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<p>CAP Í T U LO   5 3</p><p>Fígado</p><p>Vikas Dudeja</p><p>Yuman Fong</p><p>SUMÁRIO</p><p>Perspectivas Históricas</p><p>Anatomia e Fisiologia</p><p>Hipertensão Portal</p><p>Doenças Infecciosas</p><p>Neoplasias</p><p>Hemobilia</p><p>Hepatite Viral e o Cirurgião</p><p>Perspectivas históricas</p><p>A  anatomia  da  superfície  do  fígado  foi  descrita  há  2.000  anos  a.  C.  pelos  antigos  babilônios.  Até  mesmo  Hipócrates</p><p>entendeu e descreveu a gravidade da lesão hepática. Em 1654, Francis Glisson foi o primeiro médico a descrever a anatomia</p><p>essencial dos vasos sanguíneos do fígado com precisão. As primeiras cirurgias neste órgão são descritas como ressecções</p><p>rudimentares  do  fígado  eviscerado  a  partir  de  um  trauma  penetrante.  O  primeiro  caso  documentado  de  hepatectomia</p><p>parcial é atribuído a Berta, em 1716, que ressecou uma parte do fígado de um paciente que se apunhalou.</p><p>No  final  do  século  XIX,  as  primeiras  gastrectomias  e  colecistectomias  foram  realizadas  na  Europa.  Naquela  época,  a</p><p>cirurgia  no  fígado  era  considerada perigosa  e  até mesmo  impossível.  Em 1897,  Elliot,  em  sua descrição  sobre  a  cirurgia</p><p>hepática por trauma, disse que o fígado era “tão friável, tão repleto de vasos, que se tornava impossível de ser suturado e</p><p>que parecia inviável suturar grandes feridas hepáticas”. Os cirurgiões europeus iniciaram a experimentação de técnicas de</p><p>operação  eletiva do  fígado  em animais  no final do  século XIX. O  crédito da primeira  ressecção  eletiva do  fígado  é uma</p><p>questão controversa e muitos cirurgiões têm sido referenciados, mas certamente ocorreu durante esse período.</p><p>O  início  do  século  XX  testemunhou  pequenos,  porém  significativos,  avanços  com  relação  à  operação  do  fígado.  As</p><p>técnicas para sutura de grandes vasos hepáticos e o cautério para pequenos vasos foram utilizados e publicados. O avanço</p><p>mais significativo da época provavelmente foi o de J. Hogarth Pringle, que, em 1908, descreveu a compressão digital dos</p><p>vasos hilares para controlar o sangramento hepático decorrente de lesões traumáticas. A era moderna da cirurgia hepática</p><p>iniciou com o melhor conhecimento da anatomia do fígado e da sua ressecção anatômica. A primeira ressecção anatômica</p><p>do fígado foi atribuída a Lortat‑Jacob, que realizou uma hepatectomia “direita” em 1952 na França. Pack, de Nova York, e</p><p>Qua�elbaum,  da  Geórgia,  realizaram  uma  operação  similar  no  ano  seguinte,  e  era  improvável  que  tivessem  algum</p><p>conhecimento sobre o relato de Lortat‑Jacob. Descrições da anatomia segmentar do fígado feitas por Couinaud, Woodsmith</p><p>e Goldburne em 1957 contribuíram de forma inequívoca para a evolução da moderna cirurgia hepática.</p><p>Apesar desses avanços, nas décadas de 1950 a 1980 a cirurgia hepática era marcada por altas taxas de morbimortalidade</p><p>operatória.  Índices  de mortalidade  superiores  a  20%  eram  comuns  e  geralmente  estavam  relacionados  com  hemorragia</p><p>maciça. Muitos cirurgiões relutaram em realizar a cirurgia hepática em decorrência destes resultados, e é compreensível que</p><p>muitos  médicos  tenham  se  sentido  inseguros  em  encaminhar  os  pacientes  para  uma  hepatectomia.  Com  o  apoio  dos</p><p>pacientes  e  suas  famílias,  bem  como  pela  persistência  dos  cirurgiões,  a  cirurgia  hepática  passou  a  ser  realizada. Não  é</p><p>possível listar aqui todos eles, mas cirurgiões como Blumgart, Bismuth, Longmire, Fortner, Schwar蘡, Starzl e Ton merecem</p><p>ser referenciados.</p><p>Os  avanços  na  anestesia,  nos  cuidados  intensivos,  na  antibioticoterapia  e  nas  técnicas  radiológicas  intervencionistas</p><p>também contribuíram para a segurança da cirurgia hepática. Atualmente, a hepatectomia total com transplante de fígado,</p><p>bem como a hepatectomia parcial de doadores vivos,  já  se  tornou  rotina  em centros  transplantadores. As hepatectomias</p><p>parciais  para  as  mais  diversas  indicações  são  realizadas  em  centros  especializados  em  todo  o  mundo,  com  índices  de</p><p>mortalidade de 5% ou menos. A hepatectomia parcial em fígados normais é atualmente realizada com taxas de mortalidade</p><p>de 1% a 2%.</p><p>A cirurgia hepática aberta é realizada com segurança e a sua livre utilização no tratamento de uma ampla variedade de</p><p>doenças  é  agora  uma  realidade.  Além  disso,  as  abordagens  minimamente  invasivas  para  a  cirurgia  hepática  foram</p><p>desenvolvidas e agora estão sendo realizadas em números cada vez mais significativos. A curva de aprendizado permanece</p><p>íngreme, entretanto, e as  indicações para esta  técnica ainda estão sendo cuidadosamente definidas. O uso de robótica na</p><p>cirurgia hepática pode ajudar na abordagem dos problemas com a curva de aprendizagem da laparoscopia. A inclusão da</p><p>robótica  oferece  sutura  e  articulação  avançadas  que  se  aproximam  da  cirurgia  aberta,  o  que  permite  que  uma  maior</p><p>proporção de casos seja realizada de forma minimamente invasiva na totalidade.1 O papel da robótica na cirurgia hepática</p><p>está evoluindo rápido. As técnicas de termoablação para tratar tumores hepáticos, incluindo a ablação por radiofrequência e</p><p>micro‑ondas, cresceram exponencialmente em popularidade. Por fim, as técnicas para aprimorar a segurança da ressecção</p><p>hepática  adicional,  como  a  embolização  da  veia  porta  para  induzir  a  hipertrofia  pré‑operatória  do  futuro  fígado</p><p>remanescente (FFR), foram desenvolvidas e agora estão sendo amplamente utilizadas.</p><p>Anatomia e fisiologia</p><p>Anatomia</p><p>Anatomia Macroscópica</p><p>O conhecimento acurado da anatomia do fígado é um requisito imprescindível para a realização de cirurgias no fígado ou</p><p>na  árvore  biliar. Durante  as  últimas  décadas  tem‑se  prestado mais  atenção  na  anatomia  hepática  complexa,  além de  se</p><p>estarem observando os mínimos detalhes da superfície do fígado. As contribuições anatômicas de Couinaud (ver adiante),</p><p>com a descrição segmentar do fígado, deveriam ser adotadas e estudadas pelos que desejam aprender a cirurgia hepática.</p><p>Descrição geral e topografia</p><p>O fígado é um órgão sólido cuja massa corporal (1.200 a 1.600 g) ocupa quase inteiramente o quadrante superior direito do</p><p>abdome. A margem  costal  coincide  com  a  borda  inferior  do  fígado  e  sua  superfície  superior  é  coberta  pelo  diafragma.</p><p>Grande  parte  do  fígado  direito  e  a maior  parte  do  fígado  esquerdo  estão  envolvidas  pela  caixa  torácica.  Na  superfície</p><p>posterior, situa‑se a veia cava inferior (VCI). Uma parte do fígado se estende para o lado esquerdo do abdome. O fígado é</p><p>revestido pelo peritônio, exceto no leito da vesícula biliar, na porta hepatis e na face posterior do fígado de cada lado da VCI,</p><p>em  duas  áreas  em  forma  de  cunha.  A  região  do  fígado  à  direita  da  VCI  é  chamada  de  área  desnuda  do  fígado.  As</p><p>duplicações  peritoneais  sobre  a  superfície  do  fígado  são  denominadas  ligamentos.  As  duplicações  peritoneais</p><p>diafragmáticas constituem o ligamento coronariano, cujas bordas laterais em cada lado formam os ligamentos triangulares</p><p>direito e esquerdo. Do centro do ligamento coronariano emerge o ligamento falciforme, que se estende anteriormente como</p><p>uma fina membrana que liga a superfície do fígado ao diafragma, à parede abdominal e ao umbigo.</p><p>O  ligamento  redondo  (veia  umbilical  obliterada)  corre  pela  borda  inferior  do  ligamento  falciforme  do  umbigo  até  a</p><p>cicatriz umbilical, a qual situa‑se na superfície inferior da porção esquerda do fígado e contém o pedículo portal esquerdo.</p><p>Nas primeiras descrições da anatomia hepática, o ligamento falciforme – o marcador de superfície mais evidente do fígado,</p><p>foi usado como o divisor dos lobos direito e esquerdos do fígado, no entanto esta descrição é incorreta e de pouca utilidade</p><p>para o  cirurgião hepatobiliar  (ver  adiante mais detalhes da anatomia  segmentar).  Sobre a  superfície posterior da porção</p><p>esquerda do fígado, partindo do ramo esquerdo da veia porta no hilo hepático em direção à veia hepática esquerda e à VCI,</p><p>está o ligamento venoso (seio venoso obliterado), que também corre em um sulco (Fig. 53‑1). Os sangues venoso portal e</p><p>arterial hepático</p><p>110 dias após a administração de heme radioativa marcada, sendo consistente com o</p><p>tempo de vida dos glóbulos vermelhos. Inicialmente, a heme é desdobrada em biliverdina, de cor esverdeada, pela heme</p><p>oxigenase e, depois, transformada em bilirrubina, de cor alaranjada, pela biliverdina redutase.</p><p>A  bilirrubina  circulante  está  ligada  à  albumina  que  protege  muitos  órgãos  dos  efeitos  potencialmente  tóxicos  deste</p><p>composto. O complexo  bilirrubina‑albumina  penetra  no  sangue  sinusoidal  hepático,  onde  entra  no  espaço  de Disse  por</p><p>grandes  fenestrações  sinusoidais.  A  bilirrubina  é  dissociada  neste  espaço.  A  bilirrubina  livre  é  então  confinada  no</p><p>hepatócito, onde é conjugada a ácido glicurônico. Depois, a bilirrubina conjugada é secretada de uma forma dependente de</p><p>energia na bile canalicular, vencendo um elevado gradiente de concentração. Em seguida a bilirrubina é secretada com a</p><p>bile  no  trato  gastrointestinal.  No  trato  gastrointestinal,  a  bilirrubina  é  desconjugada  pelas  bactérias  intestinais  para  um</p><p>grupo de  compostos  conhecido  como urobilinogênios. Mais  tarde,  estes urobilinogênios  são  oxidados  e  reabsorvidos na</p><p>circulação entero‑hepática e secretados na bile. Um pequeno percentual do urobilinogênio reabsorvido é excretado na urina.</p><p>Este urobilinogênio oxidado é responsável por compostos coloridos que contribuem para a cor amarela da urina e marrom</p><p>das fezes.</p><p>Há muito tempo que a bilirrubina tem sido considerada um composto tóxico e é o agente responsável pela encefalopatia</p><p>neonatal e pelo dano coclear secundário a grave hiperbilirrubinemia (kernicterus) não conjugada. A ligação da bilirrubina à</p><p>albumina protege os tecidos da exposição à bilirrubina, no entanto os  locais de  ligação podem ser saturados pela grande</p><p>quantidade de bilirrubina ou modificados por agentes de ligação (p. ex., vários fármacos). O mecanismo da toxicidade da</p><p>bilirrubina parece estar  relacionado com seus efeitos. A bilirrubina  livre pode desfazer a  fosforilação oxidativa e  inibir a</p><p>ATPase, o metabolismo da glicose e um amplo espectro de atividade da proteína cinase.</p><p>As derivações portossistêmicas que ocorrem na cirrose e na hipertensão portal diminuem a depuração hepática inicial da</p><p>bilirrubina, resultando em um pequeno aumento da hiperbilirrubinemia não conjugada. Vários distúrbios podem resultar</p><p>em  uma  hiperbilirrubinemia  sérica  não  conjugada,  incluindo  hiperbilirrubinemia  neonatal,  uma  elevação  da  bilirrubina</p><p>decorrente de síndromes hemolíticas e deficiências enzimáticas, como as síndromes hereditárias de Crigler‑Najjar e Gilbert.</p><p>Os distúrbios da hiperbilirrubinemia sérica não conjugada incluem as colestases e as síndromes de Rotor e Dubin‑Johnson.</p><p>Metabolismo dos Carboidratos</p><p>O fígado é o centro do metabolismo dos carboidratos porque é o maior regulador do armazenamento e da distribuição de</p><p>glicose para os tecidos periféricos e, em particular, para os tecidos dependentes de glicose, como o cérebro e os eritrócitos.</p><p>Tanto o fígado quanto os músculos são capazes de armazenar glicose na forma de glicogênio, mas apenas o fígado é capaz</p><p>de desdobrar o glicogênio para produzir glicose para a circulação sistêmica. O glicogênio que é quebrado só pode ser usado</p><p>no músculo, portanto não é uma fonte de glicose sistemicamente circulante.</p><p>Depois  da  alimentação,  o  carboidrato  absorvido  pelos  intestinos  (principalmente  a  glicose)  circula  sistemicamente.</p><p>Carboidratos que chegam ao fígado são rapidamente convertidos em glicogênio para armazenamento. O fígado contém até</p><p>65  g  do  glicogênio  por  quilograma  de  tecido  hepático.  O  excesso  de  carboidrato  é  convertido  em  ácidos  graxos  e</p><p>armazenado no tecido adiposo. No estado pós‑ ‑absortivo, não existe mais glicose sistêmica oriunda diretamente do tubo</p><p>digestório e o fígado torna‑se fonte primária de glicose circulante pela degradação de glicogênio. Isto é fundamental para o</p><p>cérebro e os eritrócitos que necessitam da glicose para o seu próprio metabolismo. No estado pós‑absortivo, a maioria dos</p><p>tecidos passa  a  necessitar  dos  ácidos  graxos derivados do  tecido  adiposo  como  seu principal  combustível. Um músculo</p><p>altamente ativo pode esgotar o seu próprio glicogênio e depender da glicose derivada do fígado como substrato no estado</p><p>pós‑absortivo. Após 48 horas de jejum, o glicogênio hepático esgota‑se e o fígado passa da degradação de glicogênio para a</p><p>gliconeogênese.  O  substrato  para  a  gliconeogênese  hepática  vem,  principalmente,  dos  aminoácidos  (principalmente  a</p><p>alanina) derivados da degradação muscular, mas também do glicerol derivado da degradação do tecido adiposo. Durante o</p><p>jejum prolongado, os ácidos graxos da degradação do tecido adiposo são β‑oxidados no fígado, que libera corpos cetônicos</p><p>que depois se tornam o principal combustível para o cérebro.</p><p>A  transição  dentro  e  fora  destes  vários  estados  metabólicos  e  a  regulação  do  metabolismo  dos  carboidratos  são</p><p>influenciadas  principalmente  pela  concentração  de  glicose  no  sangue  sinusoidal  e  nos  hormônios  (p.  ex.,  insulina,</p><p>catecolaminas,  glucagon).  No  estado  de  jejum,  durante  o metabolismo  anaeróbico,  é  produzido  lactato,  sobretudo  pelo</p><p>músculo.  O  fígado  utiliza  este  lactato,  que  é  convertido  em  piruvato  e  penetra  nas  vias  gliconeogênicas  para  produzir</p><p>glicose, o que é conhecido como o ciclo de Cori.</p><p>Nas doenças do fígado, são comuns os distúrbios do metabolismo do carboidrato. Os cirróticos frequentemente mostram</p><p>tolerância  anormal  à  glicose.  Seu mecanismo  não  está  completamente  esclarecido, mas  provavelmente  relaciona‑se  com</p><p>resistência à insulina. Esse fenômeno não é causado pelo desvio de glicose sanguínea para fora do fígado. A hipoglicemia é</p><p>uma entidade incomum na doença hepática crônica devido à resiliência notável do fígado e sua função metabólica. Somente</p><p>com a perda maciça de hepatócitos na  falência hepática  fulminante é que a gliconeogênese  fracassa e, então, sobrevém a</p><p>hipoglicemia.</p><p>Metabolismo Lipídico</p><p>Os ácidos graxos são sintetizados no fígado no decorrer dos estados de excesso de glicose, quando se excedeu a capacidade</p><p>do fígado para armazenar glicogênio. Os adipócitos têm uma capacidade limitada para sintetizar os ácidos graxos, portanto</p><p>o fígado é a fonte predominante de ácidos graxos sintetizados, embora sejam amplamente armazenados no tecido adiposo.</p><p>Durante  a  lipólise,  ácidos  graxos  livres  são  transportados  para  o  fígado,  onde  são metabolizados.  Os  ácidos  graxos  no</p><p>fígado  sofrem  esterificação  com  glicerol  para  formar  triglicerídios  para  armazenamento  ou  transporte,  ou  sofrem  β‑</p><p>oxidação, gerando energia na forma de ATP e corpos cetônicos. Em geral, este processo é regulado pelo estado nutricional,</p><p>com o jejum favorecendo a oxidação e o estado pós‑prandial, a esterificação.</p><p>Existe um ciclo constante de ácidos graxos entre o fígado e o tecido adiposo que está sob um delicado equilíbrio, o qual</p><p>pode ser facilmente alterado, resultando em infiltração gordurosa do fígado. Alguns fatores influenciam este equilíbrio; por</p><p>exemplo, a captação hepática de ácidos graxos é uma função das concentrações plasmáticas. Embora não haja um limite à</p><p>capacidade do fígado para esterificar os ácidos graxos, sua habilidade para dispor ou degradar os ácidos graxos é limitada,</p><p>assim como sua capacidade de secretar os  triglicerídeos na  forma de  lipoproteínas. As condições de aumento dos ácidos</p><p>graxos  circulantes,  portanto,  podem  facilmente  substituir  a  capacidade  do  fígado  para  lidar  com  elas,  resultando  em</p><p>acúmulo gorduroso neste órgão. Isso é conhecido como esteatose ou, quando associada à inflamação crônica nos casos mais</p><p>avançados, esteato‑hepatite. Algumas condições têm sido associadas à esteatose hepática, como diabetes, uso de esteroides,</p><p>fome,  obesidade  e  quimioterapia  citotóxica  intensa.  O  fígado  gorduroso  associado  ao  consumo  de  álcool  tem  inúmeras</p><p>causas,  estando  relacionado</p><p>com aumento da  lipólise,  reduzida oxigenação e elevação da esterificação dos ácidos graxos</p><p>hepáticos, podendo também estar associado a fome relativa no alcoolismo crônico.</p><p>Metabolismo das Proteínas</p><p>O fígado também é fundamental para o metabolismo de proteínas e está envolvido na síntese e no catabolismo de proteínas</p><p>em energia ou formas de armazenamento, na administração do excesso de aminoácidos e na eliminação de nitrogênio. A</p><p>proteína ingerida é quebrada em aminoácidos que circulam por todo o corpo, que são usados como blocos de construção de</p><p>proteínas,  enzimas  e  hormônios.  O  excesso  de  aminoácidos  não  utilizados  nos  tecidos  periféricos  é  geralmente</p><p>administrado pelo fígado, onde é oxidado para liberar energia (produzindo 50% das necessidades energéticas do fígado) ou</p><p>convertido em glicose, corpos cetônicos ou gorduras. Quando os aminoácidos são catabolizados para a produção de energia</p><p>por  todo  o  corpo,  há  produção  de  amônia,  glutamina,  glutamato  e  aspartato.  Estes  produtos  são  essencialmente</p><p>processados no fígado, onde o nitrogênio é convertido em ureia pelo ciclo da ureia e esta é então excretada na urina. Assim,</p><p>o fígado é fundamental para o equilíbrio do nitrogênio corporal e o metabolismo dos aminoácidos.</p><p>Como  o  fígado  pode  catabolizar  grande  parte  dos  aminoácidos  produzindo  energia  ou  outras  formas  de  energia</p><p>estocável,  como  a  glicose  e  gorduras,  uma  importante  exceção  são  os  aminoácidos  de  cadeia  ramificada,  os  quais  não</p><p>podem ser catabolizados no fígado e são em grande parte metabolizados pelo tecido muscular. Foi postulado que isso pode</p><p>atuar como uma rede de segurança que ajuda a poupar o fígado de algumas das necessidades do metabolismo de proteínas</p><p>e aminoácidos.</p><p>O fígado também é o principal local de síntese para muitas proteínas envolvidas em funções abrangentes e importantes</p><p>como  coagulação,  transporte,  ligação  de  cobre  e  ferro  e  inibição  da  protease.  Estas  proteínas  incluem  ceruloplasmina,</p><p>armazenamento de ferro e de proteínas de ligação e α1‑antitripsina. A albumina é produzida exclusivamente no fígado e é</p><p>uma  proteína  predominante  da  seroaglutinação.  A  insuficiência  hepática  ou  as  alterações  genéticas  específicas  podem</p><p>resultar na modificação das quantidades e da função destas proteínas, com efeitos patológicos variados.</p><p>O  fígado  também é  responsável pela  chamada  resposta da  fase aguda, que é uma  replicação  sintetizada pela proteína</p><p>resultante  de  um  trauma  e/ou  infecção.  Seus  objetivos  são  impedir  o  dano  ao  órgão,  manter  a  função  hepática  vital  e</p><p>controlar os mecanismos de defesa. Esta resposta é estimulada pelas citocinas pró‑inflamatórias, como a interleucina‑1 (IL‑</p><p>1), a IL‑6 e o fator de necrose tumoral (TNF), os quais induzem a expressão gênica das proteínas dessa fase aguda no fígado.</p><p>Algumas das proteínas da falência hepática aguda são α1‑ α2‑ e β‑globulina, bem como soro amiloide A e proteína C reativa.</p><p>Uma  parte  igualmente  importante  desta  resposta  é  a  sua  consequência.  As  citocinas  anti‑inflamatórias,  como  as</p><p>antagonistas dos receptores IL‑1, IL‑4 e IL‑10, parecem desempenhar importante papel. A resposta da fase aguda ocorre no</p><p>período de 24 a 48 horas, mas, no contexto de lesão contínua, esse período pode se alongar.</p><p>Metabolismo das Vitaminas</p><p>Junto com o intestino, o fígado é responsável pelo metabolismo das vitaminas lipossolúveis A, D, E e K, as quais são obtidas</p><p>de  forma  exógena  e  absorvidas  no  intestino.  Sua  absorção  intestinal  adequada  é  extremamente  dependente  da</p><p>micelarização apropriada do ácido graxo, que requer a presença de ácidos biliares.</p><p>A vitamina A é da família retinoide e está envolvida na visão normal, no desenvolvimento do embrião e na regulação do</p><p>gene  no  adulto.  O  armazenamento  de  vitamina  A  acontece  exclusivamente  no  fígado  e  ocorre  nas  células  hepáticas</p><p>estreladas. O  excesso de  ingestão de  vitamina A pode  resultar  em  toxicidade hepática. A vitamina D  está  envolvida na</p><p>homeostase  do  cálcio  e  do  fósforo.  Uma  das  etapas  de  ativação  de  vitamina  D  (25‑hidroxilação)  ocorre  no  fígado.  A</p><p>vitamina E  é um poderoso  antioxidante  e protege  as membranas  contra  a peroxidação  lipídica  e  a  formação de  radicais</p><p>livres. Finalmente, a vitamina K é um importante cofator translacional na γ‑carboxilação e na síntese hepática dos fatores II,</p><p>VII, IX e X, bem como as proteínas C reativa e S, chamadas de cofatores da vitamina K. As síndromes colestáticas podem</p><p>resultar de uma inadequada absorção destas vitaminas secundária à reduzida micelarização no intestino. As síndromes de</p><p>deficiência  de  vitamina  associadas  a  doenças  ósseas  metabólicas  (deficiência  de  vitamina  D),  distúrbios  neurológicos</p><p>(deficiência de vitamina E) e coagulopatia (deficiência de vitamina K) podem ocorrer subsequentemente.</p><p>O fígado também está envolvido na captação, no armazenamento e no metabolismo de várias vitaminas hidrossolúveis,</p><p>incluindo tiamina, riboflavina, vitamina B6, vitamina B12, ácido fólico, biotina e ácido pantotênico. O fígado é responsável</p><p>pela  conversão  de  algumas  destas  vitaminas  hidrossolúveis  em  coenzimas,  transformando  algumas  em  metabólitos  e</p><p>usando outras para circulação entero‑hepática (p. ex., vitamina B12).</p><p>Coagulação</p><p>O  fígado  responde  pela  síntese  de  quase  todos  os  fatores  de  coagulação  identificados,  bem  como  de  muitos  dos</p><p>componentes  do  sistema  fibrinolítico  e  várias  proteínas  regulatórias  plasmáticas  de  coagulação  e  fibrinólise.  Conforme</p><p>assinalado,  o  fígado  é  fundamental  para  a  absorção da  vitamina K,  pois  sintetiza  os  fatores de  coagulação dependentes</p><p>desta vitamina e  contém a enzima que os ativa. Além disso, o  sistema reticuloendotelial do  fígado  remove os  fatores de</p><p>coagulação ativados, os complexos ativados dos sistemas de coagulação e fibrinolítico e os produtos finais da degradação</p><p>da fibrina. As doenças do fígado são frequentemente associadas a trombocitopenia, anormalidades qualitativas plaquetárias</p><p>e deficiência de vitamina K com modulação alterada de fatores de coagulação da vitamina K dependente e da coagulação</p><p>intravascular  disseminada  (CID). Não  é  surpreendente,  porém,  que  a  doença  do  fígado  esteja  fortemente  associada  aos</p><p>distúrbios da coagulação, que são um desafio constante.</p><p>A varfarina, um dos anticoagulantes mais utilizados na prática médica, atua no fígado bloqueando a ativação dos fatores</p><p>II, VII,  IX e X dependentes da vitamina K. O  fator VII  tem a meia‑vida mais  curta  entre os  fatores de  coagulação,  e  sua</p><p>deficiência  é  manifestada,  clinicamente,  como  a  alteração  do  tempo  de  protrombina  (TP)  ou  razão  normalizada</p><p>internacional (INR). Os pacientes com disfunções hepáticas complexas têm um TP anormal.</p><p>Metabolismo de Fármacos e Toxinas (Xenobióticos)</p><p>O  corpo  humano  é  exposto  a  uma  enorme  quantidade  de  substâncias  químicas  estranhas  durante  toda  a  vida,  e  isto</p><p>representa um desafio à nossa  capacidade de  se desintoxicar  e  eliminar  estas  substâncias potencialmente  lesivas. Muitas</p><p>destas  substâncias  não  são  incorporadas  ao  metabolismo  celular,  sendo  conhecidas  como  xenobióticos.  O  fígado</p><p>desempenha um papel fundamental no controle destas substâncias, mediante um enorme e complexo número de enzimas e</p><p>vias de reação que são cada vez mais reconhecidas à medida que novas substâncias são descobertas.</p><p>De modo geral, as reações hepáticas aos xenobióticos são classificadas em fase I e II. As reações da fase I, por meio da</p><p>oxidação, da redução e da hidrólise, aumentam a polaridade e, consequentemente, a solubilidade da água dos compostos.</p><p>Em  contrapartida,  isto  permite  uma  excreção  mais  fácil.  As  reações  da  fase  I  nem  sempre  desintoxicam  e  podem,  na</p><p>verdade,  criar  metabólitos  tóxicos.  Reações  de  fase  I  ocorrem  no  citocromo  P450  (CYP)  do  sistema.  Reações  da  fase  II</p><p>geralmente</p><p>atuam para criar um subproduto menos tóxico ou menos ativo. Normalmente, isto ocorre mediante as reações</p><p>de transferase, nas quais um composto é muitas vezes acoplado a um conjugado, tornando os xenobióticos menos inócuos.</p><p>Regeneração</p><p>O  fígado  apresenta  a  exclusiva  capacidade  de  ajustar  o  seu  volume  às  necessidades  corporais,  o  que  é  clinicamente</p><p>observado  em  sua  regeneração  depois  da  hepatectomia  parcial  ou  de  uma  lesão  tóxica.  Isso  também  é  observado  no</p><p>transplante de fígado, em que o tamanho do fígado do doador se ajusta ao novo hospedeiro. Esta qualidade é conservada</p><p>de forma evolutiva em virtude das funções cruciais do fígado e ao fato de que esta é a primeira linha da exposição para os</p><p>agentes tóxicos ingeridos.</p><p>A  regeneração  do  fígado  é  uma  resposta  hiperplásica  de  todos  os  tipos  de  células  hepáticas  nas  quais  a  anatomia</p><p>microscópica funcional do fígado é mantida. A maioria das informações que temos sobre a resposta regenerativa do fígado</p><p>baseia‑se  em  trabalhos  experimentais  em  roedores.  Em geral,  os  hepatócitos  quiescentes penetram  rapidamente no  ciclo</p><p>celular após a hepatectomia parcial. A síntese máxima de DNA do hepatócito ocorre de 24 a 36 horas após a hepatectomia</p><p>parcial, e a síntese máxima de DNA dos outros tipos de célula ocorre 48 a 72 horas depois. A maior parte do aumento da</p><p>massa hepática em ratos é observada três dias após a hepatectomia parcial e geralmente é quase completa depois de sete</p><p>dias.</p><p>No  final  da  década  de  1960,  foi  reconhecido  que  fatores  circulantes  eram  os  responsáveis,  em  parte,  pela  resposta</p><p>regenerativa; muitas  pesquisas  se  concentraram  no  controle  genético  e  humoral  da  regeneração  hepática.  Os  principais</p><p>fatores circulantes identificados (especialmente a partir de estudos com roedores) são o fator de crescimento do hepatócito,</p><p>o fator de crescimento epidérmico, os fatores transformadores de crescimento, a insulina, go lucagon, bem como as citocinas</p><p>do TNF‑α, da IL‑1 e da IL‑6. Estes fatores, quando introduzidos em um hospedeiro normal, não resultam em crescimento</p><p>hepático,  indicando  que  os  hepatócitos  devem  ser  preparados  de  alguma  forma  antes  de  responder  a  estes  fatores  de</p><p>crescimento. O notável progresso na compreensão da regeneração hepática é  resultado do desenvolvimento de melhores</p><p>técnicas  biológicas  moleculares  e  genéticas.  Centenas  de  genes  envolvidos  em  todas  as  fases  de  regeneração  foram</p><p>identificados por técnicas de ordenação do RNA. Além disso,  inúmeras vias dependentes de citocina e independentes de</p><p>fator de crescimento  já  foram definidas, no entanto uma descrição completa está além do escopo deste capítulo e muitas</p><p>dúvidas ainda permanecem.</p><p>Evoluções Futuras</p><p>O estudo do fígado e da sua fisiologia continua sendo um campo extraordinariamente excitante. Assim como os campos da</p><p>biologia  molecular  e  da  manipulação  genética  desabrocharam,  o  mesmo  aconteceu  com  o  campo  da  hepatologia.  Em</p><p>virtude da carência de alternativas ao transplante para pacientes em estágios terminais de falência do fígado, a engenharia</p><p>dos  tecidos  e  as  tentativas  para  se  produzir  suporte  funcional  hepático  exógeno  continuam  sendo  investigadas.  A</p><p>reestruturação  populacional  do  fígado  com  células  transplantadas  –  os  hepatócitos  ou  progenitoras  hepáticas  e  células‑</p><p>tronco  –  pode  também  oferecer  opções  futuras  para  os  pacientes  com  insuficiência  hepática.  Embora  a  identificação  de</p><p>marcadores  específicos  confiáveis  para  células‑tronco  hepáticas  tenha  sido  imprecisa,  os  conceitos  dos  progenitores  e</p><p>células‑tronco do fígado, assim como sua utilidade potencial para repopulação hepática, ganharam aceitação, tornando isso</p><p>uma  área  excitante  da  pesquisa. As  comparações  genéticas  em  curso  sobre  fígados  normais  e  doentes  utilizando  novas</p><p>técnicas de biologia molecular e celular fornecerão pistas sobre a regulação genética de doenças hepáticas. Grandes avanços</p><p>foram feitos quanto à efetividade da terapia do gene, e muitos grupos continuam a estudar as estratégias da terapia do gene</p><p>direcionada  ao  fígado  para  o  tratamento  dos  distúrbios  adquiridos  e  hereditários.  Estudos  de  biologia  molecular  em</p><p>andamento estão pesquisando a regulação do ciclo celular hepático, com implicações para a hepatocarcinogênese. Estudos</p><p>de  pesquisa  sobre  a  patogênese  da  fibrose  hepática  e,  talvez  mais  excitante,  como  reverter  este  processo  estão  em</p><p>andamento e provavelmente resultarão em avanços significativos no futuro.</p><p>Avaliação da Função do Fígado</p><p>Uma  enorme  variedade  de  testes  está  disponível  para  avaliar  as  doenças  hepáticas.  A  triagem  de  doença  hepática,  a</p><p>avaliação da função hepática, o diagnóstico dos distúrbios específicos e o prognóstico são fundamentais no tratamento da</p><p>doença hepática. Para o cirurgião, a avaliação da função hepática e a estimativa da capacidade de um resíduo hepático ser</p><p>suficiente após a ressecção do fígado também são de evidente importância. Infelizmente, a maioria das avaliações da doença</p><p>hepática é grosseira e carece de sensibilidade, especificidade e precisão. Dividimos estes testes de função hepática em três</p><p>categorias – triagem de rotina, testes diagnósticos e quantitativos específicos.</p><p>Exames de Triagem de Rotina</p><p>Exames  de  sangue  são  frequentemente  utilizados  para  determinar  se  há  doença  no  sistema  hepatobiliar.  Em  geral,  os</p><p>exames padrão  (testes) da  função hepática  (TFHs) não  são  testes de  função e nem sempre  são específicos para a doença</p><p>hepática,  no  entanto  são  valiosos  como  uma  ferramenta  de  triagem  geral  que  pode  fornecer  indicações  básicas  para</p><p>reconhecer a presença de indícios de doença e funções hepáticas sobre a causa dessa doença. Os níveis de bilirrubina total,</p><p>bilirrubina direta  (conjugada)  e bilirrubina  indireta  (desconjugada) podem ser afetados por uma gama de processos que</p><p>estão relacionados com o metabolismo da bilirrubina. A hiperbilirrubinemia desconjugada pode ser um reflexo de aumento</p><p>da produção de bilirrubina (p. ex., hemólise), efeitos das drogas, distúrbios enzimáticos hereditários e icterícia fisiológica do</p><p>recém‑nascido. Geralmente, a hiperbilirrubinemia conjugada é um resultado da colestase ou da obstrução biliar mecânica,</p><p>mas também pode ser vista em alguns distúrbios hereditários ou na doença hepatocelular.</p><p>As transaminases alanina aminotransferase (ALT) e a aspartato aminotransferase (AST) são os marcadores séricos mais</p><p>comuns da necrose hepatocelular, mostrando a fuga destas enzimas intracelulares para circulação no dano ao hepatócito. A</p><p>AST é encontrada em outros órgãos, como coração, músculo e rim, mas a ALT é específica do fígado; no entanto o grau de</p><p>elevação desses  níveis  de  enzima nunca mostrou  ter  valor  prognóstico. A  fosfatase  alcalina  (FA)  aparece  no  fígado,  nos</p><p>ductos biliares, nos ossos, nos intestinos, na placenta, nos rins e nos leucócitos. As determinações de isoenzimas podem ser</p><p>úteis,  às vezes, para distinguir a origem de uma FA elevada. Elevações dos níveis de FA nas doenças hepatobiliares  são</p><p>secundárias a colestase ou obstrução biliar e causadas por aumento da produção desta enzima. O nível de FA também pode</p><p>estar  aumentado  na  doença  maligna  do  fígado.  A  gama‑glutamil  transpeptidase  (GGT)  é  uma  enzima  encontrada  em</p><p>muitos órgãos além do fígado, como rins, vesículas seminais, baço, pâncreas, coração e cérebro. Seu nível pode ser elevado</p><p>em doenças que  afetam qualquer um desses  tecidos. Ela  é  alterada pelo  consumo de  álcool  e  está  elevada na obstrução</p><p>biliar. Assim, é também um marcador não específico da hepatopatia, mas pode ser útil para determinar se um nível elevado</p><p>de FA é decorrente de doença hepática. A nucleotidase também é encontrada em uma ampla variedade de órgãos além do</p><p>fígado, mas níveis elevados são bastante específicos para a doença hepática. Como a GGT, ela pode</p><p>ser útil para determinar</p><p>se um nível elevado de FA é secundário à doença hepática.</p><p>A albumina  é  sintetizada  exclusivamente no  fígado, de modo que pode  ser usada  como uma medida geral da  função</p><p>hepática.  Como  a  desnutrição  crônica  e  a  lesão/inflamação  aguda  podem  diminuir  a  síntese  de  albumina,  estes  fatores</p><p>devem  ser  levados  em  consideração  na  avaliação  de  um  baixo  nível  de  albumina  sérica.  Tendo  em  vista  a  notável</p><p>capacidade  de  síntese  proteica  do  fígado,  a  hipoalbuminemia  é  um  marcador  de  doença  hepática  grave,  entretanto</p><p>apresenta pouquíssima  sensibilidade,  e  grandes  regressões da  função hepática  são necessárias  para  serem  refletidas  nos</p><p>níveis de albumina. Em geral, é mais útil na doença hepática crônica.</p><p>Os  fatores  de  coagulação  são  amplamente  sintetizados  no  fígado,  e  as  anormalidades  da  coagulação  podem  ser  um</p><p>marcador da  síntese da disfunção hepática. As medidas dos  fatores  específicos de  coagulação,  como o V  e  o VII,  foram</p><p>usadas  para  avaliar  a  função  hepática  na  população  transplantada. O TP  e  a  INR  são  os melhores  testes  para medir  os</p><p>efeitos  da  doença  hepática  na  coagulação,  e  o  TP  prolongado  ou  a  INR  elevada  são,  em  geral,  marcadores  da  doença</p><p>hepática crônica avançada. A doença hepática também pode afetar a coagulação por meio da coagulação intravascular e da</p><p>má absorção de vitamina K.