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R ES U M O C IC LO B Á SI C O TÍTULO DO RESUMO DESORDENS DO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA CURSO: GENÉTICA CLÍNICA CONTEÚDO: NATHALIA LESTARD CURADORIA: FABRÍCIO MONTALVÃO Amplie as possibilidades deste conteúdo em https://www.jaleko.com.br/ 4 DESORDENS DO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA 1 INTRODUÇÃO A célula mantém processos rigorosos para garantir a alta fidelidade da informação genética entre as diferentes gerações da célula. Todavia, ape- sar de todo esforço, mutações vão acontecer, mas não podem se tornar permanentes, uma vez que a sobrevivência em curto prazo da célula e do indivíduo depende da estabilidade genética. As mutações podem ocorrer tanto por estímulos externos quanto por fatores internos à própria célula. Os fatores que podem levar a erros na estrutura do ácido desoxirribonucleico (DNA) são: ■ erros na replicação: por mais que a célula tenha mecanismos de controle, erros podem ocorrer; ■ agentes físicos: como a radiação ultravioleta do sol, que pode produzir uma ligação covalente entre duas pirimidinas adjacentes no DNA, for- mando, por exemplo, dímeros de timina; ■ agentes químicos: podem causar lesões, como os metabólitos reativos produzidos na própria célula, incluindo as formas reativas do oxigênio; ■ lesões espontâneas: são aquelas que ocorrem mesmo em condições fisiológicas. Esses erros espontâneos (FIGURA 1) podem acontecer em decorrência de reações químicas espontâneas, como a chamada depurinação, que ocorre devido à hidrólise das ligações N-glicosil da desoxirribose. Como resultado, a dupla fita do DNA perde a base nitrogenada, restando apenas o açúcar e o fosfato na cadeia principal. Essa reação é responsável pela perda de milhares de purinas (adeninas e guaninas) todos os dias nas células. 5DESORDENS DO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA FIGURA 1 Figura 1: Lesões espontâneas no DNA. Depurinação e desaminação. De forma parecida, a molécula de DNA está sujeita à reação de desaminação espontânea de quase todas as bases. O resultado depende de cada base da sequência do DNA que sofre a reação: ■ citosina é convertida em uracila; ■ adenina é convertida em hipoxantina; ■ guanina é convertida em xantina; ■ timina não sofre desaminação. É importante notar que as bases resultantes da desaminação são bases não naturais do DNA, o que facilita o reconhecimento de que há algo errado na fita do DNA. Assim, isso facilita a correção. Por toda essa vulnerabilidade a que o DNA está exposto, o sistema de reparo se faz essencial, garantindo que, mesmo que esses erros aconteçam, eles possam ser corrigidos e não se tornem permanentes. 2 REPARO A manutenção da estabilidade genética de um organismo necessária à so- brevivência requer não apenas um mecanismo extremamente preciso para replicar o DNA, mas também mecanismos para corrigir as diversas lesões acidentais que podem acontecer no DNA. O processo de replicação é semiconservativo do DNA, ou seja, as fitas são usadas como moldes para criação de fitas novas e formam pares com elas 6 DESORDENS DO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA ao final. Tal processo envolve diversas proteínas como: helicase, primase, polimerase, entre outras. Apesar dessa complexidade, a replicação do DNA é um processo extrema- mente preciso. Inclusive, essa precisão é mais alta do que seria esperado matematicamente para um processo de replicação baseado em comple- mentaridade de bases. A fidelidade da cópia do DNA durante a replicação é tão grande que apenas cerca de um erro é cometido para cada 1010 nucleotídeos copiados. Para manter essa fidelidade, o processo de replicação dispõe de uma atividade de correção, a qual é desempenhada pela DNA polimerase III. Dessa forma, quando um nucleotídeo incorreto é covalentemente adicionado à cadeia crescente, a DNA polimerase é capaz de removê-lo ao realizar a atividade de correção exonucleotídica, que é desempenhada no sentido oposto ao da replicação, portanto no sentido 3’-5’. No entanto, as células não contam somente com essa forma de corrigir os erros que ocorrem na sequência do DNA, havendo diversas outras vias de reparo como: mau pareamento de bases, excisão de nucleotídeos, excisão de bases e correção de quebra da dupla fita. No entanto, se houver falhas no processo de replicação e/ou no de repa- ro o cenário torna-se muito perigoso e potencialmente permissivo para o surgimento de doenças. Entre as principais estão: xeroderma pigmentoso, ataxia-telangectasia, síndrome de Bloom, anemia de Fanconi, síndrome de Cockayne e câncer. 