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1 FACULDADE ÚNICA DE IPATINGA 2 Jeander Cristian da Silva Graduado em Letras (Licenciatura em Língua Portuguesa) pela UFMG e mestre em Estudos Linguísticos pela mesma instituição. Tem experiências na área de Linguística Teórica e Descritiva, pautando-se nos seguintes temas: Lexicologia e Toponímia. É autor de uma pesquisa sobre a origem do topônimo Betim, que denomina uma cidade na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Atua, na Faculdade de Letras da UFMG, como professor colaborador nas disciplinas História da Língua Portuguesa e Gramática Tradicional: Morfossintaxe da Língua Portuguesa e é estagiário docente no projeto Apoio Pedagógico, sendo responsável por ministrar cursos nas áreas de Sintaxe e Gramática Tradicional e mediar um ciclo de palestras sobre pesquisas nas áreas dos estudos linguísticos. É membro da Associação Brasil Soka Gakkai Internacional, uma ONG filiada a ONU e já presente em mais de 190 países, que luta pela Paz, Cultura e Educação mundial. PRÁTICA PEDAGÓGICA INTERDISCIPLINAR: SINTAXE 1ª edição Ipatinga – MG 2021 3 FACULDADE ÚNICA EDITORIAL Diretor Geral: Valdir Henrique Valério Diretor Executivo: William José Ferreira Ger. do Núcleo de Educação a Distância: Cristiane Lelis dos Santos Coord. Pedag. da Equipe Multidisciplinar: Gilvânia Barcelos Dias Teixeira Revisão Gramatical e Ortográfica: Izabel Cristina da Costa Revisão/Diagramação/Estruturação: Bárbara Carla Amorim O. Silva Bruna Luiza Mendes Leite Carla Jordânia G. de Souza Guilherme Prado Salles Rubens Henrique L. de Oliveira Design: Brayan Lazarino Santos Élen Cristina Teixeira Oliveira Maria Luiza Filgueiras Taisser Gustavo de Soares Duarte © 2021, Faculdade Única. Este livro ou parte dele não podem ser reproduzidos por qualquer meio sem Autorização escrita do Editor. Ficha catalográfica elaborada pela bibliotecária Melina Lacerda Vaz CRB – 6/2920. NEaD – Núcleo de Educação a Distância FACULDADE ÚNICA Rua Salermo, 299 Anexo 03 – Bairro Bethânia – CEP: 35164-779 – Ipatinga/MG Tel (31) 2109 -2300 – 0800 724 2300 www.faculdadeunica.com.br 4 Menu de Ícones Com o intuito de facilitar o seu estudo e uma melhor compreensão do conteúdo aplicado ao longo do livro didático, você irá encontrar ícones ao lado dos textos.Eles são para chamar a sua atenção para determinado trecho do conteúdo, cada um com uma função específica, mostradas a seguir: São sugestões de links para vídeos, documentos científicos (artigos, monografias, dissertações e teses), sites ou links das Bibliotecas Virtuais (Minha Biblioteca e Biblioteca Pearson) relacionados ao conteúdo abordado. Trata-se dos conceitos, definições ou afirmações importantes nas quais você deve ter um maior grau de atenção! São exercícios de fixação do conteúdo abordado em cada unidade do livro. São para o esclarecimento do significado de determinados termos/palavras mostradas ao longo do livro. Este espaço é destinado para a reflexão sobre questões citadas em cada unidade, associando-o a suas ações, seja no ambiente profissional ou em seu cotidiano. 5 SUMÁRIO A SINTAXE NA HISTÓRIA DOS ESTUDOS LINGUÍSTICOS........................... 7 1.1 DEFININDO A SINTAXE.................................................................................................7 1.2 GRAMATICALIDADE, AGRAMATICALIDADE E NORMA PADRÃO........................11 1.3 BREVE HISTÓRIA DA SINTAXE....................................................................................14 1.4 GRAMÁTICA INTERNALIZADA, GRAMÁTICA DESCRITIVA E GRAMÁTICA TRADICIONAL .............................................................................................................17 FIXANDO O CONTEÚDO ..................................................................................... 25 CLASSE E FUNÇÃO GRAMATICAL ....................................................... 25 2.1 AS DEZ CLASSES DE PALAVRAS............................................................................ 29 2.2 AS FUNÇÕES SINTÁTICAS ..................................................................................... 32 FIXANDO O CONTEÚDO ..................................................................................... 41 OS SINTAGMAS...................................................................................40 3.1 COMO IDENTIFICAR OS SINTAGMAS? ................................................................ 43 3.2 CLASSIFICAÇÃO DOS SINTAGMAS ..................................................................... 47 FIXANDO O CONTEÚDO .................................................................................... 54 OS TERMOS ESSENCIAIS DA ORAÇÃO ..............................................54 4.1 O SUJEITO.............................................................................................................. 55 4.2 TIPOS DE SUJEITO .................................................................................................. 57 4.3 O PREDICADO....................................................................................................... 60 4.4 TIPOS DE PREDICADO........................................................................................... 64 FIXANDO O CONTEÚDO ..................................................................................... 25 OS TERMOS INTEGRANTES DA ORAÇÃO ..........................................70 5.1 COMPLEMENTOS VERBAIS: OBJETO DIRETO E OBJETO INDIRETO...................... 70 5.2 COMPLEMENTO NOMINAL................................................................................... 73 5.3 AGENTE DA PASSIVA............................................................................................ 74 FIXANDO O CONTEÚDO ..................................................................................... 80 OS TERMOS ACESSÓRIOS DA ORAÇÃO............................................80 6.1 ADJUNTOS............................................................................................................. 80 6.2 APOSTO................................................................................................................. 83 FIXANDO O CONTEÚDO ..................................................................................... 89 RESPOSTAS DO FIXANDO O CONTEÚDO...........................................89 REFERÊNCIAS.......................................................................................90 UNIDADE 02 UNIDADE 03 UNIDADE 04 UNIDADE 05 UNIDADE 06 UNIDADE 01 6 CONFIRA NO LIVRO A unidade I busca definir a Sintaxe, tanto enquanto um componente da Gramática Tradicional quanto como uma disciplina científica da Linguística e situá-la dentro da história dos estudos linguísticos. A unidade II apresenta uma revisão geral das classes de palavras e das funções sintáticas segundo a Norma Gramatical Brasileira, tecendo algumas críticas. A unidade III busca explorar a noção de sintagma, a unidade intermediária de análise da sintaxe, apresentando uma definição e suas classificações. A unidade IV apresenta uma revisão sobre os termos essenciais da oração (sujeito e predicado), explorando suas definições e tipologias. A unidade V apresenta uma revisão sobre os termos integrantes da oração (objeto direto, objeto indireto, complemento nominal e agente da passiva). A unidade VI apresenta uma revisão sobre os termos acessórios da oração (adjunto adnominal, adjunto adverbial e aposto). 7 A SINTAXE NA HISTÓRIA DOS ESTUDOS LINGUÍSTICOS 1.1 DEFININDO A SINTAXE Do ponto de vista da Gramática Tradicional, a sintaxe é uma seção dedicada ao estudo da formação das frases, orações e períodos. Mais especificamente falando, ela estuda como as palavras se combinam para formar frases. Segundo Cegalla (2000), essa parte se subdivide em: 1. Análise sintática: consiste na análise da função que as palavras exercem na oração. Ex.: as funções de sujeito, objeto, adjunto etc. 2. Regência: consiste na análise das relações de dependência das palavras na oração de modo que uma palavra esteja sempre subordinada à outra. Um dosaspectos analisados nesta parte é se o erbo precisa ou não de complemento e se esse complemento deve vir ou não antecedido de preposição. Por exemplo, o verbo nascer não precisa de complemento, ele é chamado de verbo intransitivo (ex.: Helena nasceu); já o verbo gostar exige complemento, e este deve vir precedido de preposição (ex.: Helena gosta de doces); o verbo amar também exige complemento, porém este não deve vir precedido de preposição (ex.: Helena ama João). No caso específico dos verbos que exigem preposição, a regência também busca analisar qual é a preposição que o verbo rege de acordo com à Norma Padrão. Por exemplo, o verbo ir, conforme a Norma, deve sempre reger a preposição a (como em: João foi à praia), e não a preposição em, como estamos acostumados a ver na fala espontânea em frases como João foi na praia. Devemos ficar atentos, pois, em alguns casos, a mudança de regência pode implicar a mudança no sentido de uma frase, como, por exemplo:João assistiu ao filme (= João viu o filme) e UNIDADE 01 8 João assistiu o paciente (= João ajudou / prestou assistência ao paciente). Concordância: consiste na normatização de uma espécie de paralelismo na flexão dos termos da oração. Esta parte se subdivide em concordância nominal e verbal. A Gramática Tradicional prevê, portanto, que, sempre, o adjetivo deve concordar em gênero (masculino e feminino) e número (singular e plural) com o substantivo (ex.: leitura interessante / leituras interessantes) e o verbo também deve concordar em número e pessoa (1ª, 2ª e 3ª) com o sujeito (ex.: O avião aterrisou / Os aviões aterrisaram). Sintaxe da colocação: consiste naanálise da disposição ou ordem das palavras ao longo da oração, ex.: (1) João comprou um livro para Maria / (2) Para Maria, João comprou um livro / (3) Um livro, João comprou para Maria. Essa parte também cuida da colocação dos pronomes oblíquos átonos,normatizando os contextos específicos em que estes devem vir antes do verbo (ex.: O João me emprestou o livro de matemática), no meio do verbo (ex.: Perguntei ao João se ele emprestar-me-ia o livro de matemática) ou depois do verbo (ex.: O João me ajudou, emprestando-me o livro de matemática). 