Prévia do material em texto
Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 1 Ementa Estudo dos aspectos sintáticos, semânticos e pragmáticos da frase em língua portuguesa: elementos constitutivos, relações e processos de construção, estrutura informacional. Objetivo: Introduzir o estudo da sintaxe da Língua Portuguesa, em nível da frase, estabelecendo relação entre gramática normativa e teoria linguística. Referências bibliográficas AZEREDO, J.C. de. Fundamentos de Gramática do Português. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000. BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa. 37ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009. CUNHA, Celso; CINTRA, Lindley. Nova gramática do português contemporâneo. 3ª ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001. DIAS, Luiz Francisco. A sintaxe em novas dimensões. In.: STUMPF, C. T. (org.) Questões de lingüística. Passo Fundo: UPF editora, 2003, p. 57-69. GARCIA, O. M. Comunicação em Prosa Moderna. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1996. GIVÓN, T. Syntax. VI. Amsterdam/Philadelphia: John Benjamins Publishing, 2001. ILARI, R. Perspectiva funcional da frase portuguesa. 2ª ed., Campinas: Editora da Unicamp, 1992. KEHDI, Valter. A sintaxe em Mattoso Câmara. D.E.L.T.A, Vol. 20, São Paulo, 2004. MATTOSO CÂMARA Jr., J. Princípios de Lingüística Geral. Rio de Janeiro: Padrão, 1985. NEVES, Maria Helena de Moura (org.). Gramática do Português Falado. Vol. VII: novos estudos. Campinas: Editora da Unicamp, 1999. . Texto e gramática. São Paulo: Contexto, 2007. PONTES, E. O Tópico no Português do Brasil. São Paulo: Pontes, 1987. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 2 TRASK, R. L. Dicionário de Linguagem e Lingüística. São Paulo: Contexto, 2004. Bibliografia complementar AZEVEDO, José Carlos de. 1990. Iniciação à Sintaxe do Português. 3ª ed. Rio de Janeiro, Zahar. MATTOS E SILVA, Rosa Virgínia. Tradição Gramatical Tradicional. São Paulo: Contexto, 1996. PERINI, Mário. Para uma Nova Gramática do Português. 8ª ed. São Paulo: Ática, 1995 a . Gramática Descritiva do Português. São Paulo: Ática, 1995 b. TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática e Interação: uma proposta para o ensino de gramática no 1º e 2º graus. 3ª ed. São Paulo: Cortez, 1999. Atividades ATIVIDADE 1 Pesquise em jornais e/ou revistas 5 (cinco) frases que apresentem estruturas diferentes entre si. ATIVIDADE 2 Apresente 5 (cinco) frases, identificando seus sintagmas constituintes. ATIVIDADE 3 Após ter estudado as funções sintáticas que compõem os termos essenciais, integrantes e acessórios da oração, na perspectiva da gramática tradicional, vamos pesquisar outra possibilidade de abordagem, ainda numa perspectiva da gramática. Para tanto, a turma deve dividir-se em três grupos. Cada grupo ficará responsável em pesquisar a abordagem dada pelo gramático Evanildo Bechara (2009), em sua Moderna Gramática da Língua Portuguesa, a um dos termos da oração. Ou seja, um grupo vai verificar como esse gramático aborda os termos essenciais da oração, isto é, o sujeito e o predicado, outro os termos integrantes e assim por diante. Após a pesquisa, cada grupo deverá estabelecer relações com a abordagem trabalhada no material conteúdo, fazendo comparações e discutindo, num fórum de Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 3 interação específico, com os outros grupos o que diferencia a abordagem de Bechara da abordagem da gramática tradicional. ATIVIDADE 4 Retome as questões propostas sobre o poema “E agora, José?”, de Carlos Drummond de Andrade e, após a leitura do item 3.2 (outras abordagens), procure refletir sobre as questões propostas acerca desse texto, estabelecendo relações entre a estrutura gramatical e a produção de sentido. Para demonstrar o resultado da sua reflexão, produza um texto em que você responda a esses questionamentos, expondo o seu posicionamento acerca do poema. A seguir, poste-o no fórum e discuta com os seus colegas os argumentos apresentados por cada um para defender os seus posicionamentos. ATIVIDADE 5 Pesquise em jornais e revistas 5(cinco) exemplos de orações em que o referente não está explicitado na organização linguística da oração. Apresente seus exemplos no fórum de interação e, a seguir, baseado(a) na discussão que estabelecemos na seção 3.2, discuta com seus colegas o que determina a referenciação dos exemplos apresentados pela turma, justificando porque a gramática tradicional não explica esses funcionamentos na língua. ATIVIDADE 6 Pesquise em jornais e revistas 2 (dois) exemplos de orações coordenadas, 2 (dois) de orações subordinadas substantivas, 2 (dois) de orações subordinadas adjetivas e 2 (dois) de orações subordinadas adverbiais. A seguir, classifique-as de acordo com a perspectiva da gramática tradicional. Após, apresente seus exemplos com as respectivas classificações no fórum de interação. Mas sua tarefa não termina ai. Apresentados os exemplos, reflita, baseado(a) na discussão que estabelecemos na seção 4.2, sobre essa classificação, discutindo se a nomenclatura apresentada pela gramática tradicional é pertinente ou não, e por que. ATIVIDADE 7 Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 4 Sumário Palavras iniciais 1. A Frase 1.1 Tipos de Frases 1.1.1 Frase Declarativa 1.1.2 Frase Exclamativa 1.1.3 Frase Interrogativa 1.1.4 Frase Imperativa 2. O sintagma 2.1 Sintagma nominal 2.2 Sintagma verbal 2.3 Razões para adoção do conceito de sintagma 3. A Oração 3.1 A abordagem da gramática tradicional 3.1.1 Os termos essenciais da oração 3.1.2 Os termos integrantes da oração 3.1.3 Os termos acessórios da oração 3.2 Outras abordagens 4. Construções Coordenadas e Subordinadas 4.1 A abordagem da gramática tradicional 4.1.1 Orações Coordenadas 4.1.2 Orações Subordinadas 4.1.3 Orações Reduzidas 4.2 Outras abordagens 5. Aspectos da Topicalização Observe e recolha dados com estruturas topicalizadas na língua falada e escrita. Encontre pelo menos cinco estruturas em cada modalidade. Identifique sintaticamente os constituintes topicalizados e analise/discuta os prováveis propósitos (intenções) da topicalização. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 5 Palavras iniciais DIK, 2000 DIAS, 2003 As citações acima, de dois lingüistas, um americano e outro brasileiro, resumem e nos fazem refletir sobre o objetivo da nossa disciplina, que é introduzir o estudo da sintaxe da Língua Portuguesa, em nível da frase, estabelecendo relação entre gramática normativa e teoria linguística. Em outras palavras, tais citações nos mostram que o estudo da língua não se resume ao estudo da gramática, tampouco a língua pode ser considerada simplesmente um sistema de signos, em que sintagmas se articulam. Ela é, essencialmente, como diz Dik, instrumento de interação social. Para cumprir com esse objetivo principal, do qual desdobram-se outros, apresentamos a abordagem dada pela gramática tradicional ao estudo da frase, relacionando-a com algumas abordagens linguísticas para mostrar que a gramática não dá conta de explicar os aspectos pragmáticos e enunciativos da língua, os quais, necessariamente, vão envolver o sujeito falante. Assim, o estudo da sintaxe da frase não envolve somente a organização lingüística dos elementos da língua no nível da oração, mas também os efeitos, as intenções que essa organização suscita em termos de produção de sentido. ... a perspectiva segundo a qual unidades se organizam em núcleos organicamente comunicativas entre falantes e ouvintes... ... uma língua é concebida, em primeiro lugar, como um instrumento de interação social entre seres humanos, usada com o objetivoprimário de estabelecer relações estruturados é apenas o ponto de partida de um estudo de língua na área da gramática. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 6 Tais conhecimentos são de fundamental importância ao futuro professor de Língua Portuguesa, para que ele não torne suas aulas um espaço de “decoreba”, em que o tempo é utilizado para fazer exercícios de classificações dos diferentes tipos de orações e suas funções sintáticas. De posse da reflexão linguística proposta acerca da sintaxe da língua, o professor deve sim transformar sua aula de português em um espaço prazeroso, em que o aluno possa refletir sobre os fenômenos de sua língua em uso, percebendo a sua dinamicidade e heterogeneidade. 1. A Frase A motivação da existência de línguas naturais é a necessidade fundamental dos homens – seres sociais – se comunicarem entre si. Para que a comunicação se processe de maneira eficaz e largamente suficiente, as línguas particulares funcionam como organismos, apresentando ordem interna e estruturando a produção de enunciados dotados de significação. ENUNCIADOS “Um fragmento de fala específico, produzido por um indivíduo específico numa ocasião específica. Em lingüística uma sentença é um objeto lingüístico abstrato que constitui uma parte do conjunto de recursos expressivos de uma determinada língua. Portanto, quando falamos, não produzimos propriamente sentenças: produzimos, sim, enunciados. Um enunciado é um fragmento de fala marcado de algum modo como unidade; por meio de pausas e pela entonação” (TRASK, 2004). Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 7 As relações de sentido e os conteúdos expressos através da linguagem verbal ocorrem necessariamente por meio da articulação dos níveis formais constitutivos da língua: As unidades vocabulares, vistas em separado, ou seja, deslocadas do contexto efetivo da comunicação, fornecem sua informação semântica, morfológica e sintática e se agrupam em classes lexicais ou funcionais. Essas classes correspondem ao que se conhece como “classes de palavras”. Quando as classes de palavras (substantivo, adjetivo, verbo, advérbio, pronome, numeral, conjunção preposição, artigo e interjeição – as 10 tradicionalmente consideradas no caso do português) se combinam, formam-se as estruturas sintáticas. A íntima relação que existe entre a construção das formas vocabulares e a sua combinação no encadeamento sintático é atualizada na fala, a partir de diferentes propósitos comunicativos que se codificam nas formas sintáticas. Essas são variadas, pois servem a diferentes fins semântico-funcionais para o processamento da informação no encadeamento da fala. Em face das construções sintáticas, logo nos deparamos com uma unidade de informação lingüística válida em si, a frase. Essa se dá no âmbito da comunicação, e, do ponto de vista estrutural, não requer complexidade em nível da sintaxe. Ela pode corresponder a diferentes tipos de construções sintáticas ou, até mesmo, a palavras isoladas. Considerando essa peculiaridade da frase, muitas definições propostas para ela se pautam em argumento semântico, validando seu caráter de informacional, ou seja, sua natureza enunciativa. Seguindo essa perspectiva, trazemos a definição de Cunha (1972), quem apresenta a frase como fonológico, de um lado, e morfológico e sintático, de outro. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 8 Na mesma direção Cegalla (1998) refere a frase como sendo Enquanto para Garcia (1996), Como percebemos, Garcia considera que a frase pode ser tratada em um nível semântico ou em um nível fônico, mas restringe sua aplicação (a do autor) ao plano semântico. Ultrapassando explicitamente os conceitos apresentados acima, Mattoso Câmara (1989) assume para a definição da frase seu condicionamento ao contexto situacional em que ela se dá. Para o autor, a frase, então, é assim definida: enunciações de sentido completo, as verdadeiras unidades da fala e das quais nos servimos quando expressamos nossos pensamentos e sentimentos. queremos ou sentimos. Pode revestir as mais variadas formas, desde a simples palavra até o expressar um juízo, indicar uma ação, estado ou fenômeno, transmitir um apelo, uma ordem uma palavra, ou conjunto de palavras, que para a comunicação linguística, feita em dado momento, não depende de outras palavras anteriores ou seguintes...o que dá a uma enunciação o caráter de unidade frasal... é trazer ela em si ‘um propósito definido’ da parte de quem a emprega. ou exteriorizar emoções. Frase é todo enunciado suficiente por si mesmo para estabelecer comunicação. Pode período complexo, elaborado segundo os padrões sintáticos do idioma. todo enunciado capaz de transmitir, a quem nos ouve ou lê, tudo o que pensamos, Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 9 De acordo com esse último autor, a frase só pode ser definida quando se considera sua ocorrência efetiva. Ela se estabelece com a manifestação lingüística que corresponde a um “um propósito definido” da parte do sujeito da comunicação. Mattoso Câmara também salienta o fato de a frase constituir uma independência comunicativa, constituindo uma unidade frasal que não decorre de uma seqüência textual prévia ou seguinte. Além disso, em sua constituição, a frase pode ser formada por apenas uma palavra ou por um conjunto de palavras. Vê-se claramente que a definição de Mattoso, comparativamente às demais definições dadas, nos traz para a reflexão que particulariza a frase enquanto uma unidade enunciativa e não apenas como uma construção semanticamente independente. Assim, como exemplifica aquele estudioso, uma palavra como “fogo”, apenas produzida isoladamente, não traz em si um propósito definido. Por outro lado, se um falante, ao perceber o indício de um incêndio, queira fazer um alerta, irá produzir a mesma palavra (“fogo”) com uma entoação característica para esse fim comunicativo (“fogo!!!”). Devido a isso, os ouvintes irão captar o propósito comunicativo do falante e tomar as providências pertinentes à situação contextual, ou seja, sair rapidamente do local onde se encontram. Esse quadro particulariza a produção da palavra “fogo”, que ganha um status reconhecido como unidade frasal ou frase. 1.1 Tipos de frase As frases produzidas na comunicação se apresentam em realizações isoladas ou em seqüências de unidades de informação circunstanciadas no evento da fala. Azeredo (2000) relembra que a frase pode se manifestar diferentemente nas modalidades falada e escrita da língua. Como diz o autor, na fala, as frases “tendem à fragmentação, tornando-se formalmente incompletas, sem que, entretanto, a compreensão fique prejudicada”. Já na escrita, devido às condições de produção naturais a essa modalidade da língua, a frase se insere (ou corresponde) em um texto mais planejado, no qual a organização gramatical é mais controlada e elaborada pelo sujeito que a produz, sem as fragmentações típicas da fala. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 10 As frases realizadas na fala são chamadas de frases de situação, enquanto que as frases produzidas na escrita constituem os períodos. Cada frase enunciada reflete um propósito comunicativo de seu produtor. O contexto de produção e a intenção comunicativa do enunciador da frase estão presentes quando a frase é realizada, tanto em sua estrutura, quanto na entoação que ela recebe. Em particular, a entoação cumpre um importante papel na manifestação da frase. O recurso da entoação – sendo essa básica, natural e, portanto, constitutiva da língua falada – é muitoutilizado para diferenciar tipos de frases gramaticalmente relevantes nas línguas particulares. Esse recurso é tão amplamente utilizado por línguas distintas e não-aparentadas entre si que pode ser considerado universal. E, como podemos facilmente deduzir, esse fenômeno também ocorre no português. Através de diferentes entoações, o enunciador manifesta sua intenção de se comunicar, construindo frases conhecidas como declarativas, imperativas, exclamativas ou interrogativas. Dessa maneira, a partir de uma mesma construção formal (expressão sintática), como “Você quer água”, podemos formar frases distintas, quando enunciadas com entoações diferentes: Em português, tradicionalmente, são reconhecidos pelo menos os quatro maiores tipos de frases, os quais seguem apresentados abaixo. Estas frases serão tratadas individualmente nas seções subseqüentes. Os tipos maiores de frases do Português: Frase Declarativa Frase Exclamativa Frase Interrogativa Frase Imperativa Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 11 Além disso, do ponto de vista de sua constituição, é importante ressaltar que as frases podem apresentar extensões variáveis, uma vez que elas não têm uma dependência estrutural, ou seja, não requerem ou se condicionam a um tipo de construção sintática específica. Dessa sorte, uma frase pode corresponder a expressões lingüísticas diversas, como, por exemplo, uma oração simples, um período complexo ou mesmo um simples vocábulo. A restrição para a existência da frase é que a mesma represente uma expressão que tenha um valor enunciativo. Por essa razão, em uma situação de perigo, um enunciado como Corra!!, que é constituído por apenas um vocábulo, é também uma frase. Nas subseções a seguir apresentamos os tipos de frases do português. 1.1.1 Frase Declarativa As frases declarativas podem ser afirmativas ou negativas. Em geral, elas são consideradas como mais referenciadoras , pois servem largamente ao relato de informação. Muitas vezes, inclusive, o próprio falante sequer participa ou faz parte do conteúdo informacional enunciado. A seguir, há exemplos de declarativas afirmativas e negativas: AFIRMATIVA A criança encontrou o amigo da escola no parque. NEGATIVA A criança não encontrou o amigo da escola no parque. REFERÊNCIA O conceito de “referência” diz respeito à “relação entre a expressão linguística e alguma coisa que ela seleciona no mundo real ou conceitual” (TRASK, 2004). Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 12 Como está explicito nas frases acima, apenas a presença ou ausência do vocábulo negativo “não”, na estrutura frasal, poderá diferenciar os subtipos de declarativas. Nessas frases, independentemente de serem afirmativas ou negativas, o que mais as caracteriza é o fato de elas “teoricamente” serem mais neutras , pois não trazem explicitamente as intenções subjetivas do falante. 