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UC1: Texto Base Site: E-projeto UFPel Curso: 2024 - Ensino de Metodologias para o Ensino Médio e Preparação para o Enem na Educação de Surdos Livro: UC1: Texto Base Impresso por: ALESSANDRA DOS SANTOS LACERDA ROLA Data: terça-feira, 30 jul. 2024, 17:34 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 1/18 https://e-projeto.ufpel.edu.br/ Índice 1. Apresentação 2. INTRODUÇÃO 2.1. ESTRUTURA DE ENSINO – ENSINO MÉDIO 2.2. PROPOSTA CURRICULAR DE ACORDO COM A BNCC 2.3. PROPOSTA CURRICULAR NA PERSPECTIVA SURDA 3. PERFIL DOS ESTUDANTES SURDOS E PROFISSIONAIS DO ENSINO MÉDIO 3.1. PERFIL DOS/AS ESTUDANTES SURDOS/AS DO ENSINO MÉDIO 3.2. PAPEL DO PROFESSOR BILÍNGUE 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 2/18 1. Apresentação Olá, alunos e alunas! É com grande satisfação que me apresento: sou Ana Regina Campello, militante e ativista da comunidade Surda desde 1984. Naquele ano, tive a honra de criar a Comissão de Luta pelo Direito dos Surdos, que contribuiu para a construção da perspectiva surda no modelo da Feneis em 1987. Minha trajetória acadêmica inclui formação em Biblioteconomia pela Universidade Santa Úrsula (USU) e Pedagogia com Licenciatura em Educação Especial pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Sou doutora em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e realizei parte do mestrado em Linguística com bolsa sanduíche na Universidade de Gallaudet. Atualmente, leciono nos cursos de graduação em Pedagogia (presencial e a distância), extensão, pós-graduação stricto sensu do nstituto Nacional de Educação de Surdos (INES) e o Mestrado Profissional em Diversidade e Inclusão (CMPDI) da Universidade Federal Fluminense (UFF), além do doutorado do Programa de Pós-graduação em Ciências, Tecnologias e Inclusão (PGCTIn) da UFF. Sou pesquisadora líder do Grupo de Pesquisa: Instrução da Libras como L1 e L2 e professora dos Cursos de Formação de Professores Bilíngues em parceria com a Diretoria de Políticas da Educação Bilíngue de Surdos (Dipebs) do Ministério da Educação (MEC) junto a UFF. Ao longo da minha carreira, publiquei diversos artigos e livros, tanto no Brasil quanto no exterior, e atuo como tradutora e intérprete de vídeos e materiais didáticos. É um prazer imenso ministrar esta disciplina e espero que possamos compartilhar muitos conhecimentos juntos! 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 3/18 2. INTRODUÇÃO Este tema é o primeiro de uma série de apresentações de conhecimentos científicos acerca das “Estratégias e Metodologias para Ensino Médio” do CURSO DE APERFEIÇOAMENTO EM FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PROFISSIONAIS: ENSINO DE METODOLOGIAS PARA O ENSINO MÉDIO E PREPARAÇÃO PARA O ENEM NA EDUCAÇÃO DE SURDOS, financiado pelo Ministério da Educação (MEC) por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e coordenado pela Diretoria de Políticas de Educação Bilíngue de Surdos (Dipebs). O curso é destinado a formação de professores que trabalham com os/as estudantes surdos/as do ensino médio. Atualmente temos legislações que amparam o ensino desde a educação infantil até o ensino superior, como a BNCC – Base Nacional Comum Curricular, que é definida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB sob o nº 9.394/1996 (Brasil, 1996), assim como recentemente, em 2021, a Lei nº 14.191 / 2021 (Brasil, 2021) que introduziu a educação bilíngue dos surdos como nova modalidade de ensino. Estas são as bases que nortearão os currículos dos sistemas e redes de ensino dos estados federativos do Brasil, como também as propostas pedagógicas de todas as escolas públicas e privadas de Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio no país. Apesar da Base ser elaborada e construída pela perspectiva ouvinte, é igualmente importante para a comunidade surda dentro da interculturalidade, que também estabelece conhecimentos, competências e habilidades que se espera que todos os/as estudantes surdos/as desenvolvam ao longo da educação básica. As referências sobre os princípios éticos, políticos e estéticos apresentados nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica vem acrescentar aos propósitos que direcionam a educação do nosso país para a formação humana integra na construção de uma sociedade justa, consciente, democrática e inclusiva, com o uso de duas línguas: Libras e língua portuguesa. Apesar desta disciplina estar voltada ao ensino médio, é importante lembrar a continuidade do processo de ensino que vai além da educação básica (que envolve a Educação Infantil, o Ensino Fundamental obrigatório de nove anos e o Ensino Médio) com o uso da língua de instrução, especialmente na presença de estudante surdo, conforme o artigo 5º e do artigo 22º (II, & 1º) do Decreto 5.626/2005 (Brasil, 2005): Art. 5º A formação de docentes para o ensino de Libras na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental deve ser realizada em curso de Pedagogia ou curso normal superior, em que Libras e Língua Portuguesa escrita tenham constituído línguas de instrução, viabilizando a formação bilíngue. Art. 22. As instituições federais de ensino responsáveis pela educação básica devem garantir a inclusão de alunos surdos ou com deficiência auditiva, por meio da organização de: I - escolas e classes de