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<p>Esta e, em grandes linhas, a obra pedag6gica de Durkheim. Para os</p><p>educadores, ela oferece uma doutrina original e vigorosa, envolven</p><p>do os principais problemas pedag6gicos. Para os soci610gos, ela es</p><p>clarece as concep~oes que Durkheim expos em outras obras so</p><p>bre alguns pontos essenciais: rela90es entre 0 indivfduo e a socie</p><p>dade, entre a ciencia e a pratica, a natureza da moralidade e a do</p><p>entendimento. Sejam educadores ou soci610gos, muitos eram os</p><p>que aguardavam a publica9ao desta importante obra.</p><p>www.vozes.com.br</p><p>IIiEDITORA</p><p>Y VOlES</p><p>Uma vida pelo born livro</p><p>vendos@vozes.com.br</p><p>m</p><p>0</p><p>C</p><p>C"></p><p>l></p><p>0(")</p><p>l>'</p><p>0</p><p>m</p><p>(f)</p><p>0</p><p>Q</p><p>0</p><p>5</p><p>Cl</p><p>l></p><p>m ,</p><p>3</p><p>II)</p><p>0</p><p>c:: ...,</p><p>'" :r-</p><p>II)</p><p>3</p><p>-EDUCACAO E</p><p>SOCIOLOGIA</p><p>0</p><p>'..: U-</p><p>..:</p><p>u</p><p>:::></p><p>e</p><p>UJ</p><p>w</p><p>0</p><p>'" w</p><p>I-</p><p>Z</p><p>C5 z</p><p>:::></p><p>LL.</p><p>'" ~</p><p>X</p><p>w</p><p>I-</p><p>Qual a relalfao entre Sociologia e</p><p>Educalfao? A oportuna edi~ao deste</p><p>Iivro esclarece a importante</p><p>contrlbullfao desta obra de Emile</p><p>Durkheim para 0 esclarecimento da</p><p>verdadelra natureza da educa~ao</p><p>como fato eminentemente social.</p><p>Para estabeiecer fronteiras com a</p><p>Biologia e com a Psicologia,</p><p>Durkheim pretende estudar as fatos</p><p>da vida moral mediante urna cil!ncia</p><p>positlva, a Ciencia da Moral. Por</p><p>discordar dos auto res socialistas e</p><p>por dlscordar da dialetica, a sua</p><p>proposta e a de concilia~ao entre</p><p>ciencia e moral; para ele, so</p><p>aparenternente contraditorias. Os</p><p>fatos morais sao fatos socia is,</p><p>passiveis de observa~ao, descrilfao e</p><p>classlficalfao, para se chegar as leis</p><p>gerais que os exp/iquem. Se a</p><p>liberdade implica nega~ao de uma lei</p><p>determinada pela sociedade, ela e</p><p>um obstaculo para a realiza~ao da</p><p>ciencia positiva, devendo ser negada.</p><p>Nesse contexto, a EducaC;ao</p><p>desempenha papel preponderante</p><p>por constltuir-se, tai como a moral,</p><p>um fato social. Sendo sua natureza</p><p>eminentemente social e repousando</p><p>sobre a base comum de fatos morais,</p><p>a Educalfao varia de sociedade para</p><p>sociedade, uma vez que cada uma</p><p>constitui a especificidade na qual se</p><p>forma, para seu uso, urn certo tipo</p><p>ideal de homem. Esse ideal e 0 e/xo</p><p>educativ~ mediante 0 qual a</p><p>sociedade prepara a crian~a</p><p>instaurando, pela educac;ao, as</p><p>condic;oes ideals de sua existencia. A</p><p>educactao e vista, entao, como forma</p><p>de civllizar 0 ser egoista e antlssocial</p><p>que exlste na crian~a. Atraves da</p><p>educac;ao da crianc;a, a sociedade</p><p>cria e reproduz as condi~oes de sua</p><p>propria existencia.</p><p>Franc/sea Eleodora Santos Severino</p><p>Unisantos</p><p>E OUCA<;:AO E SOC IOLOGIA</p><p>COLE<;AO 'rEXTOS F UNDANTES DE E OUCAGAO</p><p>Coorde'Jnd01~ Anttmio Joaquim Severino</p><p>- A mUlICo turbulenta - Es/udos sobre os retardame1JlOS</p><p>e OJ olloma/ins do desenvo/vimento motor emelita/</p><p>Henri Wallon</p><p>- A reprodufrio - Elemelllos para ullIa teoria do sistema de CflsitJo</p><p>Pierre Buurclieu e Jean-C laude Passeron</p><p>- 0 /wme", com um mundo estilha((J(/()</p><p>A R. Luria</p><p>Do a/o no pe1J.sametJlO - Ellsaio de psic%gia compara""</p><p>Henri Wallon</p><p>De 1lIogistro</p><p>Samo Agostinho</p><p>- E"periillda e r:duco{llo</p><p>John Dewey</p><p>- Psicogcllese e hist6ria das dindus</p><p>Jean Piagcc c Rolando Garcia</p><p>Educa{iio e Soci%gja</p><p>Emilc D urkheim</p><p>Edu(,'{t(.'(70 pam uma .waedode em trrtmjonna{iio</p><p>W. II. Kilpatrick</p><p>Dudos Internac ionais de Catalogu~ao na Publjcac;ao (eIIJ</p><p>)</p><p>(Camara Hrasileira do Livro. SP. Brasil)</p><p>Durkheim, Emile, 1858-1917.</p><p>Educa9uo c Socio logia / Emile Durkheim;</p><p>rradu930 de Stephania Matousek. - Petr6polis, RJ:</p><p>Vozes, 2011 - (Co\e9ao Textos F'undantes de Educa930).</p><p>Titu lo original: Educarion et sociulogie</p><p>ISBN 978-85-326-2463-5</p><p>1. Sociologia educacion3! r. T itu lo.</p><p>10-11968</p><p>indIces para cata logo Slstematlcu:</p><p>1. Sociulogia ambiental 306.43</p><p>CDD-306.43</p><p>EM ILE DURI<HEI M</p><p>EOUCAC:AO E SOC10LOG1A</p><p>Traduo;ao de Stephania Matousek</p><p>Ib EDITORA</p><p>Y VOlES</p><p>Petro polis</p><p>Direiws de publ ica~ao em lingua porrugllesa:</p><p>© 2011, Editora Vozes Ltda.</p><p>Rua Fre i L UIs, 100</p><p>25689-900 Perr6po li s, RJ</p><p>Internee http://w\vw.vozes.com.br</p><p>Brasil</p><p>Titulo ori ginal frances: EducatiON et soci%J!,ie</p><p>Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta ubr<l podera</p><p>ser rcpro<.iuzida Oll transmitida por qualq uer forma c/ou</p><p>quaisqller meios (eletronico ou mccanico, incluindu for.oc6pia</p><p>c grava~ao) ou arq uivada ern q ualquer siscema ou banco de dados</p><p>scm pcrmissao escrita da Ed itora.</p><p>Dirctor editorial</p><p>Frei Am6nio Moser</p><p>Editores</p><p>AJ ine dos Santos Carneiro</p><p>Jos6 Maria da Si lva</p><p>I .fd io Peretti</p><p>Marilac Loraine Oleniki</p><p>Sccretano executivo</p><p>10ao Batista Kreuch</p><p>Editortlp'io: Frci Andre Luiz da Rocha Henriq ues</p><p>Plvjeto gnffico: AG.SR Desenv. Gdfico</p><p>Capo: Maria foe rnanda de Novaes</p><p>ISBN 978-85-326-2463-5 (edi,ao brasileira)</p><p>ISBN 2- 13-055329-X (cdi,ao francesa)</p><p>Edicado con forme 0 novo acordo ortografico.</p><p>Esre livro foi composto e impresso pe la Editora Vozes L[da.</p><p>Rua Frci Luis, 100 - Petr6polis, RJ - llrasil - CEP 25689-900</p><p>Caixa PoStal 90023 - TeL (24) 2233-9000</p><p>Fax: (24) 22.11-4676</p><p>SUMA RlO</p><p>AjJrescl1tO(iio ria co/celio, 7</p><p>Antonio Joaqu im Severino</p><p>[f/trodup]o: A obra pedag6gica de DurNteim, 9</p><p>Prof. Paul Fallconnet</p><p>A educa~ilo, sua natureza e seu papel, 43</p><p>1.1 As defini.;;oes da educa9ao: exa mc crlrico, 43</p><p>1.2 Oefini~ilo da educa~ao, 49</p><p>1.3 Consequencia da defi niyao anterior:</p><p>can'ttee social da educa9ao, 54</p><p>1,4 0 papel do Estado em materia de Edllea~ao, 61</p><p>1.5 Poder da edue'J91io: meios de a~ao, 65</p><p>2 N atureza e metodo d. Pedagogia, 75</p><p>3 Pedagogia e Sociologia, 97</p><p>thiag</p><p>Realce</p><p>thiag</p><p>Realce</p><p>thiag</p><p>Realce</p><p>APRESENTAC;AO DA COLEC;AO</p><p>A hist6ria da cultura ocidental revela-nos que educa~ao e filo</p><p>sofia sempre estiveram juntas e pr6ximas, numa rela~ao de vfn</p><p>culo intrfnseco. A filosofia sempre se constituiu vinculada a uma</p><p>imen9ao pedagogica, formativa do humano. E a educa9ao, embo</p><p>fa se expressando como uma praxis social, nunca deixou de refc</p><p>fi r-se a fundamentos filos6ficos, mesmo quando fazia dcles uma</p><p>utilizavao puramente ideologica. Por isso mesmo, a grande maio</p><p>ria dos pensadores que construfram a culrura ocidcntal scmpre</p><p>registrou essa produ9ao tc6rica em tcxtos dircta ou indircramen</p><p>te relacionados a rcmatica cducacional, discurindo seja aspectos</p><p>epistcmologicos. axiol6gicos ou antropol6gicos da educav3.o.</p><p>Estc testcmunho da hist6ria ja e suficiente para demonstrar</p><p>o quanto e necessaria, ainda hoje, manter vivo e atuante esse</p><p>vinculo entre a ViS30 filos6fica e a intenC;30 pedag6gica. Vale di</p><p>zer que e extremamente relevante e imprescindivel a formaC;30</p><p>filos6fica do educador. N o enmnro, a experiencia cotidiana reve</p><p>la ainda que, em nossa cultura, no que concerne a formaC;30 e a</p><p>aruaC;3o desses profissionais, ocorre separaC;3o muito acentuada</p><p>entre a filosofia, enquanto fundamento te6rico do saber e do</p><p>agir, e a educaC;3o, enquanto saber ou pratica concretos. E evi</p><p>dente que essa pratica traz implicitos seus fundamentos filos6fi</p><p>cos, sem que deles tenha clara consciencia 0 educador.</p><p>Nao hi duvida de que, al6m das deficiencias pedag6gicas e</p><p>curriculares do pr6prio processo de formac;ao desses profissio</p><p>nais, tambem a falta de mediac;oes e recursos culrurais dificulta</p><p>8 Coler;ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>muito a apropria9ao, por parte deles, desses elemeoms que daD</p><p>conta da intima e relevante vincuia9ao da educay30 com a filo</p><p>sofia. Oaf a razao de ser desta cole9ao destinada a reeditar textos</p><p>do pensamento filos6fico-educacional que, por variadas raz6es,</p><p>acabam se esgotando e tornando-se inacessiveis as novas gera-</p><p>9ues de estudantes e profissionais da area. 0 objetivo desra co</p><p>icr;3.o sera, pois, 0 de coiocar ao alcance dos estudiosos os textos</p><p>fundamentais da rcftcxao filos6fico-educacional desenvolvida</p><p>por pensadores significativos que contribufram espccificamente</p><p>para a compreensao filos6fica do processo educacional, ao lon</p><p>go de nossa hist6ria cultural. Busca-se assim toTnaf permanente</p><p>urn precioso acervo de estudos de diversos campos cientfficos,</p><p>de alcance abrangente para a discussao</p><p>Nao podemos nem deve</p><p>mos wdos nos devatur au mesmo genero de vida; dependendo</p><p>das nossas aptidoes, temus fun<,;oes dife rentes a desempenhar,</p><p>c 6 precisu estar em harmonia cum aquela que nos incumbe.</p><p>Nem rodos nus fomos feiros para reHetie; sao precisus humens</p><p>de sensa<,;au e a9ao. Ao conmirio, ~;ao precisos outros cujo traha</p><p>lho seja pensar. Ora, 0 pcnsamenro s() pode se desenvolver ao</p><p>se desprender do movimcnro, recolhendo-sc em si mcsmo e</p><p>desviando 0 sujeito cia a\!ao exterior para que e lc mergulhe por</p><p>compl e ro em sua pr6pria mente. Oaf uma prim eira distin\!ao</p><p>que nao se da scm uma ruptura de equilfbr io. E, assim como</p><p>o pensa mento, a as;ao, por sua vez, pode adotar uma multipli</p><p>cic.l ade de formas diferentes e especfficas. Scm duvicia, csta</p><p>especiaiiza9ao nao excl ui uma ccrta hase com um e, por eonse</p><p>guinte, uma cerra oscila<,;ao tanto clas fun90es orgfinieas quanto</p><p>Educa~ao e Sociologia 45</p><p>das psiquicas; oscila9a.o sem a qllal a saude do individuo, bern</p><p>como a coesao socia l, estariam comprometidas. Nao e menos</p><p>verdade, porem, que a harmonia perfeita nao pode ser apresen</p><p>tada como 0 objetivo final da conduta e cdllCa~ao.</p><p>Ainda menos satisEn6ria 6 a defini~ao lltilitari sta, seglmdo</p><p>a qual a ed ucayuo teria como objeto "tra nsformar 0 individllo</p><p>em urn instrumento de felicidad e para si mesmo e sellS scme</p><p>Ihantes" (James Mill), pais a felicidade 6 lima coisa essencia l</p><p>mente subjetiva que cada urn estirna da sua maneira. Com tal</p><p>formulay8.o, 0 objctivo da educ<1c;ao pe rmanece, portanw, inde</p><p>terminado, bern como a propria educayao, que fica submetida a</p><p>arbitrariedade individual. E verdade que Spencer tenmu dennir</p><p>a felicidade objetivamente. Para ele, HS condic;6es da fel icidade</p><p>sao as mesmas da vida. A feli cidade plena e a vida plena. Mas</p><p>o que se deve enr.cndcr por vida? Quando se trata so rnente da</p><p>vida fisica , pode-se mencionar aquila cuja ausencia a irnpos</p><p>sibili[aria; ela impliea, de faro, 11m cerm equilibrio entre 0 or</p><p>ganismo e seu n1e io, e, ja que os dois termos relacionados sao</p><p>dados definiveis, 0 mesmo deve valer para a reia9ao entre eles.</p><p>Po rem, s6 se pode exprimir assi m as necessidades vitais ma is</p><p>irnediatas. Ora, para 0 hamem, e sobretudo para 0 homem de</p><p>hoje, esra vida nao e a vida. Esperamos da vida outra coisa a16m</p><p>do funcionamento mais ou menos norma l de nossos 6rgaos. Urn</p><p>individuo cul to prefe re !laO viver do que renuneiar aos prazeres</p><p>da inreligencia. Ate do ponto de visea arenas material, tudo 0</p><p>que excede ° estr ita men[e necessario foge de qualquer tentati</p><p>va de determinac;ao. 0 standard of life, como dizem os inglescs,</p><p>au seja, 0 padrao de vida, 0 minimo ao qual podemos conscnrir,</p><p>varia infinitamente de aeordo com as cond i~6es, os meios c os</p><p>tempos. 0 q ue ontem aehavamos q ue era suficiente nos parece</p><p>46 Cofe~ao Textos Fundantes de Educacao</p><p>hoje oao cstar a a lwra cia dignidade humana, tal como a sen</p><p>timos no momenta presence, e welo leva a crer que as nossas</p><p>cx igcncias oeste POntO 56 faraD aumentar.</p><p>Esbarramos aqu i na condena~ao geral a que todas estas de</p><p>fini~oes se expoem. Elas partem do postulado de que ha uma</p><p>ed ll ca~ao ideal, perfeita, valida sem dist in9ao para toelos os ho</p><p>mens; e e esta educa~ao universal e unica que u tc6rico tenra</p><p>detinir. Mas primeiro, se a hist6ria e levada em consiucrar;ao,</p><p>nada que confirme tal hip6tese pade sec encontrauo. A cuuca</p><p>r;:ao variou muito de acordo com os tempos cos palses. Nas poli s</p><p>gregas e latinas, a ecluc39ao ensinava 0 indivfduo a sc subordinar</p><p>cegamente a coletividade, tornaf-se a coisa oa socicdacie. Hoje,</p><p>ela tenta uansforma· lo em uma personalidade au tonoma. Em</p><p>Arenas buscava-se formar intelecws finos, pcrspicazes, sutis,</p><p>amames de propor~au e harmonia, capazes de g07.ar da beleza e</p><p>clos prazeres da pura investiga~Jo; em Roma, dcscjava·se antes</p><p>de [Udo que as crian~as se tornassem homcns de a<;:3.o, apaixo</p><p>nados pela gl6ria militar, indiferenres a tudo 0 que envolve as</p><p>letras e artes. Na Idade Media, a cduca~ao era acima de mdo</p><p>crista; no Renascimento, cia adquirc urn can'itcr mais laico eli·</p><p>renlrio; hoje, a ciencia tcnde a wmar 0 lugar que a arte oeupava</p><p>antigamente. Pode-se redarguir que () faro nao corresponde ao</p><p>ideal; que, se a eduCa9Jo mudou, 6 rorquc os homens se enga</p><p>naram sobre 0 que ela dcvcria ser. No entanro, se a eduea<;:ao co</p><p>mana tivesse sido marcada por lim individua lismo parecido com</p><p>o nosso, a polis romana nao tcria podido se manter; a civilizas;:ao</p><p>latina, e consequemcmcme a moderna, que ern parte deriva da</p><p>quela, nao teriam podido sc constituir. As sociedades cristas da</p><p>Jdade Media nao teriam podido sobrevivcr sc tivessem concedi</p><p>do a reAexao livre a impurtaneia que Ihc damos hoje. Existem,</p><p>Educar;ao e $ociologia 47</p><p>portanro, neeessidades ineluniveis que e impossivcl abstrair. lJe</p><p>que adianta imaginar uma edueae;ao que seria fatal para a soc ie</p><p>dade que a coloeasse em pd.tica?</p><p>Este pr6prio postulado, aparentemente incomestavcl, re</p><p>pOllsa sobre urn erro de ordem mais geral. Se come<;:armos a nos</p><p>pergumar assim qual deve ser a educae;ao ideal, abstrac;ao fcita</p><p>de toda cond iC;ao de tempo c lugar, isto significa que admitimos</p><p>de modo implicito que urn sistema educativo nao e, por si mcs</p><p>mo, nem urn poueo real. Acabamos nao venda urn conjunto de</p><p>praticas e instituic;6es que se organizaram lemamente ao longo</p><p>do tempo, que saO solidarias com wdas as ourras instituic;oes</p><p>sociais, exprimindo-as, e que, por eonscgui nte, bern como a pr6-</p><p>pria es trurura da soeiedade, nao podem ser modifieadas a vonta</p><p>de. Parece que estamos d iante de urn plIfO sistema de eonceitos</p><p>concretizados que, a este titulo, impliea apenas a lagiea. Pode-se</p><p>imaginar que homens de todas as cpoeas 0 organizam volunta</p><p>riamente para alcanc;ar determinado fim; que, se esta organiza</p><p>c;ao nao e a mesma em todo lugar, 6 porque houve urn engano</p><p>com reia930 a natureza ou do objetivo que con vern buscar ou</p><p>dos meios que permitem atingi-Io. Oestc ponto de vista, as edu</p><p>eac;5es do passado surgem como erros totais ou pareiais. Nao se</p><p>deve, partanto, leva- las em conside ra~ao; nao somas obrigados</p><p>a assumir os erros de observac:;ao ou de 16giea dos nossos prede</p><p>cessores; mas podemos e devemos abordar 0 problema sem lidar</p><p>com as solu<;:oes encontradas anter iormcnre. au seja, deixando</p><p>de lado tudo 0 que foi feito, deve mos nos perguntar somente 0</p><p>que deve ser feito. a ensino de hist6ria pode no maximo seNi r</p><p>para nos poupar a repeti~ao de eeros ja cometidos.</p><p>Parem, na verdade, cada sociedadc, eonsiderada em deter</p><p>minado momento de seu desenvolvimcmo, tern um sistema de</p><p>48 Co le~ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>educat;ao que se impoe aos individuos com uma for<;a gcral mc n</p><p>te irresistlvel. Naa adianta crer que podcmos CdUC'af os nossos</p><p>tilhos como quisennos. Hi costumes aos quais somos obrigados a</p><p>nos conformar; se os transgrcdirmos demais, eles acabarr'l se vin</p><p>gando nos nossos filhos. Uma vcz adulws, estes t'iltimos acredi</p><p>rarao nao poder viver em meio aos sellS contemporaneos, com os</p><p>quais nao cstarao em harmonia. Pouco importa se foram cTiadas</p><p>com idcias arcaicas ou avanr;adas demais; tanto em um easo como</p><p>no outro, cles nao terao condic;6es de viver uma vida normal. Por</p><p>tanto, em qualquer epoca, existe urn ripe regulador de educac;ao</p><p>do qual nao pademos nos distanciar sem nos chocarmos com vi·</p><p>gorosas resistcncias que escondem dissidencias frustradas.</p><p>Ora, nao fomos n6s, individualmente, que invemamos os</p><p>COStumes e ideias que dererminam esre ripo de educar;ao. E les</p><p>sao 0 produto da vida em comum e reflerem suas necessida</p><p>des. Em sua maior parte, eles sao inclusive fruto das gerac;;oes</p><p>anteriores. 'Todo 0 passado da humanidade contribuiu para ela</p><p>borar este conjunro de maximas que dirige a educa{:ao de hoje;</p><p>nela esta gravada teda a nossa hist6ria e mesmo a hist6ria dos</p><p>povos que nos precederam. Este mecanismo e similar ao dos</p><p>arganismos superiores) que carregam como que 0 ceo de teela</p><p>a evolu9ao biol6gica da qual eles sao 0 resultado. Quando se</p><p>estuda historicamente a maneira como os sistemas de educa~ao</p><p>se formaram e se desenvolveram, percebe-sc que eles sempre</p><p>dependeram da religiao, da urganizac;;ao polftica, do grau de</p><p>desenvolvimento das ciencias) du estado oa indllstria, e tc. Se</p><p>forern desconecrados de codas as causas hist(jricas, cles se corna</p><p>rao incompreensiveis. Como, entao, 0 individuo pode pretender</p><p>reconstfuir, somente a partir de sua reflexao pcssoal, 0 que nao e</p><p>fruto do pensa menro individual? E le nao se encontra diantc de</p><p>Educa~ao e Sociologia 49</p><p>uma tabula rasa sabre a qual poded ed ifiear a que quiser, mas</p><p>sim de realidades existenres, as quais ele nao pode nem criar,</p><p>nem destruir, nem transformar a vontade. Ele s6 pode influen</p><p>cia-las na medida em que aprender a conhed~-las e souber qual</p><p>e a sua natureza e as condi~6es das quais elas depend em; e s6</p><p>conseguira saber cudo isto se seguir 0 seu exemplo, se come9ar</p><p>a observa-Ias, como 0 ffsico 0 faz com a materia bruta, e 0 biolo</p><p>gista, com as seres vivos.</p><p>Alias, como proceder de ourra forma? Quando se quer deter</p><p>minar 0 que deve ser a educa9ao unicamente atraves da dialeti</p><p>ca, e preciso come~ar estabelecendo que fins ela deve ter. Mas ()</p><p>que nos permite dizer que a educac;ao tern tais fins, e nao outros?</p><p>Nao sabemos aptian qual e a fun~ao da respira9ao ou da circula</p><p>crao no ser vivo. Que privilegio faria com que soubessemos me</p><p>lhor 0 que diz respeiro a fUI1c;ao educariva? Pude-se responder</p><p>que, obviamente, ela rem como objetivo criar as crian~as. Mas</p><p>isto equivale a colocar 0 problema em termos quase iguais, e</p><p>nao resolve-lo. Seria preciso dizer em que eonsistc csta criac;ao,</p><p>aquilo a que ela tendc) que necessidades humanas cia satisfaz.</p><p>Ora, s6 se pode responder a tais quesroes come~ando par ob</p><p>servar em que ela consistiu e que necessidades cia satisfez no</p><p>passado. Desra forma, nt:m que seja apenas para constituir a no</p><p>~ao preliminar de educa9ao e determinar a coisa que se chama</p><p>assim, a observa9ao histurica surge como indispensavel.</p><p>1.2 Defini\,ao da educa\,ao</p><p>Para definir a educ3c;ao, e preciso, portanto, levar em consi</p><p>dera~ao os sistemas educativos que existcm ou que ja exisriram,</p><p>campara-los e identificar as aspectos em comum. A reuniao des</p><p>tes aspectos consrituinl a defini9ao que buscamos.</p><p>thiag</p><p>Realce</p><p>III 50 Cole~ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>Ao longo do nosso caminho ja determinamos dais e le mentos.</p><p>Para que haja edllca~ao 6 preciso que uma gera~ao de adultos e</p><p>uma de jovens se e ncomrc m face a face e que uma a~ao seja</p><p>exercida pe los prime iros sabre os segundos. Resra-nos defin ir a</p><p>nat ureza desta a~ao.</p><p>Nao existe, por assim dizer, nenhuma sociedade em. que 0</p><p>sistema de educa~ao nao apresente urn duplo carater: ele e ao</p><p>mesmo tempo singular e multiplo.</p><p>E le 6 multiplo. Ue faro, em certo senti do, podc-se dizer que</p><p>em ta l sociedade hCt tantos tipos quanto me ios de cd ucac;ao di</p><p>fc rentes. Tal sociedade, por exemplo, e form ada por eastas? A</p><p>educat;;ao varian! de uma casta para Dutra; ados ari swcratas nao</p><p>e ra igua\ a dos pJ eheus; ados bra manes nao era igual a uos su</p><p>dras. Oa mcsma forma, na [dade Media, que despropor9ao entre</p><p>a eliitura rcccbida pe los jovens pajens, insullidos em wdas as</p><p>artes da cavalaria, e ados camponeses livres, que iam aprender</p><p>na escola de sua par6quia alguns escassos e le me ntos de compu</p><p>to, canto e grami cica! Ainda hoje, nao vernos a ed ucac;ao variar</p><p>com as classes sociais ou rnesmo com os habitats? A da cidade</p><p>nao e igua\ a do campo, a do burgues nao e igual a do openirio.</p><p>Dirao por al que csta organizar;ao nao e rnoralmente justificive l</p><p>e pode ser considerada como urn anacronisrno destinado a desa</p><p>parecer. A tese e ficil de defender. E 6bvio que a educa9ao dos</p><p>nossos tilhos nao deveria depender do acaso que as faz nascer</p><p>aqui au la, de tais pais em vez de outros. Porem, mes mo que a</p><p>consciencia moral de nosso tempo tivesse side sa tisfeita neste</p><p>pomo, nem por isso a cduca~ao seria mais uniforme. Mes rno</p><p>que a carrei ra de cada cri an~a nao fosse, e m grande parte, pre</p><p>determinada por uma cega he reditariedade, a diversidade moral</p><p>das profissocs nao deixaria de exigir uma grand e divers idade</p><p>Educar;ao e Socioiogia 51</p><p>pedag6gica. De fa to, cada profissao constitui um melO SUt ge</p><p>neris que de manda apt idoes e conhecimentos especificos, urn</p><p>ll1eio no qual predominam cerras ideias, usos e maneiras de ver</p><p>as eoisas; e, ja que a crianc;a deve estar preparada com vistas a</p><p>func;ao que sera levada a cumprir, a ed ucac;ao, a partir de de</p><p>terminada idade, nao pode mais continuar a mesma pa ra to</p><p>dos as sujeitos aos quai s ela se aplicar. E por isto que, em todos</p><p>os paises civilizados, ela (Cnde cada vcz mais a se divcrsificar e</p><p>se especializar, e esta especializayao, a sc tornar cada vez mais</p><p>precoce. A heterogeneidaue produzida assim na~ fepousa sobre</p><p>inegavel injusti9a, como a que observamos agora ha pouco; mas</p><p>ela nao e menor. Para e ncon trar lima educar;ao absolutamente</p><p>homogenea e igualitaria , 6 preciso vol ta r no tempo ate as so</p><p>ciedades prc-his t6ricas, no scio das qua is nao existia nenhuma</p><p>diferencia9ao; c ai nda ass im estes tipos de soc iedades represen</p><p>tam apenas 11m mOffiCnto 16gico na hist6ria da humanidade.</p><p>Contudo, scja qual for a importanc ia destas educatXoes espe</p><p>cificas, elas na~ sao a educa~ao roda. Pode-se ate d izer que elas</p><p>nao sao autossufic.: icntcs; em tOdos as lugares em que se pode</p><p>observi-Ias, elas s6 divcrgem umas das outras a part ir de cecto</p><p>ponto aqucm do qual e las se confund em. Todas elas repousam</p><p>sobre uma basc C0111um. Nao ha povo e m que nao exista cerro</p><p>numero de ideias, SCntinlc ntoS e praricas que a educac;ao deve</p><p>inculcar em todas as crianyas sern distinyao, seja qual for a cate</p><p>goria social a qllal e las perte ncem. Mesma quando a sociedadc</p><p>e dividida em castas fechadas umas as olltras, sempre hi uma</p><p>rel igiao comum a todas, e, por consegllime., os princfpios da cultura</p><p>religiosa, que c entaO fundam enta l, sao as mesmos na faixa intcira</p><p>da populas;ao. Embora cada casr.a e cada familia tenha seus deuses</p><p>cspecfficos, hi divindadcs gerais reconhecidas pOT todo 0 mundo,</p><p>thiag</p><p>Realce</p><p>thiag</p><p>Realce</p><p>thiag</p><p>Realce</p><p>52 Colec;:ao Textos Fundantes de Educac;:ao</p><p>as quais todas as crian~as aprendem a adoral'. E, vista que estas</p><p>divindades encarnam e personificarn certos sentimentos c ma</p><p>neiras de conccber 0 mundo e a vida, naa se pode ser iniciado ao</p><p>culto dclas scm adquirir, ao mesmo tempo, todo tipo de h<ibitos</p><p>menta is que excedem a esfcra da vida puramenre religiosa. Oa</p><p>mesma forma, na ldade Media, servos, camponeses, burgueses</p><p>e nobres recebiam igualmente a mcsma educ39ao crista. Se e</p><p>assim em sociedades em que a divcrsidade intelectual e moral</p><p>atinge esre nfvel de contraste, entaa fica mail" do que claro que</p><p>o mcsmo vale para povos mais avan<;ados, nos quais as classes,</p><p>cmbora permanc9am disrinras, sao separadas por urn abismo</p><p>mcnos profunda! Estes elementos comuns de toda eduea9ao</p><p>nao deixam de existir mesmo quando nao se manifestam em</p><p>forma de simbolos religiosos. Ao longo da nossa hist6ria, eons</p><p>tiwiu-se todo urn conjunto de ideias sobre a natureza humana,</p><p>a importancia respectiva de nossas diferentes faculdades, 0 di</p><p>reiw e 0 dever, a sociedade, 0 individua, 0 progresso, a ciencia,</p><p>a arte, etc., ideias que se encontram na pr6pria base do nosso</p><p>espfrito nacional; toda educa9ao, tanto a do rico quanto a do</p><p>pobTe, tanto a que conduz as profiss6es liberals quanta a qlle</p><p>prepara para as fun90es industriais, tern como objetivo n.xa-Ias</p><p>nas consciencJas.</p><p>o resultado destes fatos e: que cad a sociedade elabora urn</p><p>cerro ideal do hornem, 011 seja, daquilo que ele</p><p>deve ser tanto</p><p>do ponto de vista intelectual q uanto ffsico e moral; que este</p><p>ideal e, em eerra rnedida, 0 mesmo para todos os eidadaos;</p><p>que a partir de certo ponto ele se diferencia de acordo com os</p><p>meios singulares que toda sociedade compreende em seu seio.</p><p>E este ideal, unico e diverso ao mesmo tempo, que e 0 polo da</p><p>educa9ao. Portanto, a fun9ao desta ultima e suscitar na criam;a:</p><p>Educa~ao e Sociologia 53</p><p>to) urn ceno numero de estados fisicos e mentais que a soeieda</p><p>de a qual ela pertence exige de todos as seus membros; 2°) cer</p><p>tQS estados ffsicos e mentais que a grupo social espedfico (casta,</p><p>classe, familia, profissao) tambem considera como obrigat6rios</p><p>em todos aqucles que 0 formam. Assim, e 0 conjunto da socie</p><p>dade e eacia meio social especifico que determinam este ideal</p><p>que a educayllo realiza. A socicdade so po de viver se existir uma</p><p>homogeneidade sufieientc entre seus membros; a educa<;ao</p><p>perpetua e fortalece esta homogcneidade gravando previamen</p><p>te na alma da cdant;a as semelhan<;as essenciais exigidas pela</p><p>vida coletiva. No entanto, por outro lado, qualqucr cooperat;ao</p><p>seria impossIvel sem uma certa diversidade; a eduCa93.o assegll</p><p>fa a persistencia desta necessaria diversidadc divcrsificando-se e</p><p>especializando-se a si mesma. Se a sociedade tivcr a\can9ado 0</p><p>nivel de desenvolvimento em que as andgas divisocs em castas</p><p>e classes nao podem mais se manter, ela prescrevera uma educa</p><p>gao mais una em sua base. Se, no mesmo momento, 0 trabalho</p><p>estiver mais dividido, ela provocara nas crianc;as, a pardr de urn</p><p>primeiro deposito de ideias e sentimentos comuns, uma diversi</p><p>dade de aptid6es profissionais mais rica. Se ela viver em cstado</p><p>de guerra com as sociedades ambientes, ela se esforyara para for</p><p>mar os intelectos a partir de urn modelo alta mente nacional; se a</p><p>Concorrencia internacional adotar uma forma mais pacffica, 0 dpo</p><p>que eIa buscara realizar e mais geral e humano. Portanto, para</p><p>a sociedade, a edllca~ao e apenas 0 modo pelo qual ela prepa</p><p>ra no cora9ao das crian~as as condit;6es esseneiais de sua propria</p><p>existencia. Veremos rna is para a frente como 0 pr6prio indivfduo</p><p>encontra vantagens em se sub meter a estas exigencias.