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� Interdisciplinaridade e integração curricular Interdisciplinaridade e integração curricular com- põem, junto a outras proposições, a abordagem teórico- metodológica desta obra, atendendo à concepção peda- gógica e às competências e habilidades da BNCC. A noção de interdisciplinaridade, aqui adotada, justi- fica-se pela proposição de trabalho em área determinada pela BNCC. Para concretizá-la, na obra baseou-se no tra- balho de pesquisadores nacionais, como: Ivani Fazenda, Selma Garrido Pimenta, Antônio Joaquim Severino e Hil- ton Jupiassu. O conceito de interdisciplinaridade apresen- ta múltiplos sentidos nas discussões sobre currículo. Ao refletir sobre as ideias de Hilton Japiassu sobre o tema, Ludmila de Almeida Freire e Ronaldo de Sousa Almeida (2017) analisam que a interdisciplinaridade não possui uma única definição. Pode ser compreendida de diferen- tes formas, dependendo do paradigma teórico adotado. Nesta obra, o conceito de interdisciplinaridade se estru- tura como a busca por intersecções entre as práticas de linguagens dos diferentes componentes da área de Lin- guagens e suas Tecnologias. Para compreender as relações que justificam a esco- lha pela interdisciplinaridade como uma das bases teóri- co-metodológicas desta obra, cabe iniciar refletindo sobre o trabalho educativo nesta perspectiva. Segundo Selma Garrido Pimenta (1998), o trabalho docente interdiscipli- nar pode proporcionar o desenvolvimento de conheci- mentos, habilidades, atitudes e valores quando entende que ensinar é uma forma de colaborar com o processo de humanização. Para tal, é fundamental considerar no trabalho pedagógico os aspectos sócio-histórico-culturais que marcam a produção de conhecimentos dos estudan- tes. Por meio do trabalho interdisciplinar, professores e estudantes viabilizam a construção contínua e incessante de saberes-fazeres baseados nas necessidades e desafios do processo de ensinar e aprender como prática social, que reflete e age em determinado contexto. A interdisciplinaridade dialoga com as propostas de trabalho em área da BNCC, pois o desenvolvimento de competências e habilidades exige estabelecer conexões complexas, não lineares e que articulam saberes, atitudes, habilidades e valores. Por exemplo, por meio das compe- tências gerais, é possível mapear e planejar construções interdisciplinares, envolvendo mais de uma área. A organização do currículo por competências traz essa possibilidade. Na BNCC, as competências abrangem conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilida- des (“práticas” cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores que visam lidar com necessidades complexas da vida cotidiana, do exercício integral da cidadania e do mundo do trabalho. Deste modo, conforme apre- sentado pela própria BNCC, propõe-se o currículo em ação que se constitui de um conjunto de decisões que adaptam as proposições da BNCC às realidades locais e aos contextos escolares. Estas escolhas provêm de um processo de implicação e participação das famílias e da comunidade, assim como, referem-se a muitas ações. Uma delas diz respeito às escolhas sobre os modos de organização interdisciplinar dos componentes curricu- lares. Além disso, reforçam a competência pedagógica da comunidade escolar para assumir estratégias mais dinâmicas, interativas e colaborativas relacionadas à ges- tão do ensino-aprendizagem. Conforme Ludmila de Almeida Freire e Ronaldo de Sousa Almeida (2017), o conceito de interdisciplinarida- de passa a ser cunhado no Brasil a partir dos anos 1970 pela necessidade de dar resposta à fragmentação causa- da pela concepção positivista, que dividiu a ciência em várias disciplinas. Ainda hoje, este conceito apresenta um caráter inovador e desafiador ao impulsionar o diálogo entre diversas áreas do conhecimento. Ao refletir sobre a fragmentação que marca historica- mente a prática da educação no Brasil, Antônio Joaquim Severino (1998) destaca que esta se expressa de várias formas: por meio da não integração entre os conteúdos dos componentes curriculares, assim como, nas ativida- des didáticas; do rompimento entre teoria e prática; da desarticulação entre a vida escolar e a comunidade, da dissociação entre pedagógico e político, entre microsso- cial e macrossocial. E são esses os limites borrados pela interdisciplinaridade. Segundo Severino (1998), a interdisciplinaridade permi- te que o conhecimento escolar se conecte com as práticas sociais e não seja tratado de forma descontextualizada. O autor afirma que o caráter interdisciplinar da práti- ca do conhecimento é uma articulação entre o todo e as partes, bem como, dos fins com os meios. Ainda, acon- tece em função da prática, necessita de uma intenciona- lidade que a mobilize, é essencialmente prática de pes- quisa, e se fundamenta na ideia de que aprender é pesquisar para construir. Com base nisso, a interdisciplinaridade aplicada nesta obra tem o intuito de contribuir para a correlação de sa- beres e experiências, de ensino e pesquisa, de teoria e prática, de escola e comunidade. Japiassu (1994) explica que o trabalho interdisciplinar supõe a interação, inter- penetração e retroalimentação das áreas do conhecimen- to em termos teóricos e metodológicos. Para Fazenda (1998), a educação