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REGISTRO DE IMÓVEIS E GESTÃO PATRIMONIAL Anna Carolina Gomes dos Reis Fundamentos do Direito Imobiliário Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Reconhecer as noções gerais do registro de imóveis no Brasil. Descrever as finalidades e os efeitos do registro imobiliário. Aplicar os princípios do registro imobiliário. Introdução Neste capítulo, você vai conhecer as características do Direito Imobiliário. A partir delas, você vai compreender melhor esse ramo do Direito e os mecanismos colocados à disposição do profissional que atua nele. O seu estudo terá como base a doutrina, o Código Civil, a Lei nº. 6.015, de 31 de dezembro de 1973, e a Lei nº. 8.935, de 18 de novembro de 1994 — respectivamente, Lei de Registros Públicos (LPR) e lei que regulamenta os serviços notariais e registrais. Inicialmente, você vai se familiarizar com a história do registro imobi- liário e com o conceito de Direito Imobiliário, além de conferir exemplos de algumas operações efetuadas nesse ramo jurídico. Em seguida, você vai estudar os princípios que norteiam o sistema registral e que auxiliam os operadores do Direito e os gestores imobiliários na aplicação das leis. Por fim, você vai se debruçar sobre a ordem de serviço, ou seja, vai ler a respeito das regras de funcionamento dos cartórios, do processo de qualificação registral, da suscitação de dúvida e de alguns deveres dos oficiais registradores na realização do protocolo, da prenotação e da efetivação do registro imobiliário. 1 Conceito e aspectos históricos Antes de conhecer o conceito de Direito Imobiliário, você precisa se familia- rizar com a evolução histórica do sistema registral imobiliário brasileiro. Ao estudar a história do Brasil na escola, você provavelmente aprendeu que, no período colonial, todos os imóveis situados aqui pertenciam à coroa portuguesa. Posteriormente, o território foi dividido em capitanias hereditárias, doadas pela coroa por meio de cartas de sesmaria. Os donos das capitanias deveriam administrar as terras seguindo as ordens do monarca português. Em 1843, foi editada a Lei Orçamentária nº. 317, de 21 de outubro, que disciplinou os registros de hipotecas, caracterizados como garantias. Contudo, ainda não se fazia menção à regulamentação do registro de propriedade. Em 1850, foi publicada a primeira legislação relativa ao registro de imóveis, denominado então “registro do vigário”. Porém, esse registro regularizava apenas a posse, nada mencionava sobre a propriedade. Com a edição da Lei nº. 1.237, de 24 de setembro de 1864, surgiram os registros imobiliários, mas eles ainda mencionavam exclusivamente a transmissão de imóveis suscetíveis a hipoteca e a instituição de ônus reais, deixando mais uma vez de lado o registro de propriedade (CASSETTARI, 2016). Somente com a edição do Código Civil de 1916 é que ocorreu a introdução do registro da transmissão de propriedade, previsto no art. 856. Veja: Art. 856. O registro de imóvel compreende: I — a transcrição dos títulos de transmissão da propriedade; II — a transcrição dos títulos enumerados no art. 532; III — a transcrição dos títulos constitutivos de ônus reais sobre coisas alheias; IV — a inscrição das hipotecas (BRASIL, 1916, documento on-line). Em 1973, foi editada a LPR, atualmente considerada a “bíblia” dos registra- dores e daqueles que trabalham com direitos imobiliários. Essa lei dispõe, entre outros assuntos, sobre registro imobiliário, regras de protocolo, escrituração, prenotações, averbações, cancelamentos, etc. Já em 1994, por meio da Lei nº. 8.935/1994, foi regulamentado o art. 236 da Constituição Federal (BRASIL, 1988). Essa lei discorre sobre os serviços registrais e notariais e impõe regras para atividades delegadas exercidas pelos oficiais registradores (e tabeliães), que são as pessoas dotadas de fé pública e aptas a efetivar o registro público de imóveis. Em 2002, foi sancionado o atual Código Civil (BRASIL, 2002), que também inclui várias regras pertinentes aos registros públicos e à propriedade e à posse de imóveis, como você vai ver mais adiante. Fundamentos do Direito Imobiliário2 Agora que você está mais familiarizado com a história e a evolução legisla- tiva dos registros imobiliários, deve atentar ao conceito de Direito Imobiliário. Do ponto de vista técnico, o Direito Imobiliário é um ramo do Direito Privado que regulamenta as relações jurídicas oriundas da propriedade e a posse de bens imóveis. Nessa área do Direito, o profissional deve ter conhecimento sobre: obrigações; contratos; Direito de Família; direitos do consumidor; Direito Tributário; responsabilidade civil, administrativa e criminal; e Direito Notarial e Registral. Por essa razão, o Direito Imobiliário é considerado um dos ramos mais complexos do Direito. Veja alguns exemplos de operações jurídicas que envolvem o Direito Imobiliário: compra e venda de imóvel; locação de imóveis; registro de imóveis; incorporações imobiliárias; condomínios prediais; regularização de imóveis no âmbito de divórcios e inventários. A seguir, você vai estudar mais detidamente os fundamentos do Direito Imobiliário, conhecendo os princípios que norteiam as atividades de registro imobiliário no Brasil. Além disso, você vai ler sobre o sistema e os meca- nismos utilizados pelas serventias extrajudiciais, popularmente conhecidas como “cartórios”. 2 Princípios do registro imobiliário Os serviços de registro, segundo o art. 1º da Lei nº. 8.935/1994, são serviços de organização técnica e administrativa e devem garantir a publicidade, a autenticidade, a segurança e a efi cácia dos atos jurídicos (BRASIL, 1994). Nesse sentido, a doutrina estabeleceu, adotando como parâmetro a Constituição Federal, a Lei nº. 6.015/1973 e a Lei nº. 8.935/1994, que elencam uma série de princípios que devem amparar os registros imobiliários. São eles: legalidade, titularidade, tipicidade, publicidade, obrigatoriedade, especialidade, instância, cindibilidade, continuidade, prioridade, territorialidade e fé pública. A seguir, você vai conhecer melhor cada um deles. Segundo o jurista Luiz Guilherme Loureiro (2019, p. 535), os princípios registrais possuem três funções: 3Fundamentos do Direito Imobiliário a) Função Informadora ou Integradora: Constituem um modo de orientação ou direção fundamental para que os preceitos concretos tenham por conteúdo disposições lógicas. b) Função Científica: São uma representação intelectual sistematizada do instrumento publicitário integral [...] traduzem as diretrizes que balizam os microssistemas jurídicos); c) Função Aplicativa: Objetivam facilitar a interpretação das normas jurídicas permitindo uma correta aplicação do ordenamento jurídico. O princípio da obrigatoriedade impõe que se deve registrar todo ato praticado entre vivos que objetive transferir, modificar, constituir ou extinguir propriedade ou direito real pertinente a imóveis. Dessa forma, o registro imobiliário é obrigatório e imprescindível para a eficácia desses atos. Assim dispõe o art. 1.227 do Código Civil (BRASIL, 2002, documento on-line) “Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos”. Não existe prazo para que o registro seja efetivado. Contudo, é razoável que as partes não protelem tal ato a fim de não serem prejudicadas no futuro, por exemplo, pela morte do alienante ou por uma penhora do imóvel relativa à dívida contraída. O princípio da legalidade traduz a ideia de que todos os atos praticados pelos registradores estão vinculados às determinações contidas na lei. Os oficiais ou as partes não podem fazer exigências proibidas pela lei para efetuar o registro nem deixar de exigir aquilo que a lei obriga. A legalidade impõe que toda a documentação para a efetivação satisfaça os requisitos legais. É dever do oficial fazer a qualificação doprocesso de registro justamente para examinar a validade e a eficácia dos atos de registro e garantir a segurança dos negócios jurídicos imobiliários. O princípio da tipicidade também é decorrente da legalidade. Esse prin- cípio informa que o oficial registrador só pode praticar cada ato conforme determinação da legislação. Então, a lei estabelece atos que serão levados a registro e outros que serão averbados. O ato de registro possui a chamada “tipicidade fechada”, pois o registrador deve seguir estritamente o que está previsto em lei. O art. 221 da LPR determina que só são admitidos registros de: I — escrituras públicas, inclusive as lavradas em consulados brasileiros; II — escritos particulares autorizados em lei, assinados pelas partes e teste- munhas, com as firmas reconhecidas, dispensado o reconhecimento quando se tratar de atos praticados por entidades vinculadas ao Sistema Financeiro da Habitação; III — atos autênticos de países estrangeiros, com força de instrumento público, legalizados e traduzidos na forma da lei, e registrados no cartório do Registro Fundamentos do Direito Imobiliário4 de Títulos e Documentos, assim como sentenças proferidas por tribunais estrangeiros após homologação pelo Supremo Tribunal Federal; IV — cartas de sentença, formais de partilha, certidões