9 10 Do ponto de vista científico, a sintaxe é uma área da Linguística que além de investigar como as palavras se combinam para formar frases, entende que esse processo não se dá de modo aleatório e, sim, mediante a competência linguística do falante. A competência linguística do falante é, pois, o objeto de estudo da sintaxe e diz respeito ao conhecimento inato que todo falante tem sobre a sua língua materna. Esse conhecimento inato está radicado na biologia do cérebro/mente do falante (KENEDY, 2008, p. 129) e permite que ele construa um número infinito de frases com um número limitado de palavras e regras gramaticais (MIOTO et al., 2018, p. 15-16). Exemplificamos isso da seguinte forma: tomando o conjunto de palavras Carla - casa - a - uma - comprar, sabemos que é completamente possível construir uma frase como (4a) e que podemos gerar outras combinações com essas palavras e formar as frases (4b) e (4c). No entanto, algumas combinações, como (4d) e (4e), não são possíveis, porque fogem das regras gramaticais da nossa língua. (4) a. A Carla comprou uma casa. b. Uma casa, a Carla comprou. c. Uma casa foi comprada pela Carla. d. Uma casa comprou a Carla. 11 e. Casa uma Carla a comprou. Dizer que a língua (ou gramática) é um conhecimento inato significa dizer que todo falante nasce com uma predisposição para a linguagem. Alguns teóricos da linguagem, inclusive, defendem que ela é geneticamente determinada e que seu gene seria conhecido como FOXP2 (KENEDY, 2008). Independente disso ser verdadeiro ou não, o mais importante é entender que todo falante de uma língua natural nasce com um conhecimento inconsciente do conjunto de regras que rege a distribuição das palavras nas frases da sua língua materna (MIOTO et al., 2018). É esse conhecimento que estamos chamando de gramática internalizada ou competência linguística. Segundo Kenedy e Othero (2018), a unidade mínima da sintaxe é a palavra e sua unidade máxima é a frase. Acima da frase, estão outros fenômenos, tais como o texto e o discurso, que costumam ser objeto de estudo de áreas como a Pragmática e a Análise do Discurso. 1.2 GRAMATICALIDADE, AGRAMATICALIDADE E NORMA PADRÃO Devido à impalpabilidade da mente, para descrever a competência linguística dos falantes, os sintaticistas se baseiam na análise da gramaticalidade das 12 frases. Essa análise consiste em verificar o nível de aceitabilidade de determinadas sequências de palavras em uma língua. Observe os exemplos a seguir, retirados de Mioto et al. (2018, p. 36): a. *de gato rajado o botas b. *o rajado gato de botas c. o gato rajado de botas Tomando esses exemplos, observamos que apenas a sequência de palavras em (c) é aceitável na língua. Desse modo, dizemos que essa sequência é gramaticalporque ela forma uma frase na nossa língua. As sequências (a) e (b), por outro lado, são consideradas agramaticais, porque não formam frases na nossa língua. O asterisco é utilizado para indicar todas as sequências que são agramaticais. Segundo Mioto et al. (2018, p. 37), além de avaliar quais frases são gramaticais e agramaticais, o sintaticista deve ser capaz de explicar, por exemplo, porque na frase (c) o nome botas se combina com a preposição de e porque o agrupamento de botas se combina com o nome gato, em gato de botas (ou com o agrupamento gato rajado), mas não se combina, diretamente, com o adjetivo rajado, em *rajado de botas. Outro exemplo de análise feita pelo sintaticista é com relação ao uso do artigo. O cientista dessa área, ao analisar a frase (5C) deve ser capaz de explicar também porque o artigo o se combina com a sequência gato rajado de botas aparecendo somente nessa posição inicial da sequência e não no meio, como mostram os exemplos em (6) a. *Gato o rajado de botas b. *Gato rajado o de botas c. *Gato rajado do botas d. *Gato rajado botas o De modo a esclarecer a função da sintaxe, enquanto disciplina científica, 13 Mioto et al. (2018, p. 38-40) cita vários outros fenômenos que o sintaticista procurar explicar, tais como: a inversão da posição do pronome interrogativo em perguntas como Que livro o João leu? e O João leu que livro? e o fato de ser possível inserir um objeto entre dois verbos na frase João viu Maria nadar, mas essa mesma regra não ser aplicável ao verbo querer em *João quer Maria nadar. É necessário ficar claro que o conceito de gramaticalidade não está relacionado ao fato de uma frase estar adequada ou não à Norma Padrão. Portanto, tomando os exemplos em (7), a seguir, observe que uma sequência como (a) é agramatical, porque não forma uma frase na língua portuguesa. As sequências de (b) a (e) são gramaticais, mas se diferem quanto ao nível de adequação à Norma Padrão. Enquanto (b) é mais aceita, porque marca a desinência de plural [-s] em todos os elementos do sujeito[Os alunosinteligentes], a frase (c) não apresenta essa marca de plural no adjetivo inteligente e a frase (d) não apresenta essa mesma marca nem no substantivo nem no adjetivo. a. Livros inteligentes compraram de professor os o alunos os. b. Os alunos inteligentes fizeram bem a prova. c. Os alunos inteligente fizeram bem a prova. d. Os aluno inteligentes fizeram bem a prova. e. Os aluno inteligente fizeram bem a prova. Embora as frases (c), (d) e (e) não estejam adequadas à Norma Padrão, elas não deixam de ser frases compreensíveis no português brasileiro e isso, por si só, já explica o fato de serem gramaticais. O que acontece, na maioria das vezes, é queessas frases estão marcadas por uma avaliação social negativa que associa seus 14 usos a pessoas de baixo nível de escolaridade e/ou nível socioeconômico; fato que nem sempre corresponde aos resultados apurados nas pesquisas sociolinguísticas sobre o fenômeno da ausência /presença de concordância nominal no português brasileiro. 1.3 BREVE HISTÓRIA DA SINTAXE Tendo como berço a Grécia Antiga, a história do pensamento gramatical é marcada, sobretudo, pelas indagações acerca da relação entre linguagem e mundo nomeado e da sua natureza (convencional ou natural). A principal questão levantada por Platão (427 a.C. – 347 a.C.) e Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.) era se os nomes seriam dados às coisas por uma espécie de contrato social (tese convencional) ou se resultam da natureza das coisas (tese natural) (KRISTEVA, 1969). Assim sendo, a sintaxe sempre ocupou um espaço muito reduzido nas reflexões sobre a linguagem. O foco sempre esteve em definir quais seriam as partes do discurso ou classes de palavras. Podemos dizer que a sua potencialidade acha-se no conceito platônico de lógos (discurso racional), composto basicamente pelas categorias como ónoma/nome (o ser ou entidade) e rhéma/verbo (propriedade do ser, o que se predica ao ser) (AZEREDO, 2015). Para Bagno (2012), toda frase, por mais simples que seja, contém esses dois termos. Platão, ao propor essa distinção, estaria revelando o princípio mais fundamental das línguas humanas: a predicação. Predicar significa ‘falar de’ ou ‘dizer que’. Tomando como exemplo a frase Ivo nasceu, podemos inferir que essa frase estaria dizendo que ‘existe uma pessoa no mundo que se chama Ivo’ e que ‘Ivo nasceu’. Tendo em vista esse fato, de certo modo, a sintaxe pode ser entendida como uma narrativa dialogada, porque o seu objeto de estudo é a frase e toda frase prevê “algo que alguém conta / narra / descreve / relata a alguém” (BAGNO, 2012, p. 406). Segundo Bagno (2012, p. 411), Aristóteles também foi o primeiro a fazer menção ao termo sujeito, que, no grego, recebia a denominação 15 Kypokeîmon, significando, literalmente, “algo que está por baixo”. Os romanos traduziram esse termo por subjectum, com o mesmo significado. Na disciplina gramatical, sujeito é um termo técnico utilizado para definir o elemento da frase sobre o qual recai a predicação, mas tanto este quanto o termo objeto tem sua origem das reflexões filosóficas e metafísicas: Enquanto o sujeito, por ser o que “está por baixo”, representa a essência profunda, a substância, e, por conseguinte, é um conceito, digamos, abstrato, o objeto é aquilo que está diante de nós, que se oferece aos nossos sentidos, que se apresenta, que se expõe. Talvez possamos dizer que o conceito de sujeito é metafísico (que está além do mundo físico, sensível), enquanto o objeto é um conceito físico, uma entidade que pode ser apreendida pelos sentidos (BAGNO, 2012, p. 412). No mundo ocidental, a primeira gramática de que se tem notícia é a Techné Grammatiké, de Dionísio de Trácia (Alexandria, 170 a.C – 90 a.C). Segundo Assis e Molina (2020), ela apresenta uma teoria sobre as letras e sílabas, discute a morfologia, estabelecendo 8 categorias gramaticais e, apesar de não mencionar a sintaxe, define a palavra como a menor parte da frase. As 8 categorias gramaticais estabelecidas por Dionísio são: Nome (ónoma) – uma parte da frase casual, que designa um corpo ou uma ação; Verbo (rhema) – uma palavra desprovida de casos, que admite tempo, pessoa e voz (ativa ou passiva); Particípio – palavra que tem a particularidade de funcionar tanto como verbo quanto como nome; Artigo – parte da frase casual, anteposta ou posposta à flexão do nome; Pronome – palavra empregada no lugar do nome para indicar pessoas definidas; Preposição – palavra que pode aparecer em qualquer parte da frase, de maneira a realizar uma composição ou uma construção; Advérbio – parte não flexiva da frase que se refere ou aplica ao verbo; Conjunção – palavra que liga e ordena o pensamento, revelando sua 16 “abertura”. Foi Apolônio Díscolo (Séc. II d. C), o primeiro pensador grego a elaborar uma teoria sobre a sintaxe, tendo como base a língua grega, em