educação bilíngue, abertas a alunos surdos e ouvintes, com professores bilíngues, na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental; II - escolas bilíngues ou escolas comuns da rede regular de ensino, abertas a alunos surdos e ouvintes, para os anos finais do ensino fundamental, ensino médio ou educação profissional, com docentes das diferentes áreas do conhecimento, cientes da singularidade lingüística dos/as estudantes surdos/as, bem como com a presença de tradutores e intérpretes de Libras - Língua Portuguesa. § 1º São denominadas escolas ou classes de educação bilíngue aquelas em que a Libras e a modalidade escrita da Língua Portuguesa sejam línguas de instrução utilizadas no desenvolvimento de todo o processo educativo. A atual política implementada nas redes de ensino e público e privada pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva, criada em 2008, difere da proposta do movimento social dos Surdos, que reivindicam a separação conceitual (Deficiência X Pessoas Surdas) na constituição de uma política pública para uma educação de qualidade para todos os/as estudantes surdos/as. Como a política impera atualmente no ensino e educação de Surdos nas escolas inclusivas, é importante pensar como “ensinar as pessoas surdas com suas línguas distintas?”. O ponto que gera mais angústia e inquietação no ensino destinado aos estudantes surdos/as nas escolas e instituições de formação profissionalizante são os professores que não conhecem a pessoa surda, sua identidade, cultura e língua. Sabemos que o Brasil é um país multilíngue, com 200 (duzentas) línguas, além da língua oficial do país: a língua portuguesa. A Libras é reconhecida pela Lei nº 10.436/02 (Brasil, 2002), resultado da luta dos movimentos sociais das pessoas surdas pela comunicação em sua primeira língua, de forma a garantir a preservação da identidade das pessoas e comunidades surdas. A preservação da Libras contribui para a valorização e reconhecimento da cultura surda que, por muitos anos, era dirigida pela hegemonia “ouvintista”[1] da cultura ouvinte e do uso da oralização, como único meio de comunicação. Além da valorização, os movimentos também exigiram o ensino da língua portuguesa como segunda língua na modalidade escrita para Surdos. Possibilitando assim o desenvolvimento integral das potencialidade cognitivas, afetivas e emocionais, oportunizando a sua inclusão e integração na sociedade brasileira. Mas as pesquisas apontam que o ensino de Língua Portuguesa (LP) parasurdos tem demonstrado a ausência de materiais didáticos específicos para esse grupo. 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 4/18 https://d.docs.live.net/a93b2b3139a167eb/UFPel%20Curso%20Aperfei%C3%A7oamento%20MEC/artigo%20atual.docx#_ftn1 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 5/18 2.1. ESTRUTURA DE ENSINO – ENSINO MÉDIO O MEC (Brasil, 2018) estabeleceu uma mudança na estrutura do ensino médio, ampliando a carga horária de 1.800 horas e definiu nova organização curricular do Ensino Médio por áreas de conhecimento e não por matérias e será composta por 4 áreas de conhecimento mais 1 (uma) de formação Técnica e Profissional. A nova estrutura contempla habilidades e competências relacionadas às 04 áreas do conhecimento, com o objetivo de aproximar à realidade dos alunos com a demanda e complexidade do mundo de trabalho e da vida em sociedade. Dessa forma, o Ensino Médio está voltado para a formação de alunos surdos para o mercado de trabalho. As 4 áreas de conhecimento, ou itinerários formativos, são: Matemática e suas Tecnologias, Linguagens e suas Tecnologias, Ciências da Natureza e suas Tecnologias e Ciências Humanas e Sociais Aplicadas; e da formação técnica e profissional, com a sigla FTP; ou mesmo nos conhecimentos de duas ou mais áreas e da FTP. As escolas têm autonomia para definir quais os itinerários formativos irão ofertar de acordo com a realidade dos alunos. Para isso, os alunos serão orientados para a escolha dos itinerários formativos pela Gestão das escolas junto com os Coordenadores pedagógicos do Curso de Ensino Médio através de diálogo, mostrando suas possibilidades de escolha, avaliando seus interesses e, consequentemente, orientando-os nessas escolhas. No caso dos/das estudantes surdos/as, é importante trabalhar o desenvolvimento do projeto de vida, para que eles/as sejam capazes de fazer escolhas conscientes, com disciplina e seriedade através de diálogos (esclarecimentos, compartilhamento de informações e de percepções das acessibilidades) com seus anseios e aptidões. Para os/as estudantes surdos/as, o projeto de vida se relaciona com o uso da visualidade que se relaciona com a tecnologia e produção das acessibilidades assistivas. O ideal é incentivar aos estudantes surdos a engajarem nas atividades e profissionalização nas Artes (teatro, dança, pintura, literatura visual, cinema, fotografia, história em quadrinhos, jogos eletrônicos, escultura, arte digital e música em Libras), Tecnologia (Administração de Redes, Desenvolvimento de Software, Análise de Dados, Análise de Sistemas, Tecnologia de Informação, Ciências da Computação (Arquiteto de Software, Gerente de TI e Pesquisa ou Docência), Suporte Técnico, Segurança da Informação, Desenvolvedor Full Stack, DevOps – Desenvolvimento de Operações, Engenharia da Computação, Jogos Digitais, Sistemas de informação, etc.)