3 XERODERMA PIGMENTOSO O xeroderma pigmentoso (XP) é um distúrbio autossômico recessivo do reparo do DNA, geneticamente heterogêneo, pan-étnico e que causa uma acentuada sensibilidade à radiação ultravioleta (UV). O XP é causado por mutações que afetam, principalmente, a via de reparo global do genoma por excisão de nucleotídeos. Essa via é a responsável pela correção de lesões volumosas na dupla-hélice de DNA, como os dímeros de pirimidina. Nessa via, um enorme complexo multienzimático verifica o DNA à procura de distorções na dupla-hélice, em vez de uma alteração específica de bases. Uma vez encontrada uma lesão, a cadeia fosfodiéster da fita anormal é clivada nos dois lados da distorção, e a DNA-helicase remove o oligonucleotídeo de fita simples contendo a lesão. O intervalo produzido na hélice de DNA é corrigido pela DNA-polimerase e pela DNA-ligase. 7DESORDENS DO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA No caso do xeroderma pigmentoso, é afetada uma endonuclease responsável pela primeira etapa desse reparo e, assim, impede o reparo direto causado pela formação de dímeros de pirimidina provenientes da exposição à luz solar. Com isso, o indivíduo tem aumento do risco do desenvolvimento de tumores malignos de pele. Entretanto, não só os homozigotos, como esperado para uma condição recessiva, terão prejuízo. Os heterozigotos para essa condição também têm apresentado falhas no processo de reparo e frente a uma exposição substancial à luz solar podem sobrecarregar o sistema e predispor ao câncer de pele. Há pelo menos oito tipos de xeroderma pigmentoso, sendo os mais fre- quentes XPA e XPC. Os de ocorrência intermediária XPD e XPF; os demais são mais raros. Os sintomas principais incluem, comumente, facilidade para queimaduras de sol, fotossensibilidade aguda, sardas, fotofobia, envelhe- cimento precoce e neoplasias. Cerca de 90% dos carcinomas ocorrem em sítios de maior exposição ao UV – face, pescoço, cabeça e ponta da língua. As neoplasias cutâneas de pacientes com essa doença possuem um nível mais alto de mutações de oncogenes e genes supressores de tumor do que os tumores da população normal, e tais mutações parecem ser, altamente, específicas do UV. Aproximadamente 18% dos pacientes sofrem degeneração neuronal pro- gressiva. As características incluem surdez sensorioneuronal, deficiência intelectual, espasticidade, entre outras. A gravidade dos sintomas neu- rológicos é, normalmente, proporcional à gravidade do déficit no reparo por excisão de nucleotídeos. A neurodegeneração pode resultar de uma incapacidade de reparar o DNA danificado por radicais livres de oxigênio gerados endogenamente. A confirmação do diagnóstico do xeroderma pigmentoso baseia-se em aná- lises funcionais do reparo do DNA e sensibilidade à UV. Essas análises são, normalmente, realizadas em culturas de fibroblastos da pele. A confirmação do diagnóstico por meio da identificação de mutações em um gene associado ao xeroderma pigmentoso está clinicamente disponível para alguns dos genes associados com a condição. No entanto, a incapacidade de identificar uma mutação causadora em um desses genes não exclui essa condição genética como um diagnóstico clínico. O tratamento desses pacientes inclui evitar a exposição solar, usar roupas protetoras, protetores solares físicos e químicos, e vigilância cuidadosa para neoplasias cutâneas malignas e sua excisão. Nenhum tratamento curativo está disponível atualmente. 