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Um guia completo DESIGN THINKING Julia Pupolin 2020 Sumário Introdução Design, Designer Ações e Comportamentos As Etapas Empatia Definição Ideação Prototipagem Teste Itere e Domine 3 5 6 8 10 21 25 29 33 36 Introdução 3 O desejo e a necessidade de inovar está presente em diversos segmentos, porém, existe uma grande dificuldade em gerar valor de forma assertiva para as pessoas. Por muitos anos as empresas focaram esforços em fazer com que as pessoas desejassem seus produtos. Porém, o indivíduo empoderado passou a ter mais acesso ao conhecimento e um grande poder de escolha - de produtos a empregos. E é justamente isso que vem exigindo uma transformação em como as empresas interagem com seus clientes. Para começar a mudar esse mindset, podemos contar com o Design Thinking. Segundo Tim Brown, CEO da IDEO, “Design Thinking é uma abordagem centrada no ser humano para a inovação, que se baseia no kit de ferramentas do designer para integrar as necessidades das pessoas, as possibilidades da tecnologia e os requisitos para o sucesso do negócio.” 4 Viabilidade (negócio) Desejo (pessoas) Factibilidade (técnica) Ou seja, o Design Thinking é uma abordagem que utiliza a forma como os designers pensam e resolvem desafios para criar projetos e soluções inovadoras, muitas vezes do zero. Como na maioria das vezes não temos um recorte bem definido do desafio, a abordagem combina dois elementos principais: a forma de pensar dos designers, e uma mente aberta para estudar, compreender e unir diferentes áreas de conhecimento. Esse material é fruto da fusão de prática e estudo, foi construído com muito carinho e tem o intuito de fornecer uma perspectiva didática de como começar a utilizar a abordagem do Design Thinking no seu dia a dia. Espero que gostem! Julia. Design, Designer Traduzir a palavra design é um pouco complicado, mas nesse contexto é o ato de projetar alguma coisa para alguém. E aqui temos dois conceitos-chave: a ação de projetar alguma coisa, podendo ser um produto, serviço, experiência, um novo modelo de negócio, uma nova área, etc. E esse ato tem a intenção de atender a necessidade de um usuário, ou seja, estamos sempre pensando em quem vai utilizar aquilo que construímos. Por isso o design é uma atividade cocriada. Ser um designer é passar de ser uma pessoa que constrói coisas a partir da própria visão de mundo, experiências e valores, para alguém que olha e compreende as necessidades e dores dos usuários ao criar algo inovador e relevante. 5 Ações e Comportamentos MOSTRE AO FALAR EXPERIMENTE FOQUE EM VALORES HUMANOS FOCO NA JORNADA TORNE AS COISAS CLARAS COLABORAÇÃO TOTAL FOCO NA AÇÃO Alguns mindsets são fundamentais para se ter em mente ao passar pela jornada de design: - Foque em valores humanos. Tudo começa e termina com a empatia, por isso, nunca se esqueça que você está projetando algo para alguém. Engajar-se com o seu usuário e compreender seus feedbacks é essencial para um bom projeto de design. - Mostre ao falar. Tire suas ideias e descobertas do plano abstrato para trazer mais entendimento para os outros designers ou para os usuários. Comunique sua visão de forma relevante criando experiências, usando imagens ilustrativas e contando boas histórias. - Experimente. A prototipagem não é apenas uma forma de testar a sua ideia, ela é parte integrante da sua jornada de inovação. Portanto, deixe os medos de lado: de falhar, de julgamento e tudo mais. Permita-se testar novas coisas durante a jornada. 6 - Foco na jornada. Comprometa-se com as etapas, saiba onde você está na jornada de design, quais métodos usar nesse estágio e quais são seus objetivos. - Torne as coisas claras. Busque sempre sintetizar aquilo que você quer expor para que nenhuma informação ou ideia seja perdida. Transforme problemas confusos em insights surpreendentes, de forma a inspirar outros e a alimentar ideias inovadoras. - Colaboração total. Reúna pessoas com diferentes contextos e pontos de vista para trazer riqueza para o projeto. A multidisciplinaridade permite descobertas incríveis, pois soluções inovadoras nascem da diversidade. E é claro, confie no seu time! Pense que essa é a melhor equipe para trabalhar com você nesse projeto. - Foco na ação. Design Thinking é um nome que pode te confundir, já que está muito mais relacionado a por a mão na massa do que ficar apenas pensando. Por isso, esteja integralmente dedicado ao que você está fazendo: seja conversando com o usuário, reconhecendo padrões, definindo insights ou construindo protótipos. 