[2], Educação (Professor de Libras, Pedagogo, Coordenador Pedagógico, Psicopedagogo e até Diretor Escolar), Linguística (Consultoria Linguística, Tradução e Interpretação na perspectiva Surda, Elaboração de Dicionário e Glossário – impresso e digital, Ensino e Mentoria, Análise Linguística, Pesquisa de Campo, Desenvolvimento de Recursos Educacionais, Processamento de Linguagem Natural – PLN, Professor de Terminologia, Terminografia, Lexicografia e Lexicologia e Professor de Literatura Surda) e também ás outras áreas de conhecimento, do qual o estudante surdo pode se identificar mais, com uma pequena alerta: a acessibilidade deve ser uma ferramenta de luta a ser implementada nas escolas técnicas e / ou universidades de acordo com o cumprimento do artigo 17 da Lei da Acessibilidade (Lei nº 10.098/00), e seu Decreto n.º 5.296 (artigo 6º, & 1º, item III e artigo 59) e da Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/15 e seus artigos 28, item IV, 68, & 3º e 112, item IX). 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 6/18 https://d.docs.live.net/a93b2b3139a167eb/UFPel%20Curso%20Aperfei%C3%A7oamento%20MEC/artigo%20atual.docx#_ftn2 2.2. PROPOSTA CURRICULAR DE ACORDO COM A BNCC Com a nova proposta curricular da BNCC para o ensino médio, em cada itinerário formativo existem duas aplicações: Competência e Habilidade. O quesito Competência se define como mobilização de conhecimentos, habilidades, atitudes e valores para resolver demandas da vida cotidiana, da prática da cidadania e do mundo do trabalho: a) Conhecimento - É o equilíbrio de tudo, pois o/a estudante surdo/a vai adquirir visualmente o conhecimento e aprender a utilizar de forma construtiva, aplicando e compreendendo organicamente (uso de visão e não de som), em contextos sociais, físicos, culturais e digitais. b) Pensamento científico, crítico e criativo - Visa fornecer ao estudante surdo/a os artefatos culturais e metodológicos para que ele/a possa enfrentar e entender as situações, fenômenos e problemas de forma racional, criativa, planejada e crítica, criando raciocínios, hipóteses e investigando causas por meio da criatividade, da imaginação, da percepção científica, da pesquisa, da reflexão e da análise crítica dos acontecimentos. c) Repertório cultural – Desenvolver de modo harmonioso e integral o/a estudante surdo/a. A promoção do conhecimento dos artefatos culturais vai despertar no/a estudante surdo/a o respeito e a valorização da diversidade cultural, seja ela nacional ou estrangeira. d) Comunicação - Visa ampliar as escolhas de possibilidades expressivas do/ estudante surdo/a para que possa se expressar de forma adequada e satisfatória em diversos âmbitos, com o uso de diferentes meios de comunicação verbais (escritos) e não verbais: linguagem científica, artística, matemática etc. e) Cultura digital - As tecnologias digitais e visuais são poderosas quando utilizadas para o desenvolvimento cognitivo pleno; ele/as pode tornar o conhecimento mais acessível e ajudar a desenvolver competências e habilidades de autonomia nos/as estudantes surdos/as, bem como entender novas linguagens e na interpretação da informação. f) Trabalho e projeto de vida - A gestão escolar junto com a equipe da escola deve direcionar os/as estudantes surdos/as nas pesquisas, interesses, valorização e adquirir habilidades fundamentais para o entendimento do universo do mercado de trabalho e a identificação das escolhas do futuro por meio do exercício da cidadania, iniciando a construção da própria identidade a partir das competências adquiridas. g) Argumentação – Os/As estudantes surdos/as precisam aprender a usar a habilidade de argumentar de forma coerente e coesiva com base em fatos e dados científicos, organizando e criando opções de resposta, ideias e pontos de vista que respeitem os direitos humanos e o meio ambiente, sempre respeitando a si mesmos, o próximo e o planeta. h) Autoconhecimento e autocuidado - O autoconhecimento e o autocuidado influenciam o crescimento saudável do/a estudante surdo/a, e a acolher o sentimento do outro e a senti-lo, reconhecendo essas emoções com autocrítica e capacidade para lidar com elas. i) Empatia e cooperação - A escola deve ser um ambiente de aprendizagem cooperativa e associativa com o propósito de estimular a empatia e a resolução de conflitos com respeito ao outro e aos direitos humanos, incentivando, também, a valorização da diversidade das pessoas surdas e dos grupos sociais de onde eles/as fazem parte do pertencimento cultural. j) Responsabilidade e cidadania - É fazer com que os/as estudantes surdos/as pensem na cidadania como uma responsabilidade pessoal, principalmente de forma envolvente, desde a infância até o Ensino Médio. O quesito Habilidade se define como a introdução das aprendizagens essenciais que os estudantes precisam desenvolver: a) InteligênciaEmocional: conhecer e gerir bem as próprias emoções, ter automotivação, ser empático e saber se relacionar interpessoalmente; b) Criatividade: usar a imaginação e criar algo inédito e original, ou seja, ter inventividade para soluções criativas; c) Capacidade de resolução de problemas complexos: capacidade de perceber e criar estratégias para resolver situações novas e ter respostas consistentes e eficientes; d) Saber