</p><p>Chegamos, ponamo, ao seguinte enunciado: A eduul[iio t a</p><p>apIa exercida pelas gerafoes adultas sabre aqueloJ que aillda lIiia f?Jtiio</p><p>54 Colecao Textos Fundantes de Educacao</p><p>!flo/urns para a vida social. lila (em como objetivo slIscitar e descll</p><p>valver I/O a'iOfJ{O 11m cerlo tlumero de es/ados jisicos, illteleell/ais e</p><p>marais exigidos tmlto pelo cOlljZWIO do sociedade po/{tica quofllo pelo</p><p>meio especifieo 00 qual do eSld des/if/ada tm particular:</p><p>1.3 Consequ,mcia da definiyao anterior: carater social da</p><p>educayao</p><p>A pa rtir da dcfini9ao precedence, podc-sc conciu ir que a</p><p>cdllca~ao consistc em lima socializa~a() mc[odica das novas gc</p><p>ra(iles. Em cada lim de n6s, podc-sc di zcr, cxistcm dois seres</p><p>que, c mbora scja m inscparavc is - a nao ser por abstras;ao -, nao</p><p>dcixam de ser distintos. Urn 6 composto de wdos as estados</p><p>mentais que dizcm respe ito apenas a n6s mesmos e aos acon</p><p>teci mc ntos da nossa vida pessoal: eo que se poderia chamar de</p><p>ser individual. 0 Outro e urn sistema de ideias, sentimentos e</p><p>habiws que exprimem em n6s nao a nossa pe rsonalidade, mas</p><p>si m a grupo ou as grupos dife rentes dos quais fazemos parte;</p><p>tais como as crenyas religiosas, as cren~as e praticas morais, as</p><p>tradi<;oes nacionais au profi ss ionais e as opinioes coletivas de</p><p>todo tipo. Este conjunto forma 0 ser social. Consti(lJir esre ser</p><p>em cada urn de n6s e 0 objerivo da educayao.</p><p>Alias, e af que se manifesta melhor a importancia do seu pa</p><p>pel c a fecundidade da sua a93o. De faro, esre ser social nao</p><p>someme nao se enconua ja promo na constiruiyao primiriva do</p><p>hom e m como tambe m nao resulta de lim desenvolvimenro es</p><p>pomaneo. Esponraneamenre, 0 hom em nao tinha tendencia a</p><p>se submeter a uma autoridade polftica, respeirar lima discipl i</p><p>na moral, dedicar-se e sacrificar-se. A nossa natureza congeni ra</p><p>nao aprescntava nada que nos predispusesse necessariamenre a</p><p>nos tornarmos scrvidores de divindades, e mbl e ma s si mb6licos</p><p>Educa~o e 50clologia 55</p><p>da sociedade, a Ihes prestarmos culto au a nos privarmos para</p><p>honni-las. Foi a pr6pria tiociedade que, a medida que ia se for</p><p>mando e se consolidando, tirou do seu seio es tas grandes for~a s</p><p>morais, diante das quais 0 homem sentiu a sua inferioridade.</p><p>Ora, com exce9ao de tendencias vagas e incerras que podem</p><p>ser auibufdas a hereditariedade, ao entrar na vida, a crian9a traz</p><p>apenas a sua natureza de indivfduo. Portanto, a cada nova gera</p><p>~ao, a soci edade se encontra ern presenc;a de uma tabula quase</p><p>rasa sabre a qual eta deve construir novamente. f: preciso que,</p><p>petos meios mais [{ipidos, ela substitua 0 ser egoista e associal</p><p>que aeaba de nascer por urn outro capaz de levar uma vida moral</p><p>e social. Esra e a obra da educa~ao, cuja grandeza podemos reco</p><p>nhecer. E la 11:3.0 sc limita a refor~ar as rendencias naturaimentc</p><p>marcanres do organismo individual, au seja, desenvolver poten</p><p>cialidades ocultas que so estao esperando para serem revel ad as.</p><p>Ela cria urn novo ser no homem.</p><p>Esta virtude criadora e, alias, um privilcgio especifico da</p><p>educac;ao hUlnana. A que os animais recebem c completamente</p><p>diferente, se e que podemos chamar de eduCa9ao 0 treinamenco</p><p>progressivQ ao qual elcs sao submetidos par seus pais. Este trei</p><p>namento bem pode acclerar 0 desenvolvim ento de certos ins</p><p>tintos que estao latentes no animal, mas nao 0 inicia a uma nova</p><p>vida. Ele facilita 0 movimento das funtyoes naturais, mas nao</p><p>cria nada. Ins{Iuido pe la mae, a filhote sabe ra voar au fa zer 0 ni</p><p>nho de forma mais dpida, mas nao aprendera quase nada a nao</p><p>ser atraves de sua experiencia individual. E que as animais ou</p><p>vivem fora de todo estado social ou formam sociedades bastan</p><p>te simples, que fun cionam a partir de mecanismos instintivos</p><p>que cada individuo carrega consigo perfe itamcnte cons{iruidos</p><p>desde 0 nascimento. Porranto, a educa~ao nao pode acrescentar</p><p>thiag</p><p>Realce</p><p>56 Cole~ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>nada de essencial a nawrcza, visro que esta ultima e imeiramen</p><p>te suficieme, tanto para a vida do grupo quanto para a do indi</p><p>vfduo. No homem, ao conwhio, as aptidoes de todD tipo que a</p><p>vida social sup6c sao complexas demais para pocterem, de eeno</p><p>modo, encarnar-se nos recidos e materializar-se sob a forma de</p><p>predisposic.;6cs organicas. Poc conseguinrc, elas nao podem sec</p><p>uansmitidas de lima gerae;ao para a uutra auaves da hereditarie</p><p>dade. E a educ3eyao que garanrc a transmissao.</p><p>No cnranto, pode-se objetar, se de faro e possfvel conceber</p><p>que as qualidades propria mente morais 56 podem sec suscitadas</p><p>em n6s por uma 39ao vinda do exterior, lima vez que clas im </p><p>poem priv390es ao individuo c rcprirn em os seus movimentos</p><p>nacurais, nao haveria ounas qualidades que todo homem tern</p><p>interesse em adquirir e busca espontaneamente? Pensemos, por</p><p>cxernplo, nas diversas qualidades da inteligencia que Ihe penni</p><p>tern adaprar melhar a sua eonduta a natureza das coirms. Pense</p><p>mos tamb6m nas qualidadcs ffsicas e em tudo 0 que contribui</p><p>para 0 vigor e a saude do organismo. Com reiat;:ao a estas ulti </p><p>mas, pelo menos, parece que a educa~ao, ao desenvolve-Ias, nao</p><p>fat;:a ITlais do que tomar a dianteira do pr6prio desenvolvimenro</p><p>natUral, al~ando a individuo a urn estado de perfei9ao relativa a</p><p>qual ele teode por si mesmo, embora possa alcan9a-lo de forma</p><p>mais nipida com a ajuda da sociedade.</p><p>Por6m, apesar das aparcncias, 0 que mostra bern que, taow</p><p>aqui como alhures, a educa~ao satisfaz acirna de tudo necessi</p><p>dades sociais 6 que cxistem sociedades em que cstas qualida</p><p>des nao foram absulutamente cuitivadas e que, em todo caso,</p><p>foram compreendidas de modo muito diferente, dcpendendo</p><p>das sociedades. Nem todos as povos recoohecerarn</p><p>as vantagens</p><p>de uma s6Iida cultura intcleetual. A ciencia eo espfrito crltico,</p><p>Educa~ao e Sociologia 57</p><p>os quais va lorizamos tanto atualmente, durante muito tempo</p><p>foram vistos com dcsconfian~a. Nao con hecemos uma grande</p><p>doutrina segundo a qual sao bem-aventurados os pobres de es</p><p>pfriro? Nao se deve pensar que esta indiferen~a com re ia9ao ao</p><p>saber tenha side artificial mente imposta aos homens contra a</p><p>natureza deles. Eles nao tem por si mesmos 0 apetire instintivo</p><p>de ciencia que Ihes 6 frequeme e arbitrariameme anibufdo e s6</p><p>desejam a ciencia na medida em que a experiencia Ihes mosna</p><p>o quao imprescindlvel eIa 6 para eles. Ora, no que diz respeito</p><p>a organiza~ao de sua vida individual, eles nao se interessavam</p><p>nem urn pouco peia ciencia. Como ja dizia Rousseau, para satis</p><p>fazer as necessidades vi tais, a seosac;ao, a experiencia e 0 insci n</p><p>to podiam bastar para 0 homem assim como para 0 animal. Se 0</p><p>hom em nao tivesse senti do outras necessidades a16m daq uelas,</p><p>bastante simples, cujas rafzes prov6m de sua constitui~ao indi</p><p>vidual, ele nao teria corrido atras da ciencia; ainda mais que ela</p><p>nao foi obtida sem laboriosos e dolorosos esfor~os. Ele s6 sentiu</p><p>a sede do saber quando a sociedade a provocou neie, e a socie</p><p>dade s6 a provocou quando ela mesma sentiu esta necessidade.</p><p>Isto aconteC~u quando a vida social, soh todas as suas fonnas,</p><p>tornou-s~ complcxa demais para poder funcionar de ouna forma</p><p>a nao ser com base na reflexao, ou seja, no pensamento ilumi</p><p>nado pela cieneia. A cu ltura eientffiea se [Ornou entao indispen</p><p>savel, e e por isto que a sociedade a cxige de seus membros e a</p><p>impoe como urn dever. Entretamo, em suas origens, enquanto</p><p>a organizat;ao social for ba5tante simples, muito pouco variada</p><p>e semprc fiel a 5i mesma, a cega tradi<;ao oastara, assim como</p><p>o instinru para () anima l. Neste contexto, 0 raciocfnio e 0 li vre</p><p>pensamento sao inuteis e ate perigosos, ja que necessariameme</p><p>ameas:ariam a tradis:ao. E por isto que des sao proscritos.</p><p>thiag</p><p>Realce</p><p>thiag</p><p>Realce</p><p>58 Cole~ao Textos Fundantes de Educa~3o</p><p>o mcsmo vale ate para as qualidades ffsicas. Se 0 escado do</p><p>meio social inclinar a consciencia publica para 0 ascetismo, a</p><p>educa<;ao ffsica sera rejeitada para 0 segundo plano. f: lim pOlleo</p><p>o que acontecia nas escolas da Idadc Med ia; e es te ascetismo era</p><p>necessaria, pois a (mica maneira de se adaptar it rudeza daqueles</p><p>te mpos diffceis era amando-a. Oa mesma forma , dependendo</p><p>das linhas de opinifro, esta mcsma educa~ao sera emendida nos</p><p>mai s diferemes sentidos. Em Espana, ela tinha como objctivo</p><p>sobrewdo endurecer os mcmbros contra 0 cansa90; em Arenas,</p><p>ela era um meiu de modclar bel as carpos para serem adm irados;</p><p>na epoca da cavalaria, csperava-se que ela formassc gucrrciros</p><p>ageis e flexiveis; hojc em dia, ela s6 visa a higicnc c sc preo</p><p>cllpa sobretudo em conter os perigosos efeitos de uma cliltura</p><p>intelectual demasiado intensa. Assim, 0 indivfduo s6 busca as</p><p>qualidades que a primeira vista parecem tao espontaneamente</p><p>desejaveis quando a sociedade 0 incita nesta dircc;ao. E e le as</p><p>busca da maneira que ela Ihe prescreve.</p><p>Escamos agora aptos a responder a uma qucstao leva nta</p><p>da por tudo 0 que acabamos de ver. Enquanto moscravamos a</p><p>sociedade modclando os individuos de acordo com as suas ne</p><p>cessidades, podia parecer que e}es sofriam assim lima insllpor</p><p>dvel tirania. Porcm, na realidade, eles proprios tem interesse</p><p>nesta subm issao, pois 0 novo ser que a a9ao coletiva ed ifica</p><p>em cada urn d e n6s atraves da educa9ao reprcsenca 0 que hft</p><p>de melhor em n6s, ou seja, 0 que ha de propriarnenre huma</p><p>no em n6s. Dc faro, 0 homem s6 e homem porque vive e m</p><p>sociedadc. E diffcil demonstrar com rigor, em urn arrigo, uma</p><p>afirma9ao tao geral e importante e que resume os trabalhos da</p><p>Sociologia contcmporanea. Mas ja podemos, pelo menos, dizer</p><p>que e1a esta sendo cada vez menos contestada. Alcm disso, e</p><p>Educar;ao e $ociologia 59</p><p>posslvellembrar su mariamcnte as fatos mais essenciais que:; a</p><p>justificam.</p><p>Antes de tudo, se ex iste hoje urn fato historicamente es</p><p>tabelecido, eo fato de qu e a moral cultiva estreitas relac;oes</p><p>com a natureza das sociedad es, visto que, como ja mostra mos</p><p>ames, ela muda quando as sociedades mudam. Isro significa,</p><p>portanro, que a moral resulta da vida em comum. De faro, 6</p><p>a sociedade que nos fa z sail' de n6s mesmos, que nos obriga a</p><p>considerar interesses diferenres dos nossos, que nos ensinou</p><p>a dominar as nossos fmpetos e instintos, a sujeita-los a leis, a</p><p>nos reprimir, privar, sacrificar, subordinar os nossos fins pes</p><p>soais a fins mais clevados. Foi a sociedadc que:; instituiu nas</p><p>nossas consciencias todo 0 sistema de representa9ao que ali</p><p>menta em n6s a idcia c 0 sentimento da regra e da disci pI ina,</p><p>canto internas quanto cxternas. Foi assim que adquirimos 0</p><p>poder de resist ir a nos mesmos, au seja, 0 domfnio sabre as</p><p>nossas vantades, lim dos tra90s marcantes da fisionomia hu</p><p>mana, desenvolvido a mcdida que nos tornamos mais plena</p><p>mente humanos.</p><p>Do ponto de vista intclccttJal, nao devemos menos a socie</p><p>dade. E a ciencia que e labora as n090es cardeais que dirigem 0</p><p>nosso pensamento: n090es de causa, leis, espac;o, numera, cor</p><p>pas, vida, consciencia, sociedade, etc. Todas estas ideias funda</p><p>mentais estao em constante cvolu9ao: e que elas sao 0 resumo</p><p>eo resultado de todo 0 trabalho cientifico, e nao 0 seu ponto</p><p>de partida, como acreditava Pestalozzi. Nao consideramos hoje</p><p>o hom em, a natureza, as causas e inclusive 0 espac;o como eles</p><p>cram considerados na ldadc Media; e que os nossos conheci</p><p>menws e metodos ciendficos nao SaO mais os mesmos. Ora, a</p><p>ciencia e uma cbra coletiva, vista que supoe uma vas ta coope-</p><p>60 Cole~ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>[w;ao cntre rodos os sa bios nao somenrc_de urn mesma perfodo,</p><p>como tambem de todas as epucas sllcessivas da hist6ria. - Antes</p><p>de as ciencias estarem constitufdas, a religiao desempenhava 0</p><p>mesma papel, pais toda mitologia consiste em uma represcn</p><p>ta~ao, ja bastanre elaborada, do homem e do universo. Alias, a</p><p>ciencia e herdeira da rcl igilio, que, por sua vez, e lima instirui930</p><p>social. - Ao aprendcr lima lingua, aprendemos todo urn sistema</p><p>de ideias, disrinras c classificadas, e herdamos todo 0 trabalho</p><p>do qual sao oriundas estas classifica90es, que resumcm seculos</p><p>de experiencia. E tern mais: sem a linguagem, nao tcriamos, por</p><p>assim dizer, ncnhuma ideia geral, pais e a palavra que, ao fixar as</p><p>conceitos, Ihcs da consistencia suficiente para que eJes possam</p><p>ser manipulados comodamente pelo intelccto. Pmtanto, foi a</p><p>linguagem que nos permitiu elevar-nos acima da pura sensavao;</p><p>e e desncccssario demonsrrar que a linguagem e, pm excelen</p><p>cia, uma coisa social.</p><p>Estes exemplos mosrram que, se wdo 0 que a sociedade</p><p>deu ao hom em Ihe fosse retirado, elc scria redllzido a cate</p><p>goria do animal. Se ele pode ultrapassar 0 esdgio no qual os</p><p>animais se estagnaram, foi primeiro porque ele nao se contenta</p><p>somenre com 0 fruto dos seus esfon;;os pessoais, mas coopera</p><p>regularmente com as seus semelhanres; 0 que refon;a 0 rendi</p><p>mcnw da atividade de cada urn. Foi tambem - e sobretudo -</p><p>porque os produtos do trabalho de uma gerac;ao deixam assirn</p><p>de screm perdidos pela gerayJo scguinte. De (Udo 0 que urn</p><p>animal aprende ao longo de sua cxisrcneia individual, quasc</p><p>nada fica para a sua posteridadc. as resultados da experiencia</p><p>humana, ao conrrario, conservarn-se quase que integralmenrc</p><p>e arc em seus detalhes, gra<;3S aos livros, monumentos figll</p><p>rativos, ferrarnentas, instrumenros de todo tipo transmitidos</p><p>Educa~ao e Sociologia 61</p><p>de geraryJo em gera<;ao, tradivao oral, etc. 0 solo da natureza</p><p>e assim recoberro por urn rico aluviao que vai crescendo scm</p><p>parar. Ao inves de se dissipar rodas as vezes em que uma gera</p><p><;ao se extingue e e substituida por outra, a sabedoria humana</p><p>se acumula sem cessar, e e esta infinita acumula<;ao que eleva</p><p>o homem acima da besta e de si mesmo. Todavia, assim como</p><p>a coopera<;ao que mencionamos aeima, esta acumulavao s6 e</p><p>possivel na e pela sociedade. Isro porque, para que 0 Jegado de</p><p>cada gera~ao possa ser conservado e cransmirido para as outras,</p><p>e preci50 que haja uma personalidade moral que atravesse as</p><p>geraryocs que passam e que as ligue umas as outras: e a socie</p><p>dade. Assim, 0 antagonismo que muiras vczcs se sup6s existir</p><p>entre a sociedade e 0 individuo nao corresponde a realidade.</p><p>Estes dois rcrmos estao longe de se oporem c 56 poderem se</p><p>desenvolvcr de modo divergente. Na verdade, urn implica 0</p><p>outro. Ao qucrer a sociedade, 0 individuo quer a si mesmo. 0</p><p>objetivo e 0 efeiw da a<;ao que ela exerce sobre cle, principal</p><p>menre arraves da educa<;ao, nao sao nem urn poueo reprimi-lo,</p><p>dimi nui-Io, desnarura-lo, mas sim amplifica-Io c transforma-Io</p><p>em lim ser verdadciramente humano. Sem dllvida, cle s6 pode</p><p>crescer desra forma fazendo esfor<;o. Mas, jusramente, 0 poder</p><p>de fazer esforyo de modo volunrario e uma das caracteristicas</p><p>mais essenciais do hom ern.</p><p>1.4 0 papel do Estado em materia de Educa~iio</p><p>Esta definiryao da educa<;ao permite resolver facilmente a</p><p>questao tao comroversa dos deveres e direitos do Estado em</p><p>materia de Edueayao.</p><p>A estes op6em-se as direiros da familia. Aercdita-se que a</p><p>crianc;a pertencc primeiro aos seus pais; porranro, e a eles que</p><p>62 Cole~ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>cabc dirigir, como bem entend erem, 0 sell desenvolvimento</p><p>intclecmal e moral. A educac;ao e entao concebida como uma</p><p>coisa essencialrnente privada e domestica. Quando adotamos</p><p>este ponto de vista, tendemos de forma narurai a reduzir a inter</p><p>venc;ao do Estado ao minima posslvel. Ele deveria, dizemos, li</p><p>mitar-se a servir como auxiliar e substituto das familias. Quando</p><p>elas se encontram inaptas a cumprir os seus de veres, e natural</p><p>que ele se encarregue dos mesmos. E natural ate que de Ihcs</p><p>facilire aD maximo a tarefa, colocando a slla disposi ~ao csco las</p><p>aande possam enviar seus filhos se quiserem. Mas etc deve sc</p><p>manter estritamente denero destes limites e se impcdir de rcali</p><p>zac qualquer 3c;ao destinada a gravar determinada oricnta~ao na</p><p>alma da juventude.</p><p>Porem, 0 seu pape! nao cleve permanceer tao negativo. Se.</p><p>como tentamos motitrar aqui, a edllea~ao descmpenha acima</p><p>de tuclo uma fun9ao co letiva c tern como objetivo adaptar a</p><p>crians;:a ao mcio socia l no qual cia csta destinada a viver, e im</p><p>possivel que a socicdadc se dcsinteresse de tal opera<;ao. Se</p><p>a sociedadc constitui 0 ponto de referencia para a educa<;3.o</p><p>dirigir a sua a~ao, como cia poderia ficar ausente desta ultima?</p><p>Portanto, 6 a c ia que cabc constantemence lembrar ao profes</p><p>sor que id cias c sentimentos ele deve arraigar na crianc;:a para</p><p>que a mcsma e ntre em harmonia com 0 seu meio social. Se ela</p><p>nao estivessc scm pre presence e vigilante para obrigar a a<;ao</p><p>peJag6gica a se exercer em urn sentido social, esta ultima se</p><p>colocaria nccessariamente a servi<;o de cren<;as pardculares, e</p><p>a grande alma da patria se dividiria e se dissolveria em uma</p><p>plura lidadc incoerente de pequenas almas fragmentarias em</p><p>confl ito umas com as outras. Nada e mais contrario ao objetivo</p><p>fundamental de toda educa<;3.o do que ism. E preciso escolher:</p><p>Educa~ao e Sociologia 63</p><p>se quisermos valorizar a cxist6ncia da sociedade - acabamos</p><p>de ver 0 que eia sign ifica para nds -, e preciso que a educaC;3o</p><p>esrabcle9a uma comun hao de ideias e sentimentos suficiente</p><p>entre os cidadaos, comu nhao sem a qual qualquer sociedade e</p><p>impossivel; e, para que possa produzir cste resultado, a educa</p><p>vao nao pode ficar totalmenre amerce das arbitrarias vontades</p><p>individuais.</p><p>Uma vez que a educa~ao e lima fun<;ao essencialmente so</p><p>cial, 0 Estauo nau pode se desinteressar dela. PeIo cumrario,</p><p>tudo 0 que 6 cuuCa9aO deve se1', em certa medicla, submetido a</p><p>sua avao. Tsto nao significa, no entanto, que elc deva necessa</p><p>ria mente monopolizar 0 ensino. A questao e demasiado COITI</p><p>plexa para que possamos trata-Ia assim sem entrar em detalhes:</p><p>vamos reserva-Ia para mais tarde. Pode-se pensar que os pro</p><p>gressos escolares sao mais simples e rapidos quando uma cer</p><p>ta margem de manobra e concedida as iniciativas inclividuais,</p><p>poi s 0 individuo e mais facilmenre inovador do que 0 Estado.</p><p>Porem, 0 fam de 0 Estado dever, em prot do interesse publico,</p><p>autorizar 0 funcionamento de outras escolas al6m daquelas sob</p><p>sua responsabilidade direta nao implica que ele permanes;:a in</p><p>diferente ao que acontece dentro destas instituic;ocs. A Edu</p><p>cac;ao que elas forneccm cleve, pelo coorf(hio, ficar submetida</p><p>ao seu controle. Nao 6 nem mesmo admissivel que a fum;ao de</p><p>educador seja desempenhada por algucm que nao apresente</p><p>garantias especfficas que somente 0 Estado pode julgar. Sem</p><p>duvida, os limites dcntro dos quais a sua intervenyao cleve se</p><p>manter sao diffceis de se determinar de modo definitivu, mas</p><p>o principio de intervenc;ao nao pode ser contestado. Nau h1 es</p><p>cola que possa reivindicar 0 direito de dar, com toda liberdade,</p><p>lima Educac;ao ant issocial.</p><p>64 Co le~ao Textos Fundantes de Ed uca~ao</p><p>No entanto, e necessario reconhecer que 0 esrado de divisao</p><p>em que atualmeme se encontram as mentes na FranIYa5 faz corn</p><p>que este dever do Estado se (Orne especial mente dclicado e,</p><p>ao mesmo tempo, mais importante. Dc faw, nao cahc ao E sta</p><p>do criac csta comunhao de ideias e scmimentos sem a quai nao</p><p>exisrc soci edade; ela deve se constituir pDf si 56, e a (lnica caisa</p><p>que de pode fazer 6 consagra-Ia, manrc-Ia e wcna-Ia mais cons</p><p>ciente para as pessoas. Ora, infelizmcnte , no nosso pals [Fanyal.</p><p>esta unidade mural nao e, em (Odos os angulos, () que ela de</p><p>veria sec. Ficamos divididos entre concepl¥oes divergentes e as</p><p>vczcs ate contradit6rias. Em mcio a estas divcrgcncias, ha urn</p><p>faw que e imposslve\ negar e quc e preciso levar em considera</p><p><;ao. Nao se (rara de conceder ao grupo majoritario 0 direito de</p><p>impor suas ideias as crian~as pertcncemes ao grupo minoritario.</p><p>A escola nao deve ser a coisa de urn partido, eo professor faltara</p><p>an sell dever se usar a autoridade da qual dispoe para embarcar</p><p>os sellS alunos a bordo de slias parciais visoes pessoais, por ma is</p><p>be rn fundadas que elas Ihe possam parecer. Porem, a despeito</p><p>ue todas as dissidcncias, ja ha desde agora, na base da nossa</p><p>civilizayao, urn certO nlimero de princfpios que, implfcita ou cx</p><p>plicicameme, sao comuns a wdos, principios que, em todo caso,</p><p>muito pOUCOS ousam negar de forma aberta c frontal: respcito</p><p>ua razao, da ciencia e das ideias e semimentOs que sustentam</p><p>a moral democrarica. 0 pape! uo Estado consiste em identiflc.:ar</p><p>estes principius essenciais, fazer com que e!cs sejam ensinados</p><p>nas escolas, garantir que em lugar algum os adu ltos deixem as</p><p>crianyas ignora-Ios e certificar-se de que pDf toda pane se fale</p><p>de les com 0 respe iro que Ihes 6 devido. Sen do assim, pouc-se</p><p>5. Esta obra roi escrira tendo comu f(x:o inicial a Franrra IN.E.].</p><p>Educa~a o e Sociolog ia 65</p><p>excrcer uma a<;ao que talvez se ra tanto mais efi caz quanto me</p><p>noS agress iva e violenta for e quanto me lhor sc mantivcr dentro</p><p>de lirnites sensatos.</p><p>1.S Poder da educa\)ao: meios de a\)1io</p><p>Uma vcz detcrminado () objetivo da cduca9ao, 6 preciso bus</p><p>car definir como c e m que meuida 6 possfvcl atingi-Io, ou seja,</p><p>como e em que meuida a educa9ao pode ser eAcaz.</p><p>Esta questao scm pre foi controversa. Para Fontene ll e, "a boa</p><p>educac;ao nao forma 0 bom cadte r, e a ma tampouco 0 de str6i" .</p><p>Para Locke c Hclvetius, ao contdrio, a educayao e onipotente.</p><p>Segundo cste (dtimo, "todos as hom e ns nascc m iguais e com</p><p>aptidoes semelhantes; some me a educa~ao da orige m as dife </p><p>rencyas". A teoria de Jacotot se aproxima da anterior. A soluyao</p><p>que se da ao problema depende,</p><p>de um lade, da ide ia que se</p><p>tern da importancia e da natureza das predisposi'Y0es inatas e, de</p><p>Outro, do pode r dos me ios de ayao di spon,veis para 0 educador.</p><p>A educac;ao nao form a 0 hom e m a partir do nada, como acre</p><p>ditavam Locke e Helvetills, mas se aplica a disposiyoes que ja</p><p>se encontram na crianya. De modo ge ral, pode-se admitir qu e</p><p>estas tendc ncias congc nitas sejam bas tante fones e difkeis de</p><p>dcstruir au transformar radical me nte, pois depe nd em de condi</p><p><;ues organicas sobre as quais 0 educador nao te m muito contro</p><p>Ie. Seguindo este raciodnio, na medida e m que estas tendcn cias</p><p>tern urn objew definido e incJinam 0 inte lecto e ° carater para</p><p>maneiras de agir e pensar estre itam e nte estabelecidas, todo 0</p><p>futuro do indivi'dllo se vc de te rminado de ante mao, e a educ.:a</p><p><;ao na~ res ta mui ta coi sa a fazer.</p><p>Feliz mc ntc, pore m, uma das carac[Cristicas do homcm 6 0</p><p>faro de as suas prcdisp()si~i>cs inatas scrcm hastantc gerais c vagas.</p><p>66 Colet;ao Textos Fundantes de EdUC3t;30</p><p>De fato, 0 ripe de predisposi\=8.o fixa, rfgida, invariavel e que</p><p>impede a a9ao de causas exteriores e 0 instinto. Ora, podemos</p><p>nos pergumar fie existe no homem um (inico instinco propria</p><p>me nte d ito. Fa la-se as vezes do insrimo de conserva~ao. Mas a</p><p>expressao <5 inadcquada, pais 0 instinro e urn sistema de movi </p><p>mentos detcrminados que sao sempre identicos e que, uma vez</p><p>esti mulados pe la sensa9ao, cncadeiam-se automaticamente uns</p><p>aos DUUOS ate chegarem ao sell termino natural, sem que a refte</p><p>xao passa imervir e m algum momento. Ora, as movimentOs que</p><p>executamos q uando nossa vida csta em perigo naa apresentam</p><p>Hbsolutamente esta derenninas;ao c invariabilidade automatica.</p><p>liles mudam de acordo com as situas;6es, c nus us adaptamos as</p><p>ci rcunsrancias. Isto significa, porcanro, que cles sao acompanha</p><p>uos pur uma cena escolha conscience, em bora ripida. Aquilo</p><p>que chamamos de instinto de conservatyao nau passa, no fim das</p><p>cuntas, de urn irnpulso gera l q ue nos leva a fugir ua murte. E os</p><p>meios pdos quais tentamos evita-Ia nao sao prcdctcrminados</p><p>llma vcz por rodas. 0 mesmo vale para aqu ilo que as vczes eha</p><p>mamos, de forma igualmente inadequada, de instinto materno,</p><p>instin to paterno e mesrno inst imo sexual. Sao fo rs;as que inci</p><p>tam em determinada dire9ao, mas os meios pelos quais cstas</p><p>fon;as se concrctizam mudam de urn indi vfd uo para 0 Olltro e de</p><p>llma ocasiao para a outra. Existe, portanto, llrna gra nde rnargem</p><p>de manobra para as tcmarivas, adapta.;oes pessoais e, por consc</p><p>gu inte, para a as;au dc fatores que 56 podem exercer influc ncia</p><p>depois do nascimento. Ora, a ed uca9ao e urn des res faro res.</p><p>ja se anrmou, 6 vcrdadc, que a crian.;a as vezes herdava Uma</p><p>tcndcncia bastanrc forw a cometer determinados atos, como 0</p><p>suiddio, U fOu no, 0 assassinato, a [raude, e tc. Mas estas afi rrna-</p><p>90CS nao correspond em nem um POllCO a realidade. Pouem rer</p><p>Educar;ao e Sociologia 67</p><p>dito 0 que for, mas ning uc m nasce crim inoso e muiro menos</p><p>predestinado a tal au tal tipo de crime; 0 paradoxa dos crirr"lino</p><p>logisras iraiianos hoje em dia nao conca mais com muitos defen</p><p>sores. 0 que e herdado e uma certa fal ta de e quillbrio mental,</p><p>que leva 0 individuo a ser mais refratario a uma cond ma reg ular</p><p>e disciplinada. Mas tal temperarnento nao predestina um ho</p><p>mem a ser mais urn eriminoso do que urn apaixonado aventurei</p><p>ro, um profeta, urn precursor polftico, urn inventor, etc. 0 mes</p><p>rna vale para codas as aptidoes profissionais. Como nota Bain,</p><p>"0 filho de urn grande fii6iogo nao hcrda urn unico voeabulo;</p><p>o filho de urn grande viajame pode, na csco la, scr dcixauo para</p><p>mis e m G eografia pelo filho de urn mine iro". 0 que a c rian</p><p>c;a rccebe dos sellS pai s sao fac uldades basta ntc gera is, como,</p><p>por exemplo, dcterminada capacidade de ar.en~ao, certa dose</p><p>de pe rseveran9a, born discernime nro, imag i na~ao, etc. Mas cada</p><p>uma desras faculdades pode servir a diferentes t ipos de prop6si</p><p>tos. A crian~a dowda de Ulna imagina~ao vivaz pode, conforme</p><p>as circunsrancias e influencias que pesarao sobre si, ro rnar-se</p><p>pinwr ou poeta, engenheiro criativo ou empresario ousado. E,</p><p>partanw, consideravel a distaneia que existe entre as qualidades</p><p>naturais e a forma especifica que elas devem adotar para serem</p><p>uti lizadas na vida. lsto sign ifica que 0 futuro nao se encontra</p><p>estreitamente predeterminado pela nossa constituic;ao congeni</p><p>tao E faeil entender a razao dis(Q. As unicas formas de atividade</p><p>transmitidas hereditariame nte sao as q ue se repetem sempre,</p><p>de maneira bastante identica, para poderem se fixar em uma for</p><p>ma rfgida nos tecidos organicos. Ora, a vida humana depende de</p><p>condi\oes rnultiplas, complexas e, consequenremente, ca mbian</p><p>res; e preciso, pa rtanw, que ela pr6pria mude e se modifique</p><p>sem cessa r. Assim, e imposslvel que ela se c ristalize ern uma</p><p>68 Coler;ao Textos Fundantes de Educa ~ao</p><p>forma definida e definiti va. Porem, som ente disposi.;:oes muito</p><p>gera is e vagas, qu e exprimam as caracterfsticas e m comum de</p><p>tOdas as experiencias si ngularcs. pod e m sobreviver e passar de</p><p>lima gerar;ao para a Outra.</p><p>Dizer que as caractcrfsticas inatas sao, em sua maioria, muito</p><p>gerais e 0 mesmo que dizcr que elas sao bastante malcivcis e</p><p>Hexiveis, visto que poucm ser de rerminadas de modos bastante</p><p>diversos. Entre as virwa lidades indecisas que constiwcm 0 ho</p><p>mem no momento em que ele acaba de nascer c a pc rsonalidade</p><p>bastante definida que ele deve modelar para dcscmpenhar lim</p><p>papel util na socicdade, a di stancia e, portanw, imcnsa. E esta</p><p>discancia que a educa~ao deve fazer a crian9a pcrcorrer. Um vas</p><p>to campo est3. abcrto para a sua a\=ao.