</p><p>Testes Diagnósticos Específicos</p><p>Uma vez que os testes de triagem, aliados às observações clínicas, tenham indicado doença do fígado, os testes específicos</p><p>podem ser utilizados para ajudar a elucidar a etiologia e orientar o tratamento, caso necessário. Os estudos sorológicos para</p><p>hepatite  são  importantes  para  determinar  a  presença  de  hepatite  viral.  Os  anticorpos  autoimunes  são  usados  para</p><p>diagnosticar  a  cirrose  biliar  primária  (antimitocondrial),  a  colangite  esclerosante  primária  (antineutrofílica)  e  a  hepatite</p><p>autoimune. Os níveis de α1‑antitripsina e ceruloplasmina auxiliam no diagnóstico de deficiência de α1‑antitripsina e doença</p><p>de Wilson,  respectivamente. Os marcadores  tumorais,  como AFP  e  antígeno  carcinoembrionário  CEA  podem  ajudar  no</p><p>diagnóstico e no acompanhamento dos tumores primários e metastáticos do fígado.</p><p>Em geral, os testes funcionais hepáticos discutidos nesta seção são rotineiros, inespecíficos e de pouco ou nenhum valor</p><p>prognóstico. Muitas tentativas foram feitas para a formulação de testes dinâmicos e quantitativos da função hepática com</p><p>base na capacidade do fígado para remover várias substâncias administradas de forma exógena. Apesar dos muitos anos de</p><p>pesquisa, ainda não se tem certeza se estes testes de função hepática são melhores que os sistemas de escores derivados dos</p><p>testes  simples  de  sangue  e  das  observações  clínicas.  Por  exemplo,  o  teste  respiratório  de  aminopirina  tem  como  base  a</p><p>liberação de CYP de aminopirina radiomarcada. Um teste respiratório mensurando o CO2radiomarcado, como resultado da</p><p>degradação  da  aminopirina,  é  realizado  após  a  administração,  em  um  tempo  determinado.  Os  resultados  dependem</p><p>fundamentalmente da massa hepática  funcional, que  costuma não  se  esgotar até a doença hepática em seu estágio final.</p><p>Existem  resultados  de  estudos  comparando  o  teste  respiratório  de  aminopirina  com  a  função  hepática  padrão  e  a</p><p>classificação de sistemas; seu principal valor parece ser o prognóstico na doença hepática crônica, mas claramente não é um</p><p>teste efetivo para detectar a disfunção hepática subclínica.</p><p>Substâncias  como  a  antipirina  e  a  cafeína  podem  avaliar  a  função  hepática  de  uma maneira  similar,  com  resultados</p><p>equivalentes. O exame de depuração da lidocaína fornece informações similares ao teste da aminopirina porque tem como</p><p>base  sua  depuração  pelo  teste  de  CYP  hepático.  A  depuração  da  lidocaína  é  dependente  do  fluxo  sanguíneo  e  de  um</p><p>complexo processo de distribuição, mas a mensuração de um de seus metabólitos, a monoetilglicinaexilidida, simplificou</p><p>enormemente  o  teste.  Esse  exame  mostrou  ter  algum  valor  prognóstico  na  população  de  transplantados.  O  teste  de</p><p>eliminação de galactose se baseia no papel do fígado na fosforilação da galactose e na sua conversão em glicose. A taxa na</p><p>qual a galactose é eliminada da corrente sanguínea pode ser uma medida da função hepática. Os problemas relacionados</p><p>com  este  teste  são  o  fato  de  que  as  enzimas  envolvidas  são  geneticamente  heterogêneas,  além  da  ocorrência  de  um</p><p>considerável  metabolismo  extra‑hepático.  Além  disso,  várias  amostras  de  sangue  são  necessárias,  o  que  torna  o  teste</p><p>desconfortável.  O  valor  deste  teste  está  na  possibilidade  de  avaliar  o  prognóstico  dos  pacientes  com  doença  hepática</p><p>crônica, melhor do que uma triagem. O verde de indocianina é um corante eliminado pelo fígado por um processo mediado</p><p>por um carreador e excretado na bile. Este corante é rapidamente captado na corrente sanguínea e não é metabolizado. Este</p><p>foi o único teste que mostrou ter algum significado prognóstico em paciente cirróticos submetidos à ressecção do fígado,</p><p>embora ainda não haja estudos universais comprobatórios sobre o mesmo e tampouco uma aceitação universal.</p><p>Testes Quantitativos</p><p>Finalmente,  foi  proposta  uma  enorme  quantidade  de  sistemas  de  escores  com  base  na  observação  clínica  e  nos  testes</p><p>sanguíneos padrão. O sistema mais usado é a modificação de Pugh dos escores de Child (Tabela 53‑2). Embora todos estes</p><p>sistemas estejam longe de serem perfeitos e não sejam universalmente aceitos, o escore de Child‑Pugh é o mais utilizado em</p><p>pacientes cirróticos que necessitam de cirurgia hepática. As taxas de mortalidade e sobrevida após a hepatectomia mostram</p><p>uma correlação com este escore, mas nem sempre estão relacionadas com a falência do fígado. Pacientes Child‑Pugh classes</p><p>B  e C  apresentam maior mortalidade  após  hepatectomia  parcial  que  os Child‑Pugh  classe A,  que  podem  suportar  uma</p><p>hepatectomia alargada.1,2 A  presença  de  hipertensão  portal  tem  se mostrado  um preditor  de  resultados  ruins  após  uma</p><p>hepatectomia  parcial.  A  presença  de  hipertensão  portal  em  pacientes  cirróticos  geralmente  se  manifesta  como</p><p>trombocitopenia,  esplenomegalia  e  observação  de  varizes  intra‑abdominais  em  exames  de  imagem  ou  endoscopia.  As</p><p>melhores  evidências  de  hipertensão  portal  são  a  medida  dos  níveis  pressóricos  por  encunhamento  pelas  veias  supra‑</p><p>hepáticas e a obtenção de uma pressão superior a 10 mmHg, cujos resultados mostraram estar fortemente correlacionados</p><p>com insuficiência hepática pós‑operatória.</p><p>Tabela 53­2</p><p>Classificação de Child­Pugh</p><p>FATOR</p><p>N° DE PONTOS</p><p>1 2 3</p><p>Bilirrubina (mg/dL)  3</p><p>Albumina (g/dL) > 3,5 2,8‑3,5  6</p><p>Ascite Nenhum Leve Moderada</p><p>Encefalopatia Nenhum Mínimo Avançada</p><p>Classe A, 5­6 pontos; Classe B, 7­9 pontos; Classe C, 10­15 pontos.</p><p>Hipertensão portal</p><p>A cirrose, que é o  resultado final de uma resposta de cicatrização  iniciada por  lesão hepática crônica,  caracteriza‑se pelo</p><p>desenvolvimento  de  septos  fibrosos  rodeando  os  nódulos  hepatocelulares  em  regeneração.  A  cirrose  está  associada  ao</p><p>desenvolvimento de deficits de síntese e de hipertensão portal. Ainda não existe tratamento eficaz para os cirróticos e, como</p><p>resultado, o tratamento tem se concentrado no controle da hipertensão portal resultante e suas complicações. O principal</p><p>desafio para o hepatólogo e o cirurgião que está tratando dos pacientes com doença hepática terminal e cirrose é determinar</p><p>quando o  tratamento definitivo  (p.  ex.,  transplante de  fígado),  em vez de  tratamento paliativo  (p.  ex.,  intervenções para</p><p>prevenir hemorragia varicosa recorrente), deve ser utilizado.</p><p>Definição</p><p>A  hipertensão  porta  é  definida  por  uma  pressão  portal  superior  a  5  mmHg,  entretanto</p><p>pressões  mais  elevadas  são</p><p>necessárias para  iniciar a estimulação para o desenvolvimento da circulação colateral portossistêmica (8 a 10 mmHg). Os</p><p>vasos  colaterais  geralmente  se  desenvolvem  onde  as  circulações  venosas  portal  e  sistêmicas  estão  em  estreita</p><p>proximidade (Fig. 53‑18). A rede colateral composta pelas veias gástricas curtas e coronarianas drena para a veia ázigos e é</p><p>clinicamente a mais importante, pois é responsável pela formação de varizes esofagogástricas; no entanto outros locais, nos</p><p>quais  se  inclui  a  veia  umbilical  recanalizada  por  intermédio  da  veia  porta  esquerda  para  o  sistema  venoso  epigástrico</p><p>(cabeça  de  medusa),  os  vasos  colaterais  retroperitoneais  e  o  plexo  venoso  hemorroidário,  fazem  parte  do  conjunto  de</p><p>possibilidades que podem compor o sistema varicoso. Além de vasos colaterais extra‑hepáticos, uma fração significativa do</p><p>fluxo  venoso  portal  atravessa  os  shunts  anatômicos  e  fisiológicos  (p.  ex.,  capilarização  dos  sinusoides  hepáticos)  intra‑</p><p>hepáticos. À medida  que  a perfusão portal  hepática diminui,  o  fluxo  arterial  hepático  geralmente  aumenta  (resposta de</p><p>tampão).2</p><p>FIGURA 53­18  Vias colaterais portossistêmicas se desenvolvem onde os sistemas venosos portais sistêmicos</p><p>e venosos estão em aposição bem próxima. (De Rikkers LF: Portal hypertension. In Miller TA, editor: Physiologic basis of</p><p>modern surgical care, St Louis, 1988, Mosby, pp 417–428.)</p><p>Fisiopatologia</p><p>A hipertensão portal geralmente ocorre em virtude da maior resistência ao afluxo venoso portal de localização pré‑hepática,</p><p>intra ou pós‑hepática. Vários fatores podem contribuir para isso, incluindo maior resistência passiva secundária à fibrose e</p><p>nódulos  regenerativos;  aumento  da  resistência  vascular  hepática  causada  por  vasoconstrição  ativa,  norepinefrina,</p><p>endotelina e outros vasoconstritores humorais; aumento do fluxo venoso portal secundário para a hiperdinâmica circulação</p><p>sistêmica e hiperemia esplâncnica. O último é um contribuinte importante para a manutenção da hipertensão portal com o</p><p>desenvolvimento  sistêmico das  colaterais.  Infelizmente,  as  causas  exatas  permanecem desconhecidas, mas  os  hormônios</p><p>esplâncnicos, a diminuição da sensibilidade da vasculatura esplâncnica às catecolaminas e o aumento da produção de óxido</p><p>nitroso e prostaciclina podem estar envolvidos. É possível que a compreensão da fisiopatologia da hipertensão portal tenha</p><p>implicações terapêuticas, pois estes fatores podem representar alvos para o tratamento.</p><p>A causa mais comum de hipertensão portal pré‑hepática é a trombose da veia porta, responsável por aproximadamente</p><p>50% dos casos de hipertensão portal em crianças. Quando a veia porta é trombosada na ausência de doença hepática, vasos</p><p>colaterais  portal  hepatopetal  (para  o  fígado)  se  desenvolvem  para  restaurar  a  perfusão  portal.  Esta  combinação  é</p><p>denominada degeneração cavernomatosa da veia porta. A trombose da veia esplênica isolada (hipertensão portal esquerda)</p><p>é  geralmente  secundária  a  pancreatites  e/ou  neoplasia.  O  resultado  é  a  hipertensão  venosa  gastroesplênica,  com  a  veia</p><p>mesentérica superior e a pressão portal venosa normais. A veia gastroepiploica esquerda torna‑se o maior vaso colateral das</p><p>varizes gástricas, que se desenvolvem em vez de varizes esofagianas. É importante reconhecer essa variante de hipertensão</p><p>portal porque ela é facilmente revertida pela esplenectomia isolada.</p><p>O local de resistência aumentada na hipertensão portal intra‑hepática pode ser nos níveis pré‑sinusoidal, sinusoidal ou</p><p>pós‑sinusoidal.  Frequentemente,  mais  de  um  nível  pode  estar  envolvido.  A  causa  mais  comum  de  hipertensão  pré‑</p><p>sinusoidal  intra‑hepática  é  a  esquistossomose.  Além  disso,  muitas  causas  de  cirrose  alcoólica  podem  resultar  em</p><p>hipertensão portal pré‑sinusoidal. Por outro lado, a, cirrose alcoólica – que é a causa mais comum de hipertensão portal nos</p><p>Estados Unidos – geralmente provoca aumento da resistência no nível de fluxo portal sinusoidal (secundária à deposição de</p><p>colágeno  no  espaço  de  Disse)  e  pós‑sinusoidal  (secundária  à  regeneração  de  nódulos  distorcidos  das  pequenas  veias</p><p>hepáticas).</p><p>As  causas  pós‑hepáticas  ou  pós‑sinusoidais  da  hipertensão  portal  são  raras  e  incluem  síndrome  de  Budd‑Chiari</p><p>(trombose da veia hepática), pericardite constritiva e insuficiência cardíaca. Raramente o aumento do fluxo venoso portal</p><p>sozinho,  secundário  à  esplenomegalia  volumosa  (p.  ex.,  hipertensão  portal  idiopática),  ou  uma  fístula  arteriovenosa</p><p>esplâncnica causam hipertensão portal.</p><p>Avaliação da Doença Hepática Crônica e Hipertensão Portal</p><p>Os  principais  aspectos  da  avaliação  de  um  paciente  com  suspeita  de  doença  hepática  crônica  ou  complicações  de</p><p>hipertensão portal são os seguintes: o diagnóstico da doença hepática subjacente; a estimativa da reserva funcional hepática;</p><p>a  definição  da  anatomia  venosa  portal;  a  avaliação  hemodinâmica  hepática;  e  a  identificação  do  local  de  hemorragia</p><p>gastrointestinal superior, se presente. Essas categorias diagnósticas assumem diferentes graus de importância, dependendo</p><p>da  situação  clínica.  Por  exemplo,  a  estimativa  da  reserva  funcional  hepática  é  útil  para  determinar  o  risco  associado  à</p><p>intervenção terapêutica e está indicado tratamento definitivo (p. ex., transplante hepático) ou tratamento paliativo (p. ex.,</p><p>ligadura endoscópica de varizes ou um procedimento de shunt).</p><p>Hemorragia Varicosa</p><p>O sangramento das varizes esofagogástricas é a única complicação da hipertensão portal mais ameaçadora à vida, sendo</p><p>responsável por  aproximadamente um  terço de  todas os  óbitos de pacientes  com cirrose. Aproximadamente  50% destas</p><p>mortes são causados por sangramento incontrolável. O risco de óbito por sangramento está principalmente relacionado com</p><p>a reserva funcional hepática subjacente. Os pacientes com obstrução venosa portal extra‑hepática e função hepática normal</p><p>raramente morrem por varizes hemorrágicas, enquanto aqueles com cirrose descompensada (p. ex., a classe de Child‑Pugh</p><p>C) podem alcançar uma taxa de mortalidade superior a 50%. Uma vez controlado, o risco de ressangramento das varizes</p><p>ocorre nos primeiros dias após o início da hemorragia, possibilidade esta que diminui rapidamente entre esse período e a</p><p>sexta semana. Subsequentemente, o risco retorna à taxa pré‑hemorrágica.</p><p>Tratamento</p><p>Em  um  paciente  com  hemorragia  gastrointestinal  alta  são  instituidas  medidas  gerais,  como  assegurar  a  via  aérea</p><p>(especialmente  no  paciente  encefalopático)  e  um  acesso  adequado  (dois  acessos  venosos  de  grande  calibre),  infusão  de</p><p>líquidos, tipagem e prova cruzada de sangue, além de transfusão cuidadosa de sangue e hemoderivados. O tratamento para</p><p>hipertensão portal e sangramento varicoso evoluiu ao longo do tempo e agora inclui um espectro de modalidades no qual</p><p>terapias  sequenciais  são  frequentemente necessárias.3,4 Para  os pacientes  com hemorragia  aguda  e  hipertensão portal,  os</p><p>tratamentos não cirúrgico são geralmente de primeira  linha, uma vez que estes pacientes  têm risco cirúrgico elevado em</p><p>decorrência da função hepática descompensada. A abordagem endoscópica (p. ex., esclerose ou ligadura) tem se tornado a</p><p>base do  tratamento não cirúrgico da hemorragia aguda porque o sangramento pode ser controlado em mais de 85% dos</p><p>pacientes. Isto permite um controle clínico para a resolução de ascite e encefalopatia e a melhora da função hepática e da</p><p>nutrição antes de o tratamento definitivo para a prevenção de sangramento recorrente ser instituído. A farmacoterapia pode</p><p>também  ser  adotada  e  vários  estudos  têm  sugerido  que  ela  talvez  seja  tão  eficaz  quanto  a  abordagem  endoscópica.  O</p><p>tamponamento com balão, que é raramente usado, pode salvar vidas de pacientes com hemorragia exsanguinante quando</p><p>outros métodos  conservadores  não  forem  bem‑sucedidos. Um  shunt  portossistêmico</p><p>intra‑hepática  transjugular  (TIPS)  é</p><p>outra opção de tratamento na qual uma conexão é criada percutaneamente no fígado, entre a porta e a circulação sistêmica,</p><p>para  reduzir  a  pressão  portal  de  pacientes  com  complicações  relacionadas  com  a  hipertensão  portal.  O  TIPS</p><p>substitui  shunts  cirúrgicos  para  tratar  a  hemorragia  digestiva  alta  aguda  quando  a  farmacoterapia  e  o  tratamento</p><p>endoscópico não conseguem controlar o sangramento. Como resultado, a intervenção cirúrgica de emergência na maioria</p><p>dos centros é reservada para pacientes selecionados que não são candidatos a TIPS.</p><p>Endoscopia</p><p>Cerca  de  80%  a  90%  dos  episódios  de  sangramento  varicoso  são  controlados  de  forma  bem‑sucedida  com  medidas</p><p>endoscópicas.  A  escleroterapia  e  a  laqueação  elástica  são  as  duas  principais  opções  disponíveis  para  o  controle  de</p><p>hemorragia variceal aguda. Os dados sugerem que a laqueação elástica é melhor do que a escleroterapia no controle inicial</p><p>da hemorragia  e  que  está  associada  a menos  complicações. A  literatura  também  sugere  que  a  escleroterapia, mas não  a</p><p>laqueação  elástica,  pode  aumentar  as  pressões  portais.  Assim,  nesse momento,  a  laqueação  elástica  é  a modalidade  de</p><p>escolha para o controle inicial do sangramento varicoso. A escleroterapia endoscópica pode ser usada se a tecnologia para a</p><p>laqueação elástica não estiver disponível. A endoscopia precoce, preferencialmente dentro de 12 horas desde a chegada ao</p><p>hospital, como uma tentativa de controle de hemorragia é recomendada. Os pacientes devem iniciar fármacos vasoativos, e</p><p>a endoscopia com laqueação elástica é realizada após reanimação inicial.</p><p>Farmacoterapia</p><p>A farmacoterapia funciona mediante a redução do fluxo de sangue nas varizes, o que, por sua vez, diminui a pressão das</p><p>varizes. A terapia médica deve ser iniciada no começo do sangramento varicoso. Considerando que as infecções são comuns</p><p>em pacientes com sangramento varicoso, a antibioticoterapia profilática deve ser  iniciada.  Isso mostrou reduzir a  taxa de</p><p>infecção em mais de 50%, diminuir o ressangramento e melhorar a sobrevida. Estudos randomizados mostraram também</p><p>que a somatostatina e seu análogo octreotida de mais  longa ação são  tão eficazes quanto o  tratamento endoscópico para</p><p>controle da hemorragia digestiva varicosa aguda. Devido aos efeitos colaterais mínimos e à facilidade de administração, a</p><p>octreotida  agora  é  comumente  usada  como  complemento  à  terapia  endoscópica.  Na  verdade,  a  combinação  de  terapia</p><p>endoscópica e octreotida é mais eficaz no controle do sangramento que a octreotida isoladamente, sendo o tratamento de</p><p>escolha para a maioria dos pacientes. Em casos graves de hemorragia, a vasopressina pode ser usada para reduzir o fluxo</p><p>sanguíneo  esplâncnico,  entretanto,  devido  aos  efeitos  adversos  sistêmicos  da  vasopressina,  a  nitroglicerina  deve  ser</p><p>infundida simultaneamente e então monitorada, tendo‑se em vista o controle da pressão arterial.</p><p>Tamponamento de varizes</p><p>Alguns estudos controlados mostraram que o  tamponamento com balão é  tão eficaz quanto a  farmacoterapia e a  terapia</p><p>endoscópica  para  controlar  a  hemorragia  digestiva  aguda  alta.  As  principais  vantagens  do  tamponamento  das  varizes</p><p>usando  o  balão  de  Sengstaken‑Blakemore  são  a  imediata  cessação  do  sangramento  em mais  de  85%  dos  pacientes  e  a</p><p>disponibilidade  difundida  desse  dispositivo  (Fig.  53‑19);  no  entanto,  também  existem  desvantagens  significativas  do</p><p>tamponamento com balão,  incluindo hemorragia recorrente  frequente em até 50% dos pacientes após o esvaziamento do</p><p>balão, desconforto considerável para o paciente e uma alta incidência de complicações graves quando usado incorretamente</p><p>por um profissional da saúde inexperiente.</p><p>Fabiana Carvalho</p><p>Fabiana Carvalho</p><p>Fabiana Carvalho</p><p>Fabiana Carvalho</p><p>FIGURA 53­19  Sonda de Sengstaken­Blakemore modificada. Observe a sonda nasogástrica acessória para</p><p>aspiração de secreções, presa com fita, acima do balão esofágico e os dois grampos para evitar a</p><p>descompressão inadvertida do balão gástrico. (De Rikkers LF: Portal hypertension. In Goldsmith H, editor: Practice of</p><p>surgery, Philadelphia, 1981, Harper & Row, pp 1–37.)</p><p>Abordagens intervencionistas</p><p>Na maioria  das  instituições,  o  TIPS  tornou‑se  o  tratamento  de  escolha  para  as  hemorragias  varicosas  agudas  quando  a</p><p>farmacoterapia e o tratamento endoscópico falham. Com o TIPS, um shunt laterolateral porto‑cava é estabelecido. O TIPS é</p><p>capaz de  controlar  a  hemorragia  em quase  todos  os  pacientes,  no  entanto  está  associado  a  risco de  encefalopatia. Além</p><p>disso,  no  caso  de  disfunção  do  shunt,  existe  risco  de  hemorragia  recorrente.  O  uso  de  stents  cobertos  com</p><p>propiltetrafluoroetileno (PTFE)  foi um grande passo à  frente. Os stents com PTFE  têm uma taxa de patência ao  longo do</p><p>tempo mais elevada e taxas de mortalidade reduzidas.5 O uso de TIPS em pacientes com falência multiorgânica ou naqueles</p><p>com doença hepática descompensada está associado a elevada mortalidade em 30 dias. Nesses pacientes, o uso precoce do</p><p>TIPS, em vez de somente depois da falha de outras terapias, pode estar associado a melhores resultados.</p><p>Abordagens cirúrgicas</p><p>Os  procedimentos  cirúrgicos  são  geralmente  reservados  para  as  situações  às  quais  o  TIPS  não  está  indicado  ou  está</p><p>indisponível. A seleção da cirurgia de emergência apropriada deve ser guiada principalmente pela experiência do cirurgião.</p><p>Embora as terapias não cirúrgicas sejam eficazes na maioria dos pacientes com hemorragia varicosa aguda, uma cirurgia de</p><p>emergência deve ser prontamente realizada quando medidas menos invasivas não conseguirem controlar a hemorragia ou</p><p>não estiverem indicadas. As situações mais comuns que necessitam de cirurgia de urgência ou emergência são falhas do</p><p>tratamento endoscópico, fracasso da terapia endoscópica em longo prazo, hemorragia por varizes gástricas ou gastropatia</p><p>portal hipertensiva e insucesso na colocação do TIPS.</p><p>A transecção esofágica com um grampeador é rápida e relativamente simples, mas as taxas de ressangramento após esse</p><p>procedimento são elevadas. Além disso, há pouca evidência de que as taxas de mortalidade sejam menores do que depois</p><p>da descompressão portal.</p><p>Uma  cirurgia  de  shunt  comumente  realizada  em  situações  de  emergência  é  o  shunt  porto‑cava,  porque  é  rápida  e</p><p>efetivamente descomprime a circulação venosa portal. Resultados impressionantes foram obtidos por Orloff et al.,6 mas não</p><p>por  outros,  quando  um  shunt  porto‑cava  de  emergência  foi  utilizado  como  terapia  de  rotina  para  hemorragia  varicosa</p><p>aguda. Em pacientes que não estão ativamente sangrando no momento da cirurgia e naqueles nos quais o sangramento está</p><p>temporariamente  controlado  pela  farmacoterapia  ou  tamponamento  com  balão,  uma  cirurgia  mais  complexa,  como</p><p>o shunt esplenorrenal distal, pode  ser  apropriada. A principal desvantagem da  cirurgia de  emergência  é que as  taxas de</p><p>mortalidade  excedem  25%  na  maioria  das  séries  relatadas.  A  mortalidade  pós‑operatória  precoce  geralmente  está</p><p>relacionada com o status da reserva funcional hepática, e não com o tipo de cirurgia de emergência selecionado.</p><p>Prevenção da Hemorragia Varicosa Recorrente</p><p>Depois  que  um  paciente  tem  sangramento  de  varizes,  a  probabilidade  de  um  episódio  subsequente  ultrapassa  os  70%.</p><p>Tendo  em  vista  que  a  maioria  dos  pacientes  com  hemorragia  varicosa  tem  doença  hepática  crônica,  os  desafios  do</p><p>tratamento em longo prazo são a prevenção de hemorragia recorrente e a manutenção de uma função hepática satisfatória.</p><p>As  opções disponíveis  para  o  tratamento definitivo  incluem  farmacoterapia,  repetição do  tratamento  endoscópico,  TIPS,</p><p>cirurgias de shunts (p.  ex.,  não  seletiva,  seletiva,  parcial),  os  vários  procedimentos  não shunts  e  transplante  de  fígado. O</p><p>esquema de tratamento mais eficaz geralmente</p><p>requer duas ou mais destas terapias na sequência. Na maioria dos centros, o</p><p>tratamento  inicial  consiste  em  farmacoterapia  ou  terapia  endoscópica  com  descompressão  portal  por  meio  de  TIPS  ou</p><p>um  shunt  cirúrgico  reservado  para  o  fracasso  do  tratamento  de  primeira  linha.  O  transplante  hepático  é  utilizado  para</p><p>pacientes com doença hepática em estágio final.</p><p>Farmacoterapia</p><p>Uma metanálise de estudos controlados com beta‑adrenérgico não seletivo tem demonstrado que esse tratamento diminui</p><p>significativamente  a  probabilidade  de  hemorragia  recorrente  e  mostra  uma  tendência  de  redução  da  mortalidade.7  A</p><p>combinação  de  betabloqueadores  e  nitrato  de  ação  prolongada  (p.  ex., mononitrato  de  5‑isossorbida) mostrou  ser mais</p><p>eficaz do que a ligadura varicosa.8 A terapia de associação é também mais eficaz do que o betabloqueador isoladamente. A</p><p>farmacoterapia em longo prazo deve ser utilizada apenas em pacientes complacentes e que são observados cuidadosamente</p><p>por seu médico.</p><p>Terapia endoscópica</p><p>Vários  ensaios  controlados  e  uma  metanálise  comparando  escleroterapia  endoscópica  com  as  ligaduras  varicosas  têm</p><p>mostrado uma vantagem significativa com esta última técnica. As complicações são menos frequentes após a ligadura das</p><p>varizes e menos sessões de tratamento são necessárias para erradicá‑las (Fig. 53‑20). Também as taxas de ressangramento e</p><p>mortalidade parecem ser menores  após  a  ligadura varicosa. A  combinação de  ligadura de varizes  e  farmacoterapia  com</p><p>betabloqueadores  não  seletivos  é  mais  eficaz  que  a  ligadura  varicosa  isolada.9  Esse  resultado  foi  confirmado  em  uma</p><p>metanálise  que  incluiu dados de  17  ensaios  controlados  randomizados,10 na  qual  uma  combinação  de  betabloqueadores</p><p>com tratamento endoscópico reduziu de modo significativo as taxas de ressangramento em 6, 12 e 24 meses. Além disso, a</p><p>mortalidade  em  24  meses  foi  consideravelmente  mais  baixa  para  o  grupo  com  tratamento  combinado.  Assim,  nesse</p><p>momento, a terapia combinada deve ser recomendada como tratamento de primeira linha para a profilaxia secundária do</p><p>sangramento varicoso.</p><p>FIGURA 53­20  Ligadura endoscópica de varizes esofágicas. A, A variz é atraída para o ligador pela sucção. B,</p><p>O anel O é aplicado. (De Turcotte JG, Roger SE, Eckhauser FE: Portal hypertension. In Greenfield LJ, Mulholland MW, Oldham</p><p>KT, editors: Surgery: Scientific principles and practice, Philadelphia, 1993, JB Lippincott, p 899.)</p><p>Vários  estudos  controlados  comparando  a  terapia  endoscópica  crônica  com  o  tratamento  clínico  convencional  foram</p><p>realizados.  Ainda  que  poucos  pacientes  que  receberam  tratamento  endoscópico,  além  do  tratamento  médico,  tenham</p><p>experimentado ressangramentos em todas as investigações, a taxa de recorrência foi de aproximadamente 50% naqueles sob</p><p>a  terapia  endoscópica.  O  ressangramento  é  mais  frequente  no  primeiro  o  ano  após  o  episódio  inicial.  A  taxa  de</p><p>ressangramento diminui em cerca de 15% anualmente. Embora um único episódio de hemorragia recorrente não signifique</p><p>fracasso  da  terapia,  a  hemorragia  descontrolada,  os  vários  episódios  de  ressangramentos  volumosos,  a  hemorragia  de</p><p>varizes  gástricas  e  a  gastropatia  hipertensiva  implicam  a  necessidade  da  substituição  da  terapia  endoscópica  por  outra</p><p>modalidade de tratamento. Ocorre fracasso do tratamento endoscópico secundário a ressangramentos em até um terço dos</p><p>pacientes.  Assim,  a  terapia  endoscópica  é  uma  abordagem  inicial  racional  para  muitos  pacientes  que  apresentam</p><p>sangramento de varizes esofágicas, mas o  tratamento  subsequente  com TIPS, uma cirurgia de não derivação  (shunt),  um</p><p>procedimento de shunt ou mesmo um transplante de  fígado devem ser  indicados para uma porcentagem significativa de</p><p>pacientes. Por causa das suas taxas de falha relativamente elevadas, uma sessão de terapia endoscópica repetida não deve</p><p>ser adotada para pacientes que não dispõem de possibilidade de atendimento rápido por viverem a longa distância de uma</p><p>assistência médica avançada.</p><p>Terapia intervencionista</p><p>O TIPS está sendo cada vez mais utilizado como um tratamento definitivo para os pacientes que sangram em virtude da</p><p>hipertensão portal (Fig. 53‑21). A principal  limitação do TIPS,  entretanto,  é uma alta  incidência  (até 50%) de estenose ou</p><p>trombose do shunt  no  primeiro  ano. A  estenose  do  shunt  geralmente  é  secundária  à  hiperplasia  neointimal,  sendo mais</p><p>frequente que a trombose e podendo ser resolvida por dilatação do TIPS com balão ou, em alguns casos, pela realização de</p><p>um shunt secundário. A oclusão total de shunt ocorre em 10% a 15% dos pacientes. A estenose e a trombose do shunt  são</p><p>muitas vezes seguidas por hemorragia hipertensiva portal recorrente. A estenose e a oclusão do TIPS tornaram‑se menos</p><p>frequentes com o uso de stents cobertos com PTFE.</p><p>FIGURA 53­21  Colocação de um shunt portossistêmico intra­hepático transjugular. A VCI é acessada pela veia</p><p>jugular interna direita. Se a veia jugular interna direita não for viável, a veia jugular interna esquerda também</p><p>pode ser usada. Por este acesso um cateter 5F é colocado na veia hepática direita e dirigido para um ramo</p><p>periférico. A venografia hepática em cunha é então realizada com gás CO2 para opacificar o sistema venoso</p><p>portal. Utilizando a imagem com venograma hepático como guia, uma agulha é avançada pela parede da veia</p><p>hepática direita e dirigida de forma anteroinferior para acessar a VP direita. Uma vez que a veia porta está</p><p>canalizada, é injetado CO2no trato parenquimatoso para excluir a transgressão do ducto biliar ou da artéria</p><p>hepática. Assim que se confirma a colocação adequada, a endoprótese do TIPS é colocada, o que cria</p><p>um shunt entre a veia porta e a veia hepática, diminuindo, assim, a resistência e descomprimindo as varizes.</p><p>Os TIPS foram comparados com estudos de terapia endoscópica sequencial em 11 estudos aleatórios controlados. Menor</p><p>número de pacientes  ressangra  após  o TIPS  (19%)  quando  em  comparação  com o  tratamento  endoscópico  (47%), mas  a</p><p>encefalopatia foi significativamente mais comum em pacientes com TIPS (34%). As disfunções do TIPS foram observadas</p><p>em 50% dos pacientes. A principal vantagem do TIPS é ser uma abordagem não cirúrgica. Assim, parece ser a terapia ideal</p><p>quando é necessária descompressão portal apenas em curto prazo. Os candidatos a transplante hepático que não obtiveram</p><p>êxito na terapia endoscópica ou farmacológica, portanto, são adequados para o TIPS seguidos de transplante quando um</p><p>órgão doador  se  torna disponível. Como  resultado,  o  paciente  é  protegido  contra  a  possibilidade de  sangramento nesse</p><p>ínterim, e o procedimento de transplante pode ser facilitado pela menor pressão portal. Outro grupo de pacientes nos quais</p><p>o  TIPS  pode  ser  vantajoso  inclui  aqueles  com  descompensação  funcional  hepática  avançada  que  provavelmente  não</p><p>sobreviveriam  tempo  suficiente  sem  o  aporte  do  TIPS.  Como  funciona  do mesmo modo  que  um  shunt  portossistêmica</p><p>laterolateral, o TIPS também é eficaz para o tratamento da ascite clinicamente intratável.</p><p>Tratamento cirúrgico</p><p>As derivações portossistêmicas são seguramente o meio mais eficaz de prevenção das hemorragias recorrentes em pacientes</p><p>com hipertensão portal.  Esses procedimentos  são  eficazes porque descomprimem o  sistema venoso portal  em diferentes</p><p>níveis de intensidade por derivação do fluxo portal para a menor pressão do sistema venoso sistêmico. O desvio do sangue</p><p>portal,  entretanto,  que  contém  hormônios  hepatotrópicos,  nutrientes  e  toxinas  cerebrais,  também  é  responsável  por</p><p>consequências  adversas  das  operações  de  derivações  –  ou  seja,  encefalopatia  portossistêmica  e  insuficiência  hepática</p><p>exacerbada.  As  derivações  portossistêmicas  podem  ser  classificadas  como  não  seletivas,  seletivas  ou  parciais,  conforme</p><p>descomprimem completamente, compartimentalizam ou descomprimem</p><p>parcialmente a circulação venosa portal. Além da</p><p>descompressão varicosa, shunts seletivo e parcial portossistêmicos  também  têm o objetivo de preservar a perfusão portal</p><p>hepática e, portanto, prevenir ou minimizar as consequências adversas desses procedimentos.</p><p>Shunts não seletivos</p><p>As  derivações  não  seletivas  usualmente  utilizadas  para  desviar  completamente  o  fluxo  portal  são  o  shunt  porto‑cava</p><p>terminolateral  (fístula  de  Eck),  o  shunt  porto‑cava  laterolateral,  os  shunts  de  interposição  porto‑cava  calibrado  e</p><p>o shunt esplenorrenal convencional (Fig. 53‑22). A derivação porto‑cava terminolateral é o protótipo de shunts não seletivos,</p><p>sendo  o  único  procedimento  de  derivação  que  tem  sido  comparado  com  o  tratamento  clínico  convencional  em  estudos</p><p>randomizados controlados. A Figura 53‑23 mostra dados da sobrevida de quatro estudos controlados da derivação porto‑</p><p>cava terapêutico realizada em pacientes com hemorragia varicosa prévia. As causas mais comuns de êxito letal em pacientes</p><p>tratados clinicamente e derivados  foram ressangramento e aceleração de  insuficiência hepática,  respectivamente. Embora</p><p>não se possa mostrar uma vantagem da sobrevida para pacientes com shunt, todos estes estudos tinham um viés cruzado</p><p>em  favor dos pacientes  tratados  clinicamente,  vários dos quais  receberam um shunt quando  apresentaram  a  hemorragia</p><p>varicosa  recorrente  intratável.  Além  disso,  quase  todos  os  pacientes  do  estudo  eram  portadores  de  cirrose  alcoólica,</p><p>portanto  esses  resultados  não  necessariamente  se  aplicam  a  outras  causas  de  hipertensão  portal.  Outros  achados</p><p>importantes  desses  estudos  randomizados  incluem  controle  de  sangramento  em  pacientes  derivados,  ressangramento</p><p>varicoso em mais de 70% dos pacientes tratados clinicamente e encefalopatia espontânea, muitas vezes grave em 20% a 40%</p><p>dos pacientes com derivação.Todas as demais derivações não seletivas assinaladas na Figura 53‑22 mantêm a continuidade</p><p>da  veia  porta,  ou  seja,  conectam  a  veia  porta  e  os  sistemas  venosos  sistêmicos  de  forma  laterolateral;  portanto  esses</p><p>procedimentos  descomprimem  a  circulação  venosa  esplâncnica  e  a  rede  sinusoidal  intra‑hepática.  Como  o  fígado  e  os</p><p>intestinos  são  importantes  colaboradores  para  a  formação  da  ascite,  os  shunts  portossistêmicos  laterolaterais  são  os</p><p>procedimentos de derivação mais eficazes para aliviar a ascite, bem como para prevenir sangramento varicoso recorrente.</p><p>Quando se desvia completamente o fluxo portal, no entanto, como no shunt porto‑cava terminolateral, shunts laterolaterais</p><p>também aceleram a insuficiência hepática e levam à encefalopatia pós‑shunt com elevada frequência.</p><p>FIGURA 53­22  Shunts não seletivos desviam completamente o fluxo sanguíneo portal para fora do fígado. (De</p><p>Rikkers LF: Portal hypertension. In Moody FG, Carey LC, Scott Jones RS, et al, editors: Surgical treatment of digestive disease,</p><p>Chicago, 1986, Year Book Medical, pp 409–424.)</p><p>FIGURA 53­23  Dados de sobrevida cumulativa de quatro estudos controlados do shunt porto­</p><p>cava versus tratamento clínico convencional. (De Boyer TD: Portal hypertension and its complications: Bleeding esophageal</p><p>varices, ascites, and spontaneous bacterial peritonitis. In Zakim D, Boyer TD, editors: Hepatology: A textbook of liver disease,</p><p>Philadelphia, 1982, WB Saunders, pp 464–499.)