1.1.2 Frase Exclamativa As frases exclamativas se diferenciam das declarativas por expressarem a emoção do falante acerca do conteúdo veiculado pela frase. Essa emoção presente revela a natureza subjetiva do falante, que pode ser bastante variada. Os dados abaixo podem corresponder a diferentes estados emocionais do falante, resultando em exclamativas semanticamente distintas: PRAGMÁTICA Pragmática: “O ramo da linguística que estuda como os enunciados comunicam significados num contexto. O estudo do significado, comumente conhecido como semântica, tem sido por muito tempo uma das áreas mais difíceis e desanimadoras dos estudos linguísticos. Nas décadas de 1950 e 1960, porém, os lingüistas e os filósofos começaram a dar-se conta, aos poucos, de que a dificuldade era o resultado do fato de que eles não tinham sido capazes de distinguir dois aspectos bastante diferentes do significado. O primeiro tipo de significado é intrínseco a uma expressão que o contém, e não pode ser separado dessa expressão. O estudo desse tipo de significado é o domínio da semântica, no sentido que damos hoje a esse termo. Além disso há o segundo tipo de significado, que não é intrínseco à expressão lingüística que o veicula, e resulta da interação entre a expressão lingüística e o contexto em que é usada. Ao estudo desse tipo de sentido damos um novo nome: pragmática”. (TRASK, 2004). Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 13 1.1.3 Frase Interrogativa As frases interrogativas, assim como qualquer tipo de frase, são caracterizadas pela entoação. Diferentemente das frases declarativas, que podem ser consideradas como menos marcadas na fala pelo fato de constituírem a base maior de qualquer expressão discursiva, ou seja, de serem mais freqüentes em qualquer extrato de texto comunicativo, as frases interrogativas resultam do tipo de interação entre falante e ouvinte, através do qual o primeiro requer/solicita/pede alguma informação do segundo. Apesar de constituir um dado discurso, como as demais frases, e, em particular, como as declarativas aqui tomadas em contraste com as interrogativas, essas se realizam estritamente em diálogos (concretos ou potenciais, imaginados), refletindo o momento conversacional da comunicação, sendo numericamente muito menos ocorrentes do que as declarativas, quando se considera a expressão espontânea e variada de toda a manifestação lingüística. Em outras palavras, através de construções interrogativas, o falante expressa sua intenção de obter uma informação (de causa, razão, finalidade, etc), o desejo de alcançar uma resposta a sua indagação ou questionamento. Com sua curva entoacional peculiar, as frases interrogativas podem apresentar estruturação sintática idêntica a outros tipos de frases. Por exemplo, em a diferença se dá unicamente através da entoação. Em outros casos, frases interrogativas se caracterizam por apresentar estruturação sintática peculiar. Em tais casos, as frases do tipo pergunta portam as conhecidas “expressões interrogativas”, que seguem em negrito nos exemplos abaixo: – Os livros estão na estante? e – Os livros estão na estante., Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 14 – Por que você não veio à festa? – Quem está aí? – Qual é o seu time? – O que vamos comer? – Como resolveremos o problema? – Quando será a prova? Essas frases acima, que trazem em sua estrutura expressões interrogativas, solicitam informações que não se encontram na própria estrutura frasal. Do ponto de vista estritamente lingüístico, o enunciador requer um dado ainda não sabido, ou seja, uma informação nova. Ao se considerar apenas o conteúdo da informação veiculado pela frase e codificado nas formas lingüísticas presentes no enunciado, vê-se que tais frases não dão margem à suposição/previsão de suas respostas, uma vez que o foco da informação requerida não está explicitamente presente na frase. Com isso está-se dizendo que apenas diante da superfície lingüística que constitui a pergunta “Quem vai levá- la?” não se pode inferir sua resposta. Por essa razão, a frases interrogativas formadas com expressões interrogativas não se pode dar respostas do tipo “sim” / “não”, tal como pode ser confirmado abaixo: – Por que chegou tarde? * – Sim. * – Não. – Quem comeu meu bolo? * – Sim. * – Não. – Para onde foram viajar? * – Sim. * – Não. – Para que comprou esse instrumento? * – Sim. * – Não. – O que quer agora? * – Sim. * – Não. – Quando João terminará seus estudos? * – Sim. * – Não. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 15 As respostas “sim” / “não”, por seu turno, são típicas das frases interrogativas formadas pela entoação – curva entoacional– interrogativa. Nesse caso, essas respostas são compatíveis pelo fato de a frase interrogativa entoacional trazer, em sua superfície estrutural, o foco de sua resposta. Para melhor reter a explicação, compare, portanto, as perguntas abaixo com as fornecidas acima: – Você chegou tarde porque veio de ônibus? – Sim. – Não. – Você comeu meu bolo? – Sim. – Não. – Eles viajaram para o sertão? – Sim. – Não. – Você comprou esse instrumento para a banda? – Sim. – Não. – Quer sair agora? – Sim. – Não. – João terminará seus estudos neste ano? – Sim. – Não. ASTERISCO A presença do asterisco significa que a expressão lingüística não é aceitável. Nesse caso, diz que as respostas não são válidas à pergunta efetuada. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 16 1.1.4 Frase Imperativa Com frases imperativas o falante impõe uma atitude ao seu ouvinte/destinatário. Quanto à estrutura da frase, o recurso básico para a construção da imperativa é o uso do verbo na forma imperativa. A ordem dada através da frase imperativa tem uma força ilocucionária variada. Podem as frases imperativas partir de um simples e moderado pedido até alcançar uma ordem categórica e inegociável. Nessa modulação variada encontra-se correspondentemente entoação ou força de expressão imperativa também variada. Assim como a frase interrogativa, e diferente da frase declarativa, a frase imperativa resulta da tentativa de o falante provocar alguma reação do ouvinte. 2. O Sintagma Como foi visto na seção anterior, a frase pode ser entendida como unidade mínima da comunicação ou discurso. Ao se observar a constituição interna das frases complexas, as quais são estruturadas sintaticamente, diferentes das frases simples que são reduzidas a vocábulos, podem-se encontrar seqüências lingüísticas que integram as unidades de comunicação ou mesmo coincidem com elas formalmente, sem, entretanto, apresentar a mesma função. Essas estruturas que integram a frase são unidades que apresentam função sintática e não comunicativa. Elas são conhecidas como sintagmas. O sintagma é uma unidade gramatical que “é tipicamente, mas não invariavelmente, composta por duas palavras” (TRASK, 2004). De acordo com Trask, Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 17 Assim entende-se que há diferentes tipos de . Cada um decorre da identificação de uma dada seqüência constitutiva de uma unidade sintática maior, a oração (ver seção 3). Como todo sintagma porta um núcleo, e esse, por sua vez, corresponde a uma unidade vocabular, pode- se dizer que em uma dada língua encontrar-se-ão tipos de sintagmas correspondentes a maioria das classes de palavras existentes nessa língua. Assim, em uma língua como o português, tem-se o sintagma nominal, com núcleo substantivo (exemplo: essa cidade); o sintagma verbal, com núcleo verbal (exemplo: era antigamente um lugar bom para se viver); o sintagma adverbial, com núcleo adverbial (exemplo: antigamente); o sintagma adjetival, com núcleo adjetivo (exemplo: bom para se viver); (exemplo: e o sintagma preposicional (exemplo: para se viver). Todo sintagma é construído em torno de um núcleo, um item, geralmente uma única uma única palavra consiste num núcleo ao qual não foram acrescentados outros materiais. PALAVRAS Sintagmas podem também ser formados por uma palavra apenas, como em João partiu, em que João e partiu são os sintagmas nominal e verbal respectivamente, sendo cada um constituído por uma palavra. SINTAGMAS O termo “sintagma” é empregado como o equivalente a “phrase” do inglês. Para maiores considerações sobre o conceito de sintagma deve-se verificar a teoria gramatical que está sendo utilizada. Em geral, o termo está relacionado à Teoria da Regência e da Ligação. Nesta disciplina, entretanto, o uso do termo não visa a implicações teóricas maiores, sendo o seu propósito o de introduzir a distinção entre a frase e o enunciado, enquanto unidades do discurso e o sintagma e a oração, enquanto unidades formais da sintaxe. palavra, que é responsável por determinar que tipo de sintagma será o todo. O sintagma de Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 18 Para o estudo da sintaxe do português, podem ser considerados essas cinco classes de sintagmas, abaixo elencadas: Dessas classes, a única que não tem em seu núcleo a própria palavra que o caracteriza é o Sintagma Preposicional, uma vez que não pode ser formado apenas pela preposição. Isso se explica pelo fato de as classes de palavras maiores (substantivo, adjetivo, verbo e advérbio) serem exatamente aquelas denominadas lexicais, cujos membros podem ocupar a posição nuclear na unidade sintática. Já a preposição constitui uma classe fechada, não- lexical, que estabelece relação entre as unidades lexicais, não exprimindo, dessa forma, o conteúdo nocional básico da unidade gramatical sintagmática. Abaixo seguem exemplos que demonstram esse fato: O cantor famoso chegou cedo com sua banda SN SAdj SV S Adv Sprep Aqui está o colar de pérola SAdv SV SN Sprep Como se observa, diante dos SPreps “com sua banda” e “de pérola”, não se pode considerar que os respectivos núcleos sejam as proposições “com” e “de”. Basicamente, sintagmas preposicionais são aqueles iniciados por uma preposição. Vistos dessa forma, entendemos que os sintagmas são definidos nos planos morfológico e funcional. No plano morfológico, cada um é designado pelo nome de seu vocábulo (nuclear, exceto para o preposicional) e, no plano sintático (ou funcional), cada um ocupa um lugar de função sintática na oração. No caso dos sintagmas preposicionais, Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 19 AZEREDO, 2000. Além disso, cumpre dizer que dos tipos sintagmáticos os maiores serão o nominal e o verbal, cujos núcleos são as palavras que constituem as duas classes abertas maiores de qualquer língua: o nome (ou substantivo) e o verbo. A noção de sintagma é relevante para a análise da estrutura da oração, uma vez que essa é formada basicamente por um sintagma nominal (SN) sujeito e um sintagma verbal (SV) predicado. Considerando a estrutura oracional, o sintagma pode ser identificado através da verificação de duas características que o definem: enquanto unidade gramatical (conferir definição acima), o sintagma pode ser deslocado e/ou substituído na oração. Sendo assim, em O aluno entregou a prova em branco. encontram-se dois sintagmas maiores: O aluno (SN - sujeito) entregou a prova em branco (SV - predicado). O núcleo do SN é o substantivo “aluno” e o do SV é o verbo transitivo “entregar”. O complemento do verbo é outro SN (“a prova”). “em branco” é o SPrep. Dito isso, podemos voltar às propriedades dos sintagmas a fim de considerarmos as suas possibilidades de eles se formam regularmente na língua para as mesmas funções dos sintagmas adjetivais e dos sintagmas adverbiais. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 20 DESLOCAMENTO e SUBSTITUIÇÃO Retomando os sintagmas identificados em O aluno entregou a prova em branco, temos (SN) O aluno (SV) entregou (SN) a prova (SPrep) em branco. A partir de então, facilmente, podemos proceder ao deslocamento e/ou substituição dos mesmos por sintagmas estruturalmente equivalentes: DESLOCAMENTO do SN “o aluno” SUBSTITUIÇÃO do SN “o aluno” O aluno entregou a prova em branco Esse jovem A moça Aquele aprendiz, etc. Entregou, o aluno, a prova em branco ou Entregou a prova, o aluno, em branco ou Entregou a provaem branco, o aluno ou O aluno entregou a prova em branco Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 21 Vejamos aqui que não se deve entender que a substituição em si é um atributo único do sintagma, pois podemos também substituir as unidades vocabulares que formas os sintagmas, sem os substituir integralmente. Abaixo, encontramos a substituição ou só do determinante “o” ou do núcleo nominal “aluno” : O aluno entregou a prova em branco Esse aluno O jovem O que de fato importa quanto à substituição do sintagma é o fato de ela poder ocorrer envolvendo todo o sintagma. Tal fato o confirma enquanto unidade gramatical. Essa mesma lógica deve ser aplicada à propriedade do deslocamento, que ocorre necessariamente envolvendo todo o sintagma. Essa é uma restrição gramatical válida para o deslocamento. Por essa razão, considerando “O aluno entregou a prova em branco”, o deslocamento dos SNs nas construções abaixo é agramatical. Por fim, consideremos que todo o deslocamento e a substituição dão-se por meio de requerimento semântico. Com isso estamos dizendo que as escolhas, nos dois casos, ocorrem de acordo com o conhecimento que o falante tem do sistema lingüístico, o que implica a adequação semântica nas estruturas que estabelecem relação em nível da sintaxe. SUBSTITUIÇÃO Do ponto de vista da construção semântica, entendemos que, de fato, a substituição de qualquer parte do sintagma equivale a sua substituição como um todo. *O entregou aluno a prova em branco *Entregou a prova em o aluno branco A o aluno entregou prova em branco Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 22 2.1 Sintagma Nominal Trata-se da unidade gramatical que pode ocupar o lugar de sujeito ou de objeto da oração. Como tal, pode apresentar dimensão bastante variada: Os sujeitos e os objetos, nas frases acima correspondem às seqüências que se encontram em negrito. Nesses exemplos, podemos verificar que essas seqüências apresentam diferentes tamanhos e ao mesmo tempo são definidas como sintagmas nominais exatamente porque exercem a função sintática de sujeito e objeto. No interior desses diferentes SNs podemos identificar outros sintagmas que os constituem. Por isso, podemos analisar o SN sujeito como segue SN [Os bandidos SAdj [aprisionados SPrep [na maior casa SPrep [de detenção SPrep [do país]]]] Os colchetes servem para delimitar os sintagmas. Os sintagmas menores são dependentes estruturais dos maiores, nos quais estão inseridos. Joana viu Francisco. Ela encontrou-a A criança encontrou sua mãe. O jogo de futebol poderá arrecadar muito dinheiro. O grupo de teatro amador estreou uma peça infantil. Os bandidos aprisionados na maior casa de detenção do país recebem as visitas de seus parentes. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 23 2.2 Sintagma Verbal O sintagma verbal é a unidade gramatical na oração que é nucleada por um verbo. O SV pode ser formado opcionalmente por outros elementos a ele intimamente relacionados. Do ponto de vista de sua função, ele comumente desempenha o papel de predicado. Em orações que têm verbos auxiliares, podemos considerar a existência de dois SVs: SV SN Maria dormiu Maria [dormiu] SV SN A irmã caçula ganhou uma viagem para Roma A irmã caçula [ganhou uma viagem para Roma] SV SN O jogador fez um gol contra O jogador [fez um gol contra] Maria estava fazendo o bolo de milho Maria [estava [fazendo o bolo de milho]] A roupa foi emprestada a minha irmã A roupa [foi [emprestada a minha irmã]] A criança tinha encontrado uma bola no parque A criança [tinha [encontrado uma bola no parque]] Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 24 Em outros casos, entretanto, o sintagma verbal não funciona como predicado. Isso ocorre quando o verbo se encontra nas formas não-finitas, também conhecidas como formas nominais, conforme vemos a seguir: 2.3 Razões para a Adoção do Conceito de Sintagma Quando tentamos entender como se dá a construção de orações, logo verificamos a existência de unidades menores que as constituem. A classificação dessas unidades menores, conhecidas como unidades sintagmáticas, favorece o entendimento de como essas unidades se ordenam, ou seja, como estão condicionadas entre si, e como serão atualizadas na fala (ou na escrita), através da expressão lingüística. Em outras palavras, estamos dizendo que o estudo das unidades gramaticais sintagmáticas permite o alcance uma descrição adequada das estruturas sintáticas que se formam a partir dessas: as orações simples. E assim, procedendo a essa verificação, podemos avançar nossa análise, descobrindo como elas – as orações – pro sua vez se agrupam para a construção de estruturas ainda maiores: os períodos compostos. Dormir cedo faz bem à saúde [Dormir cedo] faz bem à saúde Fazendo regime durante três meses, João perdeu quatro quilos [Fazendo regime durante três meses], João perdeu quatro quilos Desviar da meta é perder o foco da vitória [Desviar da meta] é perder o foco da vitória Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 25 Essa descoberta estrutural está, sobretudo, centrada na FORMA. Entretanto, é importante salientar que o nosso foco, assim como o nosso alvo, não é a forma em si e por si mesma. É oportuno trabalhar explicitamente as unidades sintagmáticas – as menores unidades de constituição oracional – para melhor entender como nossas idéias se organizam sistemática e significativamente em seqüências não-aleatórias e de uma maneira hierárquica, a fim de conseguir, enquanto falantes, produzir enunciados aceitáveis gramaticalmente e adequados semanticamente. Assim, estaremos descobrindo a lógica de nossa gramática internalizada, bem como o funcionamento do que chamamos “língua falada”. O estudo do funcionamento dos sintagmas, em síntese, irá nos propiciar o entendimento das propriedades sintáticas da oração, as quais orientam nossas produções lingüísticas, na base de suas relações gramaticais: PROPRIEDADES SINTÁTICAS DA ORAÇÃO SIMPLES Constituição interna (sintagmas) Hierarquia entre os constituintes Classificação das partes constituintes Ordenamento linear dos constituintes (A partir de GIVÓN, 2001) Observando a construção da oração por esse caminho, podemos verificar a estrutura da oração abaixo, entendendo seu ordenamento linear, identificando suas unidades de constituição (sintagmas e vocábulos) e refletindo que a relação entre as subunidades e as unidades maiores define a hierarquia de sua estrutura , uma vez que podemos encontrar sintagmas que, em cadeia, são formados por outros sintagmas. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 26 Eu devolvi o livro certo para a biblioteca A jovem recebeu flores murchas do namorado ESTRUTURA A representação da estrutura da oração não corresponde ao modelo arbóreo da Lingüística Gerativa, e não traz implicação teórica adicional. A demonstração da estrutura que segue se restringe ao propósito didático de facilitar a visualização das propriedades da oração e da constituição e subdivisão das unidades sintagmáticas que a formam. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 27 3. A Oração Nesse capítulo, retomando o que você já estudou nos capítulos anteriores da nossa disciplina sobre os sintagmas verbal e nominal e os tipos de oração, vamos estudar as diferentes funções sintáticas da oração. Na tradição gramatical, o termo oração é empregado para designar uma unidade gramatical formada por um sujeito e um predicado.A oração está na base da constituição do período. Esse, por sua vez, será simples quanto for formado por uma oração apenas ou composto quando em sua estrutura contiver mais de uma oração. O período composto pode ser formado por coordenação (ver seção 4), quando as duas ou mais orações que o compõem possuem independência semântica entre si, ou subordinação (ver seção 5), quando as orações que o compõem não possuem essa independência semântica. Ao contrário, há uma dependência não só semântica, mas também sintática em termos de organização das orações no período. Por isso, podemos afirmar que as implicações semânticas e funcionais que se estabelecem entre as orações definem as relações gramaticais que entre elas se estabelecem. As relações gramaticais, pensando nas funções sintáticas da oração, são assim divididas: termos essenciais (sujeito e predicado), termos integrantes (complemento nominal e complementos verbais) e termos acessórios da oração (adjunto adnominal, adjunto adverbial, aposto e vocativo). São tantos os nomes que eles podem confundir a cabeça dos estudantes. Vejamos como Paulo Leminski (http://educacao.uol.com.br/planos-aula/ult3900u59.jhtm), no poema abaixo, brinca com essa classificação da gramática. O Assassino Era o Escriba Meu professor de análise sintática era o tipo do sujeito inexistente. Um pleonasmo, o principal predicado de sua vida, regular como um paradigma da 1ª conjugação. Entre uma oração subordinada e um adjunto adverbial, ele não tinha dúvidas: sempre achava um jeito assindético de nos torturar com um aposto. http://educacao.uol.com.br/planos-aula/ult3900u59.jhtm Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 28 Nesse poema, o que nos chama a atenção é o modo inteligente e bem humorado com que o autor trabalha as diferentes funções sintáticas da oração (sujeito inexistente, predicado, adjunto adverbial, aposto, agentes da passiva e objeto direto) e a classificação de algumas palavras (pronome, possessivo, artigo indefinito, conectivos) segundo a tradição gramatical brasileira, atribuindo a esses termos outros sentidos, diferentes daqueles previstos pela gramática. Há ambiguidade no uso desses termos? Que sentidos eles produzem? Casou com uma regência. Foi infeliz. Era possessivo como um pronome. E ela era bitransitiva. Tentou ir para os EUA. Não deu. Acharam um artigo indefinido na sua bagagem. A interjeição do bigode declinava partículas expletivas, conectivos e agentes da passiva o tempo todo. Um dia, matei-o com um objeto direto na cabeça. Reflita um pouco sobre isso. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 29 Depois dessa breve pausa, voltemos à nomenclatura já apresentada das principais funções sintáticas atribuídas à oração pela NGB (Norma Gramatical Brasileira). Para tanto, num primeiro momento, vamos apresentar uma classificação baseada numa perspectiva tradicional da gramática, tendo como obra norteadora a Gramática do português contemporâneo, de Cunha e Cintra (2001). Como essa nomenclatura é, muitas vezes, questionável, quando trabalhamos com a língua em uso, num segundo momento da nossa reflexão, vamos introduzir a possibilidade de outras abordagens, a partir de algumas perspectivas dos estudos lingüísticos sobre a língua em funcionamento. 3.1 A abordagem da gramática tradicional 3.1.1 Os termos essenciais da oração O sujeito e o são os termos essenciais da oração, o que significa dizer que, sem esses elementos, não há oração. Na oração 1) Flameguista encabeça lista de reforços do Palmeiras, (site do Terra - Notícias - acesso em: 17 jun. 2009) Flamenguista é o sujeito e encabeça lista de reforços do Palmeiras é o predicado da oração. SUJEITO e PREDICADO O sujeito é o ser sobre o qual se faz uma declaração; o predicado é tudo aquilo que se diz do sujeito. EXEMPLOS A partir daqui, os exemplos serão numerados, pois alguns deles serão retomados no item Outras abordagens. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 30 Os sujeitos de 3ª pessoa podem ter como núcleo um substantivo, os pronomes pessoais ele, ela, um pronome demonstrativo, relativo, interrogativo, ou indefinido, um numeral, uma palavra ou expressão substantivada, uma oração substantiva subjetiva. O SUJEITO classifica-se em: Simples - quando o sujeito tem um só núcleo, formado por um sintagma nominal (ver seção 2.1). 2) Alheio a polêmicas, Belluzzo garante Arena para Copa. (site do Terra – Notícias – acesso em: 17 jun. 2009) Composto- quando o sujeito possui mais de um núcleo. 3) Os repórteres Denise Menchen e Antonio Gois contaram que, pela segunda vez em dois anos, o desempenho dos bolsistas do ProUni ficou acima da média dos demais estudantes que prestaram o Provão. (Elio Gaspari, O globo, 17/06/2009) 4) Negros, pobres e homossexuais estão entre as principais vítimas de bullying (prática discriminatória de um grupo de alunos contra um determinado colega, que se caracteriza por agressões físicas, acusações injustas e humilhações) nas escolas públicas. (site do terra – Notícias – acesso em: 18 jun. 2009) Oculto - é aquele que não está materialmente expresso na oração, mas pode ser identificado pela desinência verbal e/ou pela presença do sujeito em outra oração do mesmo período ou do período seguinte. 5) Temos confiança que daqui cinco meses as obras começarão. (Declaração do presidente do Palmeiras sobre as obras do Palestra Itália para a copa de 2014. Disponível em: site do Terra – Notícias – acesso em: 17 jun. 2009) NEGRITO Os termos em negrito, nesse e nos próximos exemplos, sempre destacam, na oração, a função sintática que está sempre apresentada. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 31 6) O novo vestibular pode acelerar o amadurecimento dos jovens. E deixar a vida deles ainda mais divertida, até. (Revista Superinteressante, maio 2009) Sujeito indeterminado - quando o verbo não se refere a uma pessoa determinada, ou por se desconhecer quem executa a ação, ou por não haver interesse no seu conhecimento. 7) Acreditava-se que doenças venéreas e a dependência de álcool, nicotina e morfina degeneravam a espécie, gerando linhagens diferentes. (Revista Superinteressante, maio 2009) Oração sem sujeito - não devemos confundir o sujeito indeterminado (que existe, mas não se pode ou não se deseja identificar) com a inexistência do sujeito. Em orações como 8) Chove. 9) Anoiteceu. 10) Faz calor em Recife. o que interessa é o processo verbal em si, pois não o atribuímos a nenhum ser. Diz-se, então, que o verbo é impessoal; e o sujeito, inexistente. Já, o PREDICADO, conforme esses mesmos gramáticos (Cunha e Cintra, 2001), divide-se em: Predicado nominal - é formado por um verbo de mais um predicativo. Os verbos de ligação sempre expressam estado, o qual pode ser permanente, transitório, aparente, contínuo ou expressar uma mudança de estado. 11) Alguns filhos são ingratos com os seus pais. 12) Os filhos tornam-se ingratos com o tempo. Nos exemplos acima, a primeira oração indica um estado permanente, cujo núcleo do predicado é o sintagma adjetival ingratos, enquanto a segunda indica uma mudança de estado, cujo núcleo também é o sintagma adjetival ingratos. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 32 Predicado verbal - tem como núcleo um verbo significativo. Verbos significativos são aqueles que trazem uma idéia nova ao sujeito, podendo ser transitivos e intransitivos (a ação está centrada no verbo). 13) Joana acordou tarde. Ela não trabalha. As duas orações acima (13), embora semanticamente relacionadas entre si, são independentes do ponto devista sintático, já que cada uma apresenta os termos mínimos para constituir uma oração. Ambos os predicados (acordou tarde e não trabalha) são verbais, formados pelos verbos intransitivos acordar e trabalhar. Já, nas orações apresentadas abaixo, temos exemplos de predicados verbais, com verbos transitivos. 14) Mãe de Jackson pede guarda definitiva dos filhos do cantor. (site do Terra - Notícias - acesso em: 29 jun. 2009) 15) Investidores apostam em pagamentos via celular. (site do terra - Notícias - acesso em: 02 jul. 2009) No exemplo 14, o verbo pedir é transitivo direto e indireto, sendo guarda definitiva o objeto direto e dos filhos do cantor o objeto indireto (ver seção 3.2.1), os quais complementam o sentido do verbo. Já, no exemplo 15, o verbo apostar é transitivo indireto, sendo seu sentido complementado pelo objeto indireto pagamentos via celular. Voltaremos a esses exemplos na seção em que trataremos do complemento nominal. VERBO DE LIGAÇÃO Os principais verbos de ligação, segundo a gramática tradicional, são: Ser, estar, continuar, andar, parecer, permanecer e ficar. No entanto, é preciso ficar atento para o contexto em que a oração ocorre, para a intenção do falante, pois esses mesmos verbos também podem ocorrer em predicados verbais. Em exemplos como “Ando muito preocupado ultimamente”, “Andei quilômetros até chegar na rodoviária”, “Fiquei triste com a sua atitude” e “Fiquei em casa ontem”, a primeira e a terceira orações são formadas por predicados nominais, cujo núcleo é o nome (preocupado e triste) e não o verbo, enquanto a segunda e a quarta são formadas por predicados verbais, cujo núcleo é o verbo (andei e fiquei). Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 33 Predicado verbo-nominal - trata-se de um predicado misto, que possui dois núcleos significativos (um verbo e um nome), como em: 16) Prem Verma vive escondida. (Revista Superinteressante – julho 2009) Segundo Cunha e Cintra (2001), a análise da transitividade verbal é feita de acordo com o texto e não isoladamente, já que o mesmo verbo pode ser empregado ora como intransitivamente, ora como transitivamente, ora com objeto direto, ora com objeto indireto, conforme podemos verificar nos exemplos abaixo: 17) Joana acordou tarde hoje. (intransitivo) 18) Joana acorda os filhos todas as manhãs. (transitivo direto) 19) Joana escreve todos os dias. (intransitivo) 20) Joana escreve cartas de amor. (transitivo direto) 21) Joana escreve cartas de amor ao marido. (transitivo direto e indireto) 3.1.2 Os termos integrantes da oração Para a gramática tradicional, os termos integrantes da oração são os complementos nominal e verbais. Segundo Cunha e Cintra (2001), as palavras que se ligam por preposição a substantivos, adjetivos ou advérbios, completando o seu sentido, chamam-se complementos nominais. Já, as palavras que completam o sentido do verbo chamam-se complementos verbais. COMPLEMENTO NOMINAL O complemento pode ser representado por um substantivo, um pronome, um numeral, uma palavra ou expressão substantivada, uma oração completiva nominal. Ele vai integrar ou limitar o sentido da palavra que está complementando e é objeto dessa relação. Retomemos alguns exemplos: Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 34 Na oração 1) Flameguista encabeça lista de reforços do Palmeiras, do Palmeiras liga-se ao substantivo reforços, limitando e completando o seu sentido. Assim como, em 14) Mãe de Jackson pede guarda definitiva dos filhos do cantor, do cantor liga-se ao substantivo filhos, limitando e completando o seu sentido. Outros exemplos: 22) Você tem muitas chances de gastar e não pagar nada. Nesse slogan de uma promoção dos cartões caixa, as orações completivas nominais (ver seção 4.1.2) de gastar e não pagar nada funcionam como complemento nominal, limitando o sentido do substantivo chances, que funciona nesse período como objeto direto do verbo ter. 23) A crise dentro de nós: o valor não é dinheiro. (Manchete da revista Pais e Filhos, julho 2009) Na oração acima, de nós complementa o sentido do advérbio dentro. COMPLEMENTOS VERBAIS Os complementos verbais, como já foi dito, completam o sentido do verbo. São eles, segundo a gramática tradicional: COMPLEMENTO NOMINAL O complemento nominal pode estar integrando o sujeito, o predicativo, o objeto direto, o objeto indireto, o agente da passiva, o adjunto adverbial, o aposto e o vocativo. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 35 a) Objeto direto - é o complemento de um verbo transitivo direto e, normalmente, vem ligado ao verbo sem preposição, indicando o ser para o qual se dirige a ação (CUNHA e CINTRA, 2001). Pode ser representado por um substantivo, pronome, numeral, palavra ou expressão substantivada e uma oração substantiva (objetiva direta – ver seção 4.1.2). Retomemos alguns exemplos: 2) Alheio a polêmicas, Belluzzo garante Arena para Copa. 20) Joana escreve cartas de amor. (transitivo direto) Nesses exemplos, arena e cartas de amor funcionam como objetos diretos, complementando, respectivamente, o sentido dos verbos garantir e escrever. Outros exemplos: 24) Agaciel diz que assinatura em atos secretos foi falsificada. (site do Terra - Notícias - acesso em: 03 jul. 2009) No exemplo 24, a oração substantiva objetiva direta que assinatura em atos secretos foi falsificada exerce a função de objeto direto. 25) Dalits são considerados tão sujos, mas tão sujos, que ninguém de outras castas deve tocá- los. (Revista Superinteressante – julho 2009) b) Objeto indireto - é o complemento de um verbo transitivo indireto, ligando-se ao verbo por meio de preposição. Pode ser representado pelas mesmas classes de palavras que representam o objeto direto . OBJETO DIRETO e INDIRETO Cunha e Cintra (2001) ainda apresentam o objeto direto preposicionado e o objeto direto e indireto pleonástico. No entanto, optamos em não incluí-los nesse material por considerarmos que tais funções são raras na língua falada e até na língua escrita de uso cotidiano. Um exemplo trazido pelos autores de objeto direto preposicionado é a oração: A homem pobre ninguém roube. O caso dos objetos direto e indireto pleonástico, segundo esses autores, tem a função de realçar esses objetos na oração, por isso, eles são repetidos, como em: 1) Árvore, filho e livro, queria-os perfeitos (Vianna Moog) ; 2) A mim ensinou-me tudo (Fernando Pessoa). Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 36 26) Tudo lhe interessava: dissecou plantas para entender a composição de seus órgãos, estudou as asas das borboletas, descreveu a organização social das formigas, pesquisou os formatos de colméias e analisou os hábitos de águas-vivas e pássaros. (Revista Superinteressante – julho 2009) 27) Ex-guarda reclama de perseguição por ‘ser sexy’. (site do Terra – notícias – acesso em: 16 jul. 2009) c) Predicativo do objeto - o predicativo do objeto, segundo Cintra e (2001) só aparece no predicado verbo-nominal e tem por função modificar o objeto direto ou indireto. Pode ser expresso por substantivo ou adjetivo, como em: 28) A polícia encontrou o portão arrombado. (predicativo do objeto direto) Reescrevendo a oração do exemplo 24, teríamos falsificadas funcionando como predicativo do objeto direto assinaturas: 29) Agaciel encontrou assinaturas falsificadas. 30) Chamam-lhe “príncipe dos exploradores”. (predicativo do objeto indireto) d) Agente da Passiva - como o próprio nome diz, esse complemento só ocorre na voz passiva com auxiliar e designa o ser que pratica a ação sofrida ou recebida pelo sujeito. Esse complemento verbal,normalmente, introduzido pela preposição por, pode ser representado, conforme Cunha e Cintra (2001), por substantivo ou palavra substantivada, por pronome, por numeral ou oração substantivada. CINTRA E CUNHA Segundo esses mesmos gramáticos, somente com o verbo chamar pode ocorrer o predicativo do objeto indireto. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 37 Retomando o exemplo 26, e esclarecendo que o lhe desse exemplo refere-se a Fritz Müller, um cientista alemão que viveu em Blumenau e ajudou Darwin na teoria da evolução (ver seção 4.2), podemos fazer a passagem das orações nele presentes na voz ativa para a voz passiva. Assim, teríamos: 31) Plantas foram dissecadas por Fritz Müller. 32) Asas das borboletas foram estudadas por Fritz Müller. 33) A organização social das formigas foi descrita por Fritz Mülller. 34) Os formatos de colméias foram pesquisados por Fritz Müller. 35) E, ainda, os hábitos de águas-vivas e pássaros foram analisados por ele. Em todos os exemplos acima, Fritz Müller, que era o sujeito de todas essas orações passa a ser o agente da passiva, isto é, o sujeito que pratica a ação sofrida. AGENTE DA PASSIVA Para Cunha e Cintra (2001), quando uma oração contém um verbo construído com objeto direto, ela pode assumir a forma passiva, mediante as seguintes transformações: a) o objeto direto passa a ser sujeito da passiva; b) o verbo passa à forma passiva analítica do mesmo tempo e modo; c) o sujeito converte-se em agente da passiva. Vejamos o exemplo: O presidente Lula anunciou aumento de salários. (O presidente Lula = sujeito; anunciou = verbo na voz ativa; aumento de salários = objeto direto). Aumento de salários foi anunciado pelo presidente Lula. (Aumento de salário = sujeito; foi anunciado = verbo na voz passiva; presidente Lula = agente da passiva). Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 38 3.1.3 Os termos acessórios da oração São considerados acessórios os termos que se juntam a um nome ou a um verbo para determinar-lhes o significado. São assim denominados pela gramática tradicional pois, embora tragam um dado novo à oração, eles não são indispensáveis ao entendimento do enunciado. Por isso, podem deslocar-se na oração sem prejuízo de sentido ao enunciado. São eles: ADJUNTO ADNOMINAL Segundo Cunha e Cintra (2001) é o termo de valor adjetivo que serve para especificar ou delimitar o significado de um substantivo, qualquer que seja a função deste. Pode vir expresso por um adjetivo ou locução adjetiva, artigo, pronome adjetivo, numeral e oração adjetiva. 