8 DESORDENSDO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA 4 ATAXIA Ataxia-telangiectasia (AT) é uma doença autossômica recessiva e também pode ser chamada de síndrome de Louis-Bar. Nessa condição genética, as mutações acometem o gene da proteína ataxia-telangiectasia mutada (ATM). Estas são proteínas quinases que, em condições normais, percebem as lesões no DNA e aumentam a atividade das enzimas de reparo adequadas. A ATM está envolvida na geração de sinais intracelulares que soam como alarme em resposta a diversos tipos de lesões no DNA e promovem a fos- forilação de uma série de outras proteínas que estão envolvidas tanto com reparo quanto com o avanço do ciclo celular. A i m p o r t â n c i a d e s s e m e c a n i s m o é reve l a - da pelo fenótipo de indivíduos que nasceram com defeitos nos genes que codificam a proteína ATM, tendo a doença ataxia-telan- giectasia. Essa doença apresenta como principais manifestações fenotípicas: ■ perda precoce e progressiva do equilíbrio, por isso o nome ataxia; ■ lesões vasculares causadas pela dilatação capilar, principalmente, na pele e conjuntiva ocular, por isso o nome telangiectasia; a telangiectasia pode ser mais visível em áreas expostas ao Sol; ■ imunodeficiência com infecções respiratórias crônicas; ■ envelhecimento prematuro; ■ predisposição a câncer como leucemia e linfoma; ■ radiossensibilidade: as células desses pacientes apresentam acentuada sensibilidade à radiação, por isso, inclusive, não se usa radiação para tratamento, pois esta pode ser fatal. Existem casos mais leves da ataxia-telangiectasia e esses casos podem ocorrer devido a mutações diferentes nos dois alelos do gene, em que uma mutação é mais branda do que a outra, e com isso parece haver uma ação residual da ATM nas células. Consequentemente, as pessoas com essa condição apresentam menos instabilidade cromossômica e menor sensibilidade à radiação. Além do fato de não costumarem apresentar nem a telangiectasia nem a imunodeficiência. Os indivíduos com essa variante mais leve tendem a apresentar maior lon- gevidade em relação à maioria dos pacientes com ataxia-telangiectasia na forma clássica. Ao contrário dos casos clássicos, em que o início é precoce e na infância, essa variante mais leve pode ter início na vida adulta. Na forma clássica os indivíduos, atualmente, apresentam uma expectativa de vida um pouco maior do que antes, estando em torno de 25 anos. O diagnóstico pode não ser simples principalmente quando se trata da va- riante mais branda. No entanto, alguns sinais e sintomas aliados a achados laboratoriais podem ajudar: 9DESORDENS DO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA ■ aumento de alfafetoproteína, principalmente, depois dos 2 anos de idade; ■ redução de imunoglobulinas (IgA, IgG, etc.); ■ linfopenia; ■ ataxia cerebelar detectada por ressonância magnética; ■ quebras espontâneas na fita do DNA. 5 DOENÇAS A síndrome de Bloom é uma doença autossômica recessiva que apresenta como principais manifestações clínicas: ■ baixa estatura: decorrente da deficiência de crescimento pré e pós-natal; ■ fotossensibilidade; ■ dilatação de capilares em forma de aranha nas bochechas; ■ pigmentação alterada: pele hipopigmentada e hiperpigmentada; ■ imunidade comprometida com consequentes infecções; ■ resistência à insulina: risco aumentado para diabetes; ■ predisposição à malignização. A causa da síndrome é a perda de atividade do gene BML, que codifica uma DNA helicase, que são as proteínas responsáveis pelo desenrolamento da dupla hélice de DNA durante a replicação. A falta do produto do gene BML parece desestabilizar outras enzimas que participam da replicação, do reparo e da recombinação homóloga. Não por acaso, a alteração cromossômica mais comum dessa síndrome é o pareamento parcial entre cromossomos homólogos na mitose, o que faz com que, nessa síndrome, ocorra dez vezes mais permutação entre cromátides do que o esperado. Os tratamentos estão focados nas anormalidades da pele, problemas de crescimento, nutrição e endocrinológicos. O maior risco de câncer é para o desenvolvimento de câncer gastrintestinal, em especial do cólon. Tal fato requer uma atenção especial, pois tratamento com radiação e com fármacos alquilantes podem aumentar o risco secun- dário de malignidades. Por isso, essas abordagens devem ser evitadas ao máximo. A anemia de Fanconi também é conhecida como pancitopenia de Fanconi e pode ser de herança ligada ao X, mas, na maioria dos casos, é autossômica recessiva. Muitos