um tratado que ocupa quase 500 páginas na obra Grammatatici Graeci (ASSIS; MOLINA, 2020). Segundo Bagno (2012),Apolônio entendia a frase como sendo uma autotelēs logos, ou seja, uma unidade da língua dotada de significado e gramaticalmente construída. A partir desse conceito, surge o dogma da frase autossuficiente, o que acabou limitando a análise sintática a frases isoladas. Entretanto, arrancar a frase de um texto, para tentar analisá-la isoladamente, é o mesmo que arrancar um tijolo de um edifício completo e analisá-lo somente em relação aos seus aspectos materiais (como peso, altura, largura, comprimento, composição química etc.), sem levar em conta “o papel que ele desempenha nesse edifício, em que posição ele se encontra com relação aos demais tijolos, quanto peso ele suporta” (BAGNO, 2012, p. 424). Em Roma, o conceito de autotelēs logos será retomado por Prisciano em sua obra Institutiones Grammaticae, por meio da noção de oração perfeita, entendida como sendo um discurso com sentido pleno e que se basta a si mesmo. A oração imperfeita, por sua vez, seria um rótulo dado às palavras que tem necessidade de ser completadas para ter um sentido pleno (KRISTEVA, 1969). Cabe mencionar que, na atualidade, as gramáticas tradicionais, o ensino de português e algumas análises científicas da linguagem ainda se fazem nessa perspectiva. Assim sendo, a análise sintática acaba desconsiderando que a frase faz parte de um arcabouço maior chamado texto. Ignorando esse fato, a análise sintática tradicional ignora que existem textos falados e escritos e que todo texto apresenta um “sujeito que fala/escreve e o(s) interlocutor(es) real(is) virtual(is) com quem ele interage socialmente” (BAGNO, 2012, p. 423). Antes de Prisciano, a sintaxe parece só ter sido mencionada por Varrão (Séc. I a. C.), em sua obra De língua latina, como sendo a parte da gramática que se ocupa das relações das palavras na frase (KRISTEVA, 1969). Por muito tempo, a análise linguística fica restrita à forma, se concentrando mais especificamente nos estudos da Morfologia. A Sintaxe só ganha autonomia nos 17 estudos linguísticos nos meados do século XX, com ascensão, no meio científico, da teoria gerativa de Noam Chomsky (Filadélfia, EUA, 1928). A ideia a respeito da natureza mental da linguagem ganhou reconhecimento com a Teoria Gerativa, nos anos 1950, quando Noam Chomsky (Filadélfia, EUA, 1928), publicou o seu primeiro livro, Estruturas Sintáticas (1957). Segundo Kenedy (2019, p. 17), Chomsky defendia que: o papel fundamental da Linguística é tornar explícito, isto é, descrever com objetividade científica, o conhecimento linguístico dos falantes. Para ele [Chomsky], a teoria linguística deve descrever os procedimentos mentais que “geram” as estruturas da linguagem, como as palavras, as frases e os discursos. Kenedy (2019, p. 18) explica que as ideias de Chomsky eram revolucionárias para a época e que, a partir disso: os linguistas passaram a não apenas descrever a estrutura das línguas, mas também a procurar explicações para como a mente humana era capaz de adquirir e processar essas estruturas. Com Chomsky, a morada da linguagem e das línguas naturais passou a ser a mente dos indivíduos. A teoria gerativa ganha destaque no cenário dos estudos linguísticos, chegando inclusive a dar primazia aos estudos da sintaxe. Os anos seguintes vão ser marcados pela ascensão dos estudos funcionalistas, que vão buscar analisar a língua utilizada em seu contexto sociointeracional. Não será foco nessa disciplina o aprendizado da sintaxe sob esse escopo teórico. 1.4 GRAMÁTICA INTERNALIZADA, GRAMÁTICA DESCRITIVA E GRAMÁTICA TRADICIONAL Segundo o Dicionário Aulete Digital, o termo gramática pode ser entendido como “conjunto de regras”. Ao contrário do que geralmente se pensa, não existe apenas um tipo de gramática e nem todas têm como foco a prescrição dos usos da língua, oferecendo, ao consulente, o “certo” e “errado” tendo em vista a Norma 18 Padrão. Na Linguística, assumimos, de maneira geral, que existem três tipos de gramática: a gramáticatradicional (ou gramática normativa), a gramática internalizada e a gramática descritiva. Definiremos cada uma delas com base em Mioto et. al (2018). A gramática tradicional (ou gramática normativa) é aquela mais amplamente conhecida e que ouvimos falar na educação básica. De modo geral, ela tem como objetivo prescrever o que é “certo” e “errado” na língua. Entretanto, devemos entender que, nela, “apenas uma variedade da língua está em jogo: a norma culta ou padrão” (MIOTO et al., 2018, p. 13). Uma vez que a GT costuma trazer citações de textos literários e eruditos para exemplificar os seus termos e definições, ela acaba postulando que a linguagem desses escritores serve como modelo de “correção” e de “beleza” para todos os falantes da língua (MIOTO et al., 2018), desconsiderando todas as outras variedades da língua. No mercado editorial, as algumas gramáticas tradicionais mais bem- conceituadas são aquelas produzidas filólogos e linguistas, tais como: a Gramática Normativa da Língua Portuguesa, do Carlos Henrique da Rocha Lima; a Nova Gramática do Português Contemporâneo, do Celso Ferreira da Cunha e Luís Filipe Lindley Cintra; a Novíssima Gramática da Língua Portuguesa, do Domingos Paschoal Cegalla e a Moderna Gramática Portuguesa, do Evanildo Bechara. Algumas dessas gramáticas, inclusive, estão disponíveis na biblioteca digital da sua faculdade. A principal crítica levantada acerca do ensino de português é que ele muitas vezes se coloca como um ensino meramente classificatório de gramática. Segundo Antunes (2003, p. 88): a competência que se procura desenvolver é sempre a de identificar, a de reconhecer qualquer coisa. Daí os exercícios em que se pede para grifar, para circular palavras ou orações, sem nenhuma preocupação com saber para que servem estas coisas, para que foram usadas ou que efeitos provocam em textos orais e escritos. Adianta pouco saber que o “sujeito” de determinada frase é indeterminado, por exemplo. O que adianta mesmo é saber que efeitos práticos se consegue com o uso de um determinado tipo de “sujeito”. Por exemplo, o que está por trás da afirmação: “O Banco mentiu”? O “sujeito” da oração é evidentemente “O Banco”. Adianta muito saber apenas isso? Adiantaria saber também porque se escolheu ocultar o 19 nome de quem mentiu e mascarar a verdade com o subterfúgio da metonímia ou de um sujeito indeterminado. (O mesmo se pode dizer para declarações como “O dólar recuou”, “O mercado resistiu” e outras equivalentes). A escola perde muito tempo com questões de mera nomenclatura e de classificação, enquanto o estudo das regras dos usos da língua em textos fica sem vez, fica sem tempo (ANTUNES, 2003, p. 88, grifos da autora). Dessa forma, o ensino de sintaxe na sala de aula parece ter muito mais como objetivo que o aluno saiba, por exemplo, o nome dos termos da oração (tais como sujeito, predicado, objeto direto, objeto indireto) do que construir uma frase, e que ele saiba dizer o nome completo de uma oração subordinada (ex.: Oração Subordinada Substantiva Reduzida de Infinitivo, Oração Subordinada Adverbial Causal) do que articular orações e dar coesão e um sentido a um texto. Como explicado acima, todo falante nasce com uma predisposição para a linguagem, permitindo que ele produza e compreenda sequências na língua que são gramaticais. Essa predisposição é o que chamamos de gramática internalizada. A partir de Mioto et. al (2018), podemos entender a GI como o conjunto de regras que rege a distribuição das formas da língua e que o falante tem internalizado em sua mente / cérebro. Ao contrário da gramática tradicional, a GI não é um livro ou um documento disponível para a consulta. Ela é, sim, o próprio conhecimento linguístico do falante 20 e, por isso, ela é o objeto de estudo da Sintaxe, principalmente a partir do escopo teórico do Gerativismo, que compreende a língua como um fenômeno da mente. A gramática descritiva, por sua vez, busca apenas descrever os fenômenos da língua, sem estabelecer julgamentos de certo e errado. Retomando os exemplos dados em (7), sobre o fenômeno da variação de concordância nominal de número no português brasileiro, cabe à gramática descritiva informar que as frases de (b) a (e) existem na língua (ou seja, são gramaticais) e procurar explicar porque a desinência de plural [-s] não aparece marcada em todos os elementos do sujeito em Os alunos inteligente e Os aluno inteligente, mas sempre aparece marcada no determinante o, sendo também agramatical uma sequência como o alunos inteligentes fizeram bem a prova. É necessário ficar claro que todas as variedades do português brasileiro possuem gramática (=‘conjunto de regras’), bem como todos os falantes da língua, inclusive os menos escolarizados ou os que pertencem a uma classe socioeconômica mais baixa, porque, tirando pessoas com distúrbios neurológicos graves (MIOTO et. al, 2018), todos os falantes de uma língua natural, como o português brasileiro, estão sempre produzindo sequências de unidades da língua que são gramaticais. Podemos dizer que a gramática descritiva descreve a gramática internalizada do(s) falante(s) de uma língua natural. É possível encontrar algumas gramáticas descritivas no mercado como a Nova Gramática do Português Brasileiro, do Prof.º Ataliba Teixeira de Castilho, a Gramática de usos do português, da Prof.ª Maria Helena de Moura Neves, a Gramática Descritiva do Português, do Prof.º Mário Alberto Perini e a Gramática do Português Culto Falado no Brasil, uma coleção em 7 volumes que reúne vários pesquisadores da Linguística no Brasil. Incluímos também nessa lista as pesquisas linguísticas (monografias, teses de doutorado e dissertações de mestrado) uma vez que elas também visam à descrição dos fenômenos da língua. 