36) SP registra 2ª morte por gripe suína, a 4ª no País. (site do Terra - Notícias - acesso em: 14 jul. 2009) 37) Taxa de desemprego Britânica é a maior desde 1997. (site do Terra - Notícias - acesso em: 15 jul. 2009) Verificamos, no exemplo 37, que há dois adjuntos adnominais, um representado por um adjetivo (Britânica) e outro representado por um artigo (a) delimitando o mesmo substantivo: taxa de desemprego. ADJUNTO ADVERBIAL É, como o nome sugere, o termo de valor adverbial que indica alguma circunstância do fato expresso pelo verbo, ou intensifica o sentido deste, de um adjetivo, ou de um advérbio (Cf. Cunha e Cintra, 2001). Pode vir representado por advérbio, locução adverbial, ou oração adverbial. Os principais tipos de adjuntos adverbiais, embora, muitas vezes, só é possível classificá-los a partir do texto em que estão empregados, são, segundo Cunha e Cintra (2001): • De causa Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 39 Retomando o exemplo 27 - Ex-guarda reclama de perseguição por ‘ser sexy’ – observamos que, após o objeto indireto de perseguição, há uma oração adverbial (ver seção 4.1.2) por ser sexy, funcionando nesse período como adjunto adverbial de causa, indicando a circunstância expressa pelo verbo. 38) Suavam de calor. • De companhia 39) Eu passava o dia com minha avó, e às quatro, cinco horas da tarde, ela me trazia para dormir em casa com a minha mãe. (Trecho da entrevista de Marina Silva à revista Caros Amigos, edição do mês de julho de 2009). Nesse exemplo, destacamos dois adjuntos adverbiais de companhia, mas vamos observar que, nesse mesmo trecho, temos um adjunto adverbial de tempo (às quatro, cinco horas da tarde) e um de lugar (em casa). • De dúvida 40) Talvez, isso tudo seja consequência do simples fato de que o professor tenha deixado de ser o Mestre e de que o aluno deixou de ser Discípulo. (Trecho retirado do texto “Vítima produtoras da indiferença”, de autoria da professora Maria Ilda Zirondi, publicado no site da Revista Caros Amigos - http://carosamigos.terra.com.br/. Acesso em: 15 jul. 2009. O isso tudo aqui refere-se ao que a autora discorreu no parágrafo anterior do texto) • De fim 41) Há homens para nada, muitos para poucos, alguns para muito, nenhum para tudo. (Marquês de Maricá – Exemplo retirado da Cunha e Cintra, 2001, p. 153) 42) Joaquim estudou para advogado. • De instrumento http://carosamigos.terra.com.br/ Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 40 43) Com um fuzil semi-automático a tira-colo, o sargento Alcântara faz cumprir a ordem do comando da polícia: “Dez horas tem que acabar”. (Exemplo adaptado de uma reportagem sobre o Funk Carioca, publicada na Caro Amigos, edição do mês de julho de 2009, por Marcelo Salles) • De intensidade 44) Tenho muitas lembranças, guardei muitas coisas de uma idade muito tenra. (Trecho da entrevista de Marina Silva à Revista Caros Amigos, edição do mês de julho de 2009) Nesse exemplo, os dois primeiros adjuntos intensificam o sentido dos substantivos lembranças e coisas, respectivamente, enquanto o terceiro intensifica o sentido do adjetivo tenra. • De lugar 45) Taxa de desemprego na Grã-Bretanha é a maior desde 1997. (Disponível em: site do Terra - Notícias - acesso em: 15 jul. 2009) • De matéria Embora Cunha e Cintra (2001) apresentem essa classificação para o adjunto adverbial, no entendimento de outros gramáticos, como Bechara, com o qual compartilhamos esse entendimento, o funcionamento, isto é, a circunstância expressa é igual a do adjunto adverbial de instrumento. Vejamos o exemplo dado por Cunha e Cintra: 46) Obra de finado. Escrevi-a com a pena de galhofa e a tinta da melancolia. (Machado de Assis) • De meio LUGAR Cunha e Cintra (2001) apresentam uma subdivisão do adjunto adverbial de lugar em lugar aonde, lugar onde, lugar donde, lugar para onde e lugar por onde, que não julgamos relevante apresentá- la aqui, uma vez que todos são, de igual maneira, adjuntos adverbiais de lugar. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 41 47) Depois do acidente com o voo 447 da Air France, viajar de avião exige mais cuidados. • De modo 48) Antes de começar a ler este artigo, respire profundamente. (Retirado da reportagem “Desmatamento acelerado nas fazendas de Daniel Dantas”, de Plino Teodoro, publicada na Revista Caros Amigos, edição de julho de 2009) • De negação 49) Uma viagem por Bonsucesso e o que não fazemos pelo meio ambiente. (Título de um texto, escrito por Katerina Volcov, publicado no site da Revista Caros Amigos: http://carosamigos.terra.com.br/. Acesso em: 15 jul. 2009) Nesse exemplo, além do advérbio de negação destacado, também temos a presença de um advérbio de lugar - por Bonsucesso - que é um bairro da cidade de Guarulhos, na grande São Paulo. • De tempo Retomamos aqui o exemplo 45 - Taxa de desemprego na Grã-Bretanha é a maior desde 1997 – para destacar agora o advérbio também de tempo que o compõe, além do advérbio de lugar já destacado. 50) Na verdade, essa ideiade namorado veio surgir muito depois, pois desde cedo eu queria ser freira. (Trecho da entrevista de Marina Silva, senadora pelo PT, à revista Caros Amigos, edição do mês de julho de 2009) APOSTO É o termo de caráter nominal que se junta a um substantivo, a um pronome, ou a um equivalente destes, a título de explicação ou de apreciação. 51) O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli de Azevedo, enviou nesta terça-feira uma carta aos funcionários da estatal após a instalação da CPI que investigará supostas http://carosamigos.terra.com.br/ Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 42 irregularidades na Petrobras e na Agência Nacional do Petróleo (ANP)... (site do Terra – notícias – acesso em: 15 jul. 2009) O pode ser representado também por: • Uma oração 52) A verdade é esta: não há vitória sem estudo e dedicação. ENTRE O APOSTO E O TERMO Entre o aposto e o termo a que ele se refere há em geral pausa, marcada na escrita pelo uso de vírgulas, como nesse exemplo. No entanto, segundo Cunha e Cintra (2001, p. 156), “pode também não haver pausa entre o aposto e a palavra principal, quando esta é um termo genérico, especificado ou individualizado pelo aposto”. É o caso de A cidade de Lisboa, O poeta Bilac, O Rei D. Manuel e O mês de junho. Este aposto, chamado de especificação, não pode ser confundido, segundo os autores, com outras construções semelhantes, como O clima de Lisboa, O soneto de Bilac, A época de D. Manuel e As festas de junho, em que as expressões destacadas têm valor de adjetivo e funcionam como adjuntos adnominais. APOSTO Cunha e Cintra (2001) também tratam do valor sintático do aposto. Segundo os autores, o aposto tem o mesmo valor sintático do termo a que se refere. Pode, assim, haver: aposto no sujeito, no predicativo, no complemento nominal, no objeto direto, no objeto indireto, no adjunto adverbial, no próprio aposto e no vocativo. Agora, para refletir sobre isso, volte aos exemplos já apresentados de aposto e verifique o valor sintático do aposto nesses exemplos. Ainda no que se refere ao aposto, os gramáticos chamam a atenção do leitor para não confundir aposto com adjetivo que, em função de predicativo, costuma vir separado do substantivo que modifica por uma pausa sensível. Assim, numa oração como “E a noite, muda e calma, vai descendo...” muda e calma é predicativo de um predicado verbo-nominal, e não aposto, como pode parecer. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 43 • Referir-se a uma oração inteira 53) Dedicação e estudo são dois atributos positivos a qualquer estudante, o que resulta em conquista. • Ser enumerativo, ou recapitulativo 54) Tudo – alegrias, decepções, vitórias, derrotas – fica estampado no rosto das pessoas sinceras. 55) Duas coisas encorajam os estudantes: a certeza e a valorização da conquista de um diploma. VOCATIVO Dá-se o nome de vocativo aos termos de entonação exclamativa e isolados do resto da frase, que servem para invocar, chamar ou nomear, com ênfase maior ou menor, uma pessoa ou coisa personificada (Cf. Cunha e Cintra, 2001) . 56) Alegria, onde te encontras? Não muito comum em textos escritos do cotidiano, como jornais, revistas etc, o vocativo é empregado principalmente em textos poéticos, e também é comum em orações, onde se invoca a Deus. Vejamos: 57) Ó Deus, atendei a minha prece! 58) Dizei-me vós, Senhor Deus! (Castro Alves) VOCATIVO Os autores ainda chamam a atenção para a distinção do vocativo de substantivo que, acompanhado ou não de determinação, constitui por si mesmo o predicado em frases exclamativas do tipo: Silêncio! Mãos ao alto! Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 44 E quem não lembra ou já não ouviu falar do poema José, de Carlos Drummond de Andrade (http://www.eeagorajose.kit.net/estilos/eagorajose.htm). Vamos relembrá-lo? E agora, José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, e agora, José ? e agora, você ? você que é sem nome, que zomba dos outros, você que faz versos, que ama protesta, e agora, José ? Está sem mulher, está sem discurso, está sem carinho, já não pode beber, já não pode fumar, cuspir já não pode, a noite esfriou, o dia não veio, o bonde não veio, o riso não veio, não veio a utopia e tudo acabou e tudo fugiu e tudo mofou, sua lavra de ouro, seu terno de vidro, sua incoerência, seu ódio - e agora ? Com a chave na mão quer abrir a porta, não existe porta; quer morrer no mar, mas o mar secou; quer ir para Minas, Minas não há mais. José, e agora ? Se você gritasse, se você gemesse, se você tocasse a valsa vienense, se você dormisse, se você cansasse, se você morresse… Mas você não morre, você é duro, José ! Sozinho no escuro qual bicho-do-mato, http://www.eeagorajose.kit.net/estilos/eagorajose.htm Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 45 e agora, José? E agora, José? Sua doce palavra, seu instante de febre, sua gula e jejum, sua biblioteca, sem teogonia, sem parede nua para se encostar, sem cavalo preto que fuja a galope, você marcha, José! José, pra onde ? No poema que você acabou de ler, verificamos a invocação do nome José em diferentes estruturas e posições na frase. Observamos, assim, nesse poema, o funcionamento de um vocativo no texto. E, para além da função sintática que José exerce nesse poema, isto é, a de vocativo, o que chama a atenção nesse emprego em termos de produção de sentido? Quem é, afinal, José? A quem o poeta está se referindo? Ou melhor, quem é o referente desse nome? Por que esse sintagma nominal não está determinado? Se estive determinado, produziria outro efeito de sentido? Você também pode ouvir o próprio Drummond recitando José (http://www.youtube.com/watch?v=CaexXJ6UFnw). 3.2 Outras abordagens O conhecimento de como as palavras se organizam e de quais são suas funções na estrutura da frase é fundamental não só para a estrutura mas também para o sentido do texto, o qual se estabelece a partir do nível de organização da língua. Veja o exemplo abaixo: 59) por gripe 1ª morte anuncia SP; é País no menina 2ª vítima http://www.youtube.com/watch?v=CaexXJ6UFnw Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 46 Você conseguiu entender, produzir sentido para o exemplo acima? Não, não é mesmo? Mas se a resposta é não, qual a justificativa para tal resposta? O que causa estranheza no exemplo acima? A estranheza consiste no modo como estão distribuídos/organizados os elementos na oração, o que significa dizer que toda a língua (e o português não é diferente) possui um modo de organização interno que respeita determinados padrões estruturais para que a elaboração de orações e, por sua vez, de textos seja possível. Por isso, dizemos que há alguns elementos na oração que podem ser deslocados (os termos acessórios – ver seção 3.1.3), sem prejuízo de sentido para o texto, e outros não. Retomemos o exemplo 51, apresentado para exemplificar o funcionamento do aposto: 51) O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli de Azevedo, enviou nesta terça-feira uma carta aos funcionários da estatal após a instalação da CPI que investigará supostas irregularidades na Petrobras e na Agência Nacional do Petróleo (ANP)... Nesse exemplo, além do termo destacado - José Sergio Gabrielli de Azevedo – há outros termos acessórios, funcionando, respectivamente, como adjunto adverbial de tempo – nesta terça-feira; após instalação da CPI – e de lugar – na Petrobrás e na Agência Nacional do Petróleo (ANP). Se observarmos a estrutura desse período simplesmente do pontode vista sintático, diríamos que a informação “O presidente da Petrobras enviou uma carta aos funcionários da estatal” seria suficiente para termos o que a gramática considera uma oração, já que ela cumpre com os requisitos mínimos previstos para essa estrutura, isto é, possui um sujeito – O presidente da Petrobrás – e um predicado – uma carta aos funcionários da estatal. As demais informações, como o próprio nome utilizado pela gramática indica, são acessórias, isto é, complementam a informação principal. E, por possuírem essa característica, podem ser deslocadas na estrutura do período. Vejamos: 51(a) Nesta terça-feira, José Sergio Gabrielli de Azevedo, o presidente da Petrobrás, enviou uma carta, após a instalação da CPI que investigará supostas irregularidades na Petrobras e na Agência Nacional do Petróleo (ANP), aos funcionários da estatal. 51(b) Após a instalação da CPI que investigará supostas irregularidades na Agência Nacional do Petróleo (ANP) e na Petrobras, José Sergio Gabrielli de Azevedo, o presidente da Petrobras, enviou uma carta aos funcionários da estatal nesta terça-feira. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 47 Além dessas duas possibilidades apresentadas, há outros deslocamentos possíveis, sem prejuízo de sentido ao período. No entanto, a presença ou ausência das chamadas informações acessórias tem sim uma implicação na produção de sentido, já que elas detalham a informação principal. Faz diferença, por exemplo, saber quem é o presidente da Petrobrás e de qual terça-feira se está falando. Sentido esses não localizados simplesmente na estrutura sintática e gramatical do texto (ver, a seguir, discussão sobre a referenciação). Como vimos, então, as informações acessórias possuem mobilidade na estrutura da oração. Mas isso não é o que acontece com os chamados termos essenciais. Os termos essenciais da oração possuem uma certa fixidez na língua, em termos de lugares ocupados na estrutura da oração (ver seção 5). Como vimos acima, no item sobre sujeito, há determinadas classes de palavras que, normalmente, ocupam esse lugar sintático. Assim, causa estranheza uma oração iniciada pela preposição por ou pelo verbo é, como no exemplo 59. Qual seria, então, a distribuição mais adequada dos elementos desse exemplo para que o texto produzisse sentido aos leitores? Faça a tentativa você mesmo. Pense a sua organização colocando em prática o que já aprendeu sobre os termos essenciais da oração, isto é, o sujeito e o predicado. Sobre o que ou de quem se fala? O que se diz sobre esse “sujeito”? Abaixo, temos o texto tal qual ele foi publicado no site do Terra, em 10 de julho de 2009. 60) SP anuncia 1ª morte por gripe; menina é 2ª vítima no País (site do Terra – Notícias – acesso em: 10 jul. 2009) Assim como está organizada a manchete, diríamos que SP é o sujeito da primeira oração e menina é o sujeito da segunda oração. Mas não é possível outra organização para os mesmos termos apresentados no exemplo 60? Vejamos: 60(a) 1ª morte por gripe é anunciada em São Paulo; 2ª vítima no País é uma menina. Nesse caso, 1ª morte por gripe, que funcionava como objeto direto no exemplo 60, passa a ser o sujeito; e 2ª vítima no País, que era predicativo do sujeito, passa também a funcionar como sujeito no exemplo 60.a. No primeiro caso, há a passagem da voz ativa para a voz passiva do verbo e, nessa passagem, o sintagma que era objeto direto na voz ativa passa a ser sujeito na voz passiva. Mas não é isso que ocorre na segunda oração, já que, em ambos os casos, o verbo está na voz ativa. O que ocorre nessa situação não pode ser explicado, simplesmente, pela organização interna da língua, já que a troca do sintagma para preencher o lugar sintático do sujeito (menina por 2ª vítima no País) produz um Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 48 discursivo-textual. outro sentido à oração. A ênfase não está mais em menina, mas sim em 2ª vítima no País, mudando, assim, a topicalização da oração (ver seção 5). Essa outra leitura, em que a ênfase é dada ao elemento vítima, é produzida pela troca do lugar do sujeito na oração, mas não se explica senão pela determinação da exterioridade na língua. Ou seja, somente a explicação gramatical dos termos sintáticos não dá conta do efeito de sentido pretendido pelo locutor desse enunciado, que é o sentido pragmático, já trabalhado na seção 1. Qual o sentido de vítima? Vítima de que? De que gripe se está falando? Se menina é a 2ª vítima, qual foi a primeira? Quem é essa menina? O que verificamos aqui é que todas essas perguntas não podem ser respondidas se simplesmente considerarmos o que está dito no exemplo 60. Como já foi explicitado no capítulo 1 desse material, cada enunciado é atualizado na fala, a partir de diferentes propósitos comunicativos que se codificam nas formas sintáticas. Por isso, é preciso recorrer ao contexto da onde as informações sobre a epidemia da gripe suína estão circulando. A partir dessa reflexão, percebemos que NEVES, 2007, p. 15. Como o exemplo que estamos trabalhando é um título de uma notícia, certamente muitos dos questionamentos acima seriam respondidos com a leitura do texto da notícia na íntegra. Mas a gramática de tradição escolar trabalha com frases e orações isoladas. E somente com o avanço dos estudos ENUNCIAÇÃO Consideramos aqui enunciação o processo através do qual um enunciado é posto em funcionamento. Em outras palavras, há uma memória, uma história de enunciações, que é construída no social, e que envolve cada palavra da língua, a cada vez que essa palavra é posta em uso. limites da oração, mas o de outras só pode resolver-se no funcionamento o funcionamento de algumas classes de itens pode explicar-se nos Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 49 linguísticos é que esse outro olhar sobre a estrutura da língua é possível, mostrando que a organização interna da língua não é absolutamente autônoma, como acreditam muitos gramáticos, mas sim relativamente autônoma. Segundo Dias (2003), Assim, para esse autor, há duas dimensões na língua: a dimensão orgânica (gramatical) e a dimensão enunciativa (histórica), as quais devem estar interligadas para se explicar o funcionamento da linguagem. Vamos, então, agora, conhecer algumas reflexões de linguistas sobre a classificação desses termos que a gramática denomina de essenciais, integrantes e acessórios. Segundo Mattoso Câmara (1975), o sujeito é um substantivo (nome ou pronome), que serve de “tema”, ou ponto de partida, da comunicação frasal. É caracterizado como o elemento determinado do sintagma oracional, em que o predicado aparece como determinante. Apresenta, também, o traço da