</p><p>Mas, para exc<.:utar es{a a~ao, sera que da possu i meios com</p><p>energia suficientc?</p><p>Para dar uma ideia do que cons{i{ui a a<,;;8.o cducativa e mos</p><p>trar 0 sell podcr, um psic61ogo comemporanco, Guyau, compa</p><p>rou-a com a sllgcstao hipn6{jca; e a compara~ao nao deixa de (ef</p><p>fundamento.</p><p>De faro, a sllgestao hipn6{ica sup6e as duas seguintes con</p><p>di~oes: 1°) 0 estado ern que se encontra 0 suje ito hipnotizado</p><p>se caracteriza por Slla excepcional passividauc. 0 intelecto fica</p><p>quase que reduzido ao esrado de (abula rasa, lima especie de</p><p>vazio 6 criado na conscicncia, e a vontade sc e ncontra como que</p><p>para lisada. Por <.:onseguime, como ela l1ao se confroma com ne</p><p>nhuma ide ia contraria, a ideia sugerida pode se insta urar com</p><p>o minimo de rcsistcncia. 2°) No entanro, como a vazia nunca e</p><p>complero, e prcciso ninda que a ideia (ire da pr6pria sugestao</p><p>um poder de a'.;8.o especial. Para isso e necessario que a mag</p><p>ner:izador empreguc urn tom de camanda e fale com autorida-</p><p>Educ:a~ao e Soc:iologia 69</p><p>de. Ele deve dizer "Ell quem", indicar que a desobcdiencia nao 6</p><p>oem mesmo concebivel, que a ato deve ser realizado, que a coisa</p><p>deve sec vista do modo cornu ele a mostra c q lie nao pode ser de</p><p>outra forma. Se ele fraquejar, 0 suj<.: ito hesitant, resistira e as vezes</p><p>atc desobedecera. E~ se de come'.;ar a di scutir, 0 seu poel er aca</p><p>bOil. Quantu mais a sugcstao ir contra 0 te rnperamemo natural do</p><p>hipnmizado, mais () tom imperativo sera indispensavel.</p><p>Ora, estas duas condi~6es sao realizadas nas rela~6es que 0</p><p>educador mant6m com a crian\=a subrrle riela a sua a~ao: 1°) A</p><p>crians;a se CIl<.:ontra natural mente e m urn estado de passivida</p><p>de comparavcl com aqueJe no qual 0 hipnotizado se encomra</p><p>artificialmcnre mergulhada. Sua consciencia ainda nao comem</p><p>mais do que um pequeno numero de represema~oes capazes de</p><p>lurar contra as que the sao sugeridas, sua vomade ainda e rudi</p><p>mentar. E por isto que ela e taO facilmente sugestionavel. Pela</p><p>mesma razao, ela e bastante permeavel ao exemplo e a imita9ao.</p><p>2°) A primazia que a professor te rn na{Uralmeme sobre 0 aluno,</p><p>devido a supe rioridade de sua expe rie ncia e cultura, abaswce</p><p>na{uraimenre</p><p>a sua a~ao com a eficacia que the e necessaria.</p><p>A c011lpara~ao da educ3\=ao com a suges{ao hipnotica, c ujo</p><p>pader e nor6rio, mastra 0 quae porenres sao as armas do educa</p><p>dor. Portama, se a a~ao educativa apresenra, embora em menor</p><p>grau, uma eficacia analoga, pode-se alcan~ar grandes resultados,</p><p>contanro que se saiba utiliza-Ia correrameme. Longe de nos</p><p>sen{irmos des motivados face a nossa impo[(~ncia, devemos mais</p><p>C ficar espanrados com a ex{ensao do nosso poder. Se profes</p><p>Sores e pais percebessem, de modo mai s constante, que nada</p><p>aCOmece dianre da crialwa sem deixar algllm vestigia neia, que</p><p>a configura\=ao do seu intelecto e Cafater depende daqllelas mi</p><p>Ihares de as;6czinhas insensfveis que ocarrem a todo instance</p><p>II 70 Co!er;ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>sem chamar a nossa arem;ao em fun~ao de sua aparente insigni</p><p>ficancia, como clcs romariam mais cuidado com a sua linguage m</p><p>e condura! Ccrtameme, a eduCa93.0 naa se mostra encaz quando</p><p>age cum brusquidao e imermitencia. Como diz Herbart, nao e</p><p>admoestando a crian\a com veemencia de vez em quando que</p><p>sc pode provocar grande impactu em sua mente. Parern, quando</p><p>a cducayao se masua pacience e continua e nao busca sucessos</p><p>imcdiatos e aparentes, mas se da calma mente em um sentido</p><p>bern determinado, sem se dcixar desviar por incidentes exte</p><p>riores e circunsrancias fortuitas, cIa dispoe de wdos os melos</p><p>necessarios para marcar as almas profundamente.</p><p>Vemos, ao mesmo tempo, qual e 0 rnecanismo essencial da</p><p>a~ao educativa. 0 que cria a influencia do magnetizador 6 a au</p><p>wridade que ele ohtcm das circunstancias. Por anaiogia, pode</p><p>se dizer desde ja que a cducayao deve ser, em sua essencia, uma</p><p>questao de autoridade. Esta imporrame afirma<;ao rode, alias,</p><p>sel' diretamente estabelecida. De fiHo, ja vimos que a educa~ao</p><p>tem como ohjetivo substiruir 0 sel' individualista c assacial que</p><p>somas ao nascermos por um seT inteiramente novo. Ela deve</p><p>nos conduzir a deixarmos para wis a nossa natureza inicial: esta</p><p>e a condi~au para que a crian~a se torne humem. Ora, s6 pode</p><p>mos nos superar atraves de lim esfor90 mais ou menos cuswso.</p><p>Nada e rao errado e enganador quanto a concep~ao epicurista da</p><p>educa9ao; a concepyao de Momaigne, por exemplo, segundo a</p><p>qual 0 hom em pode se fonnar utilizando como t'lnico estimulo a</p><p>atra9ao do prazer. Embora a vida nao seja sombria e embora afir</p><p>mar artificial mente 0 comrario as crian9as seja urn crime, ela nao</p><p>deixa de ser s6ria e grave, e a educar;ao, que pre para para a vida,</p><p>deve participar desta gravidade. Para aprender a domar 0 seu</p><p>egofsmo natural, subordinar-se a fins mais elevados, submeter</p><p>r</p><p>Educa~ao e Sociologia 71</p><p>os seus desejos ao imperio da sua fon;a de vonrade e conte-los</p><p>dentro de limites scnsatos, 6 preciso que a crianc,;a excrc,;a uma</p><p>forte reprcssao sabre si mcsma. Ora, as duas t'micas razoes que</p><p>fazem com que nos nos coibamos sao a necessidade flsica au 0</p><p>clever moral. Po rem, a crian~a nao sente a necessidade que nos</p><p>impoe fisicamente estes esfor~os, pois nao esra imediatamente</p><p>em contato com as duras realidades da vida, que [Droarn esta</p><p>atitude indispensavel. Ela ainda nao come~ou a Iurar - embo</p><p>ra Spencer 0 tenha aconselhado, nao podemos deixa-Ia exposta</p><p>as severas rea~oes das caisas. E precisa que ela ja esteja, em</p><p>grande pane, formada quando real mente tiver de enfrenta-las.</p><p>Portanto, nao se pode comar com a pressao exercida pela reali</p><p>dade para dererminar a crian~a a ter for~a de vomade e adq uirir</p><p>o autoconrrole necessario.</p><p>Resta 0 dever. Para a crian~a, e inclusive para 0 adulto, e 0</p><p>senti memo do dever que e, por exceiencia, 0 estimulante do</p><p>esfor~o. Por si s6, a amor-pr6prio ja supoe isto, pais, para ser sen</p><p>sfvel as puni90es e recompensas, como se convem, e preciso ter</p><p>consciencia da sua dignidade e, por conseguinte, do seu dever.</p><p>Todavia, a crian~a so aprende 0 dever com os sells professores</p><p>ou pais, s6 podendo saber em que ele consiste pe10 modo como</p><p>estes liltimos 0 revelam atraves da sua linguagem e comporra</p><p>mento. Portanto, e preciso que des encarnem e personifiquem 0</p><p>dever para c ia. lsto significa que a auwridade moral e a principal</p><p>qualidadc do educador, pois 6 atraves desta autoridade contida</p><p>nde que 0 dever c dever. 0 que de possui de completamente</p><p>Jui generis 6 0 tom imperativo com 0 qual se dirige as conscien</p><p>eias, 0 respcito que inspira aDs desejos alheios e com 0 qual as</p><p>subjuga taO logo se pronuncia. Assim, e indispensavel que uma</p><p>impressao do meSffiO genero emane cia pessoa do professor.</p><p>72 Cole~ao Textos Fundantes de Educ3\:ao</p><p>E desnecessario demonstrar que a auwridadc cnrendida des</p><p>[a forma !laO tern nada a ver Com a violencia OU a repressao; ela</p><p>consiste, por inteiro, em uma certa prima zia moral. Ela sup5e</p><p>que 0 professor respcitc duas principais condi90es. Ele deve</p><p>primeiro ter dcrcrmina'rao, pois a autoridade implica a confian-</p><p>9a, e a crian9a nao cantia e m ninguem que hesite, tergiverse e</p><p>volte atras a rcspcito de suas decisoes. Mas esta primeira condi-</p><p>9ao nao c a mais essencial. 0 mais importance e que 0 professor</p><p>realmcntc sima dentra de si a auwridade, cujo semimento etc</p><p>deve transmirir. Ela cOl1stirui uma fOf9a que ele 56 pode man i</p><p>festar sc cfctivamente a possuir. Mas, afinal, de onde cia vern?</p><p>Sera que 6 do pod er material do qual esta munido? Sera que e</p><p>do d irc ito que eJe tern de punir e recompensar? Mas 0 medo do</p><p>castigo 6 algo muito diferente do respeito da autoridade. Elc</p><p>s6 possui valor moral se 0 castigo for reconhecido como justo</p><p>pclo individuo que 0 recebe, 0 que implica que a autoridadc</p><p>quc pune ja tenha sido reconhecida como legitima. A questao 6</p><p>justamcnte esta. Nao e de fora que 0 professor pode adquirir a</p><p>sua autoridade, ma s sim de si mesmo; ela s6 pode ter o rigem em</p><p>uma f6 interior. Ele deve crer, sem duvida, nao em si mesmo Oll</p><p>nas qualidades superiores de sua inteligencia ou cora9iio, mas</p><p>sim na sua tarefa e na grandeza da mesma. 0 que constr6i a au</p><p>tori dade que impregna rao facilmente a palavra do eclesiistico 6</p><p>a e levada ideia que eJe nuue a respeito de sua missao, pois cle</p><p>fala em nome de um Ueus do qual ele se senre mais pr6ximo</p><p>do que a multidao dos profanos. 0 professor laico pode e deve</p><p>alimcntar urn pouco deste sentimento. Ele tambcm constitui 0</p><p>6rgao de uma grande entidade moral que pertence a urn nfvcl</p><p>superior: a soeiedade. Assim como 0 padre e 0 imerprete do sell</p><p>Deus, cle c, por sua vez, 0 interprete das grandes ideias morais</p><p>Educar;ao e Sociologia 73</p><p>da sua epoca e naC;ao. Sc cle for apegado a estas ideias e sentir</p><p>toda a grandeza das mesmas, a auwridade que elas revestern e</p><p>da qual ele esta ciente nao pode deixar de se manifestar em sua</p><p>pessoa e em tudo 0 que emana dela. Em uma autoridade oriun </p><p>da de uma fome rao impessoal qUJllto esea nao pode entrar nem</p><p>orgulho, nem vaidade e nem pedantismo. Ela e inteirameme</p><p>consriwfda pelo respeito que ele nutre com relagao as suas fun</p><p>~6es e, se podemos falar assim, ao sell minist6rio. E este respei</p><p>to que, atrav6s oa palavra e da linguagern. gestual, c transmitido</p><p>da sua consci6ncia para a da crian9a.</p><p>]a se opuseram a liberdade e a autoridade, como se estes dois</p><p>fatores da educa9ao se contradissessem e se restringisscm. Mas</p><p>esra oposi.yao e uma falacia. Na verdade, la nge de se excJuir~m.</p><p>estes dais term os sao complememares. A liberdade 6 filha dOl</p><p>autoridade bem aplicada, pois ser livre nao significa fazer {) que</p><p>bem entende r, n1as sim ter autocontrole e saber agir guiado pcb</p><p>razao e cumprir 0 seu dever. Ora, a autoridade do professor, que</p><p>e apenas um aspecto da autoridade do clever e da razao, deve ser</p><p>empregada jusramenre para dmar a crianc;a deste autocontrole.</p><p>A criam;a deve, portanto, estar acostumada a reconhecer a a uto</p><p>ridade na palavra do educador e a respeitar a sua superioridaoc.</p><p>Esta e a condic;ao para que mais tarde ela</p><p>a reencontre e m sua</p><p>Consciencia e acare 0 que ela prescrcver.</p><p>2</p><p>NATUREZA E METODO</p><p>DA PEDAGOG lA</p><p>M ui tas vezes se confunde educagao e pedagogia, rerrnas que</p><p>no en tanto pedem para ser cuidadosamente diferenciados.</p><p>A educayao e a a930 exercida nas criaor;as pelos pais e pro</p><p>fessores. Esta 3yaO e constante e geral. Naa ha nenhum perfodo</p><p>na vida social e oem mesmo, por assim dizer, nenhum momento</p><p>do dia em que as novas gerayoes nao estejam em contato com os</p><p>mais velhos e, por conseguinre, nao receham a influencia cdu</p><p>c3dora destes ultimos. Isto porq ue esta influencia oao 6 scntida</p><p>som ente nos instantes bastante curtos em que os pais ou profcs</p><p>sores compartilham, de modo conscienre c atravcs de urn cnsi</p><p>no propriamentc diw, os resultados de suas cxpericncias com</p><p>aqueles que nasceram Gepois dcles. Existc LIma educayao in</p><p>consciente c inccssante. Atravcs do nosso exemplo, das palavras</p><p>que dizemos c dos aws que executamos, fabricamos a alma dos</p><p>nossos fi ihos de modo constante.</p><p>A Pedagogia e algo completamente diferente. Ela consisre</p><p>nao em a~ao, mas sim em reorias. ES(as reorias expiiciram as</p><p>tnanciras de conceber a educa9ao, e nao de prarica-Ia. Elas se</p><p>disringucm as vezes das praricas vi genres a ponro de se oporem</p><p>a elas. As pedagogias de Rabeiais, de Rousseau ou de Pes(a</p><p>lozzi se enconrram en1 oposi9ao com a educa9ao de suas epocas.</p><p>POrtanro, a cducayao consrirui apenas a modalidadc pratica da</p><p>76 Co ler;ao Textos Fundantes de Educa\ilo</p><p>Pedagogia, que, par sua vez, consistc em uma cerra maneira de</p><p>refletir sobre as qucstocs rclativas a edllCat;ao.</p><p>E 0 que fa z Com que a Pedagogia, pelo menos no passado,</p><p>seja intcrmircmc, ao passo que a educa(:3o e continua. Existem</p><p>povos que nao tiveram uma Pedagogia propriameme dita; al ias,</p><p>csta (iltima surge apenas em uma epoca relativamentc adia ntada</p><p>da hist6ria. Ela e encontrada na Grecia somemc dcpois ua cpoea</p><p>de Pericles, com PlacITo, Xenofonte e Arisr()rclcs. Ela quase nao</p><p>existiu em Roma. Nas sociedades crisras, c ia 56 produziu obras</p><p>imporrantes no seculu XVI, e 0 progrcsso que ela entaD seguiu se</p><p>desacelerou no seculo seguinre, s6 rctomando 0 sell vigor ao lon</p><p>go do XVIII. Isto ocorrcu porquc 0 homem nao reflete a tempo</p><p>inteiro, mas sumentc quando 6 necessaria, e parque as condi~6es</p><p>da reflexao nao cstao dadas em [OdD lugar e mome nta.</p><p>Sendo assirn, c prcciso que busquemos saber quais sao as carac</p><p>terfsticas da reflexao pedag6gica e os seus efeiros. Sera que se deve</p><p>considera-Ia como urn conjllnto de douuinas propria mente cientffi</p><p>C"dS e dizcrque a Pcdagogia e uma ciencia, a ciencia da educa~ao? Ou</p><p>sera que conv6m dar-Ihe urn outro norne? Neste casa, que nome? A</p><p>natureza do mc[Odo pedag6gico sera compreendida de modo bas</p><p>tante diferente can forme a resposta dada a esta pergLlnta.</p><p>T</p><p>Primeiro, e tacil demonstrar que as coisas da educac;ao, eon</p><p>sid eradas de lim certo POnto de vista, possam ser 0 objcto de</p><p>uma di seiplina que apresema todas as caracterfsticas das outras</p><p>disci plinas eie nt/fieas.</p><p>De faw, para que possamos chamar de ciencia um conjunto</p><p>de estudos, e preciso e basta que e1as possuam as seguimcs ca</p><p>raetcristicas:</p><p>Educar;ao e Socioiog ia 77</p><p>1°) Elas devem aborda r faws conclu fdos, realizados e pron</p><p>toS para a observa~ao. Afinal, uma e iencia sc define pdo seu</p><p>objcto de escudo e, conseq uenremenre, sup6e que cstc objew</p><p>exista, possa ser apomado com precisao e localizado denno do</p><p>conjunto da real idade.</p><p>ZO) Estes faws uevem apresemar uma harnogeneidade Sll</p><p>ficicnte entre si para rodcrcm ser c1assificados em uma 111esma</p><p>caregoria. Se eles fossem irrcdutfvcis uns aos outros, haveria nao</p><p>uma ciencia, mas sim tantas cicncias quanto especies distinras</p><p>de objetos de esrudo. Muitas vczcs acontece de as ciencias nas</p><p>centes envolverem de modo basta ntc confuso uma pluralidade</p><p>de objetos diferentes. Foi a caso, par exemplo, da Geografia, da</p><p>Amropologia, etc. Mas esta sempre e apenas uma fase rransiro</p><p>ria do desenvolvimemo das ciencias.</p><p>3°) Pur fim, a ciencia estucla esres fatos para conhcce-los, c so</p><p>mente para isto, de maneira absol utamente desinrercssada. Em</p><p>pregamos de prop6siw aqui a palavra c01JheCel~ que e meio geral</p><p>e vaga, scm deixar claro em que pode consistir 0 conhecimento</p><p>dito cientifico. Dc faro, pouco importa se a sabia prefere con5ti</p><p>tuir tipos em vez de descobrir leis, contentar-se em descreve r ou</p><p>(emar explicar. A ci€:ncia come~a a partir do momenta em que 0</p><p>saber, seja elc qual for, 6 buscadu por si s6. Scm duvida, a sabia</p><p>eSta pcrfeitamentc cicnte cia probabilidade de as suas descobe r</p><p>tas serem lJtilizadas mais tarde. Pode ate acamecer de ele privi</p><p>legiar tal au tal ponto de :mas pcsquisas ao pressentir que assin1</p><p>elas serao mais provc itosas c pcrmitirao satisfazer necessidades</p><p>llrgentcs. Parem, enquanto cstiver mergulhado na investiga9ao</p><p>cienrffica, e le ficad indiferemc com rela~ao as consequencias</p><p>praticas. Ele diz 0 que 6, constata 0 que as caisas sao e se con</p><p>tenta com isto. Ele nao se prcocupa em saber se as verdades que</p><p>78 Colet;ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>descobre agradarao OU desconcertarao os outros, se seria me lhor</p><p>que as rcJa~Ocs que ele estabelece permanccesscm 0 que sao ou</p><p>fossem difcrentes. 0 seu papel consis[c e m exprimir 0 real, e nao</p><p>em julga-Io.</p><p>Senda assim, nao h<i motivo para qu e a ed uca9ao nau se rorne</p><p>o objeto de lim escudo que saEi sfaya todas estas condis:ocs c, por</p><p>conseguime, apresente rod as as caracteristicas de uma cicnci a.</p><p>De liuo, a ed uC'd9ao vigente em dcterminada socicuade e COI1-</p><p>siderada em determinado momento de sua evo]u<;ao 6 urn conjun</p><p>[Q de pnhicas, manciras de agir e costumes que constiwcm faws</p><p>perfeiramcmc ucfinidos e taO ceais quanto os outrOS faws socia is.</p><p>Estas pnhicas nao sao, como se acreditou durante muiw tempo,</p><p>combinagoes mais ou menos arbitrarias e artificia is cuja existencia</p><p>clecorre apenas cia temperamental inftuencia de desejos geralmen</p><p>te fort uitos. E las sao, ao contnlrio, verdadc iras instiwi90es sociais.</p><p>Nao existc hom em que possa fazer com qlle lima sociedade (enh'l,</p><p>em detcrminado mornenro, urn siste ma de cduca~ao diferenre da</p><p>quelc que cs ta contido em sua cstrutura, be m como e imposslve!</p><p>que urn organislno vivo tenha 6rgaos e fun c;oes dife rentes claq ue</p><p>les que estao encerrados em sua constitllic;ao. Se torem necessa</p><p>rias outras razoes alem das que ji foram dadas para fun damentar</p><p>esta concepyao, basta tamar consciencia da fon;a imperativa com</p><p>a qual esras pra.ticas se impoem a n6s. Nao adiama acreditar que</p><p>pode mos educar os nossos fi lhos como quisermos. Somos forc;a</p><p>dos a seguir as regras reinantcs no meio social em que vivcmos. A</p><p>opiniao nos impoe este comporrame nro, e a opiniao 6 Llma forc;a</p><p>moral cujo poder opressivo nao 6 me nor do que 0 da forc;a nsica.</p><p>Sua autoridade impregna usns que, par isto mesmo, sao em larga</p><p>medida excluidos cia a93.0 clos indivfduos. Podemos at6 infringir as</p><p>for<;'as morais, mas e1a5 ac-abarao rcagindo conua n65. E, pur causa</p><p>r</p><p>Educac;ao e Sociologia 79</p><p>da superioridade delas, dificilrnente sairemos vencedores. Logo,</p><p>podemos ate nos revolrar contra as for\=as materia is das quais de</p><p>pendemos e tentar viver de modo diferente daquele dererminado</p><p>pela natureza do nosso meio fisico, mas entaO a morte au a do</p><p>cn~ acabam sendo a san9ao da nossa revolra. Oa mesma forma,</p><p>cstamos mergulhados em uma atmosfera de ideias e senti men</p><p>toS coletivos que nos nao podemos modificar a vontauc. E 6 em</p><p>ideias e sentimentos dcste gencro que as praticas educativas se</p><p>baseiam. Portanto, clas sao coisas distintas de n6s, ja que rcsistcm</p><p>a nossa vOl1tade, realidadcs que tcm uma natureza pr6pria, defini</p><p>da e complc ta que sc imp6e a n6s. Pa r consegui nte, pode ser born</p><p>observa-la, buscar conhecc-Ia somente para conhece-la. Alem dis</p><p>so, as priticas educativas, sejam elas quais</p><p>forem e tendo as dife</p><p>rcm;as que tivere m, te m e m cornum um aspecto essencial: tOdas</p><p>elas resultam da a\=ao exercida por uma gera\=aa sabre a gera~ao</p><p>seguinte no imuito de adaprar a mesma ao meio social no qual esta</p><p>desti nada a viver. Porra nco, tOdas elas sao modalidades diversas</p><p>desra rela9ao fu ndamenta l. Consequenternente, elas consriruem</p><p>faws de uma mesma especie, pertencendo a LIma mesma catego</p><p>ria l6gica. Elas podem emao servir de objeto a uma unica e mesma</p><p>ciencia: a ciencia cia educa\=ao.</p><p>Vamos apamar desde ja, apenas para tafI1ar as icleias mais</p><p>clams, alguns dos principais proble mas dos q uais esra cie ncia</p><p>cleve trarar.</p><p>As praticas educarivas nao SaO ratoS isolados uns dos outros.</p><p>PunSm, para uma mesma socieclade, elas esrao ligadas em urn mes</p><p>mo sisrema do qual todas as partes conrribuem para UTml mesma</p><p>finalidade: 6 a sistema de ed ucagao proprio daquele pais e daque</p><p>la epoca. Caela povo rem 0 seu, assim como tern 0 se ll sistema</p><p>moral , religioso, economica, erc. Mas, por ourro lado, povos da</p><p>80 Cole~ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>mesma espeCle, Oll seja, povos que se parecem em [U119ao de</p><p>aspectos essenciais de sua constitui<;ao, devem praticar sistemas</p><p>de educa<;ao comparaveis entre si. As semelhan<;;as que a sua orga</p><p>nizar;ao geml apresenta devem necessariamente acarretar outras,</p><p>igualmente imponantes, em sua organizar;ao educativa. Por COll</p><p>seguime, comparando, identificando os paralelismos e eliminando</p><p>as diferenr;as, decerto se pode constituir as tipos genericos de edu</p><p>C3r;ao q lie correspondem as diferentes especies de socicdade. Por</p><p>exemplo, no regime de trioo, a caracterfstica principal cia cuucac;ao</p><p>e ser difusa, dada scm distinc;ao pOf todos os mcmbros do cia. Nao</p><p>h3. profcssores design ados c nem supcrvisorcs cspeciais encar</p><p>regados de formar os jovcns. Sao wdos os anciaos, e 0 conjunto</p><p>das geras;ocs antcriores que desempenha esce papel. No maximo</p><p>aeonteee de ccrtos anciaos sercm designados em especial para mi</p><p>nistrar cerms ensinos fundamentais. Em outras sociedades, mais</p><p>avans;adas, esta difusao acaba ou, pelo menos, atenua-se. A edu</p><p>caS;ao sc conccnt.ra nas maos de funcionarios especiais. Na India e</p><p>no Egiro, sao os sacerdotes que sao responsaveis por esta funyao.</p><p>A educac;ao 6 urn atributo do poder sacerdotal. Ora, esta primeira</p><p>caracterfstica diferencial provoca outras. Quando, em vez de per</p><p>manecer completarnente difusa assim como em suas origens, a</p><p>vida religiosa cria para si mesma urn orgao especial encarregado de</p><p>dirigi-la e administra-la, ou seja, quando se forma uma classe ou</p><p>casta sacerdotal, 0 que a religiao tem de propria mente reflexivo e</p><p>intelecrual alcanya um desenvolvimenro ate entao desconhecido.</p><p>Foi nos meios sacerdotais que apareceram os primeiros prodro</p><p>mos, as form as primarias e rudimenrares da ciencia: Astronomia,</p><p>Matematica, Cosmologia. E um faro que Comte observara havia</p><p>muito tempo e que e facilmente explicavel. E bastante natural</p><p>que uma organizac;ao cujo efeiro e concentrar em um grupo restriro</p><p>Educa~ao e Socio logia 81</p><p>wda a vida meditativa que entao existe estimule e desenvolva esta</p><p>ultima. Logo, a ed ucayao nao mais se limita, como no prindpio, a</p><p>inculcar praticas na crianya e condiciona-la a cenas maneiras de</p><p>agir. Cria-se entao conteudo suficiente para uma certa instruyao.</p><p>o sacerdote cnsina os elementos desras ciencias que se estaO for</p><p>mando. S6 que esta instruyao e estes conhecimemos especulati</p><p>vos nao sao ensinados por ensinar, mas sim por causa das relayoes</p><p>que des entretem com as crenyas religiosas. Eles of ere cern urn</p><p>carater sagrado c sao plenos de elementos propriarnentc religiosos</p><p>porque se formaram no pr()prio seio da rciigiao, sendo assim inse</p><p>paniveis da mesma. ~ Em outros lugarcs, como, pot exemplo, nas</p><p>polis gregas e latinas, a educac;;ao fica dividida numa propon;;ao,</p><p>variavel conforme as polis, entre 0 Estado e a familia. Nada de</p><p>casta sacerdocal. E 0 Esrado que substirui a vida rcligiosa. Logo,</p><p>visto que ele 11aO priviJegia a medicac;ao, mas sim a a<;;ao e a pratica,</p><p>e fora dele e, consequentemente, fora da religiao quc a cicncia</p><p>nasce quando surge a necessidade. Os filosofos e sibios da Grecia</p><p>sao sujeitos laicos. A propria ciencia adquire entao rapidamentc</p><p>uma tendencia antirreligiosa. Do pomo de vista que nos imercssa,</p><p>o resultado e que a insrruyao tambem adquire urn cararer laico e</p><p>privado assim que surge. 0 grammateus de Arenas era UlTI simples</p><p>cidadao, sem ligayoes oficiais ou cararer religioso.</p><p>E iUlltil continuar com os exemplos, cujo interesse e apenas</p><p>ilusrrativo. Bastam os citados acima para mostrar como, ao corn</p><p>parar sociedades da mesma especie, poderfamos consriwir ripos</p><p>de educa~ao, assim como constirufmos ripos de famflia, Estado</p><p>ou rcligiao. Alias, esta classificayao nao resolveria todos os pro</p><p>blemas cienrfficos que podem se impor a respeiro da educayao;</p><p>cIa so fornece os elementos necessarios para resolver lIrn Olltro</p><p>problema rnais importante. Uma vez os tipos estabelecidos,</p><p>82 Cole~ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>seria preciso ex plica-los, ou scja, bllscar as condi90es das quai s</p><p>dependem as propricdadcs caractcristicas de cada LIm deles e</p><p>como \Ins dcram origem aos outras. Seriam obtidas assim as leis</p><p>q1lC dominam a cvolu<;ao dos sistemas de edllca~ao. Poderia</p><p>mos cntao perceber e m que diretyao a educa.yao se desenvolveu,</p><p>quai s sao as causas que deteflninaram este desenvolvimento e</p><p>que 0 explicam, questao cerrarnente bastame re6rica, mas cuja</p><p>soiuttao, visivelmente, reria ITIUit3S aplica.yoes priiticas.</p><p>Eis desde ja urn vasto campo de estudos aherto a pesquisa</p><p>ciendfica. E, no entanto, <linda existem outros problemas que</p><p>poderiam sec abordados com 0 mesmu espfrito. Tudo () que aca</p><p>bamos de ver diz respeito ao passadu; tais pcsqui sas nos ajuda</p><p>riam a entender de que man~ira as nossas i nst itUi~oes pedag6-</p><p>gicas se consritufram. Mas elas podem ser considcradas de um</p><p>Outro POntO de vista. Uma vcz form ad as, elas rea l me nte funeio</p><p>nam, e poderfamos cstudar de que mancira elas funcionam, au</p><p>seja, que resultados e1as produzem e que condi90es fazem estes</p><p>resultados varia rem. Para ism, seria preciso lima boa esrarisrica es</p><p>colar. Em coda cscola h<i uma disciplina e urn sistema de puni.;6es</p><p>e recompcnsas. 0 quao imeressame seria saber, nao somente a</p><p>partir de impress6es empfricas, mas tambe m de obseJvac;6es me</p><p>t()dicas, de que modo este sistema funciona nas dife rentes escolas</p><p>de uma mcsma localidade, nas diferentes regi6es, nos diferemes</p><p>momc ntos do anD, nos diferemes momemos do dia; quais sao os</p><p>dcl iws escolares mais freq ue nres; como sua propon;ao varia no</p><p>conjunw do terrir6rio Oll conforme os paises; como ela depende</p><p>da id adc da crian.;a, da sua siruar;ao familiar, etc.! Todas as ques</p><p>toes <lue se colocam com relayao aos delitos cia adulto podem</p><p>ser colocadas aqui de forma igualmente uti!. Assim como existe</p><p>uma criminologia do homern feito, existe uma da criam;a. E a</p><p>Educa~ao e Sociologia 83</p><p>disciplina nao e a unica institu ityao educativa que poderia sec es</p><p>tudada seguindo estc metoda. Nao hi metoda pedag6gico cujos</p><p>efeitos nao possam ser medidos da mesma maneira, suponuo</p><p>evidentcmente que tenha sido instaurado 0 instrumento neces</p><p>saria para tal escudo: uma boa estatistica.</p><p>II</p><p>Vimos, porranto, dais grupos de probl emas cujo carater pu</p><p>ramente cienrffico nao pode ser eontestado. Uns sao re larivos a</p><p>genese, e as ourfOS, ao funcionamcnro dos sistemas de educa</p><p>C;30. Em todos as estudos, trata-se simpl esmente de descrever</p><p>coisas presentes ou passadas ou e ntaD de buscar as causas ou</p><p>efeiros das mesmas. Elas constiruem uma ciencia: isro e 0 que</p><p>e, ou melhor, 0 que scria a Cicncia da Educac;ao.</p><p>Porem, 0 pr6prio CSbOS;:0 que acabamos cle tra~ar demonstra</p><p>claramente que as teorias consid eradas como pedag6gicas con</p><p>sisrem em reftcxoes</p><p>muito difere nres. D e fata, elas nem bus</p><p>cam 0 mesmo objctiva e ne m empregam os mesmos mewdos.</p><p>o seu ubjctivo nao 6 descrever all explicar 0 que existe ou 0 que</p><p>existiu, mas sim dererminar 0 qu e deve existir, como deve ser.</p><p>Rlas nao sc orienran1 nem para 0 presenre e nem para a passa</p><p>do, mas sim para 0 futuro, nao se prop6em exprimir fidm~nte</p><p>realidadcs ja dadas, mas sim decretar preceitos de conduta. Elas</p><p>nao dizcm: cis 0 que existe e 0 porque disto, mas si m eis 0 que</p><p>deve ser fe ito. E rem mais: geral mente, quando as te6ricos da</p><p>ecluca~ao falam das pdticas tradicionais do presente e do pas~</p><p>sad 0, e com um desprezo quase que sisrematico. Eles apontam</p><p>sobrcrudo as imperfeic;6es das mes mas. Quase todos os grandcs</p><p>pedagogos, como llabelais, Montaigne, Rousseau e Pestalozzi,</p><p>Sao espfritos rcvolucionarios e revolrados contra os usos dos seus</p><p>84 Co lec;ao Textos Fu ndantes de Educa~ao</p><p>contemporancos. E lts s6 mencionam os sistemas antigos ou vi</p><p>gentes para conucna-loN e declarar que sao infundados. fazendo</p><p>mais a u me nos tabula rasa destes sistemas e construi ndo algo</p><p>inreiramente novo no lugar GOS mesmos.