21 FIXANDO O CONTEÚDO 1. Sobre a Gramática Descritiva, podemos afirmar que: a) ela é amplamente conhecida e, por isso, é utilizada nas aulas de português da educação básica. b) ela é resultado das pesquisas linguísticas e se trata de um livro/documento disponível para consulta. c) ela se ocupa da descrição da gramática internalizada dos escritores da literatura da língua portuguesa. d) ela se ocupa da descrição do que é "certo" e "errado" na língua, baseando somente na linguagem de escritores literários e eruditos. e) ela se ocupa da descrição da competência linguística dos falantes, estabelecendo julgamentos de "certo" e "errado" em relação à norma. 2. Ao longo da história dos estudos linguísticos, podemos dizer que a sintaxe: a) era uma parte da gramática dedicada ao estudo do processo de formação e classificação das palavras da língua. b) nunca fez parte do interesse dos estudos linguísticos, sendo apenas uma seção da gramática tradicional. c) nunca foi mencionada na obra Grammatatici Graeci de Apolônio Díscolo ou na obra do gramático romano Prisciano. d) só é mencionada na primeira Gramática Tradicional do Ocidente, a Techné Grammatiké, de Dionísio de Trácia. e) só ganhou autonomia, nos estudos linguísticos, com a Teoria Gerativa de Noam Chomsky, por volta dos anos 1950. 3. Segundo a Teoria Gerativa, é correto afirmar que: a) a língua é um conhecimento inato somente dos escritores literários. b) a língua ou gramática é um conhecimento inato do falante. 22 c) falantes incultos não nascem com uma predisposição para a linguagem. d) falantes incultos são os únicos capazes de produzir sequências agramaticais. e) somente os escritores literários é que possuem uma gramática internalizada. 4. A Teoria Gerativa, basicamente, procura defender: a) a linguagem como sendo geneticamente determinada, por isso, pessoas com distúrbio neurológico grave é que não conseguem fazer usos de acordo com a Norma Padrão da Língua. b) a natureza mental da linguagem, ou seja, que todo falante nasce com uma predisposição para a linguagem. c) a natureza mental da linguagem, ou seja, que todo falante, exceto aqueles com algum distúrbio neurológico grave, nasce com uma predisposição paraa linguagem. d) o papel fundamental da Linguística como ciência que busca tornar explícito o conhecimento da Norma Padrão da língua. e) o papel fundamental da Linguística de combater os distúrbios neurológicos graves que impedem as pessoas de fazerem usos que não correspondem à Norma Padrão da língua. 5. Segundo Irandé Antunes, qual deve ser o objetivo da aula de português? a) O desenvolvimento da competência classificatória dos termos da língua. b) O desenvolvimento da competência identificatória dos termos da oração e das orações do período composto. c) Que o aluno entenda os efeitos práticos do uso de determinada estrutura gramatical em um determinado texto. d) Que o aluno entenda os efeitos práticos do uso de determinada estrutura gramatical em frases isoladas da língua. e) Que o aluno saiba a origem grega e latina dos termos utilizados pela gramática tradicional. 23 6. Sobre o conceito de gramaticalidade, é correto afirmar que: a) frases gramaticais são aquelas construídas dentro da Norma Padrão da língua portuguesa. b) frases que não estão de acordo com a Norma Padrão não deixam de ser frases gramaticais. c) frases que não refletem os usos da Norma Padrão não podem ser consideradas gramaticais. d) podemos inferir qual é o domínio da Norma Padrão dos falantes a partir das estruturas linguísticas utilizadas por eles em textos orais ou escritos. e) podemos inferir qual é o grau de escolaridade dos falantes a partir das estruturas linguísticas utilizadas por eles em textos orais ou escritos. 7. A partir dos conceitos de frase, oração e período, podemos afirmar que: a) frases não podem ser formadas por verbos. b) frases precisam ser formadas por verbos. c) períodos compostos contém apenas um verbo. d) períodos não são formados por verbos. e) todo período e toda oração são frases. 8. (ENADE, 2017) A noção de nível para Émile Benveniste revela-se fundamental para os procedimentos de análise linguística, pois, segundo o autor, só o nível pode dar conta "da natureza articulada da linguagem". Tendo por base a noção de níveis de análise linguística e considerando a arquitetura sintática que compõe o enunciado "Os alunos assistiram ao acidente na calçada", avalie as afirmações a seguir: 24 I. A ambiguidade presente na estrutura sintática do enunciado deve-se ao fato de ser possível interpretar o enunciado de duas formas: 1. o acidente ocorreu na calçada e os alunos assistiram a ele de outro local; e 2. os alunos estavam na calçada e assistiram ao acidente que ocorria em outro lugar. II. Tratando-se da linguagem coloquial, ao se suprimir a preposição que rege o complemento do verbo "assistir" (originalmente, com a acepção de 'presenciar', 'ver') muda-se o nível sintático do enunciado, mas não se altera a semântica projetada pela língua. III. Assim como em "João pediu a José para sair", ocorre, no enunciado em questão, ambuidade no nível lexical, já que a significação emerge das possibilidades interpretativas que os elementos léxicos implicam. IV. Conforme a tradição gramatical, a regência do verbo "assistir" (acepção de presenciar, ver) é a mesma do verbo "aspirar" (acepção de desejar); ambos admitem, também, o emprego transitivo direto, havendo alteração no nível sintático em função da semântica projetada pela língua. É correto apenas o que se afirma em: a) I e III. b) II e III. c) II e IV. d) I, II e IV. e) I, III e IV. 25 CLASSE E FUNÇÃO GRAMATICAL Toda a terminologia utilizada pela Gramática Tradicional é regida pela Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB), aprovada em 28 de janeiro de 1959 pelo então Ministro do Estado da Educação e Cultura Clóvis Salgado da Gama (1906 - 1978). O objetivo da NGB era uniformizar e simplificar a terminologia utilizada pelos gramáticos no Brasil. Fizeram parte da comissão filólogos e linguistas, tais como: Antenor Nascentes, Clóvis do Rêgo Monteiro, Cândido Jucá Filho, Carlos Henrique da Rocha Lima, Celso Ferreira da Cunha, Antônio José Chediak, Serafim Silva Neto e Sílvio Edmundo Elia. Sua adoção nos estabelecimentos de ensino se deu já a partir do ano de 1959. A divisão da Gramática que ficou oficialmente estabelecida pela NGB inclui três partes: a fonética, a morfologia e a sintaxe. Outros aspectos; como as figuras de linguagem, a ortografia, a pontuação e a significação (antonímia, homonímia e sentido figurado); foram incluídos em uma seção à parte, denominada apêndice. À fonética coube o estudo dos fonemas (o que inclui a classificação das vogais e das consoantes), dos ditongos, da sílaba e da tonicidade. À morfologia, o estudo da estrutura das palavras (o que inclui termos como raiz, radical, tema, afixo, desinência etc.), da formação das palavras (se por um processo de derivação, composição ou hibridismo), da flexão (em gênero, número, pessoa, tempo, modo etc.) e da classificação das palavras (substantivos, adjetivos, pronomes etc.). UNIDADE 02 26 À sintaxe coube, por sua vez, o estudo da concordância (nominal e verbal), da regência (nominal e verbal) e da colocação (que consiste, mais especificamente, na análise da disposição dos pronomes oblíquos átonos nas posições de próclise, mesóclise e ênclise). Através da NGB, a análise sintática é uma subparte da sintaxe que se subdivide em análise sintática da oração e do período. No estudo da oração, encontram-se os termos essenciais, os termos integrantes e os termos acessórios da oração (que serão o foco deste nosso curso). No estudo do período, encontra-se a análise do período simples (formado apenas por uma oração, denominada oração absoluta) e do período composto (formado por orações que coordenadas ou subordinadas). Considerando a data em que foi promulgada a NGB, podemos constatar que, embora a Linguística e a Filologia tenham experimentando alguns avanços ao longo desse período, a terminologia e os conteúdos prescritos pela NGB não passaram por nenhum processo de revisão, o que nos permite tecer algumas críticas. Para Mioto et al.(2018, p. 14), as definições da Gramática Tradicional são normalmente inadequadas porque não se aplicam a todos os contextos.Tomando como exemplo a definição do advérbio, veremos que, em algumas gramáticas, como Cunha e Cintra (2017) e Rocha Lima (2011), este é definido como palavra que modifica o verbo (expressando uma circunstância), o adjetivo ou a si próprio (expressando uma intensidade). Porém, ao analisarmos a função da palavra provavelmente em algumas posições diferentes da frase O João doou os jornais para a biblioteca, observamos que, em (b) e (c), ela parece não se comportar como advérbio, porque modifica o grupo nominal o João e os jornais. Por outro lado, podemos inferir também que a definição de advérbio dada pela GT necessita de uma revisão: 27 (8) a. [Provavelmente o João] doou os jornais para a biblioteca (e não a Maria). b. O João [provavelmente doou] os jornais para a biblioteca (e não os vendeu). c. O João doou [provavelmenteos jornais] para a biblioteca (e não as revistas). O uso dos colchetes em (8) é para deixar claro a qual elemento da frase o advérbio tem escopo: a o João em (a), a doou em (9b) e a os jornais em (9c). Cabe esclarecer que essa análise do escopo do advérbio provavelmente depende também da entonação que se dá as frases. A partir desses exemplos, Mioto et. al concluem que, ao contrário do que geralmente se pensa, a Gramática Tradicional “não se constitui em um corpo coeso de conhecimentos; e ampliando a crítica: o conjunto de observações que a GT faz não dá conta da riqueza da língua, nem mesmo do registro que ela se propõe a descrever” (MIOTO et. al, 2018, p. 14). Complementando a crítica desse autor, dois fatores justificam o fato de a NGB não abarcar todas as dimensões da língua: ela não inclui a semântica e não apresenta, explicitamente, nenhuma teoria sobre o texto. Cabe lembrar que a BNCC (Base Nacional