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ASSUNÇÃO, A. C. L.; VASCONCELOS, F. M. B. P.
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Assim como toda produção artística, as carrancas de mestre Biquiba 
também passaram por uma evolução estética. A primeira fase da carranca 
corresponde à cabeleira anelar, envolvendo todo o pescoço como uma juba. 
A segunda fase corresponde às carrancas antropomórficas (que têm 
semelhança com a figura humana), com a cabeleira dividida em ondas. 
Na terceira fase (após 1950), quando foram entalhadas para colecionado-
res, as carrancas passaram por outra transição fórmica: a cabeleira, em corda, 
tinha os sulcos produzidos na madeira de modo horizontal enquanto, na fase 
anterior, os sulcos eram esculpidos na vertical. Outra mudança ficou por conta da 
finalidade: como a carranca não precisa de um encaixe para a proa, passa a ter 
uma base quase horizontal para mantê-la no chão sem auxílio de calço. 
Figura 28 - Uma das carrancas do Mestre Guarany da primeira fase.
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Com efeito, se lançarmos uma vista sinótica sobre a arte brasileira, veremos que esta 
arte não deixou de ser um produto de importação, direta ou indireta. Barroco portu-
guês; neoclassicismo, academismo, realismo e impressionismo franceses; surrealismo 
europeu e norte-americano – todas estas influências estrangeiras se precipitaram e se 
Arte e Cultura Brasileira
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entrecruzaram neste solo que, por isso mesmo, não pôde até aqui tomar consciência 
dele mesmo... 
Por isso, apesar de estrangeiro há pouco chegado, tomo a liberdade de propor 
alguns conselhos, esboçar algumas diretrizes - que serão a conclusão do presente es-
tudo: Se não houve até aqui “pintura brasileira” (e nós vimos sobejamente porque) 
não há aparentemente razão para que um dia (amanhã...) não haja uma. Mas para que 
esta possibilidade se torne realidade, é indispensável, no meu modo de ver, mudar a 
atitude de espírito que domina geralmente no Brasil. 
É preciso libertar o navio, encalhado nas águas barrentas do academismo, da arte 
literária e anedótica, da “fabricação” pictural e turística, vulgarmente decorativa ou 
publicitária. É preciso lançar o navio no alto mar, e, por meio de uma manobra heroica 
de timão, imprimir-lhe um rumo clarividente, no sentido mesmo do gênio profundo da 
terra brasileira. (Fonte: CHABLOZ, 1942, p. 5)
Dentro da vasta gama de estilos da Arte Popular, encontramos a Arte 
naïf40 ou arte primitiva moderna. No início do século XX, o artista autodidata 
Henri Rousseau foi reconhecido como artista naïf, com suas pinturas de ca-
racterística ingênua e anticonvencional, abrindo portas para esta expressão 
no mundo todo, inclusive no Brasil, onde, nos anos de 1920, alguns artistas já 
recebiam influências das vanguardas europeias.
Naïf é uma palavra francesa que significa primórdios, primeiros. A arte 
naïf é uma arte livre de convenções e técnicas acadêmicas. Trata-se de uma 
produção de imagens representativas do universo pitoresco e regional onde 
o artista está inserido. Este universo é traduzido por formas simplificadas e/ou 
estilizadas figurativas com cores puras, tendo, em suas cenas compositivas, 
narrativas do cotidiano sempre presentes numa natureza idealizada.
Entre as características formais mais comuns na pintura naïf, estão: a 
dificuldade de uso correto da perspectiva, utilização de cores primárias sem 
contrastes e simplicidade nos desenhos.
A arte naïf teve sua penetração e seu reconhecimento na história da 
arte devido a algumas ações de artistas vanguardistas do século XX que já 
não aceitavam os cânones estabelecidos pela academia e estavam em bus-
ca de novas poéticas artísticas, voltando-se, principalmente, para o gosto do 
exótico e primitivo, como nos descreve Costa (2006):
As vanguardas artísticas do início do século XX, trazendo no seu bojo 
o questionamento a todas as regras vigentes na arte acadêmica e a 
negação do estabelecido, reforçaram a consolidação da arte naïf como 
poética artística moderna. Entre as vanguardas artísticas, o Cubismo 
foi à poética que deu o maior impulso no reconhecimento da arte naïf. 
O artista espanhol Pablo Picasso (1881-1973) criador do cubismo, com 
seu interesse pela escultura africana, particularmente pelas máscaras 
(objetos presentes em sua coleção particular e adquiridas em Paris 
no mercado negro em 1907) que serviram de inspiração ao óleo 
40O Brasil, a França, o Haiti, 
a antiga Iugoslávia e a Itália 
formam o cinco maiores 
países da arte naïf. Para 
maiores informações, visite 
o site: http://www.museunaif.
com.br/index.asp?cid=1
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sobre tela “Lês Demoiselles D’Avignon”, obra inaugural do cubismo, 
demonstrou seu interesse pelo aspecto pouco convencional e exótico 
das mesmas e estimulou a visitação de outros artistas modernos a 
obras semelhantes (p. 88).
Um dos representantes da arte naïf, o artista autodidata Francisco 
Domingos da Silva (1923 - 1985) – o Chico da Silva, nascido em Cruzeiro do 
Sul - Alto Tejo, Acre, em 1923 –, era descendente de índios. 
Figura 29 - Dragão,Chico da Silva, 1974.
Mudou-se para a cidade de Fortaleza ainda menino. Pintor e desenhista 
autodidata, desenhava pelos muros da cidade com giz ou carvão, sem que o 
grande público soubesse de seus trabalhos.
Chico da Silva se tornou conhecido após ser descoberto por Jean 
Pierre Chabloz, que lhe encontrou desenhando seus bichos fantásticos na 
praia do Pirambu. Chabloz resolveu lhe ensinar as técnicas do guache e do 
óleo, tornando-o seu discípulo. 
Os dragões, sereias e peixes voadores de Chico passaram a habitar 
as exposições do Rio de Janeiro e da Suíça, terra de Chabloz. Entre 1961 e 
1963, trabalha no recém-criado Museu de Arte da UFC, onde, mais tarde, terá 
guardado grande parte de seu acervo. Em 1966, Chico recebeu uma menção 
honrosa da XXXIII Bienal de Veneza. Após essa época, passa quatro anos 
internado em um hospital psiquiátrico, só voltando a pintar em 1981. 
41O determinismo criativo 
é uma teoria que advém 
dos estudos da arte como 
expressão, surgidos na 
Inglaterra em meados 
da década de 1930 e 
divulgados nos Estados 
Unidos da América (EUA) a 
partir da década de 1940. 
Seu conceito principal 
afirma que a criação, 
quando espontânea, possui 
caracteres subjetivos e 
individuais, em um fluxo 
contínuo de despejo de 
imagens mentais, em que 
o criador se deixa levar 
pela intuição. No Brasil, a 
artista e pesquisadora Fayga 
Ostrower (1920-2001), de 
1940 a 2001, publica vários 
estudos sobre os processos 
criativos e a criação em 
si. (site do Instituto Fayga 
Ostrower: http://www.
faygaostrower.org.br/) .

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