</p><p>O shunt esplenorrenal convencional consiste na anastomose da porção proximal da veia esplênica proximal com a veia</p><p>renal. A esplenectomia também é realizada. Por ser de menor calibre do que a porção distal, este tipo de derivação é mais</p><p>sujeito a trombose. Embora em uma série inicial tenha sido observado que a encefalopatia pós‑shunt era menos comum após</p><p>o shunt  esplenorrenal  convencional  do  que  após  o  shunt  porto‑cava,  análises  subsequentes  sugeriram  que  esta  reduzida</p><p>frequência  de  encefalopatia  estaria  provavelmente  relacionada  com  a  restauração  da  perfusão  hepática  portal  após</p><p>trombose  do  shunt,  desenvolvida  em muitos  pacientes.  Um  shunt  esplenorrenal  convencional  de  calibre  suficiente  para</p><p>permanecer  patente  se  dilata  de  forma  gradual  e  eventualmente  proporciona  uma  descompressão  portal  completa  pela</p><p>derivação  do  fluxo  portal.  Uma  suposta  vantagem  do  procedimento  é  que  o  hiperesplenismo  é  eliminado  pela</p><p>esplenectomia.  A  trombocitopenia  e  a  leucopenia  que  acompanham  a  hipertensão  portal,  no  entanto,  raramente  são  de</p><p>importância clínica, tornando a esplenectomia um processo desnecessário para a maioria dos pacientes.</p><p>Em resumo, os shunts não seletivos efetivamente descomprimem as varizes. Por causa da derivação completa do fluxo</p><p>portal,  entretanto,  elas  são  complicadas  por  frequente  encefalopatia  pós‑operatória  e  insuficiência  hepática  progressiva.</p><p>Os  shunts  laterolaterais  não  seletivos  efetivamente  aliviam  a  ascite  e  previnem  a  hemorragia  varicosa.  Atualmente</p><p>os  shunts  não  seletivos  são  raramente  indicados.  O  TIPS,  também  um  shunt  não  seletivo,  é  a  terapia  de  escolha  para  a</p><p>maioria das situações nas quais os shunts não seletivos eram usados anteriormente (p. ex., pacientes com sangramento de</p><p>varizes e ascite clinicamente intratável). Geralmente um shunt não seletivo é realizado apenas quando não se pode utilizar o</p><p>TIPS ou quando há uma tentativa fracassada de sua utilização.</p><p>Shunts seletivos</p><p>As  deficiências  clínicas  e  hemodinâmicas  de  shunts  não  seletivos  estimularam  o  desenvolvimento  do  conceito  de</p><p>descompressão  seletiva  das  varizes.  Em  1967, Warren  et  al.  introduziram o  shunt  esplenorrenal  distal. No  ano  seguinte,</p><p>Inokuchi  et  al.  relataram  seus  resultados  iniciais  com  o  shunt  de  veia  gástrica  esquerda  com  a  cava,  que  consiste  na</p><p>interposição de um enxerto entre a veia gástrica (coronária estomáquica) esquerda e a VCI que atua direta e seletivamente</p><p>na descompressão das varizes esofagogástricas. Apenas a minoria dos pacientes com hipertensão portal, no entanto,  tem</p><p>anatomia apropriada para esta operação; a experiência com ela tem sido limitada ao Japão, e estudos não controlados têm</p><p>sido realizados.</p><p>O shunt esplenorrenal distal consiste na anastomose da extremidade distal da veia esplênica à veia renal esquerda e na</p><p>ligadura de todos os vasos colaterais (p. ex., veias coronária e gastroepiploica),��que conectam a veia mesentérica superior</p><p>aos  componentes  gastroesplênicos  da  circulação  venosa  esplâncnica  (Fig.  53‑24).  Isso  resulta  na  separação  da  circulação</p><p>venosa portal em um circuito venoso descomprimido gastroesplênico e alta pressão no sistema venoso mesentérico superior</p><p>que continua para perfundir o fígado. Embora o procedimento seja tecnicamente difícil, pode ser empregado com eficiência</p><p>por cirurgiões bem treinados que têm domínio dos princípios da cirurgia vascular.</p><p>FIGURA 53­24  Shunt esplenorrenal distal fornece seletiva descompressão de varizes das veias gástricas</p><p>curtas, baço e veia esplênica para a veia renal esquerda. Perfusão portal hepática é mantida pela interrupção das</p><p>veias umbilical, coronária, gastroepiploica e quaisquer outros colaterais proeminentes. (De Salam AA: Distal</p><p>splenorenal shunts: Hemodynamics of total versus selective shunting. In Baker RJ, Fischer JE, editors: Mastery of surgery, ed 4,</p><p>Philadelphia, 2001, Lippincott Williams & Wilkins, pp 1357–1366.)</p><p>Nem todos os pacientes  são candidatos ao shunt esplenorrenal distal. Devido  às hipertensões  sinusoidal  e mesentérica</p><p>serem  conservadas  e  importantes  vias  linfáticas  seccionadas  durante  a  dissecção  da  veia  renal  esquerda,</p><p>o  shunt  esplenorrenal  distal  tende  a  agravar  a  ascite,  em  vez  de  aliviá‑la.  Assim,  pacientes  com  ascite  clinicamente</p><p>intratáveis não devem ser submetidos a esse procedimento; no entanto a maior parte dos pacientes que desenvolvem ascite</p><p>transitória após o controle de uma hemorragia varicosa é candidata</p><p>a uma derivação seletiva. Outra contraindicação para</p><p>um shunt esplenorrenal distal é a esplenectomia prévia. O diâmetro de veia esplênica inferior a 7 mm é uma contraindicação</p><p>relativa  ao  procedimento,  porque  a  incidência  de  trombose  da  derivação  é  alta  quando  se  usa  uma  veia  de  pequeno</p><p>diâmetro.  Embora  a  descompressão  varicosa  seletiva  seja  um  conceito  fisiológico  seguro,  o  shunt  esplenorrenal  distal</p><p>permanece controversa após uma vasta experiência clínica de quase 40 anos.</p><p>Embora o shunt esplenorrenal distal proporcione a conservação do fluxo portal em mais de 85% dos pacientes durante o</p><p>pós‑ ‑operatório precoce, o sistema venoso mesentérico de alta pressão gradualmente cria colaterais para o shunt de baixa</p><p>pressão,  resultando em perda do aporte portal em aproximadamente 50% dos pacientes por ano. O grau e a duração da</p><p>preservação do fluxo portal dependem da causa da hipertensão portal e dos detalhes técnicos da operação (à medida que as</p><p>circulações mesentérica e gastroesplênica venosa são desconectadas). Embora o fluxo portal  seja mantido na maioria dos</p><p>pacientes com cirrose alcoólica e hipertensão portal não cirrótica (p. ex., trombose da veia porta), o aporte sanguíneo portal</p><p>estabelece rapidamente colaterais com o shunt em pacientes com cirrose alcoólica.</p><p>A  modificação  do  shunt  esplenorrenal  distal  em  consequência  de  ligadura  proposital  ou  acidental  da  veia  coronária</p><p>resulta na perda precoce do fluxo portal. Mesmo quando todos os vasos colaterais importantes são ligados, o fluxo portal</p><p>pode  ser  gradualmente  desviado  por  meio  de  uma  rede  colateral  pancreática  (sifão  pancreático).  Essa  via  pode  ser</p><p>desconectada por toda a extensão da veia esplênica com o pâncreas, ou seja, a desconexão esplenopancreática, que resulta</p><p>em melhor preservação da perfusão portal hepática, especialmente em pacientes com cirrose alcoólica. Esta abordagem do</p><p>procedimento, no entanto, torna‑o tecnicamente mais difícil, além de apresentar uma desvantagem significativa em uma era</p><p>em que menos shunts estão sendo realizados por causa do aumento do uso de terapia endoscópica, TIPS e transplante de</p><p>fígado.</p><p>Seis  das  sete  comparações  controladas de shunt  esplenorrenal  distal  para  derivações  não  seletivas  incluíram pacientes</p><p>cirróticos predominantemente alcoólicos. Nenhum desses estudos mostrou uma vantagem para qualquer procedimento em</p><p>relação  à  sobrevida  em  longo  prazo.  Três  dos  estudos  encontraram  uma  frequência  menor  de  encefalopatia  após</p><p>o shunt esplenorrenal distal, enquanto outros não mostraram diferenças na incidência desta complicação pós‑operatória. Em</p><p>contrapartida  com  a  sobrevida,  a  encefalopatia  é  um ponto  subjetivo  que  foi  avaliado  com vários métodos  nos  ensaios.</p><p>Outro ponto  importante,  comparando‑se os  tratamentos para hemorragia varicosa,  foi a eficácia com que o sangramento</p><p>recorrente  foi  impedido.  Em  quase  todas  as  séries  não  controladas  e  controladas  do  shunt  esplenorrenal  distal,  esse</p><p>procedimento  foi  equivalente  a  shunts  não  seletivos  na  prevenção  de  hemorragia  recorrente.  Principalmente  por  causa</p><p>desses resultados inconsistentes de estudos controlados, não há consenso sobre qual procedimento de shunt é superior em</p><p>pacientes  com  cirrose  alcoólica. Quanto  à  qualidade de  vida  (p.  ex.,  taxa  de  encefalopatia  inferior),  os  resultados  foram</p><p>melhores no grupo de derivação esplenorrenal distal em três dos estudos, e parece haver uma vantagem na descompressão</p><p>seletiva das varizes, mesmo nesta população.</p><p>Consideravelmente,  menos  dados  estão  disponíveis  sobre  derivação  seletiva  na  hipertensão  portal  não  cirrótica  e  na</p><p>cirrose  alcoólica.  Como  a  perfusão  portal  hepática  após  o  shunt  esplenorrenal  distal  é  mais  bem  preservada  nessas</p><p>categorias de doença, poder‑se‑iam esperar  resultados mais  animadores. Um único  estudo  controlado em pacientes  com</p><p>esquistossomose  (hipertensão  portal  pré‑sinusoidal)  mostrou  uma  frequência  menor  de  encefalopatia</p><p>após shunt esplenorrenal distal do que depois de um shunt esplenorrenal convencional (não seletivo). Outra grande série da</p><p>Emory  University  mostrou  que  o  shunt  esplenorrenal  distal  está  mais  fortemente  associado  a  melhor  sobrevida  em</p><p>pacientes com cirrose não alcoólica do que naqueles com cirrose alcoólica; no entanto isso não foi um achado consistente em</p><p>todos os centros em que foram realizadas derivações esplenorrenais distais.</p><p>Vários estudos controlados também têm comparado o shunt esplenorrenal distal com a terapia endoscópica sequencial.</p><p>Nessas investigações, as hemorragias recorrentes foram mais efetivamente eliminadas pela derivação seletiva do que pela</p><p>escleroterapia,  no  entanto  a  perfusão  portal  hepática manteve‑se  em uma  fração  significativamente maior  nos  pacientes</p><p>submetidos à escleroterapia. Apesar dessa vantagem hemodinâmica, as taxas de encefalopatia foram semelhantes após as</p><p>duas terapias.</p><p>Dois estudos norte‑americanos  foram diferentes em relação ao efeito destes  tratamentos na sobrevida em  longo prazo.</p><p>Para um terço do insucesso, a escleroterapia com intervenção cirúrgica resultou em sobrevida significativamente melhor do</p><p>que o de shunt seletivo isolado, enquanto 85% das falhas na escleroterapia poderiam ser salvos por cirurgia. Em contraste,</p><p>uma  investigação semelhante conduzida em uma área esparsamente populosa  (planícies montanhosas do oeste) mostrou</p><p>uma  sobrevida  superior  após  a  shunt  esplenorrenal  distal.  Apenas  31%  das  escleroterapias  malsucedidas  poderiam  ser</p><p>resolvidos por cirurgia neste estudo. Os resultados de sobrevida destes dois estudos sugerem que a terapia endoscópica é</p><p>um tratamento inicial racional para pacientes com sangramento de varizes se o insucesso da escleroterapia for reconhecido</p><p>e estes pacientes forem prontamente submetidos ao TIPS ou cirurgia; entretanto os pacientes que vivem em áreas remotas</p><p>são menos suscetíveis à recuperação por cirurgia de shunt quando o tratamento endoscópico falha, portanto uma derivação</p><p>seletiva pode ser a terapia inicial mais aconselhável para esses pacientes.</p><p>Em  uma  comparação  não  randomizada  do  TIPS,  o  shunt  esplenorrenal  distal  teve  menores  taxas  de  sangramento</p><p>recorrente, encefalopatia e trombose de shunt. A ascite foi menos prevalente após TIPS. Um estudo multicêntrico aleatório</p><p>comparando TIPS e shunt esplenorrenal distal para o tratamento eletivo de sangramento de varizes em pacientes cirróticos</p><p>com bom risco mostrou resultados no geral equivalentes para estes dois procedimentos. As taxas de ressangramento não</p><p>foram significativamente diferentes entre o shunt esplenorrenal distal (6%) e o TIPS (11%), mas isso representa a menor taxa</p><p>de ressangramento publicada após o uso do TIPS. Isto foi provavelmente secundário à vigilância meticulosa da patência do</p><p>TIPS por ultrassonografia e angiografia. Reintervenção frequente em pacientes com TIPS (82% em comparação com 11% dos</p><p>pacientes  de  shunt  esplenorrenal  distal)  foi  necessária  para  se  obterem  esses  resultados.  Neste  estudo,  a  sobrevida  e  a</p><p>encefalopatia pós‑shunt foram semelhantes depois dos dois procedimentos.</p><p>Shunts parciais</p><p>Os objetivos dos shunts parciais e seletivos são os mesmos: descompressão eficaz de varizes, preservação da perfusão portal</p><p>hepática  e manutenção  de  alguma  hipertensão  portal  residual.  As  tentativas  iniciais  de  derivação  parcial  consistiam  na</p><p>anastomose veia a veia de pequeno calibre. Em geral, essas são trombosadas ou dilatadas com o tempo e, assim, tornam‑</p><p>se shunts não seletivos.</p><p>Mais  recentemente,  foi  descrita  uma  interposição  de  shunt  porto‑cava  de  pequeno  diâmetro  usando  um  enxerto  de</p><p>politetrafluoretileno combinado com ligadura da veia coronária e outros vasos colaterais (Fig. 53‑25). Quando a prótese tem</p><p>10 mm ou menos de diâmetro,  a perfusão portal hepática é preservada na maioria dos pacientes, pelo menos durante o</p><p>período  pós‑operatório  precoce.  A  experiência  com  essa  prótese  com  shunt  de  pequeno  diâmetro  é  que menos  de  15%</p><p>dos shunts trombosaram, e a maioria tem sido realizada com êxito por técnicas radiológicas intervencionistas. Um pequeno</p><p>ensaio aleatório prospectivo de shunts com  interposição parcial  porto‑cava  (8 mm de diâmetro)  não  seletivos  (16 mm de</p><p>diâmetro) mostrou uma frequência menor de encefalopatia após o shunt parcial, mas a sobrevida foi similar após ambos os</p><p>tipos de shunts. Em outro estudo clínico controlado, o shunt de interposição de pequeno diâmetro foi assinalado com uma</p><p>taxa de insucesso menor que a do TIPS.</p><p>FIGURA 53­25  Uma interposição de shunt porto­cava de pequeno diâmetro (8 a 10 mm) parcialmente</p><p>descomprime o sistema venoso portal e pode preservar a perfusão portal hepática. (De Sarfeh IJ, Rypins EB, Mason</p><p>GR: A systematic appraisal of portacaval H­graft diameters: Clinical and hemodynamic perspectives. Ann Surg 204:356–363, 1986.)</p><p>Transplante hepático</p><p>O transplante de fígado não é um tratamento para sangramento varicoso, mas deve ser considerado para todos os pacientes</p><p>que apresentam  insuficiência hepática  terminal,  acompanhada ou não por  sangramento. O  transplante em pacientes que</p><p>sangraram  secundariamente  à  hipertensão  portal  é  a  única  terapia  que  lida  com  a  doença  hepática  subjacente,  além de</p><p>fornecer a descompressão portal confiável. Devido a fatores econômicos e um suprimento limitado de doadores de órgãos,</p><p>o transplante de fígado não está disponível para todos os pacientes. Além disso, o transplante não é indicado para algumas</p><p>das causas mais comuns de sangramento varicoso, como a esquistossomose (função hepática normal) e o alcoolismo ativo</p><p>(recusa).</p><p>Há  evidências  acumuladas  de  que  sangramentos  varicosos  com  reserva  funcional  hepática  compensada  (Child‑Pugh</p><p>classes A  e  B  +  )  são  inicialmente mais  beneficiados  por  estratégias  de  não  transplante. Os  tratamentos  farmacológico  e</p><p>endoscópico  devem  ser  condiderados  de  primeira  linha  para  esses  pacientes.  Para  aqueles  que  não  respondem  ao</p><p>tratamento de primeira linha, pode ser realizada uma derivação cirúrgica ou TIPS, as quais também podem ser aplicadas</p><p>sob  circunstâncias  em  que  o  tratamento  farmacológico  ou  endoscópico  seria  arriscado,  como  em  pacientes  com  varizes</p><p>gástricas e geograficamente afastados de atendimento terciário.</p><p>Os pacientes com sangramento de varizes candidatos a transplante incluem cirróticos alcoólicos e abstinentes com reserva</p><p>funcional hepática limitada (Child‑Pugh classes B e C) ou qualidade de vida ruim secundária a doença (p. ex., encefalopatia,</p><p>fadiga,  dor  óssea).  Nesses  pacientes,  a  hemorragia  aguda  deve  ser  tratada  com  terapia  endoscópica,  farmacoterapia  e</p><p>ativação  imediata da  candidatura  a  um  transplante.  Se  a  farmacoterapia  e  o  tratamento  endoscópico  forem  ineficazes,  o</p><p>TIPS deve ser inserido como uma ponte de curto prazo para o transplante.</p><p>Se um procedimento de não  transplantação  (p.  ex., shunt cirúrgico ou TIPS)  for  realizado  inicialmente,  esses pacientes</p><p>devem  ser  cuidadosamente  avaliados  em  intervalos  regulares  de  seis  a  12  meses.  O  transplante  hepático  deve  ser</p><p>considerado  quando  outras  complicações  da  cirrose  se  desenvolvem ou  quando  a  descompensação  hepática  funcional  é</p><p>evidente clinicamente ou por avaliação cuidadosa com TFHs quantitativas.</p><p>Algoritmo para o Tratamento da Hemorragia Varicosa</p><p>Um algoritmo para tratamento definitivo da hemorragia varicosa é mostrado na Figura 53‑26. Os pacientes são inicialmente</p><p>agrupados de  acordo  com  sua  candidatura  ao  transplante.  Essa decisão  é  baseada  em uma  série  de  fatores,  incluindo  a</p><p>causa  da  hipertensão  portal,  a  abstinência  de  alcoólicos  cirróticos,  a  presença  ou  ausência  de  outras  doenças  e  a  idade</p><p>fisiológica, em vez de cronológica. Os candidatos a transplante com função hepática descompensada ou qualidade de vida</p><p>ruim secundária a doença hepática devem ser submetidos a transplante assim que possível.</p><p>FIGURA 53­26  Algoritmo para terapia definitiva de hemorragia varicosa (Ver texto para detalhes).(Adaptada de</p><p>Rikkers LF: Portal hypertension. In Levine BA, Copeland E, Howard R, et al, editors: Current practice of surgery (vol 3), New York,</p><p>1995, Churchill Livingstone.)</p><p>A maioria  dos  candidatos  a  transplante  e  não  transplante  futuro  deve  passar  por  tratamento  endoscópico  inicial  ou</p><p>farmacoterapia, a menos que apresente sangramento de varizes gástricas ou gastropatia hipertensiva portal ou viva em uma</p><p>área geográfica distante e com acesso limitado ao atendimento terciário de emergência. Os pacientes que vivem em locais</p><p>distantes e aqueles cujas terapias endoscópica e medicamentosa foram malsucedidas devem receber um shunt seletivo ou</p><p>TIPS.  Um  estudo  controlado  aleatório  mostrou  que  esses  procedimentos  são  eficazes  se  for  feito  um  cuidadoso</p><p>acompanhamento de TIPS patentes.</p><p>Até  que  os  avanços  na  tecnologia  do  TIPS  sejam  totalmente  alcançados,  é  provável  que  o  shunt  esplenorrenal  distal</p><p>permaneça  como  uma  solução  em  longo  prazo  mais  durável  e  uma  alternativa  razoável  para  o  insucesso  do  TIPS.</p><p>Entretanto o TIPS tem sido uma alternativa bastante utilizada, posto que restam alguns poucos cirurgiões com experiência</p><p>nas cirurgias de shunts; portanto, é provável que os shunts cirúrgicos venham a desempenhar um papel  ainda menor no</p><p>tratamento do sangramento varicoso futuro. Os pacientes com ascite clinicamente intratável, além de sangramento varicoso,</p><p>são mais bem tratados com o TIPS quando medidas menos invasivas não conseguem controlar o sangramento. Se o TIPS</p><p>eventualmente  falhar, um  shunt  laterolateral  convencional  pode  então  ser  executado  se  o  paciente  tiver  função  hepática</p><p>razoável e não for um candidato ao transplante. Por outro lado, o TIPS é claramente indicado para pacientes com insucesso</p><p>no tratamento endoscópico que podem necessitar de transplante em um futuro próximo e para candidatos acometidos de</p><p>deterioração  funcional  hepática  avançada. Os  candidatos  ao  transplante  futuro  devem  ser  cuidadosamente monitorados</p><p>para  que  se  submetam  ao  transplante  no  momento  apropriado  antes  de  se  tornarem  pacientes  com  riscos  cirúrgicos</p><p>elevados.</p><p>O  algoritmo  do  tratamento  para  sangramento  varicoso mudou  consideravelmente  desde  a  década  de  1970,  quando  a</p><p>terapia  endoscópica,  o  transplante  de  fígado  e  o  TIPS  tornaram‑se  disponíveis  para  estes  pacientes.  As  operações  sem</p><p>transplantes agora são menos frequentemente necessárias, os resultados da sobrevida são melhores, porque os pacientes de</p><p>alto risco cirúrgico são tratados por outros meios, e a cirurgia de emergência foi praticamente eliminada.</p><p>Doenças infecciosas</p><p>Abscesso Piogênico</p><p>Epidemiologia</p><p>Ochsner e DeBakey, em seu clássico artigo sobre abscesso piogênico do fígado em 1938, descreveram 47 casos e revisaram a literatura mundial. Esta</p><p>foi  a maior  experiência naquela  época  e  a primeira  tentativa  séria de  estudo desta doença. Naquele  tempo, o  abscesso piogênico do  fígado  era</p><p>principalmente  uma  doença  que  acometia  pessoas  na  faixa  etária  entre  20  e  30  anos  e  resultante  da  apendicite  aguda.  Com  as  marcantes</p><p>modificações  no  atendimento médico desde  então,  e  notadamente  a  utilização de  antibióticos  eficazes,  o  tratamento de  efeito  imediato para  as</p><p>doenças inflamatórias agudas aliadas ao envelhecimento da população se alterou, e o espectro desta doença mudou. O abscesso hepático piogênico</p><p>é  observado  agora  principalmente  em  pacientes  de  50  a  60  anos  e  mais  frequentemente  está  relacionado  com  doença  do  trato  biliar  ou  é</p><p>criptogênico em sua natureza.</p><p>A incidência de abscesso piogênico do fígado permaneceu semelhante, no entanto. Em 1938, Ochsner e DeBakey registraram uma incidência de</p><p>hospitalizações</p><p>penetram no  fígado pelo hilo e  se distribuem por  todo o  fígado como uma unidade única do pedículo‑</p><p>portal,  que  também  inclui  um ducto  biliar.  Esta  unidade  é  revestida  por  um  folheto  peritoneal  que  tem origem no  hilo</p><p>hepático. A drenagem venosa ocorre pelas veias hepáticas direitas, médias e esquerdas, que drenam diretamente para a VCI</p><p>supra‑hepática.</p><p>FIGURA 53­1  A, Historicamente, o fígado foi dividido em lobos direito e esquerdo pela marcação externa do</p><p>ligamento falciforme. Sobre a superfície inferior do ligamento falciforme, o ligamento redondo pode ser visto</p><p>entrando na fissura umbilical. B, Superfície posterior e inferior do fígado. O fígado envolve a veia cava inferior</p><p>(VCI) posteriormente em uma ranhura. O lúmen das três maiores veias hepáticas (VHE, VHM, VHD) e a veia</p><p>adrenal direita podem ser vistos diretamente entrando na VCI. A área nua, limitada pelos ligamentos triangulares</p><p>direito e esquerdo, é ilustrada. À esquerda da VCI encontra­se o lobo caudado, que é limitado em seu lado</p><p>esquerdo por uma fissura contendo o ligamento venoso. O omento menor termina junto à borda do ligamento</p><p>venoso e, assim, o lobo caudado acha­se dentro do omento menor, e o restante do fígado localiza­se no</p><p>compartimento supracólico. Uma camada de tecido fibroso pode ser vista ligando o lobo direito ao lobo caudado,</p><p>posteriormente à VCI, circundando­a. Este ligamento de tecido deve ser seccionado no lado direito, quando o</p><p>fígado direito for isolado da VCI. (De Blumgart LH, Hann LE: Surgical and radiologic anatomy of the liver and biliary tract. In</p><p>Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 3–34.)</p><p>Desenvolvimento normal/embriologia</p><p>O fígado em desenvolvimento compartilha uma origem comum com a árvore biliar e o pâncreas. Durante a embriogênese,</p><p>os sinais são transmitidos do mesênquima cardíaco e do septo transverso. As moléculas que regulam esse fenômeno (p. ex.,</p><p>fator de crescimento dos fibroblastos, proteína morfogenética do osso, Wnt) começaram a ser elucidadas. O primórdio do</p><p>fígado  começa  a  se  formar  na  terceira  semana  de  desenvolvimento  como  uma  excrescência  do  epitélio  endodérmico,</p><p>conhecida como divertículo hepático ou broto hepático. A conexão entre o divertículo hepático e o futuro duodeno contrai‑</p><p>se para formar o ducto biliar, e uma evaginação do ducto biliar forma a vesícula biliar e o ducto cístico. As células hepáticas</p><p>desenvolvem  cordões  e  misturam‑se  com  as  veias  vitelinas  e  umbilicais  para  formar  os  sinusoides  hepáticos.</p><p>Simultaneamente, as células hematopoiéticas, as células de Kupffer e o tecido conjuntivo formam‑se a partir do mesoderma</p><p>do septo transverso. O mesoderma do septo transverso conecta o fígado à parede abdominal ventral e ao intestino anterior.</p><p>Como  o  fígado  cresce  na  cavidade  abdominal,  estas  estruturas  são  alongadas  até  formarem  finas  membranas  que  se</p><p>transformam nos ligamentos falciforme e hepatogástrico. O mesoderma sobre a superfície do fígado em desenvolvimento</p><p>diferencia‑se  em  peritônio  visceral,  exceto  na  parte  superior,  onde  é  mantido  o  contato  entre  o  fígado  e  o  mesoderma</p><p>(futuro diafragma), formando uma área nua, desprovida de peritônio visceral (Fig. 53‑2).</p><p>FIGURA 53­2  Um embrião de aproximadamente 36 dias é mostrado. As extensões do septo transverso podem</p><p>ser vistas desenvolvendo­se à medida que o fígado se protrai na cavidade abdominal, alongando­se e formando o</p><p>omento menor e o ligamento falciforme. O fígado está completamente envolvido pelo peritônio visceral, exceto</p><p>por uma pequena porção próxima ao diafragma, conhecida como área nua. (De Sadler TW: Langman’s medical</p><p>embryology, ed 5, Baltimore, 1985, Williams & Wilkins.)</p><p>O fígado primitivo desempenha um importante papel na circulação fetal. As veias vitelinas levam sangue do saco vitelino</p><p>ao seio venoso e, por fim, formam uma rede de veias em torno do tubo digestório anterior (futuro duodeno) que drena para</p><p>os  sinusoides  hepáticos  em  desenvolvimento.  Estas  veias  vitelinas  se  fundem  para  formar  as  veias  porta,  mesentérica</p><p>superior e esplênica. O seio venoso, que desemboca no coração fetal, transforma‑se no canal hepatocardíaco e, depois, nas</p><p>veias hepáticas e na VCI supra‑hepática. As veias umbilicais, que são paralelas desde o início, levam o sangue oxigenado até</p><p>o feto. No início, as veias umbilicais drenam para os seios venosos, no entanto, depois de cinco semanas, começam a drenar</p><p>para os sinusoides hepáticos. A veia umbilical direita desaparece e a veia umbilical esquerda passa a drenar diretamente no</p><p>canal hepatocardíaco, ultrapassando os sinusoides hepáticos pelo ducto venoso. No fígado do adulto, o resquício da veia</p><p>umbilical esquerda transforma‑se no ligamento redondo, que se estende pelo ligamento falciforme na intimidade da cicatriz</p><p>umbilical,  e  o  restante  do  ducto  venoso  transforma‑se  no  ligamento  venoso  na  inserção  do  omento menor,  sob  o  lobo</p><p>esquerdo do fígado (Fig. 53‑3).</p><p>FIGURA 53­3  A, Desenvolvimento das veias umbilical e vitelínicas de um embrião de 5 semanas. Os</p><p>sinusoides hepáticos desenvolveram­se e, embora existam canais que os perpassem, as veias vitelínicas e</p><p>umbilical estão começando a drenar para eles. B, No segundo mês, as veias vitelínicas drenam diretamente para</p><p>os sinusoides hepáticos. Os ductos venosos se formaram e recebem sangue oxigenado da veia umbilical</p><p>esquerda, perpassam os sinusoides hepáticos e entram diretamente no canal hepatocardíaco. C, Por volta do</p><p>terceiro mês, as veias vitelínicas formam o sistema porta (veias esplênica, mesentérica superior e porta). A veia</p><p>umbilical direita desapareceu, e a veia umbilical esquerda (futuro ligamento redondo) drena para os sinusoides</p><p>venosos, perpassando os sinusoides hepáticos. Note o desenvolvimento da veia cava inferior e das veias</p><p>hepáticas. (De Sadler TW: Langman’s medical embryology, ed 5, Baltimore, 1985, Williams & Wilkins.)</p><p>O fígado do adulto é um sistema complexo de numerosos  tipos  celulares,  incluindo hepatócitos,  colangiócitos,  células</p><p>neuroendócrinas,  precursores  hepáticos  (conhecidos  como  células  ovais),  células  mesenquimais  miofibroblásticas</p><p>(conhecidas como células estreladas e miofibroblastos portais), macrófagos residentes (conhecidos como células de Kupffer)</p><p>e células endoteliais vasculares.</p><p>Anatomia Funcional</p><p>Historicamente,  o  fígado  era dividido  em  lobos direito  e  esquerdo, determinados pelos  ramos das veias porta  e  artérias</p><p>hepáticas. Essa descrição não somente era  supersimplificada,  como  também era anatomicamente  incorreta em relação ao</p><p>suprimento sanguíneo hepático. Nossa compreensão da anatomia funcional do fígado tornou‑se mais sofisticada.</p><p>A anatomia funcional do fígado (Figs. 53‑4 e 53‑5) é constituída por oito segmentos, cada um deles  fornecido por uma</p><p>única tríade portal (também chamada de pedículo) composta por veia porta, artéria hepática e ducto biliar. Estes segmentos</p><p>são classificados em quatro setores separados por cissuras contendo as tr��s principais veias hepáticas. Os quatro setores são</p><p>ainda mais  organizados  em  fígado  direito  e  esquerdo.  Os  termos  fígado  direito  e  fígado  esquerdo  são  preferíveis  a  lobo</p><p>direito e lobo esquerdo porque não há uma marca externa que permita a identificação do fígado direito e do fígado esquerdo.</p><p>Este  sistema,  originalmente descrito  em 1957 por Woodsmith  e Goldburne  e por Couinaud, define  a  anatomia hepática,</p><p>porque  é  mais  relevante  para  a  operação  do  fígado.  A  anatomia  funcional  é  mais  frequentemente  vista  como  imagens</p><p>transversais (Fig. 53‑6).</p><p>FIGURA 53­4  Demonstração esquemática da anatomia segmentar do fígado. Cada segmento recebe seu</p><p>próprio pedículo portal (tríade formada por veia porta, artéria hepática e ducto biliar). Os oito segmentos estão</p><p>ilustrados e os quatro setores, divididos pelas três veias hepáticas principais que correm nos sulcos, são</p><p>mostrados. A fissura umbilical (não uma cissura)</p><p>de  8/100.000,  enquanto,  em  1975,  Piീ�  e  Zuidema  registraram  13/100.000  hospitalizações.  Estudos  de  duas  grandes  séries  de</p><p>necropsia, um de 1901 e outro de 1960, relataram incidências similares de abscesso hepático piogênico, 0,45% e 0,59%, respectivamente. Estudos</p><p>mais  recentes,  da  década  de  1980  até  os  dias  atuais,  sugeriram  pequenos,  porém  significativos,  aumentos  na  incidência  de  abscesso  hepático</p><p>piogênico, atingindo a ordem de 22/100.000 hospitalizações.11 Estes números podem estar diminuindo segundo dados recentes, o que pode refletir</p><p>uma melhora na qualidade das técnicas de imagem, além de sua maior disponibilidade, propiciando a utilização com mais frequência. As práticas</p><p>de  admissão hospitalar  também afetam  esses  números. Um estudo demográfico  recente  nos Estados Unidos  calculou uma  incidência  anual  de</p><p>3,6 casos/100.000 habitantes.12 Não há diferença significativa de gênero, etnia ou geográfica na frequência da doença; a relação homem‑mulher é de</p><p>aproximadamente 1,5 para 1; e as comorbidades associadas ao abscesso piogênico são cirrose, diabetes, insuficiência renal crônica e um histórico de</p><p>malignidade.</p><p>Patogênese</p><p>O fígado está provavelmente exposto a cargas bacterianas venosas portais regularmente e, em geral, as elimina sem problemas. O desenvolvimento</p><p>de um abscesso hepático ocorre quando o inóculo da bactéria, independentemente da rota de exposição, excede a capacidade do fígado de eliminá‑</p><p>la, o que resulta em invasão tecidual, infiltração de neutrófilos e formação de um abscesso organizado. As rotas potenciais de exposição hepática às</p><p>bactérias  são  árvore  biliar,  veia  porta,  artéria  hepática,  extensão  direta  de  um  nicho  nas  proximidades  de  infecção  e  trauma.  Um  resumo  da</p><p>contribuição relativa destas rotas para a formação do abscesso hepático encontra‑se na Tabela 53‑3.</p><p>Tabela 53­3</p><p>Abscessos Piogênicos Atribuíveis a Causas Específicas</p><p>ANO DO</p><p>RELATÓRIO</p><p>N° DE</p><p>PACIENTES</p><p>CAUSA (%)</p><p>VEIA</p><p>PORTA</p><p>ARTÉRIA</p><p>HEPÁTICA</p><p>ÁRVORE</p><p>BILIAR</p><p>EXTENSÃO</p><p>DIRETA TRAUMA CRIPTOGÊNICA</p><p>1927‑1938 (um</p><p>estudo* )</p><p>622 42 – – 17 4 20</p><p>1945‑1982</p><p>(oito</p><p>estudos)</p><p>521 17 9 38 10 4 16</p><p>1970‑1999</p><p>(oito</p><p>estudos)</p><p>1.264 5 3 38 1 2 43</p><p>* Ochsner A, DeBakey M, Murray S: Pyogenic abscess of the liver. Am J Surg 40:292–319, 1938. Este é o estudo clássico de Ochsner DeBakey que revisou 286 casos</p><p>anteriormente relatados e 47 novos casos.</p><p>Atualmente,  as  infecções  da  árvore  biliar  são  a  causa mais  comum de  abscesso  hepático. A  obstrução  biliar  resulta  na  estase  da  bile,  com  o</p><p>potencial para colonização bacteriana, infecção e ascensão para o fígado, processo conhecido como colangite supurativa ascendente. A natureza da</p><p>obstrução biliar está mais relacionada com doença litiásica ou malignidade. Na Ásia, os cálculos intra‑hepáticos e as colangites (colangite piogênica</p><p>recorrente [CRP]; ver adiante) são causas comuns, enquanto no Ocidente a obstrução maligna tornou a causa mais predominante. Outros fatores</p><p>associados a maior risco incluem doença de Caroli, ascaridíase biliar e cirurgia do trato biliar. Os pontos comuns entre todas as causas de abscesso</p><p>hepático a partir da árvore biliar são a obstrução e a presença de bactérias no trato biliar. Além disso, a anastomose biliar‑entérica prévia também</p><p>tem sido associada à formação dos abscessos hepáticos, provavelmente por causa da livre exposição da árvore biliar aos microrganismos entéricos.</p><p>O sistema venoso portal drena o trato gastrointestinal, e, assim, qualquer doença infecciosa neste segmento pode resultar na infecção ascendente</p><p>da veia porta (pileflebite), com a exposição do fígado a grande quantidade de bactérias. Historicamente, a apendicite não tratada foi considerada a</p><p>causa mais comum do abscesso hepático, mas, com o advento dos antibióticos e o desenvolvimento do tratamento efetivo e imediato das infecções</p><p>abdominais agudas, as  infecções provenientes da veia porta para o  fígado  tornaram‑se menos comuns. As causas mais usuais de pileflebite são</p><p>diverticulite, apendicite, pancreatite, doença  inflamatória do tubo digestório, doença  inflamatória pélvica, víscera oca perfurada ou a onfalite no</p><p>recém‑nascido. O abscesso hepático também tem sido associado à neoplasia colorretal. Em um estudo de caso‑controle de Taiwan, a incidência dos</p><p>cânceres gastrointestinais aumentou quatro vezes entre pacientes com abscesso piogênico do fígado em comparação com os controles.13</p><p>Qualquer  infecção  sistêmica  (p.  ex.,  endocardite,  pneumonia,  osteomielite)  pode  resultar  em  bacteremia  e  na  infecção  do  fígado  via  artéria</p><p>hepática.  A  formação  de  microabscessos  múltiplos  é  uma  descoberta  relativamente  comum  na  necropsia  de  pacientes  com  sepse,  mas  estes</p><p>pacientes não costumam ser incluídos na análise do abscesso piogênico do fígado. O abscesso hepático a partir das infecções sistêmicas também</p><p>pode refletir uma resposta imune alterada, como as que ocorrem em pacientes com doença maligna, síndrome da deficiência imunoadquirida ou</p><p>distúrbios da função granulocítica. As crianças com doença granulomatosa são particularmente suscetíveis.