concordância com o verbo e o da freqüente anteposição com relação a este último. (Cf. Kehdi, 2004). Ainda, segundo Mattoso Câmara, ao contrário do prescrevem as gramáticas normativas, nem sempre o sujeito pode ser identificado como o agente da ação verbal e, por sua vez, a noção de paciente (aquele que recebe a ação) não se associa, por exclusividade, ao sujeito da construção passiva. No exemplo 24 - 1ª morte por gripe é anunciada em São Paulo - que acabamos de discutir, é questionável considerarmos o sujeito 1ª morte por gripe, embora empregado numa construção passiva, como paciente, se levarmos em conta o sentido da oração. Ou, em uma construção, tipicamente ativa, como A menina levou uma surra, o sujeito a menina não é agente, já que não pratica ação nenhuma; ao contrário, sofre a ação, sendo considerado, portanto, sujeito paciente e não agente, como prevê a gramática. língua na área da gramática. organicamente estruturados é apenas o ponto de partida de um estudo de a perspectiva segundo a qual unidades se organizamem núcleos Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 50 Se o sujeito é tratado como tema (informação já sabida, isto é, dada), o predicado é considerado rema (informação nova, que figura geralmente no segmento final da oração). Conforme Ilari (1992, p.21), baseado na conceituação de tematização de Halliday, Assim, numa oração como o exemplo 1, já apresentado: 1) Flameguista encabeça lista de reforços do Palmeiras. (site do Terra - Notícias - acesso em: 17 jun. 2009) “Flameguista” seria o tema e “encabeça lista de reforços do Palmeiras” o rema. Nesse caso, então, o tema coincidiria com o sujeito da oração e o rema com o predicado. Assim, Flamenguista poderia ser caracterizado como: a) sujeito da oração pelo critério de concordância do verbo na 3ª pessoa do singular; b) como expressão do agente; c) como o tema sobre o qual toda a oração versa. Mas nem sempre essa coincidência é possível. Veja: TEMA E REMA Não vamos aprofundar aqui a discussão sobre tema e rema, proposta feita por Halliday, numa perspectiva funcionalista. Fizemos apenas menção a isso para mostrar que o lugar do sujeito (se ele é o ser/objeto sobre o qual se versa) não é tão fixo assim na oração. Há uma série de outros aspectos que envolvem a articulação tema/rema. Para saber mais a respeito, leia o livro de Rodolfo Ilari, “Perspectiva funcional da frase portuguesa”, publicado pela editora da Unicamp, em 1992. que tem como origem a oração, e é relevante para sua organização textual. seguido pelo rema; tema e rema, cumulativamente, constituem uma estrutura o tema é, por definição, o primeiro segmento de qualquer oração, Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 51 2) Alheio a polêmicas, Belluzzo garante Arena para Copa. (site do Terra - Notícias - acesso em: 17 jun. 2009) Nesse exemplo, Beluzzo continua sendo o sujeito da oração, mas não mais o tema e sim o rema. O tema, nesse caso, seria alheio a polêmicas. Mas se a ordem dos constituintes na oração fosse assim invertida Belluzzo garante Arena para Copa, alheio a polêmicas Teríamos outra vez a coincidência do sujeito com o tema: Beluzzo. No entanto, cabe um questionamento aqui: se o tema é informação já sabida dos leitores, quem é Beluzzo? Será que todos os leitores sabem de quem se está falando, ou sobre quem está se predicando no exemplo acima? Temos ai uma questão de referenciação, que só pode ser explicada, ou melhor, a informação só pode ser recuperada, se ultrapassarmos os limites da oração. Sobre o ponto de vista informativo, no nível da oração e do texto, Neves (2007, p. 38) esclarece que Se voltarmos ao nosso exemplo “Alheio a polêmicas, Beluzzo garante arena para a Copa”, cuja oração é o título de uma manchete no portal de notícias do Terra, publicada em 17 de junho de 2009, vamos verificar que, de posse dessas informações, o referente de Beluzzo já começa a ficar mais claro. Lendo o texto na íntegra, percebemos que se trata de uma notícia que faz referência ao presidente do Palmeiras, o qual garante que o estádio Palestra Itália estará em condições para realização da copa em 2014. Portanto, retomando o que diz Neves sobre a relação, no nível do texto, entre informações dadas e informações novas, o que se observa, nesse exemplo e na maioria das manchetes de jornais, é que primeiro é apresentada a informação nova, a qual vai ser recuperada ao longo da leitura do texto. Trata- no nível da oração se relacionam um tema (aquilo de que se fala; aquilo a que se predica) e um rema (o que se diz do tema; o que se predica do tema), enquanto no nível do texto relacionam-se porções dadas (já apresentadas, acessíveis) e porções novas (não- recuperáveis ou não-acessíveis). Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 52 se de uma estratégia textual, muito utilizada pelos jornalistas, para chamar a atenção do leitor, causando um efeito de suspense sobre o que, efetivamente, trata a notícia. As polêmicas de que trata o título dessa notícia também só ficarão claras ao longo da leitura do texto, que vai exigir sempre uma “dose” de conhecimento extralinguístico do leitor. Em outras palavras, como já referimos acima, é preciso articular a dimensão orgânica com a dimensão enunciativa da língua para explicarmos o funcionamento da gramática de uma língua (Cf. Dias, 2003). Como diz Neves (2007, p. 75), Assim, no exemplo 5 abaixo, cujo sujeito a gramática classifica como oculto, há, na verdade, uma intenção do falante de referir-se a todo o grupo de pessoas que fazem parte da direção do Palmeiras. Esse é o nós a quem o Presidente do Palmeiras está se referindo. No entanto, observamos que tal referente só é recuperado fora do texto, a partir da dimensão enunciativa da língua. 5) Temos confiança que daqui cinco meses as obras começarão. (Declaração do presidente do Palmeiras sobre as obras do Palestra Itália para a copa de 2014. Disponível em: site do Terra – Notícias – acesso em: 17 jun. 2009) PARA SABER MAIS Para saber mais, leia o artigo “A sintaxe em Mattoso Câmara”, de Valter Kehdi, Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102- 44502004000300009&lng=en&nrm=iso no processo da língua em uso, os participantes de um discurso negociam o universo de discurso de que falam, e, dentro dele, num determinado momento, escolhem referir-se a algum (alguns) indivíduo(s) cuja identidade estabelecem – ou não – segundo queiram – ou não – garantir a sua existência nesse universo. Isso significa que referenciação envolve interação, e, conseqüentemente, intenção. http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-44502004000300009&lng=en&nrm=iso http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-44502004000300009&lng=en&nrm=iso Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 53 Já, no exemplo 6, em que a segunda oração - “E deixar a vida deles ainda mais divertida, até” - também é apresentada como exemplo de sujeito oculto, o sujeito é recuperado na primeira oração, ou seja, no nível do texto, sendo também O novo vestibular. A omissão do sujeito, nesses casos, é inclusive recomendada para evitar repetições desnecessárias no texto. Conforme afirma Dias (2002, p. 62), “tendo em vista a existência do lugar sintático, o processo de textualização de que faz parte a sentença se encarregou de oferecer as pistas para que a definitude do sujeito seja recuperada no texto.” 6) O novo vestibular pode acelerar o amadurecimento dos jovens. E deixar a vida deles ainda mais divertida, até. (Revista Superinteressante, maio 2009) A partir dessa reflexão, podemos nos perguntar então: Serão mesmo exemplos de sujeitos ocultos essas orações? Se o leitor consegue identificar quem é o sujeito da oração, faz sentido falar em sujeito oculto? Pense nisso! Nessa mesma esteira de reflexão, podemos retomar outros exemplos já apresentados, em que o referente só se esclarece se considerada a dimensão enunciativa da língua, articulada com a dimensão orgânica e textual. 24) Agaciel diz que assinatura em atos secretos foi falsificada. 26) Tudo lhe interessava: dissecou plantas para entender a composição de seus órgãos, estudou as asas das borboletas, descreveu a organização social das formigas, pesquisou os formatos de colméias e analisou os hábitos de águas-vivas e pássaros (Revista Superinteressante – julho 2009) SUJEITO Segundo esse autor, “a ocupação do lugar do sujeito é condicionada por fatores ligados à definitude, à indefinição, e à generalização.” (DIAS, 2003, p. 63). Para saber mais sobre o tratamento dado ao sujeito por esse autor leia: DIAS, L. F. Fundamentos do sujeito gramatical: uma perspectiva da enunciação.In: ZANDWAIS, Ana (org.) Relações entre pragmática e enunciação. Porto Alegre: UFGS/Sagra Luzzatto, 2002. p. 47-63; e o texto já citado (DIAS, 2003) na íntegra. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 54 30) Chamam-lhe “príncipe dos exploradores”. No exemplo 24, o leitor desinformado pode se perguntar quem é Agaciel e de que atos secretos se está falando? Informações essas que ele pode recuperar durante a leitura da notícia, que faz referência ao ex- diretor do Senado, Agaciel Maia, e ao escândalo que afeta o Senado, incluindo a descoberta de alguns atos secretos praticados pela casa e que só vieram a público recentemente. Tais acontecimentos são notícias corriqueiras nesse momento, no Brasil, e são pauta diária dos mais diversos veículos de comunicação. Considerando esse contexto imediato, podemos dizer que é difícil o leitor não saber do que trata um título de notícia como esse. No entanto, será que daqui a 10 anos, o leitor ainda saberá que é Agaciel Maia? Por isso, a dimensão enunciativa, que resgata a memória histórica das enunciações, é fundamental para entendermos o funcionamento da língua. Já, nos exemplos 26 e 30, o lhe faz referência a uma mesma pessoa: Fritz Müller, um cientista alemão que viveu em Blumenau e ajudou Darwin na teoria da evolução. E, novamente, verificamos que somente a estrutura do período que serviu como exemplo do funcionamento de uma determinada função sintática, a de objeto indireto nesse caso, não dá conta de explicar quem é o referente. Só recuperamos essa informação no nível do texto. Nesse caso, ao contrário do exemplo 24, não estamos trabalhando com uma informação atual, da ordem do cotidiano, mas com uma informação de um cientista que já é morto, cujas enunciações, cujos sentidos que circularam sobre essa personagem foram atualizados pela Revista Superinteressante, que publicou o texto sobre Fritz Müller. Mas tal atualização só foi possível porque essas enunciações existiram, produziram memória social, e hoje são ressignificadas, atualizadas pelo jornalista que produziu e, por sua vez, pelo leitor que leu essa reportagem. Por isso, concordamos com Dias (2003, p. 61) que Ainda em relação ao sujeito e a referenciação, cabe destacar os casos classificados pela gramática normativa de sujeito indeterminado, como em: a articulação na língua é contraída no confronto entre uma história das enunciações da língua e uma atualidade do uso. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 55 7) Acreditava-se que doenças venéreas e a dependência de álcool, nicotina e morfina degeneravam a espécie, gerando linhagens diferentes. (Revista Superinteressante, maio 2009) Nesse exemplo, a estrutura do verbo não permite que identifiquemos o sujeito da sentença. Por isso, ele é classificado como indeterminado, pois, se perguntarmos quem acredita?, a estrutura da língua não nos dá respostas. No entanto, se remetermos à dimensão enunciativa, e atualizarmos as enunciações, as memórias históricas referentes a esses estudos, podemos chegar a alguns nomes de cientistas. Com os estudos mais recentes da linguística, sobretudo na área do texto e do discurso, os linguistas chegaram à conclusão de que essa indeterminação do verbo que ocorre na estrutura linguística (e sintática) da língua produz, na verdade, só um efeito de indeterminação, como se não existisse ninguém responsável pela informação enunciada num texto como o do exemplo 7. Ou seja, o enunciador, nesse caso o jornalista, tenta isentar-se da responsabilidade da informação divulgada, utilizando a estrutura indeterminada do verbo - “Acredita-se”. Essa é uma estrutura muito comum em textos científicos e também de divulgação científica, produzido por uma ilusão do sujeito enunciador de que é possível neutralidade na informação. Neutralidade essa que não existe, uma vez que a própria estratégia do enunciador de utilizar, numa determinada construção do seu texto, o verbo na forma indeterminada já denuncia a sua intenção de não ser cobrado pela responsabilidade dessa informação. Em relação à classificação do predicado, alguns gramáticos, como Bechara, já discutem a pertinência de separar o predicado verbal do nominal, uma vez que, considerando o tratamento dado pela gramática tradicional aos predicados nominais, os verbos, nesses tipos de predicados, teriam somente a função de ligar o predicativo ao sujeito, o que tiraria dos verbos de ligação, conforme Bechara (2009), o status de verbo. Para esse autor, essa distinção não faz sentido, pois os chamados verbos de ligação “apresentam todas as condições necessárias à classe de verbos, incluindo-se ai os morfemas de gênero, número, pessoa, tempo e modo;” daí, justifica o autor, PARA SABER MAIS Para aprofundar o conhecimento sobre referenciação, leia o capítulo “Referenciar Ou: A criação da rede referencial na linguagem”, do livro Texto e gramática, de Neves (2007, editora Contexto). Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 56 gramaticais de que essa classe lexical é suporte (tempo, modo, pessoa, número). Considerando essa abordagem, em orações como 11, 12, e 16, apresentadas como exemplo do predicado nominal (11 e 12) e verbo-nominal (16), os núcleos passariam a ser, respectivamente, os verbos são, tornam-se e vive (conforme morfema de número, pessoa, tempo e modo apresentado entre parênteses), juntamente como os nomes ingratos e escondida. 11) Alguns filhos são ingratos com os seus pais. (3ª pes. plural, tempo presente, modo indicativo) 12) Os filhos tornam-se ingratos com o tempo. (3ª pés. plural, tempo presente, modo indicativo) 16) Prem Verma vive escondida (3ª pes. Singular, tempo presente, modo indicativo) Neves (2007) mostra que os verbos de ligação ou cópulas só entram no predicado juntamente com sintagmas nominais. Por isso, ainda que sejam o centro lógico-semântico do predicado, os adjetivos, ou (pro)nomes, classes que representam os sintagmas nominais, só constroem predicação em conjunto com o verbo. NEVES, 2007, p. 60. acompanharmos neste livro os linguistas e gramáticos que defendem a não distinção entre o predicado verbal e o predicado nominal, incluindo também a desnecessidade de distinguir o predicado o predicado verbo-nominal. Toda relação predicativa que se estabelece na oração tem por núcleo um verbo. BECHARA, 2009, p. 426. princípio, é inaceitável – continua o responsável pela expressão de todo feixe de categorias Mais do que isso, o verbo, além de não ser um vazio semanticamente – o que, por Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 57 Assim, os verbos de ligação estão, juntamente com os verbos-suporte, os verbos modais e os verbos , entre os verbos que não acionam uma estrutura argumental, conforme discussão apresentada por Neves (2007), com base nas teorias linguísticas de cunho funcionalista. Por outro lado, temos, com base nessas mesmas teorias linguísticas, a estrutura argumental do verbo, que se trata de um NEVES, 2007, p. 40. Assim, o tratamento dado aos complementos pela gramática é deslocado e considerado, em diversas teorias linguísticas de cunho funcionalista, como argumento do verbo, com a diferença de que é 4 CATEGORIAS DE VERBO Essas quatro categorias de verbo, citadas por Neves (2007, p. 59), “não são propriamente um rhêma, no sentido de que não são por si predicados, não constituem o núcleo, a matriz, para o preenchimento da estrutura argumental, ou seja, para a construção de orações”. Desse grupo de verbos dois deles – os de ligação e os verbos-suporte – “entram na construção de predicações em condições particulares, as quais os retiram do estatuto de centro da matriz predicativa”, como em: Prem Verma vive escondida,ou O futuro dos mares é sombrio, em que o centro do predicado não é somente o verbo, mas o verbo acompanhado dos nomes escondida e sombrio. Os outros dois subgrupos – os verbos auxiliares e os modalizadores – “se caracterizam por constituírem operadores sobre outro verbo com o qual se constroem, que é o verbo determinador da estrutura argumental (o verbo ‘principal’, ‘de sentido pleno’)”, como em: A experiência pode até atrapalhar o desempenho, pelo menos diante de situações novas (Revista Superinteressante, edição de dezembro de 2008); A empresa havia decidido retirar esse ponto do acordo (FSP). fenômeno primariamente sintático (ligado especialmente à noção de obrigatoriedade de determinados termos para preencher a valência de determinados verbos) que envolve a semântica (já que há restrições semânticas nesse preenchimento) e a pragmática (já que a realização efetiva do sistema de transitividade resulta de necessidades e intenções comunicativas). Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 58 no “nível pragmático que se situa a questão da necessidade, ou não, de um determinado termo/complemento na oração efetivamente realizada bem como a questão do modo de realização dos diversos termos: sintagma nominal, pronome pessoal ou zero (elipse).” (NEVES, 2007, p. 40). Ou seja, quem determina a necessidade de um ou outro argumento para ocupar o lugar de complemento de um verbo não é a sua transitividade, mas sim o contexto, o lugar de enunciação em esse verbo está/será empregado. Por isso, construções como as abaixo, são consideradas agramaticais, uma vez que não se admite, do ponto de vista semântico, o objeto danos para completar o sentido do verbo dirigir, nem que um advérbio, como infelizmente, seja utilizado no lugar de objeto indireto. * Pedro dirige danos ao meio ambiente * Pedro gosta de infelizmente Na perspectiva funcionalista a que nos referimos, a classificação dos verbos é feita segundo a natureza dos papéis semânticos desempenhados pelos argumentos que contraem relação com o predicado e que, na oração realizada, se apresentam como funções do verbo. Conforme classificação apresentada por COMPLEMENTOS VERBAIS Kehdi (2004) esclarece que Mattoso Câmara, ao tratar da questão dos complementos, propõe contra o que estabelece a NGB, que se designem como adjuntos os complementos substantivais; complemento seria a designação reservada para os complementos verbais. Estes últimos dividem-se em quatro tipos: objetivos, circunstanciais, predicativos e de agente. No entanto, na visão de Kehdi (2004), dever-se-ia excluir do quadro dos complementos o predicativo, pois este não tem caráter complementar; é o elemento nuclear da frase nominal, em que muitas vezes falta o verbo de ligação (cf. lat. homo bonus "o homem é bom"). Dessa forma, os complementos continuariam sendo quatro, em função da subdivisão dos objetivos: objeto direto, objeto indireto, circunstancial e de agente (com exclusão, portanto, do predicativo). Ainda, segundo Mattoso Câmara, o complemento de agente exprime o agente da ação na voz passiva, em frases como “Ele foi visto por Lisboa”. Nessa análise, os critérios formais (complemento circunstancial de lugar) são completados com o aspecto semântico. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 59 Neves (2007, p. 49 e 50), com base em Fillmore e Chafe, identificam-se, por esse critério, verbos que indicam: a) ação, se o (estruturalmente na função de sujeito) for agente; processo, se o A1 (estruturalmente na função de sujeito) for afetado ou experimentador; Argumento 1. b) ação-processo, se o A1 (estruturalmente na função de sujeito) for agente/causativo e houver um A2 afetado/efetuado; c) estado, se o A1 (estruturalmente na função de sujeito) não for nem agente nem causativo nem afetado (será ‘neutro’, ‘inativo’). A1 TEORIA DA ESTRUTURA ARGUMENTAL DOS VERBOS Não vamos aqui aprofundar a discussão sobre a teoria da estrutura argumental dos verbos, por entendermos que ela fica muito presa ainda à dimensão orgânica da língua, isto é, à organicidade lingüística. Corrobora o nosso posicionamento o excerto abaixo, de um artigo de Dias e Pereira (2009. Disponível em: http://www.revistalinguas.com/edicao21/edicao21.html. Acesso em: 29 jun. 2009): “na constituição da arquitetura sentencial, sujeito é o lugar sintático responsável por retirar o verbo de seu estado de dicionário, deixando-o em condições de receber as variações flexionais. Nessa direção, o que explica a existência do lugar do sujeito não é a eventual condição de argumento do verbo, como defende a gramática de valências. Ao contrário, o verbo é que depende da instalação do lugar do sujeito para ser retirado da sua condição de infinitivo. Não sendo projetado pelo verbo, o lugar de sujeito advém de um “ponto de partida” (DIAS, 2007, p. 1) configurado enunciativamente: a anterioridade de predicação (DIAS, 2007, p. 1). A anterioridade de predicação é então uma demanda de saturação da unidade sentencial como um todo, para que se constitua nela uma base de predicação. Na predicação, o verbo passa a ser uma unidade em perspectiva, isto é, ele recebe as coordenadas de enunciação, que http://www.revistalinguas.com/edicao21/edicao21.html Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 60 Já, na perspectiva de Pereira e Dias (2009), a organicidade lingüística é afetada pelos deslizamentos históricos do acontecimento, não se resumindo a um conjunto de regras ilusoriamente fixas e universais. Assim, a função sintática que preenche um lugar supostamente vazio na estrutura da sentença não pode ser determinada apenas pela sua organização linguística. Segundo Dias (2003), há três formas de articulação de unidades na sentença em nossa língua. Vejamos: A primeira forma se dá através de um elemento articulador, em expressões como cartas de amor, filhos do cantor, em que a preposição de articula, nesse caso, dois substantivos. A segunda forma de articulação se dá através da alteração em uma das unidades, como em Joana acordou e eu acordei. Nesses exemplos, as duas formas verbais (acordou e acordei) sofreram alteração na terminação para se articular com as unidades Joana e eu. Essas duas formas de articulação, apresentadas por Dias (2003) são detectáveis no plano da organicidade da língua. Já, a terceira forma de articulação é mais complexa, justamente porque não podemos detectar um elemento articulado no corpo da sentença. Consideremos os seguintes exemplos: 61) Joana pediu socorro. 14) Mãe de Jackson pede guarda definitiva dos filhos do cantor. Verificamos que, no segundo exemplo, já apresentado anteriormente, temos funcionando as duas primeiras formas de articulação, em Mãe de Jackson e filhos do cantor, e Mãe de Jackson pede. A terminação do verbo se articula com o sujeito Mãe de Jackson, mas o que articula o verbo pedir ao seu complemento - guarda definitiva? E o que articula o verbo pedir a um outro complemento – socorro – no exemplo 61? Há dependência entre ambas? Qual relação se estabelece entre os dois exemplos? Segundo Dias (2003), essas palavras enquanto unidades da sentença, também participam de um processo de articulação, já que há uma espécie de dependência de uma unidade em relação a outra. Se passam a ser agregadas morfologicamente, como sufixos. A submissão ao lugar do sujeito é a condição para que ele receba a coordenada proeminente na predicação: a flexão”. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 61 dizemos ou ouvimos falar que alguém pede, espera-se que se diga o que se pede. Mas o que liga pedir à guarda definitiva ou a socorro? Vamos retomar os exemplos e ampliá-los: 61(a) Joana pediu socorro. André também pediu em seguida.14(a) Mãe de Jackson pede guarda definitiva dos filhos do cantor. E obterá. Nesses exemplos, em que supomos uma continuidade dos enunciados, verificamos que somente na primeira oração está presente a unidade (o objeto) que se liga ao verbo. Na segunda oração, podemos recuperar o mesmo objeto presente na primeira oração. É o que a gramática chama de elipse, ou seja, as palavras socorro e guarda definitiva não aparecem materialmente, mas estão lá, no lugar do objeto. Agora, considere a seguinte reformulação do exemplo 61, como o mesmo verbo. 61(b) Só quem pede ganha. Nesse exemplo, não conseguimos recuperar o objeto do verbo pedir, não é mesmo? Poderíamos aqui falar em elipse, como nos exemplos acima? Poderíamos supor, como em 61 e 14, a existência de uma unidade a ser correlacionada ao verbo “pedir”, configurando-se o fenômeno da articulação? Somente a consideração da dimensão enunciativa dessa oração poderá nos dar possibilidades de preencher o lugar do objeto no exemplo acima. Seguindo as bases da reflexão proposta por Dias (2003), diremos que “a unidade chamada “objeto”, antes de ser uma palavra, é um lugar sintático.” Se fosse apenas a palavra, quando ela não aparecesse, como em 61.b, não teríamos a unidade objeto. Por isso, afirmamos, em consonância com o autor, “as condições de ocupação do lugar sintático estão no nível da enunciação.” Eis a dimensão enunciativa na sintaxe. O verbo “pedir”, assim como o verbo “amar”, exemplo utilizado pelo autor, acumularam, no decorrer da história do seu uso, uma memória das enunciações de que fazem parte. A recorrência do uso desses e outros verbos, ao longo da história da língua, resultou num lugar já preparado para abrigar o objeto. Esse lugar seria algo como uma trilha constituída na história das enunciações do verbo. Cada vez que criamos uma nova sentença com esses ou outros verbos, a enunciação sofre uma coerção histórica, projetando o lugar do objeto (Cf. Dias, 2003). Em 61.b, por exemplo, temos um uso generalizado do Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 62 verbo pedir, que projeta como possibilidade de preenchimento do lugar de objeto muitos desejos e/ou objetos. Assim, DIAS, 2003, p. 62. A reflexão aqui apresentada sobre o lugar do objeto direto, bem como as reflexões acima sobre o sujeito e outros aspectos sintáticos da língua, conduzem-nos a uma conclusão principal: não é possível dar conta de explicar alguns fenômenos sintáticos se levarmos em conta somente a classificação rígida e, muitas vezes, ineficiente da gramática. Observamos que muitos dos exemplos apresentados só ficaram mais claros, ou melhor, só foi possível produzir sentido a eles quando extrapolamos o limite da explicação da gramática, que não prevê uma língua dinâmica, em funcionamento, mas sim uma língua estática e homogênea. Assim, o que apresentamos nesse item, de forma sucinta, foram algumas das abordagens sobre a gramática que vêm sendo discutidas nas pesquisas que tem por base a lingüística. Não esgotamos, é claro, todas as possibilidades, nem mostramos todos os avanços e as contribuições que os estudos linguísticos já trouxeram para essa área da gramática: a sintaxe. Nosso objetivo foi, sobretudo, discutir alguns aspectos, ou melhor, fenômenos da língua que a gramática não dá conta de explicar. 4. Construções Coordenadas e Subordinadas 4.1 A abordagem da gramática tradicional Retomando o que já mencionamos no início do capítulo sobre a construção do período composto, e depois de ter estudado o que a gramática tradicional chama de análise interna (estudo dos termos essenciais, integrantes e acessórios) da oração, vamos nos dedicar agora ao estudo da oração complexa, através de palavras capaz de ocupar o lugar. Mas o lugar existe enquanto projeção histórica da enunciação do verbo. se o objeto tem características tão generalizantes, ele não adquire uma representação Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 63 isto é, do chamado período composto, que é constituído sempre por mais de uma oração. O modo como essas orações se articulam entre si é que a gramática chama de coordenação e subordinação. Assim, as orações consideradas autônomas, independentes do ponto de vista sintático e semântico, isto é, que não funcionam como termos de outra oração, podendo apenas uma enriquecer o sentido da outra em sua totalidade, são chamadas de orações coordenadas. E as orações cuja existência depende de uma oração principal, não sendo, portanto, independentes do ponto de vista sintático e semântico, são chamadas de orações subordinadas. Há, ainda, os períodos que são compostos por coordenação e subordinação ao mesmo tempo, como no exemplo abaixo: 62) (...) os advogados estarão às portas das cadeias/ para tentar discriminar ora os bandidos impiedosos do tráfico e das ruas - que acuam/ e assaltam/ e ferem/ e torturam/ e matam - , ora os grandes chefões disfarçados de políticos - que roubam/ e desviam/ e corrompem/ e exploram a população ignorante ou passiva (Trecho retirado do texto “Vítima produtoras da indiferença”, de autoria da professora Maria Ilda Zirondi, publicado no site da Revista Caros Amigos: http://carosamigos.terra.com.br/. Acesso em: 15 jul. 2009) Nesse exemplo, temos uma oração principal - 1) Os advogados estarão às portas das cadeias - ao qual se integra uma oração subordinada – 2) para tentar discriminar ora os bandidos impiedosos do tráfico e das ruas (...) ora os grandes chefões disfarçados de políticos. Observem que essa oração subordinada está ainda dividida, sendo intercalada por outras duas orações subordinadas – 3 e 8: • 3) que acuam - a qual se ligam quatro orações coordenadas – 4) e assaltam; 5) e ferem; 6) e torturam; 7) e matam, cujo sujeito é “os bandidos impiedosos do tráfico e das ruas” da oração 2, e o objeto direto “a população ignorante ou passiva” da oração 11; • 8) que roubam - a qual se ligam mais três orações coordenadas – 9) e desviam; 10) e corrompem; 11) e exploram, cujo sujeito é “os grandes chefões disfarçados de políticos” da oração 2, e o objeto direto “a população ignorante ou passiva” da oração 11. Verificamos, a partir da análise acima, que a oração principal é a única que não exerce nenhuma função sintática em outra oração do período, o que é sua característica essencial. http://carosamigos.terra.com.br/ Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 64 Complexo não é mesmo? Mas é assim que nos comunicamos no dia a dia, através de textos e períodos complexos, e não por frases simples e isoladas. Voltaremos a essa discussão na seção 4.2. 4.1.1 Orações Coordenadas Segundo Cunha e Cintra (2001), as orações coordenadas dividem-se em: a) Assindéticas São orações simplesmente justapostas, apresentadas uma ao lado da outra sem qualquer conectivo que as enlace. Vamos retomar aqui um exemplo já trabalhado na seção 3.1.2. Vejamos: 23) SP anuncia 1ª morte por gripe; menina é 2ª vítima no País (site do Terra – Notícias – acesso em: 10 jul. 2009) Nesse exemplo, temos duas orações justapostas que mantêm relação semântica entre si, mas possuem independência sintática. b) Sindéticas As orações sindéticas são ligadas por uma conjunção . Assim, conforme a conjunção coordenativa que a inicia, classificam-se em: • Sindéticas Aditivas → se a conjunção é aditiva. CONJUNÇÃO COORDENATIVA As principais conjunções coordenativas são: e, nem (aditivas); mas, porém, contudo, entretanto, todavia, no entanto (adversativas); ou, ora...ora, quer...quer, seja...seja, nem...nem (alternativas); logo, pois, portanto, por isso, assim (conclusivas); que, porque, pois, porquanto (explicativas). Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto65 63) Menina de 2 anos liga para emergência e salva vida da mãe. (site do Terra – notícias – acesso em: 16 jul. 2009) 64) Os estudantes leem muitos livros e aprendem pouco. • Sindéticas Adversativas → se a conjunção é adversativa. 65) Cientistas publicaram a primeira versão do genoma humano há quase uma década, mas a caça aos genes provocadores de doença continua. (Revista Scientific American, edição de julho de 2009) • Sindéticas Alternativas → se a conjunção é alternativa. 66) A bioluminescência dos fungos pode servir para alertar predadores de suas defesas, ou para atrair predadores de animais fungívoros, preservando suas linhagens. (Revista Scientific American, edição de julho de 2009, reportagem “O universo luminoso dos fungos bioluminescentes”) • Sindéticas Conclusivas → se a conjunção é conclusiva. 67) A agricultura também acelera a erosão do solo, pois a lavoura e o cultivo alteram e expõem sua estrutura; assim, mais fósforo é transportado com o escoamento. (Revista Scientific American, edição de julho de 2009, reportagem “Solos Desnutridos”) No exemplo acima, temos, na verdade, três orações coordenadas: a primeira explicativa, a segunda aditiva e a terceira conclusiva. b.5) Sindéticas Explicativas → se a conjunção é explicativa. 68) O projeto é considerado adicional porque a perspectiva de venda das compensações motivou os investidores. (Revista Scientific American, edição de julho de 2009, em reportagem que fala sobre a ineficiência do sistema de créditos de carbono para reduzir sua emissão – Mecanismo ilusório) Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 66 4.1.2 Orações Subordinadas Como já mencionado na introdução desse capítulo, a oração subordinada funciona como termo (essencial, integrante ou acessório) de outra oração. Assim, uma oração simples, como a apresentada abaixo, 69) Livro traz histórias surpreendentes de Romário. (site do Terra – notícias – acesso em: 17 jul. 2009) Poderia ser transformada em período composto, e o adjunto adnominal (termo acessório) surpreendentes passaria a ser uma oração subordinada, que exerceria a mesma função do termo substituído na oração principal, isto é, de ajunto adnominal. 70) Livro traz histórias que surpreendem de Romário. Portanto, conforme conclusão apresentada por Cunha e Cintra (2001, p. 600), As orações subordinadas, conforme classificação apresentada por esses mesmos gramáticos, baseados na tradição gramatical brasileira, dividem-se em: A) ORAÇÕES SUBORDINADAS SUBSTANTIVAS Essas orações vêm normalmente introduzidas pela conjunção integrante que (às vezes, por se) e, conforme o seu valor sintático, denominam-se: • Subjetivas → quando exercem a função de sujeito. simples. Distingue-se apenas o fato de os termos (essenciais, integrantes e acessórios) deste serem representados naquele por orações. o período composto por subordinação é, na essência, equivalente a um período Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 67 71) É inquestionavelmente verdade que a internet pôs fim ao domínio absoluto de Gutenberg (Exemplo adaptado do editorial da Revista Scientific American, edição de julho de 2009, assinado por Ulisses Capazzoli) • Objetivas diretas → quando exercem a função de objeto direto. 72) Isso equivale a dizer que a palavra impressa tem vida longa, tanto sob a forma de livros quanto revistas (...). (Exemplo retirado do editorial da Revista Scientific American, edição de julho de 2009, assinado por Ulisses Capazzoli) • Objetivas indiretas → quando exercem a função de objeto indireto. 73) Os senadores se esquecem de que devem explicações de seus atos aos eleitores. • Completivas nominais → quando exercem a função de complemento nominal. 74) A Scientific American Brasil só existe porque desfruta de leitores exigentes, patrimônio de que nem todas as outras publicações dispõem. (Exemplo adaptado do editorial da Revista Scientific American, edição de julho de 2009, assinado por Ulisses Capazzoli) • Predicativas → quando exercem a função de predicativo. 75) A verdade é que os cientistas ainda não têm certeza sobre a alimentação dos terremotos entre placas. (Exemplo adaptado da reportagem “Mecanismo Ilusório”, publicada na Revista Scientific American, edição de julho de 2009) • Apositivas → quando exercem a função de aposto. 76) É preciso que os senadores reconheçam ao menos isto: que a ética deve ser prioridade em seus mandatos. • Agentes da passiva → quando exercem a função de agente da passiva. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 68 77) As ordens no Senado são dadas por quem tem poder. B) ORAÇÕES SUBORDINADAS ADJETIVAS Essas orações vêm normalmente introduzidas por um pronome relativo, e exercem a função de adjunto adnominal de um substantivou ou pronome . Classificam-se em: • Restritivas → como o nome indica, restringem, limitam, precisam a significação do substantivo ou pronome antecedente (Cf. Cunha e Cintra, 2001). São indispensáveis ao sentido da oração, ligando-se ao antecedente sem pausa. Por isso, não se separam, na escrita, por vírgula. 78) Terremotos que se originam nessas falhas podem ser extremamente poderosos. (Exemplo retirado da reportagem “Mecanismo Ilusório”, publicada na Revista Scientific American, edição de julho de 2009) • Explicativas → acrescentam ao antecedente uma qualidade acessória, esclarecendo melhor a sua significação, à semelhança de um aposto. Não são, portanto, indispensáveis ao sentido da frase. A pausa que as separam do antecedente é indicada, na escrita, por vírgula. 