptura”(período que vai da 1ª. Guerra a 2ª. Guerra). 
Opção 2 – continuar um processo já iniciado de industrialização
A consolidação das propostas: a integração econômica regional
Prebisch e vários outros economistas jamais negaram as vantagens da especialização no período que antecedeu a 1ª. Guerra (época de ouro da economia mundial); consideraram que o novo contexto pós 2ª. Guerra era desfavorável para a América Latina como produtora de bens primários.
Os Problemas da industrialização substitutiva de importações
... Havia entretanto duas limitações a serem resolvidas cm a industrialização substitutiva de importações:
Limitações de mercados
Baixa produtividade
Limitações tecnológicas
Ineficiência produtiva relativa ao resto do mundo
A consolidação das propostas: a integração econômica regional
A integração econômica regional poderia:
Proporcionar mercados maiores para a indústria (Prebisch nunca negou as desvantagens dos mercados limitados no processo de substituição de importações)
Proporcionar uma especialização regional segundo a produtividade da mão-de-obra e disponibilidade de recursos (aqui temos o conceito de vantagens comparativas na concepção ricardiana)
Elevar o poder de barganha no novo modelo de comércio internacional (dada as negociações do Gatt - General Agreement on Tariffs and Trade)
A consolidação das propostas: a integração econômica regional
Outro objetivo: aumentar as exportações de bens manufaturados (sem desconsiderar a importância da agricultura para as exportações latino-americanas).
Nesse ponto, o documento de 1959 considera que a América Latina poderia aproveitar lacunas na produção de bens manufaturas de baixa tecnologia na Europa. Ou seja, poderia exportar, incialmente, bens manufaturados para a Europa de acordo com a capacidade tecnológica da região.
Conclusão
Infelizmente e por vários motivos, a proposta de industrialização regional idealizado pela CEPAL não se concretizou. Os países se industrializaram em seus mercados fechados, sem o viés exportador e sem qualquer critério de custos relativos, tendo como instrumento básico altas tarifas de importação.
Próxima aula: Celso Furtado.
Bibliografia
“El desarrollo económico de la América Latina y algunos de sus principales problemas” (1949)
“Problemas teóricos y prácticos del crecimiento económico” (1951).
“La cooperación internacional en la política de desarrollo latinoamericana” (1954).
“El mercado común latinoamericano” (1959).
Observação: todos estes documentos estão no Livro 50 Anos do Pensamento da CEPAL, indicado na bibliografia.
Ver também: Fantasia Organizada, de Celso Furtado.

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