7 As Etapas O caminho que vamos percorrer terá cinco etapas, e ao passar por elas vocês perceberão que teremos duas situações: vamos passar por um período de abertura, onde recolheremos ou produziremos um número enorme de informações, e, após, por um período de fechamento, onde iremos trabalhar essas informações e priorizá-las. Isso tem diversos nomes - efeito sanfona, duplo diamante, abre e fecha, flare and focus, etc. Você pode chamar como quiser! Fato é: teremos etapas onde o pensamento será divergente (flare/abertura) e outras onde o pensamento será convergente (focus/fechamento). FLARE FOCUS FLARE FOCUSFLARE FOCUS 8 E as cinco etapas do Design Thinking são: 1. Empatia: Nos colocar no lugar do outro e se conectar com necessidades, desejos e motivações de pessoas reais para nos inspirar e provocar novas ideias; 2. Definição: Precisamos reconhecer padrões, temas e encontrar significado no que coletamos no processo de empatia. Nós traduziremos as observações e inferências sobre as pessoas em frameworks e princípios; EMPATIA DEFINIÇÃO IDEAÇÃO PROTOTIPAGEM TESTE Agora iremos conhecer cada uma das etapas a fundo: passaremos pelo conceito, aplicação, uma ferramenta e como realizar a transição de uma etapa para outra. Vamos lá? 9 3. Ideação: Daí partiremos para explorar novas possibilidades. Geraremos incontáveis ideias e deveremos considerar todas as opiniões divergentes; 4. Prototipagem: As ideias mais promissoras serão levadas para um processo dinâmico e rápido de prototipagem. Representações simples de ideias que sejam concretas o suficiente para as pessoas reagirem a elas. A chave é ser rápido e “sujo”. Sem muito apego a uma ideia específica, hein?; 5. Teste: Convidaremos os usuários a experimentarem nossas ideias. O aprendizado e os feedbacks colhidos nos ajudarão a evoluir ou abandonar ideias e conceitos. Empatia “Para criar inovações relevantes, você precisa conhecer seus usuários: tendo empatia e realmente se importando com suas vidas” EMPATIA O que é empatia? Muita gente confunde empatia com simpatia, e não, não é a mesma coisa! A simpatia é um sentimento mais superficial, onde você se sensibiliza com a situação de alguém. Já a empatia é algo mais profundo. É a capacidade de compreender e compartilhar dos sentimentos de outra pessoa, de se colocar no lugar do outro e se esforçar para entender as pessoas. Como e porque elas agem, quais são suas necessidades físicas e emocionais, quais são suas visões de mundo e o que é realmente importante para elas. Não por acaso a empatia é o cerne do Human-Centered Design. Por que ter empatia? Como um design thinker, os desafios que você vai tentar resolver raramente são os seus próprios. Assim como nenhuma pessoa é igual a outra, dificilmente uma pessoa enfrenta os mesmos desafios de outras. Normalmente, os problemas que você vai resolver são os de outra pessoa, ou de outro grupo de pessoas. E se você partir da sua própria visão de mundo ou experiência para projetar 10 alguma coisa para o seu usuário, dificilmente você irá resolver a vida dessa pessoa. Para criar uma solução para o seu usuário, você deve se colocar no lugar dele, entendendo o que é importante para ele, qual é a sua visão de mundo, quais são suas histórias e experiências. Observar o que as pessoas fazem e como elas interagem com o ambiente podem te dar pistasvaliosas sobre o que elas sentem e pensam. Também podem te ajudar a aprender sobre o que elas precisam. Além disso, você pode testemunhar as manifestações físicas de suas experiências – o que elas fazem e dizem. A partir disso, você poderá inferir significados e descobrir insights que podem te guiar na criação de soluções inovadoras. E as melhores soluções nascem dos melhores insights sobre o comportamento humano. Porém, aprender a reconhecer esses insights pode ser mais complicado do que você pensa, já que nossas mentes automaticamente filtram um montante enorme de informações sem a gente nem perceber. Precisamos aprender a ver as coisas sob outro ângulo, e a empatia nos permite observar os usuários por esse outro ângulo. Envolver-se com as pessoas revela muito sobre como elas pensam e quais valores são importantes para elas. Às vezes, esses pensamentos e valores não são óbvios para elas mesmas, e uma boa conversa pode surpreender tanto o entrevistador quanto o entrevistado! As histórias que as pessoas contam e as coisas que elas dizem – mesmo que contraditórias – são fortes indicadores da ética, valores e visão de mundo que estão na base do que essas pessoas realmente são. Bons designers conseguem enxergar essa camada mais profunda dos seus usuários. 