tem um papel an- tropológico, o que a estabelece como uma ciência mul- tifocada e pluridimensionada, na qual a diversidade é inerente à própria variedade de pontos de vista. A autora ORIENTAÇÕES GERAIS | 177 V1_LINGUAGENS_Faraco_g21Sa_161a232_MPG.indd 177V1_LINGUAGENS_Faraco_g21Sa_161a232_MPG.indd 177 20/09/2020 10:3320/09/2020 10:33 discute a ambiguidade como característica dos processos interdisciplinares. Para ela, a interdisciplinaridade rompe com o pensa- mento linear e nos permite observar a complexidade e as ligações entre os fenômenos da vida social contraditó- rios e interconectados. Desta forma, as propostas interdisciplinares entre Arte, Educação Física e Língua Portuguesa, presentes na obra, buscam contribuir para que cada contexto escolar e realidade local seja acolhida e que possa se lançar no desafio de criar uma “ordem” coerente com suas demandas e interesses. Para tal, é importante ob- servar a complexidade dos processos, adotando uma postura curiosa e criativa, aberta a diferentes formas de troca. Esta obra foi escrita por meio de processos colabo- rativos entre os autores, especialistas em linguagens de suas áreas de atuação, que buscaram concretizar o tra- balho em área utilizando diferentes estratégias integra- doras. Uma delas se deu por meio de temáticas co- muns que foram desenvolvidas nos volumes. Elas tecem relações com os temas contemporâneos trans- versais, as culturas juvenis e os projetos de vida. Em síntese, conectam o universo dos estudantes a impor- tantes questões contemporâneas, como: corpo, cultu- ra, sociedade, expressão, comunicação, trabalho, ciên- cia, tecnologia, entre outras. Estas são trabalhadas ao longo da obra tanto de forma específica quanto co- mum. Ou seja, por meio das particularidades de cada componente das Linguagens e suas Tecnologias, bem como, em integrações que acontecem nas práticas de pesquisa, nas experimentações e produções propostas aos estudantes, entre conhecimentos articulados com vivências pessoais e sociais. Conceitos, procedimentos, práticas cognitivas e socioemocionais, atitudes e valo- res que compõem as competências e habilidades da BNCC foram fatores integradores nesta obra. Isso po- de ser observado nos diversos repertórios, análises, ex- perimentações e questionamentos que estimulam tro- cas de pontos de vista, de maneira a promover o compartilhamento de saberes e vivências, em que ca- da um, enquanto ser social, contribua com conheci- mentos oriundos de sua história, região, comunidade, família, etc. Em suma, ao longo dos volumes, apresentam-se vá-rios pontos de convergência entre as Linguagens e suas Tecnologias, ao mesmo tempo que se expõe e se incita a análise e a reflexão pautadas nas respectivas particularidades epistemológicas e metodológicas de ca- da componente. Busca-se, com isso, uma visão mais am- pla, profunda e crítica da realidade. As interfaces entre os conhecimentos são estabelecidas com base nos domínios de cada linguagem, porém entende-se que as práticas de linguagens de cada componente não são estanques, re- conhecem-se em suas especificidades e potencialidades na construção do saber, da cidadania, da ética e da de- mocracia. As escolhas teórico-metodológicas possibilitaram o desenvolvimento e a mobilização de competências e ha- bilidades visando uma formação integral do estudante, de maneira a promover a empatia, o respeito à diversida- de, a solidariedade, o cuidado e a responsabilidade sobre si e o outro, assim como nas relações sociais, na saúde e no desenvolvimento sustentável. Cabe destacar que a presente obra não é um mode- lo pronto de interdisciplinaridade, mesmo porque isso seria um contrassenso. A interdisciplinaridade é um con- ceito complexo e deve ser realizada de maneira proces- sual, integral e coerente em todo o processo de ensino- -aprendizagem. Os modos de aplicabilidade dos conteúdos e propostas dessa obra serão definidos pela comunidade escolar. A proposta é não se restringir ape- nas ao livro didático, mas buscar modos interdisciplina- res para os planejamentos das aulas e na concepção de ensino balizada pelo projeto político-pedagógico da es- cola. Não há fórmulas para sua aplicação, por isso, a obra pode ser um convite ao professor e à escola para desen- volverem suas pesquisas e processos educativos nessa perspectiva integradora. Paralelamente, a noção de integração curricular uti- lizada nesta obra supõe a conexão entre as aprendiza- gens escolares e os problemas e temas significativos para o mundo e a vida dos estudantes. Segundo James A. Beane (2003), a integração curricular é a essência da escola democrática. O autor defende que a estrutura- ção do currículo escolar pela abordagem da integração possibilita centrar as aprendizagens em unidades te- máticas, problemas sociais, questões relevantes e, no caso desta obra, nas práticas de linguagem e seus diá- logos com os jovens e o mundo em que vivem. O cur- rículo integrado busca a integração em múltiplas di- reções. Ao utilizar a concepção curricular de Beane (2003) a obra procura integrar: 1. as culturas juvenis e pontos de vista dos jovens acerca do mundo, das produções culturais, da ciên- cia e da vida; 178 V1_LINGUAGENS_Faraco_g21Sa_161a232_MPG.indd 178V1_LINGUAGENS_Faraco_g21Sa_161a232_MPG.indd 178 20/09/2020 10:3320/09/2020 10:33