</p><p>O abscesso hepático pode  ser o  resultado da extensão direta de um processo  infeccioso. Os  exemplos  comuns  incluem colecistite  supurativa,</p><p>abscesso subfrênico, abscesso perinefrético e até a fístula biliar para o intestino.</p><p>Os traumas penetrantes ou contusos podem resultar em hematoma hepático ou em áreas de necrose hepática que podem evoluir posteriormente</p><p>para um abscesso. A bactéria pode ter sido introduzida a partir do trauma ou a área afetada pode ser a fonte da bacteremia sistêmica. Os abscessos</p><p>hepáticos associados ao trauma podem se apresentar de forma retardada até várias semanas após a lesão. Outros mecanismos de necrose hepática</p><p>iatrogênica,  como a embolização da artéria hepática ou, mais  recentemente, os procedimentos ablativos  térmicos, podem complicar e contribuir</p><p>para  a  formação  de  abscessos.  Esta  é  uma  complicação  incomum  destes  procedimentos,  sendo  observada  com  mais  frequência  quando  há</p><p>anastomose bilioentérica prévia.</p><p>Na maioria das vezes, não se encontra uma causa para o abscesso hepático. Os abscessos criptogênicos predominam em muitas séries e são mais</p><p>comuns  em  alguns  relatos  de  casos.  As  possíveis  explicações  para  um  abscesso  hepático  criptogênico  são  as  patologias  abdominais  não</p><p>diagnosticadas,  processo  infeccioso  já  resolvido  no momento  da  apresentação  e  fatores  do  hospedeiro,  como  diabetes  ou  neoplasias malignas,</p><p>tornando  o  fígado mais  suscetível  a  bacteremia  transitória  da  artéria  hepática  ou  da  veia  porta.  Quanto  a  pacientes  com  abscessos  hepáticos</p><p>criptogênicos  que  fizeram  tomografia  computadorizada  (TC)  e  ultrassonografia  (US),  tem  sido  defendida  a  necessidade  de  ser  realizada  uma</p><p>pesquisa cuidadosa de sua causa. Em séries que avaliam a colonoscopia e a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) em pacientes</p><p>com abscesso criptogênico, o resultado tem sido não significativo e frequentemente só se torna positivo em pacientes com algum achado objetivo</p><p>que pudesse ter sugerido uma anormalidade subclínica (p. ex., bilirrubina levemente elevada). Em geral, estes pacientes deveriam se submeter a</p><p>uma meticulosa anamnese e a um exame físico detalhado acompanhados de exames laboratoriais minuciosos à procura de anormalidades no trato</p><p>intestinal  ou  na  árvore  biliar.  Além  do  mais,  os  procedimentos  invasivos  e/ou  estudos  de  imagem  devem  ter  como  base  suspeitas  clínicas</p><p>levantadas por esta investigação.</p><p>Patologia e Microbiologia</p><p>A maioria dos abscessos hepáticos envolve o hemifígado direito, sendo esta topografia responsável por cerca de 75% dos casos. A explicação para</p><p>isto não é conhecida, mas tem sido cogitada a possibilidade da existência de um fluxo sanguíneo laminar preferencial para o lado direito. O fígado</p><p>esquerdo está envolvido em aproximadamente 20% dos casos, enquanto o lobo caudado</p><p>apenas raramente é envolvido (5%). O comprometimento</p><p>bilobar com abscessos múltiplos é raro. Cerca de 50% dos abscessos hepáticos são solitários. O tamanho dos abscessos hepáticos pode variar de</p><p>menos de 1 mm a 3 ou 4 cm de diâmetro, podendo ser multiloculados ou uma cavidade única. Na exploração abdominal, esses abscessos aparecem</p><p>escurecidos  na  superfície  do  fígado  e  são  flutuantes  à  palpação,  embora  as  lesões mais  profundas  possam não  ser  visíveis  e  difíceis  de  serem</p><p>percebidas. A inflamação contígua pode causar aderência nas estruturas locais.</p><p>Os estudos de microbiologia dos abscessos hepáticos tiveram resultados variáveis, por uma série de razões. Nas primeiras séries, os abscessos</p><p>estéreis eram comumente registrados, mas é provável que refletissem técnicas de cultura inadequadas, enquanto nas séries modernas muito poucos</p><p>abscessos são pesquisados antes da administração de antibióticos. Além disso, a heterogeneidade das vias de infecção faz com que a microbiologia</p><p>seja variada. Os abscessos decorrentes da pileflebite ou da  colangite  tendem a  ser polimicrobianos,  com uma elevada predominância de Gram‑</p><p>negativos. As infecções sistêmicas, por outro lado, geralmente causam infecção com um único organismo.</p><p>Embora a taxa de esterilidade registrada por Ochsner em 1938 tenha sido de cerca de 50%, séries dos anos de 1990 registram abscessos estéreis</p><p>em 10% a 20% dos  casos. Muitos  abscessos hepáticos  são polimicrobianos  e  respondem por  cerca de 40% dos  casos. Tem sido  sugerido que os</p><p>abscessos solitários são mais suscetíveis de serem polimicrobianos. Os organismos anaeróbicos estão envolvidos em cerca de 40% a 60% dos casos.</p><p>Os  microrganismos  mais  comuns  são  a  Escherichia  coli  e  a  Klebsiella  pneumoniae,  além  de  Staphylococcus  aureus,  Enterococcus  sp.,  Streptococcus</p><p>viridans e Bacteroides spp. Muitas vezes  a Klebsiella  está  associada  a  abscessos  com  formação  de  gás. Os Enterococcus  e Streptococcus  viridans  são</p><p>geralmente encontrados nos abscessos polimicrobianos, enquanto as infecções estafilocócicas são causadas por um único organismo. Os organismos</p><p>mais  raramente encontrados  (</p><p>de</p><p>abscesso  hepático  é  de  95%  a  100%. A TC  e  a US  são  úteis  no  diagnóstico  de  outras  patologias  intra‑abdominais,  como doença  biliar  (US)  ou</p><p>distúrbios inflamatórios, como apendicite e diverticulite (TC). A ressonância magnética (RM) pode ser útil para identificar a causa de muitas massas</p><p>hepáticas  e proceder  à  avaliação das  alterações patológicas da  árvore biliar, mas não parece  ter  alguma vantagem  sobre  a TC no que  tange  ao</p><p>diagnóstico de abscesso hepático.</p><p>Diagnóstico Diferencial</p><p>Distinguir o abscesso piogênico de outras doenças infecciosas císticas do fígado, como abscesso amebiano ou cisto equinocócico, é importante por</p><p>causa das diferenças no  tratamento. O  abscesso piogênico  (ver  adiante)  é  tratado  com antibióticos  e drenagem. O abscesso  amebiano  é  tratado</p><p>principalmente  com  antibióticos,  enquanto  os  cistos  equinocócicos muitas  vezes  necessitam de  intervenção  cirúrgica. Na maioria  das  vezes,  os</p><p>cistos  equinocócicos  podem  ser  diagnosticados  pela  história  e  pelos  achados  radiológicos  característicos  (ver  adiante).  O  quadro  clínico  dos</p><p>abscessos amebiano e piogênico é praticamente idêntico, com algumas exceções perceptíveis fundamentais para a distinção de ambos (Tabela 53‑</p><p>5). Os abscessos amebianos geralmente ocorrem em jovens homens hispânicos, enquanto o abscesso piogênico tende a ocorrer em pacientes com 50</p><p>a 60 anos de idade, sem predominância de sexo ou raça. A febre é comum em ambos, mas os calafrios e os sintomas de uma bacteremia grave são</p><p>mais  comuns  no  abscesso  piogênico.  Os  testes  sorológicos  para  anticorpos  Entamoeba  histolytica  estão  quase  sempre  presentes  nos  abscessos</p><p>amebianos, mas são incomuns em pacientes com abscesso piogênico. Um estudo comparou 471 pacientes com abscesso amebiano e 106 pacientes</p><p>com abscesso piogênico com idade superior a 50 anos, e também detectou problemas pulmonares no exame físico, além de múltiplos abscessos com</p><p>titulação  sorológica baixa nos  abscessos  amebianos,  como preditores  independentes de  abscesso piogênico. Ocasionalmente, para diferenciar  as</p><p>duas patologias torna‑se necessário que se faça uma aspiração ou uma prova terapêutica com antibióticos. Infelizmente, a aspiração só diagnostica</p><p>o abscesso amebiano em 10% a 20% dos casos.14</p><p>Tabela 53­5</p><p>Características de Abscessos Hepáticos Amebianos Versus Abscessos Piogênicos</p><p>CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS ABSCESSO AMEBIANO ABSCESSO PIOGÊNICO</p><p>Idade 20‑40 anos > 50 anos</p><p>Razão homem‑mulher ≥ 10:1 1.5:1</p><p>Solitário versus múltiplo 80% solitários* 50% solitários</p><p>Localização Geralmente fígado direito Geralmente fígado direito</p><p>Viagem para área endêmica Sim Não</p><p>Diabetes Incomuns (≈2%) Mais comuns (≈27%)</p><p>Uso de álcool Comum Comum</p><p>Icterícia Incomum Comum</p><p>Bilirrubina elevada Incomum Comum</p><p>Fosfatase alcalina elevada Comum Comum</p><p>Hemocultura positiva Não Comum</p><p>Sorologia amebiana positiva Sim Não</p><p>* Em abscesso amebiano agudo, 50% são solitários.</p><p>Tratamento</p><p>Antes da utilização dos antibióticos e do uso de rotina dos procedimentos de drenagem, o abscesso piogênico hepático não tratado era sempre fatal.</p><p>Somente com a clássica revisão de Ochsner e DeBakey, em 1938, foi que a rotina da drenagem cirúrgica passou a ser empregada e foram observadas</p><p>reduções significativas na mortalidade. A drenagem cirúrgica aberta de abscessos piogênicos foi o único tratamento (com a adição de antibióticos</p><p>eventualmente) para abscesso hepático até a década de 1980. Desde então, as técnicas de drenagem percutânea invasivas diminuíram e cederam</p><p>lugar ao tratamento com antibióticos intravenosos (IV). Geralmente a laparotomia é reservada para os casos de insucesso da drenagem percutânea.</p><p>Uma  vez  suspeitado  o  diagnóstico  de  abscesso  hepático  piogênico,  deve‑se,  imediatamente,  iniciar  a  administração  de  antibióticos  de  largo</p><p>espectro por via intravenosa a fim de controlar a bacteremia progressiva e suas complicações associadas. As amostras de sangue e do abscesso a</p><p>partir  de  aspiração  devem  ser  enviadas  para  culturas  aeróbicas  e  anaeróbicas.  Em  pacientes  imunossuprimidos,  as  culturas micobacterianas  e</p><p>fúngicas do aspirado devem ser consideradas. Os pacientes que estão em risco para infecções amebianas devem colher amostras de sangue para</p><p>sorologia  amebiana.  Até  que  as  culturas  identifiquem  especificamente  o  microrganismo  agressor,  antibióticos  de  amplo  espectro,  cobrindo</p><p>organismos  Gram‑negativos,  Gram‑positivos  e  anaeróbicos,  devem  ser  utilizados.  São  recomendadas  combinações  como  ampicilina,</p><p>aminoglicosídeos e metronidazol ou cefalosporina de terceira geração com metronidazol. A duração do tratamento antibiótico não é muito definida</p><p>e  deve  ser  individualizada  de  acordo  com  o  sucesso  do  procedimento  de  drenagem. Os  antibióticos  devem  ser  continuados  enquanto  houver</p><p>evidência de infecção como febre, calafrios ou leucocitose. As recomendações costumam ser de duas semanas ou mais de tratamento.</p><p>A drenagem percutânea para abscessos hepáticos piogênicos foi descrita primeiramente em 1953, mas não ganhou ampla aceitação até a década</p><p>de 1980, com o desenvolvimento dos exames de imagem de alta definição e a experiência com técnicas radiológicas intervencionistas. Nos últimos</p><p>25  anos,  a  drenagem  percutânea  por  cateter  se  tornou  o  tratamento  de  escolha  para  a maioria  dos  pacientes  (Fig.  53‑28). As  taxas  de  sucesso</p><p>abrangem 66% a 90%.11,13 As vantagens óbvias são a simplicidade do tratamento (em geral executado na hora do diagnóstico radiológico) e o fato</p><p>de  se  evitarem  a  anestesia  geral  e  a  laparotomia. As  contraindicações  relativas  à  drenagem percutânea  por  cateter  incluem presença  de  ascite,</p><p>coagulopatia ou proximidade com estruturas vitais. A drenagem percutânea de abscessos múltiplos geralmente é a que proporciona maior taxa de</p><p>insucesso, mas a maioria dos relatos mostra um alto índice de sucesso para abordagens percutâneas, reservando a cirurgia para os insucessos. Um</p><p>estudo retrospectivo comparando a drenagem cirúrgica com a percutânea de abscessos volumosos (> 5 cm) mostrou melhor taxa de sucesso com a</p><p>drenagem cirúrgica. Apesar disso, dois  terços dos  tratamentos percutâneos foram bem‑sucedidos, e as  taxas gerais de morbidade e mortalidade</p><p>foram  semelhantes.  Não  se  dispõe  de  uma  comparação  prospectiva  randomizada  entre  as  terapias  percutânea  e  cirúrgica  para  os  abscessos</p><p>hepáticos, no entanto algumas  séries  têm sugerido que, na maioria dos  casos, há  taxas  similares de  sucesso e mortalidade. As  séries modernas</p><p>tentando  comparar  estas  duas  técnicas  retrospectivamente  devem  ser  interpretadas  com  cautela,  porque  a  maioria  dos  pacientes  tratados</p><p>cirurgicamente não obteve sucesso com as técnicas menos invasivas. A cirurgia deve ser reservada para os pacientes que necessitam de tratamento</p><p>cirúrgico da doença primária  (p. ex., apendicite) ou para aqueles que não obtiveram sucesso com as  técnicas percutâneas. Deve‑se notar que os</p><p>procedimentos de drenagem laparoscópica foram relatados com algum sucesso e isso pode ser considerado uma opção razoável para ser utilizada</p><p>em casos selecionados.11</p><p>FIGURA 53­28  A, TC demonstra abscesso hepático multiloculado no fígado direito. B, TC no momento da drenagem percutânea. C, Estudo</p><p>com contraste por meio do cateter de drenagem demonstra aspecto típico irregular loculado, como também comunicação com a árvore</p><p>biliar. D, TC de acompanhamento três meses após tratamento demonstra resolução completa do abscesso. (De Brown KT, Getrajdman GI:</p><p>Interventional radiologic techniques in the liver and biliary tract. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp</p><p>575–594.)</p><p>A aspiração percutânea sem a colocação de um dreno foi pesquisada por vários grupos. As taxas de sucesso são, geralmente, de 60% a 90% e são</p><p>um pouco semelhantes às da drenagem percutânea por cateter.15 A maioria dos pacientes, entretanto,</p><p>necessita de mais de uma aspiração e 25%, de</p><p>três ou mais intervenções. Um estudo randomizado avaliou a aspiração percutânea versus a drenagem percutânea por cateter. As taxas de sucesso</p><p>foram de 60% no grupo de aspiração e 100% no grupo de cateter. Todos, exceto um paciente no grupo de aspiração, fizeram apenas uma aspiração.</p><p>Outro estudo clínico randomizado de 64 pacientes comparou a aspiração exclusiva com drenagem por cateter. Houve resultados semelhantes em</p><p>termos de taxa de sucesso de tratamento,  internação hospitalar, duração da antibioticoterapia e mortalidade. No grupo com aspiração exclusiva,</p><p>40% necessitaram de duas aspirações e 20%, de três aspirações. Em geral, a drenagem por cateter permanece o tratamento de escolha, embora um</p><p>estudo de uma única aspiração seja razoável e deva ser considerado.</p><p>Alguns  pesquisadores  têm  relatado  sucesso  com  antibióticos  isoladamente.  A  maioria  destes  pacientes,  entretanto,  teve  uma  aspiração</p><p>diagnóstica e, assim, pelo menos uma drenagem parcial. Além disso, outras séries relataram que o tratamento antibiótico sem drenagem acarreta</p><p>uma mortalidade proibitivamente alta (59% a 100%). Em pacientes que não são candidatos à cirurgia ou que se recusam a qualquer procedimento</p><p>invasivo, é razoável uma tentativa com tratamento antibiótico; entretanto isto não é recomendado em outras situações.</p><p>Eventualmente,  a  ressecção  do  fígado  é  necessária  no  abscesso  hepático.  Isto  pode  acontecer  em  decorrência  de  uma malignidade  hepática</p><p>infectada, hepatolitíase ou estenose biliar  intra‑hepática.  Se a destruição hepática decorrente da  infecção  for grave,  alguns pacientes poderão  se</p><p>beneficiar com a ressecção.</p><p>Resultados</p><p>A  taxa  de mortalidade  por  abscesso  hepático  piogênico  diminuiu  substancialmente  nos  últimos  70  anos.  Antes  do  uso  rotineiro  da  drenagem</p><p>cirúrgica, os abscessos piogênicos eram sempre fatais. Com o uso rotineiro da drenagem cirúrgica e a utilização de antibióticos IV, a mortalidade foi</p><p>reduzida  para  aproximadamente  50%,  um  resultado  que  permaneceu  relativamente  constante  de  1945  até  o  início  de  1980.  Desde  então  a</p><p>mortalidade tem sido reduzida para 10% a 20% e a série da década de 1990 mostrou uma taxa de mortalidade abaixo de 10%.15 Uma série mais</p><p>recente do Memorial Sloan‑Keീ�ering Cancer Center  (MSKCC)  relatou uma mortalidade de 3%. Vários  estudos analisaram  fatores preditivos de</p><p>mau  prognóstico  em  pacientes  com  abscesso  hepático  piogênico.  Malignidade,  fatores  a  ela  associados  (icterícia,  resultados  de  TFH</p><p>acentuadamente  elevados)  e  sinais  de  sepse  parecem  ser  um  marcador  consistente  de  mau  prognóstico.  Sinais  de  doença  crônica,  como</p><p>hipoalbuminemia, também estão frequentemente associados a um resultado desfavorável. Finalmente, sinais de infecção grave, como leucocitose</p><p>exacerbada, pontuações Acute Physiology and Chronic Health Evaluation II (APACHE II) elevadas, ruptura abscesso, bacteremia e choque também</p><p>estão associados a altos índices de mortalidade.</p><p>Abscesso Amebiano</p><p>Epidemiologia</p><p>A  amebíase  é  certamente  uma  doença  dos  países  tropicais  e  em  desenvolvimento,  mas  é  também  um  problema  significativo  nos  países</p><p>desenvolvidos, por causa da imigração e das viagens internacionais. A E. histolytica é endêmica no México, na Índia, na África e em algumas regiões</p><p>das Américas Central e do Sul. Em 1995, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estimou que 40 a 50 milhões de pessoas no mundo sofrem de</p><p>colite amebiana ou abscesso amebiano do fígado, resultando em 40.000 a 100.000 mortes por ano.14 Antes disso, as estimativas de amebíase não</p><p>eram  confiáveis  porque  a  E.  histolytica  (forma  patogênica)  não  era  diferenciada  da  Entamoeba  dispar  (forma  não  patogênica).  Pensava‑se  que</p><p>homossexuais  do  sexo masculino  com diarreia  abrigavam E. histolytica, mas,  na  verdade,  descobriu‑se  serem  infectados  com E.  dispar,  que  não</p><p>requer  tratamento. Estudos  epidemiológicos  abordando  especificamente  infecções de E. histolytica  estimaram  que  cerca  de  55% das  pessoas  em</p><p>regiões endêmicas são infectadas, embora menos de 50% sejam sintomáticos.</p><p>Ao contrário dos abscessos hepáticos piogênicos, os pacientes com abscessos amebianos do fígado tendem a ser homens de origem latina, entre</p><p>20 e 40 anos de idade, com um histórico de viagem a (ou originários de) uma área endêmica. Condições de vida como a pobreza e as aglomerações</p><p>populacionais estão associadas a taxas mais elevadas da infecção. Uma predominância de sexo masculino superior a 10:1 tem sido registrada em</p><p>quase  todos  os  estudos.  Devido  a  razões  incertas,  as mulheres  que menstruam  apresentam  baixa  incidência  de  amebíase  e  a  gravidez  parece</p><p>eliminar esta  resistência. É comum o relato de que o consumo frequente de álcool pode  tornar o  fígado mais  suscetível à  infecção amebiana. A</p><p>imunidade diminuída do hospedeiro também parece ter uma certa participação neste problema. Pacientes com abscesso hepático amebiano sem</p><p>histórico de viagem para uma área endêmica têm imunossupressão associada, como infecção pelo HIV, desnutrição, infecção crônica ou uso crônico</p><p>de esteroide.16</p><p>Patogênese</p><p>A E. histolytica é um protozoário e existe como um trofozoíto ou um cisto. Todas as demais espécies no gênero Entamoeba são  consideradas  não</p><p>patogênicas e nem todas as linhagens da E. histolytica são consideradas virulentas. A ingestão de cistos de E. histolytica por meio de um ciclo fecal‑</p><p>oral é a causa da amebíase. Os humanos são os principais hospedeiros e a maior fonte de infecção é o contato humano com um portador do cisto.</p><p>Legumes e água contaminada também são vias de infecção humana. Uma vez ingeridos, os cistos não são degradados no estômago e passam para</p><p>os intestinos, onde o trofozoíto é liberado e passa para o cólon. No cólon, o trofozoíto pode invadir a mucosa e provocar a doença.</p><p>Acredita‑se que os  trofozoítos atingem o  fígado pelo  sistema venoso portal. Não há evidências de que os  trofozoítos passem pelos  linfáticos.</p><p>Conforme sugerido por  seu nome,  trofozoítos de E. histolytica podem desagregar  ou destruir  os  tecidos por meio de um  conjunto  complexo de</p><p>eventos, incluindo aderência celular, ativação celular e subsequente liberação de enzimas, resultando em necrose. O principal mecanismo talvez seja</p><p>a hidrólise celular enzimática. Os abscessos amebianos do fígado são formados por uma necrose hepática progressiva e localizada, resultando em</p><p>uma  cavidade  contendo  detritos  proteináceos  acelulares  cercados  por  um  halo  de  trofozoítos  amebianos  invasivos.  O  início  de  um  abscesso</p><p>hepático amebiano está associado a um acúmulo de leucócitos polimorfonucleares, que depois são desintegrados pelos trofozoítos.</p><p>Os anticorpos antiamebianos desenvolvem‑se rapidamente em pacientes com doença invasiva ou abscesso hepático amebiano. Os anticorpos de</p><p>imunoglobulina  secretória A  (IgA) mostraram  inibir  a  adesão  ao  epitélio  colônico in vitro,  no  entanto  o  desenvolvimento destes  anticorpos  não</p><p>impede  a  progressão  da  doença.  De  forma  curiosa,  crianças  que  não  apresentam  IgG  antiamebiana  têm  resistência  inata  à  infecção  invasiva,</p><p>sugerindo uma resposta alternativa imunomediada. Atualmente aceita‑se que haja uma resposta mediada pelas células T helper como o principal</p><p>mecanismo de resistência.</p><p>Patologia</p><p>O abscesso amebiano hepático é essencialmente o resultado da necrose de liquefação do fígado, produzindo uma cavidade cheia de sangue e tecido</p><p>hepático  liquefeito. O  aspecto deste fluido  é  normalmente descrito  como molho de  anchova  e  é  inodoro,  a menos  que haja  infecção  bacteriana</p><p>secundária. A necrose hepática progressiva continua até atingir a cápsula de Glisson e ser bloqueada, uma vez que a cápsula é resistente à hidrólise</p><p>pela ameba. Assim, os abscessos amebianos tendem a se localizar sob a cápsula do fígado. Devido à elevada resistência da cápsula de Glisson, a</p><p>cavidade  é  envolvida</p><p>pela  tríade portal,  protegida por  esta  bainha peritoneal.  Inicialmente,  a  cavidade  formada  é mal  definida,  com nenhuma</p><p>resposta fibrosa  real  em  torno de  suas bordas;  entretanto um abscesso crônico pode desenvolver uma cápsula fibrosa até  se  calcificar. Como os</p><p>piogênicos, os abscessos amebianos tendem a ocorrer principalmente no lado direito do fígado.</p><p>Apresentação Clínica</p><p>Cerca  de  80%  dos  pacientes  com  abscesso  amebiano  do  fígado  apresentam  sintomas  que  duram  desde  alguns  dias  a  quatro  semanas.  A</p><p>permanência dos sintomas é de cerca de 10 dias. Os sinais e queixas clínicas que aparecem estão resumidos na Tabela 53‑6. O quadro clínico usual é</p><p>um paciente na faixa etária entre 20 e 40 anos de idade, com história de ter estado em alguma área endêmica e que aparece com febre, calafrios,</p><p>anorexia, dor no quadrante  superior direito  e  à palpação  e hepatomegalia. Usualmente  a dor  abdominal  é  constante,  fastidiosa  e  localizada no</p><p>quadrante superior direito. Embora alguns estudos relatem números mais elevados, aproximadamente 25% dos pacientes têm diarreia, a despeito</p><p>da  infecção colônica obrigatória. O abscesso hepático sincrônico é encontrado em um terço dos pacientes com colite amebiana ativa. A  icterícia,</p><p>consequente  a um volumoso  abscesso  comprimindo  a  árvore  biliar,  não  é  tão  rara  quanto  antes  se  aceitava,  e  calcula‑se  que  cerca de  22% dos</p><p>pacientes apresentem esta característica em nível mundial. Perda de peso e mialgias podem ocorrer quando os sintomas já perduram por semanas.</p><p>Dor no ombro direito ou pleurítica também pode ocorrer se houver irritação do hemidiafragma direito. Os sintomas e a dor à palpação podem estar</p><p>localizados no epigástrio ou no lado esquerdo se o abscesso estiver na porção esquerda do fígado. A ruptura para o peritônio com peritonite ocorre</p><p>raramente  e,  quando  sobrevém,  em  geral  decorre  de  abscesso  do  lado  esquerdo.  Há  relatos  de  casos  raros  de  ruptura  para  o  espaço  pleural,</p><p>pericárdio e outros órgãos intra‑abdominais.</p><p>Tabela 53­6</p><p>Sinais, Sintomas e Achados Laboratoriais no Abscesso Hepático Amebiano*</p><p>PARÂMETRO MÉDIA FAIXA N° DE CASOS REVISTOS</p><p>Sinais e Sintomas</p><p>Dor abdominal (%) 92 73‑100 1.701</p><p>Febre (%) 90 72‑100 2.192</p><p>Sensibilidade abdominal (%) 78 40‑100 1.424</p><p>Hepatomegalia (%) 62 20‑100 1.539</p><p>Anorexia (%) 47 28‑89 499</p><p>Perda de peso (%) 39 11‑83 871</p><p>Diarreia (%) 23 12‑40 1.426</p><p>Icterícia (%) 22 5‑50 1.630</p><p>Testes Laboratoriais</p><p>Cistos nas fezes, trofozoítas (%) 12 4‑30 4.908</p><p>Amebas no aspirado do cisto (%) 42 30‑76 1.402</p><p>Hemoglobina (g/dL) 12,1 10,2‑12,8 229</p><p>Fosfatase alcalina (% > 120 U/L) 76 65‑91 589</p><p>Bilirrubina total (g/dL) 1,4 0,8‑2,4 509</p><p>Albumina (g/dL) 2,8 2,3‑3,4 404</p><p>AST (× limite superior ao normal) 1,7 1,0‑2,5 459</p><p>* Em uma extensa revisão da literatura.</p><p>Os pacientes que se apresentam de forma aguda (sintomas  2 semanas) diferem clinicamente</p><p>entre si. As apresentações agudas são geralmente mais graves, com febre elevada, calafrio e dor abdominal significativa. Na apresentação aguda,</p><p>50% dos pacientes têm lesões múltiplas, enquanto na apresentação crônica mais de 80% têm uma lesão à direita. Um curso mais complicado tende a</p><p>seguir a apresentação aguda, mas a resposta à terapia é semelhante em ambos os grupos.</p><p>As  anormalidades  laboratoriais  são  comuns nos  abscessos  amebianos  (Tabela 53‑6). Nos  casos  típicos,  os  pacientes  têm uma  leucocitose  sem</p><p>eosinofilia. A anemia é  comum. Anormalidades  leves dos  resultados TFH,  incluindo os níveis de albumina, TP‑INR, FA, AST e bilirrubina,  são</p><p>típicas.  O  mais  comum  é  um  nível  elevado  de  TP‑INR.  Como  mais  de  70%  dos  pacientes  com  abscesso  hepático  amebiano  não  têm  ameba</p><p>detectável em suas fezes, a avaliação laboratorial mais útil é o estudo dos anticorpos antiamebianos circulantes, que estão presentes em 90% a 95%</p><p>dos pacientes. Muitos testes sorológicos foram criados ao longo dos anos. Um teste indireto de hemaglutinina foi amplamente usado no passado e</p><p>tem uma sensibilidade de 90%. Este teste foi reposto pelos imunoensaios enzimáticos, que detectam a presença de anticorpos contra o parasita e são</p><p>simples, rapidamente realizados e baratos. Um imunoensaio enzimático tem uma sensibilidade reportada de 99% e uma especificidade superior a</p><p>90% nos pacientes com abscesso hepático. Infelizmente, a presença de anticorpos pode refletir uma infecção prévia e a interpretação pode ser difícil</p><p>em áreas  endêmicas. Os estudos em curso  concentram‑se na  identificação de antígenos específicos para E. histolytica,  na  tentativa  de  identificar</p><p>infecção aguda. Os kits de detecção de antígeno foram avaliados em áreas endêmicas e conseguem detectar o antígeno de lecitina da E. histolytica no</p><p>soro e pus do abscesso hepático; além disso, em pequenos estudos, mostraram ter elevada sensibilidade. A sensibilidade, no entanto, pode diminuir</p><p>se o teste for realizado após tratamento com metronidazol.17</p><p>Os exames de  imagem são fundamentais para o diagnóstico do abscesso amebiano do fígado. Radiografias simples de tórax são anormais em</p><p>aproximadamente 50% dos casos, em geral mostrando m diafragma direito elevado, derrame pleural ou atelectasia. A US abdominal tem um índice</p><p>de precisão de cerca de 90% quando combinada com história e quadro clínico característicos. Os achados típicos da US abdominal são uma lesão</p><p>arredondada próxima à cápsula do fígado (ver comentários anteriores) sem ecos significativos nas bordas, interpretados como parede de abscesso.</p><p>O  conteúdo  da  cavidade  é,  em  geral,  hipoecoico  e  heterogêneo  (Fig.  53‑29). Os  dados  da US  são  assinalados  em  40%  a  70%  dos  casos.  A  TC</p><p>abdominal  é  provavelmente mais  sensível  que  a US,  sendo útil  na  diferenciação  entre  abscessos  amebiano  e  piogênico,  com o  realce  da  borda</p><p>circunferencial (Fig. 53‑30). A TC também pode ser útil na identificação de cistos simples e tumores necróticos. A RM do fígado não mostra uma</p><p>nítida vantagem sobre a TC ou a US nos casos típicos, mas pode ser útil na diferenciação das lesões atípicas. Os estudos da medicina nuclear, como</p><p>a  cintilografia  com gálio  ou  a  varredura  com  tecnécio99m podem  ajudar  na  diferenciação  entre  abscessos  piogênicos  e  amebianos,  porque  estes</p><p>últimos normalmente não contêm leucócitos e, portanto, não aparecem nestas varreduras.18</p><p>FIGURA 53­29  Ultrassonografia típica de um abscesso hepático amebiano. Observe a localização periférica, o formato arredondado com</p><p>discreta borda e os ecos internos. (De Thomas PG, Ravindra KV: Amebiasis and biliary infection. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and</p><p>biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 1147–1166.)</p><p>FIGURA 53­30  Imagem de TC de abscesso amebiano. A lesão apresenta localização periférica e é arredondada. A borda não exibe realce,</p><p>mas há edema periférico (setas pretas). Observe a extensão para o espaço intercostal (seta branca).</p><p>Quando a conduta anteriormente descrita ainda não é definitiva e o diagnóstico incerto persiste, duas opções devem ser consideradas. Primeiro,</p><p>pode ser utilizado um teste terapêutico com fármacos antiamebianos. Caso ocorra uma melhora rápida, isso confirma o diagnóstico. Em situações</p><p>em que a sorologia amebiana é inconclusiva e um teste terapêutico dos antibióticos é considerado inadequado ou falhou em aliviar os sintomas, a</p><p>segunda  opção,  uma  aspiração  diagnóstica,  deve  ser  considerada.  Um  abscesso  piogênico  teria  bactérias  e  leucócitos,  enquanto  um  abscesso</p><p>amebiano conteria o chamado típico molho de  anchova. As culturas do abscesso amebiano geralmente são negativas e não contêm  leucócitos. Em</p><p>pacientes nos quais a doença neoplásica ou hidática compõe o diagnóstico diferencial, a aspiração não deve ser realizada.</p><p>Diagnóstico Diferencial</p><p>O diagnóstico diferencial  de um abscesso  amebiano do  fígado pode  ser  abrangente  e  inclui  doenças  como hepatite  viral,  doença  equinocócica,</p><p>colangite,  colecistite  e  até  outras  patologias  abdominais  inflamatórias,  como  a  apendicite.  As  lesões  malignas  do  fígado  também  podem  ter</p><p>manifestações  similares,  em situações atípicas. Eventualmente, as doenças pulmonares primárias devem ser  consideradas.  Em geral,  a  distinção</p><p>mais importante a ser feita é entre o abscesso piogênico e o amebiano. Os elementos essenciais deste problema estão resumidos na Tabela 53‑5 e na</p><p>seção anterior sobre abscesso piogênico.</p><p>Tratamento</p><p>O principal tratamento para abscesso amebiano é metronidazol (750 mg por via oral, três vezes ao dia por 10 dias), que é curativo em mais de 90%</p><p>dos pacientes. Em geral, a melhora clínica ocorre em três dias. Outros nitroimidazóis (secnidazol, tinidazol) também são eficazes e muito utilizados</p><p>fora dos Estados Unidos.  Se  a  resposta  ao metronidazol  for  baixa  ou  se  o  fármaco não  for  tolerado,  outros  agentes  podem  ser  empregados. A</p><p>emetina  é  eficaz  contra  a  amebíase  invasiva  (principalmente no  fígado), mas  requer  injeções  intramusculares  e produz graves  efeitos  colaterais</p><p>cardíacos. Uma opção mais atraente é a cloroquina, mas é um agente menos eficaz. Após o tratamento do abscesso do fígado, recomenda‑se que os</p><p>agentes  luminais  sejam administrados para  tratar  o  estado de portador. Os  agentes  luminais  eficazes para  a  amebíase  incluem o  iodoquinol,  a</p><p>paramomicina e o fluorato de diloxanida.</p><p>A aspiração  terapêutica por agulha dos abscessos amebianos  tem sido sugerida, no entanto uma revisão sistemática da Cochrane não admite</p><p>qualquer benefício de aspiração  terapêutica em conjunto com o  tratamento com metronidazol sobre o com metronidazol  isolado para acelerar a</p><p>resolução clínica ou radiológica dos abscessos amebianos.19 Em geral, a aspiração é recomendada em caso de diagnóstico ainda não confirmado</p><p>(ver  texto  anterior),  falta de  resposta  à  terapia  com metronidazol no  intervalo de  três  a  cinco dias  e/ou abscessos  considerados de alto  risco de</p><p>ruptura. Os abscessos maiores que 5 cm de diâmetro e no fígado esquerdo parecem estar afeitos a um maior risco de ruptura, devendo a aspiração</p><p>ser considerada.</p><p>Resultados</p><p>Embora o abscesso hepático amebiano geralmente  responda  rapidamente ao  tratamento clínico,  existem complicações  incomuns que devem ser</p><p>consideradas. A complicação mais frequente do abscesso amebiano é a ruptura para o peritônio, a cavidade pleural ou o pericárdio. O tamanho do</p><p>abscesso parece ser o mais  importante  fator de risco para a ruptura, e a sua  incidência geral varia de 3% a 17%. A maioria das rupturas para o</p><p>peritônio tende a ser contida pelo diafragma, pela parede abdominal ou pelo omento, mas a ruptura pode fistulizar para uma víscera oca. Uma</p><p>ruptura  peritoneal  costuma  se  manifestar  em  forma  de  dor  abdominal,  peritonite  e/ou  uma  massa  ou  distensão  generalizada.  No  passado,</p><p>defendia‑se  a  prática  da  laparotomia  para  este  tipo  de  complicação,  mas,  atualmente,  muitos  casos  são  tratados  com  sucesso  pela  drenagem</p><p>percutânea. A laparotomia está indicada para casos de diagnóstico duvidoso, perfuração de víscera oca e fistulização, resultando em hemorragia ou</p><p>sepse  e  fracasso da  terapia  conservadora. A  ruptura  para  o  espaço pleural  costuma  resultar  em um volumoso  e  rápido derrame,  que  colaba  o</p><p>pulmão  comprometido.  O  tratamento  consiste  na  toracocentese,  entretanto,  se  há  uma  infecção  bacteriana  secundária,  podem  ser  necessárias</p><p>abordagens cirúrgicas mais agressivas. A ruptura pode ocorrer para os brônquios e, em geral, melhora com drenagem postural e broncodilatadores.</p><p>Raramente, um abscesso do lado esquerdo pode romper para o pericárdio, podendo se apresentar como um derrame pericárdico assintomático ou</p><p>mesmo um tamponamento.  Isso deve ser  tratado com aspiração ou drenagem mediante uma  janela pericárdica. Outras complicações  incluem a</p><p>compressão da árvore biliar ou da VCI por abscessos volumosos e o desenvolvimento de um abscesso cerebral.</p><p>A taxa de mortalidade para todos os pacientes com abscesso amebiano do fígado é de 5% e não parece ser afetada pela inclusão da aspiração na</p><p>associação à terapia com metronidazol ou na cronicidade dos sintomas. Quando um abscesso se rompe, a taxa de mortalidade é de 6% até 50%. Os</p><p>fatores independentemente associados ao mau prognóstico têm níveis elevados de bilirrubina sérica (> 3,5 mg/dL), encefalopatia, hipoalbuminemia</p><p>(</p><p>bacteriana de um cisto hidático pode</p><p>ocorrer e manifestar‑se como um abscesso piogênico. A ruptura do cisto para a árvore biliar ou para a árvore brônquica ou a ruptura para peritônio</p><p>livre, cavidades pleural ou pericárdica pode ocorrer. As rupturas em peritônio livre podem resultar em equinococose disseminada ou uma reação</p><p>anafilática potencialmente fatal. Nos casos de diagnósticos duvidosos, uma bateria de testes sorológicos está disponível para avaliar a resposta a</p><p>anticorpos, mas todos são marcados por baixas sensibilidade e especificidade.