11 Como ter empatia? A primeira coisa é entender três conceitos básicos para que possamos ser realmente empáticos: 12 - ENGAJAR: Muito da empatia vem do que chamamos comumente de ‘entrevista’, e o peso desse nome pode travar o usuário de várias formas. Tão logo ele vai pensar que é a) algo super formal ou b) algo para testá-lo. E na verdade não é nada disso! Por isso, essa etapa deve parecer muito mais com um bate-papo informal entre amigos do que com qualquer outra coisa. Por isso, não se apegue ao seu roteiro, prepare algumas perguntas, mas prepare-se para deixar a conversa se desviar delas – deixe seu usuário a vontade para que ele conte o que quiser. É legal sempre perguntar o porquê das coisas e como a pessoa se sentiu em relação ao fato que está contando, isso pode revelar sentimentos profundos. E não se preocupe, o envolvimento pode acontecer tanto em encontros espontâneos e rápidos, quanto em entrevistas agendadas para durarem mais – basta você se interessar pelo que a pessoa tem a dizer para você! ENGAJAR Interagir, trocar e entrevistar usuários OBSERVAR Usuários e comportamentos em contexto IMERGIR Vivenciar as experiências dos usuários - OBSERVAR: Veja os usuários e seus comportamentos no contexto de suas vidas. Se for possível, observe-os em ambientes relevantes para trazer mais profundidade para sua entrevista. Os seres humanos são contraditórios por natureza, e não é por acaso que algumas das mais poderosas descobertas sobre as pessoas acontecem quando você observa uma divergência entre o que elas falam e o que elas realmente fazem. Algumas atitudes ou hábitos podem ser corriqueiros ou bobos para o usuário, e, para você, enquanto designer, ser o ponto da virada para o entendimento daquela pessoa, e eles nem mencionariam e você não saberia se não estivesse observando atentamente. - IMERGIR: Você pode e deve combinar observação com envolvimento. Peça para o usuário te mostrar como ele executa alguma tarefa, e acompanhe passo a passo, sempre perguntando porque ele está fazendo aquilo daquela forma. Peça para que ele verbalize o que está passando por sua cabeça enquanto está trabalhando na tarefa ou interagindo com um objeto. Tente ter a conversa no contexto de trabalho ou na casa do usuário – muitas histórias estão diretamente conectadas com artefatos que podem ser o gatilho para a sua entrevista. Use o ambiente para trazer à tona questões mais profundas. - BÔNUS: Tenha paciência. Existem pessoas comunicativas que conseguem conversar com você como se já te conhecesse há mil anos, mas também existem os casos onde o entrevistado é alguém mais tímido ou que tem receio de se expor, por isso pode ser que a entrevista demore um pouco para pegar no tranco. Dê exemplos pessoais para 13 que haja uma sensação de troca no estilo “eu te conto um segredo e você me conta outro”, ou tenha sempre na manga perguntas mais genéricas para ir aquecendo. Além disso, durante a entrevista, não tenha medo do silêncio e não se apresse a preenchê-lo com outra pergunta ou com alguma “dica” para a pessoa responder mais rápido – muitas vezes ela pode estar recordando alguma história ou buscando as palavras para algum sentimento muito difícil de explicar. Guia de Empatia em Campo Por acreditar que uma etapa de empatia bem feita pode garantir o sucesso de um projeto, vamos investir um tempo aqui passando pelo Guia de Empatia em Campo. Vamos responder quatro perguntas principais: a) Como encontrar as pessoas certas para conversar?; b) Como construir um roteiro?; c) Como entrevistar?; d) Como entender essas pessoas? Prontos? Então vamos lá. a) Como encontrar as pessoas certas para conversar? Para responder essa pergunta, é importante entender o conceito do Usuário Extremo, que nada mais são pessoas que são extremas em algum aspecto relacionado ao seu projeto. Usamos esse tipo de usuário porque seus comportamentos e sentimentos são amplificados, o que nos ajuda a evidenciar pontos de vista e desenvolver 14 insights poderosos. Outro motivo a usar um usuário extremo é que partimos do raciocínio que se resolvermos os problemas desse grupo de pessoas extremas, resolveremos também os problemas dos usuários típicos. Usuários extremos podem ser comportamentais ou situacionais (em geral, não apenas demográficos). Por exemplo, em um projeto que quer resolver desafios em uma viagem aérea, poderemos encontrar: 15 Usuário Típico Usuário Extremo Alguém que viaja muito a trabalho Alguém que não fala o idioma local Alguém cego Alguém que usa cadeira de rodas Alguém com medo de voar b) Como construir um roteiro? O roteiro