genes podem ser afetados e originar a anemia de Fanconi, inclusive há genes que estão envolvidos com a predisposição aumentada ao câncer de mama breast cancer gene 2 (BRCA2) e com a maquinaria de reparo (ra- diation sensitive 51 [RAD 51], sialylated lewis X4 [SLX4] e partner and localizer of breast cancer 2 [PALB2]). Essa doença apresenta como principais manifestações fenotípicas: ■ deficiência de crescimento resultando em baixa estatura; 10 DESORDENS DO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA ■ microcefalia; ■ anemia; ■ leucopenia; ■ trombocitopenia; ■ hiperpigmentação da pele; ■ más formações cardíacas e renais; ■ predisposição aumentada para desenvolvimento de câncer, em especial leucemia e linfoma. Atualmente, é considerada a causa hereditária mais comum de falência da medula óssea. Os pacientes possuem risco aumentado para tumores tanto hematológicos como para sólidos. 6 SÍNDROME E CÂNCER A síndrome de Cockayne é um distúrbio raro, autossômico recessivo. Nessa síndrome, o alvo é a via de reparo acoplada à transcrição e, assim, o próprio processo de transcrição também é afetado. Em células com funcionamento adequado, ocorre o acoplamento do ácido ribonucleico (RNA)-polimerase (enzima que transcreve DNA em RNA) à via de reparo por excisão de nucleotídeos. Com isso, a RNA-polimerase para nas lesões de DNA e, por meio de proteínas acopladoras, direciona a maquinaria de reparo a esses sítios, permitindo que a lesão seja corrigida antes da transcrição ocorrer. Os principais sintomas observ ados nessa condição são: ■ nanismo; ■ surdez; ■ fotossensibilidade; ■ disfunção neurológica. Além disso, a instabilidade genômica é uma das principais características das células de câncer. Isso aumenta a incidência de mutações, e o acúmulo dessas é que resulta na malignização celular. Por isso, muitas das condições genéticas que estão relacionadas com falhas nos sistemas de reparo e replica- ção do DNA apresentam alta predisposição para desenvolvimento de câncer. Todavia, há alguns casos diretamente relacionados com a falha desses processos, como é o caso do câncer de mama, de ovário e o de colorretal. Embora diversos genes em que mutações causam formas mendelianas al- tamente penetrantes de câncer de mama tenham sido descobertos a partir de estudos em famílias, os dois genes responsáveis pela maioria de todos os cânceres de mama hereditários são BRCA1 e BRCA2. Mutações no BRCA1 e BRCA2 também estão associadas a um aumento significativo no risco de câncer de ovário e das trompas de falópio em mu- 11DESORDENS DO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA lheres heterozigotas. Além disso, mutações em BRCA2 e, em uma extensão menor, em BRCA1, também são responsáveis por 10 a 20% de todos os cânceres de mama em homens e aumentam o risco de câncer de mama em homens em 10 a 60 vezes acima do 0,1% observado entre os homens da população geral durante a vida. Além do risco aumentado de câncer ovariano e câncer de mama, mutações no BRCA1 conferem risco aumentado para câncer de próstata e cólon. Já mutações no BRCA2 conferem risco para câncer de pâncreas, ducto biliar, vesícula biliar e câncer de mama masculino. Os produtos dos genes BRCA1 e BRCA2 são proteínas nucleares contidas dentro do mesmo complexo de multiproteínas. Esse complexo foi implicado na resposta celular à quebra de DNA de dupla-fita, como ocorre normal- mente, por exemplo, durante a recombinação homóloga ou anormalmente como um resultado de dano ao DNA. A proteína BRCA1regula uma etapa inicial do processamento de extremi- dades quebradas, mas, caso ela esteja ausente, as extremidades quebradas não são processadas corretamente para a recombinação homóloga e serão corrigidas com erros pela via de ligação de extremidades não homólogas. A proteína BRCA2 liga-se à RAD51 evitando sua polimerização no DNA e a mantém assim, na forma inativa, até que a RAD51 seja necessária para o processo. Com isso, em cenário de normalidade, no caso de uma lesão ao DNA, o BRCA2 auxilia no rápido recrutamento da proteína RAD51 aos locais das lesões e, uma vez posicionada, auxilia a liberá-la da sua forma ativa em DNA de fita simples. Apesar da expressão ubíqua de BRCA1 e