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Letícia Escorse – 17.2 2 DISPNEIA A dispneia pode ser definida como uma experiencia subjetiva de desconforto ao respirar. MECANISMOS Eferentes motores – Distúrbios da bomba respiratória quando há aumento da resistência ou rigidez das vias respiratórias gerando acentuação do trabalho respiratório ou sensação de esforço exagerado para respirar. Aferentes sensoriais: Os quimiorreceptores nos corpos carotídeos e no bulbo são ativados por hipoxemia, hipercapnia e acidemia. A estimulação desses receptores produz a sensação de falta de ar. Receptores J sensíveis ao edema intersticial, quando ativados pelo aumento da pressão arterial pulmonar, podem contribuir para o aumento da falta de ar. *Fatores emocionais (ansiedade ou o medo agudo) podem contribuir para a dispneia. AVALIAÇÃO DA DISPNEIA Tipo de sensação: Tipo de desconforto. Intensidade da sensação: É possível perguntar ao paciente sobre quais atividades podem ser realizadas e em quais enfrenta dificuldades. Dimensão afetiva: Percepção do paciente sobre o sintoma desagradável e interpretado como anormal. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL A dispneia COSTUMA resultar de desvios na função normal cardiovascular e respiratória. Enquanto que os distúrbios do sistema respiratório se relacionam mais com alterações das propriedades mecânicas dos pulmões e/ou da parede torácica, os distúrbios cardiovasculares causam dispneia mais comumente porque desencadeiam anormalidades da troca gasosa ou estimulam os receptores pulmonares e/ou vasculares. DISPNEIA DO SISTEMA RESPIRATÓRIO doenças das vias respiratórias A asma e a DPOC, as duas doenças pulmonares obstrutivas mais comuns, caracterizam-se por obstrução do fluxo expiratório, que geralmente, causa hiperinsulflação dos pulmões e distensão das paredes torácicas. Esses pacientes tem aumento da resistência e da restrição (rigidez) elástica dos músculos respiratórios e precisam fazer mais esforço para respirar. Asma e DPOC podem gerar hipoxemia e hipercapnia secundárias à desproporção entre ventilação e perfusão (V/Q). DOENÇAS DA PAREDE TORÁCICA Distúrbios que enrijecem a parede torácica ou que enfraquecem os músculos respiratórios (Síndrome de Guillain-Barré) estão associados ao aumento do esforço respiratório. Derrames pleurais mais volumosos também podem contribuir para dispneia, tanto porque aumentam o esforço respiratório quanto porque estimulam receptores pulmonares na presença de atelectasia associada. *Não esqueça que LES pode ser causa de dispneia por acometimento pleural. DOENÇAS DO PARÊNQUIMA PULMONAR As doenças pulmonares intersticiais, que podem ser causadas por infecções, exposições ocupacionais, distúrbios autoimunes, estão associadas ao aumento da rigidez (diminuição da complacência) dos pulmões. Além disso, a desproporção V/Q e a destruição ou espessamento da interface alvéolocapilar pode causar hipoxemia e aumentar o impulso respiratório. A estimulação dos receptores pulmonares pode acentuar ainda mais a hiperventilação. DISPNEIA DO SISTEMA CARDIOVASCULAR DOENÇAS DAS CÂMARAS CARDÍACAS ESQUERDAS O mecanismo da dispneia se deve ao aumento da pressão no VE, o que provoca elevação da pressão nos capilares pulmonares, gerando o extravasamento de líquido e edema intersticial. Esse edema estimula os receptores justacapilares e, desse modo, há a dispneia. A hipoxemia secundária à desproporção V/Q também pode contribuir para a falta de ar. DOENÇAS DOS VASOS SANGUÍNEOS PULMONARES A doença pulmonar tromboembólica e as doenças primárias da circulação pulmonar (hipertensão pulmonar, vasculite pulmonar) causam dispneia porque aumentam a pressão arterial pulmonar e estimulam os receptores pulmonares. DOENÇAS PERICÁRDICAS A pericardite constritiva e o tamponamento pericárdico estão associados a elevações das pressões intracardíacas e vasculares pulmonares, o que constitui o mecanismo de dispneia nesses distúrbios. DISPNEIA ASSOCIADA A ANEMIA A anemia leve a moderada está associada a angústia respiratória quando o paciente faz esforço físico (intolerância ao exercício). Esse sintoma parece estar relacionado com a estimulação dos metaborreceptores, porque, normalmente, a saturação de O2 é normal em pacientes anêmicos. Os metaborreceptores localizados nos músculos esqueléticos parecem ser ativados por alterações da composição bioquímica local dos tecidos