de entrevista nada mais é do que um guia para você desenvolver uma conversa com seu usuário, com o objetivo de extrair quais são as dores, desejos, visão de mundo, e o que mais for necessário para entender melhor essa pessoa. Essa é a anatomia de um bom roteiro de entrevista: 16 Tempo Introdução Aquecimento Conexão Emoções + Histórias Follow up Encerramento - Introdução pessoal e do projeto: apresente-se e apresente o projeto de uma forma confortável para você. Tente algo como: “Estamos trabalhando em um projeto de design sobre ________. Podemos conversar alguns minutos?” - Aquecimento: são perguntas genéricas pra “esquentar” o usuário, mas que dão ótimas informações para criação de insights. Você pode perguntar: “Como é a sua rotina? Qual é o seu dia preferido da semana? O que você faz para relaxar?” - Conexão: construa confiança oferecendo alguma informação pessoal (que tenha relação com o projeto) para que o usuário consiga se abrir mais facilmente com você. Por exemplo: “Minha experiência sobre o assunto X é _______. Você já passou por algo parecido?” - Explore histórias: Descubra histórias para entender o que seu entrevistado faz, e, mais importante do que isso, o que ele pensa e o que ele sente. Fale sobre passado e presente, experiências positivas e negativas. “Você pode me contar uma história sobre uma vez que você_____________?” “Qual foi sua melhor/pior/mais louca/ memorável experiência com (área de foco)?” “Seria surpreendente se...” - Converse sobre sentimentos: “Descreva como você... (decidiu, realizou a tarefa, chegou a algum lugar etc.) O que você estava pensando naquele momento?” “Por que você falou aquilo? Conte mais.” “Como você se sentiu naquele momento, quando ______________ aconteceu?” - Faça um follow up: esse momento é importante para se certificar que você não deixou de recolher nenhuma informação importante para o projeto. - Encerramento: não esqueça de agradecer seu usuário! c) Como entrevistar? Uma boa forma de realizar a entrevista com o usuário é fazê-la em duplas, sendo que cada designer terá um papel: um será o entrevistador e o outro tomará notas das respostasdo usuário. Algumas dicas: Para o entrevistador: - Tente fazer com o auxílio de mais uma pessoa, assim você pode se engajar de forma mais profunda com o usuário, enquanto a outra pessoa anota as informações da entrevista; - Conduza o papo como se fosse uma conversa entre amigos, quanto mais à vontade o usuário estiver com você e com a situação, mais ele irá falar; - O roteiro de entrevista é um guia, você não precisa necessariamente passar por todos os pontos que estão 17 ali. Se o usuário começar a desviar do assunto, deixe ele falar. Se você podar o fluxo de pensamento dele, ele pode se fechar para você; - Quando o usuário começar a responder suas perguntas, não o interrompa – deixe-o falar tudo que quiser; - Não fique com medo do silêncio – se o usuário fizer uma pausa mais longa para pensar, não se apresse em tentar ajudá-lo a responder sua pergunta com alguma dica. Ele provavelmente está tentando lembrar de alguma situação ou tentando traduzir em palavras alguma coisa difícil de ser explicada; - Sempre tente ir mais a fundo: pergunte o porquê das coisas e como o usuário se sentiu em relação ao que ele está te contando. Para quem toma notas: - Não interrompa a entrevista: deixe o entrevistador criar a conexão com o usuário, assim ele ficará mais à vontade para falar; - Leve post its para tomar notas; - Anote no primeiro post it o nome da pessoa e a qual público ela pertence; - Anote uma ideia por post it: não faça bullets! Não tenha medo de gastar o post it; - Tente sintetizar o que o usuário está falando; - Você pode anotar também suas impressões, inferências e insights! d) Como entender essas pessoas? Através das observações e entrevistas, nós podemos identificar as motivações dos nossos usuários baseado no que eles falam, fazem, pensam e sentem. 18 Durante a etapa de empatia, podemos observar e escutar o que as pessoas falam e fazem. Mas o trabalho do designer é também inferir sobre o que elas pensam e sentem. Isso irá ajudar a entender os significados mais profundos. Para documentar e organizar essas informações, podemos usar o Mapa de Empatia: 19 Transição: Empatia >> Definição Quando você acabar a etapa de empatia, vai se ver com um monte de informações e materiais e aí surge a dúvida: o que fazer com tudo isso? Você vai precisar começar a desenhar algumas conclusões e processar tudo aquilo que escutou e viu para conseguir entender a coisa como um todo e lapidar algumas inferências em formato de insights. O Unpack é onde esse processo começa – compartilhando suas descobertas com os outros designers envolvidos no projeto e trabalhando nas informações, construindo algo mais visual para sair do abstrato. Pegue toda a informação que está na sua cabeça e transfira para uma parede onde você pode começar a FALA FAZ PENSA SENTE Observar Inferir fazer conexões – fotos/imagens do usuário, post-its com trechos da entrevista, mapas de jornada ou experiência, enfim, toda e qualquer coisa que possa capturar suas impressões e informações sobre o seu usuário. Esse é o começo do trabalho de síntese, que leva a etapa de definição. 