BRCA2, a mutação nesses genes predispõe, predominantemente, a neoplasias na mama e no ovário. A perda da função de BRCA1 ou de BRCA2, provavelmente, permite o acúmulo de outras mutações que são diretamente responsáveis pela neoplasia. De modo compatível com essa hipótese, carcinomas de mama e de ovário em pacientes com mutações nesses genes possuem instabilidade cromossômica e mutações frequentes em outros genes supressores de tumor. A identificação de uma mutação germinativa em BRCA1 ou BRCA2 em uma paciente com câncer de mama é de grande importância para o acon- selhamento genético e para o manejo do risco de câncer para os filhos da paciente, irmãos e outros parentes. Fato esse que pode ser investigado com auxílio de um teste mutação-específico no restante da família. No entanto, o câncer de mama pode ter outras causas que não somente a genética, como devido a fatores ambientais e hormonais. Por isso, re- conhecer características-chaves pode auxiliar na identificação dos casos de câncer hereditário. Os fatores de risco para câncer de mama e ovário hereditários são: 12 DESORDENS DO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA ■ casos com início precoce incomum; ■ casos bilaterais; ■ casos com câncer de mama em homem; ■ familiares com câncer de mama e ovário; risco ainda maior quando o parente é de primeiro grau e histórico de ocorrência até os 40 anos. As recomendações atuais para mulheres com uma mutação em BRCA1 ou BRCA2 incluem exames frequentes na mama e no ovário, bem como estudos por imagem. A mastectomia bilateral total pode reduzir o risco de câncer de mama em mais de 90%, embora o risco não seja abolido, pois sempre permanece algum tecido mamário. Do mesmo modo, a salpingo- -ooforectomia (retirada das trompas e ovário) bilateral pode reduzir o risco de câncer ovariano em mais de 90%. O tratamento para homens em risco inclui exames de próstata e de mama frequentes e exames laboratoriais. Em famílias com mutações conhecidas, a análise molecular pode ser empregada na vigilância ou profilaxia nos membros com uma mutação. O câncer de mama masculino é cem vezes menos comum do que o câncer de mama feminino. Porém, quando ocorre, mutações hereditárias nos genes de câncer de mama hereditário, particularmente o BRCA2, aumentam as chances de ocorrência em 16%. 7 CÂNCER O câncer colorretal, uma condição maligna das células epiteliais do cólon e reto, é uma das formas mais comuns de câncer. É responsável por, aproxi- madamente, 10 a 15% de todos os tipos câncer. A maior parte dos casos é esporádica, mas uma pequena proporção de casos de câncer de colo é familiar, entre os quais encontram-se duas condições autossômicas dominantes: polipose adenomatosa familiar (PAF) e a síndrome de Lynch (SL). O foco aqui é a síndrome de Lynch por sua causa molecular. Aproximadamente 2 a 4% dos casos de câncer de cólon são atribuíveis a essa síndrome. A síndrome de Lynch resulta de mutações de perda de função de genes de reparo do DNA distintos que codificam proteínas do reparo de mau pareamento (mismatch repair). O reparo de pareamento incorreto é realizado, em condições normais, por proteínas mostradas que se ligam, especificamente, a mau pareamento e verificam o DNA adjacente procurando uma quebra. Uma vez encontrada uma quebra, uma das proteínas do complexo multiproteico promove a degra- dação da fita com a quebra até o pareamento incorreto. Como as falhas são quase exclusivamente confinadas às fitas recém-sintetizadas em eucariotos, os erros de replicação são removidos seletivamente. 13DESORDENS DO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA Os genes envolvidos no desenvolvimento desse quadro são MLH1, MSH2, MSH6 e PMS2, pois esses são os responsáveis por codificarem proteínas do reparo de mau pareamento. Embora todos esses quatro genes tenham sido implicados na síndrome de Lynch em diferentes famílias, o MLH1 e o MSH2 juntos são responsáveis pela vasta maioria dos casos, enquanto os outros têm sido encontrados somente em alguns pacientes. Frequentemente, são associados a um menor grau de deficiência de reparo de mau pareamento e com uma penetrância mais baixa. Assim como os genes BRCA1 e BRCA2, os genes de reparo de