tomar decisões: usar a intuição e somar todos os fatos já conhecidos para chegar a uma atitude firme; e) Saber trabalhar em equipe: ter cooperação, ser um comunicador, saber liderar e ser liderado, ser flexível e comprometido para promover um esforço coletivo; 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 7/18 alesa alesa f) Gerir bem as pessoas: identificar aptidões, motivar, saber opinar e desenvolver pessoas é característica de um grande líder; g) Ter pensamento crítico: saber julgar e refletir sobre o que se deve crer em resposta a uma experiência, expressão verbal, sinalizada ou escrita; h) Ter capacidade de coordenação: conduzir as pessoas à cooperação e facilitar processos; i) Flexibilidade para negociar: saber fazer negociações com polidez e ter facilidade de relacionar-se com as pessoas, ser proativo, ter empatia e ser comunicativo; j) Aprender a aprender: aquisição de novos conhecimentos, estudar sempre para promover atualização profissional constante, sem atar os usos. Os quesitos de Competência e Habilidades são ferramentas que podem ser estimuladas através do diálogo na sala de aula, uso do tempo com a educação integral e do projeto de vida dos/as estudantes surdos/as. É importante usar os temas e objetos do conhecimento diversos e relativos à língua natural dos/as estudantes surdos/as, que é a Libras. Apresentar inovações com estratégias metodológicas e visuais que possam colaboram para o trabalho integrado e contextualizado das áreas do conhecimento e exemplos de objetivos de aprendizagem. 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 8/18 2.3. PROPOSTA CURRICULAR NA PERSPECTIVA SURDA Através das reivindicações da comunidade surda, em 2019 foi implementada a Diretoria de Política de Educação Bilíngue dos Surdos, órgão vinculado a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão - SECADI do Ministério de Educação – MEC. A partir de então, o documento para implementar uma BNCC-EBS voltada à educação de surdos, com a Libras como primeira língua e língua portuguesa na modalidade escrita como segunda língua tem sido mobilizado. De acordo com a BNCC do Ensino Médio, há um período do desenvolvimento que possibilita mais autonomia e maior capacidade de reflexão sobre o mundo, os/as estudantes surdos/as gradativamente vão adquirir mais possibilidades de participação na vida pública e privada e na produção cultural através da Libras. A BNCC – EBS construída pela epistemologia surda e produzida pelas pessoas surdas, deve ser integrante do componente curricular no Ensino Médio. Portanto, constituída pelas culturas visuais expressadas nas vusicas[3] (substituindo a palavra da música), danças, manifestações da cultura corporal, vídeos, marcas corporais, moda, postcard comunitárias em Libras, redes de mídia da internet, gírias e demais produções e práticas socioculturais que combinam linguagens e diferentes modos de estar comunidade com o uso de Libras. Isso promove a ação desejada de mediação e intervenção sociocultural, conforme apontado na BNCC. É a Libras que supõe, ou melhor, que faz a mobilização de conhecimentos de uma ou mais áreas de acordo com a competência e habilidade a serem trabalhadas no decorrer do Ensino Fundamental; ela é o recurso linguístico empregado para influenciar os conhecimentos da Libras e utilizada pelos/as estudantes surdos/as como instrumento para mediar conflitos (internos e externos), ou seja, constituir o sujeito visual[4] em sua subjetividade. As competências e habilidades a serem desenvolvidas nos/as estudantes surdos/as se diferem um pouco daquelas estabelecidas para estudantes ouvintes, e as propostas para as sete (07) competências e habilidades da BNCC na perspectiva surda, podem ser definidas com base no Livro “Referenciais para o ensino de Língua Brasileira de Sinais como primeira língua para surdos na Educação Bilíngue de Surdos: da Educação Infantil ao Ensino Superior”, volume 4, pelos autores Stumpf e Linhares (2021): COMPETÊNCIA ESPECÍFICA 1 HABILIDADES 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 9/18 https://d.docs.live.net/a93b2b3139a167eb/UFPel%20Curso%20Aperfei%C3%A7oamento%20MEC/artigo%20atual.docx#_ftn3 https://d.docs.live.net/a93b2b3139a167eb/UFPel%20Curso%20Aperfei%C3%A7oamento%20MEC/artigo%20atual.docx#_ftn4 Compreender o funcionamento das diferentes linguagens e práticas culturais (artísticas, corporais e verbais) das comunidades surdas, e como a Libras as constitui e as coloca em funcionamento. E também mobilizar conhecimentos por meio da Libras, tanto na recepção e na produção de discursos nos diferentes campos de atuação social e nas diversas mídias, como para ampliação das formas de participação social dos estudantes surdos, de modo que favoreça o entendimento e as possibilidades de explicação e interpretação crítica da realidade social a fim de que continuem aprendendo e conhecendo as reivindicações da pauta social. Analisar processos de produção e circulação de discursos em Libras elaborados por surdos e ouvintes em ações “face a face”. Trabalhar com discursos produzidos também por meio da tradução da língua oral para a língua de sinais e que estejam disponíveis em mídias com ampla circulação social. Tais discursos têm impacto nas comunidades surdas, com diferentes linguagens produzidas por meio da Libras, e constituirão