Comum Curricular) considera o texto como o centro das práticas de ensino-aprendizagem de português,por ser ele o “centro das práticas de linguagem” (BNCC, 2006, p. 63). Dessa forma, se a NGB se propõe a ser um instrumento que deveria ser adotado nos estabelecimentos de ensino, ela não corresponde nem à realidade das pesquisas linguísticas atuais e nem às orientações dos documentos parametrizadores 28 do ensino de português. Ao analisarmos a BNCC, observamos que a sintaxe está incluída, sobretudo, no eixo Conhecimentos Linguísticos e Gramaticais, que compreende as práticas de análise linguística e gramatical. O documento enfatiza que estas análises devem estar estreitamente relacionadas com o desenvolvimento produtivo das práticas de oralidade, leitura e escrita. Utilizando a sintaxe, o professor pode trabalhar com a habilidade de leitura a partir da análise, por exemplo, da função anafórica do pronome de 3ª pessoa, ou seja, de retomada de um elemento prévio, já mencionado, no texto. Leia o trecho a seguir, de uma reportagem do portal UOL sobre o aumento das ocupações informais no Brasil desde 1985, e observe a função anafórica do pronome elas: de acordo com imagens de satélite, houve também um crescimento nas ocupações em áreas com declive, ou seja, mais sujeitas a deslizamentos. Elas estão predominantemente localizadas em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Espírito Santo e São Paulo.1 (CARLOS MADEIRO, 2021, online) O professor pode, a partir desse trecho, pedir ao aluno para analisar a função do pronome elas, que, nesse contexto, retoma o termo áreas com declive, pertencente ao período anterior. Dessa forma, ele estará trabalhando com a 29 competência EF06LP22, da BNCC, que visa “reconhecer/utilizar recursos de coesão referencial: nomes e pronomes” (BRASIL, p. 346). Tal competência é proposta para os alunos do 7º ano do ensino fundamental. Na próxima seção, faremos uma breve revisão sobre as dez classes de palavras apresentadas pela Nomenclatura Gramatical Brasileira. 2.1 AS DEZ CLASSES DE PALAVRAS Segundo a Nomenclatura Gramatical Brasileira, as palavras da língua (ou partes do discurso) dividem-se em dez classes: Substantivo Artigo Adjetivo Numeral Pronome Verbo Advérbio Preposição Conjunção Interjeição Essas classes podem ser agrupadas ainda em palavras variáveis (de 1 a 6) e palavras invariáveis (de 7 a 10) e por outras subclassificações que não serão o foco dessa nossa discussão, como, por exemplo, o fato dos substantivos serem agrupados em: substantivos comuns e próprios, concretos e abstratos, primitivos e derivados, simples e compostos. 30 As palavras variáveis são aquelas que recebem, na frase, algum tipo de flexão em gênero e número (no caso dos artigos, numerais, pronomes, substantivos e adjetivos) e pessoa, número, tempo e modo (no caso dos verbos). As palavras invariáveis não aceitam nenhum tipo de flexão. No quadro 1, a seguir, apresentamos uma lista simplificada das definições das classes de palavras, tomando como base a Novíssima Gramática da Língua Portuguesa, de Domingos Paschoal Cegalla: Quadro 1: Classes De Palavras De Acordo Com A Gramática Tradicional Classe: Definição: Exemplo: 1. Substantivo São palavras que designam os seres. criança, menino, homem, livro, flor, praia, alegria etc. 2. Artigo É uma palavra que antepomos aos substantivos para dar aos seres um sentido determinado ou indeterminado. Indica, ao mesmo tempo, o gênero e o número dos substantivos. o, a, os, as, um, uma, uns, umas. 3. Adjetivo São palavras que expressam as qualidades oucaracterísticas dos seres. bom, forte, feliz, brasileiro, famoso etc. 4. Numeral É uma palavra que exprime número, ordemnumérica, múltiplo ou fração. um, dois, três etc. primeiro, segundo, terceiro etc. dobro, triplo, quádruplo etc. 5. Pronome São palavras que substituem os substantivos ou os determinam, indicando a pessoa do discurso (ser que participa ou é objeto do ato da comunicação). eu, tu, ele, nós, vós, eles meu, seu, nosso etc. este, isto, aquilo etc. 6. Verbo É uma palavra que exprime ação, estado, fatoou fenômeno. pensar, ganhar, sair, ficar etc. 7. Advérbio É uma palavra que modifica o sentido do verbo,do adjetivo e do próprio advérbio. bem, muito, mal, ontem etc. 8. Preposição É uma palavra invariável que liga um termo dependente a um termo principal, estabelecendo uma relação entre ambos. de, para, a, por, com, contra etc. 31 9. Conjunção É uma palavra invariável que liga orações oupalavras da mesma oração. e, nem, mas também, mas, porém, todavia, contudo etc. 10. Interjeição É uma palavra ou locução que exprime umestado emotivo: Caramba!, Puxa vida!, ai!, ui!, ah!, oh!, ai de mim!, meu Deus! etc. Fonte:Adaptado de Cegalla (2000). Figueiredo Silva e Medeiros (2020) lembram que nem sempre essas foram as classes postuladas pela gramática tradicional. Como vimos no capítulo anterior, os particípios verbais já constituíram uma classe distinta dos verbos. Os autores tecem algumas críticas com relação a essa divisão,proposta pela NGB, das classes de palavras.Além do caso do advérbio provavelmente, já discutido anteriormente, eles apontam que a definição do substantivo como “palavras que designam os seres” não explica o fato de classificarmos palavras como viagem, ideal, beleza e nostalgia dentro dessa classe. O mesmo pode ser dito a respeito das palavras livro, praia e alegria dadas como exemplo pelo próprio Cegalla. Afinal de contas, o que devemos entender como ser? Além disso, a definição do verbo como “palavra que exprime ação” não explica o fato de classificarmos viagem como substantivo, já que esta palavra designa uma ação no mundo. Os autores também discutem a respeito da classe das interjeições. Geralmente, palavras de outras classes; como substantivos, verbos e advérbios; são utilizadas como interjeições, por exemplo: Atenção!,Corra!, Devagar!. Nesse caso, podemos levantar o seguinte questionamento: é realmente necessário estabelecer as interjeições como uma classe distinta? Cabe lembrar que elas só foram criadas pelos gramáticos latinos para que o número de classes de palavras da gramática latina fosse o mesmo da gramática grega (FIGUEIREDO SILVA; MEDEIROS, 2020). Em muitos casos, a diferença entre os substantivos e adjetivos parece ser melhor 32 estabelecida pelo contexto em que a palavra aparece na frase. Tomando como exemplo a palavra militar em (8), observamos que em (a) ela é classificada como substantivo; não só por designar um ser no mundo, mas sim, por estar ao lado de um determinante, nesse caso o artigo o; já em (b), ela é classificada como adjetivo por estar modificando o substantivo carreira. a. O militar prendeu o ladrão. b. João assumiu a carreira militar. Observe também que a palavra militar não só modifica, mas especifica a referência do substantivo carreira. De modo contrário, teríamos uma frase vaga como João assumiu a carreira, não evidenciando ‘que tipo de carreira o João assumiu’. Ainda com relação aos adjetivos, podemos questionar se palavras como feio, levado e burro expressam uma qualidade do ser. Entendendo que, na frase, as palavras assumem funções umas em relação as outras. Na próxima seção, faremos uma revisão geral da proposta de classificação das funções sintáticas apresentada pela Nomenclatura Gramatical Brasileira. 2.2 AS FUNÇÕES SINTÁTICAS De modo geral, podemos classificar as funções sintáticas propostas pela Nomenclatura Gramatical Brasileira em dez grupos: 33 Sujeito, Predicado, Predicativo, Complemento nominal, Complemento verbal, Agente da passiva, Adjunto adnominal, Adjunto adverbial, Aposto, Vocativo. 34 Destacamos que essa lista resume a proposta da NGB e não menciona outras subclassificações, como os tipos de sujeito, os tipos de predicado, noções que estudaremos nas próximas unidades deste livro. A NGB também classifica as funções sintática em grupos mais gerais denominados termos essenciais da oração, que incluem o sujeito, o predicado e o predicativo;termos integrantes da oração, que incluem o complemento nominal,o complemento verbal e o agente da passiva e termos acessórios da oração, que incluem o adjunto adnominal, o adjunto adverbial e o aposto. Apenas o vocativo não se inclui em nenhum desses grupos mais gerais. No quadro 2, a seguir, apresentamos uma lista simplificada das definições das dez funções sintáticas elencadas anteriormente, tomando como base a Novíssima Gramática da Língua Portuguesa, de Domingos Paschoal Cegalla: Quadro 2: Funções Sintáticas De Acordo Com A Gramática Tradicional Função: Definição: 1. Sujeito É o ser do qual se diz alguma coisa. Ex.: “Os sertanistascapturavam os índios.”. 2. Predicado É aquilo que se declara do sujeito. Ex.: “Os sertanistascapturavam os índios.”. 3. Predicativo É o termo que exprime um atributo, um estado ou modo de ser, podendo se referir ao sujeito (predicativo do sujeito, ex.: “A mesa era de mármore.”) e ao objeto (predicativo do objeto, ex.: “O juiz declarou o réu inocente.”). 4. Complemento nominal É o termo que completa a significação do nome. Ex.: “a defesa da pátria”, na qual da pátria completa a significação do nome defesa. 5. Complemento verbal É o termo que completa a significação do verbo. Ex.: “As plantas purificam o ar.”, na qual o ar completa a significação do verbo purificar. 6. Agente da passiva É o complemento de um verbo na voz passiva, representando, pois, o ser que pratica a ação expressa pelo verbo passivo. De modo geral, aparece regido pela preposição por. Ex.: “A cidade estava cercada pelo exército romano.”. 35 7. Adjunto adnominal É o termo que caracteriza ou determina os substantivos. Ex.: “Meu irmão veste roupas vistosas.”, na qual meu determina o substantivo irmão e vistosas determina o substantivo roupas. 8. Adjunto adverbial É o termo que expressa uma circunstância (de tempo, lugar, modo, etc.) ou, em outras palavras, que modifica o sentido de um verbo, adjetivo ou advérbio. Ex.: “Ele fala bem, fala corretamente.” 