20 Definição “Trabalhar no problema certo é o único caminho para criar a solução certa” DEFINIÇÃO O que é a etapa de definição? A etapa de definição é focada em trazer clareza e foco para a jornada de design. É a sua chance e responsabilidade enquanto design thinker de definir o desafio que você vai trabalhar, baseado naquilo que você aprendeu sobre o seu usuário e sobre o contexto. O objetivo dessa etapa é fazer com que toda a informação e material que você recolheu na etapa de empatia faça algum sentido, elaborando uma declaração de problema significativa e acionável – isso é o que chamamos de Point of View (POV). Essa declaração irá nortear o projeto até o final, e ela deve focar nos insights e necessidade de um usuário em particular ou de uma persona que represente um grupo de pessoas. Mas tem um porém - os insights não nascem do nada, ao contrário: eles emergem de um processo de síntese de informação que visa a descoberta de conexões e padrões. Então prepare-se: seus neurônios vão trabalhar bastante na etapa de definição! 21 Por que definir? A etapa de definição é crítica para a abordagem do design porque nela surge o seu POV: a expressão explícita do problema que você está se propondo a resolver. Mais importante, seu POV te ajuda a definir qual é o desafio certo a focar, baseado no seu entendimento sobre o(s) usuário(s) (empatia). Essa etapa também é um esforço para sintetizar os seus achados, que até aqui estão dispersos, e transformá-los em insights poderosos. Um bom insight é a junção da observação e da inferência que vieram da etapa de empatia. É um palpite embasado em dados. É a síntese do seu trabalho de empatia, que visa a descoberta de conexões e padrões, e que te dá a vantagem que mais ninguém tem: descobertas que você pode usar para atacar seu desafio de design, e isso é o insight. 22 OBSERVAÇÃO + INFERÊNCIA = INSIGHT Como definir? Considere o que se destacou quando você estava conversando e observando as pessoas. Que padrões surgem quando você olha para essas informações? Se você nota alguma coisa interessante, pergunte a si mesmo (e ao seu time) o que deve ser isso? Perguntando porque alguém teve um certo comportamento ou sentimento, você está fazendo conexão daquela pessoa para um contexto maior. Para preencher o POV: - Desenvolva um entendimento sobre o tipo de pessoa para quem você está projetando algo – seu USUÁRIO; - Sintetize e selecione um conjunto de NECESSIDADES que você acha que é importante resolver. Você pode, inclusive, escolher uma única necessidade que se mostrar como a dor mais latente; - Trabalhe para expressar INSIGHTS que você desenvolveu através da síntese de informações que você reuniu durante a etapa de empatia. - Articule um POV combinando usuário, necessidade e insight, de modo a construir uma declaração de problema que irá guiar o resto do projeto de design. 23 Conhecemos... (Descreva seu usuário) Nos surpreendemos em saber que... (Tensão, contradição ou surpresa) Imaginamos que isso significa que... (O que você inferiu?) Seria uma mudança de jogo se... (Construa um desafio inspirador para trabalhar) (Não coloque a solução aqui ainda!) 24 Um bom POV é aquele que: - Dá foco e te ajuda a priorizar a principal dor do usuário; - Inspira o seu time; - Provê critérios para avaliar ideias; - Permite que o seu time tome decisões independentes em paralelo; - Salva você e o seu time da missão impossível de desenvolver conceitos que podem ser qualquer coisa para qualquer pessoa. Ou seja, sua declaração de problema deve ser focada, não ampla. Transição: Definição >> Ideação Na etapa de definição, você determina um desafio específico e relevante para trabalhar, e na etapa de ideação, você foca na geração de soluções para resolver esse desafio. A ideação é um “teste” decisivo para o seu POV: se ele estiver bem redigido, irá naturalmente levá-lo a um grande número de ideias. Um ótimo passo para essa transição de etapas é criar uma