a base para a produção de criticidade dos estudantes surdos, nas escolhas que farão, fundamentadas em função de interesses pessoais e também coletivos. Analisar visões de mundo, conflitos de interesse, preconceitos e ideologias presentes nos discursos em Libras e veiculados nas diferentes mídias, como modo de ampliar possibilidades de explicação de mundo e interpretação crítica da realidade. Analisar, de maneira cada vez mais aprofundada, o funcionamento das linguagens em Libras a fim de interpretar e produzir criticamente discursos em textos de diversas semioses, levando em conta as produções que devem ser gravadas para a produção de textos em Libras, com respeito à modalidade de língua gestuovisual. Utilizar as diferentes linguagens em Libras, levando em conta seus funcionamentos específicos em razão de sua modalidade de língua, para compreensão e produção de textos e discursos em diversos campos de atuação social, por meio de dispositivos tecnológicos para gravação do texto e análise posterior. Analisar e experimentar diversos processos de remidiação de produções multissemióticas, multimídia e transmídia, a fim de fomentar diferentes modos de participação e intervenção social, uma vez que a Libras, pela sua modalidade gestuovisual, exige a utilização de dispositivos tecnológicos para armazenamento de suas produções. COMPETÊNCIA ESPECÍFICA 2 HABILIDADES 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 10/18 Compreender processos identitários, conflitos e relações de poder que permeiam as práticas sociais de linguagem nas comunidades surdas no uso da Língua de Sinais; e respeitar as diversidades de constituição de subjetividades das pessoas surdas e de suas lutas. Com isso, é possívelassegurar a disseminação e a valorização da pluralidade de ideias e posições, e atuar socialmente com base em princípios e valores assentados na democracia, na igualdade e nos direitos humanos. Assim, pode-se exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, e combater preconceitos de qualquer natureza às pessoas surdas. Para tal, é necessário apresentar as relações de poder/saber entre os diferentes personagens e as práticas que emergem das mais variadas instituições sociais em que a pessoa surda está inserida. Trazer os “saberes” presentes nas comunidades surdas, bem como as representações sociais da Libras e possibilitar ao estudante surdo ter acesso às produções artísticas de seus pares, como contos em Libras, e piadas tradicionais que a comunidade surda mantém e faz circular – por exemplo, King Kong; o funeral e o intérprete; a lua de mel; o leão surdo; o surdo americano, o russo e o cubano num comboio; um soldado surdo e um soldado ouvinte; o pássaro surdo; o Ferrari; a comunicação escrita; no barbeiro (KARNOPP; SILVEIRA, 2014). Essa competência possibilita ao estudante refletir sobre as tensões na comunidade surda na interação e relação de poder no âmbito da interpretação para Libras; na relação com o intérprete e com as pessoas ouvintes, e com a luta entre maioria e minoria linguística. Esse processo se dá para que o estudante surdo possa compreender e produzir discursos em Libras de maneira posicionada – valorizando e respeitando as individualidades, as diferenças de ideias e posições, e pautando-se por valores democráticos – e também atuar de maneira cooperativa e empática, sem preconceitos e estabelecendo o diálogo. Apropriar-se de modo a fazer uso adequado das diversas linguagens (artísticas, corporais e verbais) em diferentes contextos da comunidade surda, entendendo a corporeidade da Língua de Sinais, em seu funcionamento como sistema verbal, mas fazendo uso de outras linguagens, valorizando-as como fenômeno social, cultural, histórico, variável, heterogêneo e sensível aos contextos de uso. Analisar interesses, relações de poder e perspectivas de mundo nos discursos das diversas práticas de linguagem (artísticas, corporais e verbais) das pessoas surdas e nas comunidades surdas para compreender o modo como circulam (os eventuais limites de acesso a discursos e produções culturais em Libras), constituem-se e (re)produzem significação e ideologias que impactam a vida das pessoas surdas. Analisar diálogos e conflitos entre diversidades surdas, e processos de disputa por legitimidade nas práticas de linguagem e suas produções (artísticas, corporais e verbais, em Libras), presentes na cultura local e em outras culturas surdas. Negociar sentidos e produzir entendimento mútuo nas diversas linguagens (artísticas, corporais e verbais usadas pelas comunidades surdas e em Língua de Sinais), com vistas ao interesse comum pautado em princípios e valores de equidade assentados na democracia e nos direitos das pessoas surdas. COMPETÊNCIA ESPECÍFICA 3 HABILIDADES 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 11/18 Empregar diferentes linguagens em Libras (artísticas, corporais e verbais) por meio de mídias digitais de uso público para exercer, com autonomia e colaboração, protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva, de modo crítico, criativo, ético e solidário, defendendo pontos de vista que respeitem o outro e promovam os direitos das pessoas surdas, a consciência socioambiental e o consumo responsável, em âmbito local, regional e global. Participar de processos de produções individual em Língua