</p><p>Partama, para entender bern c enconuar urn eq uilibria, e preciso</p><p>distinguir cuidadosame nte dais tipos de rdlexoes bastante diferen</p><p>tes. A Pedagogia e alga discinto cia Ciencia ua Educa9ao. Mas entaD</p><p>o que ela 6? Para fazer uma escolha bern fundada nao basta saber</p><p>aqui lo que cia nao e, mas e preciso apontar em que cia cOl1siste.</p><p>Pod cmos dizer que e uma acte? Pareee que sim, pais no1'</p><p>mal me nte nau se ve intermediario entre estes doi s extremos,</p><p>e atribui-sc () tc rmo "<.trte" a todo prod uw de uma reft cxao que</p><p>nao e ei6ncia. Pore m, isto significa estender 0 senti do da palavra</p><p>"arre" a ponto dc incl uir nele coisas muiro dife renres.</p><p>De faro, tambc m chamarnos de arre a experiencia pratica ad</p><p>qu irida pelo professor em contato com crian~a s e no exerdcio oa</p><p>sua profissao. Ora, csca expcrieneia e mani fesra rr'leme alga muito</p><p>difereme das teorias do pedagogo. Um raw de obselva.yao corrente</p><p>faz com que esra difercn~a seja bem perceptivel. Pode-se, ao mes</p><p>rno tempo, ser um professor perfeito, mas completamente inca pa7.</p><p>de proeeder as reft exoes da Pedagogia. 0 rneStle habil sabe tazer</p><p>o que e preciso fazcr, mas nem sempre consegue dizer as raZQes</p><p>que justi ficam as proccdimentos que emprega. 0 pedagogo, por</p><p>sua vez, pode carecer de qualqllcr habilidade pratica; n6s naa da</p><p>rfamos uma turma nas maos de Rousseau e nem de Montaigne.</p><p>E meSlllo de Pestalazzi. que era urn homem do meliel; mas que</p><p>devia possuir de modo apenas incompleto a arre do educador,</p><p>cornu prova m os sells repetidos fracassos. A Illesma confUS30 e</p><p>[c ita e rn outras csfcras. C hama-sc de aete 0 savoir-failT do homem</p><p>de Estaclo, expert na adminjstra~ao publica. Porem, camber'll se diz</p><p>r</p><p>Educa~ao e Sociologia 85</p><p>que os cscritos de Plat~i.<), Arist6tcles c Rousseau sao tratadns em</p><p>arte polftica; c 6 6bvio que naa se pode considera- Ios como obras</p><p>realmcme cie ndficas, vistO que elas nao tern por objetivo estudar 0</p><p>real, mas sim construi r um ideal. E, conwdo, hi lim abismo entre</p><p>o pensamemo que de u origem a um livro como Do contra/o social e</p><p>aquele que edifica a administra.yao do Esrado: Rousseau provavel</p><p>mente teria sido pessimo ranto como ministfo quanta como edllca</p><p>dor. 'TIlmbem e par isro que os melhores te6ricos da Medicina nao</p><p>sao os melhores medicos, lange disto.</p><p>Portanw, e melhor naa des ignar com a mesma palavra duas</p><p>form as de atividade tao diferentes. Acreditamos que e preciso</p><p>reservar 0 termo "arte" para tudo aquilo que e prat ica pura sem</p><p>tcoria. Todo mundo e ntc ndc Cste termo quando d e se re fere</p><p>a arte do sold ado, a do advogado e a do professor. lIma arte e</p><p>urn sistema de mane iras de agir adeq uadas a fi ns espcciais e</p><p>rcsuitan tes Oll de urna expe ric ncia tradieiona l transmitida pcJa</p><p>edueat;ao ou cia experic ncia pessoaJ do indivfduo. S6 sc pode</p><p>adquiri-Ias mexendo com as coi sas sobre as quais a a9::10 deve sec</p><p>exercida e agindo por si mes mo. Se m dllvida, pode aconteeer de</p><p>a arte sel' guiada peia refi exaa, mas a reft exao nao e urn e le me n</p><p>to essencial da arte, vis to que ela pode existir sem esta ult ima. E</p><p>mais: nao existe nenhuma arte em que tuda seja reftetido.</p><p>Porem, entre a arte ass im definida e a ciencia p ropria mente</p><p>dita, hi Iugar para uma 3tirude mental intermediiria. Em vez de</p><p>agir sabre as coisas au os seres seguindo determinados mod as,</p><p>pode-se refletir sobre as processos de a930 assim e mpregados,</p><p>nao no intuito de conhece-Ios e explici -Ios, mas sim de esti</p><p>mar 0 valor deles. descobrir se eles sao 0 que devem ser, se nao</p><p>seria util modifica-Ios e de que maneira, inclusive substitu f-Ios</p><p>totaimenre por novas processos. Estas reft exoes tomam forma de</p><p>86 CoJe<;:ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>tcorias; sao combina9oes de ideias, e nao de atos, aproxirnando-se</p><p>assi m cia ciencia. Comucio, as ideias combinadas deste modo naD</p><p>tern por objetivo cxprcssar a natureza das caisas ja dadas, mas</p><p>si m dirigir a ac;ao. Elas nao consistcm em movimemos, mas estao</p><p>bem pr6ximas do rnovime nto que devcm orientar. Emhora nau</p><p>sejam ac;oes, elas sao pelo menos programas de ac;ao c, por isto,</p><p>aproximam-se cia arte. Alguns exemplos sao as [Corias m6dicas,</p><p>politicas, estrategicas, etc. Para exprimir 0 carater misto dcstGs ri </p><p>pas de refiexao, vamos chama-las de teorias pdticas. A Pcdagogia</p><p>e uma [eoria pratica deste genero. Ela nao estuda cientificameme</p><p>os siswmas de educas:ao, mas reflete sabre eles no intuito de for</p><p>necer a atividade do educador ideias que 0 dirigem.</p><p>III</p><p>Porcm, a Pcdagogia vis ta desta forma esta sUJe lta a uma</p><p>objq:ao cuja gravidadc nau pode ser omitida. Sem duvida, vao</p><p>dizcr. uma (Coria pratica e pusslvel e legltima quando ela pod e</p><p>se apoiar em uma cie ncia constitufda e incontestavel da qual</p><p>ela consdtui apenas a aplicac;ao. Neste caso, de fatD, as n090es</p><p>te6ricas das quais sc deduzcm as consequeneias p[(:!.tieas pos</p><p>suem um valor cicntffico que impregna as conclusOes oriundas</p><p>delas. E assim que a Quimica Aplicada e uma teoria pn.hica que</p><p>nao passa da implel1"'1enta9ao das tcorias da Qufmiea pura. Mas</p><p>o valor de llma teoria pradea dependc do das ciencias eujus no-</p><p>90es fundamentais ela toma cmprestado. Ora, em que ci&ncias</p><p>a Pedagogia pode se apoiar? Prim e iro na Ciencia da Educac;au,</p><p>pois, para sa be r 0 que a ed ucayao deve ser, antes de tudo seria</p><p>preciso saber qual e a natureza dela, as diversas condi9ucs das</p><p>quais ela dcpcnde e as le is que guiaram a sua evoluC;lio atravcs</p><p>da hist6ria. Contudo, a Ciencia da Educac;lio existe sumeme em</p><p>r</p><p>Educa~ao e Socioiogia 87</p><p>esrado embrionario. Restam, de urn lado, os outros ramos da</p><p>Socioiogia, que poderiam ajudar a Pedagogia a fixar 0 objetivo</p><p>da educav3.o com a orientac;ao geral dos metodos, e, de DUtro, a</p><p>Psicologia, cujas li90es poderiam ser bastante (lteis para a deter</p><p>mina9ao detalhada dos procedimentos pedag6gicos. Mas a 50-</p><p>ciologia e uma cicncia ai nda emergente, dispondo so mente de</p><p>poucas proposi~6cs estabelecidas, se c que dispoe realmente.</p><p>A propria Psicologia, embora se tenha constiwido mais cedo du</p><p>que as cieneias sociai s, provoca todo tipo de conuoversias: nao</p><p>hi questocs psicol6gicas em torno das quais ainda nao se defen</p><p>dam as teses mais opostas possivcis. Sendo assim, qual 0 valor</p><p>de conclusoes praticas com base em dados cientfficos ao mcsmo</p><p>tempo tao incerros e incomplctos? Qual 0 valor de uma rcftexao</p><p>pedag6gica que careee de qllalquer base au cujas bases, quando</p><p>nao cstao wtalmente ausentcs, carecem tanto de solidez?</p><p>o faw que invocamos assim para nega r qualquer autoridadea</p><p>Pedagogia e, em si mesmo, incontestavel. E 6bvio que a Cicncia</p><p>da Educ39ao resta a ser feita por inteiro e que a Socio[ogia, bern</p><p>Como a Psicologia, ainda cstao bem POllCO adiamadas. Portanto,</p><p>se</p><p>da problematica educa</p><p>cional, dada a intima vinculavao entre a educayao e as cicncias</p><p>humanas em geral.</p><p>AtJtotJio J. Severino</p><p>Coordenador da cole,ao</p><p>INTRODUC;:AO</p><p>A OBRA PEDAGOG1CA</p><p>DE DURKHE1M</p><p>Ao longo de sua vida, Uurkheim ensinou a Pedagogia e a</p><p>Sociologia ao mesmo tempo. Na Faculdade de Letras de Bor</p><p>deaux, de 1887 a 1902, ele ministrou uma hora de aula de Peda</p><p>gogia par semana. Os ouvintes eram, em sua maioria, rnembros</p><p>do Ensino Primario. Na Sorbonne, foi na cadeira de Ciencia da</p><p>Educor/io que, em 1902, ele supriu a vaga de Ferdinand Buis</p><p>son, a qual de passou a ocupar definitivamente a partir de 1906.</p><p>Ate a sua morte, de reservou a Pedagogia pclo menos urn terc;o,</p><p>e muitas vezes dois terc;os, dessas aulas: sess5es pllblicas, con</p><p>ferencias para os membros do Ensino Primario, curso para os</p><p>alunos da Escola Normal Superior. Esta obra pedag6gica pcr</p><p>maneee quase toda inedita. Scm duvida, nenhum dos seus ou</p><p>vintes conseguiu abranger toda a sua extensao. Gostarfamos de</p><p>apresenta-Ia aqui brevemente.</p><p>I</p><p>Durkheim nao dividiu 0 seu tempo e nem 0 seu pensamen</p><p>to entre duas atividades distintas, ligadas uma a outra de modo</p><p>acid ental. E pelo seu aspecro de faro social que ele aborda a</p><p>educa930: sua doutrina da educavao e urn elemenro esseneial de</p><p>sua Sociologia. "Soci6Jogo, [diz eIe,] e sobretudo enquanro soci6-</p><p>logo que falarei a voces sobre educac;ao. Alias, nao acredito me</p><p>10 Coler;ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>expor aver e mostrar as cai sas por lima perspecriva deformadora</p><p>ao proceder assirn, pais tenho certeza de que, ao cOI1mirio, nao</p><p>existe metodo mais apto a ressaltar a verdadeira natureza das</p><p>caisas" (p. 98), A educac;ao e alga eminentemente social.</p><p>A observac;ao pode prova-lo. Antes de tuda, em toda socie</p><p>dade, ha tantas ed uca90es especfficas quanto meios sociais di</p><p>ferentes. E, mesmo em sociedades igualinirias Como as nossas,</p><p>q ue rendem a e liminar as dife renc;as inj ustas. a cducac;ao va</p><p>ria , e deve nec~ssariamen[e variar, de acordo com as profissocs.</p><p>Scm duvida, wdas cstas cducalYocs cspccificas repOlIsam sabre</p><p>uma hase comum. Porcm, csta cducac;ao comu m varia de lima</p><p>sociedade para ourra. Cada soci cdade alime nca urn ceno ideal</p><p>humano. E esre idea l "que e 0 polo da eduea,ao" (p. 53). Para</p><p>caua socicuade, a ed ucar;ao e "a rn e ia pelo qual ela prepara na</p><p>cora~ao das criant;as as condiGoes essenciais de sua pr6pria exis</p><p>tcncia". Assim, "cada tipo de povo possui uma educas;ao que Ihe</p><p>6 propria e que pade detini-Io ao mesmo tI[U lo que a sua organi-</p><p>7.a,ao moral, politica e rel igiosa" (p. 104). A observa,ao dos btos</p><p>cond uz, portanw, a seguinre definis;ao: "A educas;ao e a a~aa</p><p>exercida pelas geras;:oes adul tas sobre aquelas que ainda nao es</p><p>tao ITIa[Uras para a vida social. Ela rem coma abjetivo suscitar</p><p>e desenvolver na crian~a urn certa numera de estados ffsicos,</p><p>intelectuais e morais exigidas tanto pelo conjunro da sociedade</p><p>polftica quanto pelo meio especifico ao qual e la esta destinada</p><p>e m particular" (p. 53). E m suma, a educa~ao e uma soc ializa~ao</p><p>da gera,ao jovem (cf. p. 53, 109).</p><p>Mas por que ha de ser assim necessariamente? Porque "em</p><p>cada urn de nos, pode-se dizer, existem dois seres que, em</p><p>bora se mostrem inseparaveis - a HaO ser por a b stra~ao -, nao</p><p>dcixam de ser distintos. Um e composto de todas os estados</p><p>Educar;ao e Sociologia 11</p><p>mentai s que dizem respeito apenas a nos mesmos e aos acon</p><p>tecirnenros ua nossa vida pessoal: eo que sc poderia chamar de</p><p>ser individua l. 0 {)utrO e urn sistema de id eias, sentimentos e</p><p>habitos que exprime m em n6s nao a nossa personalidade, mas</p><p>sim 0 grupo ou os grupos diferentes dos quais fazemos parte,</p><p>tais como as cre nr;as rcligiosas, as cren~as e praticas morais, as</p><p>tradi~oes nacionais au profissionais e as opini6es coletivas de</p><p>todD tipo. Esre conjulltO for ma 0 ser social. Constitui r es te ser</p><p>em cada urn de n6s e 0 objetivo da educa,ao" (p. 53·54; 109).</p><p>Scm a civiliza~ao, 0 home m seria apenas urn animal. Foi a[(a</p><p>ves da coopera~ao e da tradis:ao sociais q ue 0 homem se tar</p><p>nou homcm. Moralidades, linguagens. religi6es e ciencias sao</p><p>obras colctivas, coisas sociais. Ora, e atraves da moralidad e que</p><p>o homcm cstabelece a far~a de vontadc dcntro de si, dominan</p><p>do 0 descjo; c a linguagem que 0 eleva acima da sensa~ao pura;</p><p>e primeiro nas religioes e d epois nas cic ncias que se e laboram</p><p>as no~6es carucais das quais e feita a intel igencia propria men</p><p>te humana. "Estc ser social [ ... J nao se cncon[(a ja pronto na</p><p>constituiyao primitiva do homem [ ... J Foi a pr6pria sociedade</p><p>que, a medida q ue ia se fo rmando e se consolidando, rirau do</p><p>seu seio estas grandes furc;as marais [ ... J Ao entrar na vida. a</p><p>crians;a rraz apenas a sua natureza de ind ivfduo. Portanto, a</p><p>cada nova gerayao, a sociedade se encontra em presen~a de</p><p>uma tabula quase rasa sobre a qual ela deve eonstruir nova</p><p>mente. f: preciso que, pclos meios mais capidos. cia su bstitua</p><p>o ser egaisra e associal que aca ba de nascer par urn (Hltro ca paz</p><p>de levar lima vida moral e social. Esta e a ohra da cduca~ao</p><p>[ ... J" (p. 54, 110). A hcreditariedade t ransmite os mecanismos</p><p>instintivos que garantcm a vida organica, e, nos animais que</p><p>vivem ern sociedadc, uma vida socia l e bastantc simp les. Mas</p><p>12 Cote\ao Textos Fundantes de Educ3\ao</p><p>ela nao basta para transmitir as habilidades que a vida social do</p><p>homcm supoe, habilidades complexas demais para poderem</p><p>"materia lizar-se sob a forma de predisposic;oes organicas" (p.</p><p>56, 111). Por serem sociais, as caracrerisricas cspecffi cas que</p><p>disdnguem 0 homcm sao uansmitidas por uma via social: a</p><p>educa~ao.</p><p>Para a mente acostumada a enxergar as caisas por esra pers</p><p>pectiva, esta concep~ao sociol6gica da natureza e do pape! da</p><p>ed ucac;ao sc imp6e como uma COn5[3[a<;ao 6bvia. Durkheim a</p><p>considera como urn "axioma fundamental " (p. 99). Mais CX3-</p><p>tamenre. digamos que e uma vcrdade comprovada pcla cxpe</p><p>riencia. Quando nos posicionamos como hisroriadorcs, vcmos</p><p>c1arameme que a educar;ao em Espana era a civilizacrao lace</p><p>demtmia crianclo espartanos para a p6lis lacedemtmia; que a</p><p>educa~ao ateniense, nos tempos de Pericles, era a civilizar;ao</p><p>arcniense criando homens con formes ao ripo ideal de homem,</p><p>ral como Arenas 0 conccbia naquela epoca, para a p61is arenien</p><p>se e, ao mesma tempo, para a humanidade, tal como Arenas a</p><p>rcpresentava a partir de suas rela~6es com cIa. Basta antecipar</p><p>o futuro para comprcender como os historiadores interpretaeao</p><p>a educa~ao francesa no seculo XX; mesmo nas suas tentativas</p><p>mais audaciosamcme idea listas e humanit<l rias, ela e produto</p><p>cia civili za~ao francesa; e la consiste em tran smiti-Ia; enfim, ela</p><p>busca ceiar homens con formes ao tipu ideal de hom em ao qual</p><p>esta civilizar;ao aspira, criar homens para a Franr;a, e tHmbem</p><p>para a human idade, tal como a Franr;a a represenra a partir de</p><p>suas relar;oes Com ela.</p><p>No enranto, csta verclade evidente foi , e m geraJ, ignurada,</p><p>sobreru do durante os ultimos s6culos. Fil6sofos e pedagugos</p><p>se concertam para considerar a Ed ucar;au como uma coisa emi-</p><p>EduC3\ao e Sociologia 13</p><p>nentemente individual. Para Kant, escreve Dllrkhcim, "tanto</p><p>para Kant quanta para Mill, tanto para Herbarr q uanta para</p><p>Spencer, 0 objeti vo da educac,;:ao scria antes de rudo rea li zar</p><p>em cada individuo os atributos cunstitutivos cia espccie hu</p><p>mana em geraJ, e levando-os, porem, ao seu mais alto grau de</p><p>perfeic,;:ao" (p. 995.). Comudo, este concerto de opinioes nao</p><p>equival e a lima presu ny30 de verda de. l sto porquc sa bemos</p><p>que a Filosofia ciassica quase sempre esqueceu de:; considerar</p><p>o homem real de lima epoca e de urn pais, 0 unico concrc</p><p>tamente observavel, para especul ar sobre a natureza humana</p><p>universal , produto arb itrario de uma abstrar;ao fcita, sem me</p><p>todD, a partir de urn numero bern restrito de amostras huma</p><p>nos fosse permitido cspcrar, seria prudente e mct6dico tel'</p><p>paciencia ate que as ciencias tivessem feito progrcssos e pudes</p><p>sem ser utilizadas com mais seguran9a. 0 problema 6 que, justa</p><p>mente, a paciencia nae) nos e permitida. Nao temos a liberdade</p><p>de nos colocar OtI de aeliar a quesrao: e la nos e colocada, au me</p><p>Ihor, imposta pelas proprias caisas, pelos faws, pela necessidade</p><p>de viver. E tern mais: somos levados pel a corrcnteza, e e preciso</p><p>seguir em [reme. Em muitos aspec{Qs, 0 nosso siste ma tradicional</p><p>de educa9ao nlio sc cncontra em harmonia Com as nossas ideias e</p><p>necessidades. Portanto, as unicas escolhas que nos restam sao as</p><p>seguintes: temar manter as pracicas legadas pelo passado, embora</p><p>88 Cole~ao Textos Fundantes de Educa):ao</p><p>elas nao satisfagam mais as exigencias da situa9:10, ou entao (eo</p><p>tar destemidamcnte restabelecer a harmonia perdida rcalizando</p><p>as modificayoes nccessarias. Destas duas escolhas, a primeira e</p><p>irrealizavel. Nada 6 mais ilus6rio do que estas tentativas de dar</p><p>uma vida artificial e uma aparente autoridade a instituiy6es cn</p><p>vclhecidas e desacrediradas. 0 fracasso e ineviravel: nao se pode</p><p>abafar as ideias que estas institui90es contradizem e nem calar</p><p>as ncccssidades que elas dcixam insaasfeiras. As forgas contra as</p><p>quais sc (enta assim lurar nunca sa em perdendo.</p><p>S6 nos resta, portanto, ref coragem para comc9ar a trabalhar,</p><p>buscar as mudangas que se impoem e realiza-Jas. Mas como des</p><p>cobri-las a naD ser atraves da rcflexao? Somenre a consciencia re</p><p>ftexiva pode preencher as lacunas de uma tradit;ao obsoleta. Ora,</p><p>o que e a Pedagogia senao a reflexao aplicada da maneira mais</p><p>met6dica possfvel as coisas relativas a educat;ao no intuito de re</p><p>gular 0 seu desenvolvimento? Sem duvida, nao remos em maos</p><p>todos os elementos que desejamos para resolver 0 problema, mas</p><p>isto nao e morivo para nao buscar resolve-Io, ja que elc deve ser</p><p>resolvido. [>orranto, nao temos mais nada a fazer senao agir da</p><p>melhor forma possfvei, juntando 0 maximo de faws instrurivos e</p><p>interpretando-os com 0 maximo de metodo para reduzir ao mi</p><p>nimo as chances de erra. Este e 0 pape! do pedagogo. Nada e</p><p>mais vao e esreril do que aquele puritanismo cienttfico que, sob</p><p>o pretexto de que a ciencia ainda nao esta prama, recomcnda a</p><p>absten<;:ao e aconsclha os homens a assistirem indiferentes, ou</p><p>pelo menos resign ados, a marcha dos acontecimentos. Ao lado do</p><p>sofisma de ignorancia esta 0 sofisma de ciencia, nao men os pcri</p><p>goso. Sem duvida, agindo nestas eondi<;:oes, corre-se riscos. Mas a</p><p>at;ao nunea se da sem riscos; pOl' mais avan9ada que seja, a ciencia</p><p>nao pode elimina-Ios. '"'udo a que podemos fazer e empregar toda</p><p>Educac;ao e Sociologia 89</p><p>a nossa eiencia, por mais imperfeita que ela seja, e toda a nossa</p><p>consciencia para prevenir estes riscos na medida das nossas capa</p><p>cidades. E e justameme este 0 papd da Pedagogia.</p><p>Comudo, a Pedagogia nao e util someme em perfodos educos</p><p>nos quais e preciso, com urgencia, restabelecer a harmonia entre um</p><p>sistema escolar e as necessidades da epoc'3; hoje em dia, pelo menos,</p><p>ela se tornou uma auxiliar con stante e indispensavel da educa<;:ao.</p><p>Isto porque, em bora a arre do educador seja kita sobretu</p><p>do de instinros e hibitos que se tornaram quase instintivos,</p><p>a inteligencia continua sendo necessaria. A reflexao nao po</p><p>deria substituf-Ia, mas 0 professor nao conseguiria dispensar</p><p>a reflexao, pelo menDs a partir do momento em que os povos</p><p>tenham atingido urn cerro grau de civiliza9ao. Oe fato, tendo</p><p>em vista que a personalidade individual se tomou urn elemen</p><p>to essencial da eulrura intelectual e moral da humanidade, 0</p><p>educador deve levar em conta 0 germe de individualidade que</p><p>existe em roda crian<;:a. Ele deve, por todos os meios possfveis,</p><p>buscar favorecer 0 desenvolvimento dele. Em vez de aplicar</p><p>a todos, invariavelmente, 0 mesmo regula memo impessoal e</p><p>uniforme, ele deveria, ao contrario, variar e diversificar os mcto</p><p>dos de acordo com os tempera memos e a disposi9aO de cada in</p><p>teligeneia. Todavia, para poder acomodar com discernimento as</p><p>praticas educativas a variedade de casos particulares, e preciso</p><p>saber quais sao as suas tendencias, as raz6es dos diferentes pro</p><p>cessos que as comp6em e os efeitos que elas produzem em dife</p><p>rentes circunsrancias; em suma, e preciso submete-Ias a reflexao</p><p>pedag6gica. Uma educa~ao empiriea e mecanica nao pode nao ser</p><p>Opressiva e niveladora. Alem disso, a medida que avan9amos na</p><p>hiSt6ria, a evoIu9ao social se acelera: uma epoca nao se assemelha</p><p>mais a anterior, cada uma tendo a sua propria fisionomia. Novas</p><p>90 Cole~ao Textos Fundantes de Educa'tao</p><p>necessidades e ideias surgem sem parar; para poder acompanhar</p><p>as ffiudanr;as incessantes que atingem as opini6es e costumes, a</p><p>propria educar;ao deve mudar e, consequentemente, apresentar</p><p>lima cons tame maleabilidade, permitindo assim a mudan<;a. Ora,</p><p>o unico meio de impedi-Ia de sucumbir ao jugo do habito e dege</p><p>ncrar em automatismo mccanico e imuravel e mantendo-a eter</p><p>namente vivaz atravcs da rcflcxao. Quando ele analisa oobjetivo</p><p>e a razao de seT dos m6todos que emprega, 0 educador esra apm</p><p>a julga-los c, logo, disposto a l11odifica-los se aehar que oobjetivo</p><p>nao 6 mais 0 mesmo au que os meios devem seI diferentes. A</p><p>rcflcxao e, por exceicncia, a fon:;a anmgonica da roeina, e a rotina</p><p>6 0 obstaculo aos progressos necessarios.</p><p>it por isra que, como dissemos no comecyo, embora seja verda</p><p>de que a Pedagogia so surge na historia de modo intermitente, ela</p><p>tende cada vez mais a se rarnar uma funcyao continua da vida so</p><p>ciaL A Idade Media nao tinha necessidade dela, era uma epoca de</p><p>conformismo, na qual todos pensavam e sentiam da mesma for</p><p>ma, todas as mentes eram como que tiradas do mesmo molde, as</p><p>dissidencias individuais eram raras e inclusive proibidas. Por isto,</p><p>a Educac;ao era impessoal: nas escolas medievais, 0 professor se</p><p>dirigia coletivamente a rados os alunos, sem imaginar que pudes</p><p>se adaptar a sua acyao a natureza de cada um. Ao mesmo tempo, a</p><p>imutabilidade das cren~as fundamentais impedia 0 sistema edu</p><p>cativo de evoluir rapidamente. Por estas duas razoes, 0 professor</p><p>tinha menos necessidade de se guiar pelo pensamento pedag6gi</p><p>co. 'Tudo muda, porem, no Renascimento: as personalidades in</p><p>dividuais se destacam da massa social em que se mantinham ate</p><p>entao absorvidas e misturadas, as mentes se diversificam, 0 de</p><p>senvolvimento historico se acelera sirnultaneamente, e uma nova</p><p>civilizac;ao se constimi. Para acompanhar todas estas mudan~as, a</p><p>Educa<;ao e Sociologia 91</p><p>reflexao pedag6gica irrompe e, embora nem sempre brilhe com a</p><p>mesma intensidade, nunca mais se apaga complctamcnte.</p><p>IV</p><p>Porcm, para que cia possa produzir os efeitos uteis que [e</p><p>mos 0 direiw de esperar dela, a reflexao pedagogica 'deve se</p><p>submeter a uma culrura apropriada.</p><p>1°) 1a vimos que a Pedagogia nao e e nao poderia substituir a</p><p>educa~ao. Seu papeJ nao consiste em fazer as vezes da pracica, mas</p><p>sim guia-la, esclarece-Ia, ajuda-Ia, quando necessario, a preencher</p><p>as lacunas que sobrevierem e remediar as deficiencias constatadas.</p><p>Porramo, 0 pedagogo nao rem de construir de alto a baixo urn sis</p><p>tema de ensino, como se ja nao exiscisse urn antes dele, devendo,</p><p>ao contrario, empenhar-se sobretudo em conhecer e compreender</p><p>o sistema de sua epoca - esra e a condicyao para que ele esteja apto a</p><p>usa-Io com discernimento e julgar 0 que pode estar errado nele.</p><p>No entanto, para compreende-Io, nao basta considera-lo tal</p><p>Como ele se apresenta hoje em dia, pois este sistema de edu</p><p>ca<;ao e urn produto historico que somente a historia pode ex</p><p>plicar. Trata-se de uma verdadeira institui~ao social. Alias, nao</p><p>existem muitos sistemas de educa~ao em que toda a hist6ria</p><p>do pais repercuta de modo tao completo. As escolas francesas</p><p>traduzem e exprimem 0 espirito frances. Porranto, nao enten</p><p>deremos nada sobre a essencia delas e 0 objetivo que buscam</p><p>se na~ soubermos 0 que compoe 0 nos so espirito nacional, quais</p><p>sao os seus diversos elementos, tanto os que dependem de cau</p><p>Sas permanentes e profundas quanto os que, ao contrario, sao</p><p>devidos a a~ao de fatores mais ou menos acidentais e passa</p><p>geiros: todas as questoes que somente a analise historica pode</p><p>esclarecer. Frequentememe se discute sobre 0 lugar que cabe</p><p>92 Cole~ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>a Escola Primaria no conjullw da nossa organizavao escolar e</p><p>na vida da sociedade em gera!. Mas 0 proble ma sera insolUvel</p><p>se ignorarmos como a nossa organiza~ao escolar se (ormoll, de</p><p>onde vern as suas caracterfstic<.lS marcantes, 0 que determinoll ,</p><p>no passado. 0 lugar que 0 Ensino Basico ocupa hoje, as causas</p><p>que favoreceram ou entravaram 0 desenvolvimemo, etc.</p><p>Assim, a his[dria do ensino, pelo menus do ensino nacional, e</p><p>a primcira <las propcdeuricas de uma culrura J1cdag6gica. Natural</p><p>mente, SC sc tratar de Pcdagogia Primaria, 60 cstudo oa hist()ria do</p><p>Ensino Primario que devcremos privilcgiar. Por6m, pcla razao que</p><p>acabamos de apontar, ele nao pode seT complcramcntc scparado do</p><p>sistema escolar corna um rodo, do qual ele nao passa de uma parte.</p><p>l') No enranw, esre sisrema escoJar nao e composto unicamen</p><p>te de pratiC3s estabelecidas e mewdos consagrados pelo usc, he</p><p>ran~ do passado. Nele se encomram, a16m disso, te ndc ncias para</p><p>o fmuro e aspi rac;:6es de um novo ideal, emrevistO de forma rnais</p><p>ou menos clara. E importante conhecer bern estas aspirac;:6es para</p><p>poder esrimar que lugar convem Ihes arribuir dentro da realidade</p><p>escolar. Ora, elas vern manifesrar-se nas douuinas pedag6gicas - a</p><p>hisr6ria destas doutrinas deve, portanto, completar a do ensino.</p><p>Pode-se pensar, e claro, que, para cumprir a sua util missao,</p><p>esta hist6ria nao precise ir muito longe no passado, podendo,</p><p>sem inconveniente, sec basranre curta. Nao basta ria saber as</p><p>teorias em torno das quais as mentes conremporaneas esrao di</p><p>vididas? Todas as ourras, dos seculos anreriores, estao hoje obso</p><p>lecas e parecem rer proveito apenas para os eruditos.</p><p>Porem, acredimmos que este modernismo enfraquec;:a uma das</p><p>principais fomes nas quais a reflexao pedag6gica se alimema.</p><p>De fato, as domrinas mais recenres nao nascera m ontem; e las</p><p>sao a continuac;:ao das anteriores, sem as quais elas consequen-</p><p>Educar;ao e Sociologia 93</p><p>rcmenre nao pod em ser compreendidas. Assim, para descobrir as</p><p>causas dererminanres de uma corrente pedag6gica com alguma</p><p>impocrancia, em geml e preciso, urna a uma, volrar basrame no</p><p>tempo. Alias, isto e indispensavel para rer certeza de que as novas</p><p>vis6es que fascinam as memes hoje nao sao brilhames improvisa</p><p>c;:6es, fadadas a cair ~m breve no esq uecimemo. Poc exemplo, para</p><p>compreender a anral tcndcncia a ensinar atraves das coisas, 0 que</p><p>se pode chamar de rcalismo pcdag6gico, nao d~vemos nos comen</p><p>rar em ver como tal au tal professor contemporanco a segue, mas</p><p>sim vol tar are 0 momentO em que cia surgc, ou scja, no mcio do</p><p>seeulo XVIII na Fran,a e por volta do tim do XVIT em eerros paises</p><p>protestantes. 86 0 faro de ela ticar assim associ ada as suas primci</p><p>ras origens fad com que a pedagogia realista se aprescnte sob urn</p><p>ourro aspecro: perceberemos melhor a quanw e la se deve a causas</p><p>profundas, impessoais e influe nces e m todos os palses europcus</p><p>c, ao mesmo tempo, reremos melhores chances de observar quais</p><p>sao esras causas e, logo, de medir a verdadeira reperCllSSaO deste</p><p>mavimenro. Mas, alem disso, esra corrente pedag6gica se consti</p><p>miu em oposic;:ao a uma corrente comriria: a do ensino humanista</p><p>e livresco. Portamo, s6 poderemos analisar a primeira com sabe</p><p>doria se tambem conhecermos a segu nda. Somos cntao obrigados</p><p>a vahar bern mais no tempo. Para que ela de [Odos os scm; fruws,</p><p>csta hist6ria da Pedagogia nao deve, alias, ser separada da historia</p><p>do ensino. Embora as tenhamos distinguido aqui, na vcrdadc elas</p><p>sao complementares, pais, em cada epoca, as doutrinas dependem</p><p>do estado do ensino, ° qual elas refletem ao rnesmo tempo em que</p><p>rcagem contra cle. AJem disso, na medida em que exercem uma</p><p>a~ao eficaz, e1as contribuem para determina-lo.