lista de perguntas “How-Might-We...?” (Como nós podemos...?) a partir do seu POV, para guiar a sua ideação. O desafio HMW é um tipo de pergunta que transforma o seu desafio em uma oportunidade de design. Esse formato é utilizado para instigar os designers a responder essa pergunta inspiradora das mais variadas formas possíveis, ou seja, ele serve para aumentar a quantidade de ideias inovadoras geradas. Ideação “Não é sobre encontrar a ideia ‘certa’, e sim sobre gerar o maior número de possibilidades” IDEAÇÃO O que é a etapa de ideação? A etapa de ideação normalmente é a mais aguardada de todo o projeto – isso porque a maioria das pessoas tende a resolver um desafio já pulando para solução, ao invés de levar em conta todas as etapas anteriores. Essa é a etapa do projeto onde você e seu time se concentram em gerar o maior número de ideias possíveis. A ideação fornece o combustível e também o material para a construção de protótipos e a obtençãode soluções inovadoras para entregar nas mãos dos seus usuários. Por que idear? Você entra na etapa de ideação para poder passar de identificar quais são os problemas dos seus usuários para criar soluções para eles. A ideação é a sua chance de combinar tudo aquilo que você entendeu sobre o problema e sobre a pessoa para quem você está projetando com a sua imaginação para gerar conceitos de soluções. Nessa etapa o que importa é quantidade, e não 25 qualidade – mesmo as ideias mais loucas, impossíveis ou bobas podem servir de inspiração para algo realmente relevante para o usuário. Por isso, nesse momento o objetivo não é encontrar uma solução única, ou a melhor ideia, na verdade é conseguir a gama mais ampla de ideias, onde você e sua equipe poderão selecionar algumas para prototipar. A determinação da melhor solução será descoberta mais tarde, através de testes com usuários e feedbacks. A ideação é utilizada para: - Ir além das ideias óbvias e aumentar o potencial de inovação das soluções criadas; - Aproveitar as perspectivas do time, bem como seus pontos fortes; - Descobrir áreas inesperadas de exploração; - Criar volume e variedade nas suas opções de inovação. Como idear? O processo de ideação acontece através da combinação da sua mente consciente e inconsciente, e também através de pensamentos racionais com a imaginação. Em um brainstorm você alavanca a sinergia do grupo para chegar a novas ideias, através da construção sobre as ideias dos outros. Ou seja, mesmo que surja uma ideia que não é muito boa, que não está bem lapidada ou que pode ser melhorada, o grupo pode trabalhar nessas ideias de forma coletiva e trazer o melhor delas - isso é o que chamamos de “crescer na ideia do outro.” Além disso, adicionar constraints, trazer materiais inspiradores e abraçar o desconhecido permitem que você e seu time 26 alcancem mais do que poderiam se simplesmente estivessem apenas pensando no problema. Transição: Ideação >> Prototipagem Para não perder todo o potencial inovador que você acabou de gerar na ideação, é legal passar por um processo de seleção das ideias que serão prototipadas. Você pode fazer isso de várias formas, uma delas é colocar todas as ideias geradas em na Matriz de Priorização: 27 EIXO DA INOVAÇÃO EIXO DA EMPATIA 12 3 Aquelas que fornecem o maior impacto, inovação e empatia (quadrante 1) serão levadas para próxima etapa, e as restantes serão guardadas em um backlog. Caso as ideias que você escolheu para prototipar falhem, você sempre pode visitar seu backlog de ideias para pinça-las para uma rodada de prototipagem. Uma outra forma de seleção de ideias é através de votação. Cada membro da equipe tem três votos, sendo um voto para uma ideia Legal (do ponto de vista do usuário, claro), uma ideia Rápida (de ser implementada) e uma ideia Disruptiva. Vocês podem levar as duas ou três ideias mais votadas para a etapa de prototipagem, e, dessa forma, preservar o potencial de inovação ao levar várias ideias para frente. Ambas abordagens são bem diferentes do senso comum, onde apenas uma única ideia é prototipada. 