9. Aposto É uma palavra ou expressão que explica ou esclarece, desenvolve ou resume outro termo da oração. Ex.: “D. Pedro II, imperador do Brasil, foi um monarca sábio.” 10. Vocativo É o termo (nome, título, apelido) usado para chamar ou interpelar a pessoa, o animal ou a coisa personificada a que nos dirigimos. Ex.: “A ordem, meus amigos, é a base do governo.” (Machado de Assis). Fonte: Adaptado de Cegalla (2000). Podemos observar que a maioria dessas definições se fazem a partir de critérios semânticos, ou seja, são baseadas apenas na relação semântica entre os termos da oração. Um bom exemplo é a definição dos termos sujeito (“o ser do qual se diz alguma coisa”) e predicado (“aquilo que se declara do sujeito”) que acaba aludindo às reflexões filosóficas / metafísicas que os gregos faziam sobre a linguagem. Entretanto, dessa forma, a Gramática Tradicional, estaria desconsiderando um critério morfossintático que difere o sujeito dos demais termos da oração que é o aspecto da concordância verbal. O sujeito é o único termo da oração que estabelece concordância com o verbo (ainda que nem todos os seus elementos estejam marcados com a desinência de plural [-s]). Esse fenômeno não acontece na relação entre o verbo e o seu complemento e na relação entre o verbo e o adjunto adverbial (PERINI, 2016). É possível também estabelecer algumas críticas com relação à classificação mais geral das funções sintáticas. Como veremos mais adiante em nosso curso, segundo a própria NGB, o sujeito apresenta outras subclassificações como sujeito simples, composto, oculto, indeterminado e oração sem sujeito. Uma vez que a NGB estabelece o sujeito como um termo essencial da oração como podemos dizer que existe uma oração sem sujeito? Ademais, observamos que as gramáticas tradicionais não explicam, com 36 muita clareza, o que significa dizer que um termo é essencial ou integrante da oração, uma vez que, da mesma forma que existem orações sem sujeito, existem orações sem complemento, caso dos verbos intransitivos (ex.:A Maria chegou), e existem orações em que o complemento é opcional, caso do agente da passiva (ex.: A cidade estava cercada (pelo exército romano)). Outra crítica a ser feita à parte de sintaxe da Gramática Tradicional é com relação à diferença entre termos integrantes e termos acessórios. A maioria das gramáticas define este último como um termo que não é fundamental, por acrescentar informações secundárias a um nome ou a um verbo da frase (ROSSIGNOLI, 2015). Considerando, isoladamente, a frase João foi ao parque, não acreditamos que seja possível afirmar que ao parque seja um termo acessório, pois ele acrescenta uma informação que é crucial para o entendimento do interlocutor. 37 FIXANDO O CONTEÚDO 1. Sobre a NGB (Nomenclatura Gramatical Brasileira) é correto afirmar que: a) ela está de acordo com os atuais documentos parametrizadores do ensino. b) ela considera a semântica e a sintaxe como partes da gramática. c) ela rege toda a terminologia utilizada pela Gramática Tradicional. d) ela se atualiza de modo a tornar mais simples a terminologia gramatical. e) ela só foi adotada nos estabelecimentos de ensino no ano de 1959. 2. Sobre as partes da Gramática estabelecidas pela NGB, é correto afirmar que: a) a divisão da Gramática oficialmente estabelecida pela NGB inclui a fonética, a morfologia, a sintaxe e a semântica. b) a fonética estuda, dentre outros aspectos, a estrutura das palavras (o que inclui a classificação das vogais e das consoantes). c) a morfologia se propõe a analisar a formação das sílabas das palavras. d) a sintaxe se propõe a analisar o processo de formação de orações e períodos. e) a sintaxe se propõe à análise dos processos de flexão e a classificação das palavras. 3. Marque a alternativa que contém, segundo a NGB, apenas termos dados às funções sintáticas: a) adjunto adverbial, adjunto adnominal, aposto, vocativo. b) adjunto adverbial, verbo, aposto, agente da passiva. c) agente da passiva, predicado, predicativo, interjeição. d) substantivo, adjetivo, predicativo, vocativo. e) vocativo, interjeição, aposto, adjunto adnominal. 4. Qual das alternativas apresenta um exemplo de Aposto? a) “A ordem, meus amigos, é a base do governo” (Machado de Assis). b) “Tem compaixão de nós, ó Cristo!” (Alexandre Herculano). 38 c) Cristo, tende piedade de nós! d) D. Pedro II, imperador do Brasil, foi um monarca sábio. e) Os índios viviam aqui. 5. (AOCP – 2019, adaptada) Em qual alternativa a ausência do acento no vocábulo provocaria uma mudança de classe? a) Córrego. b) Nós. c) Sábia. d) Têm. e) Vêm. 6. (IADES – 2018, Adaptada) Assinale a alternativa que classifica, respectivamente, os vocábulos sublinhados em “Alguns hábitos têm o poder de iniciar uma reação em cadeia, mudando outros hábitos conforme eles avançam por meio de uma organização”: a) Pronome; verbo; preposição; preposição. b) Substantivo; adjetivo; conjunção; conjunção. c) Adjetivo; verbo; preposição; pronome. d) Conjunção; substantivo; conjunção; adjetivo. e) Pronome; substantivo; preposição; conjunção. 7. (IBADE – 2019, Adaptada) O termo sublinhado em “Os autores do estudo acreditam que em breve ele poderá ser levado para dentro das escolas” exerce função sintática de a) objeto direto. b) objeto indireto. c) predicativo. d) adjunto adnominal. e) adjunto adverbial. 39 8. Sobre as classes de palavras, é correto afirmar que: a) a partir de Mioto et al. (2018), podemos dizer que o advérbio é a palavra que modifica o verbo ou adjetivo. b) as definições da Gramática Tradicional, incluindo das classes de palavras, constituem um corpo coeso de conhecimentos. c) as palavras invariáveis são aquelas que recebem, na frase, algum tipo de flexão. d) em alguns casos, o contexto sintático determina se uma palavra é substantivo ou adjetivo. e) os substantivos se flexionam em gênero e número e os verbos em pessoa, número, tempo e modo. 40 OS SINTAGMAS Na unidade 1, discutimos que a unidade mínima de análise da sintaxe é a palavra e a sua unidademáxima de análise é a frase. No entanto, é necessário que você entenda que não são as palavras, isoladas, que desempenham as funções sintáticas em uma frase e, sim, os sintagmas (KENEDY, OTHERO, 2018). Para entender melhor essa ideia, vamos retomar e analisar, criticamente, a definição de pronome constante na gramática tradicional. Segundo Cegalla (2000), os pronomes são “palavras que substituem os substantivos”. Essa mesma definição pode ser encontrada em outras gramáticas. Para atestá-la, vamos, então, substituir os substantivos da frase O João disse que vai comprar um livro para Maria por pronomes pessoais de 3ª pessoa: (11) a. O ele disse que vai comprar um livro para a Maria. b. O João disse que vai comprar um ele para a Maria. c. O João disse que vai comprar um livro para a ela. Observe que, após substituirmos apenas os substantivos da frase (11) por pronomes, obtemos frases agramaticais. Isso se explica porque, ao contrário do que é prescrito pelas gramáticas tradicionais, os pronomes não substituem simplesmente os substantivos, mas sim os sintagmas nominais, ou seja, os grupos de palavras que são nucleados por um substantivo. Assim sendo, essa definição dos pronomes é falha UNIDADE 03 41 justamente por ignorar que as frases da língua sejam estruturadas por sintagmas (KENEDY; OTHERO, 2018). Segundo Kenedy e Othero (2018), uma única palavra pode ser sintagma quando esta for capaz de desempenhar, na frase, uma função sintática. Observe, na frase (12) a seguir, que a palavra João assume a função sintática de sujeito e, por isso, ela é um sintagma: (12) João comprou um livro para a Maria. Por outro lado, repare que os agrupamentos um livro e para a Maria também são sintagmas por assumirem, respectivamente, as funções de objeto direto e de objeto indireto do verbo comprar. Em outros casos, uma frase inteira pode ser um sintagma, como mostra o exemplo (13), a seguir: (13) A Maria sabe que o João comprou um livro. Em (13), o agrupamento que o João comprou um livro assume a função de 42 complemento do verbo saber. Assim sendo, temos uma oração (subordinada) que é complemento de outra oração (principal). Essa oração subordinada também é um sintagma. Não obstante, um sintagma também pode ser formado por um elemento vazio, como mostra o exemplo (14): (14) O João disse que Øvai comprar um livro para a Maria. Geralmente, na análise sintática, utilizamos o símbolo Ø para indicar que uma posição vazia é significativa exatamente por assumir alguma função sintática dentro da frase. Note, no exemplo 14, que essa posição vazia, na verdade, representa a função de sujeito da perífrase verbal vai comprar. Além disso, observe que este sujeito tem a mesma referênciado sujeito da oração principal, o sintagma O João. Assim sendo, podemos dizer que as duas ações, ou seja, a de ‘dizer’ e a de ‘comprar’, são praticadas pela mesma pessoa no mundo experimental (‘João’). Antes de darmos prosseguimento para a próxima seção, gostaríamos de reforçar que, segundo Kenedy e Othero (2018, p. 18), são os sintagmas que: (I) estruturam o período, e não as palavras isoladamente; (II) desempenham funções sintáticas na frase (sujeito, predicado, predicativo do sujeito etc.), e não palavras isoladas; Além disso, não se esqueça que os sintagmas correspondem, normalmente, a um conjunto de palavras; mas, existem sintagmas unitários e vazios. 43 3.1 COMO IDENTIFICAR OS SINTAGMAS? De modo geral, existem seis testes utilizados para a identificação dos sintagmas de uma frase. Listamos esses testes a seguir: Teste da pronominalização, Teste da interrogação, Teste do deslocamento (ou topicalização), Teste da clivagem, Teste da elipse, Teste da apassivação, Discorreremos sobre cada um deles, tomando como base Kenedy e Othero (2018) e Negrão et. al (2017). 