de Sinais e colaborativa em diferentes linguagens (artísticas, corporais e verbais), levando em conta seus funcionamentos e apontando elementos distintos da estrutura de cada linguagem, para produzir sentidos em diferentes contextos. Levantar produções surdas já existentes de modo que auxilie esse estudante em sua produção individual. Concluir e posicionar-se criticamente diante de diversas visões de mundo presentes nos discursos dominantes em diferentes linguagens, e como isso impacta em comunidades minoritárias linguisticamente, considerando contextos de produção e de circulação, e o desafio ainda presente para as comunidades surdas. Isso significa usar a ética nas práticas e na veiculação de produtos e informações sociais em Libras, no que concerne a busca e a construção de uma sociedade bilíngue (Libras/Língua Portuguesa). Debater questões polêmicas de relevância social, analisando diferentes argumentos e opiniões manifestados, a fim de negociar e sustentar posições dos estudos surdos e da perspectiva social posta às pessoas surdas. Formular propostas, intervir e tomar decisões democraticamente sustentadas que levem em conta o bem comum e o direito de comunicação e de diferença das pessoas surdas; a consciência socioambiental e o consumo responsável em âmbito local, regional e global. Mapear e criar, por meio de práticas de linguagem, possibilidades de atuação social, política, artística e cultural para as pessoas surdas com experiência na Língua de Sinais, visando enfrentar desafios contemporâneos, discutindo seus princípios e objetivos de maneira crítica, criativa, solidária e ética. COMPETÊNCIA ESPECÍFICA 4 HABILIDADES 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 12/18 Compreender as línguas de sinais, assim como as línguas orais, como fenômeno (geo)político, histórico, social, variável, heterogêneo e sensível aos contextos de uso e de produção discursiva, reconhecendo-as e vivenciando-as como formas de expressões identitárias, pessoais e coletivas, bem como respeitando as variedades linguísticas na Libras. Isso propiciará uma ação no enfrentamento de preconceitos de qualquer natureza – incluindo a compreensão da complexidade do uso de sinais caseiros e variações dialetais na Língua de Sinais como componente da variação linguística das comunidades surdas. Analisar textos em Libras, de modo a caracterizar as línguas de sinais como fenômeno (geo)político, histórico, social, variável, heterogêneo e sensível aos contextos de uso. Empregar, nas interações sociais, a variedade e o estilo de língua adequados às situações comunicativas em Língua de Sinais ao(s) interlocutor(es) e ao gênero do discurso, respeitando os usos das línguas e suas variações por esse(s) interlocutor(es) e combatendo situações de preconceito linguístico – incluindo o uso de sinais caseiros, e as razões para tal, em situações de interação dos surdos com a família, majoritariamente composta por ouvintes. Fazer uso da Língua Internacional de Sinais como língua franca das comunidades surdas, bem como das línguas de sinais emergentes em comunidades indígenas, levando em conta a multiplicidade e a variedade de usos, usuários e funções dessa língua no mundo contemporâneo. COMPETÊNCIA ESPECÍFICA 5 HABILIDADES Compreender os múltiplos aspectos que envolvem a produção de sentidos nas práticas sociais da cultura, trazendo características dos elementos visuais e gestuais que compõem o discurso em Língua de Sinais, reconhecendo-a e vivenciando-a, assim, como forma de expressão de valores e identidades surdas, em uma perspectiva democrática e de respeito à diferença. Analisar criticamente preconceitos, estereótipos e relações de poder subjacentes às práticas e aos discursos verbais e imagéticos na apreciação e produção das práticas da cultura corporal de movimento orientadas às pessoas surdas e à Língua de Sinais. Selecionar e utilizar movimentos corporais de modo consciente e intencional para interagir socialmente em práticas da cultura corporal, nas enunciações em Língua de Sinais, de modo a estabelecer relações construtivas, éticas e de respeitoàs diferenças surdas. Praticar, significar e valorizar práticas culturais surdas e a gestuovisualidade como forma de autoconhecimento, autocuidado e construção de laços sociais em seus projetos de vida. COMPETÊNCIA ESPECÍFICA 6 HABILIDADES 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 13/18 Apreciar esteticamente as mais diversas produções artísticas e culturais na Língua de Sinais, e produções das pessoas surdas, considerando características locais, regionais e globais; bem como mobilizar conhecimentos sobre as linguagens artísticas em Libras, a fim de dar significado e (re)construir produções autorais individuais e coletivas de surdos e pessoas vinculadas à comunidade surda (intérpretes de Libras, familiares, pesquisadores) – tudo isso de maneira crítica e criativa, com respeito à diversidade de saberes, identidades e culturas. Apropriar-se do patrimônio artístico e da cultura produzida pelas pessoas surdas e na Língua de Sinais de diferentes tempos e lugares, compreendendo sua diversidade, bem como os processos de disputa por legitimidade. Usufruir e apreciar esteticamente diversas manifestações artísticas e culturais de pessoas surdas, das locais às mundiais, assim como delas participar, de