28 Prototipagem “Construa para pensar e teste para aprender” PROTOTIPAGEM O que é a etapa de prototipagem? Primeiro: você sabe o que é um protótipo? É tudo aquilo que você possa construir de forma rápida e barata para testar a experiência da sua ideia. Ou seja, se der errado, tudo bem! Você joga fora ou itera (melhora a partir de feedbacks dos usuários) e segue a vida. O bom do protótipo é que você pode errar em uma etapa bem inicial do projeto, então você não perde tempo. E também você não perde grana, porque é um artefato bem rudimentar e barato! Estamos falando de ideias construídas com isopor, cartolina, papel alumínio, etc. A etapa de prototipagem então é a geração iterativa de artefatos que tem como objetivo responder as questões que irão te aproximar da sua solução final. Nas etapas iniciais do projeto essas questões podem ser amplas – por exemplo: “será que meu usuário curte cozinhar de forma competitiva?” Nessas etapas iniciais, você então pode criar protótipos rudimentares que são rápidos e baratos de fazer (pense em minutos e centavos) que irão trazer à tona feedbacks importantes dos usuários e dos designers. Em estágios mais avançados, seu protótipo e sua 29 pergunta estarão um pouco mais refinados. Exemplo – você pode criar um protótipo para o projeto culinário que tem como objetivo descobrir se o usuário gosta de cozinhar seguindo comandos de voz ou comandos visuais. Um protótipo pode ser qualquer coisa que o usuário possa interagir – uma parede com anotações em post-its, um aplicativo feito em folhas de papel, uma atividade de encenação, ou até um storyboard. Lembre-se que o protótipo tem que testar principalmente a experiência do usuário, então construir um cenário em storyboard para o usuário é legal, mas fazer com que eles participem de uma encenação nesse cenário – com artefatos reais, interagindo com pessoas – muito provavelmente trará muito mais sentimentos e respostas daquela pessoa. Por que prototipar? - Para idear e resolver problemas. Para comunicar. Se uma imagem vale mais do que mil palavras, um protótipo vale mais do que mil imagens. - Para começar uma conversa. Suas interações com seus usuários são muito mais ricas quando giram em torno de um artefato que promove uma experiência. Um protótipo é uma oportunidade de ter mais uma conversa com seu usuário e aprender ainda mais sobre ele. - Para falhar rápido e barato. Usar o menor número possível de recursos significa menos tempo e dinheiro “perdidos”. - Para testar novas possibilidades. Quanto mais simples de prototipar, mais liberdade você terá para testar várias ideias diferentes sem se comprometer prematuramente com uma única direção. 30 - Para gerenciar o processo de construção. Identificar uma variável também pode te encorajar a quebrar um problema grande em vários pedacinhos testáveis. Como prototipar? - Não tenha medo de por a mão na massa. Comece a construir o seu protótipo mesmo que você não tenha muita certeza do que está fazendo. O ato de começar a selecionar alguns materiais para o seu protótipo vai ajudar a você entrar no ritmo (post-its, fita, clips são alguns exemplos de um bom começo). - Não gaste muito tempo em um único protótipo e não se apegue a ele! Largue mão antes de você se encontrar muito envolvido emocionalmente com qualquer protótipo. Lembre-se que ele pode falhar e você terá que descartar a ideia ou iterá-la. - Tenha em mente o que você quer testar com cada protótipo. Essa construção não serve simplesmente para trazer uma ideia para a realidade, e sim responder uma questão durante o teste. Dito isso, não se feche para todas as outras coisas que você pode aprender com o usuário ao testar o protótipo, ok? - Construa com o usuário em mente. O que você espera testar com ele? Que comportamentos você espera dele? Essas questões podem te ajudar a construir seu protótipo e também te ajudar a receber feedbacks mais assertivos na fase de testes. Para melhorar a organização da construção do protótipo, você pode utilizar o frame Cenário-Artefato-Papel: 31 Transição: Prototipagem >> Teste Entre as etapas existe mais uma extensão do que uma transição, já que elas estão diretamente ligadas. Não existe protótipo sem teste, nem teste sem protótipo. O que você está tentando testar e como você irá testar são aspectos muitos importantes para você levar em consideração antes de construir um protótipo. Embora as duas etapas estejam totalmente conectadas, não pense que é só construir o protótipo e sair correndo pra testá-lo. Não pense também que você irá apenas colocar o protótipo na frente do usuário e ele irá testá-lo maravilhosamente. Muitas vezes os resultados mais ricos de um teste serão aqueles onde o designer pensou cuidadosamente como testar de uma forma em que o usuário dá seus feedbacks relevantes de uma forma natural e honesta. Então é muito interessante planejar com carinho como você irá realizar esse teste, ok? 32 Cenárioda experiência Artefatos na experiência Papéis envolvidos Qual é o lugar onde a sua ideia acontece? O que você está criando? Quais elementos físicos e digitais fazem parte da ideia? O que as pessoas precisam fazer