e mandados extraídos de autos de processo. V — contratos ou termos administrativos, assinados com a União, Estados, Municípios ou o Distrito Federal, no âmbito de programas de regularização fundiária e de programas habitacionais de interesse social, dispensado o reconhecimento de firma (BRASIL, 1973, documento on-line). No Registro de Imóveis, além da matrícula, é feito o registro de vários atos, elencados no art. 167, I, da Lei nº. 6.015/1973. Deve ocorrer o registro, por exemplo: 1) da instituição de bem de família; 2) das hipotecas legais, judiciais e convencionais; 3) dos contratos de locação de prédios, nos quais tenha sido consignada cláusula de vigência no caso de alienação da coisa locada; [...] 7) do usufruto e do uso sobre imóveis e da habitação, quando não resultarem do direito de família; [...] 9) dos contratos de compromisso de compra e venda de cessão deste e de promessa de cessão, com ou sem cláusula de arrependimento, que tenham por objeto imóveis não loteados e cujo preço tenha sido pago no ato de sua celebração, ou deva sê-lo a prazo, de uma só vez ou em prestações; [...] 28) das sentenças declaratórias de usucapião; 29) da compra e venda pura e condicional; [...] 34) da desapropriação amigável e das sentenças que, em processo de desapro- priação, fixarem o valor da indenização (BRASIL, 1973, documento on-line). Por outro lado, há a tipicidade flexível destinada aos atos de averbação. Ela pode ser ampliada desde que não prejudique terceiros ou provoque alteração nos imóveis. O art. 167, II, da Lei nº. 6.015/1973 determina os atos que devem ser averbados. Deve ocorrer a averbação, por exemplo: 1) das convenções antenupciais e do regime de bens diversos do legal, nos registros referentes a imóveis ou a direitos reais pertencentes a qualquer dos cônjuges, inclusive os adquiridos posteriormente ao casamento; 2) por cancelamento, da extinção dos ônus e direitos reais; 3) dos contratos de promessa de compra e venda, das cessões e das promessas de cessão a que alude o Decreto-lei nº 58, de 10 de dezembro de 1937, quando o loteamento se tiver formalizado anteriormente à vigência desta Lei; [...] 16) do contrato de locação, para os fins de exercício de direito de preferência (BRASIL, 1973, documento on-line). 5Fundamentos do Direito Imobiliário O princípio da publicidade é considerado um dos pilares do registro imo- biliário, pois é por meio dele que se garante que os registros se tornem públicos e acessíveis a qualquer pessoa que tiver interesse. A publicidade possibilita os efeitos declaratórios e constitutivos do registro, dá amplo conhecimento aos atos de registro, garante maior segurança nas relações jurídicas imobiliárias e permite a expedição de certidões de matrícula dos imóveis. Em decorrência da publicidade e do acesso público aos registros, não é permitido que alguém alegue desconhecer os aspectos jurídicos dos imóveis, como possíveis ônus, por exemplo, penhora e hipoteca. Lembre-se de que acessibilidade não significa sempre gratuidade. Os serviços de busca de anotações nos registros de imóveis podem ser cobrados. Os valores são determinados em tabelas de taxas e emolumentos fixados em lei estadual. O princípio da especialidade requer que todos os elementos envolvidos no registro imobiliário sejam corretamente identificados e especificados. Nesse sentido, a LRP afirma o seguinte: Art. 225. Os tabeliães, escrivães e juízes farão com que, nas escrituras e nos autos judiciais, as partes indiquem, com precisão, os características, as confrontações e as localizações dos imóveis, mencionando os nomes dos confrontantes e, ainda, quando se tratar só de terreno, se esse fica do lado par ou do lado ímpar do logradouro, em que quadra e a que distância métrica da edificação ou da esquina mais próxima, exigindo dos interessados certidão do registro imobiliário (BRASIL, 1973, documento on-line). As mesmas minúcias relativas à caracterização do imóvel devem constar dos instrumentos particulares apresentados em cartório para registro. Se nos títulos a caracterização do imóvel não coincidir com a que consta do registro anterior, aqueles serão considerados irregulares para efeito de matrícula. Além disso, a LPR estabelece que, nos autos judiciais que versem sobre imóveis rurais, a localização, os limites e as confrontações serão obtidos: Fundamentos do Direito Imobiliário6 a partir de memorial descritivo, assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica — ART, contendo as coordena- das dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, georreferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisão posicional a ser fixada pelo INCRA, garantida a isenção de custos financeiros aos proprietários de imóveis rurais cuja somatória da área não exceda a quatro módulos fiscais (BRASIL, 1973, documento on-line). Essas exigências legais permitem que os imóveis fiquem bem caracte- rizados, diminuindo possíveis fraudes e evitando conflitos. O princípio da especialidade possui ainda um subprincípio chamado de “unicidade”, o qual impõe que cada imóvel tenha uma matrícula e que cada matrícula possua um único imóvel. A matrícula inclui todas as possíveis alterações que o imóvel venha a sofrer, tais como registros e averbações. O princípio da instância estabelece que o registrador, com exceção das anotações e averbações obrigatórias, só pode realizar atos de registro ou averbação se for solicitado por quem de direito. Nesse sentido, a regra é que as anotações sejam feitas: “[...] I — por ordem judicial; II — a requerimento verbal ou escrito dos interessados; III — a requerimento do Ministério Público, quando a lei autorizar” (BRASIL, 1973, documento on-line). O princípio da instância pode também ser chamado de “reserva de iniciativa”, “rogação” ou “inércia do registrador”. Por sua vez, o princípio da continuidade determina que todo registro deve se apoiar no registro anterior. Só é possível efetuar um registro se aquele que figura como outorgante for o titular do registro anterior. A LPR prevê que, se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro (BRASIL, 1973). Há duas exceções às quais não é aplicado o princípio da continuidade. A primeira se refere à usucapião, já que nesse caso não há transmissão da propriedade pelo titular anterior constante no registro do imóvel. A segunda exceção se refere à possibilidade de o município solicitar ao cartório de registro 7Fundamentos do Direito Imobiliário de imóveis competentea abertura de matrícula de parte ou da totalidade de imóveis públicos oriundos de parcelamento do solo urbano implantado, ainda que não inscrito ou registrado, por meio de requerimento acompanhado de documentos prescritos na LRP (art. 195–A) (BRASIL, 1973). O princípio da prioridade decorre de um ato registral que se chama “prenotação”. A prenotação é uma anotação realizada pelo registrador no livro de protocolo e apõe a ordem de apresentação do título no registro de imóvel. A prioridade, então, é definida pela ordem de entrada do título na serventia extrajudicial: aquele que primeiro apresentar o título terá preferência para o registro. Na seção a seguir, que trata sobre a ordem de serviço, você vai conhecer melhor o ato de prenotação e a prioridade. O princípio da cindibilidade ou parcelaridade permite que, ao efetuar o registro, o oficial considere apenas algumas partes do título. A cindibilidade pode ocorrer porque há uma nulidade parcial passível de separação do registro, ou porque a parte interessada fez um requerimento específico apontando qual parte do título deverá, ou não, ser anotada para fins de registro. Já o princípio da territorialidade ou circunscrição determina a limitação da competência da serventia extrajudicial para a efetivação de registros e averbações. Cada serventia possui competência determinada por lei. Caso o registro seja efetuado em serventia incompetente, o ato será considerado nulo. O princípio da titularidade estabelece que os atos de registro só podem ser praticados por quem tem fé pública. Mas você sabe quem tem fé pública? A fé pública é detida pelas pessoas que são nomeadas pelo poder público para exercer a atividade delegada de serviço de registros públicos. Assim, só possuem validade os atos praticados por oficiais registradores e seus prepostos, nos limites estabelecidos pela lei. Por fim, o princípio da fé pública informa que todos os atos registrais, praticados mediante delegação do poder público por meio dos oficiais registradores, gozam de autenticidade. A fé pública é o princípio disposto no art. 3º da Lei nº. 8.935/1994 (BRASIL, 1994). 