</p><p>Portamo, a cultura pedag6gica deve ter lima base extre</p><p>mameme hist6rica. S6 assim a Pedagogia pod era evirar uma</p><p>94 Co l e~ao Textos Fundantes de Educ:a~ao</p><p>aCUS3yao que com frcqu encia e levanrada contra ela e que ja pre</p><p>judicou bastamc a slIa amoridade. Muiros pedagogos, e demrc</p><p>eles os mais ilusrres, quiseram edificar os seus sistemas fazcndo</p><p>abstra9ao do que havia existido ames deles. Neste ponto, (} traca</p><p>m enro aD qual Ponocrates submete GargJ.ntua6, an tes de inicia-Io</p><p>aos novas mewdos, e significativo: de faz uma lavagem cerebral</p><p>"com heleboro de Anticira" de modo a faze-Io esquecer "tuda</p><p>o que ele havia aprendido Com os sellS antigos preceptores" .</p><p>15[0 significa va dizer, de forma aleg6rica, que a nova pedagogia</p><p>nao deveria tef nada em C01l1um com a anterior. Mas, ao mesmo</p><p>tempo, isto equivalia a se distanciar das condi<;oes da realidade.</p><p>o futuro nao pode ser imaginado a partir do nada: s6 podemos</p><p>construf-Io com as materiais que 0 passada nos legau. Urn ideal</p><p>construfdo na dire-;ao oposta do estado das coisas exisrentes nao C</p><p>n.'"<Ilizavcl, ja que nao possui ralzes na realidade. Alias, 6 claro que</p><p>{} passado tinha suas razoes de ser do jeiw que foi: ele nao podc ria</p><p>ter durada se nao tivesse satisfeiw necessidades legftim as que</p><p>nao paderiarn desaparecer da noiw para 0 dia. Portanto, nao se</p><p>pode ser taO radica l e finer cibula rasa, a nao ser que ignoremos</p><p>necessidades vita is. Foi assim que muitas vezcs a Pedagogia nao</p><p>passou de uma forma de iirerarura ut6pica. Terfamos pen a de</p><p>crian~as nas quais a mewdo de Rousseau ou de Pestalozzi Fosse</p><p>aplicado com rigor. Sem duvida, estas utopias desempenharam</p><p>um papel util na hisr6ria. 0 pr6prio simplismo delas Ihes perrni</p><p>riu aringir as men res com mais intcnsidade e estimula-Ias a agir.</p><p>Porem, primeiro, estas vamagens nao deixam de rer inconvenien</p><p>[es. E, segundo, para aquda pcdagogia do dia a dia, da qual [Odo</p><p>professor precisa para entendcr c guiar a sua pnhica cotidiana, e</p><p>6. Tr'd t3-se de urn romance de Fran-;ois Rabelais, escrito em IS~41N.T. I .</p><p>Educa~ao e Soci ol ogia 95</p><p>preciso menos treinamento fanatico e unilateral e, ao contrario,</p><p>mais metoda, urn sentimento mais presente da realidade e das</p><p>multiplas dificuldades que sc deve enfremar. E este sentimemo</p><p>que levant a uma culrura hist6rica be rn compreendida.</p><p>3°) S6 a hist6ria do ensino e da Pedagogia perm ire dere rmi</p><p>nar as metas que a educalYao deve buscar a todo momento. No</p><p>emanto, e na Psicologia que cabe procurar os mcios necessarios</p><p>a realizac;ao desras metas.</p><p>De faro, 0 ideal pedag6gico de uma epoca expressa antes de</p><p>rudo () estado da sociedacle na epoca considerada. Contudo, para</p><p>que cste ideal se tOme realidade, e preciso ainda fazer com que</p><p>a con sci en cia da crianlYa se conforme a ele. Ora, a conscicncia</p><p>tern as suas proprias leis, as quais e preciso conhecer antes de</p><p>modificar, se quisermos evirar, tantO quanta possivel, as cenrati</p><p>vas empfricas que a Pedagogia busca jusramenre reduzir ao mf</p><p>nimo. Para poder estimular 0 desenvolvimento da arividade em</p><p>uma cena dirq:ao 6 preciso saber q uais sao os mecanismos que a</p><p>mavem e a natureza ddes. S6 ass im sera possivel aplicar ai, com</p><p>conhecimento de causa, a a9ao adequada. Sera que se trara, por</p><p>exemplo, de despertar 0 amor da parria OU 0 sentimento de hu</p><p>manidade? Saberemos oricmar mdhor a sensibilidade moral dos</p><p>alunos neste ou naqllcle senrido quando tivermos noc;oes mais</p><p>completas e precisas sobre 0 conjunto dos fen6menos que cha</p><p>mamas de cendencias, habiws, dcsejos, emoc;oes, erc., sobre as</p><p>diversas condic;oes que os regem e tiobre a forma sob a qual eles</p><p>se manifestam na crian-;a. Con</p><p>form e virmos as rendencias como</p><p>produtos das expericncias agradavcis ou nao que a especie viveu</p><p>ou, ao conu3rio, como urn faeo primitivo anterior aos estados afe</p><p>rivos que acompanham a seu mecanismo, deveremos agir de mo</p><p>dus basta me diferemes para regular 0 seu funcionamemo. Ora, e</p><p>96 Coler;ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>a Psicologia e, em especial, a Psicologia Infantil que cabc resolver</p><p>cscas quest6es. Ponamo, embora ela seja incompetence para 6-</p><p>xar 0 objetivo - ja que 0 mesmo varia dcpcndcndo dos estados</p><p>sociais -, ela certameme tern urn papcl (Iti1 a desempenhar na</p><p>cons[jtlli~:ao dos metodos. E mais: como nenhum mewdo pode</p><p>ser aplicado da mesma maneira nas diferentes crianc;as, e mais</p><p>uma vez a Psicologia que deve nos ajudar a nos situar em meio a</p><p>d iversidade das inteljgencias c carareres. lnfel izmente, sabemos</p><p>que ainda esramos longc do momento em que ela realmente es</p><p>tara apta a satisfazcr cstc desideratum.</p><p>Urn ramo espccffico da Psicologia rem uma importancia ca</p><p>pital para u pedagogo: a Psicologia Coletiva. Ue faw, uma tur</p><p>rna e uma pequcna sociedade. Por isto, nao se deve conduzi-Ia</p><p>como sc ela fossc apenas uma simples agiomera9ao de sujeitos</p><p>independenrcs tIns dos OlltroS. CrianlYas reunidas em uma tur</p><p>rna pensam, sentem e agem de modo diferente de quando estao</p><p>isoladas. Em uma turma, produzem-se fen6rnenos de contagio,</p><p>desmotiva~ao coletiva, agita9ao mutua e efervescencia sa udavcl</p><p>que 6 prcciso saber discernir no intuito de prevenir Oil combatcr</p><p>uns c uti lizar os OUtros. Sem duvida, esta ciencia ainda 6 uma</p><p>crian~a. No en tanto, existe desde ja urn cereo numero oe teses</p><p>que nao se deve ignorar.</p><p>Estas sao as principais discipl inas que podem ocsperrar e</p><p>alimentar a reflexao pedag6gica. Em vez de huscar decretar lim</p><p>c6uigo abstrato de regras rnetodol6gicas para a Pedagogia - ini </p><p>ciativa que, a partir de uma investiga9ao tao composta e eomple</p><p>xa, nao e plenamente realizavel -, achamos mclhor indicar de</p><p>que maneira, em nos sa opiniao, a pedagogo dcvc ser farmada.</p><p>Uma certa atitude mental face aos problemas que cabe a eJe</p><p>resolver sc masua, por isto mesmo, determinada.</p><p>3</p><p>PEDAGOGIA E SOCIOLOGIA</p><p>Senhorcs,</p><p>Para mim e lima grande honra (cujo valor eu simo intensa</p><p>mente) ter de substituir nesta cadeira () homem de grande bom</p><p>scnso e firme vontade ao qual a fran~a deve, em larguissima</p><p>parte, a renova~ao do seu Ensino P rimario. Tendo estado em</p><p>contato Intima com as professorcs das nossas escolas desde que</p><p>eomecei a ensinar a Pedagogia na Universidade de Bordeaux,</p><p>ha quinze anos, pude ver de perro a obra a qual 0 nome do Sr.</p><p>Buisson ticara definitivamentc associ ada. Por conseguime, re</p><p>conhe90 coda a sua grandeza, sobrctudo quando me lembro do</p><p>estado no qual se encontrava estc Ensi no no momenta em que</p><p>a reforrna toi empreendida - <5 impossivel nao admirar a impor</p><p>tancia dos resultados ohtidos e a rapidez dos progressos realiza</p><p>dos. Multiplica~ao e transformac;ao rnateria l de escolas, substi</p><p>tuilYaO das velhas rotinas de antigamente por metodos racionais,</p><p>Urn verdadeiro impulso na rcf1exao pedag6gica e um estimulo</p><p>geral de todas as iniciativas: tudo isto certameme consritui uma</p><p>das maiores e mais bem-sucedidas revolu90es que ocorreram na</p><p>hist6ria da nossa Educac;ao nacional. Portanto, para a ciencia foi</p><p>lima verdadeira sone quanoo, ao considerar a sua rarefa como</p><p>eoncluida, 0 Sr. Buisson rcnunciou as suas exaustivas fun90es</p><p>para compartilhar, atraves do ensino, os resultados de sua io</p><p>Comparavel experiencia. Uma cxtcnsa pnitica, gu iada por uma</p><p>98 Cole~ao Tt"xtos Fundantes de Educa~ao</p><p>vasta filosofia, ao mesmo tempo prudente e curiosa a respeito</p><p>de wdas as nov ida des, devia necessariamcnre dar a sua pala</p><p>vea lima auwridade - auwcidacie esr3 reallYada, al6m disso, pelo</p><p>prestigio moral oa sua pessoa e pelo reconhccimc nto dos ser</p><p>vi.yos presrados a todas as grandes causas as quais 0 Sr. Buisson</p><p>dedicou a sua vida.</p><p>Eu nao POSSllO nada qucse parec;a com uma competcncia tao</p><p>especifica. Por isto, eu ceria razao de me sentir pacricuiarmcn</p><p>te assustado diante das dificuldades da minha tarefa se naD me</p><p>acalmasse com a ideia de que problemas tao complexos podem</p><p>sec estudados de forma util par mentes e pOntOS de vista di</p><p>versos. Sociulogo, e sobretudo enquanto soci6iogo que falarei a</p><p>voces sobrc cducac;:ao. Alias, nao acred ito me expor aver e mos</p><p>tra r as coisas pur uma perspectiva deformauora aO proceder as</p><p>sim, pois [cnho certeza de que, ao contrario, nao existe metodo</p><p>mais apto a rcssaltar a verdadeira natureza das coisas. De fato,</p><p>na minha opiniao, 0 postulado de toda jnves tiga~ao pedag6gica</p><p>e a tese de que a educac;:ao e uma coisa eminentcmente social,</p><p>tantO par suas origcns quanto por suas funt;:6es e qu e, logu, a Pe</p><p>dagogia dependc mais da Sociologia do que de quaiquer outra</p><p>ciencia. E, tendo em vista que esta ideia dominara todo 0 meu</p><p>ensino, ass im como cia ja dominava 0 ensino semclhantc que</p><p>eu ministrava antes em uma outra universidad e, parccell-me ser</p><p>conveniente usar es ta primeira aula para identifica- la c torna-Ia</p><p>mais precisa para que voces possam seguir melhor as aplicac;ocs</p><p>uiteriores. Nao que seja possivel fa zer lima demonstrac;ao cx</p><p>pressa durante uma unica aula. Urn principio tao gcral e cujas</p><p>repercussoes sao taO extcnsas s6 pode ser analisado progrcssiva</p><p>mente, a medida que entramos nos detalhes dos faws e vemos</p><p>como cle se aplica ai. Porem, a que podemos fazer desde ja e</p><p>Educa<;ao e Socioiogia 99</p><p>dar urn panorama; indicar as principais razoes pcbs quai s ete</p><p>deve ser aceiro, desde 0 inicio do estudo, a titulo de presunc;:ao</p><p>provis6ria e sob reserva de verificac;oes nccessarias; e. por fim ,</p><p>revelar ao mesmo tempo [Uda a sua cxtcnsao e as seus limites</p><p>cste sera 0 tema da nossa prime ira aula.</p><p>I</p><p>It necessari o ehamar imediatamente a atenr,;ao de voces para</p><p>este axiom a fund ame ntal, que em geral e ignorado. Ate alguns</p><p>an os atras - e mesmo ass im as excer,;oes podem ser cootadas</p><p>nos dedos7 -, os pedagogos ll1odernos cram unanimes em vcr</p><p>a cduca~ao como li ma caisa eminentemcnte individual e, logo,</p><p>a Pedagogia como urn coroIario imediato e direto somcote da</p><p>Psicologia. 'Tanto para Kane quaneo para Mill e tanto para Her</p><p>bart quanto para Spencer, 0 objetivo da ed ucar,;ao seria antes</p><p>de tudo realizar em cada indivfd uo os atri butos constitlJtivos da</p><p>especie humana em gerai, e levando-os, porem, ao seu mais alto</p><p>grau de perfeic;ao. Supunha-se como uma vcrdadc evidcnte que</p><p>7. A ideia ja havia sido formulada por Lange em uma aula de abercura pu</p><p>blicada em MOllo!shefte derConuf/liu,lgesellsdwjt (t. III , p. 107). Ela foi retoma</p><p>da por Lorenz von Stein em Verm'ol!uIIgslehre (t. V). A esta mesma corrente</p><p>pertencem WILLMANN, Qno. Didaktik als Bildullgslehre - Nach ihren</p><p>Beziehungen zur Sozialforschung und wr Geschichte deT Bildung. 2 vol.</p><p>Leipzig: Gr bner, 1882-1889.· NA'J'QRP, Paul. SozialJ)iidagogik- Theorie</p><p>deT Wi llenscrzichung auf de! Grundlage de! GemeinschafL 3. ed. SWt</p><p>tgart: Frommann, 1909 fl. ed., 1899J .• BERGEMANN, Paul. Sozia/e Pt1e</p><p>dagogik - auf erfahrung!iwissenschaftlicheT GTundlage und mit Hi lfe deT</p><p>induktiven Methode als universa listische oder Kul tur-P dagogik. Gera: 'T.</p><p>Hofma nn, 1900. Vamos mcncionar tambem VINCENT, George Edgard.</p><p>The socia/ mind and eriuCtJtiofi. Nova York: Macmillan, 1897 . • ELSLAN</p><p>DER, Jean-Fran~ois, L'idliCOfioll t111 point de vue soci%gique. Bruxelles: J.</p><p>Lebegue, 1899.</p><p>100 Cole~ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>havia lima unica educa~ao que, excluindo qualquer Dutra, COI1-</p><p>vinha indistintamente a rodos as homens, fossem quais fossem</p><p>as condi90es hist6ricas e sociais em meio as quais eles viviam: e</p><p>este ideal abstrato e unico que os te6ricos da edLlca~ao se propu</p><p>nham determinar. Admiria-se que havia uma natureza humana,</p><p>cujas form as e propriedades eram determiniveis uma vez por</p><p>rodas,</p><p>C 0 prohlema pedag6gicu consistia em buscar sa ber de</p><p>que mancira a as;ao cd ucadora deveria se exeTerr na natureza</p><p>humana assim dcfinida. Scm dlivida, ningucm nunca pensou</p><p>que 0 homcm Fosse imcdiacamcntc, assim que cntrassc na vida,</p><p>[lido 0 que ele pode e deve seT. E bastantc 6bvio que () seT hu</p><p>ITlano 56 se constitui de modo progress iva, ao longo dc urn lemu</p><p>processo que come~a no nascime nto e so termina na maturida</p><p>de. Porem, imaginava-se que este processo nao fazia !TIais do que</p><p>atualizar virtualidacles, revelar e nergias lmentes que existiam, ja</p><p>pre-formadas, no organismo ffsico e mental cia crian93. PorwntD,</p><p>o ed ucador naG teria nada de essencial a acrescemar a obra cia</p><p>natureza, nao criando nada novo. 0 seu papel se limitaria a impe</p><p>dir que estas virrualidades exjstentes se atrofiassem par causa da</p><p>inatividade au se desviassem de sua dire~ao normal au ainda se</p><p>desenvolvessem com demasiada lenticlao. Assim, as condiyoes cle</p><p>tempo e lugar e 0 estado em que se encontra a meio social per</p><p>dem tada a utilidade para a Pedagogia. Ja que 0 hom em carrega</p><p>dentro de si tDdos os germes do seu clesenvolvimento, e ele, e</p><p>someme ele, que e preciso observar quando se quer determinar</p><p>em que semido e de que maneira este desenvolvimento deve ser</p><p>orientado. 0 imponame e saber quais sao as faculdades inatas e</p><p>a natureza das mesmas. Ora, a ciencia cujo objetivo e descrever</p><p>e expl icar 0 homem individual e a Psicologia. Panama, ela deve</p><p>bastar para todas as necessidadcs do pedagogo.</p><p>Educa~ao e $ociologia 101</p><p>T nfe liz mcnrc, e~ta concepc;3.o cia ed ucaC;30 esni em conua</p><p>diC;ao formal com tuelo 0 Clue a hist6ria nos ensina: de faro, nao</p><p>existe nenhum povo em que cia [Cnha sido colocada em prarica.</p><p>Em primeiro lugar, nao hi uma educa~ao universal mente valida</p><p>para 0 genero humane inteiro - em todas as sociedades, por as</p><p>sim dizer, sistemas pedag6gicos diferentcs coexistem c funcio</p><p>nam em paralelo. Tal saciedade e fannada par eastas? A eduC'J</p><p>c;ao varian! de uma casta para a outra - ados aristDcratas nao era</p><p>igual ados plebeus, ados bramanes nao era iguaJ ados sud ras.</p><p>Oa mcsma forma, na Idade Media, que desproPor9ao entre a</p><p>cultura rccebida pelos jovens pajens, instruiclos em wdas as ar</p><p>tes da cavalaria, e ados camponeses livres, que iam aprender na</p><p>escola de sua par6qllia alguns escassos elementos de complIto,</p><p>canto e gramatica! Ainda hoje, nao vemos a educac;ao variar com</p><p>as classes sociai s ou mesmo com os habitats? A da cidade nao e</p><p>igual a do campo, a do burgues nao e igual a do opera rio. Dirao</p><p>par af que esta organizayao nao e moral mente justifid.vel e pade</p><p>ser considerada como urn anacronismo destinada a desaparecer?</p><p>A lese e ficil de defender. E 6bvio que a educayao dos nossos fi</p><p>Ihos nao deveria depender do acaso que oS faz nascer aqui au hi ,</p><p>de (ais pais ern vez de outros. Porcm, mesma que a consciencia</p><p>moral de nosso tempo tivesse sido satisfeita neste pomo, nem</p><p>por isso a educac;ao ser ia mais uniforme. Mesmo que a carreira</p><p>de cada crianc;a nao fosse, em grande parte, predeterminada por</p><p>uma cega heredirariedade, a divcrsidade moral das profiss6es</p><p>nao deixaria de exigi r uma grande diversidade pectag6gica. De</p><p>fatD, cada profissao constitui urn meio sui generis que demanda</p><p>aptid6es e conhecimentos especfficos, urn meio no qual pre do</p><p>minam certas ideias, usos e rnanciras de vcr as coisas; e, ja que a</p><p>crianc;a deve estar preparada com vistas a fun~ao que sed levacla</p><p>102 Cole~ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>a cumprir, a cdUC31:;aO, a partir de determinada idade, naD pode</p><p>mais continuar a mesma para todos os sujeitos aos quais ela se</p><p>aplicar. E por ism que, em todos os paises civilizados, ela [ende</p><p>cada vez mais a se diversificar c sc especiaiizar, e esta especia</p><p>liza~ao, a se tornar cada vez mais precoce. A hererogeneidadc</p><p>produzida assim nao repousa sobre inegavel injustic;a, como a</p><p>que observamos agora hi poueo; rnas ela nao e menor. Para e n</p><p>contrar uma eduC<.t<;ao absolutamente homogenea e igualicaria,</p><p>e preciso voltar no tempo ate as sociedades pre-hist6ricas. no</p><p>seio das quais nau existia nenhuma diferencia9ao; c ainda assim</p><p>estes tipos de sociedadcs representam apenas urn momento 16-</p><p>gico na hist6ria da humanidade.</p><p>Ora, e 6bvio que estas edl1ca~6es especifieas nao sao nem urn</p><p>pall co organizadas com fins individuais. Sem ddvida, as vezes</p><p>acomece de e1as provocarem nos indivfduus 0 descnvolvimemo</p><p>de aptidoes singu larcs que ja se encontravam imanentes e s6 es</p><p>ravam esperando para enrrarem em a~ao; neste senti do, pode-se</p><p>dizer que elas us ajudavam a realizarem a natureza deles. Porem,</p><p>sabemos 0 quanto estas voca~6es estreitameme dennidas sao ex</p><p>cepcionais. Dc modo mais geral, 0 nosso tcmperamenw inrelec</p><p>cual ou moral nao nos predestina a uma fun~ao bern dererminada.</p><p>o homem medio 6 eminentemente plistico, podendo ser urili</p><p>zado da mesma forma em empregos basta nrc variados. Ponamo,</p><p>se ele se especial iza, e se 0 faz de cal mudD em vez de ourro, na~</p><p>e por razoes intcriores e nem pel as necessidades da natureza. E</p><p>a sociedade que, para se manter, exige que 0 trabalho se divida</p><p>entre os seus mcm bros e de tal maneira em vez de outra. E por</p><p>isto que ela prepara COfn as suas pr6prias maos, atraves da educa</p><p>~ao, os trabalhadores especializados dos quais precisa. Portamo,</p><p>foi para e poc ela que a educa~ao se diversificuu assim.</p><p>Educa~ao e Sociologia 103</p><p>E tern mais. Longe de nos aproximar necessariamcnte da</p><p>perfei~ao hurnana, esta cultura espedfica engendra uma deca</p><p>den cia parcial - e ism acontece embora ela se encontre em har</p><p>monia corn as predisposi90es naturais do individuo. Isto porque</p><p>nao podemos desenvolver com a intensidade necessaria as fa</p><p>culdadcs privilegiadas pe1a nossa fun~ao sem deixar as outras se</p><p>entorpeccrem com a inatividade e scm ahdicar, par conseguin</p><p>re, de toda uma parte da nossa natureza. Pur exemplo, enquanto</p><p>indivfduo, 0 hom em nao e men os feiro para agir do que para</p><p>pensar. Alias, tendo em vista que ele 6 antes de tudo um ser</p><p>vivo e que a vida e a93.0, as faculdades ativas talvez the sejam</p><p>mais essenciais do que as ouuas. E, no en tanto, a partir do mo</p><p>mento em que a vida intelecrual das socicdades atinge um cer</p><p>ro grau de dcsenvolvirnento, hi e deve nccessariamente haver</p><p>homens que se dediquem a ela de modo exclusivo, ou seja, que</p><p>nao fa~am omra coisa senao pensar. Ora, () pensamento s6 pode</p><p>se desenvolver desligando-se do movimcnto, recolhendo-se em</p><p>si mesma, desviando u sujeito da a9:10. Assim, focmam-se aqlle</p><p>las naturezas incompietas em que wdas as energias da atividade</p><p>se convertem, poc assim dizer, em reAexao, naturezas que, pOT</p><p>mais mutiladas que estejam em certos aspectos, constituem,</p><p>emretamo, os agentes indispensaveis do progresso cientitico. A</p><p>analise abstrata da constitui~ao humana jamais teria permitido</p><p>preyer que 0 homem fosse capaz de alterar assim 0 que e consi</p><p>derado a sua essen cia e nem que Fosse necessaria uma educavao</p><p>que preparasse estas dteis altera~6es.</p><p>Contudo, seja qual for a importancia dcstas educa~oes cs</p><p>pecificas, elas nao sao a eduea~ao toda. Pode-se are dizer que</p><p>elas nao sao autossuficiemes; em todos os lugares em que sc</p><p>pode observa-las, elas 56 divergem umas das outras a partir de</p><p>104 Colet;ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>cerro POnto aquem do qual elas se confundcm. Todas elas re</p><p>pousam sabre uma base comulTI. Nao hi ncnhull1 povo em que</p><p>nao exisra certo numero de ideias, senti memos e pnhicas que</p><p>a educacriio dcvc inculcar em codas as crian~as sem disrincrao,</p><p>seja qual for a cmegoria social a qual e las pertencem. E inclu</p><p>sive esta cdllca~ao comum que e considerada em geral como a</p><p>verdadcira educavao. So mente cia parece plenamente mcrcccr</p><p>sec dcsignada desta forma. A cia e concedida uma espccic de</p><p>prcdominancia com reia<;iio as outfas. Panama, e suorctudo esra</p><p>cduca~ao que e importante</p><p>invesrigar para saber, como se su</p><p>poe, se ela esnl conrida pDf inteiro na nOl¥ao de hom cm e pade</p><p>sec deduzida da mesma.</p><p>Para dizer a verdadc, a qllestao nem se coloca a respeito de</p><p>wdo 0 que envolvc os sistemas de educa-;ao que a hist6ria nos</p><p>apresenta. Eles estao tao obviamente ligadus a sistemas socia is</p><p>determinados que acabarn sendo inseparavcis deles. £mbora</p><p>houvesse em Ruma lima educa~ao comum a todos os romanos,</p><p>apesar das difercnc;as que separavam a aristocracia da plebe,</p><p>esra educa9ao sc caracterizava por ser essencialmente romana.</p><p>Ela reftetia tuda a organiza9ao da p6lis ao mesmo tempo em que</p><p>era a sua base. 0 mcsrno vale para todas as sociedades hist6ri</p><p>cas. Cada tipo de povo possui uma educac;ao que Ihe e pr6pria e</p><p>que pode defini-Io ao mesmo tfudo que a sua organiza~ao moral,</p><p>politica e religiosa. Trara-se de urn dus elementos da sua fisio</p><p>nomia. Esta c a razao pela qual a educac;ao variou de forma tao</p><p>prodigiosa de acordo com as epoC'as e palses; pe la qual, aqui na</p><p>Fran9a, ela far. 0 indivfduo entregar a sua personalidade com</p><p>pleramente nas maos do Estado, ao passo que em outros lugares</p><p>e la forma, ao contnirio, seres auronomos e donas de sua pr6pria</p><p>condura; e pela qual e la era ascetica na Idade Media, liberal no</p><p>EducaC;<lo e Sociologia 105</p><p>Renascimento, lireraria no seculo XVll e cientffica hoje em dia.</p><p>Isto nao significa que, por causa de aberra9oes, os homens se</p><p>ten ham enganado a respeito de sua natureza humana e de suas</p><p>necessidadcs, mas sim que estas necessidades variaram, e varia</p><p>ram porquc as condic;ocs sociais das q uais e1as depend em nao</p><p>pennaneceram inalteradas.</p><p>Porem, por lIma contrad ic;ao inconsciente, recusamos com</p><p>rela9ao ao presenre, e mais ainda com rclas;ao au futuro , aquilo</p><p>que admirimos facilmenre corn re la~ao ao passado. Todo 0 mun</p><p>do reconhece sem discllrir que , em Roma c na Grecia, 0 unico</p><p>objetivo da educa~ao era formar gregos e romanos e que, par</p><p>conseguinte, a educa9ao estava associ ada a todo urn conjunto</p><p>de instirui~6es poifticas, morais, econornicas e rcligiosas. No en</p><p>tanto, imaginamos alegremenre que a nossa educa-;ao moderna</p><p>foge a lei comum e que, awalmente, ela dcpcnde cada vez me</p><p>nus das contingencias socia is, pois tende a se libcrtar wtalmente</p><p>delas nu futuro. Nao reperimos sem parar que queremus trans</p><p>formar os nossos filhos em homens antes mesmo de transforma</p><p>los em cidadaos? E nao parece que a nossa qualidadc humana</p><p>seja naruralmente imune as inAuencias colerivas ja que, pela</p><p>logiea, e anterior as mesmas?</p><p>E, todavia, nao seria uma especie de milagrc se a natureza</p><p>da educac;ao tivesse mudado tao completamente depois de ter</p><p>tido todas as caracterfsticas de uma institui93.0 social durante</p><p>s6culos c em todas as sociedades conhecidas? Tal transforma</p><p>-;ao parece ainda mais surpreendeme se levarmos em conside</p><p>ra-;ao que 0 momentO em que ela ceria aconrecido 6 jusramente</p><p>aquele em que a educacrao come90u a se tornar urn verdadei</p><p>co servic;o publico: desde 0 final do seculo passado, cia rende,</p><p>!lao somente na Fran.;a, mas em toda a Europa, a fiear cada vez</p><p>106 Cole~ao Textos Fundan tes de Educa~ao</p><p>mais diretamente sob 0 controle e a direc;ao do Estado. Sem</p><p>duvida, os objetivos que cia busca se afasram cada vez mais das</p><p>condi.;:oes locais ou 6tnicas que antigamente as sing ularizavam,</p><p>tornandu-se mais gerais e abscra[Qs. Mas eles nao deixam de ser</p><p>essencialmcnte colerivos. De fata, nao e a coletividadc q ue os</p><p>impoc? Nao e ela que nos ordena a desenvolvcr nos nossos n</p><p>Ihos antes de wcla as qualidades que eles compartilham com</p><p>codas as homens? E [em mais: e la nau somcow cxerce sabre n6s</p><p>uma pressao moral, atraves da opiniao, para que eorcndamos</p><p>ass im os nossos cleveres de educadorcs, com o tambem valoriza</p><p>mow a educac;ao q lie, cornu eu acabci de dizer, ela pr6pria se</p><p>encarrega cia tarefa. E facil adivinhar que, se e la preza a edu</p><p>cac;:ao a este pomo, e porquc cia vc as vamage ns que a mesma</p><p>pode Ihe oferecer. E, de faw, somente uma culw ra amplamente</p><p>humana pode dar as socicdades modernas os cidadi'i.os dos quais</p><p>e1as precisam. Ism porque cada urn dos grandes povos europe us</p><p>cobre urn imenso habitat e e ngloba as rac;:as mais diversas. Alem</p><p>elissa, 0 trabalho 6 cxtremal11 e nte dividido - os indivfduos que</p><p>o comp5em sao tao diferentes uns dos OUtfOS que nao ha mais</p><p>quase nada em comum emre eles, salvo a sua qualidade humana</p><p>em gera\. Portanto, eles s6 pod e m manter a homogeneidade in</p><p>dispensavei a qualqucr cotlsetlso social se forem tao semelhanws</p><p>quanto possivcl no (Jnico aspecto em que toelos se parecem, ou</p><p>seja, enquanw wdos forem seres humanos. Em outfas paiavras,</p><p>e m socicdadcs tao cl iferenciadas, a (Jnico tipo coletivo que pode</p><p>haver 6 0 tipo gene rico de homem. Se ele perclesse urn pouco cia</p><p>sua gcncralidade ou deixasse 0 antigo particularismo reaparccer,</p><p>os grandcs Estados europeus se dividiriam e m uma plura lidade</p><p>de pequenos grupos fragmemarios e se decomporiam. Logo, 0</p><p>nosso ideal pedag6gico reflete a nossa estrutura social, assim</p><p>Educa~ao e Sociologia 107</p><p>como ados gregos e romanos s6 pode ser com precndiclo a partir</p><p>da organizac;:ao das p61is. Se a nossa educa9ao moderna nao e</p><p>mais csrreitameme nacional, e em func;:ao cia maneira como as</p><p>na90cs mode rn as se constituiram.</p><p>E isto nao c tudo: a sociedacle nao somente eleva 0 t ipo hu</p><p>mana a dignidade de modelo para 0 educador reproduzir, como</p><p>tambem 0 constr6i . e 0 constr6i de acordo COm as suas neccssi</p><p>dades. E urn equivoco pe nsar que ele ja esteja dado por intciro</p><p>na consriw ic;:ao nawral do homem, que basta uma observa~ao</p><p>met6dica desta ultima para descobri-Io, sem se abste r, no c n</p><p>tanto, de ernbe leza-lo mentalmente em seguicla, imaginando</p><p>a mais alto grau de desenvolvimemo daquilo que ainda se en</p><p>contra em estado rudimcntar. 0 homem que a educac;:ao deve</p><p>realizar em n6s nao e a homcm tal como a natureza crioll , mas</p><p>sim tal como a sociedadc quer que de seja; e ela quer que cle</p><p>seja da form a ex.igida pela sua economia interior. A prova d isto</p><p>e a manei ra como a concep<s:ao ti~ homem variou con form e as</p><p>sociedades. Assi m como n6s, os homens dOl Antiguidade ta m</p><p>bern acreditavam esrarem formando os seus £1 lhos para seren1</p><p>homens. Se eles se recusavam a eonsiderar um estrangeiro como</p><p>seu semelhante, e jusram e ncc porque na opiniao cleles some nte</p><p>a ed ueas:ao cia p61is era capaz de formar seres verdad eira e pro</p><p>priamente h llmanos. S6 qu e elcs eoncebiam a humaniclacle da</p><p>maneira deles, que nao e a mesma que a nossa. Toda mudan<;a</p><p>urn poueo importante na organ izas:ao de uma sociedade provoca</p><p>uma mudans:a de iguaJ importancia na ideia que 0 homcm nu</p><p>tre a respeito de si mesmo. Se 0 rrabalho social se dividir ainda</p><p>mais sob a pressao da crescence concorre-ncia e a especiali z3\=ao</p><p>de cada trabalhador for ao mesmo tempo mais intensa e preeo</p><p>ce, 0 conjullto de coisas que a cduca<;ao comum engloba devera</p><p>108 Cole~ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>necessaria mente se rcuuzir c, por conseguime, as caractcristi</p><p>cas do tipo humano diminuirao. Antigamente, a cultura litcraria</p><p>era considerada como urn elemento essencial de toua cultura</p><p>humana. I-Iojc. csra chegando a epoca em que c ia talvez nao</p><p>passe de uma cspecialidade. Ua mesma forma, entre as nossas</p><p>faculdadcs cxiste uma hierarquia comprovada - atfibuimos lima</p><p>espccic dc superioridade a algumas delas, as quais devernos, por</p><p>isto mcsmo, desenvolver mais do que as outras. Parem, isto nao</p><p>significa que esta dignidade seja intrfnseca as mesmas, ou seja,</p><p>que a pr6pria natureza Ihes tenha designado, para a eternidade,</p><p>csea eminente posil,;ao, mas sim que elas rem mais valor para a</p><p>sociedade. Logo, como a csca la destes valores muda necessaria</p><p>mente com as sociedadcs, csea hierarquia nunC'd permanece a</p><p>mesma em dois momentos difcrenres da hist6ria. Omem, era a</p><p>coragem que</p><p>ocupava 0 primeiro plano, com todas as faculdades</p><p>exigidas pela virrude miliear. Hoje, eo pensamenw e a rcftcxao.