e o que recebem em troca? Teste “A etapa de teste é uma oportunidade de aprender sobre a sua solução e mais sobre o seu usuário” TESTE O que é a etapa de teste? A etapa de teste é aquela onde você recolhe feedbacks do seu usuário sobre o protótipo que você criou, ou seja, mais uma oportunidade de conhecer ainda mais essa pessoa. Mas diferente da etapa inicial de empatia, agora você já trabalhou no desafio desse usuário e criou uma solução (protótipo) para o problema dele. Mas tenha atenção para não reduzir essa experiência a algo simples como perguntar se o usuário gostou ou não da sua solução. Ao contrário, continue a perguntar “porque” e buscar sentimentos – foque no que você pode aprender sobre essa pessoa e também sobre o problema dela (será muito útil na hora de iterar o protótipo). No mundo ideal você deve buscar testar sua solução no contexto real da vida do usuário. Se for um objeto físico, peça para a pessoa pegá-lo e usá-lo dentro da sua rotina. Caso seja uma experiência, tente criar o cenário de forma a capturar a situação real dessa interação. Se não for possível testar o protótipo dessa forma, construa a interação da forma mais real possível ao colocar o usuário em um papel encenado, ou engajado a realizar uma tarefa com o protótipo. 33 Uma regrinha pra ter em mente: construa seu protótipo como se você soubesse que está certo, mas teste a solução como se você soubesse que está errado. Testar sempre é uma chance de melhorar a sua ideia. Por que testar? - Para refinar seus protótipos e soluções. O resultado de um teste é o próximo passo que você tem que seguir, e muitas vezes isso significa reconstruir ou iterar seu protótipo. - Para aprender mais sobre o seu usuário. Testar é uma nova oportunidade de se aproximar do seu usuário e aprender mais sobre ele através da observação e envolvimento – normalmente você sairá do teste com insights novos e inesperados. - Para refinar o seu POV. Às vezes o teste revela que você não só errou na solução, mas como você não trabalhou bem no problema do usuário. Prepare-se para voltar algumas casas. Como testar? - Mostre e não conte. Coloque seu protótipo nas mãos do usuário e não explique nada (ainda). Deixe-o interpretar o protótipo, observe como ele usa a solução (correta ou incorretamente), e como ele interage. Escute o que ele tem a dizer e as questões que surgem. Anote tudo isso: o que o usuário gostou, o que poderia melhorar, o que ele não entendeu e novas ideias para a solução – essas informações serão utilizadas para alimentar a sua matriz de feedback e iterar o protótipo. 34 - Crie experiências. Crie o protótipo e o teste de uma forma que pareça uma experiência que o usuário tem que interagir, não uma explicação exaustiva que a pessoa terá que avaliar. - Peça para o usuário comparar. Trazer vários protótipos para o teste dá ao usuário uma base de comparação, e muitas vezes isso pode mostrar necessidades latentes dele. Ao realizar o teste, uma boa ferramenta para organizar e documentar os feedbacks é a Matriz de Feedback: 35 + - ! ? O que funcionou e foi legal O que pode ou precisa melhorar Novas ideias Dúvidas Itere e Domine A iteração é a premissa básica para uma boa jornada de design. E não tem regra pra isso, você pode iterar de forma cíclica, passando pelas etapas várias vezes - ou também entre as etapas, por exemplo, se o protótipo falhar, você pode voltar para o backlog de ideias da etapa de ideação, e se não tiver nenhuma ideia que corresponda com o que você encontrou de necessidade do usuário durante o teste, você pode refazer a etapa de ideação ou até mesmo revisitar a etapa de empatia e definição. Geralmente, quanto mais você itera, mais você trabalha de forma super detalhada, ao invés de ficar no conceito mais amplo. Para simplificar, mostrei a jornada de design em uma progressão linear, mas um desafio de design pode ser resolvido de várias formas, além disso, há um número ilimitado de estruturas de design para se trabalhar. A forma que apresentei a jornada é uma sugestão, mas você e sua equipe podem e devem adaptá-lo ao seu estilo de trabalho – cortando etapas, inserindo novas, trocando a ordem, etc. Mais importante ainda, à medida que você e seu time continuam a praticar a inovação, o mindset de designer irá permear a forma como vocês trabalham, independente do processo que vocês usarem. Portanto, continuem praticando e iterando! 36 Enjoy ;) Espero que o material ajude e impulsione a sua jornada com o Design Thinking! Julia Pupolin Design Thinking & Human- Centered Design Expert LinkedIn www.linkedin.com/in/juliapupolin/