</p><p>A  US  é  geralmente  utilizada  no mundo  inteiro  para  o  diagnóstico  de  equinococose  devido  a  sua  disponibilidade,  preço  e  acurácia.  Vários</p><p>achados  ultrassonográficos  podem  ser  diagnósticos  e  dependem do  estágio  do  cisto  no momento  do  exame. Um  cisto  hidático  simples  é  bem</p><p>delimitado, com sinais de germinação na membrana cística, podendo conter areia hidática hiperecogênica de flutuação  livre. Uma aparência em</p><p>roseta  é  observada  quando  os  cistos  piogênicos  estão  presentes.  O  cisto  pode  ser  preenchido  por  uma  massa  amorfa  que  pode  levar  a  um</p><p>diagnóstico equivocado. As calcificações na parede do cisto são bastante sugestivas de doença hidática e podem ser úteis no diagnóstico (Fig. 53‑</p><p>31). Achados similares são detectados na TC e RM. Estes exames também podem avaliar a doença extra‑hepática e mostraram relações anatômicas</p><p>hepáticas detalhadas com o cisto. Nos pacientes com suspeita de comprometimento biliar, pode ser necessária a CPRE ou a colangiografia trans‑</p><p>hepática percutânea.</p><p>FIGURA 53­31  Ultrassonografia demonstra características típicas de cisto hidático em estágios variados. A, Cisto hidático simples com</p><p>“areia hidática”. B, “Cistos­filhos e avôs” e aspecto típico de roseta. C, Cisto hidático preenchido por massa amorfa dando um aspecto sólido</p><p>ou semissólido. D, Cisto calcificado com aspecto de “casca de ovo”. (De Thomas PG, Ravindra KV: Amebiasis and biliary infection. In Blumgart LH,</p><p>Fong Y, editors: Surgery of the liver and biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 1147–1166.)</p><p>Embora o tratamento dos cistos hidáticos seja primariamente cirúrgico, opções alternativas estão em evolução.23 Em geral, a maioria dos cistos</p><p>deveria ser tratada, mas, em pacientes idosos com cistos pequenos, assintomáticos e calcificados, a conduta conservadora é adequada. No preparo</p><p>para uma cirurgia, os corticosteroides pré‑operatórios têm sido recomendados, mas não são aceitos universalmente. O anestesiologista deve dispor</p><p>de epinefrina e corticosteroides disponíveis em caso de uma reação anafilática. Muitas cirurgia têm sido realizadas, e geralmente o abdome está</p><p>completamente protegido, o fígado é mobilizado e o cisto é exposto. A proteção do abdome é importante porque pode ocorrer ruptura, resultando</p><p>em anafilaxia e  implante difuso. Em geral, o cisto é aspirado por meio de um sistema de sucção fechada e lavado com agente escolicida como a</p><p>solução salina hipertônica. Em seguida o cisto é curetado e, posteriormente, seguido por várias possibilidades, como excisão (ou pericistectomia),</p><p>procedimentos de marsupialização, deixando o cisto aberto, drenagem do cisto, omentoplastia e a ressecção hepática parcial. A pericistectomia total</p><p>e/ou hepatectomia parcial formal também podem ser realizadas sem adentrar o cisto (Fig. 53‑32).As abordagens cirúrgicas (drenagem e evacuação)</p><p>conservadoras  e  radicais  (ressecção)  parecem  ser  igualmente  eficazes  no  controle  da  doença,  embora  um  estudo  prospectivo  nunca  tenha  sido</p><p>realizado. Quando a comunicação com o ducto biliar é diagnosticada no pré ou no ato operatório, deve ser meticulosamente examinada. Em geral,</p><p>uma sutura simples é suficiente, todavia maiores reparos biliares mediante abordagens do ducto biliar comum podem ser necessários. As técnicas</p><p>laparoscópicas para drenagem e curetagem dos cistos têm sido relatadas em várias séries, com resultados animadores. Os índices de recorrência</p><p>após o tratamento cirúrgico giram em torno de 1% a 20%, mas em geral são 5% ou menos em centros experientes.</p><p>FIGURA 53­32  A, Cisto hidático periférico do fígado esquerdo. B, Amostra intacta após pericistectomia. Observe que o pericisto inteiro foi</p><p>removido. (De Milicevic MN: Hydatid disease. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 1167–1204.)</p><p>No passado, a aspiração dos cistos hidáticos era contraindicada devido ao risco de ruptura e disseminação descontrolada, no entanto a aspiração</p><p>percutânea e a injeção de agentes escolicidas têm sido relatadas com bastante sucesso em pacientes cuidadosamente selecionados.24 Esta técnica é</p><p>conhecida como PAIR (punção, aspiração, injeção e reaspiração) e tem sido mais aceita em algumas instituições. Dois estudos randomizados, um</p><p>comparando cirurgia e PAIR (= 50) e outro comparando PAIR e tratamento medicamentoso, mostraram taxas de sucesso similares. Estes estudos</p><p>têm amostragens pequenas e apresentam problemas metodológicos significativos para se chegar a conclusões definitivas.25 Embora a intervenção</p><p>cirúrgica  permaneça  como  o  tratamento  de  escolha,  estudos  prospectivos  adicionais  são  claramente  necessários  para  avaliar  esta  técnica</p><p>interessante e potencialmente útil. O tratamento da equinococose com albendazol ou mebendazol é eficaz na redução de cistos em muitos pacientes</p><p>com E. granulosus, mas o desaparecimento do cisto ocorre em menos de 50% dos pacientes. O tratamento pré‑operatório pode diminuir o risco de</p><p>disseminação  e  é  uma  prática  razoável  e  segura.15  A  terapia  sem  ressecção  definitiva  ou  drenagem  deve  ser  considerada  apenas  para  doença</p><p>amplamente disseminada ou candidatos cirúrgicos fracos.</p><p>Colangite Piogênica Recorrente</p><p>A CPR é uma síndrome de ataques  repetidos de  colangite  secundária a  cálculos biliares  e  estenoses que  comprometem os ductos  intra  e  extra‑</p><p>hepáticos. A  condição  tem muitas denominações, mas  habitualmente  é  conhecida  como  colangio‑hepatite  oriental  ou hepatolitíase. A doença  é</p><p>quase  exclusiva  de  asiáticos,  no  entanto  também  é  encontrada  em  imigrantes  asiáticos  em  todo  o mundo. Homens  e mulheres  são  igualmente</p><p>afetados e, historicamente, a doença acomete em uma idade precoce (20 a 40 anos) em pacientes das classes socioeconômicas mais baixas.26</p><p>A  etiologia  da  CPR  é  desconhecida,  mas  está  relacionada  com  a  infecção  recorrente  dos  ductos  biliares  com  bactérias  do  tubo  digestório.</p><p>Finalmente, os cálculos e estenoses desenvolvem‑se na árvore biliar, mas não se sabe o que ocorre primeiro. Os cálculos são de bilirrubinato e em</p><p>alguns  pacientes  nenhum  cálculo  é  encontrado,  apenas  lama  biliar.  Foi  observada  uma  associação  entre  CPR  e  infecção  por  Clonorchis</p><p>sinensis e Ascaris lumbricoides, mas jamais se provou uma verdadeira relação causal.27</p><p>Estenoses  podem  ser  detectadas  em  qualquer  lugar  da  árvore  biliar, mas  geralmente  envolvem  os  ductos  intra‑hepáticos  principais  e, mais</p><p>frequentemente, o ducto hepático esquerdo. A vesícula biliar só é comprometida em cerca de 20% dos casos. A cirrose e a insuficiência hepática são</p><p>observadas  somente  em  doença  de  longa  evolução,  em  geral  após  várias  cirurgias.  Outras  complicações  incluem  fístula  coledocoduodenal  e</p><p>pancreatite aguda decorrentes de cálculos no ducto biliar comum. Tem sido observado um aumento na  incidência de colangiocarcinoma, mas é</p><p>difícil provar uma relação causal.</p><p>O paciente típico com CPR é jovem, asiático, pertencente a uma classe socioeconômica baixa e apresenta‑se com surtos repetidos de colangite. Os</p><p>sintomas e as manifestações são os mesmos da colangite: febre, dor abdominal no quadrante superior direito e icterícia. A obstrução biliar quase</p><p>sempre  é  parcial,  portanto  a  icterícia  acentuada  e  o  prurido  não  são  comuns.  Em geral,  há  leucocitose  e  os  resultados  alterados dos  TFHs  são</p><p>compatíveis  com obstrução biliar.</p><p>A avaliação da distribuição anatômica da doença  é  fundamental para  a  formulação de um plano  terapêutico</p><p>consistente. A combinação de US, TC, colangiografia direta e RM é, na maioria das vezes, necessária para uma avaliação completa destes pacientes.</p><p>A colangiografia retrógrada realizada endoscopicamente e/ou direta por via trans‑hepática muitas vezes é fundamental. A colangiopancreatografia</p><p>por  ressonância magnética  pode  combinar  a  imagem  em  corte  seccional  e  a  colangiografia  em  um  exame  não  invasivo,  podendo  substituir  a</p><p>colangiografia direta.</p><p>Nas manifestações agudas, a maioria dos pacientes melhora com a conduta conservadora, dando tempo para os exames radiológicos e para o</p><p>planejamento de uma cirurgia definitiva, que é o tratamento de escolha. Se a intervenção for necessária durante a fase aguda, ela deve focar numa</p><p>adequada  descompressão  da  árvore  biliar  mediante  a  exploração  do  ducto  biliar  comum  ou  da  papilotomia  endoscópica  com  colocação  de</p><p>um stent. Embora abordagens não cirúrgicas, como litotomia colangioscópica trans‑hepática percutânea, tenham sido desenvolvidas, o tratamento</p><p>cirúrgico  permanece  como  preferencial.  A  litotomia  colangioscópica  trans‑hepática  percutânea  geralmente  é  utilizada  em  pacientes  com  risco</p><p>cirúrgico  elevado  e  naqueles  nos  quais  o  tratamento  cirúrgico  não  foi  bem‑sucedido.  Taxas  de  resolução  dos  cálculos  são  elevadas  (>  80%)  e</p><p>necessárias para um resultado bem‑sucedido em longo prazo. Infelizmente, a recorrência de cálculos é comum e está relacionada com a presença de</p><p>estenoses biliares.28</p><p>Na  cirurgia  definitiva,  o  objetivo  é  retirar  os  cálculos  da  árvore  biliar  e  derivar  ou  proceder  à  estricturoplastia  para  expandir  as</p><p>estenoses.29 Muitos  casos  requerem  apenas  uma  exploração  do  ducto  biliar  comum,  com  ou  sem  hepatojejunostomia.  Em  casos  complicados,</p><p>providencia‑se um acesso permanente à árvore biliar para procedimentos radiológicos intervencionistas pelo alongamento da extremidade da alça</p><p>de  hepaticojejunostomia  em  Y  de  Roux  até  a  pele  ou  espaço  subcutâneo,  o  que  tem  sido  uma  abordagem  bem‑sucedida  (Fig.  53‑33).  Outros</p><p>procedimentos  potencialmente  necessários  incluem  a  estricturoplastia  e  a  hepatectomia  parcial.  Esta  última  é  considerada  para  pacientes  com</p><p>estenoses intra‑hepáticas, atrofia hepática, abscesso hepático ou suspeita de colangiocarcinoma.30</p><p>FIGURA 53­33  A, Colangiografia de um paciente com colangite piogênica recorrente e uma estenose do ducto hepático comum (seta</p><p>preta). Há vários cálculos no interior dos ductos esquerdos dilatados (setas brancas). B, Uma hepatojejunostomia para o ducto do segmento</p><p>III (pontas de seta) foi realizada, e um coledocoscópio flexível é mostrado passando através da anastomose nos ductos periféricos</p><p>esquerdos. Todos os cálculos foram retirados. (De Fan ST, Wong J: Recurrent pyogenic cholangitis. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and</p><p>biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 1205–1225.)</p><p>Em uma grande série da Ásia, onde a hepatectomia é  liberalmente aplicada, as  taxas de mortalidade cirúrgica são de 1%. Além disso,  com o</p><p>tratamento agressivo, há uma  taxa de  liberação de cálculos de 100%. Os resultados em  longo prazo são excelentes,  com taxas de recorrência de</p><p>litíase inferiores a 5%. A sobrevida em longo prazo está relacionada principalmente com presença de colangiocarcinoma, que é encontrado em cerca</p><p>de 10% dos casos. Os pacientes particularmente complicados podem ter uma taxa maior de recorrência dos sintomas.</p><p>Neoplasias</p><p>Neoplasias Benignas Sólidas</p><p>Estima‑se  que  os  nódulos  benignos  do  fígado  estejam  presentes  em  cerca  de  10%  a  20%  da  população  em  países  desenvolvidos.  Com  o</p><p>uso crescente dos exames radiológicos que progridem rapidamente, estas entidades têm sido encontradas com mais frequência. É fundamental que</p><p>haja familiaridade com os aspectos clínicos, a evolução, as características das imagens e as indicações cirúrgicas para estes tumores. Muitas lesões</p><p>benignas podem ser  corretamente  identificadas pelos modernos  exames por  imagem,  como TC, US  e RM. Em alguns  casos,  a  investigação dos</p><p>marcadores  tumorais  séricos  (AFP,  CEA)  e  de  um  tumor  primário  no  caso  de  suspeita  de metástase  deve  ser  realizada.  A  ressecção  pode  ser</p><p>necessária para um diagnóstico definitivo. As técnicas laparoscópicas para avaliação, biópsia ou ressecção tornaram‑se, também, uma importante</p><p>ferramenta diagnóstica.31,32</p><p>Adenoma Hepático</p><p>O adenoma hepático  (AH)  é  uma proliferação  benigna  relativamente  rara dos  hepatócitos  no  contexto de um  fígado normal.  Ele  é  encontrado</p><p>predominantemente em mulheres  jovens  (com idade entre 20 a 40 anos) e está geralmente associado ao uso de hormônios esteroides por  longo</p><p>prazo, como os anticoncepcionais orais  (ACO). O uso de hormônio anabólico masculino pode também predispor ao desenvolvimento de AH. A</p><p>relação homem‑mulher é de aproximadamente 11:1. Os AHs são geralmente únicos, mas  lesões múltiplas  têm sido relatadas em 12% a 30% dos</p><p>casos.  Curiosamente,  os  casos  com múltiplos  adenomas  não  estão  associados  ao  uso  de  contraceptivo  oral  e  não  têm  uma  predominância  tão</p><p>elevada  em mulheres.  Histologicamente,  o  AH  é  composto  de  cordões  de  hepatócitos  benignos  contendo  grande  quantidade  de  glicogênio  e</p><p>gordura. Os dúctulos biliares não são observados histologicamente e a arquitetura normal do fígado está ausente nessas lesões. A hemorragia e a</p><p>necrose  são  comumente  encontradas.33  Com  base  nos  estudos  de  correlação  da  patologia  molecular  detalhada,  um  grupo  francês  propôs</p><p>recentemente  uma  classificação  patológica  molecular  na  qual  os  adenomas  se  classificam  em  mutado  com  β‑catenina,  com  HNF1A  mutado,</p><p>inflamatório e não especificado de outra forma.34,35 Os estudos moleculares também identificaram assinaturas genéticas com um risco mais elevado</p><p>de transformação maligna. Especificamente, o risco mais elevado de transformação maligna é observado no AH com ativação de β‑catenina.35,36 Os</p><p>pacientes com AH apresentam sintomas em cerca de 50% a 75% dos casos. A dor abdominal no quadrante superior direito é comum e pode estar</p><p>relacionada com hemorragia no tumor ou com sintomas locais compressivos. O exame físico geralmente é normal e os marcadores tumorais são</p><p>normais.  Podem  ocorrer  graves manifestações,  como  ruptura  em  peritônio  livre  e  sangramento.  A  imagem  tende  a  ser  característica  e  evita  a</p><p>necessidade de diagnóstico tecidual na maior parte do tempo.37‑39 Devido à hemorragia  intratumoral, a necrose e o componente  lipídico do AH</p><p>tendem a ser heterogêneos na TC. Na TC com contraste, o AH tende a apresentar melhora periférica com progressão centrípeta. As RMs do AH</p><p>também têm características radiológicas específicas, incluindo uma massa heterogênea bem demarcada contendo gordura ou hemorragia. Apesar</p><p>da  imagem de alta qualidade, a ressecção pode, por vezes, ser necessária para assegurar um diagnóstico em casos difíceis. De  forma  intrigante,</p><p>estudos vêm elucidando a correlação entre os subtipos moleculares descritos e as características imaginológicas.40</p><p>Os dois grandes riscos do AH são a ruptura com hemorragia intraperitoneal potencialmente fatal e a transformação maligna. A quantificação do</p><p>risco  de  ruptura  é  difícil, mas  foi  estimada  em  30%  a  50%,  com  todas  as  instâncias  de  ruptura  espontânea  ocorrendo  em  lesões  com  5  cm  ou</p><p>mais.39 Embora existam numerosos registros de transformação de AH em carcinoma hepatocelular (CHC), o verdadeiro risco de transformação é</p><p>provavelmente baixo. Os adenomas hepáticos com ativação da β‑catenina devem ser considerados para intervenção cirúrgica precoce, uma vez que</p><p>a transformação maligna ocorre com mais frequência neste subtipo.36,41</p><p>Pacientes que apresentam hemorragia aguda necessitam de cuidados emergenciais. Se possível,</p><p>a embolização da artéria hepática constitui uma</p><p>manobra  temporária útil. Uma vez  estabilizados  e  adequadamente  recuperados,  são necessárias  laparotomia  e  ressecção do nódulo. As massas</p><p>sintomáticas devem ser ressecadas da mesma forma. As pacientes com AH assintomático decorrente de contraceptivos orais podem ser observadas</p><p>após a interrupção do uso de pílulas, embora a progressão e a ruptura tenham sido observadas nesta situação. O comportamento do AH durante a</p><p>gravidez é imprevisível, sendo geralmente recomendada a ressecção antes de uma gravidez programada. Em geral, o cirurgião deve comparar os</p><p>riscos da conduta expectante, estudos em série por imagem e medidas de AFP com os riscos da ressecção. A ressecção geralmente é recomendada</p><p>por causa da baixa mortalidade em mãos experientes e dos riscos da observação. As condições da margem não são importantes nestas ressecções,</p><p>podendo ser realizadas ressecções limitadas. O tratamento da adenomatose é controverso, mas grandes lesões provavelmente devem ser ressecadas</p><p>devido  ao  risco de  ruptura,  enquanto  o  risco de malignidade  é  baixo nas  lesões  inferiores  a  5  cm.42 Ocasionalmente,  o  transplante de  fígado  é</p><p>necessário para formas agressivas de adenomatose.43,44</p><p>Hiperplasia Nodular Focal</p><p>A hiperplasia nodular focal (HNF) é o segundo tumor benigno do fígado mais comum após o hemangioma e é predominantemente encontrada em</p><p>mulheres jovens.39  É  caracterizada  por  uma mácula  fibrosa  central  com  septos  irradiados,  embora  nenhuma mácula  central  seja  observada  em</p><p>aproximadamente 15% dos casos (Fig. 53‑34).Microscopicamente, a HNF contém cordões de hepatócitos de aparência benigna e segmentados por</p><p>múltiplos  septos  fibrosos  originários  da  mácula  central.  A  vascularidade  hepática  típica  não  é  observada,  porém  um  epitélio  biliar  atípico  é</p><p>encontrado disseminado por toda a lesão. Em geral a mácula central contém uma grande artéria que se estende em pequenos ramos dispostos em</p><p>um padrão radial. A etiologia da HNF não é conhecida e a teoria mais aceita é que estaria relacionada com o desenvolvimento de uma malformação</p><p>vascular.  Os  hormônios  femininos  e  os  agentes  contraceptivos  orais  têm  sido  implicados  no  desenvolvimento  e  crescimento  da  HNF,  mas  a</p><p>associação é frágil e difícil de ser provada.</p><p>FIGURA 53­34  Corte transversal de uma hiperplasia nodular focal ressecada. Note a cicatriz central bem definida. (De Hugh TJ, Poston GJ:</p><p>Benign liver tumors and masses. In Blumgart LH, Fong Y [eds]: Surgery of the liver and biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 1397–1422.)</p><p>A maioria dos pacientes com HNF se apresenta como um achado incidental na laparotomia ou, mais comumente, em estudos de imagem. Se os</p><p>sintomas forem observados, quase sempre se apresentam como dores abdominais imprecisas, de modo que têm sido descritos vários sintomas não</p><p>específicos. Muitas vezes é difícil atribuir estes sintomas relatados à presença da HNF, portanto outras possíveis causas devem ser investigadas. O</p><p>exame físico geral é irrelevante e anormalidades leves da função hepática podem ser detectadas. Os níveis de AFP sérica estão normais.</p><p>Com os progressos dos exames de imagens hepatobiliares, a maioria dos casos de HNF tem sido diagnosticada radiologicamente com razoável</p><p>segurança. A TC contrastada e a RM tornaram‑se métodos seguros de diagnóstico da HNF.45 A HNF normalmente mostra hipervascularização na</p><p>fase  arterial  na  TC  ou  RM  com  cicatriz  central  que  não  melhora.  A  marcação  desaparece  com  o  tempo  e  a  lesão  torna‑se  isointensa  com  o</p><p>parênquima hepático nas fases portal e diferida. Quando não se observa uma mácula central, entretanto, o diagnóstico radiológico torna‑se difícil</p><p>para  se diferenciar um adenoma  celular  hepático  (ACH) de um nódulo maligno,  especialmente CHC fibrolamelar,  sendo que  algumas vezes  é</p><p>praticamente impossível. Ocasionalmente, torna‑se necessária a confirmação histológica, e a ressecção é recomendada para o diagnóstico definitivo.</p><p>A aspiração por agulha fina para o diagnóstico de HNF tem sido sugerida, mas muitas vezes não é esclarecedora.</p><p>A  maioria  dos  tumores  na  HNF  são  benignos  e  de  natureza  indolente.  A  ruptura,  o  sangramento  e  o  infarto  são  extremamente  raros  e  a</p><p>degeneração maligna  da HNF  jamais  foi  assinalada.  O  tratamento  da HNF  depende  de  um  diagnóstico  correto  e  dos  sintomas.  Os  pacientes</p><p>assintomáticos com características radiológicas típicas não exigem tratamento.39 Se o diagnóstico for impreciso, a ressecção pode ser necessária para</p><p>a  confirmação  histológica.  Os  pacientes  sintomáticos  devem  ser  meticulosamente  investigados  quanto  à  possibilidade  de  outra  doença  com  o</p><p>objetivo de esclarecer os sintomas. A observação cuidadosa dos pacientes com HNF sintomática por meio de exames de imagem em série é razoável</p><p>porque os sintomas melhoram em um número significativo de casos. Os pacientes com HNF sintomática persistente ou que apresentem uma massa</p><p>crescente  devem  ser  considerados para  ressecção. Como  a HNF  é  um diagnóstico de doença  benigna,  a  ressecção deve  ser  realizada  com  taxa</p><p>mínima de morbimortalidade.46</p><p>Hemangioma</p><p>Tumor benigno mais comum do fígado,39 o hemangioma ocorre em mulheres mais do que em homens (proporção 3:1) e em uma média de idade de</p><p>aproximadamente 45 anos. Os hemangiomas capilares pequenos não  têm importância clínica, enquanto os volumosos hemangiomas cavernosos</p><p>despertam a atenção do cirurgião hepático  (Fig. 53‑35). Os hemangiomas  cavernosos  estão  associados  à HNF  e  são  considerados malformações</p><p>vasculares  congênitas. O  crescimento  do  hemangioma  é  por  ectasia,  em vez  de  neoplasia.  São  normalmente  solitários,  com menos  de  5  cm de</p><p>diâmetro  e  ocorrem  com  igual  incidência  nos  hemifígados  direito  e  esquerdo.  As  lesões  maiores  que  5  cm  são  arbitrariamente  chamadas</p><p>hemangiomas gigantes. A involução ou trombose dos hemangiomas pode resultar em massas fibróticas densas difíceis de serem diferenciadas de</p><p>tumores malignos. Microscopicamente, são revestidos por endotélios, com espaços preenchidos de sangue separados por finos septos fibrosos.47,48</p><p>FIGURA 53­35  A e B, Imagens de TC de um grande hemangioma cavernoso mostrando o deslocamento das veias hepáticas esquerda e</p><p>média e compressão da veia porta esquerda. O nódulo era sintomático e foi necessária uma hepatectomia direita estendida para que fosse</p><p>removido.</p><p>Geralmente, os hemangiomas são assintomáticos e encontrados incidentalmente em exames de imagem. Grandes nódulos compressivos podem</p><p>causar leves sintomas abdominais superiores. Os sintomas atribuídos a um hemangioma do fígado demandam uma investigação em relação a outra</p><p>doença,  porque  em  cerca  da metade  dos  casos  será  encontrada  outra  causa  para  os  sintomas. Uma  rápida  expansão  ou  trombose  aguda  pode</p><p>ocasionalmente  causar  sintomas.  A  ruptura  espontânea  dos  hemangiomas  do  fígado  é  muito  rara.  Uma  síndrome  com  associação  de</p><p>trombocitopenia e coagulopatia de consumo, conhecida como síndrome de Kasabach‑Merriീ�, é rara, porém bem‑definida.</p><p>Os  TFHs  e  os  marcadores  tumorais  usualmente  são  normais  nos  hemangiomas  hepáticos.  A  investigação  radiológica  pode  esclarecer  o</p><p>diagnóstico  na  maioria  dos  casos.  A  TC  e  a  RM  em  geral  são  suficientes  se  for  observado  um  típico  padrão  de  preenchimento  nodular</p><p>periférico.45,47 Exames de eritrócitos marcados por  isótopos radioativos são  testes precisos, mas raramente serão necessários se TC e RM de alta</p><p>definição  estiverem  disponíveis.  A  biópsia  percutânea  de  um  hemangioma  suspeito  é  potencialmente  perigosa  e  inexata,  portanto  não  é</p><p>recomendada.</p><p>A história natural do hemangioma hepático é geralmente benigna, e parece que a maior parte permanece estável por muito tempo, com baixo</p><p>risco de  ruptura ou hemorragia.39 O crescimento e o aparecimento dos  sintomas  realmente ocorrem, porém</p><p>eventualmente  requerem ressecção.</p><p>Não  há  registro  de  degeneração  maligna  de  hemangioma  hepático.  Um  paciente  assintomático  com  o  diagnóstico  confirmado  pode  ficar  em</p><p>simples  observação.39 Os  pacientes  sintomáticos  devem  ser  submetidos  a  uma  avaliação  global  em  busca  de  explicações  alternativas  para  os</p><p>sintomas, mas são elegíveis para ressecção caso nenhuma outra causa seja encontrada. A ruptura, a mudança de tamanho e o desenvolvimento da</p><p>síndrome de Kasabach‑Merriീ�  são  indicações para  ressecção. Em  raros  casos de diagnóstico  impreciso,  a  ressecção pode  ser necessária para  se</p><p>elaborar um diagnóstico definitivo. A ressecção dos hemangiomas hepáticos deve ser realizada com o mínimo de morbimortalidade. A ressecção é</p><p>realizada  com mais  frequência  pela  enucleação  com  controle  do  fluxo  arterial,  mas  as  ressecções  anatômicas  têm  sido  defendidas  por  alguns</p><p>cirurgiões. A cirurgia em hemangioma central volumoso pode ser associada à morbidade significativa.</p><p>Os  hemangiomas  hepáticos  em  crianças  são  comuns,  sendo  responsáveis  por  aproximadamente  12%  de  todos  os  tumores  hepáticos  na</p><p>infância.49 São geralmente multifocais e podem comprometer outros órgãos. Hemangiomas volumosos em crianças podem resultar em insuficiência</p><p>cardíaca congestiva secundária ao shunt arteriovenoso. Os hemangiomas infantis sintomáticos não tratados estão associados a alta mortalidade. Por</p><p>outro lado, quase todos os pequenos hemangiomas capilares têm resolução espontânea. O hemangioma infantil sintomático pode ser tratado com</p><p>embolização terapêutica; o tratamento médico deve ser iniciado para o controle da insuficiência cardíaca congestiva. Os agentes quimioterápicos e a</p><p>irradiação têm sido utilizados, mas a experiência é limitada. A ressecção pode ser necessária para as lesões sintomáticas e/ou casos de ruptura.</p><p>Outros Tumores Benignos</p><p>Embora existam outros tumores hepáticos benignos, a maioria dos tumores sólidos benignos do fígado é composta por AH, HNFs ou hemangioma;</p><p>entretanto estes são raros e podem ser difíceis de diferenciar da malignidade. Os nódulos macrorregenerativos ou hiperplasia adenomatosa são</p><p>nódulos simples ou múltiplos, bem delimitados, corados pela bile, abaulados e que ocorrem primariamente em pacientes com doença crônica do</p><p>fígado. Essas  lesões têm potencial maligno e podem ser difíceis de distinguir do CHC. Hiperplasia regenerativa nodular é um processo benigno</p><p>micronodular  difuso  (geralmente   10 a 20 casos/100.000) é encontrada no sudeste da Ásia e na África tropical. A incidência mais baixa (1 a</p><p>3 casos/100.000) é observada na Austrália, América do Norte e Europa. Em áreas de acometimento elevado, os índices são variáveis. Por exemplo,</p><p>Taiwan tem uma incidência de 150 casos/100.000 e Singapura, de 28 casos/100.000. Evidências epidemiológicas sugerem que o CHC está em grande</p><p>parte relacionado com fatores ambientais; a incidência de CHC em imigrantes eventualmente envolve a população local após várias gerações. Uma</p><p>exceção  a  esta  observação  é  que  os  brancos  que  vivem  nas  áreas  de  grande  prevalência  tendem  a  ter  uma  baixa  incidência  de  CHC,  o  que</p><p>provavelmente está relacionado com a continuação do estilo de vida e dos fatores ambientais de seu país de origem. É provável que a variação e a</p><p>taxa de incidência entre imigrantes estejam relacionadas com a proporção ao número de VHB. Um aumento significativo no percentual de CHC nos</p><p>Estados Unidos e em outros países ocidentais  tem sido observado nos últimos 35 anos, no entanto dados recentes sugerem que pelo menos nos</p><p>Estados Unidos a epidemia pode ter atingido o pico, uma vez que as taxas de incidência se estabilizaram nos últimos anos.50,51 A explicação para o</p><p>aumento observado durante as últimas décadas não é compreendida, mas o surgimento da infecção com o vírus de hepatite C (VHC) e de padrões</p><p>de imigração foi sugerido.52‑54 O risco de CHC aumenta ainda mais em pacientes obesos e naqueles com doença hepática gordurosa não alcoólica e</p><p>esteato‑hepatite não alcoólica.55 Visto que a obesidade e suas complicações estão aumentando em uma proporção epidêmica no mundo ocidental, a</p><p>obesidade como causa de CHC está se tornando mais importante. Dados recentes também sugerem que abordar os fatores ambientais pode levar à</p><p>redução da  incidência de CHC. Em Taiwan, o  tratamento das hepatites crônicas B e C sob a conduta de um programa nacional de  terapia para</p><p>hepatite viral conseguiu a redução da incidência e da mortalidade por CHC.56</p><p>O CHC é duas a oito vezes mais comum em homens do que em mulheres em áreas de baixa e alta incidências. Embora os hormônios sexuais</p><p>possam desempenhar um pequeno papel no desenvolvimento do CHC, a maior incidência em homens provavelmente está relacionada com altas</p><p>taxas dos fatores de riscos associados, como infecção por VHB, cirrose, fumo, consumo excessivo de álcool e a elevada síntese de DNA hepático na</p><p>cirrose.  Em  geral,  a  incidência  de  CHC  aumenta  com  a  idade,  mas  observou‑se  a  tendência  para  desenvolver  CHC mais  cedo,  em  áreas  de</p><p>incidência elevada. Por exemplo, em Moçambique, 50% dos pacientes com CHC tinham idade inferior aos 30 anos, o que poderia estar relacionado</p><p>com a possibilidade de se contrair a infecção em diferentes faixas etárias e a história natural da hepatite B e infecções pela C.</p><p>Fatores causais</p><p>Foram observadas numerosas associações entre infecções virais hepáticas, exposições ambientais,</p><p>contém o pedículo portal esquerdo. (De Blumgart LH, Hann LE:</p><p>Surgical and radiologic anatomy of the liver and biliary tract. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and biliary tract,</p><p>London, 2000, WB Saunders, pp 3–34.)</p><p>FIGURA 53­5  Anatomia segmentar do fígado.</p><p>A, Como vista em laparotomia na posição anatômica B, Na posição ex vivo. (De Blumgart LH, Hann LE: Surgical and</p><p>radiologic anatomy of the liver and biliary tract. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and biliary tract, London, 2000,</p><p>WB Saunders, pp 3–34.)</p><p>FIGURA 53­6  Anatomia segmentar do fígado é demonstrada em três níveis nas imagens de TC contrastadas. A,</p><p>No nível das veias hepáticas, o segmento 1 é visto posteriormente “abraçando” a veia cava. O segmento 2 é</p><p>separado do segmento IVA pela veia hepática esquerda. O segmento 4A é separado do segmento 8 pela veia</p><p>hepática média, e o segmento 8 é separado do segmento 7 pela veia hepática direita. B, No nível da bifurcação da</p><p>veia porta, o segmento 3 é visto, já que se fixa inferiormente em sua posição anatômica e é separado do</p><p>segmento 4B pela fissura umbilical. Observe que o segmento 2 não é visto neste nível. Ramos terminais da veia</p><p>hepática média separam o segmento 4B do segmento 5, e ramos terminais da veia hepática direita separam o</p><p>segmento 5 do segmento 6. Observe que os segmentos 4A, 8, e 7 não são vistos neste nível. O segmento 1 é</p><p>visto posterior à veia porta e “envolvendo” a veia cava. C, Abaixo da bifurcação portal, podem ser vistas as</p><p>pontas inferiores dos segmentos 3 e 4B. Os ramos terminais da veia hepática média e a vesícula biliar marcam</p><p>a separação do segmento 4B do segmento 5. Segmentos 5 e 6 são separados pelos ramos distais da veia</p><p>hepática direita. Observe como o fígado direito localiza­se bem inferior em relação ao fígado esquerdo. A</p><p>anatomia segmentar do fígado é demonstrada em três níveis nas imagens de TC contrastada.</p><p>A cissura principal contém a veia hepática média, que corre na direção anteroposterior da fossa da vesícula biliar para o</p><p>lado esquerdo da veia cava e divide o  fígado em hemifígados direito e esquerdo. A  linha da cissura principal  também é</p><p>conhecida  como  linha  de  Cantlie.  O  fígado  direito  é  dividido  em  segmentos  anteriores  (segmentos  5  e  8)  e  posteriores</p><p>(segmentos 6 e 7) pela cissura direita, que contém a veia hepática direita. O pedículo portal direito é composto por artéria</p><p>hepática direita, veia porta e ducto biliar e se divide em pedículos anteriores direitos e posteriores direitos, que suprem os</p><p>segmentos do setor anterior e posterior.</p><p>O fígado esquerdo tem uma cissura visível ao longo de sua superfície inferior, chamada de cissura umbilical, na qual o</p><p>ligamento  redondo  (contendo  o  remanescente  da  veia  umbilical)  penetra.  O  ligamento  falciforme  é  contíguo  à  cicatriz</p><p>umbilical  e  ao  ligamento  redondo.  A  cicatriz  umbilical  não  é  uma  cissura  e  não  contém  a  veia  hepática;  ela  envolve  o</p><p>pedículo portal esquerdo, que acomoda a veia porta esquerda, a artéria hepática e o ducto biliar. Este pedículo corre nessa</p><p>cissura  e  se  ramifica  para  perfundir  o  fígado  esquerdo,  o  qual  é  dividido  em  segmentos  anteriores  (segmentos  3  e  4)  e</p><p>segmento posterior (segmento 2, o único setor composto por um único segmento) pela cissura esquerda. A cissura esquerda</p><p>corre posteriormente ao ligamento redondo e contém a veia hepática esquerda.</p><p>No hilo hepático, a tríade portal direita tem um pequeno curso extra‑hepático de aproximadamente 1 a 1,5 cm, antes de</p><p>penetrar no parênquima e ramificar‑se nos ramos segmentares anterior e posterior. A tríade portal esquerda, entretanto, tem</p><p>um  longo  curso  extra‑hepático de até  3  a  4  cm e  corre  em sentido  transversal  ao  longo da base do  segmento 4  em uma</p><p>bainha peritoneal que constitui a extremidade superior do omento menor. Esse tecido conjuntivo é conhecido como placa</p><p>hilar (Fig. 53‑7). A continuação da tríade portal esquerda corre anterior e inferiormente na cissura umbilical e dá ramos aos</p><p>segmentos 2 e 3 e ramos recorrentes ao segmento 4.</p><p>FIGURA 53­7  O sistema de placas está ilustrado: a placa cística entre a vesícula biliar e o fígado (A); a placa</p><p>hilar na confluência biliar na base do segmento IV (B); e a placa umbilical acima da porção umbilical da veia</p><p>porta (C). As setas mostram o plano de dissecção da placa cística para colecistectomia e a placa hilar para</p><p>exposição da confluência do ducto hepático e o ducto hepático principal esquerdo. (De Blumgart LH, Hann LE: Surgical</p><p>and radiologic anatomy of the liver and biliary tract. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and biliary tract, London,</p><p>2000, WB Saunders, pp 3–34.)</p><p>O lobo caudado (segmento 1) é a porção dorsal do fígado. Ele envolve a VCI com sua superfície posterior e  localiza‑se</p><p>posteriormente  à  tríade  portal  esquerda,  na  parte  inferior,  e  às  veias  hepáticas  esquerda  e média,  na  parte  superior.  A</p><p>superfície principal do lobo caudado fica à esquerda da VCI, mas, na parte inferior, ela passa entre a VCI e a tríade portal</p><p>esquerda e funde‑se ao fígado direito (segmentos 6 e 7). Esta parte do lobo caudado é conhecida como a porção direita ou</p><p>processo caudado. A porção esquerda do lobo caudado localiza‑se na bursa do omento menor e é coberta na parte anterior</p><p>pelo ligamento gastro‑hepático (omento menor), que a separa dos segmentos 2 e 3 na parte anterior. O ligamento gastro‑</p><p>hepático  prende‑se  ao  ligamento  venoso  (remanescente  do  seio  venoso)  ao  longo  da  borda  esquerda  da  tríade  portal</p><p>esquerda (Fig. 53‑8).</p><p>FIGURA 53­8  A anatomia do lobo caudado (segmento I) é mostrada. A, Vista em corte transversal, a maior</p><p>parte do caudado está à esquerda da veia cava inferior (VCI) e localiza­se posterior ao omento menor, que separa</p><p>o caudado dos segmentos II e III. A terminação do omento menor no ligamento venoso é demonstrada. O</p><p>caudado cursa para a direita, insinuando­se entre a VCI e a veia porta esquerda (VPE), onde ele se une ao fígado</p><p>direito. Observe a proximidade da veia hepática média (VHM) com estas estruturas. B, Os segmentos II e III</p><p>foram rodados para a direita do paciente, expondo o lado esquerdo do caudado. VHE, veia hepática esquerda; VP,</p><p>veia porta. (De Blumgart LH, Hann LE: Surgical and radiologic anatomy of the liver and biliary tract. In Blumgart LH, Fong Y,</p><p>editors:Surgery of the liver and biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 3–34.)</p><p>O influxo vascular e a drenagem biliar para o lóbulo caudado provêm dos sistemas direito e esquerdo. O lado direito do</p><p>lóbulo  caudado,  o processo  caudado,  em grande parte deriva  seu  suprimento venoso portal  da veia porta direita  ou da</p><p>bifurcação da veia porta principal. A porção esquerda do  lóbulo caudado deriva seu  influxo venoso portal da veia porta</p><p>principal  esquerda. Em geral,  o  suprimento arterial  e  a drenagem biliar da porção direita  se  fazem pelo  sistema  setorial</p><p>posterior direito,  e  o da porção  esquerda  se processa pelos principais vasos  esquerdos. A drenagem venosa hepática do</p><p>lóbulo caudado é singular porque um número de pequenas veias posteriores drena diretamente na VCI.</p><p>A borda posterior do lado esquerdo do lóbulo caudado termina em um componente fibroso que se prende ao pilar direito</p><p>do diafragma e caminha, posteriormente, atrás da VCI e liga‑se ao segmento 7 do fígado direito. Em até 50% das pessoas,</p><p>este componente fibroso é composto parcial ou completamente pelo parênquima hepático. Assim, o tecido hepático pode</p><p>envolver  completamente  a  VCI.  Essa  estrutura  é  conhecida  como  ligamento  da  veia  cava  e  é  importante  reconhecê‑la</p><p>quando mobilizamos o fígado direito ou o lóbulo caudado para afastá‑los da veia cava.</p><p>Raramente são encontradas variações anatômicas no fígado. A ausência completa do fígado esquerdo  já foi assinalada,</p><p>assim como também já se descreveu uma língua de tecido que se estende além da parte inferior do fígado direito (lobo de</p><p>Riedel). Além disso, foram observados raros casos</p><p>consumo de álcool,  fumo, doenças metabólicas</p><p>genéticas, cirrose, uso de ACO e desenvolvimento do CHC. Em geral, 75% a 80% dos casos de CHC estão relacionados com VHB (50% a 55%) ou</p><p>infecções VHC  (25% a 30%). Também está  claro, de acordo com pesquisas, que o desenvolvimento do CHC é um processo  complexo de várias</p><p>etapas e que envolve diferentes fatores de risco.54,57</p><p>Depois  de muitos  anos  de  pesquisa,  estabeleceu‑se  uma  evidente  associação  entre  a  infecção  persistente  por  VHB  e  o  desenvolvimento  do</p><p>CHC.58 Em estudo, observou‑se uma incidência cinco a 100 vezes maior de CHC em indivíduos infectados pelo VHB em comparação com os não</p><p>infectados. Outra  evidência  inclui  as  seguintes  observações:  as  áreas  geográficas  com  elevados  índices  de  infecção  por VHB  também  têm  altos</p><p>índices  de CHC;  a  infecção por VHB precede  o  aparecimento de CHC;  a  sequência  da  infecção por VHB para  cirrose  e  para  o CHC  está  bem</p><p>documentada e o genoma do VHB é encontrado no genoma do CHC. O VHB não apresenta oncogenes conhecidos, mas a mutagênese insercional</p><p>em hepatócitos pode ser um fator que contribui para o desenvolvimento do CHC. Outro mecanismo proposto está relacionado com a cirrose e a</p><p>inflamação hepática crônica, que está presente em 60% a 90% dos pacientes com infecção por VHB e CHC. A cirrose não é um pré‑requisito para o</p><p>desenvolvimento do CHC relacionado com o VHB. O risco de CHC não está simplesmente relacionado com a presença do VHB, mas requer uma</p><p>infecção crônica (i.e., antígeno de superfície de hepatite B cronicamente positivo). Há uma possibilidade maior de infecção persistente (estado de</p><p>portador) quando esta é adquirida no nascimento ou na primeira  infância. A agregação familiar de CHC está provavelmente relacionada com a</p><p>transmissão precoce e vertical do vírus e com o estabelecimento do estado de portador crônico.</p><p>Descobriu‑se que a hepatite C é uma das principais causas de doença hepática crônica no Japão, Europa e Estados Unidos, onde existe um índice</p><p>relativamente baixo de infecção pelo VHB. Os anticorpos contra o VHC são encontrados em 76% dos pacientes com CHC no Japão e na Europa e</p><p>em  36%  nos  Estados  Unidos.  A  infecção  por  VHB  e  VHC  é  fator  de  risco  independente  para  o  desenvolvimento  do  CHC,  mas  pode  agir</p><p>sinergicamente quando um indivíduo está infectado por ambos os vírus. Embora a história natural da infecção pelo VHC não esteja completamente</p><p>esclarecida, ela parece ser uma infecção crônica, com um curso benigno inicial; no entanto pode ocorrer o desenvolvimento final de cirrose e CHC.</p><p>Os estudos sobre as taxas de progressão para cirrose têm estipulado um tempo médio de 30 anos, mas estas taxas variam de menos de 20 a 50 anos.</p><p>Os fatores associados a progressão mais rápida incluem sexo masculino, uso crônico de álcool e idade mais avançada no momento da infecção. O</p><p>VHC é um vírus RNA que não se integra no genoma do hospedeiro e, portanto, a patogenia do CHC relacionada com o VHC pode ser devida à</p><p>inflamação crônica e à cirrose, e não à carcinogênese diretamente.59,60</p><p>A verdadeira relação entre a cirrose e o CHC é muito difícil de se confirmar, e sugestões causais continuam sendo especuladas. A cirrose não é</p><p>requisito para o desenvolvimento de CHC, nem o CHC é um resultado inevitável da cirrose. A relação entre cirrose e CHC complica‑se ainda mais</p><p>pelo fato de que eles têm associações comuns. Além disso, algumas associações (p. ex., a infecção por VHB, a hemocromatose) estão relacionadas</p><p>com o alto risco de CHC, enquanto as demais (p. ex., o álcool, a cirrose biliar primária) estão relacionadas com baixo risco de CHC. Trabalhos com</p><p>fígados cirróticos com taxas elevadas de replicação de DNA estão associados ao desenvolvimento de CHC.</p><p>O consumo crônico do álcool e do fumo está associado ao risco elevado de CHC, podendo existir um efeito sinérgico com a infecção por VHB e</p><p>VHC.  O  álcool  causa  cirrose,  mas  nunca  se  demonstrou  que  haja  atividade  diretamente  carcinogênica  nos  hepatócitos.  Assim,  o  álcool</p><p>provavelmente age como um cocarcinógeno. O tabagismo tem estado associado ao desenvolvimento de CHC, mas a evidência não é consistente e o</p><p>risco  de  contribuição,  independentemente  da  hepatite  viral,  é  provavelmente  pequeno.  A  aflatoxina  produzida  pela  espécie Aspergillus  é  uma</p><p>poderosa hepatotoxina. Com a exposição crônica, a aflatoxina age como um carcinógeno e aumenta o risco de CHC. O fungo agressor cresce em</p><p>grãos,  amendoins  e  produtos  alimentícios  em  regiões  tropicais  e  subtropicais.  A  ingestão  de  alimentos  contaminados  resulta  na  exposição  à</p><p>aflatoxina. Nos Estados Unidos, os níveis de aflatoxina em alimentos potencialmente comprometidos são controlados.</p><p>Outras  substâncias  químicas  também  têm  sido  implicadas  como  carcinógenos  relacionados  com  CHC,  incluindo  nitritos,  hidrocarbonetos,</p><p>solventes, pesticidas e cloreto de vinila. O Thorotrast® (dióxido de tório coloidal), um meio angiográfico usado nos anos 1930, emite altos níveis de</p><p>irradiação  de  longa  duração  e  tem  sido  responsabilizado  por  fibrose  hepática,  angiossarcoma,  colangiossarcoma  e  CHC.  As  associações  com</p><p>doenças  hepáticas metabólicas  hereditárias,  como  a  hemocromatose  hereditária,  a  deficiência  de α1‑antitripsina  e  a  doença de Wilson,  também</p><p>foram  incluídas  como  fatores  de  risco  para  CHC.  As  associações  com  a  utilização  de  hormônios,  agentes  contraceptivos  orais  e  esteroides</p><p>anabolizantes, também têm sido sugeridas, porém sem muita ênfase, e estão provavelmente relacionadas com adenoma e CHC bem diferenciado.</p><p>Várias pesquisas têm procurado relações do CHC com diabetes, obesidade e síndrome metabólica.55,61‑63</p><p>Quadro clínico</p><p>Na maioria das vezes, os pacientes com CHC são homens com 50 a 60 anos de idade com queixas de dor abdominal no quadrante superior direito,</p><p>perda de peso e massa palpável. Em países onde o VHB é endêmico, as apresentações em idades mais jovens são comuns e provavelmente estão</p><p>relacionadas com a infecção na infância. Infelizmente, nas populações não rastreadas, o CHC tende a iniciar os sintomas em um estágio avançado,</p><p>sem pródromos. A manifestação nos estágios avançados é sempre com leve dor abdominal no quadrante superior direito que às vezes se irradia</p><p>para o ombro direito. Os sintomas não específicos de malignidade avançada, como anorexia, náuseas, letargia e perda de peso, são comuns. Outra</p><p>manifestação  habitual  do CHC  é  a  descompensação  hepática  em  um paciente  com  cirrose  inicial  identificada  ou  até  em  pacientes  sem  cirrose</p><p>previamente conhecida.</p><p>O CHC pode se apresentar como uma ruptura, com início súbito de dor abdominal seguida por choque hipovolêmico secundário a sangramento</p><p>intraperitoneal. Outras manifestações raras incluem oclusão da veia hepática (síndrome de Budd‑Chiari), icterícia obstrutiva, hemobilia ou febre de</p><p>origem desconhecida. Menos de 1% dos casos de CHC apresenta‑se com síndrome paraneoplástica, que pode ser hipercalcemia, hipoglicemia e</p><p>eritrocitose. Pequenos tumores descobertos por acaso estão se tornando manifestação mais comuns devido ao conhecimento dos fatores de risco</p><p>específicos, programas de rastreamento e uso crescente de exames de imagem abdominais de alta resolução.</p><p>Diagnóstico</p><p>A investigação radiológica é parte fundamental no diagnóstico de CHC. No passado, o rastreamento do fígado com radioisótopos e a angiografia</p><p>eram métodos comuns de diagnóstico, mas a US, a TC e a RM substituíram totalmente estes exames. A US desempenha um papel significativo no</p><p>rastreamento e na detecção precoce do CHC, mas, em geral, o diagnóstico definitivo e o planejamento do tratamento contam com a TC ou a RM. A</p><p>TC com meio de contraste e os protocolos por RM que têm como objetivo o diagnóstico do CHC aproveitam a hipervascularidade destes tumores e</p><p>tanto a imagem quanto os padrões de intensificação pelo contraste são fundamentais.64,65 A TC e a RM também avaliam a extensão da doença em</p><p>termos</p><p>de metástases peritoneais, metástases ganglionares e a extensão do comprometimento vascular e biliar. A detecção de trombos moles e/ou</p><p>tumorais no sistema venoso hepático ou portal também é importante e pode ser feita com qualquer uma dessas modalidades (Fig. 53‑36).</p><p>FIGURA 53­36  Imagem de TC com contraste mostra carcinoma hepatocelular multifocal. A veia porta esquerda está invadida pelo</p><p>tumor. (De Roddie ME, Adam A: Computed tomography of the liver and biliary tree. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and biliary tract, London,</p><p>2000, WB Saunders, pp 309–340.)</p><p>As dosagens de AFP podem ser muito úteis no diagnóstico de CHC no entanto o doseamento da AFP está associado a múltiplos problemas. Em</p><p>primeiro lugar, as medições da AFP têm agora baixas sensibilidade e especificidade. A especificidade e os valores preditivos do positivo da AFP</p><p>melhoram com níveis de limiar mais elevados (p. ex., 400 ng/mL), mas em detrimento da sensibilidade. Elevações falso positivas dos níveis de AFP</p><p>sérico podem ser observadas nas patologias inflamatórias do fígado, como a hepatite viral crônica ativa. Além disso, a AFP não é específica para o</p><p>CHC  e  pode  estar  elevada  no  colangiocarcinoma  intra‑hepático  e  nas metástases  colorretais.  Com  as melhorias  na  tecnologia  de  imagem  e  na</p><p>capacidade para detectar tumores menores, a AFP é amplamente utilizada como teste adjuvante em pacientes com massas hepáticas. Os níveis de</p><p>AFP são particularmente úteis no monitoramento de pacientes tratados para avaliação de recorrência após normalização dos níveis.</p><p>Desde a proposta de diretrizes para o diagnóstico de CHC pela conferência Barcelona‑2000 European Association for the Study of Liver66 e pela</p><p>American Association for the Study of Liver Disease,67 nova informação foi acumulada e as recomendações evoluíram.68,69 A AFP desempenhava</p><p>um papel importante no diagnóstico de CHCs com mais de 2 cm,67 no entanto, dado o excelente desempenho das modalidades de imagem com</p><p>contraste, a AFP já não tem um papel essencial no diagnóstico do CHC.68,69 Para os nódulos hepáticos com 1 a 2 cm de dimensão num contexto de</p><p>cirrose,  TC  com  contraste  trifásico  e  RM  são  agora  recomendadas.68,69  Se  as  características  típicas  do  CHC  na  imagem  (marcação  arterial</p><p>com washout do contraste em fases tardias) forem observadas, o diagnóstico do CHC é presumido. Para lesões com mais de 2 cm, um único estudo é</p><p>suficiente, no entanto, para lesões com 1 a 2 cm de tamanho, a TC e a RM com contraste têm uma sensibilidade de 53% a 62%, especificidade de</p><p>aproximadamente 100%, valor preditivo do positivo de 95% a 100% e valor preditivo do negativo de 80% a 84%.70 O desempenho da TC e da RM</p><p>de uma forma sequencial pode aumentar a sensibilidade e pode ser necessário em casos difíceis.70</p><p>Os pacientes com fatores de risco e características radiológicas sugestivas, com ou sem um nível elevado de AFP, que são candidatos à terapia</p><p>cirúrgica potencialmente curativa não  requerem biópsia pré‑  ‑operatória, a menos que o diagnóstico seja duvidoso. A aspiração percutânea por</p><p>agulha fina do CHC leva a um pequeno risco de implante celular tumoral (estimado em cerca de 1%) e ruptura/sangramento (sobretudo em fígados</p><p>cirróticos).</p><p>Uma vez que  tenha  sido  feito  o diagnóstico de CHC,  a doença deve  ser  testada para  estabelecer um plano de  tratamento  adequado. Muitos</p><p>pacientes com CHC têm duas doenças, e a sobrevida está relacionada tanto com o tumor quanto com a cirrose. O estadiamento inclui a dimensão</p><p>da doença e a extensão da investigação de cirrose.</p><p>Ao  avaliar  a  extensão  da  doença  neoplásica,  os  sítios  comuns  de  metástase  devem  ser  considerados.  O  CHC metastatiza  comumente  para</p><p>pulmão, osso e peritônio. A história pré‑operatória deve focalizar os sintomas referentes a estas áreas. A extensão da doença neoplásica no fígado,</p><p>inclusive  a  invasão  macrovascular  e  a  presença  de  múltiplos  nódulos  hepáticos,  também  deve  ser  considerada.  Uma  imagem  abdominal</p><p>transversal, incluindo imagens de fase arterial (ver anteriormente), fornece informações sobre a dimensão da doença no fígado, bem como doença</p><p>peritoneal. A TC do tórax pré‑operatória é obrigatória porque as metástases pulmonares são geralmente assintomáticas. A rotina de rastreamento</p><p>dos ossos não é realizada, a menos que existam sintomas ou sinais sugestivos.</p><p>A avaliação da  função hepática é  imprescindível no estudo das opções de  tratamento para um paciente com CHC. A ressecção do  fígado é a</p><p>proposição  do  tratamento  ideal  para  CHC  e  o  risco  de  insuficiência  pós‑operatória  do  fígado  e  morte  deve  ser  considerado.  Este  risco  está</p><p>relacionado  a  grau  da  cirrose,  hipertensão  portal,  extensão  do  fígado  ressecado  (reserva  funcional  hepática)  e  resposta  regenerativa  potencial.</p><p>Outros tratamentos bem‑sucedidos estão disponíveis para CHC, como técnicas ablativas, técnicas de embolização e transplante hepático, portanto</p><p>há  que  se  fazer  uma  avaliação  completa  do  tumor  e  da  função  hepática.  Uma  série  de  testes  de  função  hepática  está  disponível,  geralmente</p><p>divididos  em avaliação  clínica  e  testes  funcionais,  e  há muitos  esquemas de  avaliação  clínica  (ver  anteriormente),  no  entanto  a  classificação de</p><p>Child‑Pugh é usada mais frequentemente. Os pacientes de classe C de Child‑Pugh não são candidatos à terapia de ressecção, enquanto Child‑Pugh</p><p>classe A costumam tolerar alguns  tipos de  ressecção hepática. Muitos consideram pacientes Child‑Pugh classe B candidatos à cirurgia, mas são</p><p>geralmente limítrofes e a terapia deve ser individualizada.</p><p>Fora dos sistemas de escore,  foi  recentemente mostrado que a hipertensão portal  significativa,  independentemente dos valores bioquímicos, é</p><p>fortemente preditiva de insuficiência hepática pós‑operatória e óbito. A hipertensão portal pode ser avaliada diretamente pela medida da pressão</p><p>encunhada da veia hepática, mas é geralmente óbvia em estudos por  imagem de alta qualidade na  forma de esplenomegalia,  fígado de aspecto</p><p>cirrótico e varizes. Exames de sangue geralmente mostram acentuadas citopenias. Normalmente, os pacientes apresentam trombocitopenia. Testes</p><p>da função hepática têm sido descritos, mas não são rotineiramente utilizados na maioria dos centros porque os resultados dos estudos avaliando o</p><p>seu valor preditivo foram inconclusivos.</p><p>A laparoscopia tem sido empregada como uma ferramenta de estadiamento do CHC, e um em cada cinco pacientes é poupado da laparotomia</p><p>não terapêutica. A laparoscopia fornece informações adicionais sobre extensão da doença no fígado, doença extra‑hepática e cirrose. A indicação da</p><p>laparoscopia  é  ditada  pela  extensão  da  doença  e  é  apenas  seletivamente  empregada.  A  presença  de  cirrose  clinicamente  aparente,  evidência</p><p>radiológica de  invasão vascular ou  tumores bilobares aumentou sua  indicação para 30%, enquanto sem estes  fatores apenas em 5% dos casos a</p><p>laparoscopia deve ser empregada.71</p><p>Existem vários  sistemas  de  estadiamento  para  o CHC, mas  nenhum  se mostrou  particularmente  superior;  eles  provavelmente  dependem da</p><p>população específica na qual a doença está sendo estadiada, bem como da causa do CHC nesse grupo em particular. O sistema de estadiamento</p><p>TNM não é utilizado de rotina para o CHC, pois ele não prediz de forma precisa a sobrevida, porque não leva em consideração a função hepática.</p><p>Além  disso,  o  sistema  de  estadiamento  TNM  depende  da  patologia  que  está  frequentemente  disponível  no  pré‑operatório.  O  sistema  de</p><p>estadiamento de Okuda é mais antigo, porém simples e eficaz, e leva em consideração a função hepática e os fatores relacionados com o tumor. Ele</p><p>adiciona um único ponto para a presença de tumor envolvendo mais de 50% do fígado, presença de ascite, nível de albumina inferior a 3 g/dL e</p><p>nível  de  bilirrubina  acima  de  3  mg/dL.  O  sistema  de  estadiamento  de  Okuda  distingue  confiavelmente  pacientes  com  um  prognóstico</p><p>proibitivamente</p><p>ruim e com potencial de sobrevida em longo prazo. O sistema de estadiamento mais bem validado é o Cancer of the Liver Italian</p><p>Program  (CLIP),  que  foi  acuradamente  desenvolvido  e  prospectivamente  validado  (Tabela  53‑7).  Um  exemplo  de  sistema  de  estadiamento</p><p>provavelmente demográfico‑específico é o Chinese University Prognostic Index (IPUC), que leva em consideração o estadiamento TNM, sintomas,</p><p>ascite, níveis de AFP, bilirrubina e fosfatase alcalina e parece ser francamente aplicado ao CHC relacionado com o VHB na China.</p><p>Tabela 53­7</p><p>Escore do Câncer de Fígado do Grupo Italiano*</p><p>PARÂMETROS CLÍNICOS VALORES DE CORTE PONTOS</p><p>Classe de Child‑Pugh A 0</p><p>B 1</p><p>C 2</p><p>Morfologia do tumor Uninodular, extensão de  50% 2</p><p>AFP  400 ng/dL 1</p><p>Trombose da veia porta Não 0</p><p>Sim 1</p><p>* A pontuação varia de 0 a 6; uma pontuação de 4 a 6 é geralmente considerada doença avançada, enquanto uma pontuação de 0 a 3 tem o potencial de sobrevida em</p><p>longo prazo.</p><p>Patologia</p><p>Histologicamente o CHC é classificado em bem pouco ou moderadamente diferenciado, todavia o seu grau histológico nunca se mostrou preciso</p><p>para prever resultados. Os padrões de crescimento de CHC foram classificados de várias formas, e o esquema mais utilizado classifica o CHC em</p><p>três padrões de crescimento distintos que mostram relação díspar com o resultado. O tipo pediculado de CHC está conectado ao fígado por um</p><p>pequeno pedículo vascular e é facilmente ressecado sem sacrificar uma grande quantidade de tecido hepático não neoplásico. Este tipo de tumor</p><p>pode crescer a um tamanho substancial sem comprometer muito tecido normal do fígado. O tipo expansivo de CHC é bem demarcado e sempre</p><p>contém  uma  cápsula  fibrosa,  caracterizando‑se  pelo  crescimento  que  desloca  as  estruturas  vasculares,  e  não  as  invade.  Esse  tipo  é  geralmente</p><p>ressecável. O  outro  tipo  de CHC  é  o  infiltrativo,  que  tende  a  invadir  as  estruturas  vasculares mesmo  sendo um nódulo  de  tamanho pequeno.</p><p>Ressecar  o  tipo  infiltrativo  é  possível,  mas  é  comum  serem  encontradas  margens  histológicas  comprometidas.  Pequenos  tumores  (</p><p>transplante  e</p><p>ressecção, e provavelmente devem ser ressecados.78‑80</p><p>Várias outras terapias ablativas locais não cirúrgicas estão disponíveis para o tratamento de CHC. A injeção percutânea de etanol (IPE) é uma</p><p>técnica  útil  para  o  tratamento  de  pequenos  tumores.  O  tumor  é  eliminado  pela  combinação  de  desidratação  celular,  necrose  de  coagulação  e</p><p>trombose vascular. A maioria dos tumores menores que 2 cm pode ser eliminada com uma única aplicação de IPE, mas os tumores maiores podem</p><p>exigir várias injeções. A sobrevida em longo prazo após IPE para tumores com menos de 5 cm tem sido relatada como variando de 24% a 40%, mas</p><p>não há estudos randomizados comparando IPE com ressecção. A injeção percutânea de ácido acético é uma técnica semelhante à IPE, com poder</p><p>necrosante maior, sendo útil em tumores septados.</p><p>As  técnicas  termoablativas  térmicas que  congelam ou aquecem os  tumores para destruí‑los  tornaram‑se populares. A  crioterapia utiliza uma</p><p>criossonda especial para congelar e então derreter o  tumor e o  tecido circundante do  fígado,  resultando em necrose. A crioterapia geralmente é</p><p>realizada por laparotomia ou laparoscopia e, mais recentemente, tem sido realizada por técnicas percutâneas. Sua vantagem é que a coleta de gelo</p><p>que se forma é facilmente monitorada pela US. As desvantagens incluem hipotermia, limitando a utilização do congelamento próximo aos grandes</p><p>vasos sanguíneos, e um índice de complicação relativamente elevado, que vai de 8% a 41%. As taxas de sobrevida relatadas em dois anos para a</p><p>crioablação do CHC são de 30% a 60%, mas nenhum estudo comparativo para ressecção foi realizado. A ablação por radiofrequência (RFA) utiliza</p><p>corrente alternada de alta frequência para criar calor em torno de uma agulha inserida, resultando em temperaturas superiores a 60 °C (140 °F) e</p><p>morte  imediata da  célula. Embora  inicialmente utilizados para  tumores menores,  os  avanços na  tecnologia  têm criado RFAs  comprovadamente</p><p>capazes de tratar tumores medindo 7 cm; no entanto a eficácia da RFA para CHCs maiores que 3 cm é limitada por causa da maior taxa de recidiva</p><p>local. A RFA também é limitada pelo efeito protetor dos grandes vasos sanguíneos que dissipam a energia, não realizando uma boa ablação nestas</p><p>áreas. A RFA pode,  facilmente, ser realizada de  forma percutânea com índices muito baixos de complicação, e novas  técnicas de orientação das</p><p>punções estão  sendo desenvolvidas. Dados  recentes  sugerem que a  ressecção pode ser  superior à RFA para CHCs pequenos no que  se  refere a</p><p>sobrevida livre de doença e sobrevida global.81</p><p>A terapia transarterial para o CHC baseia‑se no fato de que a maior parte da vascularização do tumor vem da artéria hepática. Hoje a  terapia</p><p>transarterial é aplicada de forma percutânea, evitando, assim, a morbidade e a mortalidade da laparotomia. A embolização transarterial percutânea</p><p>pode  induzir  necrose  isquêmica  no  CHC,  resultando  em  taxas  de  resposta  de  até  50%  (Fig.  53‑37). As  tentativas  para  melhorar  a  eficácia  da</p><p>embolização arterial  incluem a adição de agentes quimioterápicos  (quimioembolização) às partículas de embolização mole e óleos,  como o óleo</p><p>etiodado  (Ethiodol®),  que  são  seletivamente  absorvidos  pelos  CHCs.82  Embora  a  quimioembolização  não  tenha  mostrado  ser  superior  à</p><p>embolização  simples  em  relação  à  sobrevida,  um  ensaio  sugeriu  melhora  no  controle  local  com  quimioembolização.83  Sete  estudos  aleatórios</p><p>compararam embolização ou quimioembolização para um tratamento conservador. Dois destes estudos e metanálise confirmaram a vantagem na</p><p>sobrevida geral das estratégias de embolização.84‑86 A seleção de candidatos apropriados para embolização é importante, e o tratamento deve ser</p><p>limitado  a  pacientes  com  função  hepática  preservada  e  tumores  multinodulares  assintomáticos  sem  invasão  vascular.  Uma  seleção  incorreta</p><p>resultará em maior incidência de insuficiência hepática induzida pelo tratamento, comprometendo os benefícios potenciais.</p><p>FIGURA 53­37  Angiogramas demonstrando hepatocarcinomas hipervasculares antes (A) e depois (B) da embolização.</p><p>A radioterapia externa (EBRT) exerce um papel limitado no tratamento do CHC, embora possam aparecer algumas respostas ocasionais. A EBRT</p><p>é limitada pela lesão ao parênquima normal do fígado e aos órgãos circundantes, mas os métodos mais recentes de radioterapia que respeitam as</p><p>bordas tumorais e as técnicas de barreira respiratória estão aumentando a utilidade desta modalidade de tratamento. As injeções intra‑arteriais de</p><p>iodo‑131 com lipiodol ou ítrio‑90 em microesferas de vidro têm sido utilizadas para centralizar a irradiação localizada para o CHC, com registros</p><p>de significativos índices de resposta. A radioterapia transarterial é uma terapia potencialmente promissora para o CHC como terapia primária ou</p><p>adjuvante.82</p><p>A  quimioterapia  sistêmica  com  uma  variedade  de  agentes  (p.  ex.,  cisplatina,  doxorrubicina,  etoposida,  5‑fluorouracil  (5‑FU),  mitomicina  C,</p><p>amsacrina, mitoxantrona, picibanil,  tamoxifeno, uracil, VM‑26) foi  ineficaz e tem tido um papel mínimo para o tratamento do CHC. As taxas de</p><p>resposta estão geralmente abaixo de 20% e têm curta duração. A imunoterapia sistêmica e a terapia hormonal foram utilizadas em um pequeno</p><p>número  de  pacientes  com CHC  com  alguns  resultados  iniciais  promissores, mas  é  necessário  um  estudo  posterior  para  definir  o  papel  dessas</p><p>terapias.</p><p>Mais  recentemente,  o  sorafenibe,  um  tratamento molecular  direcionado  que  inibe  as  serina‑treonina  quinases  Raf‑1  e  B‑Raf,  a  atividade  do</p><p>receptor de  tirosina quinase do  fator de  crescimento endotelial vascular 1,  2  e 3  e o  fator de  crescimento derivado de plaquetas‑β,  foi  avaliado.</p><p>Llovet et al.87 analisaram 599 pacientes  aleatoriamente  com  estágio  avançado de CHC  e  nível  de  cirrose Child‑Pugh A para  sorafenibe  oral  ou</p><p>placebo. A média de sobrevida global foi 10,7 meses no grupo sorafenibe e 7,9 meses no grupo placebo (P</p><p>do  seu  estado de  desempenho  e  da  sua  função  hepática,  é  pouco  provável  que  qualquer modalidade de</p><p>tratamento forneça benefício significativo, portanto deve‑se oferecer a estes pacientes apenas tratamento de suporte.</p><p>Variantes distintas de CHC</p><p>O CHC fibrolamelar88 (CHCF) é uma variante do CHC com características clínicas extremamente diferentes, resumidas na Tabela 53‑8. Esse tumor</p><p>geralmente ocorre em pacientes mais jovens, sem história de cirrose. Em geral o tumor é bem delimitado, encapsulado e pode ter uma área fibrótica</p><p>central. A mácula central pode dificultar a distinção entre este tumor e a HNF. Histologicamente, o CHCF é composto de grandes células tumorais</p><p>poligonais envolvidas em um estroma fibroso, formando estruturas lamelares (Fig. 53‑38). O CHCF não produz AFP, mas está associado a níveis</p><p>elevados  de  neurotensina.  Em  geral,  o  CHCF  tem  um  prognóstico  melhor  que  o  CHC,  provavelmente  relacionado  com  elevadas  taxas  de</p><p>ressecabilidade, ausência de doença hepática crônica e um curso mais indolente. A sobrevida em longo prazo pode ser esperada em cerca de 50% a</p><p>75% dos pacientes após ressecção completa, mas a recidiva é comum e ocorre em pelo menos 80% dos pacientes. A presença de metástases para</p><p>linfonodos prediz um pior prognóstico. A ressecção de metástases linfonodais e da doença recidivada tem sido defendida em razão da ausência de</p><p>uma terapia alternativa e da possibilidade de sobrevida em longo prazo. Um estudo identificou um transcrito quimérico que é expresso no CHC</p><p>fibrolamelar, mas não no figado adjacente normal.89 O estudo também sugeriu que esse transcrito codifica uma proteína quimérica que contém o</p><p>domínio  catalítico  de  proteína  cinase  A,  sugerindo,  assim,  que  este  ganho  de  atividade  de  cinase  pode  ter  um  papel  na  patogênese  do  CHC</p><p>fibrolamelar. A elucidação destes novos processos pode levar ao desenvolvimento de novas terapias dirigidas contra esta doença que normalmente</p><p>afeta pessoas jovens e saudáveis.</p><p>Tabela 53­8</p><p>Comparação do Padrão de Carcinoma Hepatocelular e Carcinoma Hepatocelular Fibrolamelar</p><p>PARÂMETRO CHC CHC FIBROLAMELAR</p><p>Razão homem‑mulher 2:1‑8:1 1:1</p><p>Idade média 55 anos 25 anos</p><p>Tumor Invasivo Bem circunscritos</p><p>Ressecabilidade</p><p>é o tumor hepático primário mais comum em crianças. Existem aproximadamente 50 a 70 novos casos/ano nos Estados Unidos.</p><p>Foram documentados raros casos de hepatoblastoma em adultos, mas, em geral, a média da idade de manifestação é de 18 meses e quase todos os</p><p>casos ocorrem antes dos três anos. O hepatoblastoma foi associado à síndrome de polipose familiar. Existem vários subtipos histológicos, mas, na</p><p>maioria dos casos, o tumor é originário dos hepatócitos fetais ou embriônicos e sempre existem elementos mesenquimatosos presentes. Esse tumor</p><p>geralmente se apresenta como uma massa assintomática. A trombocitose e a anemia leve são comumente encontradas quando do diagnóstico. Os</p><p>níveis  de AFP  séricos  estão  elevados  em  85%  a  90% dos  pacientes  e  podem  servir  como marcadores  importantes  para  resposta  terapêutica. A</p><p>maioria dos estudos apoia o uso da quimioterapia seguida da ressecção, e a sobrevida parece depender da ressecção completa. A quimioterapia</p><p>pode  ser  útil  para  reduzir  o  estágio  dos  tumores,  facilitando  a  ressecção.  Nos  pacientes  sem  doença  metastática  ou  naqueles  com  a  variante</p><p>anaplásica, podem ser  esperados  índices de  sobrevida  longos, de 60% a 70%,  com a  ressecção  completa. Curiosamente,  50% dos pacientes  com</p><p>metástase pulmonar podem ser curados com ressecção do tumor hepático e quimioterapia ou ressecção da metástase pulmonar.</p><p>Os sarcomas raramente podem‑se manifestar como tumores primários do fígado e devem sempre ser considerados lesões metastáticas até prova</p><p>em  contrário.  É  provável  que  o  angiossarcoma  seja  o  sarcoma hepático  primário mais  bem documentado devido  à  sua  conhecida  associação  à</p><p>exposição ao cloreto de vinil ou ao Thorotrast®. O angiossarcoma geralmente se manifesta como múltiplos nódulos hepáticos e pode ocorrer na</p><p>infância. A sobrevida tardia é rara no angiossarcoma hepático primário. Outros sarcomas, incluindo leiomiossarcoma, histiocitoma fibroso maligno,</p><p>sarcoma embrionário e  tumores  rabdoides hepáticos primários  foram descritos, mas  são  raros. As duas últimas  lesões  são geralmente vistas na</p><p>população pediátrica.</p><p>O linfoma não Hodgkin pode‑se manifestar primariamente no fígado, com ou sem doença extra‑hepática. O linfoma hepático primário deve ser</p><p>tratado da mesma maneira como o linfoma em outras partes do corpo, se o diagnóstico puder ser feito antes da ressecção.</p><p>Os tumores neuroendócrinos hepáticos primários ou tumores carcinoides têm sido descritos. Distinguir o raro tumor neuroendócrino hepático</p><p>primário de uma  lesão metastática pode  ser  uma  tarefa difícil,  porque  o  tumor primário  extra‑hepático pode ficar  radiologicamente  oculto  e  o</p><p>fígado é o sítio mais comum para metástases.</p><p>Os tumores de células malignas germinais do fígado, incluindo os teratomas, os coriocarcinomas e os tumores do saco vitelino, são muito raros e</p><p>estão presentes sobretudo na população pediátrica.</p><p>O hemangioendotelioma epitelioide do fígado é um tumor vascular maligno raro que se manifesta como múltiplos nódulos hepáticos bilaterais.</p><p>Metástases  extra‑hepáticas  ocorrem  em  aproximadamente  25%  dos  pacientes  e  o  comportamento  clínico  é  imprevisível,  com  alguns  pacientes</p><p>apresentando um curso indolente prolongado. A maioria dos pacientes acaba morrendo de insuficiência hepática, mas foram registrados casos de</p><p>transplantes bem‑sucedidos.</p><p>Tumores Metastáticos</p><p>Os  tumores  malignos  mais  comuns  do  fígado  são  as  lesões  metastáticas.  O  fígado  é  um  sítio  comum  de  metástases  oriundas  dos  tumores</p><p>gastrointestinais, provavelmente devido à disseminação pelo sistema venoso portal. Para o cirurgião, o tumor metastático mais relevante do fígado</p><p>é o câncer colorretal, devido ao potencial para a ressecção curativa, no entanto um grande número de outros tumores comumente se metastatizam</p><p>para o fígado, incluindo cânceres do sistema gastrointestinal superior (estômago, pâncreas, biliar), sistema genitourinário (rim, próstata), sistema</p><p>neuroendócrino,  mama,  globo  ocular  (melanoma),  pele  (melanoma),  tecidos  moles  (sarcoma  retroperitoneal)  e  sistema  ginecológico  (ovário,</p><p>endométrio,  colo  do  útero).  