</p><p>Amanha, talvez seja 0 rcfin amento e a sensibilidade com rclac;ao</p><p>as coisas anlsricas. Assim, tanto no presenre quanto no passa</p><p>do, 0 nosso ideal pcuag6gico e, nos mfnimos detalhcs. fruto da</p><p>sociedade. E ela que rra~a 0 retraro do homem que devemos</p><p>ser, rerrato no qlIal se refletem todas as parricularidades da sua</p><p>organiz<lc;ao.</p><p>II</p><p>Em suma, () individuo e os seus interesses nao sao 0 unico</p><p>ou principal objetivo da educac;ao, a Qual e antes de tudo 0 meio</p><p>peIo qual a socicdade renova eternamente as condi<;6es da sua</p><p>pr6pria existc?ncia. A sociedade s6 pode viver sc cxistir uma ho</p><p>mogeneidade suficiente enrre os seus memhros. A educ3<;ao per</p><p>pewa e reforc;:a esta homogeneidade ao fixar de anrcmao na alma</p><p>Educa~ao e Sociologia 109</p><p>da crianc;a as semclhanc;as essenciais que a vida coletiva slIpoe.</p><p>Porem, ao mesmo ecmpo, qualquer eooperac;ao seria impossivel</p><p>sem uma certa diversidade. A educac;ao garame a continuidade</p><p>desta necessaria diversidade diversific3ncio-sc c especializando</p><p>se a si mesma. Portanw, cia consisre, em um ou outro destes</p><p>aspectos, em Ulna sociali7.a~ao met6dica das novas gerac;oes. Em</p><p>cada urn de n6s, pode-se dizer, existem dois seres que, embora</p><p>se rnostrem inseparaveis - a nao ser por abstra~ao -, nao deixam</p><p>de ser distintos. Um e composw de wdos os estados mentais</p><p>que dizem rcspeiw apenas a n()s mesmos e aos acontecimentos</p><p>da nos sa vida pessoal: eo que se poderia chamar de ser indivi</p><p>dual. 0 outro c urn sistema de ideias, sentimenros e hiibiws que</p><p>exprimem e m nos nao a nossa personalidade, mas sirn 0 grupo</p><p>ou os grupos diferentes dos quais fazemos pane, rais como as</p><p>cren~as religiosas, as cren~as e praticas morais, as tradi~6es na</p><p>cionais ou profissionais e as opini6es coletivas de todo tipo. Este</p><p>conjunto forma 0 sef social. Constituir este ser em cada urn de</p><p>nos e 0 objetivo cia cducac;ao.</p><p>Alias, e ai que sc manifesta melhor a irnpordineia do seu pa</p><p>pcl e a fecundidade da sua ac;ao. Dc faro, este ser social nao</p><p>somente nao se cncontra ja pronto na constituiC;ao primitiva do</p><p>homem como tarn bern nao resulta de urn desenvolvimento es</p><p>pomaneo. Espomancamente, 0 homem nao tinha tendencia a</p><p>sc submeter a uma allwridade poiftica, respeitar uma disciplina</p><p>moral, dedicar-se e sacrificar-se. A nossa natureza congenita nao</p><p>aprcsentava nada que nos predispllsessc necessariamente a nos</p><p>tornarmos servidorcs de divindades, emhlemas simb6licos da</p><p>socicdade, a Ihes prcstarmos cllito ou a nos privarmos para hon</p><p>d-Ias. Foi a pr6pria sociedade que, a medida que ia se formando</p><p>c se consolidando, tiruu do sell seio estas grandes fon;as mora is</p><p>110 Co[e~ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>diante das quais 0 homem scntiu a sua inferioridadc. Ora, com</p><p>eXCe\!30 de tendencias vagas c incenas que podcm ser auibufdas</p><p>a hcrcdirariedade, ao cntrar na vida, a crianlYa tcaz apenas a sua</p><p>naUlreza de indivfduu. Partama, a cada nova gera~ao, a socieda</p><p>de se e nCQmra em prcsen~a de uma tcibula quase rasa sabre a</p><p>qual ela deve constru ir novamenre. E prcci so que, pelos meios</p><p>mais rapid os, ela subsriwa 0 sec egolsra c associal que Hea oa de</p><p>nascer por urn Dutro capaz de levar uma vida moral e social. Esta</p><p>e a abea da cduca9ao, cuja grandeza podemos reconheccr. Ela</p><p>nao se limita a refor~ar as tendencias naturalmente marcantes</p><p>do organismo individual, au seja, desenvolver potencialidades</p><p>ocultas q ue s6 estao esperando para serem reveladas. Ela cria</p><p>um novo ser no homem, e este homem e feiro de tudo 0 que</p><p>h" de melhor e m n6s e de tudo 0 que d" valor e dignidade a</p><p>vida. Esta virtude criadora e, alias, um privilegio cspecif1co da</p><p>ed uCa9ao humana. A que os animais recebem e complemmenre</p><p>diferente, se e q ue podemos c harnar de eduea9ao 0 trei namen</p><p>to progressivo ao qual eles sao submeridos por sellS pais. Este</p><p>treinamcnto bern pode acclerar 0 desenvolvimcnto de eertos</p><p>instinros que estao latentcs no an imal, mas nao 0 inieia a uma</p><p>nova vida. Ele faeilita 0 movime nto das fUI190es natura is, mas</p><p>nao eria nada. lnsrru fdo pcla mae, 0 fi lhore sa bed voar ou fazer</p><p>o ninho de forma mais dpida, mas nao aprendera qU3se nada</p><p>a oao ser arr3ves de sua cxperiencia individual. E que os animais</p><p>ou vivcm fora de todo estado social ou formam sociedades bastan</p><p>te simples, que funcionam a partir de mecanismos inscimivos que</p><p>C'dda indivfduo carrega consigo perfeitameme constiwfdos desde 0</p><p>nascimento. Ponamo, a educac;ao nao pode acresccntar naela de es</p><p>sencial a nawreza, vista que esta ultima e inteiramenre suficiente,</p><p>tanto para a vida do grupo quanto para a do inelividuo. No homem,</p><p>Educac;ao e Sociologia 111</p><p>ao contdrio, as aptidoes de todo t ipo que a vida social sup5e sao</p><p>complexas de mais para poderem, de certo modo, encarnar-se</p><p>nos recidos e marerializar-se sob a fo rma de predisposi~oes orga</p><p>nicas. Poc conseguime, elas nao poclem ser transmiridas de uma</p><p>gerac;ao para a ouna atravcs da heredira riedade. E a educac;ao</p><p>que garanrc a rransmissao.</p><p>Este aspecto marcame cia cducac;ao humana e 0 fato de 0 ho</p><p>mem re-Io senrido bem cedo podem ser comprovados atraves de</p><p>uma cerimonia realizaela em muitas sociedades: a inicia9ao. Ela</p><p>ocorre quando a educa~ao term ina - em geml, cIa ate feeha 0 ul </p><p>timo perfodo em que as anciaos estao concluindo a insrru~ao dos</p><p>rapazes, revelando-Ihes as crenc;as mais fundamentais e os rims</p><p>mais sagraclos da tribo. Depois que cia acaba, 0 sujeito que a river</p><p>recebido passa a oClipar urn lugar na sociedade. Elc se destaca do</p><p>grupo das tnulheres, no meio das quais viveu durante toela a sua</p><p>infan cia, e se junta aD dos guerre iros, dentro do qual tern a partir</p><p>de entao umCl posic;ao bern definida. Ao mesmo tempo, ele toma</p><p>eonscicncia do seu sexo, cujos direitos e deveres passa a rer, ja</p><p>qlle se tornou lim hom em e um eidadao. Ora, lima crcn93 univer</p><p>salme nrc difundida em wdos estes povos e que este sujeito, pelo</p><p>pr6prio faw de ter sido iniciado, torna-se urn homem inteiramen</p><p>te novo: cle muda de personalidade c ate de nome, 0 q ual nao e</p><p>e ntaO considerado como urn simples signo verbal, mas sim como</p><p>um elemento essencial da sua pessoa. A iniciaC;ao e vista como</p><p>um segundo nascime nto. A mente primitiva simboliza esta rrans</p><p>formac;ao imaginando qlle urn principia espiritual, lima especic</p><p>de alma nova, encarnou-se no indivfduo. Porem, se e1iminarmos</p><p>as form as miticas que cnvolvem esta erem;:a, nao veremos, sob 0</p><p>simbolo desta ideia e de forma obscura, que a educat;:ao cria urn</p><p>ser novo no homem? Trata-se do ser social.</p><p>112 Cole~ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>No entanto, pode-se objcrar, se de fato e possfvel conceber</p><p>que as qualidades propriamenre marais s6 podcm sec susciradas</p><p>e m nos poc uma actao vinda do exterior, uma vez que elas im</p><p>poem priva<;6es ao individuo e reprimem os seus movimentos</p><p>naturais, nao haveria outras qualidades que todo hom em tern</p><p>interesse e m adqu irir c busca espontaneam ente? Pe nsemos, por</p><p>exempl0, nas diversas qualidades da intcligencia q ue the pcrmi</p><p>tern adaptar melhor a sua conduta a natureza das coisas. Pcnse</p><p>ruos tambem nas quaJidades ffsicas c em tudo 0 que contribui</p><p>para 0 vigor e a sa ude do organismo. Com rela93.0 a cstas lilti</p><p>mas, pelo menus, parece que a ed uca9ao, ao desenvolve-Ias, nao</p><p>fac;a mais do que wmar a dianteira do pr6prio desenvolvimemo</p><p>natural , ai<;ando 0 individuo a urn cscado de perfei9aO re lariva a</p><p>qual ele tende por si mesmo, embora possa alcan9a-lo de forma</p><p>mais rapida com a ajuda da sociedade.</p><p>Porem, apcsar das aparencias. 0 que rnostra be rn que, ta mo</p><p>aqui como alhurcs. a educa~ao satisfaz acima de rudo necessida</p><p>des extern a~, ou seja. sociai s, e que existem sociedades em que</p><p>estas qualidadcs nao foram absolutamente cultivadas e que, em</p><p>todo caso, foram compreendidas de modo</p><p>muito diferente, de</p><p>pendendo das sociedades. Nem todos as povos rccanheceram</p><p>as vantagens de uma s6lida cu ltura intelectual. A ciencia e 0</p><p>espfrito critico, as quais valorizamos tanto atualmente, durante</p><p>muito tempo foram vistas com dcsconfiantya. N ao conhecemos</p><p>uma grande doutri na segundo a qual sao bem-avcnturados as</p><p>pobres de cspfri to? Nao se deve pensar que esta indife ren9a</p><p>com re la9ao ao saber teoha sido artificialmcnte imposta aos ho</p><p>mens contra a natureza deles. E les nao tin ham por si mesmos</p><p>nenh um descjo de cicncia, simplesmente porque as sociedades</p><p>das quais eles faziam parte nao sentiam a men or necessidade.</p><p>Educa~ao e Sociologia 113</p><p>Para poder viver, des prccisavam ames de rudo de tradi~oes</p><p>fortes e respeitadas. Ora, a tradi tyao nao desperta 0 pensamcnto</p><p>e a reftexao. mas tende, ao contrtt rio, a excl ui-los. 0 mesmo va le</p><p>para as qualidades ffsieas. Se 0 es tado do meio social incl inar</p><p>a conseiencia pllblica para 0 asce tismo, a educa~ao ffsica sed</p><p>automaticamente reje itada para 0 segundo plano. E urn pouco</p><p>o que acontecia nas escolas da ldade Media. Oa mcsma forma,</p><p>dcpendendo das linhas de opiniilo, esta mesma cduca~ao sera</p><p>emendida nos mais dife rentes semidos. Em Esparta, cia tinha</p><p>como objetivo sobretudo endurecer os mcmhros contra a ca n</p><p>satyo; em Arenas, e la era urn meio de modclar bel os corpas para</p><p>serem admirados; na epoca da cavalaria, espcrava-se que e la</p><p>formasse guerreiros age is e flexiveis; hoje em dia, cia s6 visa a</p><p>higiene e se preocupa sobretudo ern comer os pc rigosos cfc itos</p><p>de li ma cultura imelectual demasiado intensa. Assim, 0 ind i</p><p>viduo s6 busca as quaJidades que a primcira vista parccem tao</p><p>espomaneamente desejaveis q uando a socicoade 0 ineita nesta</p><p>dire930. E e le as busca da maneira que cia Ihc prescreve.</p><p>Voces estao venda a que ponto a Psicologia pura e simples e</p><p>insufieiente para 0 pedagogo. Como eu mostTci agora h1. poueo,</p><p>nao somente e a sociedade que tta9a 0 ideal que 0 indivfduo deve</p><p>realizar atraves da eduC<l9aO, como tambem nao ha tenoencias</p><p>determinadas na natureza individual, ou seja, nao existem esta</p><p>dos definidos que sejam como uma primeira aspiratyao a este</p><p>ideal e que possam ser vistos como a forma interior e antecipa</p><p>da do mesmo. Sem duvida, isw !laO significa que nao existam</p><p>em n6s aptid6es bastante gerais. scm as q uais cstc idea l seria</p><p>obviamente irrealizavel. Se 0 hom em pode aprendcr a se sacri fi</p><p>car, e porque ele e capaz de sacriflcio; se cle pade se submeter</p><p>a disciplina da ciencia, e porque e le sa be se adaptar a mesm3. S6</p><p>114 Colt(,'<lo Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>peIo fato de sermos parte integrantc do universa, somas capazes</p><p>de prcocuparmo-nos com outras coisas a1em de nos mesmos; as</p><p>sim, cxiste em n()s I1ma primeira impessoalidade que peepara ao</p><p>dcsprcndimcnto. Oa mesma forma, 56 pelo fato de sermos seres</p><p>pensanrcs, temos cerra tendencia ao conhecimento. Purem, urn</p><p>abismo separa esras predisposi~6cs vagas c confusas, misturadas</p><p>alias a todo tipo de predisposi90es contrarias, e a forma tao bern</p><p>definida e singular que elas adotam sob a a9ao da sociedadc.</p><p>Mesma corn a analise mais perspicaz, e impasslvel prever 0 que</p><p>estes germes indistintos se tornarao, uma vez que a coletivi</p><p>dade os river fecundado, pais esta ultima nao se canrenta em</p><p>intensifica-Ios, mas acrescenta-Ihes mais alguma coisa. Ela lhes</p><p>fornece a sua pr6pria energia e, par isto mesma, transforma-os,</p><p>produzindo efeitos que nao estavam primitivamente cantidos</p><p>neles. Logo, mesmo que a conscicncia individual nao fosse mais</p><p>urn misrerio para n6s e a Psicologia, uma ciencia completa, ela</p><p>nao poderia dizer ao professor 0 objetivo que ele deve buscar.</p><p>S6 a Sociologia pode ou nos ajudar a compreendc-Io, ligando-a</p><p>aos estados sociais dos quais ele depende e os quais ele expres</p><p>sa, ou a descobri-Io, quando a conscicncia publica, pecturbada e</p><p>incerta, nao sabe rna is a que ele deve ser.</p><p>III</p><p>Contudo, se 0 papel da Sociologia e preponderante para a de</p><p>termina9ao dos fins que a eduCa9aO deve buscar, sera que ela rem</p><p>a mesma importancia no que diz respeiro a escolha dos meios?</p><p>Ai, a Psicologia volta em cena. Embora 0 ideal pedag6gico</p><p>expresse necessidades socia is antes de tudo, ele s6 pode se rea</p><p>lizar nos e pelos individuos. Para que ele seja algo mais do que</p><p>uma simples conCeP9ao mental e uma va injun9ao da socieda-</p><p>Educacao e Sociologia 115</p><p>de aos seus membros, e preciso descobrir 0 meio de fazer com</p><p>que a consciencia da crian9a se conforme a ele. Ora, a conscicn</p><p>cia tem as suas pr6prias leis, as quais e preciso conhecer antes</p><p>de modificar, se quisermos evitar as tentativas empfricas que</p><p>a Pedagogia busca justamente reduzir ao minima. Para poder</p><p>estimular 0 desenvolvimento da atividade em uma cecta dire9:l0</p><p>e preciso saber quais sao os mecanismos que a movem e a natu</p><p>reza deles. S6 assim sera possivel aplicar ai, com conhecimento</p><p>de causa, a ac;:ao adequada. Sera que se trata, par exemplo, de</p><p>dcspertar 0 amor da patria ou 0 sentimenro de humanidade? Sa</p><p>bcremos orientar melhor a sensibilidade moral dos alunos neste</p><p>au naquele sentido quando tivermos n090es mais completas e</p><p>precisas sobre 0 conjunto dos fen6menos que chamamos de ten</p><p>dencias, habitos, desejos, emo90es, etc., sohre as divcrsas condi-</p><p>90es que os regem e sabre a forma soh a qual eles se manifestam</p><p>na crian9a. Con forme virmos as tendcncias como produtos das</p><p>experiencias agradaveis ou nao que a esp6cic viveu au, ao C011-</p><p>trario, como urn faro primitivu anterior aos cstados afetivos que</p><p>acompanham 0 seu funcionamenro, devcrcmos agir de mod os</p><p>bastante diferentes para regular 0 seu desenvolvimento. Ora, e</p><p>a Psicologia e, em especial, a Psicologia Infantil que cahe resol</p><p>ver estas questoes. Partanto, em bora ela seja incompetente para</p><p>fixar 0 objetivo, ou melhor, os ohjetivos da educa~ao, ela certa</p><p>mente tem urn papel util a descmpenhar na constirui9ao dos</p><p>metodos. E mais: como nenhum metodo pode ser aplicado da</p><p>mesma maneira nas diferentcs erianc;:as, e mais uma vez a Psi</p><p>cologia que deve nos ajudar a nos situar em meio a divcrsidade</p><p>das inteligcncias e carateres. Infclizmente, sabemos que ainda</p><p>estamos longe do momento em que cia real mente estari apta a</p><p>satisfazer este desideratum.</p><p>116 Cole~ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>Portanw, nao se deve ignorar as vantagens que a ciencia do</p><p>indivfduo pode oferecer it Pedagogia, cujo valor n6s vamos reco</p><p>nhecc r aqui. No e ntamQ, mesmo nos amhitos em que ela e uti l</p><p>para 0 pedagogo esclarecer certos problemas, cia esta lange de</p><p>poder dispensar a Sociologia.</p><p>Primeiro, ja que as fins da educac;ao sao sociais, os mcios</p><p>pelos quais estes fins podem sec alcam,;ados dcvcm ncccssa</p><p>riameme ree 0 mesmo carater. E, de faro, dcntre todas as ins</p><p>titui<;6es pedagdgicas, talvez oao haja ncnhuma que nao seja</p><p>analoga a uma institui<;ao social, cujos aspectos principai s ela</p><p>reproduz de forma rcduzida c como que abreviada. Tanto na</p><p>escola quanto na cidadc, impoc-sc uma disci pi ina. As regras qu e</p><p>fixam os devcrcs dos alunos sao compara,veis as que prescre</p><p>vern a condura clos homcns feitos. As puni90es e recompensas</p><p>assuciadas as prim c iras sc parecem com as que as segu ndas san</p><p>cionam. Ensinamos as criam;as a eiencia ja fei[a, mas a ciencia</p><p>que cs[a sen do fc ita cambe m se ensina. Ela nao fica fechada</p><p>no ccrcbro daquclcs que a concebem, 56 se mrnando realmente</p><p>ativa sc for compartilhada com as DU[fOS homens. Ora, a nature</p><p>za dcsta con"lunicac;ao, que coloca em pdrica wda uma cede de</p><p>mccanismos socia is, constiwi um ensino que, embora se dirija</p><p>a adultos, nao sc diferencia daquele que 0 aluno recebe do seu</p><p>mcstrc. Nao se diz, a li as, que as sa bios sao os mes[res c10s seus</p><p>contcmporaneos? Nao se chama de escolas as grupos que se</p><p>formam em wrno c1 eles?8 Podectamos dar varios exemplos. E</p><p>que, de faw, como a vida escolar nao</p><p>passa do germe da vida so-</p><p>8. Cf. \:VILLMANN, Octo. Didoktik ols Bildllllgsleh,.e - Nach i hr~n Be</p><p>ziehungen zur Sozialforschung und zur Geschichrc der Bildun,e;. Vol. 1.</p><p>Leipzig: Gr bner, 1882. p. 40.</p><p>Educa~ao e Sociologia 117</p><p>cial, assim corno esra ulrima nao passa cia contin uac;ao e mawci</p><p>dade daquela, os principais processos pel os quais uma fundona</p><p>se encontram obviamente na outra. Portanm, pode-se esperar</p><p>que a Sociologia, ci2ncia das in stitu i ~6es sociais, ajude-nos a</p><p>compreender 0 que sao (ou a conjeturar 0 que devem sec) as</p><p>institui9ues pedag()g:icas. Quanto me lhor conhecermos a socie</p><p>dade, melhor pcrcc bcremos wdo 0 que se passa no microcosmu</p><p>sucial que a escola 6. Voces estao venda como, ao contrario, con</p><p>vern uriiizar com prudencia e rnodera«;3.o os dados da Psicologia,</p><p>rncsmo quando se [fata de de terrninar os metodos. Pm si 56, ela</p><p>nao podcria nos forn ecer os elementos necessarios para cons</p><p>rruir uma tecnica que, por defini«;ao, rira 0 sell pror6ripo nao do</p><p>indivlduo, mas sim da cole[ividade.</p><p>Alias, as esrados sociais dos quais os fins pedag6gicos depen</p><p>dem nao limitam a stla a«;ao af. Eles tamb6m afetam a concep</p><p>~ao dos metodos: a natureza do obje[ivo impliC'd em parte ados</p><p>meios. Se a sociedade se orientar, por exemp!o, em um senti do</p><p>individualisra, todos os processos educacionais que possam re</p><p>primir 0 indivfduo e ignorar a sua espontaneidade interna serao</p><p>considerados como inrolenlveis e reprovados. Se, ao contrario,</p><p>sob a pressao de circunstancias dun'iveis ou passageiras, ela sen</p><p>tir novamente necessidade de impor lim conformismo mais ri </p><p>goroso a rodas, sera proibido [udo 0 que possa provocar al6m da</p><p>conta a iniciativa da inteligencia. Na realidade, rodas as vezcs</p><p>em que 0 sistema de metodos educativos foi profundamentc</p><p>uansformado, foi sob a influencia de uma daquelas grandes COf</p><p>rentes socia is cuja a«;1\o se repercmiu em todas as areas da vida</p><p>coleriva. Nao foi em fun~ao de descobertas psicologicas que 0</p><p>Renascimento opos tOdo um conjullw de novas mctodos aos</p><p>que a ldade Media u[iliz3va. 0 que aconteceu foi que, como</p><p>118 Colecao Textos Fundantes de Educac;ao</p><p>consequencia de mudan<;as ocorridas oa estrutura das socieda</p><p>des europcias, lima nova concep~ao do hornem c do seu lugar</p><p>no mundo acabou surgindo. Oa mesma forma, os pedagogos</p><p>que, no final do seculo XVIII au no come,o do XIX, come,a</p><p>ram a substituir 0 metoda abstrato pelo intuitivo, esravam an</p><p>tes de tudo reftetindo aspiragocs vigen res naquela epoca. Nem</p><p>Basedow, nem Pestalozzi e nem Froebel eram grandes psic6lo</p><p>gos. 0 que a doutrina delcs cxprime e, sobretudo, respeito pela</p><p>liberdade interior, horror diante de qualquer repressao e amor</p><p>pelo hornem e, logo, pcla crianga - nogoes que se encontram na</p><p>base do nos so individualismo maderno.</p><p>Assim, seja qual for 0 aspecto pelo qual abordemos a edu</p><p>cagao, ela semprc se apresenta com 0 mesmo Carater. Sejam os</p><p>fins que e1a busca ou os meios que ela emprega, sao semprc</p><p>necessidades sociais que ela satisfaz e ideias e sentimentos co</p><p>letivos que cia expressa. Sem duvida, 0 proprio indivfduo sai</p><p>ganhando com este mecanismo. Nos ja nao admitimos ciara</p><p>mente quc aquilo que temos de melhor e devido a educa<;ao?</p><p>E aquilo que temos de melhor e de origem social. Portanto,</p><p>devemos sempre nos concentfar no estudo da sociedade; e</p><p>somcnte nele que 0 pedagogo vai encontrar os princfpios da</p><p>sua investiga<;ao. A Psicologia bern pode Ihe apontar qual e a</p><p>melhor maneira de agir para apliear na crianc;a estes principios,</p><p>uma vez que as mesmos estiverem consolidados. Porem, ela</p><p>na~ pode ajuda-lo a descobri-Ios.</p><p>Para eonciuir, eu gostaria de aerescentar que, se ja existiu</p><p>uma epoea e urn pais em que 0 ponto de vista soeiol6gico se im</p><p>pas de modo particular mente urgente aos pedagogos, esta epo</p><p>ca c este pais e 0 infcio do seculo XX e a Franc;a. Quando uma</p><p>sociedade se encontra em urn estado de relativa estabilidade e</p><p>Educar;ao e Sociologia 119</p><p>equilibrio temporario, como, par exemplo, a sociedade francesa</p><p>do seculo XVII; quando, por conseguinte, estabelece-se urn sis</p><p>tema de educaC;ao que, igualmente durante certo tempo, nao e</p><p>contestado por ninguem, as (micas questoes urgentes que se co</p><p>locam sao questoes de aplicaC;ao pdtica. Nao emerge nenhuma</p><p>dtlVida s6ria sabre 0 objetivo a alcanc;ar e nem sobre a orientac;ao</p><p>geral dos metodos. Portanto, s{) pode haver controversia com</p><p>relac;ao a melhor maneira de colod.-los em pratica - e estas difi</p><p>culdades podem ser resolvidas pcla Psicologia. Eu nao preciso</p><p>ensinar a voces que a firmcza intclectual e moral nao predomina</p><p>mais no nos so seculo, 0 que, ao mesmo tempo, e a sua miseria</p><p>e a sua grandeza. As profundas transformas;oes que as socieda</p><p>des contemporaneas sofreram ou cstao sofrendo demandam</p><p>transformaC;6es correspondentes na EducaC;ao naciunal. Porem,</p><p>em bora realmenre simamos que mudanc;;as sao necessarias, nao</p><p>sabemos muito bern como elas devem ser. Sejam quais forem</p><p>as convicc;6es pessoais dos indivfduos ou partidos, a opiniao pu</p><p>blica permanece indecisa e apreensiva. Portanto, nos nao abor</p><p>damos 0 problema pedagogico com a mesma serenidade que</p><p>os homens do seculo XVII. Nao se trata mais de colocar ideias</p><p>prontas em pratica, mas sim de descobrir ideias que nos guiem.</p><p>Como poderfamos faze-Io se nao observassemos a propria ori</p><p>gem da vida educativa, ou seja, a sociedadc? Logo, e a sociedade</p><p>que e preciso estudar e sao as suas necessidades que e preciso</p><p>conhecer, ja que sao estas tIitimas que 6 prcciso satisfazer. Fi</p><p>car olhando so mente para 0 proprio umbigo significa desviar os</p><p>nossos olhares da propria realidade que devemos acessar enos</p><p>impedir de compreender 0 movimento que leva 0 mundo ao</p><p>nosso red or, bern como nos mesmos junto com ele. Portanto,</p><p>ao dizer que uma cultura sociol6gica nunca foi mais necessaria</p><p>120 Coler;ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>ao ed ucador, naa aehu que CStou deixando-mc guiar por um sim</p><p>ples preconceito 011 sucumbindo a urn amor cxagerado por uma</p><p>ciencia que cultivci durante a minha vida intcira. Nao e que a</p><p>Sociolugia possa nos dar de mao beijada proccssos ja ()fontos, os</p><p>quais basta urilizar. Alias, sent que poderia ser assim? Pacem, eia</p><p>pode, mais c melhor, forn ecer-nos aq uilu de que tcmos mais ur</p><p>gcn rcmc me necessidade, quero dizer urn corpo de idcias dircti</p><p>vas que sejam a alma da nossa pratica, sustcntando-a, dando urn</p><p>scnrido a nossa avao e nos ligando intimamcmc a mcsma, 0 que</p><p>e lima cond i.yao obrigat6ria para que esta a~ao scja fccunda.</p><p>Nascido em 1.5 de abril de 1858, em</p><p>Epinal, Francta, de familia de origem</p><p>judia e de pai rabino, Emile Ourkhelm</p><p>e 0 principal representante da escola</p><p>de sociologia francesa. Ao lado de</p><p>Karl Marx e de Max Weber, Ourkheim</p><p>e considerado um dos pais da</p><p>sociologia. Ele define sua voca~ao</p><p>sociol6gica como missao de fundar</p><p>uma nova ciencia para uma nova</p><p>sociedade, qual seja, a socledade</p><p>industrial, fato que 0 diferencia de</p><p>Marx e de Weber, que se dedicam a</p><p>Sociologia, que tem por fundamentos,</p><p>respectivamente, a Economia e a</p><p>Politica. Com isso, contribui para 0</p><p>desenvolvimento do espirito</p><p>univers itario, na Europa, inaugurando</p><p>as cadeiras de SocioJogla e de</p><p>Antropologia Social. Casou·se e teve</p><p>um casal de filhos. Ele vlveu 0 clima</p><p>das grandes convulsoes socials que</p><p>abalaram a Europa desde 1848 ate a</p><p>Primeira Guerra Mundial. Em fun~ao</p><p>desse clima, Durkheim propoe-se a</p><p>fundar uma nova ciencia que de</p><p>conta da explica~ao da sociedade</p><p>que estaria nascendo desse processo.</p><p>Crla entao a Ciencia da Moral. Em</p><p>1915, seu filho e morto, lutando, no</p><p>front de Salonique; em 1917,</p><p>Durkheim morre em Paris.</p><p>Imagem (00)</p><p>Imagem (2)</p><p>Imagem (3)</p><p>Imagem (4)</p><p>Imagem (5)</p><p>Imagem (6)</p><p>Imagem (7)</p><p>Imagem (8)</p><p>Imagem (9)</p><p>Imagem (10)</p><p>Imagem (11)</p><p>Imagem (12)</p><p>Imagem (13)</p><p>Imagem (14)</p><p>Imagem (15)</p><p>Imagem (16)</p><p>Imagem (17)</p><p>Imagem (18)</p><p>Imagem (19)</p><p>Imagem</p><p>(20)</p><p>Imagem (21)</p><p>Imagem (22)</p><p>Imagem (23)</p><p>Imagem (24)</p><p>Imagem (25)</p><p>Imagem (26)</p><p>Imagem (27)</p><p>Imagem (28)</p><p>Imagem (29)</p><p>Imagem (30)</p><p>Imagem (31)</p><p>Imagem (32)</p><p>Imagem (33)</p><p>Imagem (34)</p><p>Imagem (35)</p><p>Imagem (36)</p><p>Imagem (37)</p><p>Imagem (38)</p><p>Imagem (39)</p><p>Imagem (40)</p><p>Imagem (41)</p><p>Imagem (42)</p><p>Imagem (43)</p><p>Imagem (44)</p><p>Imagem (45)</p><p>Imagem (46)</p><p>Imagem (47)</p><p>Imagem (48)</p><p>Imagem (49)</p><p>Imagem (50)</p><p>Imagem (51)</p><p>Imagem (52)</p><p>Imagem (53)</p><p>Imagem (54)</p><p>Imagem (55)</p><p>Imagem (56)</p><p>Imagem (57)</p><p>Imagem (58)</p><p>Imagem (59)</p><p>Imagem (60)</p><p>Imagem (61)</p><p>Imagem (62)</p><p>nas. Atualmcnte, admire-se em geral que 0 sell caratcr abstratO</p><p>diswrccu, em larga medida, a es peculac,;:ao politica do seculo</p><p>XVIII, por exemp lo: individualista em cxcesso, desatada de</p><p>mais da hi s«)ria, ela frequentemcnte legifera para urn homem</p><p>de cOTIven9ao, independence de qualquer meio social defini</p><p>do. 0 progresso que, no seculo XIX, as cie ncias poHticas rea</p><p>lizaram, sob a inflllencia da hisr6ria e das filosofias inspiradas</p><p>na hist6ria, progresso em cuja direyao se orientam, no final do</p><p>seculo, wcias as ciencias morais, cleve, pur sua vez, ser rcaliza</p><p>do pela Filosofia da Educa~iio.</p><p>A ed ucatyao c coisa social: isw qucr tiizer que ela coloca a</p><p>crianr;a em contata com urna determinada sociedade, e nao com</p><p>a sociedade in genere. Se esta afi rma~ao for verdadeira, e la nao</p><p>somente cleve comandar a reflexao especlilariva sobre a edu</p><p>cat;;ao, como tambem exercer influencia sobre a pr6pria ativi</p><p>clade educariva. Em real idade, esta influcncia 6 incontestivel;</p><p>em dire:;iw, ela e com freqllencia contestaua. Vamos examinar</p><p>algumas das resistcilcias que a afirma~ao de Durkhei 111 provoca</p><p>quandu expressa.