modo a aguçar continuamente a sensibilidade, a imaginação e a criatividade dos estudantes surdos, valorizando o lugar “de” e “no” mundo desses estudantes. Expressar-se e atuar em processos criativos que integrem diferentes linguagens artísticas e referências estéticas e culturais na Língua de Sinais, recorrendo a conhecimentos de naturezas diversas (artísticos, históricos, sociais e políticos) e experiências individuais e coletivas surdas. Relacionar práticas artísticas e da cultura corporal do movimento às diferentes dimensões da vida social, cultural, política, histórica e econômica das pessoas surdas. COMPETÊNCIA ESPECÍFICA 7 HABILIDADES 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 14/18 Mobilizar práticas de linguagem no universo digital, considerando dimensões técnicas, críticas, criativas, éticas e estéticas para expandir os modos de produzir sentidos com uso da Língua de Sinais, e engajar-se em práticas autorais e coletivas surdas e da comunidade surda. Também desenvolver os contextos de aprendizado dentro dos campos da ciência, da cultura, do trabalho, da informação e da vida pessoal e coletiva surda; indicar a tecnologia como dispositivo favorável às interações surdas, dadas a possibilidades de recursos midiáticos e produções em vídeos, de modo a manter o registro das produções em Língua de Sinais. Explorar tecnologias digitais de informação e comunicação (TDICs), compreendendo seus princípios e suas funcionalidades, e mobilizá-las de modo ético, responsável e adequado a práticas de linguagem em diferentes contextos em que se façam uso da Língua de Sinais na acessibilidade do público surdo. Avaliar o impacto das TDICs na formação do sujeito surdo e nas práticas sociais que demandam uso da Língua de Sinais, a fim de fazer uso crítico dessa mídia ao realizar a seleção, a compreensão e a produção de discursos em ambiente digital, tomando a pauta da acessibilidade e a janela de Libras em sua elaboração. Utilizar diferentes linguagens, mídias e ferramentas digitais em processos de produção coletiva para a comunidade surda, e projetos autorais de surdos em ambientes digitais. Apropriar-se criticamente de processos de pesquisa e busca de informação em língua de sinais, por meio de ferramentas digitais e novos formatos de produção e distribuição dos conhecimentos que visem ao conhecimento de práticas culturais surdas em redes sociais, observando as novas criações da comunidade surda e como elas se inserem no meio digital. Fonte: https://editora-arara-azul.com.br/wp-content/uploads/2023/07/Vol04_LibrasL1_2022.pdf A proposta deve ser integrada futuramente como componente curricular no Ensino Médio. Desse modo, e para fechar este tópico, é possível afirmar que a Libras é a base material subjetiva do/a estudante surdo/a e, por isso, deve estar no currículo escolar do Ensino Médio e da Educação de Jovens e Adultos - EJA, até como dispositivo de interação humana que pode ser usado para implementar soluções para questões e problemas identificados na Comunidade Surda e tratados no universo escolar. 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 15/18 https://editora-arara-azul.com.br/wp-content/uploads/2023/07/Vol04_LibrasL1_2022.pdf https://editora-arara-azul.com.br/wp-content/uploads/2023/07/Vol04_LibrasL1_2022.pdf 3. PERFIL DOS ESTUDANTES SURDOS E PROFISSIONAIS DO ENSINO MÉDIO Prossiga próxima da Aula 02 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 16/18 3.1. PERFIL DOS/AS ESTUDANTES SURDOS/AS DO ENSINO MÉDIO Ao destacar o perfil dos/das aluno/as surdos/as, queremos esclarecer que a maioria é filhos de pais ouvintes (segundo Behares (1996), Lane (1992), Goldfeld (1997), Freeman, Carbin e Boese (1999), Quadros (1997, 2004), Silva, Pereira e Zanoli (2007) e Fernandes e Moreira (2009), sendo cerca de 95% das pessoas surdas filhas de pais ouvintes) que não percebem a surdez em si, mas encontram o obstáculo na comunicação que ela proporciona a vida toda. Muitos pais não reconhecem ou não aceitam o uso da língua de sinais na comunicação com os filhos, porque desconhecem, pela desinformação, a importância dela para o desenvolvimento psíquico-social e ainda como a forma de aquisição de conhecimentos das pessoas surdas. Há a ilusão de que os filhos possam ouvir ou tornarem-se semelhantes aos ouvintes, através do implante coclear. Para tanto, buscam atendimentos, tratamentos clínicos e educação oralista na tentativa de oferecer aos filhos surdos, a oportunidade de constituírem-se como sujeitos e cidadãos através da língua falada. O atraso na aceitação acarreta em “privação linguística”[5] e consequentemente, em prejuízos no desenvolvimento cognitivo, emocional e de comunicação da criança surda, uma vez que a utilização da Libras pelos surdos possibilita o entendimento, podendo ainda facilitar o atendimento de suas necessidades, seus anseios e suas expectativas. É com o uso dessa língua que o surdo entenderá a interação na sociedade, construindo sua identidade e exercendo sua cidadania, sendo esta, a forma mais expressiva de inclusão de forma equitativa. A comunicação através da Libras, propicia uma melhor compreensão entre surdos e ouvintes, já que é previsto por lei a presença de intérpretes de Libras em diferentes instituições públicas, como escolas, universidades, congressos, seminários, programas