mau pareamento são genes supressores de tumor envolvidos na manutenção da integridade do genoma. A perda de função dos genes de reparo de mau pareamento levará a mutações somáticas em outros genes condutores. O primeiro é o antigen-presenting cell (APC), que tem papel crucial na polipose adenomatosa familiar, e o segundo é o gene transforming growth factor beta receptor 2 (TGFBR2), no qual mutações também causam uma síndrome de câncer de colo hereditário autossômica dominante. Embora os pacientes com síndrome de Lynch desenvolvam pólipos seme- lhantes em número aos da população em geral, eles os desenvolvem em idades mais jovens. A idade média no momento do diagnóstico com um adenocarcinoma colorretal é inferior aos 50 anos de idade, ou seja, 10 a 15 anos mais jovem do que a população em geral. Pacientes com a síndrome de Lynch e uma reconhecida mutação em MLH1 ou MSH2 têm um risco de 80%, durante a vida, de desenvolver o câncer colorretal. Pacientes com a síndrome de Lynch não têm características físicas distintivas. Os critérios mínimos para considerar a síndrome de Lynch são a ocorrência de câncer colorretal ou outro tumor associado à síndrome de Lynch em três membros de uma família, pelo menos, dois dos quais são parentes de primeiro grau, através de duas ou mais gerações, e o desenvolvimento de câncer colorretal em pelo menos um indivíduo afetado antes dos 50 anos. A síndrome de Lynch é fator de risco para síndrome de reparo de mau pareamento constitucional e resulta em um risco acentuadamente elevado para muitos cânceres durante a infância, incluindo o câncer colorretal e o câncer do intestino delgado, bem como para leucemia na infância e vários tipos de tumores cerebrais na infância. O processo investigativo do diagnóstico tem que vir acompanhado de uma boa análise do quadro clínico. Entre os achados clínicos desse contexto, pode-se destacar: a presença de múltiplos pólipos, idade de manifestação precoce (antes de 50 anos de idade), a localização do tumor em porções mais proximais do cólon, a presença de um segundo tumor ou história de câncer colorretal, uma história familiar de cânceres colorretais ou outros 14 DESORDENS DO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA cânceres (câncer endometrial, particularmente) e câncer em parentes com menos de 50 anos de idade. Todos esses são achados que aumentam a probabilidade de um paciente com câncer de colo ter uma mutação em um gene de reparo de mau pareamento. Para os pacientes sem história familiar, mas com câncer colorretal de início precoce, o teste genético para a síndrome de Lynch é, idealmente, feito de forma gradual: avaliação do tecido do tumor para instabilidade de microssatélites por meio de testes moleculares específicos para tal e/ou imuno-histoquímica das quatro proteínas de reparo de mau pareamento. O reconhecimento precoce da síndrome de Lynch é necessário para uma intervenção eficaz. Colonoscopias de seguimento do cólon proximal começando na idade de 25 anos aumentam a expectativa de vida de 13,5 anos, e a remoção cirúrgica profilática do cólon com a idade de 25 anosaumenta a expectativa de vida em mais de 15 anos. A FIGURA 2 e a FIGURA 3 apresentam mapas mentais sobre o assunto abordado no resumo. 15DESORDENS DO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA FIGURA 2 Figura 2: profilaxia pós-exposição (PEP). 16 DESORDENS DO REPARO E REPLICAÇÃO DO DNA FIGURA 3 Figura 3: Vigilância. 8 REFERÊNCIAS 1. ROBERT, L. N.; RODERICK, R. M.; HUNTINGTON, F. W. Thompson & Thompson genética médica. 8. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016. Cap 15. Caso 29. Caso 48. 2. LAUGEL, Vincent. Cockayne syndrome. Margaret P. Adam, Holly H. Ar- dinger, Roberta A. Pagon, Stephanie E. Wallace, Lora J. H. Bean, Karen W. Gripp, Ghayda M. Mirzaa, Anne Amemiya. GeneReviews® [Internet]. Seattle (WA): University of Washington, Seattle; 1993–2021.2000 Dec 28 [upda- ted 2019 Aug 29]. 3. KARIKKINETH, AJOY C. et al. Cockayne syndrome: clinical features, model systems and pathways. Ageing Res. Rev. 2017 Jan;33:3-17. Epub 2016 Aug 6. 4. CUNNIFF, Christopher; BASSETTI, Jennifer A. ; ELLIS, Nathan A. . 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