79) Diferentemente dos cães, que existem em uma vasta gama de tamanhos, formas e temperamentos, os gatos domésticos são relativamente homogêneos, diferindo principalmente quanto à pelagem. (Revista Scientific American, edição de julho de 2009) ORAÇÃO ADJETIVA Cunha e Cintra (2001, p. 602) esclarecem que a oração adjetiva pode, como todo adjunto adnominal, depender de qualquer termo da oração, cujo núcleo seja um substantivo ou um pronome: sujeito, predicativo, complemento nominal, objeto direto, objeto indireto, agente da passiva, aposto e, até mesmo, vocativo. Assim, no exemplo 68, já mencionado - Livro traz histórias que surpreendem de Romário – a oração adjetiva que surpreendem está funcionando como adjunto adnominal do objeto direto histórias. Ou, neste exemplo citado pelos gramáticos – Renego de ti, demônio, que me estavas a tentar – a oração adjetiva que me estavas a tentar está funcionando como adjunto adnominal do vocativo demônio. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 69 Nesse exemplo, observamos que a oração adjetiva - que existem em uma vasta gama de tamanhos, formas e temperamentos - acrescenta uma explicação ao sentido do termo antecedente – cães. C) ORAÇÕES SUBORDINADAS ADVERBIAIS Funcionam como adjunto adverbial de outras orações e são, normalmente, introduzidas por uma das conjunções (exceto as integrantes que, como vimos, introduzem as orações substantivas). Classificam-se, assim, conforme Cunha e Cintra (2001), de acordo com a conjunção que as introduz: As principais conjunções subordinativas são, segundo a Nomenclatura gramatical Brasileira (NGB): - Causais: porque, pois, porquanto, como (= porque), pois que, por isso que, já que, uma vez que, visto que, visto como, que etc - Concessivas: embora, conquanto, ainda que, mesmo que, posto que, bem que, se bem que, por mais que, por menos que, apesar de que, nem que, que etc. - Condicionais: se, caso, contanto que, salvo se, sem que (= se não), dado que, desde que, a menos que, a não ser que etc. - Finais: para que, a fim de que, porque(= para que). - Temporais: quando, antes que, depois que, até que, logo que, sempre que, assim que, desde que, todas as vezes que, cada vez que, apenas, mal. - Consecutivas: que, de forma que, de maneira que, de modo que, de sorte que, etc. - Comparativas: que, do que (depois de mais, menos, maior, menor, melhor e pior), qual (depois de tal), quanto (depois de tanto), como, assim como, bem como, como se, que nem. - Integrantes: que, se. - Conformativas: conforme, segundo, consoante etc. - Proporcionais: à medida que, ao passo que, à proporção que, enquanto, quanto mais...mais, quanto mais...tanto mais, quanto mais...menos, quanto mais...tanto menos, quanto menos...menos, quanto menos...tanto menos, quanto menos...mais, quanto menos...tanto mais. CONJUNÇÕES SUBORDINATIVAS Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 70 • Causais → quando introduzidas por uma conjunção subordinativa causal, como em: 80) Como os policiais civis não poderiam prender o suspeito no país vizinho, esperaram por quatro dias que ele cruzasse a fronteira para realizar a prisão em Foz do Iguaçu (PR), com apoio da Polícia Federal. (site do Terra – notícias – acesso em: 17 jul. 2009) • Concessivas → quando introduzidas por uma conjunção subordinativa concessiva, como em: 81) Embora tenha havido muitas discussões a respeito dos possíveis resultados catastróficos da Influenza AH5N1, até agora, a pandemia não ocorreu. (Exemplo retirado do texto “Ameaças e defesas, numa pandemia”, de autoria do médico Francisco Oscar de Siqueira França, publicado na Revista Scientific American, edição de julho de 2009) • Condicionais → quando introduzidas por uma conjunção subordinativa condicional, como em: 82) Se não agirmos para conservar o fósforo, o futuro verá um colapso na agricultura. (Período adaptado da chamada da reportagem “Solos Desnutridos”, publicada na Revista Scientific American, edição de julho de 2009) • Finais → quando introduzidas por uma conjunção subordinativa final, como em: 83) Para que o fantasma de uma tragédia como essa não assombre o resto da vida de uma criança, é preciso cuidado na hora de abordar o assunto. (site do Terra – notícia falando da tragédia com o avião da Tam, dois anos atrás – acesso em: 17 jul. 2009) • Temporais → quando introduzidas por uma conjunção subordinativa temporal, como em: 84) Depois de introduzirem o vírus modificado em camundongos, os pesquisadores verificaram que os roedores se tornaram imunes a infecção, quando foram expostos ao poliovírus ativo. (Revista Scientific American, edição de julho de 2009) Nesse exemplo, verificamos que há duas orações subordinadas adverbiais temporais compondo o período. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 71 • Consecutivas → quando introduzidas por uma conjunção subordinativa consecutiva, como em: 85) Os senadores fazem discursos de modo que impressionam a população. • Comparativas → quando introduzidas por uma conjunção subordinativa comparativa, como em: 86) (...) não só se pode ouvir com a boca, como se pode sentir com os ouvidos. (Exemplo retirado de uma reportagem sobre os cinco sentidos, intitulada “Uma boa esticada”, publicada Revista Scientific American, edição de julho de 2009) • Conformativas → quando introduzidas por uma conjunção subordinativa conformativa, como em: 87) De acordo com boletim médico divulgado nesta manhã, Severino está na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), mas está consciente. (Disponível em: site do Terra – notícias – acesso em 17 jul. 2009) • Proporcionais → quando introduzidas por uma conjunção subordinativa proporcional, como em: 88) As tempestades podem se tornar mais intensas à medida que o planeta se aquece. (Revista Scientific American, edição de julho de 2009) 4.1.3 Orações reduzidas Além das orações subordinadas que acabamos de estudar – as chamadas orações desenvolvidas - as quais são sempre introduzidas por um nexo subordinativo, a NGB propõe a classificação das orações subordinadas reduzidas, que apresentam o verbo em uma das formas nominais: infinitivo, gerúndio ou particípio. Vejamos: 89) Um grupo de cientistas abnegados vasculha dejetos para desvendar nosso comportamento (Revista Superinteressante, dezembro de 2008). Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 72 89(a) Um grupo de cientistas abnegados vasculha dejetos para que nosso comportamento seja desvendado. No exemplo 89, temos uma oração substantiva objetiva indireta reduzida de infinitivo, enquanto em 89.a, temos a mesma oração em sua forma desenvolvida. Temos, assim, conforme classificação apresentada por Cunha e Cintra (2001), as orações reduzidas de: a) infinitivo Podem ou não vir regidas de preposição e, como as desenvolvidas, classificam-se em substantivas (subjetivas, objetivas diretas, objetivas indiretas, completivas nominais, predicativas e apositivas), adjetivas (pouco frequentes no português do Brasil) e adverbiais (causais, concessivas, condicionais, consecutivas, finais e temporais). Vejamos alguns exemplos: 22) Você tem muitas chances de gastar e não pagar nada. (Substantiva completiva nominal reduzida de infinitivo) 90) Para evitar o trânsito e ainda proporcionar uma experiência turística agradável, o ideal é se locomover pelo topo dos edifícios (Adverbial final reduzida de infinitivo) (Revista Superinteressante, dezembro de 2008) 91) Ninguém sabe exatamente quantas sementes são necessárias para prejudicar sua saúde. (Substantiva objetiva indireta reduzida de infinitivo) (Revista Aventuras na História, abril de 2009) 92) Na verdade, a carambola chegou ao Brasil há menos de 200 anos, depois de percorrer um longo caminho repleto de aventuras e perigos. (Adverbial temporal reduzida de infinitivo) (Exemplo adaptado da reportagem “Os biopiratas do Jardim do Éden”, publicada na Revista Aventuras na História, abril de 2009) b) gerúndio Podem ser adjetivas ou adverbiais. As adverbiais temporais são as mais frequentes, mas podem também, em alguns casos, equivaler a subordinadas adverbiais causais, concessivas ou condicionais. Vejamos alguns exemplos: Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 73 7) Acreditava-se que doenças venéreas e a dependência de álcool, nicotina e morfina degeneravam a espécie, gerando linhagens diferentes. (Adjetiva reduzida de gerúndio) (Disponível em: Revista Superinteressante, maio 2009) 93) Segundo outros relatos, o velho jagunço foi o último dos quatro a morre, enfrentando os inimigos apenas com um machado. (Adverbial temporal reduzida de gerúndio) (Revista Aventuras na História, abril de 2009) 94) Mesmo não tendo mais forças, Antonio Conselheiro lutou até o fim. (Adverbial concessiva reduzida de gerúndio) 95) Uma visão de curto prazo, não levando em conta as lições do passado, conduz a soluções igualmente imediatistas. (Adjetiva explicativa reduzida de gerúndio) (Exemplo adaptado do depoimento de Laurentino Gomes, publicado na Revista Aventuras na História, edição de abril de 2009) c) particípio Podem, como as reduzidas de gerúndio, ser adjetivas ou adverbiais. Também são mais freqüentes as adverbiais temporais, mas ocorrem também as adverbiais causais, concessivas e condicionais. Vejamos alguns exemplos: 96) Lançada em 1959, numa época em que a mulher se limitava a cuidar da casa, Barbie era Jovem, solteira e sem filhos – a primeira boneca adulta da história do brinquedo. (Adverbial temporal reduzida de particípio) (Revista Aventuras na História, abril de 2009) 97) Considerada por muito historiadores como o conflito mais decisivo da Guerra Civil Espanhola, a batalha do Ebro contou com a participação de dez brasileiros. (Adverbial causalreduzida de particípio) (Revista Aventuras na História, abril de 2009) 98) Concluída há 70 anos, a luta dos republicanos contra os nacionalistas do general Francisco Franco (1892 – 1975) ficou marcada pela participação expressiva de voluntários estrangeiros. (Adverbial temporal reduzida de particípio) (Revista Aventuras na História, abril de 2009) Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 74 4.2 Outras abordagens Pensar a organização do período composto exige uma complexidade maior do que identificar funções sintáticas no período simples. Por isso, alguns gramáticos, como Bechara (2009), preferem chamar o período composto por subordinação de orações complexas. Diz ele: Assim, num período como o exemplo já apresentado - 71) É inquestionavelmente verdade que a internet pôs fim ao domínio absoluto de Gutenberg – Bechara chama o que de transpositor. Dessa forma, o que é nomeado por Cunha e Cintra (como já vimos) e pela gramática tradicional como oração principal e oração subordinada, é denominado por esse gramático de oração complexa e oração transposta. No entanto, embora a nomenclatura seja diferente da gramática tradicional, a função sintática e a classificação das orações transpostas em substantivas, adjetivas ou adverbiais continua a mesma, não dando conta também do funcionamento da língua em uso. Se, como dissemos acima, a organização das orações complexas (períodos compostos) exige uma complexidade maior do que a organização do período simples, por outro lado, elas representam melhor a língua em funcionamento, já que não nos comunicamos e, principalmente, não escrevemos textos utilizando somente períodos simples. O período apresentado no exemplo 62 – (...) os advogados estarão às portas das cadeias/ para tentar discriminar ora os bandidos impiedosos do tráfico e das ruas - que acuam/ e assaltam/ e ferem/ e torturam/ e matam -, ora os grandes chefões disfarçados de políticos - que roubam/ e desviam/ e corrompem/ e exploram a população ignorante ou passiva - é uma indicação dessa complexidade, onde articulam-se, intercalam-se, no mesmo período, diferentes orações subordinadas e coordenadas. E, muitas vezes, quando lemos um texto como o abaixo, fica difícil pensarmos e identificarmos todas as orações presentes nele, segundo a complexos, representados sob forma de outra oração. Só haverá orações ou períodos compostos quando houver coordenação. Temos sim orações complexas, isto é, orações que têm termos determinantes ou argumentais Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 75 classificação proposta pela gramática. Tente, durante a leitura do texto, fazer o exercício de classificar todas as orações coordenadas e subordinadas presentes nele. Dono de empresa nega ter trabalhado para Sarney em serviço declarado Na prestação de contas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) da candidatura de José Sarney (PMDB-AP) ao Senado, em 2006, três notas, somando o valor de R$ 174,6 mil, podem ser considerados questionáveis. Mesmo com a declaração, o proprietário da empresa que teria prestado o serviço negou que tenha trabalhado para a campanha de Sarney. De acordo com dados disponíveis no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o trabalho executado com o dinheiro teria sido "publicidade por carro de som". As informações são do jornal O Globo. A empresa que teria sido contratada fica em São Luís, capital maranhense, e não no Amapá, Estado onde Sarney se reelegeu. A prestadora de serviços, que constrói trios elétricos e aluga palcos, funciona no mesmo endereço que uma distribuidora de medicamentos e de uma empresa de pesquisas eleitorais. O proprietário da empresa, Carlos Cavalcanti, negou em entrevista ao jornal nesta quinta que tenha trabalhado para a campanha de Sarney ao Senado. Ele alega que trabalhou para a campanha da filha do senador, Roseana Sarney, que disputou e perdeu o cargo ao governo do Maranhão, em 2006. Ainda de acordo com o jornal, na prestação de contas de Roseana, aparecem cinco notas da empresa, com serviços de publicidade feita por carros de som, somando R$ 520 mil. Segundo o TSE, a Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 76 Redação Terra - disponível em <http://noticias.terra.com.br/brasil/>. Acesso em: 24 jul. 2009 Tentou? Difícil, não é mesmo? E por que será é tão difícil? Porque, quando lemos ou escrevemos um texto, não nos preocupamos com a estrutura sintática das orações que o organizam e sim com o sentido. Isso não significa, no entanto, que o estudo da sintaxe não tenha importância para a organização do texto e também para a construção do seu sentido. Como nos mostra Leandro Ferreira (2000, p. 96 – 97), a sintaxe tem uma organização implícita, que nos permite formular algumas proposições: a) não há língua sem sintaxe, pois a organização das palavras não é jamais aleatória. Basta relembrarmos o exemplo 59, discutido na seção 3.2; b) as relações sintáticas não são da mesma ordem das que se observam nos conjuntos matemáticos; c) não há relação biunívoca entre natureza e função dos elementos; d) o fato de haver numa língua um inventário limitado de funções (que significam de forma diferente dependendo do enunciado em que são empregadas) garante ao mesmo tempo o funcionamento da língua e a possibilidade de analisá-la. campanha de Roseana custou R$ 6,9 milhões. Ainda segundo o jornal, depois de insistir, o proprietário da empresa teria voltado atrás e dito que deveria ter enviado "dois carros para a campanha Sarney". A campanha de Sarney custou, segundo declarou ao TSE, R$ 1,6 milhão. PARA SABER MAIS Para saber mais sobre o tratamento dado por Bechara às orações coordenadas e subordinadas, leia o capítulo “Orações complexas e grupos oracionais: a subordinação e a coordenação. A justaposição”, de sua gramática (BECHARA, E. Moderna gramática portuguesa. 37ª ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009, p. 462 – 539). http://noticias.terra.com.br/brasil/ Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 77 Além dessa organização implícita, a autora também fala de uma construção teórica para a sintaxe, cuja “divisão essencial se dá em conseqüência de uma análise da língua comportando um plano do significante e um plano do significado, definidos por suas relações recíprocas” (LEANDRO FERREIRA, 2000, p. 97). Em outras palavras, pela forma de organização interna da língua, ou da dimensão orgânica da língua (ver seção 3.2), temos acesso ao plano do sentido. E somente a explicação dada pela gramática tradicional à sintaxe não dá conta desse segundo plano. Vejamos, então, agora, algumas abordagens de perspectivas linguísticas ao processo de coordenação e subordinação. Segundo Neves (2007, p. 226), Considerando esses aspectos, as propostas funcionalistas questionam o corte rígido entre subordinação e coordenação. Na perspectiva da gramática tradicional, como vimos, o conceito de coordenação implica independência sintática, enquanto na subordinação, a oração principal depende da função sintática apresentada pela oração subordinada. Os estudos funcionalistas mostram que o amplo bloco de construções complexas que recebem o nome de subordinação pela gramática “não pode ser simplesmente e indiscriminadamente definido como designador de construções em que uma oração ‘exerce função sintática em outra’ ” (NEVES, 2007, p. 227). Retomemos uma estrofe do poema José, de Carlos Drummond de Andrade uma análise de base funcionalista penetra a organização dos enunciados para avaliá- los não apenas sob diversos níveis (predicacional; proposicional; ilocucional), mas também sobre os diversos ângulos que envolvem a atividade lingüística (textual/informacional; interacional),e o faz sempre com incorporação dos diversos componentes (sintático; semântico; pragmático). Se você gritasse, se você gemesse, se você tocasse a valsa vienense, se você dormisse, Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 78 Nessa estrofe, verificamos que seis dos oito versos que a compõem iniciam com a conjunção subordinada se, o que indicaria, segundo a gramática tradicional, uma oração subordinada adverbial condicional, que deveria exercer a função sintática de adjunto adverbial e vir acompanhada de uma oração principal para completar o seu sentido. No entanto, não é isso que verificamos funcionando nessa estrofe do poema José, uma vez que não há uma oração principal à qual essas construções (se você gritasse, se você gemesse...) estão subordinadas. Poderíamos dizer então que Carlos Drummond de Andrade feriu os princípios da norma culta padrão da língua portuguesa? Não, essa estrutura demonstra o que apontamos acima de que é preciso questionar o corte rígido, proposto pela gramática, entre coordenação e subordinação. Além disso, certamente, ao produzir essa estrofe com esse tipo de construção, Drummond tinha a intenção de produzir um determinado efeito de sentido no seu leitor. E essa intenção é da ordem da pragmática. Observemos que, depois da última construção apresentada – se você morresse... – ele utiliza aspas, deixando ao leitor as possibilidades de preenchimento do sentido. Por outro lado, se analisarmos o poema como um todo e essa estrofe em especial, poderíamos propor a seguinte paráfrase como uma possibilidade de leitura: mesmo você chorando, gemendo, gritando etc, você não morre José, porque você é forte e precisa passar por isso. Halliday (1985, apud Neves 2007, p. 228), na sua proposta de gramática funcional, põe em xeque a atribuição de um caráter decisivo à dicotomia coordenação X subordinação. Para esse autor, a organização dos blocos enunciativos complexos conjuga-se sobre dois eixos: se você cansasse, se você morresse… Mas você não morre, você é duro, José ! PARA SABER MAIS Para saber mais sobre as construções condicionais, leia o estudo de Maria Helena de Moura Neves, publicado no Vol. VII, da Gramática do Português Falado (editora da Unicamp, 1999). Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 79 1) um sistema tático, que diz respeito à interdependência entre os elementos, e que se resolve em parataxe (relação entre elementos de igual estatuto) e (relação entre elementos de diferente estatuto); 2) um sistema , que se refere à relação entre os processos, desvinculada do modo de organização e de estruturação do enunciado, e que se resolve por uma “expansão” ou por uma “projeção”, relações que cumprem diverso papel semântico-funcional. HIPOTAXE E PARATAXE A hipotaxe consiste na possibilidade de uma unidade correspondente a um estrato superior poder funcionar num estrato inferior, ou em estratos inferiores. Ou, em outras palavras, “um sistema que sustenta uma relação de ‘dominação’ entre um elemento modificador, e, portanto, ‘dependente’, e um modificado, e, portanto, ‘dominante’” (NEVES, 2007, p. 228). Já, a parataxe consiste na propriedade mediante a qual duas ou mais unidades de um mesmo estrato funcional podem combinar-se nesse mesmo nível para constituir, no mesmo estrato, uma nova unidade suscetível de contrair relações sintagmáticas próprias das unidades simples deste estrato. Ou, em outras palavras, “um sistema que sustenta uma relação de simples ‘continuação’ entre elementos que vêm um em seguida do outro” (NEVES, 2007, p. 228). SISTEMA LÓGICO-SEMÂNTICO Conforme discussão apresentada por Neves (2007, p. 228), a proposta do sistema lógico semântico apresentado por Halliday assim se caracteriza: a) A expansão se dá: a.1) por elaboração (uma oração elabora o significado de outra, especificando-a; o modelo de conjunção é isto é, e o sinal que identifica a relação é =); a.2) por extensão (uma oração amplia o significado da outra, acrescentando algo novo a ela; a conjunção típica desse processo é e, e o sinal que identifica a relação é +); a.3) por realce (uma oração realça o significado da outra, qualificando-a quanto a tempo, lugar, modo, causa ou condição; as conjunções típicas são assim e então, e o sinal que identifica a relação é x); b) Na projeção uma oração se projeta sobre a outra, funcionando como representação da própria representação linguística: ou se expressa uma locução (identificada pelo sinal “...”) ou se expressa uma Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 80 Com base nessa proposta de Halliday e outros autores de cunho funcionalista, alguns estudos vêm sendo realizados por linguistas brasileiros, como o projeto da Gramática do Português Falado, que já possui vários volumes publicados, e trabalha com dados coletados no NURC (Norma Urbana Culta). A base de dados do NURC é composta de entrevistas, gravadas com informantes cultos, falantes de cinco capitais brasileiras: Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Recife. No volume VII da Gramática do Português Falado, encontramos uma parte de estudos só sobre sintaxe. Por exemplo, o professor Roberto Gomes Camacho apresenta um estudo sobre as Estruturas coordenadas aditivas. Nesse artigo, Camacho (1999), após tratar do uso da conjunção de termos, na coordenação simples, distingue a coordenação simétrica da assimétrica para tratar da atuação dos juntivos na oração, que é o que nos interessa no momento. Quando a relação é simétrica, admite-se mudança potencial na ordenação dos membros coordenados, como em: 99) agora, uma escola se compõe de um... um... local em que haja condições do estudante ter aula e do professor dar a sua aula (Exemplo retirado de Camacho – DID-SSA – 231:368) Nesse exemplo, se alterarmos a ordem dos elementos na oração, não há prejuízo de sentido para o enunciado. Vejamos: 99(a) agora, uma escola se compõe de um... um... local em que haja condições do professor dar a sua aula e do estudante ter aula. ‘idéia’ (identificada pelo sinal ‘...’). Ambas são representas pelo discurso direto se na parataxe, e pelo discurso indireto, se na hipotaxe. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 81 Já, na relação assimétrica, não é possível essa mudança dos elementos coordenados. Vejamos: 100) em função da necessidade de eu assegurar...a caça... e continuar podendo comer (Exemplo retirado de Camacho – EF-SP – 405:180) Nesse exemplo, não há, pela relação de sentido estabelecida, como invertermos a ordem dos elementos coordenados, já que continuar podendo comer é conclusão de assegurar a caça. Assim, observamos que a relação de sentido estabelecida pela juntivo e, nesse caso, não é aditiva, como prevê a gramática tradicional, mas sim conclusiva. O mesmo ocorre com o exemplo já apresentado - 64) Os estudantes leem muitos livros e aprendem pouco – em que a relação de sentido é adversativa e não . Essas outras relações de sentido indicam, como diz Camacho (1999), a função marcadamente textual da ligação entre as orações, indo ao encontro do que Halliday & Hasan (1976) propõem em relação à subcategorização das . Esses autores tratam a conjunção e como uso coesivo e aditivo, com base no escopo da ocorrência da sentença. Para aprender um pouco mais sobre os valores semânticos possíveis para o juntivo e, observe esses outros exemplos apresentado por Camacho (1999, p. 397): JUNTIVO E Camacho trata dos outros valores semânticos do juntivo e no item 2.3 do seu artigo. CONJUNÇÕES Halliday & Hasan (1976) classificam as conjunções/junções em quatro tipos: aditiva (incluindo alternativa), adversativa, causal (incluindorazão, propósito, conseqüência, resultado, etc) e temporal. a) Ana caiu num sono profundo e sua cor normal retornou aos poucos. b) Passamos o dia todo em São Paulo e fui visitar a Bienal. c) Pedro jogou ração envenenada no quintal e o cacho do vizinho morreu. d) Pedro pôs ração estragada no prato e seu cachorro morreu. e) Me dê a sua foto e eu lhe dou a minha. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 82 restritivas. f) Essas são as pegadas da onça e ela passou por aqui há pouco tempo. O mesmo princípio de relação simétrica ou assimétrica dos elementos na coordenação vale para a conjunção ou, ou melhor, para a relação de disjunção entre as orações, como mostra Pezatti (1999), em seu artigo Estruturas coordenadas alternativas, também publicado no Vol. VII da Gramática do Português Falado. Vejamos: 66) A bioluminescência dos fungos pode servir para alertar predadores de suas defesas, ou para atrair predadores de animais fungívoros, preservando suas linhagens. Nesse exemplo, já apresentado anteriormente, a inversão da ordem dos elementos coordenados na oração não altera o sentido. Trata-se, portanto, de relação simétrica. Já, na relação assimétrica, não é possível essa inversão, como em: 101) para então...ele dizer... se há malignidade ou não nesse nódulo (Exemplo retirado de Pezatti – EF-SSA-49:90) Pezzatti (1999, p. 435) apresenta ainda, entre diversos usos da conjunção ou, um “uso especificamente discursivo, fora do âmbito da coordenação propriamente dita”, que apresentam uma função de retificação, como em: 102) num posso entretanto responder essa questão...porque foge um pouco ao meu setor sei entretanto que as eleições...ou que o período presidencial...é mantido...durante três anos... Em relação às orações subordinadas, as adverbiais tem sido objeto privilegiado de pesquisa pelo fato de que, NEVES, 2007, p. 232 tradição lhes atribui, nos mesmos moldes em que são tratadas as orações substantivas e as adjetivas dificilmente pode ser sustentada, para essas orações, a condição de ‘subordinadas’ que a Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 83 As orações adverbiais, segundo proposta funcionalista de Dik, funcionam como satélites, termos que não são argumentos do predicado, mas trazem informações adicionais em qualquer das camadas de organização dos enunciados: na predicação, na proposição, no ato de fala (Cf. Neves, 2007). Assim, as orações temporais constituem satélite de predicação, enquanto as concessivas e as condicionais constituem satélites de incidência. Vejamos exemplo apresentado por Neves (p. 233): 103) Embora muitas mulheres índias com prazer se entregassem aos brancos, e índios se tornassem seus soldados, muitas tribos guerrearam até sentirem não haver outra saída sena a retirada para o interior (NOR) Nesse exemplo, até sentirem não haver outra saída sena a retirada para o interior funciona como satélite temporal que incide sobre a predicação central - muitas tribos guerrearam – e embora muitas mulheres índias com prazer se entregassem aos brancos, e índios se tornassem seus soldados funciona como satélite concessivo, incidindo sobre toda a proposição. Retomemos o exemplo 81. Se ele fosse assim reescrito, 81(a) Embora tenha havido muitas discussões a respeito dos possíveis resultados catastróficos da Influenza AH5N1, ela só poderá ser considerada pandemia quando o Ministério da Saúde divulgar números superiores a cinco mil infectados. Teríamos o satélite temporal – quando o Ministério da Saúde divulgar números superiores a cinco mil infectados – incidindo sobre a predicação central – ela só poderá ser considerada pandemia – enquanto o satélite concessivo - Embora tenha havido muitas discussões a respeito dos possíveis resultados catastróficos da Influenza AH5N1 – incide sobre toda a proposição, inclusive o satélite temporal. Essas orações satélites são termos opcionais, portanto, particularmente ligadas a escolhas do falante, que vai adequar a ordem dos elementos conforme a função enunciativa que pretende atingir. Por isso, Neves (2007, p. 234) afirma que “a ordem é altamente pertinente, constituindo um fator de obtenção de diferentes efeitos, tanto semântica como pragmaticamente”. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 84 Retomemos dois exemplos já apresentados: 82) Se não agirmos para conservar o fósforo, o futuro verá um colapso na agricultura. (Período adaptado da chamada da reportagem “Solos”) 88) As tempestades podem se tornar mais intensas à medida que o planeta se aquece. (Revista Scientific American, edição de julho de 2009) Se invertêssemos a ordem do satélite concessivo e temporal, respectivamente, teríamos: 82(a) O futuro verá um colapso na agricultura se não agirmos para conservar fósforo. 88(a) À medida que o planeta se aquece, as tempestades se tornam mais intensas. A reescrita desses dois exemplos nos mostra que houve uma reorientação temática. Em 82, o tema era a conservação do fósforo que passa a ser colapso na agricultura em 82.a; em 88, o tema passa de tempestades intensas a aquecimento do planeta. E, ao mudar a orientação temática desses enunciados, produzem-se também outros efeitos de sentido, que são de ordem pragmática. Esses são apenas alguns dos aspectos tratados pelos estudos funcionalistas em relação às orações coordenadas e subordinadas. O que fizemos aqui nesse item foi apontar alguns caminhos para que você, estudante, aprofunde seus conhecimentos acerca dessa e outras abordagens linguísticas que tratem da sintaxe, a partir da leitura da bibliografia indicada. 5. Aspectos da topicalização Em linhas gerais, a pode ser considerada como um processo sintático em que um constituinte da oração é “deslocado” (ver seção 2.) para a esquerda, ou seja, para o início da oração. TOPICALIZAÇÃO Os resultados de análises sobre a “topicalização” na língua portuguesa variam conforme o quadro teórico adotado. Um dos primeiros estudos realizados sobre a topicalização no português e que permanece de Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 85 Para observamos a topicalização, precisamos considerar a ordem dos constituintes sintagmáticos na seqüência da oração. Sabemos que podemos construir um enunciado variando sua ordem, e que esse recurso traz implicações de ordem pragmática. Dessa forma, se tomamos como exemplo A mãe encontrou a boneca da menina no quintal estamos diante de uma construção declarativa com ordem Sujeito + Verbo + Objeto (S+V+O). De fato, essa é a ordem considerada mais neutra e, portanto, menos marcada pragmaticamente em nossa língua. Neutra porque não parece transparecer qualquer intenção de o falante chamar a atenção para um dos constituintes . Por ser considerada mais neutra, a ordem SVO é tomada como a básica na língua, de sorte que o português pode ser chamado de língua do tipo sujeito-verbo-objeto. Quando dizemos que o português é uma língua do tipo SVO estamos classificando-a a partir da identificação de uma propriedade lingüística que ela apresenta, baseados no critério . Com essa e outras propriedades lingüísticas verificadas conjugadamente, podemos classificar o português como sendo de um determinado tipo, em face de outras línguas tipologicamente semelhantes (queremos dizer, do mesmo tipo) ou distintas (ou seja, de outros tipos). fundamental importância para a reflexão do processo nessa língua, se intitula “O Tópico do Português do Brasil”, da pesquisadora Eunice Pontes (ver referência). Trata-se de um dos primeiros trabalhos que analisaram consistentemente a ocorrência da topicalização no português, avaliando o processo consoante diferentes abordagensteóricas e traçando seu paralelo com a ordem dos constituintes nessa língua, bem como com as modalidades escrita e falada. CONSTITUINTES Sabemos que também podemos apenas marcar a proeminência de um dos constituintes da frase através da curva entoacional. Entretanto, aqui estamos nos referindo a uma frase declarativa “padrão”, ou seja, uma que apresente uma ordem de constituintes considerada não-marcada do ponto de vista pragmático. Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 86 Seguindo esse raciocínio, ao retomarmos a construção acima, reproduzida abaixo, iremos considerá-la como uma oração sem tópico. Por outro lado, as construções “a”, “b” e “c”, abaixo, por não estarem na ordem básica, topicalizam diferentes sintagmas. Com isso, há uma proeminência das partes consideradas topicalizadas, sobre as quais se faz algum comentário: Ao examinarmos outra vez essas construções dadas acima, podemos, seguramente, considerá-las como bem formadas, no sentido do português padrão. Por outro lado, é possível também encontrar, além das três construções (“a”, “b” e “c”), formas alternativas de topicalização, como as que seguem em “d”, “e”, “f” e “g”: Como podemos observar nos dados acima, o deslocamento ocorre juntamente com outras modificações da estrutura não topicalizada. Nas três primeiras (“d”, “e” e “f”), encontramos a presença de um pronome que repete (duplica) o tópico, enquanto que em “g” há a falta, no constituinte tópico, da preposição “no”, que acompanha o locativo. Tais construções, do ponto de vista da norma culta, talvez TIPOLOGIA Tipologia é uma área do estudo linguístico que se ocupa com a verificação de como as línguas do mundo diferem e se assemelham entre si. Em seus resultados, podem-se encontrar as propriedades lingüísticas reputadas como universais linguísticos, ou seja, propriedades necessariamente/potencialmente presentes em qualquer língua. A mãe encontrou a boneca da filha no quintal a) A boneca da filha (tópico), a mãe encontrou no quintal b) Encontrou a boneca da filha no quintal (tópico), a mãe c) No quintal (tópico), a mãe encontrou a boneca da filha d) A boneca da filha (tópico), a mãe encontrou ela no quintal e) A mãe (tópico) ela encontrou a boneca da filha no quintal f) Da filha (tópico) a mãe dela encontrou a boneca no quintal g) Quintal (tópico), a mãe encontrou a boneca da filha Língua Portuguesa: Frase – Profas. Stella Telles e Evandra Grigoletto 87 sejam consideradas problemáticas, embora, do ponto de vista da língua, sejam totalmente válidas, dada a sua freqüência de ocorrência na fala coloquial, inclusive de variedades padrão do português. Sabemos que tradição gramatical brasileira, que se perpetua nas orientações prescritivas, vem sendo revista por alguns gramáticos, que começam a incorporar estudos atuais sobre a língua. Não obstante, esse processo é paulatino e, em certa medida, refratário, dado que a gramática normativa não se desvencilha facilmente de um passado de “estudo/ensino” da língua fundamentado na escrita literária encontrada sobretudo em clássicos do português. Assim, entendemos o porquê de as construções acima (de “d” a “g”) serem pouco freqüentes e rejeitadas na escrita, embora amplamente recorrentes na fala. Por fim, negar construções desse tipo, considerando-as mal formadas e inaceitáveis, é tomar uma postura valorativa e ingênua sobre a língua, pois não se pode negar seu percurso natural de mudança. Negar essas construções é, portanto, estabelecer uma crítica a partir de conhecimento bastante limitado, pautado em gramáticas normativas ou prescritivas, cujo propósito não é o de explicar como a língua funciona ou como ela pode ser considerada do ponto de vista tipológico. Sobre esse aspecto, vale salientar o fato de que há outras línguas que apresentam regularmente estruturas com proeminência de tópico e que exibem construções similares às fornecidas em “d”, “e”, “f” e “g”. Isso reforça ainda mais a ideia de que aquelas orações, muito freqüentes na fala do português, não devem ser interpretadas simples e inadvertidamente como desvios à norma, mas, ao contrário, devem sinalizar um comportamento estrutural recorrente em outras línguas do mundo. Essas considerações são relevantes para tomarmos ciência do vasto universo que ainda precisamos explorar sobre a língua, em face do muito que desconhecemos de nossa fala. Ademais, essas reflexões devem também nos estimular a descobrir sistematicamente o funcionamento do português, a partir de seus usos efetivos e variáveis. Com isso, poderemos melhor vencer certas interpretações cristalizadas e muitas vezes inadequadas acerca da realidade variável e dinâmica do português escrito e/ou falado.