A  maioria  dos  tumores  hepáticos  metastáticos  que  apresentam  doença  extra‑hepática  concomitante  terá  doença</p><p>hepática irressecável ou não será curável com a ressecção, limitando o papel do cirurgião ao de selecionador de casos. Adenocarcinoma metastático</p><p>no fígado de origem desconhecida é frequentemente um CIH primário, e esse diagnóstico deve sempre ser considerado.</p><p>Tradicionalmente, o carcinoma que se dissemina para um local distante foi considerado uma doença sistêmica na qual  terapias  locorregionais</p><p>(p. ex., cirurgia) não são eficazes. Alguns tumores metastáticos para o fígado, em particular o câncer colorretal metastático, têm demonstrado ser</p><p>uma exceção a esta regra. Após mais de 35 anos de pesquisa clínica, foi documentado que o câncer colorretal metastático isolado no fígado pode ser</p><p>ressecado, com potencial de sobrevida em longo prazo e mesmo cura.96‑98 Os avanços da quimioterapia sistêmica e regional também têm ampliado</p><p>o número de pacientes passíveis de serem tratados por terapia cirúrgica e provavelmente também têm melhorado a sobrevida em longo prazo após</p><p>uma  ressecção.99  A  seleção  do  paciente  é  o  aspecto  mais  importante  da  terapia  cirúrgica  para  a  doença  metastática  no  fígado,  e,  no</p><p>acompanhamento clínico dos pacientes ressecados, foram identificados aqueles que teriam mais probabilidade de se beneficiar. Embora a sobrevida</p><p>em  longo  prazo  seja  comum  e  ocorra  em  até  50%  a  60%  dos  pacientes  nas  séries  atuais,  as  reocorrências  e  a  terapia multimodal  são  comuns,</p><p>ocorrendo  em aproximadamente  75% dos pacientes. Então,  expectativas  realistas  e  informação  sincera  ao paciente  são  importantes  aspectos do</p><p>tratamento. Outros tumores que se manifestam como metástase hepática isolada também podem ser ressecados com cura potencial, mas os dados</p><p>sobre estes outros tumores são esparsos e menos convincentes do que para o câncer colorretal.</p><p>Metástase Colorretal</p><p>Existem  mais  de  50.000  casos  de  metástases  hepáticas  colorretais  por  ano  nos  Estados  Unidos.  A  maioria  dos  casos  está  associada  a  doença</p><p>disseminada ou doença hepática não ressecável. Estima‑se que aproximadamente 5% a 10% desses pacientes sejam candidatos à ressecção hepática</p><p>potencialmente curativa. Com taxas de melhora na resposta à quimioterapia moderna e avanços na cirurgia hepática, no entanto, mais pacientes no</p><p>presente momento  são  candidatos  à  hepatectomia  do  que  no  passado;  atualmente,  até  20%  dos  pacientes  podem  ser  candidatos.  No  passado</p><p>distante, portadores de metástases  colorretais hepáticas geralmente manifestavam sintomas e  sinais de malignidade avançada  como dor,  ascite,</p><p>icterícia, perda de peso e massa palpável. A apresentação com estes sintomas é sinal de mau prognóstico; poucos desses pacientes são candidatos à</p><p>terapia  além  de  quimioterapia  ou  cuidado  paliativo.  Isto  levou  muitos  profissionais  a  acompanhar  cuidadosamente  os  pacientes  com  câncer</p><p>colorretal primário ressecado que são potencialmente candidatos à terapia agressiva, com exame físico seriado e estudos por imagem, TFHs e níveis</p><p>de CEA. Embora não com o apoio por parte de ensaios randomizados, observações clínicas indicaram que pacientes cuidadosamente observados</p><p>com  exames  físicos  seriados,  exames  de  imagem  multicorte,  TFHs  e  determinação  dos  níveis  de  CEA  muitas  vezes  têm  doença  metacrônica</p><p>ressecável  e  maior  potencial  para  sobrevida  em  longo  prazo.  Além  destes  pacientes,  descobriu‑se  que  alguns  apresentam  doença  metastática</p><p>sincrônica no momento do diagnóstico de câncer colorretal primário na imagem pré‑operatória ou na laparotomia.100</p><p>Embora o CEA elevado não seja específico para a  recidiva do câncer colorretal, o  seu aumento em exames seriados e a detecção de um novo</p><p>nódulo sólido nos</p><p>estudos de imagem são diagnósticos de doença metastática. Os TFHs elevados são comuns no carcinoma colorretal metastático</p><p>no fígado, mas não são eficazes como ferramenta de rastreamento. Os níveis mais  frequentemente elevados são os de FA, GGT e desidrogenase</p><p>lática. A imagem das metástases hepáticas com TC ou RM de alta qualidade é importante para determinar a ressecabilidade e fazer o planejamento</p><p>cirúrgico. A maioria dos médicos usa cortes finos (5 mm) de alta resolução,  técnicas helicoidais contrastadas dinâmicas. As imagens são obtidas</p><p>com contraste venoso na fase venosa portal para maximizar o realce do parênquima hepático, o que aumenta a diferença entre o parênquima e o</p><p>tumor.</p><p>Quando um paciente com metástases hepáticas colorretais é considerado um candidato para terapia cirúrgica, deve ser realizada uma completa</p><p>investigação  da  doença.  A  colonoscopia  deve  ser  realizada  caso  tenha mais  de  um  ano  desde  o  último  exame  para  afastar  a  possibilidade  de</p><p>recorrência  local  ou  lesões  colorretais  metacrônicas.  Devem  ser  obtidas  imagens  completas  do  abdome  e  da  pelve.  TC  do  tórax  geralmente  é</p><p>realizada, mas é de baixo rendimento. Muitos estudos avaliaram o benefício adicional da tomografia por emissão de pósitrons (PET) em detectar</p><p>doença extra‑hepática oculta. Cerca de 25% dos pacientes  sofrem alteração no  seu  tratamento com base nos achados da PET scan,  porém  isso  é</p><p>altamente variável, dependendo da qualidade da imagem seccional e da seleção do paciente (Fig. 53‑39).Foi publicado um ensaio randomizado de</p><p>PET/TC versus TC em pacientes com metástases hepáticas colorretais potencialmente ressecáveis.101 Neste ensaio, o uso de PET/TC não resultou em</p><p>alterações significativas do tratamento cirúrgico e não houve diferença na ressecabilidade ou nos resultados em longo prazo entre os dois grupos.</p><p>Este ensaio fornece evidência definitiva de que o uso rotineiro da PET não afeta de modo significativo os resultados entre pacientes com metástases</p><p>hepáticas de câncer colorretal potencialmente ressecáveis. Com o uso da laparoscopia de estadiamento, 10% dos pacientes são poupados de uma</p><p>laparotomia não terapêutica, e o rendimento da  laparoscopia correlaciona‑se com o número de  fatores prognósticos ruins presentes, permitindo</p><p>que seja usada de maneira seletiva.</p><p>FIGURA 53­39  PET em um paciente diagnosticado com câncer colorretal metastático sincronicamente no fígado após ressecção do tumor</p><p>do cólon. A tomografia demonstra atividade hipermetabólica por todo o fígado, mas também mostra duas áreas no quadrante superior</p><p>esquerdo compatíveis com uma lesão omental, bem como uma recorrência anastomótica. A TC recente demonstrou apenas doença</p><p>hepática. (De Akhurst T, Larson SM: The role of nuclear medicine in the diagnosis and management of hepatobiliary diseases. In Blumgart LH, Fong Y,</p><p>editors: Surgery of the liver and biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 271–308.)</p><p>Até agora, um estudo prospectivo comparando cirurgia sem tratamento ou quimioterapia isoladamente não foi realizado, nem é provável que o</p><p>seja.  Então,  a  razão  para  a  ressecção  hepática  vem  de  comparações  retrospectivas  entre  estas  estratégias  de  tratamento.  O  cirurgião  tem  que</p><p>compreender  a  história  natural  das metástases  hepáticas  do  câncer  colorretal  que  são deixadas  sem  tratamento  ou  tratadas  com quimioterapia</p><p>sistêmica com o objetivo de  interpretar de  forma correta os dados de  sobrevida associados à hepatectomia. Antes dos anos 1980, a maioria das</p><p>metástases hepáticas  era deixada  sem  tratamento. Dois  estudos  importantes  identificaram,  retrospectivamente, pacientes  com metástases únicas</p><p>isoladas e/ou tumores múltiplos, mas ressecáveis, que não receberam tratamento. Um estudo mostrou sobrevida de 10% em três anos e o outro, de</p><p>2% em cinco anos para pacientes com doença limitada e potencialmente ressecável. Esses estudos deixaram claro que a sobrevida em longo prazo é</p><p>extremamente  rara  sem  tratamento  e  também está  estreitamente  relacionada  com o volume de doença no  fígado. No passado,  a  quimioterapia</p><p>sistêmica baseada no 5‑FU foi extremamente ineficaz como terapia única para metástases colorretais hepáticas, com sobrevida média de cerca de 12</p><p>meses e índices parciais de resposta de 20% a 30%. Os avanços importantes na quimioterapia sistêmica para metástases de câncer colorretal estão</p><p>sendo  alcançados  atualmente.  A  quimioterapia  de  combinação,  incluindo  5‑FU  com  irinotecan  ou  oxaliplatina  combinada  com  anticorpos</p><p>direcionados antiangiogênicos como bevacizumabe (anticorpo antifator de crescimento endotelial vascular) ou cetuximabe (anticorpos de fator de</p><p>crescimento  antiepidermal),  agora  resultou  em  taxas  de  resposta  de mais  de  50%  e  sobrevida média  de  20 meses  ou mais  para  pacientes  com</p><p>doença avançada.97 Embora a sobrevida e as taxas de respostas tenham melhorado, um resultado consistente durável e a sobrevida de cinco anos</p><p>são achados raros com a administração de quimioterapia isolada.</p><p>As hepatectomias parciais esporádicas  realizadas para  tratar o  câncer  colorretal metastático antes da década de 1980 eram vistas  com grande</p><p>ceticismo. A elevada morbimortalidade da cirurgia hepática naquela época e a razão questionável para a ressecção das metástases hematogênicas</p><p>eram os  pontos  principais. Durante  os  últimos  30  anos,  grandes  séries mostraram que  a  cirurgia  do  fígado pode  ser  praticada  com um  índice</p><p>aceitável de segurança e que os pacientes com metástase isolada ou metástases ressecáveis têm potencial para sobrevida mais longa. Os índices de</p><p>sobrevida  em  cinco  anos  vão  de  25%  a  58%.  Também  há  uma  clara  tendência  de  sobrevida  maior  nas  séries  mais  recentes  (Tabela  53‑9).  A</p><p>mortalidade peroperatória em centros experientes é consistentemente inferior a 5% e em muitas séries atuais é inferior a 2%. Quase todos mostram</p><p>que quase 50% dos pacientes submetidos à ressecção hepática por câncer colorretal metastático sobreviverão por três anos e 20% sobreviverão por</p><p>10  anos.  Apesar  da  baixa mortalidade,  a  cirurgia  do  fígado  está,  ainda,  associada  a  índices  significativos  de morbidade  de  30%  a  50%.102  As</p><p>intercorrências mais comuns são sangramento, fístula biliar, abscesso e complicações cardiorrespiratórias. Com melhorias na quimioterapia, uma</p><p>proporção maior  de  pacientes  submetidos  à  hepatectomia  tem  sido  tratada  pré‑operatoriamente,  no  entanto  alguns  estudos mostraram  que  a</p><p>quimioterapia  pré‑operatória  está  associada  a  toxicidade  hepática  (esteatose  e  síndrome  obstrutiva  sinusoidal)  e  taxas  mais  elevadas  de</p><p>insuficiência hepática pós‑operatória.</p><p>Tabela 53­9</p><p>Resultados da Ressecção Hepática por Metástase Colorretal*</p><p>ESTUDO</p><p>N° DE</p><p>PACIENTES</p><p>TAXA DE MORTALIDADE</p><p>OPERATÓRIA (%)</p><p>TAXA DE</p><p>SOBREVIDA (%)</p><p>SOBREVIDA</p><p>MÉDIA (MO)</p><p>1</p><p>ANO</p><p>5</p><p>ANOS</p><p>10</p><p>ANOS</p><p>Adson, 1984 141 2 82 25 – 24</p><p>Hughes, 1986 607 – – 33 – –</p><p>Schlag, 1990 122 4 85 30 – 32</p><p>Doci, 1991 100 5 – 30 – 28</p><p>Gayowski, 1994 204 0 91 32 – 33</p><p>Scheele, 1995 469 4 83 33 20 40</p><p>Fong, 1995 577 4 85 35 – 40</p><p>Jenkins, 1997 131 4 81 25 – 33</p><p>Rees, 1997 150 1 94 37 –</p><p>Jamison, 1997 280 4 84 27 20 33</p><p>Fong, 1999 1.001 3 89 37 22 42</p><p>Minagawa, 2000 235 0 – 35 26 37</p><p>Scheele, 2000 597 – – 36 – 35</p><p>Choti, 2002 226 1 – 40† 26 46</p><p>Abdalla, 2004 190 – – 58 – Não atingido</p><p>Nicoli, 2004 228 0,9 16 9</p><p>Andrés, 2008 210 0,5 95 40 – –</p><p>de Jong, 2009 243 – – 47 – 36</p><p>House, 2010 1.600</p><p>1985‑1998 1.037 2,5 – 35 16 43</p><p>1999‑2004 563 0,5 – 43 – 64</p><p>Faitot, 2014‡ 272</p><p>Estágio um 155 3 85 35 37,2</p><p>Estágio dois 117 4 82 49 34,5</p><p>Saxena, 2014 701 2 86 33 20 35</p><p>Marques, 2012§ 676</p><p>Quimioterapia pré‑</p><p>operatória‖</p><p>334 3,9 91 43</p><p>Sem quimioterapia</p><p>pré‑operatória</p><p>342 3,4 93 55</p><p>* Em séries selecionadas com mais de 100 pacientes.</p><p>† A taxa de sobrevida em cinco anos nos pacientes operados no período mais atual neste estudo foi de 58%.</p><p>‡ Resultados em longo prazo de hepatectomia</p><p>em dois estágios versus hepatectomia em apenas um estágio usada em combinação com abordagens de ablação.</p><p>§ Dados combinados de dois centros hepatobiliares, dados analisados com respeito à realização ou não de quimioterapia pré­operatória.</p><p>‖ Número de tumores mais elevado no grupo da quimioterapia pré­operatória (2,8 ± 2,2) em comparação com aqueles sem terapia pré­operatória (1,8 ± 1,6)</p><p>Com estas grandes séries, aprendemos muito sobre os  fatores prognósticos, bem como verificamos que os pacientes  são mais  suscetíveis a  se</p><p>beneficiarem da ressecção hepática por metástase colorretal. Embora nem todos os estudos concordem, verificou‑se que fatores de mau prognóstico</p><p>incluem metástases extra‑hepáticas, linfonodos envolvidos com o tumor colorretal primário, apresentação sincrônica (ou intervalo livre de doença</p><p>mais curto), maior número de tumores, comprometimento bilobar, nível de elevação do CEA de mais de 200 ng/mL, tamanho do tumor hepático</p><p>superior  a  5  cm  e  margens  histológicas  comprometidas.  Em  uma  série  de  1.001  ressecções  hepáticas  do  MSKCC,  uma  análise</p><p>multivariável103 identificou cinco fatores pré‑operatórios como mais influentes no resultado – tamanho maior que 5 cm, intervalo livre de doença</p><p>inferior  a  um  ano,  mais  de  um  tumor,  linfonodo  positivo  primário  e  nível  de  CEA  superior  a  200  ng/mL.  Utilizando  estes  cinco  fatores,</p><p>desenvolvemos um escore de risco que prevê a recidiva após a ressecção do fígado (Tabela 53‑10).</p><p>Tabela 53­10</p><p>Escore de Risco Clínico e Sobrevida de 1.001 Pacientes Submetidos à Ressecção Hepática por</p><p>Câncer Colorretal Metastático*</p><p>PONTUAÇÃO</p><p>TAXA DE SOBREVIDA (%)</p><p>SOBREVIDA MÉDIA (MO)1 ANO 3 ANOS 5 ANOS</p><p>0 93 72 60 74</p><p>1 91 66 44 51</p><p>2 89 60 40 47</p><p>3 86 42 20 33</p><p>4 70 38 25 20</p><p>5 71 27 14 22</p><p>* Cada um dos cinco fatores de risco seguintes equivale a um ponto: linfonodos positivos primário, intervalo livre de doença  1 tumor, tamanho > 5 cm, nível</p><p>de antígeno carcinoembrionário > 200 ng/mL. Pontuação é o número total de pontos em um paciente individual.</p><p>Adaptada de Fong Y, Fortner J, Sun RL, et al: Clinical score for predicting recurrence after hepatic resection for metastatic colorectal cancer: Analysis of 1001</p><p>consecutive cases. Ann Surg 230:309–318, 1999.</p><p>Tradicionalmente,  a  presença  de  doença  extra‑hepática,  quatro  ou mais metástases  hepáticas, margens  exíguas  e  incapacidade  de  ressecar  a</p><p>doença por completo no fígado têm sido consideradas contraindicações à hepatectomia. A única destas contraindicações históricas que permanece</p><p>atualmente  é  a  incapacidade de  ressecar toda  a  doença.  Relatos  recentes  têm mostrado  que  a  hepatectomia  de  quatro  ou mais metástases  está</p><p>associada  a  uma  sobrevida  de  aproximadamente  cinco  anos  em  33%  dos  pacientes,  apesar  das  altas  taxas  de  recidivas.  Ainda  que  a margem</p><p>cirúrgica exígua tenha se mostrado associada ao resultado, é frequentemente confundida por sua relação com o mau prognóstico geral do tumor</p><p>(i.e., tumores sincrônicos múltiplos);104 no entanto o envolvimento das margens não parece excluir a possibilidade de sobrevida em longo prazo,</p><p>mas pacientes com margens positivas tendem a evoluir mal. Tentativas de se obterem margens amplas com mais de 1 cm são apropriadas, todavia,</p><p>quando  possível.105  A  ressecção  de  metástases  extra‑hepáticas  que  se  apresentam  simultaneamente  com  metástases  hepáticas  mostrou  estar</p><p>associada à sobrevida em longo prazo em casos altamente selecionados.106 Os locais que parecem estar associados aos melhores resultados nesta</p><p>situação  são  metástases  pulmonares  limitadas,  recorrências  locorregionais  do  tumor  primário  e  linfonodos  portais.  Estes  resultados  foram</p><p>posteriormente confirmados em uma metanálise de 50 estudos incluindo 3.481 pacientes com metástases hepáticas colorretais com doença extra‑</p><p>hepática.107 A seleção do paciente é importante e geralmente requer quimioterapia pré‑operatória para excluir a evolução e estabelecer o controle</p><p>do quadro sistêmico da doença.</p><p>Embora a sobrevida tardia após a ressecção hepática por metástase colorretal seja claramente possível, a recidiva da doença é muito comum. Em</p><p>geral,  há  recorrência  em  aproximadamente  75%  dos  pacientes, mas,  em  situações  de  alto  risco  (p.  ex.,  quatro  ou mais  tumores,  doença  extra‑</p><p>hepática), as taxas de recidiva se aproximam de 100%. Cerca da metade das recidivas se assesta isoladamente no fígado e poucos destes pacientes</p><p>(cerca de 5% de todos os que se submetem à ressecção hepática) são candidatos a uma segunda ressecção. Estes pacientes altamente selecionados</p><p>que passam por uma segunda ressecção do fígado com completa remoção de toda a doença podem esperar maiores índices de sobrevida em cinco</p><p>anos, variando de 30% a 40%. As recidivas pulmonares limitadas e isoladas também podem ser ressecadas com potencial de maior sobrevida em</p><p>longo  prazo.  Além  disso,  múltiplas  linhas  eletivas  de  quimioterapia  agora  estão  disponíveis,  associadas  ao  prolongamento  da  sobrevida.  Em</p><p>virtude do potencial para futuras intervenções terapêuticas efetivas após a ressecção hepática, os pacientes selecionados para tal tratamento devem</p><p>ser  acompanhados  com  determinações  no  nível  de  CEA  seriadas  e  estudos  de  imagem  para  detectar  recorrência  em  uma  fase  precoce,</p><p>potencialmente tratável.</p><p>A  quimioterapia  adjuvante  tem  sido utilizada  como uma  tentativa de  reduzir  a  recorrência  e melhorar  a  sobrevida  em  longo prazo.  Ensaios</p><p>clínicos  randomizados prospectivos  têm mostrado um benefício da quimioterapia  intra‑arterial hepática  adjuvante, no  entanto os  resultados de</p><p>ensaios controlados randomizados sobre o benefício da quimioterapia sistêmica adjuvante após ressecção das metástases hepáticas divergem. Em</p><p>um ensaio randomizado multicêntrico, Portier et al.108 randomizaram 173 pacientes para ressecção hepática isolada (87 pacientes) ou para ressecção</p><p>hepática com quimioterapia adjuvante (5‑FU‑ácido folínico) durante seis meses (86 pacientes). Embora este regime de quimioterapia já não seja o</p><p>padrão,  a  taxa de  sobrevida  livre de doença  em  cinco  anos  foi  de  26,7% para pacientes  que  foram  submetidos  a  cirurgia  isolada  e  33,5% para</p><p>aqueles que fizeram cirurgia mais quimioterapia (P = 0,028). Uma tendência não significativa no sentido da melhoria da sobrevida global também</p><p>foi  observada no  braço da  quimioterapia. Os  resultados deste  ensaio  foram  agrupados  com outro  ensaio  de  fase  3  que  não  foi  concluído.  Esta</p><p>análise  conjunta  falhou  em mostrar  uma melhora  estatisticamente  significativa  na  sobrevida  livre  de  progressão  ou  sobrevida  global.109 Nesta</p><p>análise, havia  278 pacientes  (138 no braço da  cirurgia  com quimioterapia  e  140 no braço da  cirurgia  isolada). A mediana da  sobrevida  livre de</p><p>progressão  foi de 27,9 meses no braço da quimioterapia em comparação com 18,8 meses no braço da cirurgia  (razão de risco, 1,32;  intervalo de</p><p>confiança de 95% [IC95%], 1‑1,76; P = 0,058). A mediana da sobrevida global foi de 62,2 meses no braço da quimioterapia em comparação com 47,3</p><p>meses no braço da cirurgia (razão de risco, 1,32; 95% IC95%, 0,95‑1,82; P = 0,095).109 A quimioterapia adjuvante foi independentemente associada a</p><p>sobrevida livre de progressão e sobrevida global numa análise multivariada.</p><p>Em outro ensaio controlado randomizado multicêntrico (European Organization for Research and Treatment and Cancer, ensaio EORTC 40983),</p><p>Nordlinger  et  al.  randomizaram  364  pacientes  em  dois  grupos;  182  pacientes  foram  tratados  com  cirurgia  isolada  e  182  fizeram  cirurgia  com</p><p>quimioterapia sistêmica.110 Três ciclos de quimioterapia sistêmica com 5‑FU–ácido fólico mais oxaliplatina (FOLFOX4) foram administrados no pré‑</p><p>operatório e pós‑operatório no grupo de quimioterapia. Entre os pacientes selecionados após a aleatorização, a taxa de sobrevida livre da doença</p><p>em três anos foi de 28,1% no grupo com cirurgia isolada</p><p>e 36,2% no grupo com cirurgia e quimioterapia (P = 0,041). Quando os pacientes foram</p><p>analisados globalmente, não houve diferença significativa no resultado. Foram reportados os resultados em longo prazo deste ensaio, sendo que</p><p>não foi observada diferença na sobrevida global com a inclusão da quimioterapia.111 Embora este ensaio forneça evidência de que a quimioterapia</p><p>sistêmica  perioperatória  pode  postergar  a  recorrência  da  doença,  existe  pouca  diferença  na  recorrência  em  fases  mais  tardias.  Além  disso,  o</p><p>benefício da quimioterapia adjuvante pode estar relacionado com melhor seleção dos pacientes. Em resumo, há evidências clínicas de nível 1 de que</p><p>a  quimioterapia  sistêmica  adjuvante,  quando  combinada  com  a  ressecção  hepática, melhora modestamente  a  sobrevida  livre  da  progressão  da</p><p>doença em pacientes com metástases hepáticas colorretais.</p><p>A quimioterapia neoadjuvante para metástases ressecáveis é também uma estratégia comum para tratar doença sistêmica oculta e pode ser útil</p><p>na  seleção  de  um  pequeno  grupo  de  pacientes  (</p><p>tecidos  moles,  Wilms,  melanoma  ocular,  gastrointestinais  superiores  (estômago,  pâncreas,  esôfago,  vesícula  biliar),  adrenocortical,  tumores</p><p>urológicos  (bexiga,  célula  renal,  próstata,  testículo)  e  tumores  ginecológicos  (útero,  colo  do  útero,  ovário).  Alguns  princípios  gerais  devem  ser</p><p>considerados  no  manejo  destes  tumores,  pois  o  comportamento  das  metástases  isoladas  no  fígado  é  semelhante  àquele  do  câncer  colorretal</p><p>metastático. O prognóstico tende a ser sombrio se houver doença extra‑hepática, tumores múltiplos, tumores volumosos ou um pequeno intervalo</p><p>livre de doença, de modo que os pacientes necessitam ser cuidadosamente selecionados para a cirurgia com base nestes fatores.</p><p>Embora  existam  alguns  raros  registros  de  sobrevida  tardia  após  a  ressecção  das  metástases  isoladas  do  fígado  a  partir  de  tumores</p><p>gastrointestinais do trato superior, geralmente estes pacientes têm um prognóstico sombrio e a ressecção hepática não é recomendada. Na maioria</p><p>das  séries,  a  ressecção  de metástases  hepáticas  de  tumores  genitourinários  tem  o melhor  prognóstico  e,  para  pacientes  bem  selecionados,  esta</p><p>ressecção deve ser considerada. Pacientes com tumor de mama, melanoma e sarcoma raramente se apresentam com metástases isoladas no fígado</p><p>e, com um intervalo livre da doença prolongada e/ou longa estabilidade na quimioterapia, a ressecção hepática deve ser considerada. Em geral, a</p><p>ressecção hepática para os tumores metastáticos não colorretais e não neuroendócrinos tem de ser considerada e só deve ser utilizada nas situações</p><p>mais favoráveis (ver anteriormente). A ressecção hepática também pode ser uma terapia eficaz para tumores sintomáticos em pacientes que tenham</p><p>uma razoável expectativa de vida e nenhuma outra terapia eficaz.</p><p>Neoplasias Císticas</p><p>Cistos Simples</p><p>Os cistos simples do fígado contêm líquido seroso, não se comunicam com a árvore biliar e não apresentam septações. Em geral, eles são esféricos</p><p>ou  ovoides  e  podem  chegar  ao  tamanho  de  20  cm.  Podem  comprimir  o  fígado  normal,  induzindo  à  atrofia  regional  e,  às  vezes,  à  hipertrofia</p><p>compensatória. Em 50% dos casos os cistos são únicos. Histologicamente, uma única camada de células cuboides ou colunares sem atipia alinha</p><p>esses cistos. Na maioria dos casos, os cistos simples são considerados malformações congênitas.</p><p>Cistos  simples  são  achados  relativamente  comuns  em  adultos,  sendo,  principalmente,  descobertas  radiológicas  assintomáticas  incidentais.</p><p>Eventualmente, um cisto volumoso causará sintomas. Embora a TC mostre relações anatômicas, a US é o melhor exame para confirmar um cisto</p><p>único  simples  de  parede  fina.  A  doença  hidática,  o  cistadenoma  e  o  tumor  neuroendócrino metastático  são  os  diagnósticos  diferenciais  mais</p><p>importantes a se considerar. Uma parede espessa ou nodular levanta a suspeita de um cistadenoma, mas também pode representar hemorragia no</p><p>interior do cisto. A complicação mais comum é o sangramento intracístico, mas em geral ele é raro. O tratamento dos cistos hepáticos simples só</p><p>está indicado se eles forem sintomáticos ou existir suspeita diagnóstica. Como muitos cistos são assintomáticos, deve ser realizada uma avaliação</p><p>completa  da  etiologia  dos  sintomas  antes  de  atribuí‑los  ao  cisto.  O  tratamento  não  cirúrgico  consiste  na  aspiração  e  injeção  de  um  agente</p><p>esclerosante. Poucos estudos têm documentado o acompanhamento em longo prazo da escleroterapia para cistos hepáticos. A terapia cirúrgica é</p><p>realizada pela fenestração ou extirpação da porção do cisto que é extra‑hepática, o que pode ser realizado na laparotomia com bons resultados em</p><p>longo prazo ou por meio de abordagens laparoscópicas. Esta última abordagem é a de preferência atual, mas a eficácia em longo prazo não tem</p><p>sido comprovada.120 Uma metanálise incluindo nove estudos de caso‑controle retrospectivos envolvendo 657 pacientes comparando a fenestração</p><p>laparoscópica  com a  abordagem aberta demonstrou que  a  abordagem  laparoscópica  foi  associada  a menor  tempo operatório, menor  tempo de</p><p>internação e menos perda de sangue operatória, sem diferenças nas taxas de recidiva do cisto.121</p><p>Cistadenoma e Cistadenocarcinoma</p><p>O cistadenoma do fígado é uma neoplasia rara que geralmente se apresenta como uma massa cística volumosa, geralmente de 10 a 20 cm. O cisto</p><p>tem uma superfície externa globular com múltiplos cistos e lóculos de vários tamanhos. O fluido contido nesses cistos quase sempre é mucinoso.</p><p>Microscopicamente, as células cuboides ou colunares atípicas repousam sobre uma membrana basal, com estroma do tipo ovariano, alinhando os</p><p>cistos. O epitélio geralmente forma projeções polipoides ou papilares.</p><p>O cistadenoma do fígado afeta sobretudo as mulheres acima de 40 anos. Embora muitos cistadenomas sejam assintomáticos, os sintomas podem</p><p>incluir dor abdominal, anorexia, náusea e distensão abdominal. Na maioria dos casos, o diagnóstico é suspeitado por uma combinação de imagens</p><p>de cortes seccionais (TC ou RM) e US. A US quase sempre mostra uma estrutura cística com espessura da parede variável, nodularidade, septações</p><p>e lóculos cheios de fluido. Por outro lado, a TC com contraste mostra um aumento da captação na parede do cisto e nos septos. A doença hidática</p><p>deve sempre ser considerada no diagnóstico diferencial. Os cistadenomas tendem a crescer lentamente, mas podem eventualmente evoluir para sua</p><p>contraparte maligna, cistadenocarcinomas.</p><p>O  cistadenocarcinoma  é  um  tumor  maligno  extremamente  raro  com  mínimo  registro  de  sua  história  natural  e  de  seu  prognóstico  após  a</p><p>ressecção.  A  degeneração maligna  é  sugerida  com  frequência  nas  imagens  com  grandes  projeções  e  uma  parede marcadamente  espessada.  O</p><p>tratamento do cistadenoma ou cistadenocarcinoma é a excisão completa, que pode ser realizada com uma enucleação se não houver evidência de</p><p>malignidade  invasiva.  Os  riscos  de  recorrência  de  uma  ressecção  incompleta  e/ou  o  desenvolvimento  de  um  cistadenocarcinoma  devem  ser</p><p>considerados.</p><p>Doença Policística do Fígado</p><p>Os  cistos  múltiplos  do  fígado  são  usualmente  encontrados  em  pacientes  adultos  com  doença  renal  policística  autossômica  dominante</p><p>hereditária.122 Histologicamente, são lesões semelhantes aos cistos simples (ver anteriormente). A principal diferença entre as duas entidades é o</p><p>número de cistos. Quando presentes em pacientes adultos com doença renal policística, esses cistos são sempre múltiplos. Além disso, pode haver</p><p>numerosos cistos hepáticos microscópicos, além dos macrocistos visíveis a olho nu. Apesar dos inúmeros cistos no fígado, o parênquima e a função</p><p>hepática  quase  sempre  são preservados. Os  cistos hepáticos  são precedidos pelos  cistos  renais  e  sua prevalência na doença  renal policística do</p><p>adulto aumenta com a idade. Nos pacientes com menos de 20 anos, a incidência de cistos no fígado é 0%, entretanto, na faixa etária com mais de 60</p><p>anos, é de 80%.</p><p>Os cistos do fígado em pacientes adultos com doença renal policística em geral são assintomáticos, mas, em alguns pacientes, numerosos cistos</p><p>volumosos podem causar dor e distensão abdominal. Os resultados dos TFHs quase sempre são normais. As complicações são raras, mas podem</p><p>ocorrer  infecção  e  sangramento  intracístico. A US  e  a  TC mostram múltiplos  cistos  simples  por  todo  o  fígado  e  rins. O  tratamento  da  doença</p><p>policística é reservado para os sintomas graves relacionados com cistos volumosos e/ou complicações. O tratamento inclui a aspiração percutânea</p><p>com  ou  sem  escleroterapia,  fenestração  do  cisto  (via  laparotomia  ou  laparoscopia),  ressecção  hepática  e  transplante  hepático  ortotópico.  O</p><p>transplante de  fígado só é utilizado em casos de doença progressiva, após a  fenestração ou a  ressecção por disfunção hepática. No contexto de</p><p>falência renal, um transplante combinado de rim e fígado pode ser conveniente.</p><p>Cistos do Ducto Biliar</p><p>Os  cistos  do  ducto</p><p>de fígado supradiafragmático, na ausência de um saco herniário.</p><p>Veia porta</p><p>A veia porta fornece cerca de 75% do aporte sanguíneo hepático. Apesar de ser pós‑capilar e extremamente desoxigenada,</p><p>sua taxa de fluxo elevado fornece 50% a 70% das necessidades de oxigênio do fígado. A ausência de válvulas no sistema</p><p>venoso  portal  fornece  um  sistema  que  pode  acomodar  um  elevado  fluxo  de  baixa  pressão.  Isso  permite  a  medição  da</p><p>pressão venosa portal em qualquer ponto ao longo do sistema.</p><p>A  veia  porta  forma‑se  atrás  do  colo  do  pâncreas,  na  confluência  da  veia mesentérica  superior  e  da  veia  esplênica.  O</p><p>comprimento da veia porta principal varia de 5,5 a 8 cm, e o seu diâmetro, em geral, é em torno de 1 cm. Em posição cefálica</p><p>à  sua  formação,  atrás  do  colo  do  pâncreas,  a  veia  porta  passa  atrás  da  primeira  porção  do  duodeno  e  no  interior  do</p><p>ligamento hepatoduodenal, onde corre na margem direita do omento menor, geralmente atrás do ducto biliar e da artéria</p><p>hepática.</p><p>A veia porta se divide nos  ramos principais direito e esquerdo no hilo hepático. O ramo esquerdo da veia porta corre</p><p>transversalmente  ao  longo  da  base  do  segmento  4  e  para  o  interior  da  cissura  umbilical,  onde  emite  os  ramos  para  os</p><p>segmentos 2, 3 e 4. A veia porta esquerda também emite os ramos posteriores para o lado esquerdo do lobo caudado. A veia</p><p>porta direita tem um pequeno curso extra‑hepático e penetra no parênquima hepático, onde se divide em ramos setoriais</p><p>anterior e posterior. Eventualmente estes ramos setoriais podem ser extra‑hepáticos, saindo da veia porta principal antes da</p><p>sua bifurcação. Geralmente existe um pequeno ramo do processo caudado da veia porta principal direita, ou na bifurcação</p><p>da veia porta direita, que sai posteriormente para nutrir esta porção do fígado (Fig. 53‑9).</p><p>FIGURA 53­9  A anatomia da veia porta é demonstrada. A veia mesentérica superior (VMS) une­se à veia</p><p>esplênica (VE) posterior e ao colo do pâncreas (sombreado) para formar a veia porta. Observe a entrada da veia</p><p>mesentérica inferior (VMI) na veia esplênica – o arranjo anatômico mais comum. Em seu trajeto superior na</p><p>borda do omento menor posterior ao ducto biliar comum e à artéria hepática, a veia porta recebe efluente venoso</p><p>da veia coronária (VC). No hilo hepático, a veia porta bifurca­se em uma veia porta direita maior e uma veia porta</p><p>esquerda menor. A veia porta esquerda corre transversalmente na base do segmento IV e entra na fissura</p><p>umbilical para suprir os segmentos do fígado esquerdo. Logo antes da fissura umbilical, a veia porta esquerda</p><p>(VPE) geralmente dá origem a um ramo considerável para o lobo caudado. A veia porta direita (VPD) entra no</p><p>parênquima hepático e divide­se em um ramo setorial anterior direito (SAD) e setorial posterior direito (SPD).</p><p>Ela também dá origem a um ramo posterior para o lado direito do lobo caudado/processo caudado. (De Blumgart</p><p>LH, Hann LE: Surgical and radiologic anatomy of the liver and biliary tract. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and</p><p>biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 3–34.)</p><p>Existem várias conexões entre os sistemas venosos sistêmicos e portal. Sob condições de alta pressão venosa portal, estas</p><p>conexões  portossistêmicas  podem  se  dilatar  devido  ao  fluxo  colateral.  Este  conceito  é  revisto  de  forma  detalhada mais</p><p>adiante  neste  capítulo,  mas  as  colaterais  portossistêmicas  mais  importantes  são  as  seguintes:  as  veias  submucosas  do</p><p>estômago proximal e esôfago distal recebem o fluxo portal das veias gástricas curtas e da veia gástrica esquerda e podem</p><p>resultar  em varizes,  com potencial  para  hemorragia;  as  veias da parede  abdominal  e  umbilical  recanalizam o  ligamento</p><p>redondo do fluxo por intermédio da veia umbilical, resultando na denominada “cabeça de medusa”; o plexo hemorroidário</p><p>superior recebe o fluxo portal das veias afluentes mesentéricas inferiores e pode formar volumosas hemorroidas, e outras</p><p>comunicações retroperitoneais produzem efeitos colaterais que podem tornar perigosas algumas operações abdominais.</p><p>A anatomia da veia porta e de seus ramos é relativamente constante e tem muito menos variação do que a dos sistemas</p><p>arterial e biliar hepáticos. A veia porta raramente é encontrada em posição anterior ao colo do pâncreas e do duodeno. A</p><p>conexão da veia porta diretamente com a veia cava já foi descrita. Muito raramente uma veia pulmonar pode conectar‑se</p><p>com a veia porta. Finalmente, pode haver uma ausência congênita do ramo esquerdo da veia porta. Nessa situação, o seu</p><p>ramo direito cursa pelo fígado direito e circunda perifericamente para suprir o fígado esquerdo, ou a veia setorial anterior</p><p>direita pode emergir da veia porta esquerda.