3 Ordem de serviço, qualificação registral e fiscalização A ordem de serviço diz respeito às regras de funcionamento das serventias extrajudiciais, tais como o horário de funcionamento, a possibilidade de reali- zação de atos fora do horário de expediente cartorário, a ordem de recebimento de documentação, as custas e os emolumentos. Assim, os serviços de registro imobiliário serão prestados, de modo efi ciente e adequado, em dias e horários Fundamentos do Direito Imobiliário8 estabelecidos pelo juízo competente, atendidas as peculiaridades locais, em lugar de fácil acesso ao público e que ofereça segurança para o arquivamento de livros e documentos. O serviço de registro imobiliário começará e terminará às mesmas horas em todos os dias úteis. Lembre-se de que tais horários não são iguais em todo o País, portanto o profissional deve verificar a lei estadual ou as regras do Poder Judiciário do estado ao qual a serventia extrajudicial está submetida. De toda forma, o atendimento ao público deverá ser de no mínimo seis ho- ras diárias. Essa regra não se aplica aos registros civis de pessoas naturais, que funcionarão todos os dias, adotando o sistema de plantão para sábados, domingos e feriados. Se o registro for lavrado fora do horário regulamentar ou em dias em que não houver expediente, o respectivo ato será considerado nulo, e o oficial que der causa a tal nulidade será responsabilizado civil e criminalmente. A responsabilização civil do oficial depende de comprovação de dano pela parte que alegar a nulidade do registro. Quanto à res- ponsabilidade penal, se for o caso, o oficial poderá responder por crime de prevaricação. Os oficiais titulares de cartório adotarão o melhor regime interno de modo a assegurar às partes a ordem de precedência na apresentação dos seus títulos, estabelecendo-se, sempre, o número de ordem geral. Contudo, é possível que, diante do excesso de atividades, os títulos apresentados no horário regulamentar não sejam registrados até a hora do encerramento do serviço. Nesse caso, esses títulos aguardarão o dia seguinte, no qual serão registrados preferencialmente. De acordo com o art. 12 da Lei nº. 6.015/1973, “Nenhuma exigência fiscal, ou dúvida, obstará a apresentação de um título e o seu lançamento do Protocolo com o respectivo número de ordem, nos casos em que da precedência decorra prioridade de direitos para o apresentante” (BRASIL, 1973, documento on-line). Além disso, independem de apontamento no protocolo os títulos apresentados apenas para exame e cálculo dos respectivos emolumentos. As regras pertinentes à apresentação e à qualificação dos títulos levados a registro estão previstas nos arts. 183 a 216–A da LPR (BRASIL, 1973). A seguir, você vai ver algumas delas, mas o ideal é que você leia todos os artigos diretamente no referido diploma jurídico, pois isso é muito importante para a excelência profissional. 9Fundamentos do Direito Imobiliário Ao serem protocolados, os títulos receberão o número de ordem que lhes competir em razão da sequência rigorosa de sua apresentação. A escrituração do protocolo caberá tanto ao oficial titular como ao seu substituto legal, podendo ser feita ainda por escrevente auxiliar expressamente designado pelo oficial titular ou pelo seu substituto legal (mediante autorização do juiz competente), ainda que os segundos não estejam nem afastados, nem impedidos. O número de ordem determinará a prioridade do título, e esta, a preferência dos direitos reais, ainda que uma mesma pessoa apresente mais de um título simultaneamente. Nesse sentido, veja o que afirma o art. 1.246 do Código Civil (BRASIL, 2002, documento on-line): “O registro é eficaz desde o mo- mento em que se apresentar o título ao oficial do registro, e este o prenotar no protocolo”. Após o protocolo do título, serão realizadas as prenotações, que consistem numa série de atos de buscas e na elaboração de resumos. Feita a prenotação, como regra, inicia-se o prazo de 30 dias destinado à qualificação registral e ao efetivo registro. Ao oficial registrador, cabe a qualificação registral. Ela é um mecanismo que visa a garantir a efetiva relação entre a titularidade presumida e a titu- laridade verdadeira de um imóvel. Em outras palavras, fazer a qualificação registral significa conferir a autenticidade do título e publicizar o requeri- mento de registro de imóvel. Assim, o oficial tem a incumbência de verificar o protocolo do registro no que se refere ao cumprimento de requisitos legais (aspectos formais) e à exatidão nas qualificações do alienante, como o nome constante no registro do titular do domínio e o estado civil das partes. Tudo isso serve para impedir, na máxima medida, fraudes e ilegalidades no registro imobiliário (LOUREIRO, 2019). Algumas regras são impostas pela lei para o registro de títulos. A seguir, veja quais são elas. 1. Não serão registrados no mesmo dia títulos pelos quais se constituam direitos reais contraditórios sobre o mesmo imóvel. 2. O título de natureza particular apresentado em uma só via será arqui- vado em cartório, fornecendo o oficial, a pedido, certidão desse título. 3. Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outor- gante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro. 4. A matrícula será feita à vista dos elementos constantes do título apre- sentado e do registro anterior que constar do próprio cartório. Fundamentos do Direito Imobiliário10 No processo de qualificação, o oficial poderá: verificar que o título é perfeito e efetuar o registro; verificar a existência de vícios e solicitar que sejam sanados; verificar que o título possui vícios insanáveis e devolvê-lo ao apresen- tante, anotando o evento no protocolo. Se o interessado não concordarcom a devolução do título ou com os vícios apontados pelo oficial registrador, ele poderá iniciar um procedimento de natureza administrativa perante o juízo competente. Tal procedimento se chama “suscitação de dúvida”. Esse procedimento é regulamentado pelo art. 198 e seguintes da LPR (BRASIL, 1973). Além disso, como regra, se não ocorrer o registro depois de passados 30 dias do protocolo, o título deverá ser novamente apresentado e protocolado. Entretanto, nesse caso, o requerente passa a ter preferência na ordem de registro. Pelos atos que praticarem, os oficiais de registro terão direito, a título de remu- neração, aos emolumentos fixados nos regimentos de custas do Distrito Federal, dos estados e dos territórios, os quais serão pagos diretamente pelo interessado, no ato de requerimento ou no da apresentação do título. O valor desses emolumentos é tabelado e fixado por lei estadual. A tabela com os valores deve ser afixada em local visível, de fácil leitura e acessível ao público. Dessa forma, o oficial registrador pode cobrar o pagamento dos emolumentos na conclusão do ato, mas não pode cobrar valor mais alto ou mais baixo do que aquele determinado pela lei. Como afirma o parágrafo único do art. 14 da Lei nº. 6.015/1973, “O valor correspondente às cus- tas de escrituras, certidões, buscas, averbações, registros de qualquer natureza, emolumentos e despesas legais constará, obrigatoriamente, do próprio documento, independentemente da expedição do recibo, quando solicitado” (BRASIL, 1973, documento on-line). Por fim, como você sabe, os serviços de registro público são atividades privadas, porém exercidas mediante delegação do poder público. Logo, sofrem fiscalização permanente do Estado. A fiscalização das serventias registrais 11Fundamentos do Direito Imobiliário é realizada pelo Poder Judiciário, assim definido na órbita estadual e do Distrito Federal. Tal fiscalização ocorre sempre que necessário ou mediante representação de qualquer interessado, quando da inobservância de obrigação legal por parte do oficial de registro ou de seus prepostos. Cabe ao Poder Judiciário zelar para que os serviços de registro sejam prestados com rapidez, qualidade satisfatória e eficiência. Além disso, o Poder Judiciário pode sugerir à autoridade competente a elaboração de planos para adequar e melhorar a prestação desses serviços, observando também critérios populacionais e socioeconômicos. BRASIL. Constituição da república federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, 5 abr. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ constituicao.htm. Acesso em: 12 maio 2020. BRASIL. Lei nº. 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Coleção de Leis do Brasil, Rio de Janeiro, 5 jan. 1976. Disponível em: http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/LEIS/L3071impressao.htm. Acesso em: 12 maio 2020. BRASIL. Lei nº. 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 31 dez. 1973. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/CCivil_03/leis/L6015compilada.htm. Acesso em: 12 maio 2020. BRASIL. Lei nº. 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o art. 236 da Consti- tuição Federal, dispondo sobre serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, 21 nov. 1994. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8935.htm. Acesso em: 12 maio 2020. BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, 11 jan. 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/2002/l10406.htm. Acesso em: 12 maio 2020. LOUREIRO, L. G. Registros públicos: teoria e prática. 10. ed. Salvador: JusPodivm, 2019. CASSETTARI, C. (coord.). Registro de Imóveis II: atos ordinários. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. Fundamentos do Direito Imobiliário12 Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun- cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. 13Fundamentos do Direito Imobiliário