</p><p>14 Cole~ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>Primciro se repercute a oposi~ao que sc pode chamar de unl</p><p>vcrsitaria ou humanista. E la acusa a Sociologia de incentivar um</p><p>nacionalismo esrreiw) e rnesmo de favorecer as interesses do</p><p>Estado, e, mais ainda, dos de urn regime poifticQ, em detrimen</p><p>to dos da humanidade. Durante a guerra, com frequencia upu</p><p>seram a Educa9ao germanica e a latina: a primeira, puramcntc</p><p>nacional e visando somcme 0 beneficia do Esmdu; e, Csta ulti</p><p>ma, liberal e humana. Scm duvida, disserarn, a edllca~ao cduca a</p><p>crian9a para a parria, mas tOlllbim para a humanidadc. Em SlI ma,</p><p>de diversas formas, estabelece-se urn antagonismo entre as se</p><p>guintes refmos: educas:ao social, educat;:ao huma na, sociedade e</p><p>humanidadc. Ora, 0 pensamento de Durkheim plana bem aci</p><p>ma de obje<r'0es deste genero. Enquanto educador, ele nunCa</p><p>teve a inten~ao de fazer os fins nacionais preval ecerem sabre os</p><p>fins humanos. Oizer que a educa~ao e coisa social nao significa</p><p>formular urn programa de Educa~ao, mas sim constatar LIm faro.</p><p>Durkheim sustenta este faro como vcrdade iro, e m qualquer lu</p><p>gar, seja qual for a tendencia predominante, aqui au la. 0 cos</p><p>mopolitismo nao e menos social do que 0 nacionalismo. Exis</p><p>rem civilizar;6es que incitam 0 cdw.:ador a elevar a patria acima</p><p>de tudo, olltras que 0 incitam a subordinar os fins nacionais aos</p><p>humanos, au melhor, a harmoniza-Ios. 0 ideal universalista csta</p><p>ligado a uma civi li za~ao sinrcrica que tende a combinar todas as</p><p>outras. Alias, no mundo conremporaneo, cada na~ao aprcsen</p><p>fa 0 seu cosmopolitismo, 0 seu humanismo proprio, no qual se</p><p>pode reconhecer 0 seu rem peramenro. De raw, qual e, para n6s,</p><p>franceses do seculo XX, 0 va lor re lativo dos deve res pcrante a</p><p>humanidade e 0 dos perantc a parria ? Como eles pod em entrar</p><p>em conflito? Como se pode eoncilia-Ios? Nobres e dificeis ques</p><p>toes, as quais 0 sociulogo nao resolve em proveiro do nacionalis-</p><p>Educa~ao e Sociologia 15</p><p>m~, definindo, como e le 0 faz, a educar;ao. Quando elc abordar</p><p>estes problemas, suas maos estarao livres. Reconhecer 0 carater</p><p>social que rcalmenre pertencc a educar;ao nao diz nada sobre a</p><p>maneira como scrao analisadas as for~as morais que orientam 0</p><p>cducador em direr;6es diversas ou opostas.</p><p>A mes ma res posta vale contra as obje~6es individualisras.</p><p>Durkheirn define a educa.:;ao como uma socializa9ao da crianr;a.</p><p>Mas, entaO, podc-se pensar, 0 que e feiro do valor da pessoa</p><p>humana, da iniciativa, da responsabilidade, do aperfei~oamento</p><p>proprios do indivfduo? Arraigou-sc taO profundamente 0 habito</p><p>de opor a sociedade c () individuo que toda doutrina que use fre</p><p>quentcmente a palavra sociedade parece sacrificar 0 individuo.</p><p>Aqui, mais uma vez, ha urn equivac<.>. Se ja existiu urn homem</p><p>que foi um individua, uma pessoa, com tudo 0 que <.> rermo im</p><p>pl ica de originalidade criadora e resisrencia aos arrebaramentos</p><p>coletivos, este homem foi Durkheim. E a sua doutrina moral</p><p>corresponde tanto ao sell proprio cad,[Cr que nao seri a paradoxal</p><p>dar a esta dourrina 0 nome de individualismo. Seu primciro livro,</p><p>A divisiio do trobalho social, propoe [Oda uma filosofia da hist6ria</p><p>na qual a genese, a diferencia~ao e a liberra~ao do individuo sur</p><p>gem como 0 tra~o mais marcame do progresso da ci v iliza~ao; a</p><p>exalta~ao da pessoa humana, como 0 seu resultado atua!' E esta</p><p>filosofia da historia culmina na seguinte rcgra moral: dcstaque</p><p>se, seja uma pessoa. Como, entao, tal dautrina pode ria enxcrgar</p><p>na educa.:;ao urn processo qualquer de dcspersonaliza~ao? Se</p><p>criar uma pessoa constitui 3tualmente a objctivo da educa~ao, e</p><p>se educar consiste em socializar, vamos, porranro, concluir que,</p><p>segundo Durkheim, 6 possfvcl individualizar socializando. Este</p><p>e, no rundo, {} seu pensa mcnto. Pode-sc discurir sabre a ma</p><p>neira como cle concebe a cduca~ao da individualidade. Pocem,</p><p>16 Coll:"\30 Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>sua definic;ao de educa9aO provem de urn pensador qu e, em</p><p>ncn hum mom ento, ignora ou subestima 0 papcl all 0 valor do</p><p>indivfduo. E e preciso dizer aos soci61ogos que e na analise da</p><p>educacao de Uurkheim que eles pc rceberao melhor a essencia</p><p>do seu pensamenco sobre as rcJa90es da sociedade e do indivi</p><p>duo e 0 papel dos indivfduos dc e lite no progresso social.</p><p>Por fim, em nome do idea l, pode-se tambem emergir uma</p><p>resistencia ao realismo de Durkheim. Ele ja [oi acusado de hu</p><p>milhar a razao c desalentar 0 esforyo, como se ele fizesse a apolo</p><p>gia sistematica de como e a realidade presente e permanecessc</p><p>indiferente a como e la deve ser. Para en tender como, pelo con</p><p>(rario, estc rcalismo sociol6gico lhe parece apto a dirigir a a98oO,</p><p>vejamos que ide ia ele nutria a respeito da Pedagogia.</p><p>II</p><p>Todo 0 ensi no de Durkhei m satisfa z uma necessidade pro</p><p>funda do sell intelecto, uma exigencia esscncial imposta pelo</p><p>proprio espirito cientifico. Durkheim sente uma verdadeira</p><p>rcpulsa com relayao as constru9oes arbitrarias e aos programas</p><p>de 39ao qu e traduzem somente as tcndencias de sells autores.</p><p>Rle precisa refletir sabre urn dado, uma rea lidade observavel, 0</p><p>que ele chama de coisa. Considcrar as fato s sociais como coisas</p><p>constitui a primeira regra do seu metodo. Quando tomava a pa</p><p>lavra sobre assumos relativos a moral, ele primeiro apresentava</p><p>fatos, coisas; e as se us proprios gestos indicavam que, embora</p><p>se tcatasse de coisas espirituais, nao materiai s, ele nao se limita</p><p>va a anal isar conceitos, mas aprcendia, mO$trava e manipulava</p><p>rcalidades. A educa9ao c uma coisa, ou, em outras palavras, urn</p><p>faro. Em realidade. em todas as sociedades, ele observa uma</p><p>edueavao. Conformemente a rradivoes, h1biros, regras expHci-</p><p>EdUC<I\30 e Sociologia 17</p><p>(as au impllcitas. em urn dctcrminado contexto de insritui90cS,</p><p>com uma aparelhagem propria, sob a influencia de idei as c sen</p><p>timentos colcrivos, na Fran9a, no seculo XX, educadorcs edll</p><p>(,~.;lm, e crian~as sao cducadas. 'Tuda isto pode sec dcscrito, anali</p><p>sado e explicado. A 110910 de Ciencia da Educavao e, portanw,</p><p>uma idcia completamente clara. Ela desempcnha 0 importante</p><p>papd de conhecer e compreender a realidadc. Nao se con funde</p><p>nem com a atividade efetiva do ed ucador, nem mesmo com a</p><p>Pedagogia, que visa a dirigir esra atividadc. A Educa9ao e 0 seu</p><p>objero: por es[a afirmayao, devemos cntender nao que ela tenda</p><p>aDs mesmos fins que a Educat;:ao, mas, pelo cOI1u.lrio, que e la a</p><p>supoe, visco que a observa.</p><p>Durkheim nao contesta de form a algllma que esta cit?: ncia</p><p>seja, em larga medida, de ordem psicol6gica. Somente a Psi</p><p>coiogia, baseada na Biologia, ampliada pel a Patologia, permite</p><p>compreender por que a cri anc;a hllmana precisa de ed ucac;ao,</p><p>em que ela se distingue do adu lro, como se formam e cvoJu</p><p>em</p><p>os sells senti dos, memoria, faculdades de associar;;ao e de atcn</p><p>C;ao, imagina9ao, pensamento abstrato, linguagem, sentimentos,</p><p>carater, for9a de vontade. A psicologia da criang3, ligada a do</p><p>homem adlliw c compJ etada pela psicologia propria do educa</p><p>dor, constitui uma das vias pe las quais a ciencia pode abordar 0</p><p>estudo da edllca9ao. Esta ideia e aceita universal mente.</p><p>Contudo, a Psieologia e apenas uma das duas vias de acesso</p><p>posslveis. Quem a seguir exclusivamente se exponi a abordar</p><p>SOrnente uma das duas faces do fato educa9ao. Isto porque, ob</p><p>viamente, a PsicoJogia e incompetente quando se deve dizer</p><p>nao mais 0 que e a crianca qlle recebe eduCa9ao, slla mane ira es</p><p>pecifica de assimila-Ia e reagir a ela, mas sim a pr6pria natUreza</p><p>da civilizar;ao quc a educacao rransmite e a aparelhagem a qual</p><p>18 Coler;ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>ela reeoere para transmitj-Ia. A Fran<;a do seculo XX dispensa</p><p>quarro Ensinos: 0 P rimario, 0 Secundariu, 0 Superior e 0 T 'ecn i</p><p>co, cujas reJa<;oes nao sao as mesmas que na Alemanha, Inglater</p><p>fa a u Estados Unidos. Seu E nsino Secundario se apoia no fra n</p><p>ces, !lnguas chlssicas, IIng uas vivas, hisr6ria c c ie nc ias; por volta</p><p>de 1600, c lc sc apoiava exclusivamente no latim c no grego; na</p><p>Id ade Media, na diai6rica. 0 nosso en sino abrc cspa<;o para 0</p><p>metoda inwirivo c experimental, 0 dos Escados Un ioos mais</p><p>ainda, enquanto que a Educa<;ao medieval e human ista era ex</p><p>clusivamente livresca. Ora, e claro que as institui<;6es escolares,</p><p>as disciplinas e as metodos sao faws sociais. 0 pr6prio li vro 6 urn</p><p>fata social; 0 cu lta do livro e 0 declfnio deste culta dependcm de</p><p>causas socia is. E diffcil ver como a Psicologia poderia concebc</p><p>las. A educat;ao fisica, moral e inteiectual que Ufna sociedade</p><p>oferece em um momentO de sua hist6ria e manifestamente da</p><p>cumpetencia da Sociologia. Para eswdar a educa~ao de forma</p><p>cientifica, como urn fato dado a observa93.0, a Soeiologia deve</p><p>colaborar com a Psieologia. Sob urn dos seus dois aspectos, a Ci</p><p>encia da Eduea~ao e uma ciencia sociol6gica. Era a partir desta</p><p>perspectiva que Durkheim a abordava.</p><p>Levado pela 16gica interna de seu pr6prio pensamemo, ele</p><p>estava ahrindo um novo caminho, sendo 0 precursor, e nao 0</p><p>imitador, de dourrinas atualmente bastante em yoga, as quais a</p><p>dele ultrapassa em clareza e fecundidade. A Alemanha eriou 0</p><p>te rmo Sozialpdtlagogik, as Estados U nidos, 0 termo Educatiol101</p><p>Sociology, que maream indubitavelmente a mesma tendeneia1</p><p>•</p><p>1. NATORp, Paul. SozialfJiidagogiJ.·- Theoric der Willenserziehung auf der</p><p>Grundlage der Gemeinschaf(. 3. ed. Sru ttg:m: Frommann. 1909 [1. cd. ,</p><p>1899]. Cf. as defi ni~ocs da F.r1umliona/ Soci%gJ' em MONROE, Paul. A</p><p>cyclopedia of F.dlJC(Jliolt. 'l olno \~ Nova York: Macmillan, 19 11 , p. 361.</p><p>Educat;'ao e $ociologia 19</p><p>Pore-m, sob estas palavras com freq uencia ainda sc misturam</p><p>coisas bern disrimas. Ha, por exemplo, de urn lado, uma orien</p><p>ta~ao mais ou menos incerta no sentido do estudo sociol6gico da</p><p>educafYao, tal como Ourkheim a eoncebe, e, do Olltro lado, um</p><p>sistema de Educa~ao que se preocupa mais especificamente em</p><p>preparar 0 homem para a vida social, formar 0 cidadao: StaolS</p><p>blirgerliche E1Ziehullg, como Kcrschensteiner2 0 chama. A ideia</p><p>americana de EdufX.Jti()/lai Sociology se aplica de maneira confusa</p><p>ao estudo sociol6gico da cduca~ao e, ao mesmo tempo, a intro</p><p>duc;:ao da Sociologia nas salas de au la, como materia de ensino.</p><p>A Ciencia tia Educa~ao, definida por Durkheim, e sociol6gica,</p><p>em uma accp<;ao bem mais clara do tenTIo.</p><p>Quanro ao que ele enrende por Pedagogia, nao e nem a ati</p><p>vidadc educativa propriarneme dira, nem a ciencia especulativa</p><p>da cd uca~ao. Trara-se da rea~ao sisrem,hica desta iiltima sobre</p><p>a primeira, efejto de uma reflexao que busca, nos resul tados da</p><p>Psicologia e da Socioiogia, principios para a conduta ou reform a</p><p>da cducafYao. Assim concebida, a Pedagogia poue ser idealista,</p><p>sem cair na utopia.</p><p>Que urn grande nurnero de pedagogos ilustres tcnha cedido</p><p>ao esplrito de sistema, atribufdo a educac;:ao urn objctivo inaces</p><p>sfvcl ou arbitrariamenre eseolhido, proposw processos arrificiais,</p><p>Durkheim na~ somenre naa 0 nega, como tambem nos previne</p><p>melhor do que qualquer um sohrc 0 perigo desta concep~ao. A</p><p>Sociologia cambate aqui 0 inimigo que cia esta acoswmada a</p><p>encontrar: em tad os os domfnios, na moral, na politica e mes</p><p>mo na economia politica, 0 cstudo cientifico das i n stitui~6es foi</p><p>2. KERSCHENSTEINER, Geor,e;. Der BegTif/ der sloatsbiirgerlicitm Ent.ie-</p><p>20 Cole~ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>prccedido por uma filosofia essencialmeme mti/icialista, que pre</p><p>tendia formular receitas para garantir aos indivfduos e aos povos</p><p>o maximo de felicidade, scm antes conhecer 0 bastante suas COI1-</p><p>dit;:6es de exisc8ncia. Nada pode sec mais conwhio aos habitus do</p><p>soci61ogo do que dizcr de entrada: "vejam como se cleve eclucar</p><p>as crian~as", fazcndo tabula rasa cia educaifao que Ihcs 6 realmen</p><p>ce oferecida. Estrmuras escolares, programas de cnsi no, mewdos,</p><p>tradic;.ues, habiws. rendencias, ideias e idcais dos professores sao</p><p>faws, cujas origens e evolUl;oes a Pedagogia busca descobrir, lon</p><p>ge de pretender mudar estes faws. A Educ3c;ao francesa e ex</p><p>trcmamente tradicional, pOlleo disposca a se encaixar nas formas</p><p>t6cnicas de merodos combinados; cia da imenso credito as facul</p><p>dades de intuic;:ao, taro, iniciativa dos professores; respeita a evo-</p><p>1lJ(;:ao livre da crian~a; e ate rcsulta, em grande parte, nao da as;ao</p><p>sistem:itica dos professorcs, mas sim da a~ao difusa e involumaria</p><p>do meio. Tudo ism e urn fato, que apresenta causas e responde.</p><p>grosse modo, as condis;ocs de existencia da sociedade franccsa.</p><p>Ponamo, a Pedagogia, inspirada na Sociologia, nao corre () risco</p><p>de fazer a apologia de urn sistema duvidoso ou de recomendar</p><p>uma mecaltiz.tJ-{iJo oa erian9a, que comprometeria () sell desenvol</p><p>vi memo espontanco. Assim se anulam as obje<;ocs de pensadores</p><p>eminentes, que se obstinam a opor Educa~ao e Pedagogia, como</p><p>se refletir sobre a a~ao exercida significassc necessariamente se</p><p>condenar a dcformar esra ac;:ao.</p><p>Entretanto, nao se deve concluir que a rcflcxao ciendfica seja</p><p>praticamcntc esteril e que 0 realismo provcnha de urn espirito</p><p>conservador, que aceita pregui90samente tudo 0 que a realidade</p><p>apresenta. Saber para prever e prover, ja dizia Augusto Comte,</p><p>da ciencia positiva. De fatD, quanto mals bern eonhecemos a</p><p>natureza das eoisas, mais chances temos de utiliza-la com eficacia.</p><p>Educa~ao e Sociologia 21</p><p>a educador e obrigado, por exemplo, a govcrnar a atCn9ao da</p><p>criarwa. Ninguem pode negar que ele a govcrnara rnelhor se eo</p><p>nhecer a natureza dela mais exatamentc. A Psicologia aca rreta,</p><p>porcanto, apljca~oes praticas, cujas regras para a Educa9aO sao</p><p>formuladas peJa Pedagogia. Da mesma forrna, a ciencia socio</p><p>l6gica da educay3.o rode aearretar aplica~6es praticas. Em que</p><p>consiste a laicizayao da moralidade? Quais sao suas causas? De</p><p>onde vern as resistcncias que ela provoca? Que dificuldades a</p><p>edueavao moral deve veneer quando se dissocia da rciigiosa?</p><p>Problema manifestamente social e atual para as sociedaues con</p><p>temponineas: como contescar que urn estudo desinteressado so</p><p>bre ° mesmo possa conduzir a formular regras pedag6gicas, nas</p><p>quais 0 professor frances do seculo XX ganharia em sc inspirar</p><p>para a sua pdtica educativa? As crises e conflitos sociais tern</p><p>causas, 0 que nao quer dizer que seja proibido buscar sardas e</p><p>remedios. As institui~6es nao sao nem absolutamente ftexiveis</p><p>e nem absolutamente refratarias a toda modifica~ao deliberada.</p><p>Adapta-las com prudencia aos seus pap6i s respectivos, adapta</p><p>las umas as outras e cada uma dclas a civiliza~ao na qual se in</p><p>corporam constitui urn bclo campo de a~ao para uma politica</p><p>racional e, quando sc trata de inscitui~6es educativas, para uma</p><p>pedagogia racional, ou seja, uma pedagogia que nao seja nern</p><p>conservadora c ncm rcvolucionaria, eficaz dentro dos limites em</p><p>que a a9ao dcl ibcrada do hOl'nem pode ser eficaz.</p><p>Assim, 0 rcalismo e 0 idealismo podem se conciliar. Os ideais</p><p>Sao realidadcs. Par exemplo, a Fran~a contemporanea tern urn</p><p>ideal intclcetual; ela concebe um tipo ideal de inteligencia e</p><p>o propoc as crian~as. Porem, este ideal e complexo e confuso.</p><p>Os publiciscas, que pretendem exprimi-Io, em geral mOstram,</p><p>cada urn por sua vcz, apenas uma das faces, lim dos elementos:</p><p>22 Co le~ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>elementos de origens, idades e, por assim dizer, orientac;:oes di</p><p>versas, elementos solidarios, uns para com certas tendencias so</p><p>ciais, outros para com tendencias diferentes au opostas. E passi</p><p>vel [ratar este ideal complexo como uma caisa, au scja, analisar</p><p>as seus componenrcs, determinar sua genese, suas causas e as</p><p>necessidadcs as quais des correspondem. Porem, este cswdo.</p><p>inicial mente desintcrcssado, e a melhor preparac;:ao para a esco</p><p>Iha que uma conscicncia scnsata pode desejar fa zer entre os di</p><p>versos programas de ens ino concehfveis e as regras a seguir para</p><p>aplicae 0 programa escolhido. Podemos dizer 0 mesma, mutatis</p><p>mlllmldis, sabre a educa.yao moral cas questues de detaIhe, assi m</p><p>como sobre problemas de ord em mais geral. Enfim, a opiniao,</p><p>o legislador, a administra9ao, as pais e os professores devem, a</p><p>rem po todo, fazer escolhas, seja para re formar profundamente</p><p>as insrirui\oes au faze-las funcionarem no cotidiano. Ora, eles</p><p>trabalham numa materia res istente que nao sc ucixa manipular</p><p>arbitrariamente: meio social , institlliyoes, habitos, tradiyoes e</p><p>tcndencias eoletivas. Enquanto depender da Sociologia, a Pe</p><p>dagogia ,sera uma prepara\!ao racional para esras cscolhas.</p><p>Durkheim dava a maior impordincia, nao somcntc enq uanto</p><p>intclcctual, mas tambem como cidadao, a esra conccpc;ao racio</p><p>nalista da a9ao. Embora [osse hosril it agira9ao reformi sta, que</p><p>pcrrurba scm melhorar nada, sobrerudo nas reformas negativas,</p><p>que dcsrroem sem propor algo novo, ele carregava a ac;ao nas</p><p>veias. No cnranto, para que a a\ao [osse fert il , ele sustenrava</p><p>que e la deveria envolver aqu ilo que e passivel, limitado, defi</p><p>nido, dcrerminado nas condi9oes sociais em que ela se exercer.</p><p>Dirigido a educadores, 0 seu ensino pedag6gico sempre apre</p><p>sentou urn cara,rer imediaramenre pr:1rieo. Absorvido em seus</p><p>outros trabalhos, ele nao teve tempo de se invcs tir em pesquisas</p><p>Educa~ao e Sociologia 23</p><p>puramcnrc especularivas sobre a eduea9ao. Em suas aulas, os as</p><p>suntos sao abordados de aeordo com 0 metodo cienrifico defi nido</p><p>ha poueo. Porcm, a cscolha dos mesmos e dirada pelas difieulda</p><p>des pd.tieas que 0 cducador publico encontra na Fran~a conrem</p><p>poranea, e e a conclusoes pcdag6gicas Clue 0 professor chega.</p><p>III</p><p>Durkheim deixou, eompletamenre rcdigido, 0 manuSCfl to</p><p>de urn curso dividido em dezoito au las sabre 0 ensino do moral</p><p>no Escola' Pl'imaria. Vamos percorrer esta obra rapidameorc. A</p><p>primeira aula e lima introdUl,;ao sobre a moral laiea. Durkh ci m</p><p>define a rarefa moral que ineumbe ao professor na Franya con</p><p>tcmpodinca: para ele, trata-se de dar uma educa~ao moral laica</p><p>e racionalista. Esra laicizCl<;ao da moralidade e determinada por</p><p>todo 0 dcsenvolvimento hist6rico. Mas ela e diffei!. Na hi st6ria</p><p>da civilizac;ao, a rcligiao e a moralidade sempre estiveram taO</p><p>inrimam enrc li gadas que sua necessaria dissoeia<;ao nao poderia</p><p>Scr uma operac;ao simples. Se nos contentarmos em tirar todo</p><p>conteudo religioso da moral idade, aca baremos murjlando-a. Isto</p><p>porque a rel igiao cxpr;me, do seu modo, arraves de lima lin</p><p>guagem simb6lica, coisas verdadeiras. Nao se deve perde r csras</p><p>verdades jun to com os sfmbolos que sao rejeirados; e preciso</p><p>reeneonrr:1-las, projetando-as no plano do pensamento laico. Os</p><p>Sistemas racionalistas, sobretudo os nao merafisieos, em geral</p><p>apresentam uma imagem da moralidade simplificada demais.</p><p>Ao se tornar sociol6gica, a analise moral pode fornecer uma base</p><p>raeional, nem re ligiosa e nem mcraflsica, para uma moralidade</p><p>rao complexa quanta a moralidadc rcligiosa rradicional, e inclu</p><p>sive mais rica sob certos aspectos, al6m de chegar are as fontes</p><p>das fon;as morais mais cncrgeticas.</p><p>24 Coler;ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>As aulas seguintcs se dividem em duas partes bern distintas,</p><p>plano que ilustra 0 que dissemos sabre a contribuit;ao que, de</p><p>urn lado, a Sociologia e, de outrO, a Psicologia trazem a Peda</p><p>gogia. A primeira parte estuda a moralidade propria mente dita,</p><p>ou scja, a civ iliza~ao moral que a cducac;ao uansmire a crian~a:</p><p>trata-se de uma analise sociol6gica. A segunda estuda a nature</p><p>za da crian~a que assimi lara csta moralidade: aqui a Psicologia</p><p>ocupa 0 primeiro plano.</p><p>As a im aulas que Durkh eim dedicou a analise da moralidade</p><p>constituem 0 que dc legol! de mais completo sobre cste assun</p><p>to, visto que sua mOTte 0 inte rrompeu no momentO em que es</p><p>tava redigindo, para publicacrao ulterior, os prolcgomenos de sua</p><p>Mora!. Elas pod em ser comparadas com as paginas publicadas</p><p>no Bulletin de la Societe Frall{aise de Philosophie sabre "A deter</p><p>minaryao do faw moral", nas quais e1e nao diseorre sabre deveres</p><p>diversos, mais sim sobre aspectos gerais da moralidade. Em sua</p><p>obra, isw 6 equivalente ao que os £1l6sofos chamam de Moral</p><p>Te6rica. E ntretando, ° metoda que e1e apliea e inavador.</p><p>E fiei! cmender como a Sociologia pode estudar 0 que de</p><p>faw sao a famni a, 0 Estado, a propri edade, 0 comrata. Mas,</p><p>quando se tram do bem e do dever, parece que nos enconrramos</p><p>f<j.ce a puros coneeitos, e nau insriruiy6es, e que se impue, en</p><p>taD, urn metOdo de analise abstrata, ja que a observaryao e ina</p><p>plicavel. Vejamos a perspectiva pe la qual Durkheim .borda a</p><p>assuntO. Scm duvida, a educa<;ao moral desempenha 0 papel de</p><p>iniciar a erianya aos diversos dcveres e de suscitar, uma a uma,</p><p>virtudes especificas. Mas ela tambem desenvolve a aptidao ge</p><p>ral a moralidade e as disposi~5cs fundam entais encontradas na</p><p>raiz da vida moral, al6m de constituir no espirito da erianya 0</p><p>agente moral, disposco a tomar iniciativas, das quais depcnde 0</p><p>Educac;ao e Sociologia 25</p><p>progresso. Quais sao, de faw, na sociedadc francesa con tempo</p><p>ranea, os elementos do tcmperamento moral, cuja realiza<;ao eo</p><p>objetivo ao qual deve aspirar a educac;ao moral geral? Podemos</p><p>descrever estes elementos e compreender a sua natureza e pa</p><p>pe l. Em suma, e esta descric;ao que forma 0 conteudo das marais</p><p>ditas reoricas. Cada fi16sofo define, a sua maneira, estes elemen</p><p>tOS fundam entais, mas mais construindo do que descrevendo.</p><p>Podemos refazer ° mesmo trabalho, tomando como objew nao</p><p>mais 0 nosso ideal pessoal, mas sim a ideal que pertence de faro</p><p>a nossa civilizaC;iio. Desta form a, ° estudo da educa~ao moral</p><p>nos permite apreender, em meio aos faws, as rca lidadcs as quais</p><p>correspondem os conceitos bastante absrraros que os fi16sofos</p><p>manipulam. Ele habilita a ciencia dos modos c costumes a ob</p><p>servar 0 que e a maralidade, em seus aspectos mais gerais, pois,</p><p>na educac;ao, percebemos a morali dade no momenta em que ela</p><p>se transmite e, por consequencia, distingue-se com mais clareza</p><p>das consciencias individuais, em cuja complexidade ela esc} ha</p><p>bitualmente envolvida.</p><p>Durkhc im da enfase a tres e lementos fundamentai s da n05-</p><p>sa moralidade: 0 cspiriro de disciplina, 0 de abnegas;:ao e 0 de au</p><p>[Onamia. A titulo de cxemplo, cabe mencionar 0 plano seguido</p><p>par Durkh c im para anali sar a primei ro elemento. 0 espfrito de</p><p>disciplina C ao mesmo tempo a ciencia da e a simpatia pela regu</p><p>laridadc e limitas;:ao dos desejos. Ele implica 0 respeito da regra,</p><p>que obriga 0 indivfduo a inibir impulsos e se esfors;:ar. Por que a</p><p>vida social exige regu laridade, limi tas;:ao e esforc;o? Alem disso,</p><p>como 0 indivfduo consegue,</p><p>afinal, aceitar estas penosas exigen</p><p>cias, condic;5es para a sua pr6pria felicidad e? Responder a estas</p><p>perguntas equivale a dizer qual e a funs;:ao da disciplina. Como</p><p>a sociedade pode estar apea a impor a disciplina e, principalmente,</p><p>26 Cole<;ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>despertar no individuo 0 scntimenro do respeito devido a au</p><p>wridadc de urn imperati vo caregoricQ, que surge como trans</p><p>cendente? Res ponde r a es ta perguma equivale a reftetir sabre</p><p>a na[Ureza da disciplina e sell fundamento [acional. Enfim, por</p><p>que a regra pode e deve ser concebida como independente de</p><p>qualque r si mbolismo religioso e mesma metafisico? 0 que esta</p><p>laiciza,ao da disciplina modi fica no pr6prio conteudo da ideia</p><p>de disciplina, naquilo que ela exige e permite? Aqui, associ a</p><p>mos a natureza e fun9ao da disciplina, nao mais as condi9oes da</p><p>civiliza9ao em geral, mas aquelas especfficas da cxisrencia oa</p><p>civiiiza9ao em que vivemos. E buscamos saber sc 0 espfrito de</p><p>disciplina que pr etence a nels, franccscs, 6 rcalmcntc rudo aq ui-</p><p>10 que de cleve sec, sc nao csta ratologicamcnte enfraquecido,</p><p>c COffiO a cducac;ao, respcitando os sellS carateres pr6prios, pode</p><p>mclhorar a nossa moralidade nacional.</p><p>Uma ana lise si me trica pode ser aplicada a todD espfri to de</p><p>abncgac;ao. 0 que e e para que serve este ultimo, tanto do ponto</p><p>de vista da sociedade como do do indivfduo ? A qu e fins n6s,</p><p>franceses do seculo XX, devemos nos dedicar? Qual e a hi e</p><p>rarquia destes fins, de onde vern, como podem conciliar seus</p><p>antagoni smos parciais? Mesmas questoes com 0 espirito de</p><p>·autonomia. A analise deste ultimo elemento e parricularmente</p><p>ferril , pois se trata aqui de urn dos aspectos mais recenres da</p><p>moralidade, 0 mais caracteristico da moralidade laica e raciona</p><p>lista de nossas sociedades democraticas.</p><p>Hastam estas observac;:oes sumarias para notar uma das prin</p><p>cipais superioridades do metodo seguido por Durkheim. Ele</p><p>conseguc mastrar toda a camplexidade, roda a riqueza da vida</p><p>moral , riqueza feita de oposic;:oes que nao podem ser amalgama</p><p>das apenas parcialmenre em uma sfnrese harmoniosa, riqueza</p><p>Educa~ao e $ociologia 27</p><p>taO abundante que ne nhum individuo, por maior que seja a sua</p><p>grandeza, pode algum dia aspirar a ca rregar dentro de si rodos</p><p>estes elementos, no mais alto grau de desenvolvimenro que</p><p>adngirem, e realizar assim, inregralmenre, somenre para si, roda</p><p>a moralidade. Pessoalmente, assim como Kant, Durkheim foi</p><p>antes de tudo urn homem de vontade e disciplina. Eo aspecro</p><p>kantiano da moralidade que ele ve primeiro e com mais c1areza.</p><p>E ja quiseram afirmar que, segundo ete, a cocn;ao era a unica</p><p>ar;ao que a sociedadc cxcrcia sobre 0 individuo. Sua verdadcira</p><p>doutrina e infinitamcnte mais comprccnsfvel, c talvez nao haja</p><p>nenhuma filosofia moral que se assemelhe a ela neste ponto.</p><p>Ele demonstrou muito bern, por exemplo, que as forr;as morais,</p><p>que cornpeiem e mesmo agridem a natureza animal do homem,</p><p>tam bern exercem neste (iltimo uma atrar;ao, uma sedu~ao. E a</p><p>estes dais aspectos do fato moral que ambas as nor;oes de dever</p><p>e de bem respondem. Para estes dois polos se orientam duas ati</p><p>vidades marais distintas, das quais nem uma nem outra e indife</p><p>rente ao agente moral bem constiruido, mas que, dependendo</p><p>de qual delas prevalecer, distinguem os agenres morais em dois</p><p>tipos diferentes: 0 homem do sentimenro e do enrusiasmo, no</p><p>qual domina a aptidao a generosidade, e 0 homem da vonta</p><p>de, mais frio e austero, no qual domina 0 espfriro de regra. Os</p><p>pr6prios eudemonismo e hedonismo ocupam urn lugar na vida</p><p>moral: e preciso, dizia urn dia Durkheim, que haja epicurianos.</p><p>Assim, disparates e mesmo contrarios se misturam na riqueza</p><p>da civiliza<;ao moral, riqueza que a analise abstrata dos fil6sofos</p><p>es(a geralmcnre fadada a empobrecer, porque tende, por exem</p><p>plo, a deduzir a ideia do bern da do dever, conciliar os conceitos</p><p>de obriga<;ao e autonomia e reduzir assim uma realidade bastan</p><p>te complexa ao conjunto 16gico de algumas ideias simples.</p><p>28 Coler;ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>As nove aulas que forma m a segunda parte do curso abor</p><p>dam 0 problema propriameme pedagogico. Foram e numerados</p><p>e definidos os elementos da moralidadc que devemos constituir</p><p>na crian<;a. Como a narufeza desta ultima se presta a receb~-Ia?</p><p>Que reCUfSOS, e ngrenagens e tam hem obstaculos sao encontra</p><p>dos pclo ed ucador? Os drulos das aulas ja apomam a dire9ao</p><p>do pcnsamento: a disciplillu f a psic%gia do erial/fa, primeif(); a</p><p>di.rciplt'llo esco/ar, a pellolitladee as recompeflsas escolares; em scgui</p><p>da, 0 altruismo lIa cl'ianya c a it?fi uencia do meio escolar nu jOrtJlO</p><p>{tio do espirito Jadc/I; e, por fim, a influencia geml do e nsino das</p><p>ciencias, letras, histdria. oa propria moral e tambem da culwra</p><p>estetica na j01'lJ1af(iO clo espirito de autotJOmia.