1.Teste da pronominalização: esse teste é útil para a identificação de sintagmas nominais (isto é, sintagmas que tem como núcleo um substantivo). Para proceder a ele, basta que você substitua uma palavra (ou uma sequência delas) por um pronome pessoal. Se ao substituir, você encontrar uma frase agramatical, então esse constituinte que você escolheu não é um sintagma. De modo contrário, se após a substituição, você encontrar uma frase gramatical, então ele é um sintagma. Já utilizamos esse teste na seção anterior com o exemplo (11),para descobrirmos se os substantivos (João, livro e Maria) eram sintagmas. Como 44 encontramos frases agramaticais, concluímos, por meio deste teste, que essas palavras não são sintagmas. Agora, utilizando o mesmo exemplo, observe a seguir que a substituição das sequências formadas por [artigo + substantivo], ou seja, (O João, um livro e a Maria), gera frases gramaticais, e, por isso, podemos dizer que elas sim são sintagmas: (11) d. Ele disse que vai comprar um livro para a Maria. e. O João disse que vai comprá-lo para a Maria. f. O João disse que vai comprar um livro para ela. É necessário destacar que até a posição vazia pode ser substituída por um pronome pessoal, indicando que ali há um sintagma nominal: g. O João disse que ele vai comprar um livro para a Maria. 2. Teste da interrogação: esse teste consiste na substituição de uma palavra (ou uma sequência delas) por um pronome interrogativo como quem, o que, quando, onde, etc. No exemplo (11) anterior, a sequência [que vai comprar um livro para a Maria] pode, pelo teste da interrogação, ser substituída pelo pronome o que em [O que o João disse?], indicando se tratar de um sintagma. 3. Teste do deslocamento (ou topicalização): consiste no deslocamento de uma palavra (ou uma sequência delas) para diferentes posições ao longo da frase. Esse deslocamento não pode ser feito com palavras isoladas e nem com “pedaços” de sintagmas. Reproduzimos, a seguir, o exemplo (12) tentando deslocar as sequências [para a Maria] e [comprou um]: (12) a. João comprou um livro para a Maria. 45 b. [para a Maria], João comprou um livro. c. João, [para a Maria], comprou um livro. d. João comprou [para a Maria], um livro. e. *[comprou um] João livro para a Maria. f. João livro para a Maria [comprou um]. Observe que o teste de deslocamento mostra que a sequência [para Maria] é um sintagma; já a sequência [comprou um] não é um sintagma, pois o deslocamento desse grupo de palavras para outras posições, torna a frase agramatical. 4. Teste da clivagem: consiste em colocar uma determinada palavra (ou uma sequência delas) entre o verbo ser e a partícula que. Se a frase que resultar for gramatical, esse elemento é um sintagma. Para exemplificar, iremos também clivar a sequência [para Maria] e [comprou um] do exemplo (12): g. Foi [para a Maria] que o João comprou um livro. h. *Foi [comprou um] que o João livro para a Maria. Esse teste também comprova que a sequência [para a Maria] é um sintagma e que a sequência [comprou um livro] não é um sintagma. Agora, para tornar mais claro, vamos clivar, aleatoriamente, outras sequências de palavras do exemplo (12) a fim de verificarmos se elas funcionam ou não como sintagmas dessa frase: i. Foi o João que comprou um livro para a Maria. j. Foi um livro que o João comprou para a Maria. k. Foi o João comprou que um livro para a Maria. O resultado do teste mostra que as sequências o João e um livro são sintagmas e que a sequência o João comprou não é um sintagma. 5. Teste da elipse: consiste na omissão de uma palavra (ou de uma sequência 46 delas) numa estrutura coordenada, fazendo com que essa palavra ou sequência não seja foneticamente produzida e tenha de ser inferida. Observe o exemplo (15), a seguir: (15) a. O João comprou um livro para a Maria e para o Pedro. b. O João comprou um livro para a Maria e [comprou um livro] para o Pedro. A sequência [comprou um livro] sofre elipse na frase (15b), indicando que, nesse caso, trata-se de um sintagma. O mesmo pode ser dito a respeito da sequência [convidou o João] na frase (16) a seguir: (16) a. Maria convidou o Joãopara o casamento e para a festa. b. Maria convidou o João para o casamento e [convidou o João] para a festa. 6. Teste da apassivação: consiste em transformar uma frase na voz ativa para a voz passiva. Nesse caso, somente frases construídas com verbos transitivos diretos é que permitem a apassivação. Por exemplo: (16) a. O João escreveu um poema. b. Um poema foi escrito pelo João. Esse teste mostra que tanto as sequências [um poema] quanto [o João] são sintagmas, pois ambas podem ser deslocadas para posições diferentes ao longo da frase. Em linhas gerais, os testes que se demonstram mais eficazes para identificação de sintagmas são o do deslocamento e o da clivagem. 47 3.2 CLASSIFICAÇÃO DOS SINTAGMAS Antes mesmo de apresentarmos uma classificação dos sintagmas, é necessário que você entenda que toda frase é estruturada em torno de um princípio hierárquico.Segundo Kenedy e Othero (2018, p. 28), “a existência dos sintagmas, como unidade intermediária entre as palavras e frases, evidencia uma propriedade fundamental da sintaxe das línguas naturais: a hierarquia”. Assim sendo, “as palavras encontram-se estruturadas em sintagmas, os quais se organizam dentro de outros sintagmas, de maneira recursiva, até que o sintagma final da estrutura (a frase) seja constituído”. Para exemplificar esse princípio da hierarquia, vamos analisar a frase (17), a seguir: (17) Os amigos da Maria conhecem o João. Ao analisarmos esta frase, é possível observar que: Na posição de sujeito, a palavra os se junta à palavra amigos e forma um sintagma [os amigos]. Além disso, as palavras de, a e Maria se juntam e formam outro sintagma [da Maria] e este se junta a[os amigos], formando um outro sintagma maior [os amigos da Maria]. Esse sintagma maior é atraído pelo verbo conhecer, assim como o sintagma [o João]. A partir dessa combinação de palavras e sintagmas chegamos à frase. Outra premissa básica da sintaxe das línguas naturais é a de que todo sintagma é organizado em torno de um núcleo que determina a sua categoria, ainda que ele seja um sintagma unitário ou um sintagma nulo / vazio (KENEDY; OTHERO, 2018). Neste curso, tomando como base Kenedy e Othero (2018), estudaremos quatro tipos de sintagmas da língua portuguesa: o SN, sintagma nominal (nucleado 48 por um substantivo); o SV, sintagma verbal (nucleado por um verbo); o SP, sintagma preposicional (nucleado por uma preposição) e o SA, sintagma adjetival (nucleado por um adjetivo). A figura a seguir, criada com base nesses autores, permite ver que a natureza morfológica do núcleo projeta, para cima, a natureza do sintagma: Apresentamos, a seguir, uma definição breve de cada um desses quatro sintagmas, tomando como base Kenedy e Othero (2018) e a Nova Gramática do Português Brasileiro, de Castilho (2012): Sintagma nominal (SN): é nucleado por um substantivo e pode ocupar as funções sintáticas de sujeito (18a), objeto direto (18b) e complemento de preposição (18c): (18) a. [O João] gosta de doces. b. A Maria ama [o João]. c. A Maria gosta d[o João]. Sintagma verbal (SV): é nucleado por um verbo e ocupa sempre a função sintática de predicado. Desse modo, o SV contém todos os outros constituintes presentes na frase, a exceção do sujeito e de eventuais vocativos. Reproduzimos as frases do exemplo (18), destacando o SV: (18) a.O João [gosta de doces]. b. A Maria [ama o João]. c. A Maria [gosta do João]. SN SV SP SA N V P A Figura 1: Natureza Morfológica Do Núcleo 49 Sintagma preposicional: é nucleado por uma preposição e, de modo geral ocupa as funções sintáticas de objeto indireto (19), complemento nominal (20), adjunto adnominal (21) e adjunto adverbial (22). (19) a. João chegou [de Recife]. b. João foi [ao parque]. c. João precisava [de ajuda]. (20) a. A confiança [nos alunos] era grande. b. A construção [da casa] ficou perfeita. c. A invenção [da bomba atômica] chocou o mundo. (21) a. A confiança dos alunos era grande. b. João comprou um livro [de matemática] para a Maria. c. João tomou café [com leite]. (22) a. João chegou de Recife [em um dia de chuva]. b. João cortou o bolo [com a faca]. c. João tomou café com leite [no café da manhã]. Sintagma Adjetival (SA): é nucleado por um adjetivo e pode funcionar como adjunto adnominal, enquanto constituinte do sintagma nominal (ex.: Céu [Azul]), ou, como predicativo, enquanto constituinte do sintagma verbal (Maria é [bonita]). Após essa explicação sobre os quatro sintagmas, resta-nos discorrer sobre outros dois elementos que podem fazer parte da estrutura hierárquica dos sintagmas: os complementos e os especificadores. 50 Como dissemos anteriormente, o núcleo pode ser o único elemento de um sintagma, entretanto ele também pode estabelecer relações sintáticas com outros elementos, denominados complementos e especificadores. O sintagma [a construção da casa], por exemplo, tem como núcleo o substantivo construção e, por isso, é classificado como SN. Esse núcleo contém um complemento, que é o SP [da casa], e um especificador, que é o artigo definido a. Na estrutura interna do SP [da casa], por sua vez, temos como núcleo a preposição de e vemos que este é formado por um complemento que é o SN [a casa]. O SN [a casa], por sua vez, é formado pelo núcleo casa e apenas por um especificador que também é o artigo definido a. 51 FIXANDO O CONTEÚDO 1. O sintagma pode ser definido como: a) a unidade formada por palavras isoladas que desempenham as funções sintáticas em uma frase. b) a unidade formada por um grupo de palavras que é responsável por desempenhar as funções sintáticas em uma frase. c) a unidade intermediária de análise da sintaxe responsável por desempenhar as funções sintáticas em uma frase. d) a unidade máxima de análise da sintaxe responsável por desempenhar as funções sintáticas em uma frase. e) a unidade mínima de análise da sintaxe responsável por desempenhar as funções sintáticas em uma frase. 