ativos durante o exercício e, quando estimulados, contribuem para a angústia respiratória. DISPNEIA DA falta de condicionamento A sensação de falta de ar associada à obesidade provavelmente se deve a vários fatores, inclusive débito cardíaco aumentado e disfunção da bomba ventilatória (redução da complacência da parede torácica). A falta de condicionamento cardiovascular (despreparo físico) caracteriza-se pelo desenvolvimento rápido de metabolismo anaeróbio e estimulação dos quimiorreceptores e metaborreceptores. Outras condições que podem envolver a dispneia e estão associadas a quadros de congestão sistêmica são a doença renal crônica e a insuficiência hepática crônica (associada à hipertensão portal). AVALIAÇÃO ANAMNESE · Início, evolução, frequência e duração · Características da dispneia: É um cansaço geral, um desconforto para respirar, uma dor muscular? · Fatores desencadeantes (exercício, ansiedade, infecção respiratória, exposição a alérgenos...) · Fatores de melhora ou piora · Intensidade da dispneia (mMRC) · Sinais e sintomas associados: Tosse, pigarro, edema de MMII, DPN, ortopneia, dor à palpação do gradil costal, dor pleurítica, doença hepática ou renal... · Fatores de risco: tabagismo ativo ou passivo, exposição ocupacional (fornos à lenha, áreas de queimada, exposição à forno ou queima de qualquer material biológico). · Doenças de base: HAS, DPOC, asma, DAC, anemia, doença musculoesquelética, doença hepática, doença renal... EXAME FÍSICO · Alterações na cor da pele: Cianose, palidez de pele e mucosas. · Alterações do tórax: uso de musculatura acessória, taquipneia, aumento do diâmetro anteroposterior...Simetria dos movimentos, percussão pulmonar (macicez ou hipertimpanismo), murmúrio vesicular, presença de roncos, sibilos, estertores. · Exame cardíaco: Sinais de elevação da pressão no coração direito (distensão das veias jugulares, edema, hiperfonese de B2) e de disfunção esquerda (características do ictus, galopes por B3 e B4), e doença valvar (sopros). · Exame do abdome · Estigmas de doença hepática ou renal EXAMES COMPLEMENTARES · Hemograma: Importante para avaliar a presença de anemia como possível causa ou intensificador da dispneia. · Radiografia do tórax PA e perfil: Avaliar hiperinsulflação ou redução do volume pulmonar, presença de derrame pleural, alterações parenquimatosas, tamanho da área cardíaca. Em geral, a TC é reservada para avaliação mais detalhadas do parênquima pulmonar (doença pulmonar intersticial) e da possibilidade de embolia pulmonar). · ECG: Para detectar indícios de hipertrofia ventricular e infarto do miocárdio preexistente. · Ecocardiograma: Quando há suspeita de hipertensão pulmonar, disfunção sistólica, cardiopatia valvar. · Provas de função respiratória: Espirometria pode ser necessária se nossa suspeita incluir asma, DPOC. · BNP: A medida dos níveis de peptídeo natriurético cerebral é cada vez mais usada para avaliar ICC. DPOC DEFINIÇÃO É uma síndrome caracterizada pela obstrução crônica e difusa das vias aéreas inferiores, de caráter irreversível, com destruição progressiva do parênquima pulmonar. Geralmente estão incluídos nesta definição pacientes com bronquite obstrutiva crônica e/ou enfisema pulmonar. EPIDEMIOLOGIA E FATOR DE RISCO Sua prevalência é maior em indivíduos com sexo masculino a partir da 5/6º década de vida. O tabagismo é o principal fator de risca para DPOC, havendo uma história de carga tabágica positiva em 90% dos casos. A quantificação do tabagismo é dada pela “carga tabágica”, multiplicando-se quantidade de maços consumidos/dia x total de anos de tabagismo. A maioria dos pacientes com DPOC possui uma carga tabágica de 40 anos/maço. Outros fatores de risco: · Tabagismo passivo · Poluição atmosférica· Exposição ocupacional a poeiras orgânicas, fumaças e vapores · Deficiência de alfa-1-antitripsina: Doença genética autossômica recessiva que cursa com enfisema pulmonar em crianças ou adolescentes. A ausência dessa enzima deixa livre a elastase neutrofílica que vai degradando o parênquima pulmonar. O tabagismo é o fator de risco mais importante para DPOC e para o carcinoma broncogênico. Contudo, a DPOC se mostrou um fator de risco independente para este. TABAGISMO E VIAS AÉREAS As substâncias do tabaco provocam uma série de alterações nas vias aéreas: 1. Estimulam a produção de muco e hipertrofia das glândulas submucosas. 