de televisão entre outros. O uso da Libras é o elo de comunicação entre os surdos, que passam a ser compreendidos como uma comunidade que tem características comuns e que devem ser reconhecidas como tal, praticando assim, a verdadeira inclusão social. A pessoa surda, através da Língua de Sinais, pode se desenvolver integralmente em todas as suas potencialidades cognitivas, afetivas e emocionais, permitindo sua inclusão e integração na sociedade. Por isso, é importante que os pais de crianças surdas estabeleçam comunicação nesta modalidade e proporcionem contato com a Língua de Sinais o mais cedo possível, aceitando a surdez de seus filhos como diferença, assim como a Libras. Geralmente, em tentativas de comunicação, os pais ouvintes utilizam a língua oral concomitante aos gestos com seus filhos surdos. E de acordo com Kail (2013) e Quadros (1997), a produção linguística dessas crianças a partir dos três anos de idade é inferior à das crianças expostas à língua de sinais: se a exposição a uma língua falada e sinalizada pode trazer benefícios para o desenvolvimento das competênciascomunicativas e cognitivas da criança, em contrapartida, parece indispensável fornecer um input correspondente a uma língua integral (língua de sinais) para que as competências linguísticas possam ser elaboradas. (Kail, 2013, p.99) Se a pessoa surda não for exposta a língua de sinais como primeira língua, sofrerá consequências que perduram por toda a vida, com atrasos de aprendizagem e do desenvolvimento das competências comunicativas e cognitivas e dificuldades de aquisição de habilidades. Inclusive ficará excluído das conversas cotidianas no seio familiar onde as informações são omissas e perdidas (vocabulário pobre). No tratamento para reabilitação que nunca é bem-sucedido: Entendemos que o processo de reabilitação oral é lento e demorado, pois somente aos 12 anos a criança utilizará a língua oral com relativo domínio de vocabulário, para se comunicar de maneira clara e expressar-se de forma autônoma, deixando o intenso tratamento, ao aquela são submetidos para oralizar (Kail, 2013, p. 37) 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 17/18 https://d.docs.live.net/a93b2b3139a167eb/UFPel%20Curso%20Aperfei%C3%A7oamento%20MEC/artigo%20atual.docx#_ftn5 3.2. PAPEL DO PROFESSOR BILÍNGUE Com a proposição da Lei 14.191 de 2021 (Brasil, 2021), o papel e função do professor bilíngue são assegurados: Art. 60-B. Além do disposto no art. 59 desta Lei, os sistemas de ensino assegurarão aos educandos surdos, surdo-cegos, com deficiência auditiva sinalizantes, surdos com altas habilidades ou superdotação ou com outras deficiências associadas materiais didáticos e professores bilíngues com formação e especialização adequadas, em nível superior. Parágrafo único. Nos processos de contratação e de avaliação periódica dos professores a que se refere o caput deste artigo serão ouvidas as entidades representativas das pessoas surdas. A elaboração de material didático e pedagógico também é descrita no artigo 79-C, inciso V desta lei: V - elaborar e publicar sistematicamente material didático bilíngue, específico e diferenciado. Atualmente temos a formação na área de Pedagogia (para ensino fundamental), Letras-Libras (ensino superior na área de Letras-Libras – Licenciatura e Bacharelado na formação de tradutor e intérprete de Libras) além do Curso de Língua Portuguesa como L2, na Universidade de Brasília – UNB. Os profissionais graduados com complementação pedagógica também podem atuar na educação básica, conforme disposto pelo Conselho Nacional de Educação (Art. 61, V, incluído pela Lei nº 13.415, de 2017 (Brasil, 2017)). O Decreto nº 5.626 de 2005 (Brasil, 2005) representou uma conquista dos movimentos sociais ligados à educação de surdos e nos permitiu “romper com os modelos do passado para negar os sentidos de inclusão que os sustentavam” (Souza, 2007) e nos permitiu um novo momento na educação dos surdos e no trabalho em parceira com essa comunidade. Apesar da pequena quantidade de professores bilíngues no país, é inegável o compromisso dos profissionais que lidam com os/as estudantes surdos/as no ensino médio inseridos na Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Ferreira e Zampieri (2010) mostram a importância da relação entre o professor e o/a estudante surdo/a, e do compartilhamento de um território linguístico para a produção de significados e significações da aprendizagem, assim, sendo possível uma escola bilíngue. As amarras de uma educação bilíngue aos projetos pedagógicos têm como pontos de destaque o desafio uma política de educação bilíngue, de práticas de significações que devem ser pensadas nos diferentes contextos históricos e culturais, no sentido de que a educação bilíngue não pode ser assimilada à escolarização bilíngue. Outra amarra é o modo como a surdez está sendo construída nos projetos pedagógicos, já que denominar um projeto pedagógico como “bilíngue” não supõe necessariamente um caráter intrínseco de verdade; é necessário estabelecer com clareza as fronteiras políticas que determinam a proposta educativa. (Karnopp, 2012, p. 37) 30/07/2024, 17:34 UC1: Texto Base | E-projeto https://e-projeto.ufpel.edu.br/mod/book/tool/print/index.php?id=21022 18/18 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9394.htm#art60b