2. Uma crítica que pode ser feita à GT com relação à definição de pronomes é que: a) os pronomes não substituem apenas os substantivos, mas sim, a sequência de palavras formada por [artigo+substantivo]. b) os pronomes não substituem os substantivos e, sim, os sintagmas nominais. c) os pronomes substituem apenas a sequência de palavras formada por [substantivo + adjetivo]. d) os pronomes substituem apenas os substantivos e nunca os sintagmas nominais. e) os pronomes substituem os substantivos, os adjetivos e os advérbios. 3. Qual termo em destaque é um sintagma? (Caso seja necessário, utilize os testes de deslocamento e clivagem para descobrir) a) [A Helena apresentou] uma palestra na universidade. b) A Helena [apresentou uma] palestra na universidade. c) A Helena apresentou uma [palestra na] universidade. d) A Helena apresentou uma [palestra] na universidade. e) A Helena apresentou uma palestra [na universidade]. 52 4. Qual é a classificação do sintagma destacado em "desenvolvimento pessoal [com o Professor Karnal]"? a) Adjetival. b) Nominal . c) Oração. d) Preposicional. e) Verbal. 5. Qual é a classificação do sintagma destacado em: “Confira os [novos] produtos da Apple” (UOL, 15 set. 2021)? a) Adjetival. b) Não é um sintagma. c) Nominal. d) Preposicional. e) Verbal. 6. Qual é a classificação do sintagma destacado no título da notícia "[Inglaterra] inicia grande reforma em círculo de pedra de Stonehenge" (Uol, 15 set. 2021)? a) Adjetival. b) Não é um sintagma. c) Nominal. d) Preposicional. e) Verbal. 7. Qual é a alternativa que apresenta a classificação correta dos sintagmas destacados em "Inglaterra inicia grande reforma [em círculo [de pedra [de Stonehenge]]]" (Uol, 15 set. 2021)? a) [SA em círculo [SP de pedra [SP de Stonehenge]]]. 53 b) [SN em círculo [SP de pedra [SA de Stonehenge]]]. c) [SN em círculo [SP de pedra [SP de Stonehenge]]]. d) [SP em círculo [SP de pedra [SP de Stonehenge]]]. e) [SV em círculo [SN de pedra [SP de Stonehenge]]]. 8. (AOCP - 2016) Na oração“As investigações iniciais ocorrem aqui e, na hora que a criança tem alta, a investigação tem continuidade na cidade onde ela reside”, o pronome pessoal “ela” funciona como elemento coesivo, retomando o sintagma: a) “A gente”. b) “Esse município”. c) “A criança”. d) “A investigação” e) “Na cidade”. 54 OS TERMOS ESSENCIAIS DA ORAÇÃO Estudamos, na unidade 2, que a Norma Gramatical Brasileira classifica o sujeito e o predicado como termos essenciais da oração. Kenedy e Othero (2018) explicam que esses elementos são assim considerados por comporem a estrutura básica de toda oração. Nesse sentido, todas as demais funções sintáticas (como a dos complementos nominais, complementos verbais, adjuntos adnominais, adjuntos adverbiais etc.) são desempenhadas por elementos que se encontram ou no interior do SNsujeito ou no interior do SVpredicado. Observe, nas frases a seguir, que temos orações constituídas de um SN sujeito e um SV predicado: a. [ORAÇÃO [SN Orquídeas [SV dão flores]]. b. [ORAÇÃO [SN As orquídeas do meu jardim [SV dão flores [SPem setembro]]]. No exemplo (23a), o SN sujeito é constituído apenas pelo seu núcleo, que é o substantivo orquídeas e o SV predicado é constituído pelo seu núcleo, que é o verbo dar, e por um complemento, que é o SN [flores]. Esse complemento assume a função sintática de objeto direto. No exemplo (23b), além do núcleo orquídeas, o SN contém um especificador, que é o artigo definido as, e o SP [do meu jardim]. Tanto esse especificador quanto o SP assumem a função sintática de adjunto adnominal. Além disso, observe que, dentro do SV, o SP [em setembro] assume a função sintática de adjunto adverbial. É considerando o fato de que todas as demais funções sintáticas de uma frase estão no interior do SNsujeito e do SVpredicado que podemos dizer que esses são os termos essenciais da oração. UNIDADE 04 55 Cabe lembrar que, ainda que o SNsujeito seja foneticamente nulo, como mostra o exemplo (24), a seguir, podemos identificá-lo pela flexão morfológica do verbo, ou seja, pela terminação [-ei]: (24) [SNsujeito Ø] Cheguei cedo. Nas seções subsequentes, apresentaremos, respectivamente, uma descrição acerca do sujeito (4.1) e suas classificações (4.1.1), e uma descrição acerca do predicado (4.2) e suas classificações (4.2.1). 4.1 O SUJEITO O SNsujeito, quando foneticamente realizado, pode ter seu núcleo formado por um substantivo (3a) ou por um pronome (3b): (25) a. O Pedro fez a prova do Enem. b. Ele fez a prova do Enem. Quando formado por um pronome, segundo Cunha e Cintra (2017), o SNsujeitopode ser um pronome pessoal do caso reto de 1ª, 2ª ou 3ª pessoa, tanto do singular (eu, tu/você, ele) quanto do plural (nós, vocês, eles): (26) a. Eu fiz a prova do Enem. b. Você fez (ou tu fizeste / fez) a prova do Enem. c. Ele fez a prova do Enem. d. Nós fizemos (ou a gente fizemos / fez) a prova do Enem. e. Vocês fizeram a prova do Enem. f. Eles fizeram a prova do Enem. 56 Por outro lado, O SNsujeito também pode ser formado pronomes demonstrativos (27a), relativos (27b), interrogativos (27c) e indefinidos (27d), conjugados na 3ª pessoa (CUNHA; CINTRA, 2017): (27) a. Aquele é o diário da Maria. b. O diário, que está em cima da mesa, é da Maria. c. Quem é a dona daquele diário? d. Ninguém é a dona daquele diário. Segundo esses mesmos gramáticos, o numeral também pode ser núcleo de um SNsujeito: (28) Os dois viajaram ontem. 57 Após a descrição acerca da estrutura do SNsujeito, passaremos para a apresentação da classificação, proposta pela NGB, para essa função sintática. 4.2 TIPOS DE SUJEITO Dentro da tradição gramatical, o sujeito de uma oração costuma receber cinco classificações: simples, composto, oculto (ou desinencial), indeterminado e inexistente (ou oração sem sujeito). A diferença entre o sujeito simples e composto se estabelece pela quantidade de núcleos que o SNsujeito apresenta. Quando este contém apenas um só núcleo, ele é classificado como sujeito simples, quando apresenta mais de um núcleo, ele é classificado como sujeito composto (KENEDY; OTHERO, 2018). Observe os exemplos (29) e (30), a seguir: (29) [SNsujeito As rosas] têm espinhos. (30) “[ SNsujeito O burro e o cavalo] nadavam ao lado da canoa.” (Herberto Sales) Em (29), o SNsujeito é formado por apenas um núcleo, que é o substantivo rosas; por isso, ele é classificado, sintaticamente, como sujeito simples. Já, em (30), o SNsujeito é formado por dois núcleos, os substantivos burro e cavalo, e, por isso, ele é classificado como sujeito composto. As classificações do sujeito oculto, indeterminado e inexistente compartilham a propriedade de não terem o SN realizado foneticamente. Logo, a oração apresentará um SN nulo/vazio (Ø) (KENEDY; OTHERO, 2018). Comparemos os exemplos a seguir, em que temos ocorrências de um sujeito oculto (31), sujeito indeterminado (32) e sujeito inexistente (33): (31) a. [SNsujeito Ø] Viajarei amanhã. b. O João chegou e [SNsujeito Ø] pegou um livro. c. O João comprou cinco novos livros hoje na livraria nova do campus. Amanhã, [SNsujeito Ø] pretende voltar lá para adquirir mais alguns. (KENEDY, OTHERO, 58 2018, p.66) (32) a. [SNsujeito Ø] Roubaram o carro do meu tio. b. [SNsujeito Ø] Precisa-se de garçom. (33) a. [SNsujeito Ø] Choveu muito ontem. b. [SNsujeito Ø] Faz muito frio aqui no sul do Brasil. c. [SNsujeito Ø] Já faz tanto tempo que eu ganhei esse livro. d. [SNsujeito Ø] Havia muitas pessoas na manifestação. Em (31a), apesar do SN ser foneticamente nulo, a função sintática de sujeito é inferível por meio do contexto, através da flexão morfológica do verbo. Nesse caso, a desinência verbal [-ei], em viajarei, indica que o sujeito se trata da primeira pessoa do singular eu. Quando isso acontece, esse tipo de sujeito é classificado como sujeito oculto ou desinencial. O sujeito oculto também pode ser recuperado por meio de uma retomada anafórica, na própria oração (31b), ou, em orações ou períodos anteriores (31c). Note que o sujeito do verbo pegar, em (31b), é o mesmo do verbo chegar, ou seja, é o SN [O João]. Da mesma forma, em (31c), o sujeito do verbo pretender é o mesmo do verbo comprar. O sujeito indeterminado ocorre quando não se sabe ou não se quer mencionar o agente da ação expressa pelo verbo (KENEDY; OTHERO, 2018), caso dos exemplos em (32). De modo geral, a gramática tradicional prevê duas maneiras de expressá- lo: 1) quando o verbo está na 3ª pessoa do plural e não faz referência a SN's de orações ou períodos anteriores, caso do exemplo (32a): Roubaram o carro do meu tio. 2) quando o verbo está na 3ª pessoa do singular junto à partícula -se (denominada índice de indeterminação do sujeito), caso do exemplo (32b): Precisa- se de garçom. 59 Observe que, nos exemplos dados em (32), provavelmente, não se sabe ou não se deseja mencionar "quem" roubou o carro ou “quem” está precisando de um garçom. No entanto, é necessário esclarecer que se o SNsujeito puder ser inferido a partir de alguma informação anterior, dada pelo contexto, ele deixa de ser classificado como indeterminado e passa a ser classificado como sujeito oculto. É isso que ocorre nos exemplos dados em (34), a seguir: (34) a. [SNsujeito Os ladrões] apareceram pedindo ajuda e depois [SNsujeito Ø] roubaram o carro do meu tio. b. [SNsujeito O João] disse que [SNsujeito Ø] está precisando de garçom. O sujeito inexistente ocorre com verbos que expressam fenômenos naturais (chover, ventar, nevar, trovejar etc.), fenômenos metereológicos (estar tarde, fazer frio etc.), tempo transcorrido (fazer tantos anos, haver tanto tempo etc.) e com o verbo haver no sentido de 'existir'. Todos os exemplos dados em (33) apresentam sujeito inexistente. Em (33a), o verbo da frase expressa um fenômeno natural: Choveu muito ontem; em (33b), a estrutura verbal expressa um fenômeno meteorológico: Faz muito frio aqui no sul do Brasil; em (33c), expressa tempo transcorrido: Já faz tanto tempo que eu ganhei esse
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