2. Reduzem ou bloqueiam o movimento ciliar das células epiteliais. 3. Ativam macrófagos alveolares a secretarem fatores quimiotáticos que estimulam recrutamento de neutrófilos. 4. Ativação de neutrófilos, que passam a produzir mais elastase. 5. Inibição da atividade da alfa-1 antitripsina, enzima inibidora fisiológica da elastase. FISIOPATOLOGIA BRONQUITE OBSTRUTIVA CRÔNICA Ocorre hipertrofia e hiperplasia das glândulas submucosas secretoras de muco + aumento de células caliciformes na mucosa = estado hipersecretor, além de redução do lúmen das vias aéreas distais devido ao espessamento da parede brônquica por edema e fibrose. ENFISEMA PULMONAR Definido como o alargamento dos espaços aéreos distais aos bronquíolos, decorrente da destruição progressiva dos septos alveolares (parede interalveolar). O enfisema causa obstrução crônica das vias aéreas distais pelo fato de haver perda no tecido elástico de sustentação da parede brônquica, o que permite a redução do seu lúmen, principalmente na fase expiratória. OBSTRUÇÃO DAS VIAS AÉREAS E HIPERINSUFLAÇÃO É a característica mais marcante da DPOC. A manutenção das vias aéreas abertas na fase inspiratória depende mais da força geradora de fluxo que vem da musculatura respiratória, enquanto que a força expiratória depende em grande grau da elasticidade pulmonar, a qual está reduzida na DPOC e, além disso, a resistência das vias aéreas está aumentada pela redução do seu lúmen o que depende de dois fatores centrais Diminuição do tecido elástico na parede dos alvéolos (enfisema) + Edema e fibrose na parede dos pequenos brônquios Esses fatores predispõe ao colapso das VA, impedindo a eliminação do ar armazenado nas porções periféricas do pulmão, o que gera um aprisionamento de ar, gerando um pulmão cronicamente hiperinsuflado (no exame físico pode ser notado pelo “tórax em barril” e na radiografia pela hipertransparência, alargamento dos EIC, retificação do diafragma). DISTÚRBIO DA TROCA GASOSA A troca gasosa está comprometida tanto pela lesão enfisematosa quanto pela lesão bronquítica. Ambos mecanismos propiciam o surgimento de alvéolos mal ventilados, porém bem perfundidos. Por conta disso, há alteração da relação V/Q e dificuldade na oxigenação correta do sangue, o que pode levar a um mecanismo chamado de shunt parcial e a mistura de sangue mal oxigenado pode produzir hipoxemia. Pode haver prejuízo também na eliminação do CO2 nas fases mais avançadas da doença. Esses pacientes começam a reter CO2 de forma lenta e progressiva (acidose respiratória), estimulando, assim, o rim a reter mais bicarbonato para compensar a acidose. COR PULMONALE Significa uma disfunção do VD consequente a um distúrbio pulmonar. Uma série de pneumopatias pode cursar com cor pulmonale, sendo a DPOC a causa mais comum. O mecanismo envolvido é a hipóxia crônica, já que as arteríolas pulmonares respondem a esse quadro com vasoconstricção. Essa medida é fisiológica, pois desvia o sangue para os alvéolos bem ventilados. No entanto, se a hipóxia alveolar for generalizada, a maior parte dos vasos sofrera vasoconstrição, promovendo a hipertensão arterial pulmonar. Quando a pressão arterial pulmonar atingir valor > 50 mmHg, o VD pode entrar em falência sistólica, devido ao aumento excessivo da pós-carga (resistência que ele enfrenta para mandar o sangue para frente). As consequências da insuficiência ventricular direita são: elevação da pressão venosa central, congestão sistêmica, baixo débito cardíaco. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS O pulmão aumenta sua capacidade de trabalho progressivamente até os vinte anos, quando atinge seu máximo. A partir dos trinta anos, essa capacidade naturalmente diminui, em um ritmo lento e constante. O tabagismo é responsável por uma aceleração desse declínio (o VEF1 cai anualmente quase o dobro em pacientes tabagistas). A queixa mais marcante do paciente com DPOC é a dispneia aos esforços. A evolução é insidiosa, progressiva, marcada por piora agudas desencadeadas por fatores como infecção respiratória. A tosse é outro sintoma muito frequente, sendo comumente acompanhada de expectoração. Bronquite crônica: Entidade na qual o paciente apresenta tosse produtiva (geralmente matinal) por mais de 3 meses consecutivos de um ano e há mais de dois anos. Sua principal causa é o tabagismo. Exame físico Os achados variam de acordo com a forma predominante da doença (componente enfisematoso ou bronquítico). No paciente com bronquite obstrutiva crônica, a ausculta revela sibilos, roncos, estertores crepitantes, associados à diminuição do MV. Nos pacientes com predomínio enfisematoso, a ausculta pode revelar apenas a redução do MV. A percussão mostra aumento do timpanismo. A respiração pode revelar uma fase expiratória mais alargada em relação à fase inspiratória. O aspecto do tórax pode revelar a hiperinsuflação pulmonar (tórax em barril). O exame físico pode revelar dois estereótipos de pacientes: · Pink puffers: São os sopradores róseos, o estereótipo do enfisematoso. Na inspeção, nota-se apenas pletora (pele avermelhada devido a policitemia secundária à hipóxia crônica). Geralmente, são magros e consumidos pela doença, apresentando dispneia expiratória (sopradores). Na ausculta, apenas MV e identificada. · Blue bloaters: São os inchados azuis, estereotipo do bronquítico grave. Esses pacientes possuem um distúrbio mais grave da troca gasosa do que o enfisematoso puro, apresentando-se com hipoxemia significativa manifestada como cianose (azuis). A hipoxemia leva à cor pulmonale e, portanto, ao quadro de ICD e congestão sistêmica (daí o corpo inchado). A ausculta é rica em ruídos adventícios. *A maioria dos pacientes com DPOC apresenta um misto entre esses dois estereótipos. DIAGNÓSTICO HEMOGRAMA Pode mostrar eritrocitose (o tabagismo pode si só pode revelar eritrocitose), além da própria hipoxemia que induz aumento da eritropoietina renal. GASOMETRIA ARTERIAL Pode estar cronicamente alterada, geralmente nos estágios mais avançados na doença. Dados importantes são: hipoxemia, hipercapnia com acidose respiratória crônica, marcada pelo aumento compensatório do biacarbonato, o ph pode estar normal ou discretamente baixo. Nos estados de descompensação, pode haver piora aguda da hipóxia e da hipercapnia, o que justifica a solicitação da gasometria arterial. RADIOGRAFIA DE TÓRAX Se encontra alterado em casos mais avançados de DPOC. Seus sinais mais comuns são: 1. Retificação das hemicúpulas diafragmáticas 2. Hiperinsuflação pulmonar (aumento do número de costelas visíveis (>9-10 costelas na PA) 3. Hipertransparência 4. Aumento dos espaços intercostais 5. Redução do diâmetro cardíaco (coração em gota) 6. Aumento do espaço retroesternal no perfil 7. Espessamento brônquico ECG Devemos procurar as alterações do cor pulmonale, ou seja, sinais de sobrecarga cardíaca direita. A hipoxemia crônica associada à cardiopatia do coração direito predispõe a taquiarritmias. As mais comuns são as extrassístoles atriais, o ritmo atrial multifocal, o flutter e a fibrilação atrial. ESPIROMETRIA Exame mandatório na avaliação de um paciente com suspeita de DPOC. Utilizamos como critério diagnóstico para DPOC uma relação VEF1/CVF < 70% do previsto sem alteração significativa após a prova broncodilatadora. Esse achado corrobora para a existência de uma obstrução fixa das vias aéreas. O VEF1 deve ser acompanhado de foma seriada no paciente com DPOC a fim de quantificar o grau de obstruçãoe demonstrar a evolução da doença. TOMOGRAFIA DE TÓRAX É considerada atualmente o exame definitivo para o estabelecimento de enfisema nos pacientes com DPOC, determinando ainda sua extensão e localização. Isso pouco muda a conduta na prática, mas pode ser útil para avaliação dos pacientes candidatos à terapia cirúrgica da DPOC. EXARCEBAÇÃO Qualquer insulto sobre o aparelho respiratório pode descompensar esses pacientes, pois eles possuem baixa reserva pulmonar. O principal fator para descompensação é a infecção respiratória, bacteriana ou viral, sinusites, bronquites, pneumonias...Outros fatores desencadeantes importantes são a hiperatividade brônquica (broncoespasmo), drogas depressoras do centro respiratório, insuficiência cardíaca, TEP e pneumotórax. TRATAMENTO O tratamento de pacientes com DPOC depende principalmente da cessação do tabagismo. O tratamento farmacológico será sintomático e tem como bases: · Beta-2-agonista de longa duração · Anticolinérgicos · Corticoides inalatórios · Vacinação: Para prevenção de exarcebações. Primeiramente, é preciso classificar o paciente a partir de escores como o mMRC e o CAT. A partir da sua pontuação nesses dois escores e na quantidade de exarcebações anuais que ele apresenta indicaremos o tratamento: image4.png image5.png image6.png image7.png image1.png image2.emf image3.png