</p><p>A autonomia 6 a atitude de uma consciencia que ace ita as</p><p>regras porque rcconhece que elas sejam racionalm eme fun</p><p>damemadas. Ela sup6e a aplica,:;3.o livre, porem me t6dica, da</p><p>imeligencia no exame das regras ja prontas que a crian~a rece</p><p>be prime iro da soeiedade na qual eia esta crescendo. Longe de</p><p>aceini-Ias passiva rne nte, a crian~a deve pouco a pOlleo aprender</p><p>a anima-las, coneil ia-Ias, eliminar ou reformar sellS elementos</p><p>obsoletos para adapta-Ios as condi~oes de cxistencia cambiantes</p><p>da sociedadc da qual ela aca ba se tornando um membro ativo.</p><p>Durkheim diz que e a ciencia que confere allconomia. Sornentc</p><p>ela ensin a a reeonhecer 0 que e fundam e ntado na natureza das</p><p>coisas - natureza ffsica , mas tamb6m moral. Someme ela ens ina</p><p>a reconheeer 0 que e inelutavcl, modific:lvel, normal , quais</p><p>sao afinal as lim ites da a9ao eficaz para melhorar a natureza,</p><p>tanto flsiea q uanta moral. O este ponto de vis ra, todo ens ino</p><p>tern urn destino moral , desde 0 c nsino das cie ncias cosmol6gi</p><p>cas ate (c sobretudo) 0 e nsino do pr6prio homem, pela Hi st6ria</p><p>e Sociol ogia. E e assim que hoje a cduCOfiio moral completa</p><p>Educar;ao e Sociologia 29</p><p>de manda um eflsillo da moral: duas coisas que D urkh e im d is</p><p>tingue clarameme, embora a segu nda si rva para completar a</p><p>primeira. Parece-Ihe indispensavei, mesmo na Escola Primaria,</p><p>que 0 professor ensine a crian,:;a 0 q ue sao as sociedades onde ela</p><p>esd destinada a viver: [amflia, corpora9ao, na9ao, comunhao de</p><p>civi li za~ao que tcnde a incorporar a humanidade imeira; cornu</p><p>elas se forma ram e se transformaram; q ue a~ao elas exereem so</p><p>bre 0 individuo e que papcl estc ultimo desempcnha nelas. Do</p><p>curso que cle ministrou varias vczes sobre este Fnsino do moral</p><p>na Escola Primal'ia, possufmos apenas rascunhos de reda~ao ou</p><p>pianos de aulas. Neles, Durkhei m mostra aos professores como</p><p>e posslvel traduzi r, adapta ndo-os as inteIigcncias infantis, os re</p><p>sultados do que ele chamava de "Fisiologia do direito e dos cos</p><p>tumes", ou seja, a vll i ga riza~ao da ciencia dos costumes, a qual ,</p><p>alias, ele dedicou a maior parte de seus livros e aulas.</p><p>IV</p><p>A E ducOfiio ifltelectualna Escola Primdria e 0 tema de u ma</p><p>aula eompletamente redigida em paralelo a que diz respeito a</p><p>educa~ao moral e construida mai s ou menos a partir do mes</p><p>ffiO plano. Durkheim nao a considerava satisfat6ria: ele semi a</p><p>a dificuldade de afinar 0 se u traba lbo. E que 0 ideal intelectual</p><p>da nossa democracia esta menos definido que a seu ideal mo</p><p>ral- seu estudo cientffico roi menos bern pre parada, e a assumo</p><p>e mais novo.</p><p>Aqui, mais uma vez, ha duas partes com orienta90es d ife</p><p>remes: uma esta vi rada para 0 objetivo visado, e, a outra, para os</p><p>meios empregados; a primeira exige que a Sociologia defina 0</p><p>tipo intelectual que a nossa sociedade se esfor9a para realiza r; e</p><p>a Outra interroga a L6gica e a Psicologia para saber que beneficio</p><p>30 Co)ec;ao Tt'xtos Fundantes de Educar;ao</p><p>cada disciplina forneee, que recursos, e ngrenagcns c rcsistcn</p><p>cias</p><p>0 inte lecto da crianc;a apresenta ao educador que uabalha</p><p>para rea lizar este tipo. Denue as aulas puramente psicol6gicas,</p><p>vamos ressa ltar someme as que refle tem sabre a aten930: elas</p><p>demonstram 0 que Durkheim era eapaz de fazer quando se de</p><p>diea va i\ Psieologia.</p><p>Para designar a Educa~ao intelectual prima ria urn objetivo</p><p>determinado, Durkheim estuda as origens e a maneira como, de</p><p>faw, 0 Ensino Primario romou consciencia de sua natureza e pa</p><p>pel proprius. E le se desenvolveu depois do Ensino Secundario</p><p>c se definiu, em cerra medida, em uposic;ao a dc. E oa ohra de</p><p>dois de seus principais iniciadores, Comeni us e Pcstaiozzi, que</p><p>Durkhcim busca desvendar 0 sell ideal e m gestae;a.o. Ambos se</p><p>pe rguntaram como urn e nsino podia ser ao mesmo tempo cnci</p><p>clopedieo e basico - dar lima ideia do todo, formar uma mente</p><p>justa e equilibrada, ou seja, uma mente eapaz de aprecnde r a</p><p>realidade inteira, sem esquecer nenhum e lemento essencial -,</p><p>mas tambem se dirigir a todas as crian~as sem excC\ao, das qua is</p><p>a maioria devera se contentar com nor;oes sumarias, faceis de</p><p>assimi lar com rapidez. Ao interpretar criticamente as tentativas</p><p>de Come nius e Pestalozzi, Durkheim e labora a sua detini r;ao</p><p>do ideal a ser rea lizado. Assim como a moralidade, a in te lec</p><p>tualidade requerida aos franceses contemporaneos exige deles</p><p>um ceno numero de aptidoes mentais essenciais. Durkheim as</p><p>chama de calegonas, noc;6es-chave, centros de inteligibilidade,</p><p>que sao as estruturas e instrumentos do pensamento 16gico.</p><p>Emenda-se por categoria nao someme as foe mas mais abstea</p><p>ras do pensamemo, a nOt;ao de causa ou substancia, mas tam</p><p>be m as ideias, mais ricas em conteudo, que peeside m a nossa</p><p>interpreta~ao do real, a nossa imerpretatyao atual: tlossa ideia do</p><p>Educa~ao e Socioiog ia 31</p><p>mundo fisico, lJOJ.I'a idcia da vida, IJOJsa ideia do homcm, por</p><p>exemplo. Esras catcgorias nao sao inaras ao intelecto humano.</p><p>Elas possuem lima hist6ria e foram consr[uidas poueo a poueo</p><p>ao longo da evolutyao da civi lizac;ao. Na nossa civil izac;ao, isto se</p><p>deu atraVes do desenvolvimento das ciencias fisicas e morais.</p><p>Um born intelecto e um inre lecto cujas ideias mestras, que re</p><p>gulam 0 exercicio do pensamenro, estejam em harmonia com as</p><p>ciencias fundamentais, tais como elas estao atualmeme consti</p><p>tuidas: munido desta maneira, este imelecto pode trabalhar em</p><p>meio a verdade, tal como n6s a concebemos. Portamo, e preciso</p><p>ensinar a crian~a os elementos das ciencias fundamemai s, OU</p><p>melhor, das disc iplinas fundamemais, uma vez que a Gramatica</p><p>e a Histuria, por exemplo, tamb6m cooperam exrremamente a</p><p>forma~ao do entcndimcnw.</p><p>J unw com tantos grandcs pcdagogos, Durkheim rccomcnda,</p><p>portanw , 0 que chamamos, atrav6s de urn tcrmo barbaro, de cul </p><p>tura /onllal: formar 0 cspiri co, e nao preenc he-lo. Nao 6 pOT sua</p><p>utilidade que os conhccimencos valem em primeiro lugar; nan</p><p>ha nada menos utilinl rio do que esta concepr;ao da instruC;ao.</p><p>Porem, seu forma lismo e origina l e se op6e claramentc ao de</p><p>urn pensador como Montaigne e ao dos humanistas. Dc faw, a</p><p>transmissao de urn saber posit ivo do mestre ao aluno e a ass imi</p><p>la~ao pel a crian~a de uma materia the parece ser a condityao para</p><p>uma verdadeira formac;ao inte lectual. E faeil ver a razao disto: a</p><p>analise sociol6gica do entend irnento provoca consequendas pe</p><p>dagugicas. A rnem6ria, a atentyao e a faculdade de associar;ao sao</p><p>disposity6es congeni tas na criantya, que se desenvolvem quando</p><p>exerciradas e some nte no comexto da experie ncia individua l,</p><p>seja qual for 0 objeto ao qual estas facu ldades se aplicare m.</p><p>As ideias diretrizes elaboradas pel a nossa civilizac;ao sao, pelo</p><p>32 Cole~ao Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>conmirio, ideias coierivas que devem sec rransm itidas a crian</p><p>~a, pais e1a nao saheria eJabora-las sozinha. N ingue m rei nventa</p><p>a ciencia com a sua cxpcricncia pr6pri a, ja que e la e social, e</p><p>nao individual, c ja que e la se aprende. Sem duvida, e la nao e</p><p>tran svasada de um a mente para DUtra: eo pr6prio vasa, ou seja,</p><p>a intcligcncia, que se cleve modelar pela e a partir cia ciencia.</p><p>Assim, e m bora as ideias diretrizes sejam farmas, nao e passivel</p><p>transm it i-Ias vazias. Augusto Cornte ja dizia que nao se pode</p><p>estudar a J6gica sem a ciencia, 0 metoda elas ciencias sem sua</p><p>dOlltrina, iniciar-se ao sell sistema sem assimilar alguns de se llS</p><p>resultados. Durkheim tambem pensa que e preciso aprcndcr</p><p>caisas, adquirir sabecloria, abstrat;:ao feita ate do va lor cspccffi co</p><p>dos conhecimencos, pais estes ultimas estao neccssariamcnrc</p><p>envolvidos nas [or mas constitutivas do entendimcmo.</p><p>Para observar [Uda 0 que Durkhe im tira dcstcs pri ndpios,</p><p>seria preciso eotrar nos dctalhes da scgunda parte do curso, no</p><p>qual ele estuda succssivamc ntc a didatica de alguns ensinos</p><p>fund ameotais: a Matcmatica e as categorias de numero e forma;</p><p>a Ffsica e a not;:ao de realidade; a Geografia e a not;:ao de meio</p><p>planetario; a I-list6ria e as n090es de tempo e desenvolvimento</p><p>hist6ricos ... lis ta cnumcrayao ainda esta incompl eta. Em seus</p><p>outros escritos, Durkheim abordoll a educayao J6gica atraves</p><p>das Ifnguas, dando ape nas exemplos. Alias, seria necessaria a</p><p>colahora9ao de cspccial istas para seguir, em detalhe, toclas as</p><p>consequencias d idat icas dos principios estabe lecidos.</p><p>Vcjamos, por exemplo, a no~ao de tempo hist6rico. A hist6-</p><p>ria co dcscnvolvirne nto te mporal de sociedades humanas. Mas</p><p>esrc tempo ultrapassa infinira meme os tempos que 0 individuo</p><p>conhece, os tem pos que e le vivencia dire tamenre. A hist6ria nao</p><p>pode fazer sentido para uma mente que nao possua uma certa</p><p>Educa~ao (" Sociologia 33</p><p>represcnta9ao dcste tempo hist6rico; lim born intclecto 6, nota</p><p>velmente, um inte iecto que a poss lla. Ora, sozinha, a crianya nao</p><p>e capaz de construir esta represeota'¥ao, cujos elementos nao Ihe</p><p>sao forneddos nem pe l a sensa,¥ao e nem pela mem6ria indivi</p><p>dua l. Portanto, e preciso ajuda-Ia a constrll f- Ia. Na verdade, esta</p><p>e uIlla das func;oes que 0 e nsino da Hist6ria desempenha. Mas</p><p>cle a desempenha, pode-se dizcr, involllntariamente. E digno</p><p>de nota que 0 mesue raramente sinta a inanidade das daras e a</p><p>necessidade de trabalhar sistcmaticame nte para Ihes dar urn sig</p><p>nificado. E nsina-se ii crian,a: batal ha de Tolbiac, ano 496. Como</p><p>a criant;:a poderia ver urn sentido preciso nesta data, tendo em</p><p>vista que a representacyao de urn passado, mesmo pr6xirno, ja</p><p>lhe e tao dificil? E necessaria tOdo um trabaIho, cujas eta pas</p><p>poderiam ser as seguintcs: dar a ideia de urn seculo, acreSCen</p><p>tando, uma a outra , 0 perlodo de (reS ou quauo gera'¥oes; come</p><p>~ando, poc exemplo, pela da era crista e explicando por que 0</p><p>nascimento de C risto foi escolh ido corno origem. Entre 0 ponto</p><p>de partida e a cpoea awal, demarcar 0 tempo com pomos de rc</p><p>ferencia concretos, como a biografia de persona gens ou evcntos</p><p>simb6licos. Constitu ir ass im lim primeiro esquema, cllja Uama</p><p>sera POLICO a pouco consol idada. Em seguida, mostrar que 0 pon</p><p>to inicial de nossa cra e convencional, que existem olltras eras,</p><p>Outras hist6rias difcrentes da nos sa, que estas eras pertenccm</p><p>a urn perfotlo ao qual a cronologia humana nao se aplica mais,</p><p>que os primciros tempos permanecem obseuros para n6s, etc.</p><p>Quao pOlleos, dcntre n6s, lembram (erem reeebido de seus pro</p><p>fcssores de Hisroria aulas inspiradas em tais principius! E claro</p><p>que com 0 passar do tempo adqui rimos as no'¥oes mencionadas;</p><p>nao se pode dizer que, sa lvo exce'¥ao, elas (enham sido metod i</p><p>camcnte constitufdas. Urn dos resultados essenciais do cnsino</p><p>34 Cole~ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>da Hist6ria e, portanto, mais ou menos obtido. de fata, sem seT</p><p>c1aramcntc pcrcebido nem intencionado. Ora, a brevi dade da</p><p>Educat;;ao Primaria cxige que se busque alcan~ar as objetivos</p><p>sem rodeios, sc esta Educa~ao quiser ser plena mente</p><p>eficaz.</p><p>Pade-se dizcr que, atc os dias atuais, 0 ensino da Gramatica</p><p>e da Literatura e 0 unico que [cnha tido plena consciencia de</p><p>seu papell6gico: ele ensinapora/onltor, us conheci mentos que</p><p>ele rransmite sao voluntariamente utilizados para a constirui9ao</p><p>do entendimento. Em certa medida, 0 cnsino da Matematica</p><p>se atribui 0 mesmo papel: no enranto, aqui a fun~ao educativa</p><p>e criativa dos conhecimentos com frequcncia jd e perdida de</p><p>vista, e as conhecimentos passam a ser aprcciados por si mes</p><p>mos. Ve-se que a didar ica de Durkheim se asscmclha a de H er</p><p>barr, mas com inovaC;6es. Bern siruada na historia das domrinas</p><p>pedag6gicas, ela parece resolver 0 conftito do /ormoliJmo e de</p><p>seu conrrario, a oposic;ao do saber e da cultura. Ela fornecc 0</p><p>princfpio que sozinho permire superar as dificuldades cm meio</p><p>as quais se debar em os nossos Ensinos Prirnario e Seeundario,</p><p>presos entre as aspica~6es enciclopedicas e 0 legft imo senti men</p><p>to dos perigos que elas engendram. Cada uma das disciplinas</p><p>fundamentais implica uma filosofia latente, au seja, urn siste</p><p>ma de noyoes cardeais, que resumem 0$ aspectos mais gerais</p><p>das coisas, tais como n6s as concebemo$, e que coman dam a</p><p>intcrpretayao delas. E eS[3 filosofia, fcmo do trabalhado acu</p><p>muladu por gerayoes, que se deve transmitir a crian~a , pais</p><p>e1a constirui a pc6prio esqueleto da intelig~ncia. Filos6jieo c</p><p>bdsieo nao sao tecmos que se excluem, muito pelo contr:irio: 0</p><p>ensino mais basi co deve sec 0 mais filos6fi co. Mas e 6bvio que</p><p>o que chamamos aqui de filosofia nao deve ser expos to em</p><p>uma forma abstrata. Ela deve emanar do ensino mais familiar,</p><p>Educat;ao e $oclologia 35</p><p>sem nunca ser formulada. Pacem, para emanar assim, e preciso</p><p>primeiro que ela 0 inspire.</p><p>v</p><p>A Edl1ca~ao inre1ectual basica sc divide em dois tipos: ° En</p><p>sino Prima rio para a massa, e () Scclindario para a elite. E a Edu</p><p>ca~ao da elite que suscita, na Fran\=a conte mporanea, as prohle</p><p>mas mais embara~osos. Hi mais de urn secuIo, 0 nosso Ensino</p><p>Secundario vem atravessando uma crise, cuja soluyao ainda sc</p><p>mostra incerra. Pode-se falar, sem exagero, sobre a questao so</p><p>cial do Ensino Secundario. QuaJ e exaramente a sua natureza</p><p>eo seu papel? Que ca usas determinaram a crise, em que csta</p><p>ultima consiste de faro, como se pode prever a sua soluc;ao? F: a</p><p>estas quest5es que Durkheim dedicou uma de suas mais belas</p><p>aulas, sabre A f!'l)o/upio e 0 popel do Ells;llo SeclInddrio tlfJ Frrw(o:</p><p>de a ministrou varias vezes e deixou duas reda9ues cornplctas</p><p>dela. Ele as havia come,ado a pedido do Reitor Liard, que quis</p><p>organizar, pela primeira vez, urn ensino pedag6gico para futuros</p><p>professores do Ensino Secundario. Oestinado aus candidatOs de</p><p>wdas as modalidades da agregayao\ ranto cientfficas quantO li</p><p>terarias, e1e tinha como objetivo, na concepyao de Durkhcim,</p><p>despertar em rod os e ao mesmo tempo 0 sentimenro de tarefa</p><p>comum: sentimento indispensavel, se quisessemos que discipli</p><p>nas diversas contribuissern para urn ensino que, assim como a</p><p>mente que cle forma, deve apresemar uma unidade. E provclvel</p><p>que as fmuros professores do Ensino Secundario sintam lllll dia,</p><p>por si mesmos, a necessidade de refletir metodicamente, sob a</p><p>dire~ao de urn mestre, sabre a natureza e a funyao especfficas da</p><p>3. lhna-se de urn dos concursos para professor da Fran~a IN:C].</p><p>36 CO le\;i'iO Textos Fundantes de Educa~ao</p><p>instituis:ao que eles devem manter viva. E, neste dia, a li ~ao de</p><p>Durkheim surgini como 0 guia mais seguro para esra reAexao.</p><p>Sell autor considerava que as pesquisas que havia e fe wado e a</p><p>documcma~ao que havia consultado eram insarisfar6rias em va</p><p>rios pontOs. Antes de julgar a ohra, nao se pode esquecer que ele</p><p>ded icou somcntc urn ou dois anus de trabalho a es te vasto as</p><p>sunto. Desra forma, csta aula e urn modelo incompanlvel do que</p><p>a aplic3<;ao do metoda socio16gico as coisas da Educ39ao pode</p><p>engendrar. Eo lll1ico exempl0 complcto que Durkheim deixou</p><p>da anal ise hist6rica de urn sistema de institui<;ocs escolares.</p><p>Para saber 0 que e 0 Ensi no Sccundario awal da I'ran9a,</p><p>Uurkhe im observa como ele se formou. As cstruturas datam da</p><p>Idade Med ia, periodo no qual foram instauradas as univcrsida</p><p>des. E no seio da universidade, atraves do confinamento pro</p><p>gressivo nos colegios do ensino dado na Faculdadc de Arres,</p><p>que 0 Ensino Secunda rio nasceu, difere nciando-sc do Ensino</p><p>Superior. Assim, suas afinidades pod em ser explicadas: urn prc</p><p>para para ° Outro. 0 ensino dialetico e, na ldade Mcdia, a pro</p><p>pedeutica geral, pois a dialetica e, en taO, 0 metodo universal;</p><p>ensino formal , cultura geral rransmitida atraves de uma discipli</p><p>na bastante especffica, ele ja possui as aspectos que, ao longo de</p><p>toda a sua hist6ria, ° Ensino Secundario mante ra. PorCI11, cm</p><p>bora as estruturas estejam constituidas desde a Idade Media, a</p><p>disciplina educativa muda no seculo XVI: a L6gica e substitufda</p><p>pclas humanidades greco-latinas. Originario do Renascimento,</p><p>na fran~a 0 humanismo foi posto em pratica princi paliYle nre pe</p><p>los jcsuftas. E les impregnaram-no com sua marca pr6pria; e, e m</p><p>bora SellS rivais, como 0 Orat6rio, Porr-Royal e a universidade,</p><p>wnham remperado a sistema deles, foi 0 modo como os jesuicas</p><p>imerpreraram 0 humanismo que foi pOT excclc ncia 0 cducador</p><p>Educa~ao e Sociologia 37</p><p>da mente ciassica francesa. Em nenhuma sociedade europe ia a</p><p>inftuencia do hllmanismo foi excillsiva: atraves de algumas de</p><p>suas caracterfscicas dominances, 0 nosso espirito nacional se ex</p><p>prime no e ao mesmo tempo resulta do humanismo, com suas</p><p>qualidades e defeitos. No e n tantO, sobretudo a partir do secuio</p><p>XVIII, OlltraS tendencias sc manifestam: a pedagogia dim real ista</p><p>ataca 0 hllmanismo. Ela prirne iro produz dUlltrinas, sem exercer</p><p>a<;3.o imediata nas in stitui<;oes escalares. Dcpois, ela cria, jun</p><p>to com as Escolas Ccntrai s da Canven~3.o, um sistema escolar</p><p>completamentc novo, cuja dura<;ao e efemera. E 0 seclllo XIX</p><p>faz 0 antigo e 0 novo sistema se enfrentarem, sem conseg uir</p><p>eliminar nenhum dos dois e ne m conci lia-Ios definitivamente.</p><p>E e este conAito que ainda buscamos supe rar. Ao permitir-nos</p><p>compreende-Io, a hist6ria nos da armas para resolve-Io.</p><p>VI</p><p>Em gera l, 0 e nsino pedag6gico anre lim amplo espa<;o a his</p><p>tdria crftica das dou trinas da educa~ao. Durkheim reconhece a</p><p>importaneia dcste esrudo, ao qual sc aplicou durante um born</p><p>tempo. Nas duas aulas sobre a Educas;ao intelectual, Primaria e</p><p>Secllndaria, ele introduz a hist6ria das dolltrinas: a de Comenius,</p><p>entre olltras, chamau sua <:lte n~ao. E lc deixou pIanos e notas de</p><p>aulas que formam uma hist6ria das principais dourrinas pedag6-</p><p>gicas na Fran<;a desde 0 Renascime nto. La Revue de Afetaphysi</p><p>qlle et de Alorale publicou 0 plano dc talhado de suas aulas sobre</p><p>jean-Jacques Rousseau. Por fim, cle redigiu inregralmente urn</p><p>curso, dc urn ana inreiro, sobre Pesta lozzi e Herbart. Vejamos</p><p>aqui somcnte que metodo ele scguiu.</p><p>Primeiro, d e discingue claramencc a hist6ria das teorias da edu</p><p>cacyao e a da pr6pria educ3<;ao. Com frequcncia se faz confusao</p><p>38 Colecao Textos Fundantes de Educal)'ao</p><p>entre as duas. Trara-se, entretanto, de duas coisas fao distintas</p><p>quanto a hist6ria da Filosofia Polftica e a das institui96es poli</p><p>tieas. Seria preferivel que nossos educadores conhecessem me</p><p>lhor a hist6ria de nossas instituir;;oes escolares e nao pensassem,</p><p>como acontece de fato, que a conhecem atraves de Rousseau ou</p><p>Montaigne.</p><p>Em scguida, Durkheim aborda as doutrinas como faws, e e a</p><p>educat;:ao do espirito hist6rico que de tern a inten9ao de alcan-</p><p>9ar aD estuda-las. Normalmente, e de forma bastante difcrente</p><p>que elas sao cxaminadas. 'Iomemos como exemplo os livros de</p><p>Gabriel Compayre, manuais chissicos de hist6ria da Pedagogia,</p><p>familiares a todos os nossos professores. Apesar de seu nome,</p><p>nao sao hisrorias propria mente</p><p>ditas. Eles sem duvida prestam</p><p>servivos, mas lembram, de modo lamenravei, uma cerra concep</p><p>vao da historia da Fiiosofia, felizmentc obsoleta. Parece que os</p><p>grandes pedagogos, como Rabelais, Montaigne, Rollin e Rous</p><p>seau, surgem ai como colaboradores do tc6rico que atualmen</p><p>te busca definir a doutrina pedagogica. Tcm-se a impressao de</p><p>que h<1 uma verdadc pedag6gica eterna, valida de forma uni</p><p>versal, da qual eles haviam propos to concep9oes aproximativas.</p><p>Na doutrina deJes, busca-se separar 0 joio do trigo, sustentar</p><p>os preceitos utilizaveis atualmente pelos mcstres, rejeitar seus</p><p>paradoxos e erros. A critica dogmatica suplanta a hist6ria, e 0</p><p>elogio au a condena9ao, a explicayao das ideias. 0 residuo e 0</p><p>proveito intelecrual sao bastante escassos. Nao 6 atraves do eon</p><p>fronto dialetieo das teorias do passado, teorias mais imbuidas</p><p>dc intuiyoes confusas do que construidas de forma cientifiea,</p><p>que se tern chance de claborar uma doutrina salida e feeunda</p><p>na pr;itiea. Acantece habitual mente de os pedagogos de segun</p><p>da categoria, ec1eticos, moderados, e cujo raciocfnio e bastante</p><p>Educal)'ao e Sociologia 39</p><p>fraco, resistirem bern melhor a esta critica do que as mentes de</p><p>primeira categoria. 0 born-sen so de um Rollin se mostra mais</p><p>vantajoso quando comparado as extravaganeias de urn Rous</p><p>seau. Se a Pcdagogia Fosse uma ciencia, sua hist6ria apresenta</p><p>ria urn estranho aspecto: a genialidade a teria conduzido em erro</p><p>na maior parte das vezes, ao passo que a mediocridade a reria</p><p>manti do no caminho cerro.</p><p>Decididamente, Durkheim reconhece que se possa buscar</p><p>identificar, atraves de uma discussao crftica, os elementos de</p><p>verdade contidos em uma doutrina. No prefaeio que escreveu</p><p>para 0 livro p6stumo de Hamelin, 0 sistema de Descmtes, ele ex</p><p>pos urn metoda de imerpretayao tanto hist6rico quanto crftico,</p><p>o qual ele pr6prio aplicou ao estudo de PestaJozzi e Herbart. Ele</p><p>admirava 0 pensamento consistente e profundo destes grandes</p><p>iniciadores e, longe de ignorar a sua fecundidade, pergumava-se</p><p>se as vezes nao Ihes atribula algumas das ideias cujos primei</p><p>fOS cantoroos ele acreditava encontrar ern suas obras. Porem,</p><p>seja qual for 0 seu valor dogmjxico, Durkheim procura identi</p><p>ficar nas doutrinas sobretudo as for9as sociais que inspiram urn</p><p>sistema de Educa9ao ou trabalham para modifica-lo. A hist6ria</p><p>da Pedagogia nao e a hist6ria da educayao, pois as re6ricos nao</p><p>expressam exatamente 0 que de faw ocorre e nem 0 que de</p><p>fato ocorrera. Contudo, as ideias tambem sao fatos e, quando</p><p>tern grande repercussao, faws sociais. 0 prodigioso suces</p><p>so de Emflio deriva de causas diferentes da genialidade de</p><p>Rousseau: ele manifcsta tendencias confusas, porem ener</p><p>gicas, da sociedadc curopeia do seculo XVIII. Hi pedagogos</p><p>Conservadores, tais como Jouvency e Rollin, que refletem 0</p><p>ideal pedag6gico dos jesuftas au da universidade do seculo</p><p>XVII. E, principal mente, visto que as grandes doutrinas se</p><p>40 Cole~ao Textos Fundantes de Educat;ao</p><p>prolifcram em epocas de crise, ha pedagogos rcvolucionarios</p><p>que traduzem coisas coletivas essenciais para 0 observador e qua</p><p>se impossfvcis de observar diretamente: aspira90es, idcais em</p><p>gesta930, rebeliocs contra institui90es que se tornaram obso[cras.</p><p>Durkheim estudou dcste ponto de vista, por exernplo, as ideias</p><p>pedag6gicas do Renascimcnto e distinguiu, melhor do que qual</p><p>quer urn antes dele, as duas grandes correntes predominantes:</p><p>a que atfavessa a obra de Rabclais e a autra, bastante diferente</p><p>apesar de sua misrura parcial, que atravessa a ohra de Erasmo.</p><p>Es[a 6, em grandes lin has, a obra pedag6gica de Durkheim.</p><p>Este resumo basta para mostrar a sua cxtensao e as estreitas re</p><p>la90es que ela mantem com 0 conjunto de sua ohra sociol6gica.</p><p>Para os educadores, ela oferece uma dourrina original e vigo</p><p>rosa, envolvendo os principais problemas pedag6gicos. Para as</p><p>soci610gos, ela esclarece as concep<;oes que Durkheim exp6s</p><p>em outras obras sabre alguns pontos csscnciais: rela~5es entre 0</p><p>individuo e a sociedade, entre a cicncia c a pratica, a natureza da</p><p>moralidade e a do entendimento. Scjam educadores ou soci6-</p><p>logos, muitos sao os que desejam que csta obra pedag6gica nao</p><p>permane9a inedita. Vamos rentar publicar as principais aulas.</p><p>o pequeno volume que estamos lanc;;ando hoje Ihes servi</p><p>ra de introdu9ao. Reirnprimimos aqui apenas os estudos peda</p><p>gogicos que Durkheim ja havia publicado4</p><p>• Os dois primeiros</p><p>reproduzem os artigos "Education" e "Pedagogie" do Nouveau</p><p>4. Cabe, no emamo, mcncionar: 1°) 0 artigo "Enfance", no DictiolJltaire</p><p>de Ptdflf!,of!,ie, que Durkheim assinoll em colaborayao com Buisson; 2") A</p><p>paJestra sobre EducalioTl sexlIe!le, feita na Societe Fran9aise de Philosophie</p><p>(But/elirt), que se assemelha sobretudo aos rrabalhos de Dllrkheim sabre a</p><p>familia e a casamenw. 0 estudo p6stuTlla sabre Emflio, publicado na Revue</p><p>de Mftaphysique el de A4amle (t. XXVI, 1919, p. 153), nao pode ser separado</p><p>de urn outro suhre 0 cOlltrata social nesta mesma revista (t. xxv, 1918).</p><p>Educ:a~ao e Soc:ioiogia 41</p><p>Dictionnaire de Pedagogie et d'ftlstruction Primaire, publicado sob</p><p>a direc;ao de E Buisson (Paris: Hachette, 1911); e 0 terceiro e a</p><p>aula dc aberrura que foi dada quando Ourkheim tomou posse</p><p>de sua cadeira na Sorbo nne em 1902 e que foi puhlicada no nu</p><p>mero de janeiro de 1903 da Revue de MitajJhysique et de Morale.</p><p>Algumas paginas sao redundantes. Nos dois primeiros eStli</p><p>dos, ha inclusive decalques textuais do tercciro. Mas pensamos</p><p>que remanejar 0 original ocasionaria mais inconvenientes do que</p><p>algumas repeti~6es.</p><p>Paul/laucollllet</p><p>1</p><p>A EOUCAC::AO, SUA</p><p>NATUREZA E SEU PAPEL</p><p>1.1 As definiyoes da educa"iio: exarne critico</p><p>A palavra ectucaC¥:lo ja [oi empregada com urn sentido bas</p><p>rante vasto para designar 0 conjunto das influencias que a</p><p>natureza au os DUUDS homens padem exercer sabre a nossa</p><p>inteligencia au vOl1tade. Stuart Mill diz que ela compreende</p><p>"tuda 0 que fazemos por conta pr6pria e tuda 0 que os DU[[OS</p><p>fazem para n6s com 0 objetivo de nos aproximar da perfei~ao</p><p>da nos sa natureza. Em sua acepyao mais larga, ela compreende</p><p>inclusive os efeitos indiretos produzidos no carater e nas fa </p><p>culdades do homem por coisas cujo objetivo e compieramente</p><p>diferente: leis, farmas de governo, artes industriais e mesma</p><p>faws fisicos, independentes da vontade do homem, (ais como</p><p>o clima, 0 solo e a posi~ao local" . Porem, esta definic;;ao en</p><p>globa fatos bastante dispares que nao podem ser reunidos sob</p><p>urn mesmo VOC<l.bulo sem dar lugar a confus6es. Em fun~ao</p><p>de seus procedimentos e resultados, a a~ao das coisas sobre os</p><p>homens difere muito da que provem dos pr6prios homens; e</p><p>a ac;;ao entre hom ens pertencentes a mesma faixa eniria difere</p><p>da que os adultos exercem sobre os mais jovens. 0 que nos</p><p>interessa aqui e somente esta ultima, a qual, por conseguinte,</p><p>Convem reservar a palavra educac;;ao.</p><p>44 Coler;ao Textos Fundantes de Educar;ao</p><p>Mas em que consisre esta a~ao sui gtlleris? A esta pergunta ja</p><p>foram dadas respostas bastamc difcrc nrcs, que podem se dividir</p><p>em dois ripos principa is.</p><p>Segundo Kant, "0 objetivo da educ3yao c descnvolvcr em</p><p>cad a jndivfduo [Qda a perfei9ao da qual e le 6 capaz" . Mas 0 que</p><p>se deve enrender por perfei.yao? Ja foi frequentemente dito que</p><p>se trata do desenvol vime nro harmonica de todas as faculdades</p><p>humanas. Elevar ao ponto mais al to passive I [Ddas as pmencia</p><p>lidades que se encontram dentro de 116s, realiza-Ias de forma</p><p>tao complera quanta passivel, mas sem deixa-Ias prejudicarem</p><p>umas as outras - naa e Lim ideal acima de qualquer autro?</p><p>Mas embora, em cena medida, ele seja de faro necessaria e</p><p>desejavei, este desenvolvimento harmonica nao e totalmente</p><p>realiz:ivel, pois ele contradiz uma outra regea da conduta huma</p><p>na que nao e menos imperiosa: e a que faz com que nos dedique</p><p>mos a uma taeefa especifica e restrita.</p>