</p><p>Artéria hepática</p><p>A artéria hepática, representando o alto fluxo arterial sistêmico oxigenado, fornece cerca de 25% do aporte total do sangue</p><p>hepático e 30% a 50% de sua oxigenação. A descrição anatômica mais comum do suprimento arterial e da árvore biliar só</p><p>está presente em cerca de 60% dos casos (Fig. 53‑10). O tronco celíaco nasce diretamente da aorta, imediatamente abaixo do</p><p>hiato aórtico do diafragma e dá origem a três ramos – artéria esplênica, artéria gástrica esquerda e artéria hepática comum.</p><p>A artéria hepática comum passa por diante e para a direita ao longo da borda superior do pâncreas e caminha para o lado</p><p>direito do  omento menor,  onde  ascende  em direção  ao hilo  hepático,  anteriormente  à  veia porta  e  à  esquerda do ducto</p><p>biliar. No ponto em que a artéria hepática comum começa a se dirigir para cima em direção ao hilo hepático, dá origem à</p><p>artéria gastroduodenal, seguida pela artéria supraduodenal e, depois, pela artéria gástrica direita. A artéria hepática comum</p><p>após a origem da artéria gastroduodenal é chamada de artéria hepática própria e se divide em artérias hepáticas direita e</p><p>esquerda no hilo. A artéria hepática esquerda se direciona verticalmente pela cissura umbilical para suprir os segmentos 2,</p><p>3 e 4. A artéria hepática esquerda geralmente também dá origem a um ramo da artéria hepática média que se dirige para o</p><p>lado direito da fissura umbilical e supre o segmento 4. Geralmente, a artéria hepática direita corre posteriormente ao ducto</p><p>biliar hepático comum e penetra no triângulo de Calot, delimitada pelos ductos cístico e hepático comum e pela borda do</p><p>fígado, onde se origina a artéria cística, que supre a vesícula biliar e, então, continua e penetra no fígado direito.</p><p>FIGURA 53­10  A anatomia mais comum do tronco celíaco e do sistema arterial hepático é demonstrada.</p><p>O tronco celíaco, logo abaixo do hiato diafragmático, trifurca­se em artérias esplênica, gástrica esquerda e</p><p>hepática comum. A artéria hepática comum dirige­se para a direita e volta­se, superiormente, em direção ao hilo.</p><p>No ponto desta volta, a artéria gastroduodenal se origina, e a artéria hepática própria é formada. A artéria hepática</p><p>própria dá origem às artérias hepáticas direita e esquerda no hilo. Observe a artéria hepática média originando­</p><p>se da artéria hepática esquerda proximal, que segue para suprir o segmento IV. A artéria cística mais</p><p>comumente tem origem na artéria hepática direita dentro do triângulo de Calot. (De Blumgart LH, Hann LE: Surgical and</p><p>radiologic anatomy of the liver and biliary tract. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and biliary tract, London, 2000,</p><p>WB Saunders, pp 3–34.)</p><p>Ao contrário da veia porta, a anatomia da artéria hepática é extremamente variável (Fig. 53‑11). Um vaso acessório pode</p><p>ser descrito como uma origem aberrante de um ramo, o que é um acréscimo ao padrão de ramificação normal. Um vaso</p><p>substituto  é descrito  como uma origem aberrante de um  ramo que  é  adicional  ao padrão normal. Usualmente,  a  artéria</p><p>hepática origina‑se do tronco celíaco, no entanto os ramos ou todo o sistema arterial hepático podem se originar da artéria</p><p>mesentérica superior (AMS). As artérias hepáticas direita e esquerda podem também se originar separadamente no tronco</p><p>celíaco.</p><p>biliar  ou  cistos  coledococianos  são  dilatações  congênitas  da  árvore  biliar  que,  na maioria  dos  casos,  são  diagnosticadas  na</p><p>infância, mas podem se manifestar na idade adulta. Tendo em vista o risco de malignidade e a colangite recorrente, o tratamento é a ressecção com</p><p>restabelecimento da continuidade biliar‑entérica. A maioria dos cistos do ducto biliar envolve a árvore biliar extra‑hepática, mas nos cistos do tipo</p><p>IV, há envolvimento do ducto biliar extra‑hepático e dos ductos intra‑hepáticos. Em contraposição, a doença de Caroli (tipo V) é caracterizada por</p><p>múltiplos cistos intra‑hepáticos. Assim, os cistos do ducto biliar devem ser considerados no diagnóstico diferencial de um paciente com múltiplas</p><p>lesões císticas hepáticas. As lesões intra‑hepáticas dos cistos do ducto biliar tipo IV e a doença de Caroli são dilatações segmentares multifocais dos</p><p>ductos biliares separadas por partes dos ductos biliares de calibre normal. Aproximadamente 50% dos casos de doença de Caroli estão associados à</p><p>fibrose  hepática  congênita;  os  cistos  estão  difusamente  localizados  por  todo  o  fígado.  Nos  demais  50%  dos  casos,  as  dilatações  podem  estar</p><p>confinadas  a  uma  parte  do  fígado,  geralmente  o  hemifígado  esquerdo. A  colangite  bacteriana  recorrente  normalmente  domina  o  curso  clínico</p><p>destas doenças, e a morte quase sempre sobrevém em torno de cinco a 10 anos se não houver um tratamento adequado. Quando os cistos intra‑</p><p>hepáticos dos ductos biliares são  localizados, a ressecção hepática com ou sem reconstrução biliar é a conduta mais adequada. O tratamento do</p><p>comprometimento hepático difuso é inexpressivo e, nos casos complicados, o procedimento mais eficaz é o transplante.</p><p>Princípios da Ressecção Hepática</p><p>Embora  as  ressecções  do  fígado  já  fossem  realizadas  no  final  dos  anos  de  1800,  só  em  1952  Lortat‑Jacob  executou  a  primeira  e  verdadeira</p><p>hepatectomia direita anatômica. Esse evento marcou a era moderna da cirurgia hepática, no entanto as primeiras séries foram marcadas pela alta</p><p>morbimortalidade decorrente das volumosas perdas  sanguíneas  intraoperatórias. As  séries dos anos 1970  e  1980  sempre  registraram  índices de</p><p>mortalidade superiores a 10%, chegando a 20% sobretudo nas grandes ressecções. Esta mortalidade elevada limitava a abordagem cirúrgica sobre o</p><p>fígado e havia muita relutância em indicá‑la como alternativa de tratamento. Nas últimas três décadas, foram assinalados avanços técnicos notáveis</p><p>que  alteraram  totalmente  os  resultados  operatórios dos pacientes  submetidos  à  cirurgia  hepática. A  compreensão de  que  a maioria das perdas</p><p>sanguíneas durante a ressecção hepática vinha das veias hepáticas levou os cirurgiões a realizarem essas operações com uma baixa pressão venosa</p><p>central. Realiza‑se uma hepatectomia parcial por meio de uma  linha central com o paciente na posição de Trendelenburg discreta aliada a uma</p><p>restrição  hídrica  e  vasodilatadores,  se  necessário,  para manter  a  pressão  venosa  central  inferior  a  5 mmHg. Outro  avanço  importante  foi  uma</p><p>melhor compreensão da anatomia segmentar do  fígado,  tornando a dissecção  intra‑hepática mais  segura e precisa. Existem várias  técnicas para</p><p>seccionar o tecido hepático e muitos métodos para coagular e controlar os vasos sanguíneos. O conceito mais importante, no entanto, é a secção do</p><p>tecido hepático e que essa dissecção seja feita por um cirurgião que tenha completo conhecimento da anatomia vascular do fígado.</p><p>Em centros de excelência, a mortalidade peroperatória é em torno de 5% ou menos e depende de alguns  fatores. Os  três  fatores mais críticos</p><p>relacionados com a morbidade operatória são perda sanguínea, quantidade de fígado normal ressecada e condição do fígado (p. ex., cirrose). Uma</p><p>hepatectomia parcial deve ser  realizada com esses  fatores em mente para minimizar a morbidade. Em uma revisão de mais de 1.800 ressecções</p><p>hepáticas durante um período de 10 anos de MSKCC, a mortalidade operatória foi de 3,1%.123 A perda sanguínea média foi de 600 mL e dois terços</p><p>dos pacientes não necessitaram de transfusão de glóbulos vermelhos. A morbidade geral pós‑cirúrgica foi de 45%, mas a permanência média no</p><p>hospital  foi de oito dias. A morbidade esteve  relacionada principalmente  com perda  sanguínea e  extensão da  ressecção. As  ressecções menores</p><p>estiveram  associadas  a  uma  taxa  de  mortalidade  de  1%.  A  maioria  das  complicações  e  óbitos  foi  observada  em  tumores  biliares  complexos,</p><p>cirróticos com CHC e ressecções alargadas. Melhoras dos resultados após hepatectomia parcial em centros hepatobiliares experientes mostraram</p><p>taxas  de  mortalidade  que  giram  em  torno  de  1%  a  2%,  com  poucos  pacientes  necessitando  de  transfusões  sanguíneas  peroperatórias.  Como</p><p>resultado  da  crescente  segurança  da  operação  hepática,  a  ressecção  do  fígado  tornou‑se  o  tratamento  mais  adequado  para  muitas  condições</p><p>hepáticas malignas e benignas.</p><p>As fístulas biliares são um problema nos casos que requerem reconstituição biliar complexa, mas também podem ocorrer em cerca de 10% a 20%</p><p>das  hepatectomias  sem  reconstrução  biliar.  A  ligadura  cuidadosa  dos  canalículos  biliares  apresenta  importância  óbvia  para  minimizar  esta</p><p>complicação. Em virtude da capacidade de regeneração do fígado, as ressecções de até 80% de fígados não cirróticos podem ser realizadas com</p><p>compensação funcional dentro de poucas semanas. Tendo em vista que muitas ressecções englobam tumores e fígado normal, o conceito de volume</p><p>FFR e parênquima funcional hepático é importante, porque muitas vezes há hipertrofia compensatória do fígado normal quando tumores ocupam</p><p>uma parcela significativa do volume hepático. O risco de insuficiência hepática é mínimo caso a redução do parênquima hepático funcional seja</p><p>inferior  a  50%, mas  tende  a  crescer  quando  este  número  se  aproxima de  20%  a  25%. Os  pacientes  com  cirrose  têm  taxas  bastante  elevadas  de</p><p>insuficiência hepática pós‑operatória em decorrência da reduzida capacidade regenerativa consequente ao comprometimento da função hepática</p><p>primária. A deficiência funcional hepática, a falência de múltiplos órgãos e o óbito são sérios riscos essenciais à realização de ressecções hepáticas</p><p>alargadas em paciente cirróticos. Em geral, pacientes com cirrose Child B, C ou hipertensão portal não toleram ressecções hepáticas, e a sua seleção</p><p>é primordial. A ascite e as complicações infecciosas também são problemas comuns após a ressecção do fígado. Uma estratégia para minimizar a</p><p>disfunção hepática pós‑operatória e a morbidade após hepatectomia alargada é embolizar percutaneamente a veia porta do lado do fígado a ser</p><p>ressecado.  Em  aproximadamente  quatro  semanas  ocorre  atrofia do parênquima hepático  a  ser  ressecado  e  hipertofia do  FFR.  Por  sua  vez,  isso</p><p>aumenta o volume relativo do FFR.</p><p>As técnicas de ressecção do fígado diferem de acordo com a doença que está sendo tratada. Nas doenças hepáticas benignas, que necessitam de</p><p>ressecção, as indicações para operação são os sintomas ou a infecção. A remoção do fígado normal deve ser mínima nestes casos e técnicas como a</p><p>enucleação são adequadas, embora uma ressecção maior possa ser necessária ocasionalmente. Para a doença maligna, a obtenção de uma margem</p><p>de tecido normal é fundamental e as ressecções anatômicas formais produzem os melhores resultados. As técnicas como as ressecções em cunha</p><p>quase sempre resultam em elevados índices de comprometimento das margens e recidiva da doença e devem ser utilizadas com cautela e de forma</p><p>limitada.</p><p>O  conhecimento  pormenorizado  da  anatomia  do  fígado  é  essencial  para  a  prática  da  operação  hepática  segura  (ver  anteriormente).</p><p>Desafortunadamente, descrições detalhadas e  complicadas da anatomia e  ressecções hepáticas  comuns podem confundir  sobretudo o estudante</p><p>e/ou mesmo  o  cirurgião  pouco  experiente.  Uma  reunião  de  consenso  em  2000  conduzida  em  Brisbane,  Austrália,</p><p>com  o  auxílio  da  American</p><p>Hepato‑Pancreato‑Biliary Association, traçou diretrizes para as principais abordagens (Tabela 53‑11; Fig. 53‑40). Em geral, o termo lobectomia não é o</p><p>mais  adequado porque não há delimitações  externas no  fígado que evidenciem um  lobo. Na dúvida, deve‑se  sempre  ter  em mente  a  anatomia</p><p>segmentar  do  fígado  para  a  efetivação  da  ressecção.  Lembre‑se  de  que  o  fígado  direito  é  composto  pelos  segmentos  5  a  8  e  hepatectomia</p><p>direita ou hemi‑hepatectomia direita são termos utilizados para a ressecção destes segmentos. Os segmentos 2 a 4 compreendem o fígado esquerdo</p><p>e hepatectomia esquerda e  hemi‑hepatectomia  esquerda  são  termos  apropriados  para  a  ressecção  destes  segmentos. A  hepatectomia  direita  pode  ser</p><p>estendida mais à esquerda para incluir o segmento 4, e a hepatectomia esquerda pode ser estendida para a direita para incluir os segmentos 5 e 8.</p><p>Termos  como  hepatectomia  estendida  direita‑esquerda,  segmentectomia  direita‑esquerda  e  trissegmentectomia  são  apropriados  para  descrever  estas</p><p>ressecções. A exérese dos segmentos 2 e 3 é uma ressecção sublobular realizada com frequência e é quase sempre conhecida como segmentectomia</p><p>lateral esquerda e setorectomia lateral esquerda. Outras ressecções sublobares comuns, como aquelas do setor posterior direito (segmentos 6 e 7) ou</p><p>do  setor  anterior  direito  (segmentos  5  e  8)  são  chamadas  de  setorectomia  posterior  direita  e  setorectomia  anterior  direita,  respectivamente. As</p><p>ressecções  de  um  único  segmento  ou  bissegmentares  podem  ser  simplesmente  referidas  por  uma  descrição  numérica  dos  segmentos  a  serem</p><p>ressecados.</p><p>Tabela 53­11</p><p>Nomenclatura para a Maioria das Grandes Ressecções Hepáticas Anatômicas Comuns*</p><p>SEGMENTOS† COUINAUD, 1957</p><p>GOLDSMITH E WOODBURNE,</p><p>1957 BRISBANE, 2000</p><p>V‑VIII Hepatectomia direita Lobectomia hepática direita Hemi‑hepatectomia direita</p><p>IV‑VIII‡ Lobectomia direita Lobectomia hepática direita</p><p>estendida</p><p>Trisseccionetomia direita</p><p>II‑IV Hepatectomia esquerda Lobectomia hepática esquerda Hemi‑hepatectomia</p><p>esquerda</p><p>II, III Lobectomia esquerda Segmentectomia lateral esquerda Seccionetomia lateral</p><p>esquerda</p><p>II, III, IV, V,</p><p>VIII‡</p><p>Hepatectomia esquerda</p><p>estendida</p><p>Lobectomia esquerda estendida Trisseccionetomia esquerda</p><p>* A terminologia original baseia­se em descrições anatômicas de Couinaud e Goldsmith e Woodburne.</p><p>† Consulte a Figura 53­40A­E.</p><p>‡ Outro nome comum para essas operações é trissegmentectomia direita ou esquerda.</p><p>FIGURA 53­40  As principais ressecções hepáticas comumente realizadas estão indicadas pelas áreas sombreadas. A, Hepatectomia</p><p>direita, lobectomia hepática direita ou hemi­hepatectomia direita (segmentos V­VIII). B, Hepatectomia esquerda, lobectomia hepática</p><p>esquerda ou hemi­hepatectomia esquerda (segmentos II­IV). C, Lobectomia direita, lobectomia hepática direita estendida ou</p><p>trissetorrectomia direita (trissigmentectomia) (segmentos IV­VIII). D, Lobectomia esquerda, segmentectomia lateral esquerda ou</p><p>setorrectomia lateral esquerda (segmentos II­III). E, Hepatectomia esquerda estendida lobectomia esquerda estendida ou</p><p>trissegmentectomia esquerda (segmentos II, III, IV, V, VIII). Ver Tabela 53­11. (De Blumgart LH, Jarnagin W, Fong Y: Liver resection for benign disease</p><p>and for liver and biliary tumors. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 1639–1714.)</p><p>Uma  discussão  pormenorizada  das  técnicas  de  ressecções  hepáticas  está  além  do  escopo  deste  capítulo  e,  em  geral,  requer  treinamento  da</p><p>especialidade, mas  princípios  gerais  podem  ser  abordados. As  ressecções  hepáticas  devem  considerar  a  doença  a  ser  tratada  e  os  objetivos  da</p><p>operação, seja a respeito de uma margem com ressecção negativa na vigência de uma malignidade e/ou a ressecção de tecido benigno para aliviar</p><p>os sintomas. A porção do fígado a ser ressecada deve sê‑lo com segurança, considerando‑se o influxo (veia porta, artéria hepática e ducto biliar) e o</p><p>fluxo (veias hepáticas), além da preservação do fígado remanescente com um tamanho adequado e com aporte arterial e drenagem biliar e venosa</p><p>intactos.</p><p>As  abordagens mais  comuns para uma  ressecção  anatômica,  bem  como a  sequência  ideal,  seriam a mobilização do  fígado  a  ser  ressecado,  a</p><p>dissecção das estruturas hilares de afluxo e das vias de drenagem venosa e a ligadura das estruturas na mesma sequência, seguida de secção do</p><p>parênquima.  A  mobilização  do  fígado  envolve  secção  dos  ligamentos  triangulares  direito  ou  esquerdo,  liberando  o  fígado  do  diafragma.</p><p>Frequentemente, o  fígado deve  ser mobilizado completamente e afastado da veia  cava  inferior  (que é fixa), o que  requer dissecção cuidadosa e</p><p>ligadura  de  múltiplos  ramos  venosos  retroperitoneais  da  cava  retro‑hepática.  Para  as  exéreses  maiores,  a  veia  hepática  da  porção  do  fígado</p><p>ressecado é frequentemente isolada antes da ressecção. Existem várias técnicas de dissecção, controle e ligadura dos vasos de influxo. O controle</p><p>clássico do influxo é obtido por dissecção do hilo hepático com abordagem da veia porta e artéria hepática para o hemifígado a ser ressecado. Estes</p><p>podem ser ligados por sutura manual e/ou com grampeadores vasculares. A não ser que a proximidade do tumor obrigue, defendemos a secção do</p><p>ducto  biliar  no  interior  do  parênquima  hepático  para  minimizar  a  possibilidade  de  lesões  biliares  contralaterais  relacionadas  com  anomalias</p><p>anatômicas. O controle do influxo pode também ser obtido pela dissecção do pedículo portal intra‑hepático para a secção anatômica do fígado a ser</p><p>ressecado. Tenha sempre em mente que as estruturas de influxo invaginam com o peritônio no hilo hepático e cursam intra‑hepaticamente como</p><p>um pedículo revestido composto por três estruturas de influxo. O pedículo de influxo pode ser isolado realizando‑se hepatotomias em flancos ou</p><p>por secção do parênquima para o pedículo de interesse. O pedículo pode ser ligado com um grampeador vascular, mas a ligadura com sutura é</p><p>algumas  vezes  necessária.  Classicamente,  a  veia  hepática  é  seccionada  em  sua  porção  extra‑hepática,  podendo  também  ser  utilizado  um</p><p>grampeador vascular.</p><p>A veia hepática pode também ser  ligada no interior do parênquima hepático para a sua secção. Há vários métodos de secção do parênquima,</p><p>variando de bisturis ultrassônicos complexos a coaguladores com energia de radiofrequência ou uma simples técnica de “esmagamento” com pinça</p><p>hemostática e  subsequente  ligadura. Em mãos experientes,  todas estas podem ser usadas para minimizar a perda de  sangue,  sendo  importante</p><p>desenvolver  uma  técnica  específica  que  seja  de  realização  confortável.  Finalmente,  a  secção  parenquimatosa  é  a  dissecção  da  anatomia  intra‑</p><p>hepática,  o  controle  das  estruturas  vasculares  e  biliares,  a  redução  das  perdas  sanguíneas  e,  principalmente,  evitar  a  lesão  do  futuro  fígado</p><p>remanescente.</p><p>Hemobilia</p><p>Um caso de hemobilia letal secundária a um trauma abdominal penetrante foi descrito por Glisson em 1654. Somente em</p><p>1948 Sandblom cunhou o termo hemobilia em seu artigo sobre o tema. A hemobilia é definida como o sangramento para a</p><p>árvore biliar decorrente de uma comunicação anormal entre um vaso sanguíneo e o ducto biliar. Trata‑se de uma condição</p><p>rara que é  sempre difícil de  ser distinguida das causas mais  frequentes de  sangramento gastrointestinal. As causas mais</p><p>comuns  de  hemobilia  são  lesões  iatrogênicas,  trauma  acidental,  cálculos  biliares,  tumores,  doenças  inflamatórias  e/ou</p><p>doenças vasculares. Uma hemobilia volumosa é algo raro, enquanto a pequena hemobilia sem consequência hemodinâmica</p><p>é um problema comum da doença litiásica biliar ou de procedimentos hepáticos intervencionistas.</p><p>Causas</p><p>A  causa  mais  comum  de  hemobilia  é  o  trauma  iatrogênico  do  fígado  e  da  árvore  biliar.  Antes  da  década  de  1980,  a</p><p>proporção de hemobilia</p><p>atribuída ao trauma acidental em comparação com o trauma iatrogênico era de 2:1, mas o trauma</p><p>iatrogênico é agora considerado a principal causa de hemobilia em 40% a 60% dos casos. A biópsia percutânea resulta em</p><p>hemobilia  em menos de 1% dos  casos, mas os procedimentos de drenagem biliar  trans‑hepática percutânea  trazem uma</p><p>incidência de 2% a 10%. Da mesma  forma,  a  exploração  cirúrgica da árvore biliar pode  resultar  em hemobilia por  lesão</p><p>direta ou pela formação de pseudoaneurisma arterial. Inúmeros casos de hemobilia após colecistectomia têm sido relatados.</p><p>A hemobilia secundária a lesão acidental é mais comum no trauma abdominal fechado do que no penetrante. A incidência</p><p>de  hemobilia  documentada  após  importante  trauma  hepático  varia  de  0,2%  a  3%.  Os  fatores  de  risco  para  o</p><p>desenvolvimento da hemobilia após  trauma acidental  são a  ruptura hepática central  com uma cavidade e a  consequente</p><p>utilização  de  tamponamento  abdominal  e  drenagem  inadequada.  A  vesícula  biliar  pode  ser  a  causa  do  sangramento</p><p>decorrente  de  trauma,  cálculos  biliares  ou  colecistite  alitiásica.  A  doença  vascular  primária,  como  o  aneurisma,  a</p><p>angiodisplasia ou os hemangiomas são causas raras de hemobilia. Os tumores malignos do fígado, árvore biliar, vesícula</p><p>biliar e pâncreas, bem como infecções parasitárias, abscessos hepáticos e colangite, são causas incomuns de hemobilia.</p><p>Apresentação Clínica</p><p>O  sangramento  venoso  portal  para  a  árvore  biliar  é  raro,  pequeno  e  autolimitado,  a menos  que  a  pressão  portal  esteja</p><p>elevada. A hemobilia, discreta em geral segue uma evolução clínica assintomática, no entanto a hemobilia arterial, a fonte</p><p>mais comum, pode ser expressiva. As sequelas clínicas da hemobilia estão relacionadas com a perda de sangue e a formação</p><p>de  coágulos  potencialmente  obstrutivos  na  árvore  biliar.  A  clássica  tríade  de  sintomas  e  sinais  de  hemobilia  são  dor</p><p>abdominal superior, hemorragia gastrointestinal alta e icterícia. Em alguns relatos, os três estavam presentes em 22% dos</p><p>pacientes. Os  sintomas  e  sinais  de  uma  volumosa  hemobilia  são melena  (90% dos  casos),  hematêmese  (60% dos  casos),</p><p>cólica biliar (70% dos casos) e icterícia (60% dos casos). O sangramento gastrointestinal alto visto em associação a sintomas</p><p>biliares  deve  sempre  aumentar  a  suspeita  de  hemobilia.  Um  aspecto  interessante  da  hemobilia  é  a  tendência  para</p><p>apresentações tardias, até semanas após o evento causal inicial, bem como a recorrência e o sangramento durante meses e</p><p>mesmo anos. Coágulos na árvore biliar podem mascarar cálculos se a hemobilia passar despercebida. Estes coágulos podem</p><p>causar colangite, pancreatite e colecistite.</p><p>Exames Diagnósticos</p><p>Uma vez levantada a suspeita de hemobilia, a primeira avaliação deve ser feita pela endoscopia digestiva alta, que afasta</p><p>outras  causas  de  hemorragia  e  pode  identificar  o  sangramento  a  partir  da  papila  duodenal;  no  entanto  a  endoscopia  é</p><p>diagnóstica  de  hemobilia  apenas  em  aproximadamente  10%  dos  casos.  Uma  vez  que  seja  diagnóstica  e  a  conduta</p><p>conservadora seja planejada, não é necessário mais algum exame. A US ou a TC podem ser úteis para mostrar um tumor</p><p>intra‑hepático  ou  um hematoma. Uma  evidência  de  sangramento  ativo  na  árvore  biliar  pode  ser  observada  na  TC  com</p><p>contraste na forma de coágulos intraluminares e dilatação biliar. A TC também pode mostrar os fatores de risco associados</p><p>à hemobilia, como as lesões cavitárias centrais e os aneurismas. Atualmente, a angiografia arterial é considerada a melhor</p><p>alternativa  quando  se  suspeita  de  hemobilia  e  identificará  a  causa  do  sangramento  em  cerca  de  90%  dos  casos.  A</p><p>colangiografia mostra coágulos na árvore biliar que podem simular estenoses ou pequenas falhas de enchimento difíceis de</p><p>diferenciar dos cálculos.</p><p>Tratamento e Resultados</p><p>O  tratamento  da  hemobilia  deve  concentrar‑se  em  parar  o  sangramento  e  reparar  a  obstrução  biliar.  Muitos  casos  de</p><p>hemobilias discretas podem ser tratados de forma conservadora, com correção da coagulopatia, adequada drenagem biliar</p><p>(somente se necessário) e observação cautelosa. Em uma recente revisão de 171 casos registrados de 1996 a 1999, 43% foram</p><p>tratados de forma conservadora e com êxito. A primeira  linha de terapia para uma hemobilia volumosa é a embolização</p><p>transarterial,  e  têm  sido  registrados  índices  de  sucesso  em  80%  a  100%  dos  casos.  A  angiografia  com  embolização</p><p>transarterial é indicada para uma hemobilia volumosa que requer transfusão de sangue (Fig. 53‑41).</p><p>FIGURA 53­41  Achados clássicos de hemobilia são demonstrados. Após uma colecistectomia complicada, um</p><p>pseudoaneurisma iatrogênico desenvolveu­se e rompeu para a árvore biliar. Hemobilia importante foi o resultado.</p><p>O diagnóstico foi feito por endoscopia e embolização arterial. A, Arteriografia demonstrando um</p><p>pseudoaneurisma da artéria hepática no hilo. B, Poucos segundos depois, o contraste é visto entrando no ducto</p><p>hepático com evidência de coágulo na árvore biliar. C e D, O mesmo aneurisma antes (C) e depois (D) da</p><p>embolização bem­sucedida. (De Sandblom JP: Hemobilia and bilhemia. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and</p><p>biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 1319–1342.)</p><p>A intervenção cirúrgica está indicada quando a terapia conservadora e a embolização transarterial foram malsucedidas. É</p><p>importante observar que o  tratamento cirúrgico de hemobilia  raramente é necessário e, até mesmo em casos aos quais a</p><p>laparotomia pode estar indicada por outras razões, a embolização transarterial ainda é a terapia adequada para a hemobilia</p><p>decorrente de baixa morbidade. Em geral, as abordagens cirúrgicas envolvem a  ligadura de vasos sangrantes, excisão do</p><p>aneurisma ou a ligadura não seletiva de uma artéria hepática principal. A ressecção hepática pode ser necessária após uma</p><p>ligadura  arterial malsucedida ou para  casos de  trauma grave ou  tumor. A hemorragia da vesícula biliar  ou  a  colecistite</p><p>hemorrágica  exigem  a  colecistectomia.  Existem  relatos  isolados  de  conduta  bem‑sucedida  na  hemobilia  com  coagulação</p><p>endoscópica, somatostatina e vasopressina. O tratamento da hemobilia após drenagem biliar trans‑hepática percutânea em</p><p>geral  consiste  na  remoção  do  cateter  ou  na  substituição  por  cateteres  mais  longos,  mas  pode  exigir  embolização</p><p>transarterial.</p><p>Quando do relato de Sandblom, na década de 1970, a mortalidade por hemobilia era pelo menos de 25%. Um estudo de</p><p>1987 observou uma mortalidade de 12%. Em uma revisão de casos de 1996 a 1999, apenas quatro mortes foram registradas.</p><p>Existe uma redução na mortalidade por hemobilia e provavelmente está relacionada com dois fatores. Primeiro, a incidência</p><p>das  pequenas  hemobilias  aumentou  em  decorrência  do  crescente  número  de  procedimentos  hepáticos  percutâneos.</p><p>Segundo,  os  progressos  na  angiografia  seletiva  e  na  embolização  transarterial  contribuíram  muito  para  a  melhora  do</p><p>tratamento.</p><p>Bilhemia</p><p>A bilhemia é uma condição extremamente rara na qual a bile flui para a corrente sanguínea, seja pelas veias hepáticas ou</p><p>pelos ramos da veia porta. Este fluxo ocorre no contexto de pressão  intrabiliar elevada, que excede a pressão do sistema</p><p>venoso. A causa pode ser a erosão de cálculos biliares para a veia porta ou trauma acidental/iatrogênico. A condição pode</p><p>ser fatal pela embolização de grandes quantidades de bile nos pulmões. Geralmente, entretanto, o fluxo biliar é baixo e as</p><p>fístulas  se  fecham  espontaneamente.  A  apresentação  clínica  é  caracterizada  por  aumento  da  icterícia,  acentuada</p><p>hiperbilirrubinemia direta  sem elevação dos níveis de  enzima hepatocelular  (AST, ALT)  e  septicemia. Este diagnóstico  é</p><p>mais  bem  identificado  pela  CPRE.  O  tratamento  é  direcionado  para  a  redução  das  pressões  intrabiliares  por  meio  de</p><p>próteses ou papilotomia.</p><p>Hepatite viral e o cirurgião</p><p>As  epidemias</p><p>de  icterícia  foram  observadas  nas  civilizações  antigas  e  registradas  por  Hipócrates.  Durante  a  Segunda</p><p>Guerra Mundial essas epidemias foram chamadas de icterícia catarral. Mais de 28.000 casos foram documentados na época.</p><p>Os estudos epidemiológicos dos anos 1940  registraram a diferença entre a hepatite de origem sanguínea  (hepatite B) e a</p><p>hepatite entérica (hepatite A). A descoberta mais importante foi a do antígeno Austrália, por Blumberg et al., em 1965. Este</p><p>antígeno foi comprovado como o antígeno de superfície da hepatite B (HBsAg) e forneceu meios de diferenciar os dois tipos</p><p>de  hepatite,  além  de  caracterizar  a  epidemiologia  desta  doença.  Esta  descoberta  também  levou  ao  desenvolvimento  de</p><p>vacinas contra o VHB baseadas neste antígeno, com óbvios e profundos efeitos em todo o mundo. Outras pesquisas levaram</p><p>à descoberta do vírus delta (hepatite D) e da hepatite C (explicitando os casos de hepatite não A e não B). A hepatite E foi</p><p>descoberta  como uma  forma única  enteral  da  hepatite  infecciosa;  o  vírus da  hepatite G,  descoberto  em  1995,  ainda  está</p><p>sendo definido.</p><p>A hepatite viral é um grande problema de saúde pública e é a causa mais comum de doença hepática em todo mundo.</p><p>Embora  a  hepatite  aguda  fulminante  seja  incomum,  há  mais  de  5  milhões  de  pessoas  que  sofrem  de  hepatite  crônica.</p><p>Estima‑se que mais de 15.000 pacientes morrem anualmente por hepatite viral nos Estados Unidos. A hepatite viral não é</p><p>uma  doença  cirúrgica,  mas  tem  importantes  consequências  para  os  cirurgiões  e  os  pacientes  cirúrgicos.  Para  qualquer</p><p>cirurgião envolvido  com operações hepáticas,  o  estado  funcional do  fígado é de  extrema  importância. Os pacientes  com</p><p>hepatite viral crônica demandam uma atenção especial antes de qualquer intervenção cirúrgica. Além disso, a hepatite viral</p><p>crônica é uma causa comum de CHC. Finalmente, o risco de transmissão do paciente para o cirurgião e vice‑versa é uma</p><p>questão sobre a qual todos os cirurgiões devem estar cientes.</p><p>Definição</p><p>A hepatite viral é uma  infecção do  fígado por um dos seis vírus conhecidos que  têm composições e estruturas genéticas</p><p>diferentes. VHA, VHC, VHD, VHE e VHG têm genomas RNA, enquanto o VHB tem um genoma de DNA que se replica</p><p>por  meio  de  intermediários  de  RNA.  O  VHA  e  o  VHE  são  responsáveis  por  formas  de  hepatites  epidêmicas  e  são</p><p>transmitidos pela via fecal‑oral. O VHB é o único com potencial para integrar‑se aos genomas dos hospedeiros, embora isso</p><p>não seja necessário para sua reprodução. O VHC reproduz‑se no citoplasma dos hepatócitos e tem mecanismos complexos</p><p>para evitar a imunidade do hospedeiro por intermédio de áreas hipervariáveis em seu genoma. O VHD requer a presença</p><p>de coinfecção por VHB para a reprodução e a infectividade e pode alterar o curso clínico da infecção pelo VHB. O VHG foi</p><p>descoberto recentemente e apresenta semelhanças com o VHC, mas não tem associação definitiva com a hepatite clínica.</p><p>Diagnóstico</p><p>A Tabela 53‑12 resume os testes sorológicos e suas implicações para VHA, VHB e VHC. O diagnóstico da infecção do VHA</p><p>depende da determinação dos anticorpos para o VHA. Os anticorpos IgM e IgG estão presentes no início da infecção, mas</p><p>apenas o  IgG persiste por  longo tempo. O antígeno do VHA e os  testes para o RNA do VHA foram desenvolvidos, mas</p><p>costumam ser restritos aos laboratórios de pesquisa.</p><p>Tabela 53­12</p><p>Avaliação Sorológica das Hepatites Virais mais Comuns</p><p>VÍRUS</p><p>NOME DO</p><p>ANTÍGENO INTERPRETAÇÃO</p><p>NOME DE</p><p>ANTICORPO INTERPRETAÇÃO</p><p>VHA Antígeno VHA Infecção aguda Anti‑VHA IgM Infecção aguda</p><p>IgG anti‑VHA Imunidade</p><p>HBsAg Infecção aguda ou crônica Anti‑HBs Imunidade</p><p>HBeAg Replicação do VHB,</p><p>infectividade</p><p>Anti‑HBc Todas as fases da infecção</p><p>Anti‑HBe Convalescença tardia</p><p>VHC Nenhum – Anti‑VHC Convalescença tardia ou infecção</p><p>crônica</p><p>A infecção por VHB foi caracterizada por muitos antígenos e anticorpos (Fig. 53‑42). O HBsAg é o marco do diagnóstico</p><p>da infecção  por VHB  e  aparece  no  soro  de  uma  a  10  semanas  após  a  infecção;  geralmente  desaparece  em  quatro  a  seis</p><p>meses,  mas  a  persistência  no  soro  implica  infecção  crônica.  Os  anticorpos  anti‑HBs  em  geral  aparecem  após  o</p><p>desaparecimento do HBsAg e marcam a cura após a infecção por VHB. Os anticorpos anti‑HBs também são induzidos pela</p><p>vacina contra o VHB. O antígeno core da hepatite B (HBcAg) é um antígeno intracelular que não é detectável no soro. Por</p><p>outro lado, anticorpos anti‑HBc são detectáveis no início, depois da infecção, e persistem após a recuperação e nas infecções</p><p>crônicas. O  antígeno  “e” da hepatite B  (HBeAg proteína  secretora)  é um marcador da  reprodução  e da  infectividade do</p><p>VHB.  Geralmente  está  presente  no  início  e  pode  persistir  por  anos  como  infecção  crônica,  mas  geralmente  desaparece</p><p>dentro de meses na  ausência de  infecção  crônica. A  soroconversão  aos  anticorpos  anti‑HBe  está usualmente  associada  à</p><p>resolução da infecção e também mostrou que muitos pacientes que se tenham soroconvertido frequentemente apresentam</p><p>VHB DNA mensuráveis, embora em níveis baixos. A quantificação do VHB DNA no soro tornou‑se a forma mais precisa de</p><p>avaliar a atividade do VHB. Evidência recente tem mostrado que muitos pacientes nos quais se pensava resolvida a VHB</p><p>aguda podem ter infecção viral persistente e estar em risco de desenvolver hepatite crônica ou sua reativação.</p><p>FIGURA 53­42  Marcadores sorológicos na hepatite aguda pelo vírus B (VHB) (A) e infecção crônica pelo VHB</p><p>(B). (De Doo EC, Lian TJ: The hepatitis viruses. In Schiff ER, Sorrell MF, Maddrey WC, editors: Schiff’s diseases of the liver,</p><p>Philadelphia, 1999, Lippincott­Raven, pp 725–744.)</p><p>O  diagnóstico  da  infecção  por  VHC  depende  da  detecção  de  anticorpos  contra  vários  antígenos  do  VHC.  Os</p><p>imunoensaios  atuais  são  altamente  sensíveis  e  específicos.  Não  há  testes  específicos  de  antígeno  VHC,  mas  há  uma</p><p>variedade  de  testes  quantitativos  e  qualitativos  para  VHC  RNA,  que  se  tornaram  importantes  na  confirmação  do</p><p>diagnóstico em casos obscuros e na avaliação das respostas à terapia.</p><p>A coinfecção por VHD nos pacientes infectados com o VHB recebe um diagnóstico mais seguro pela detecção do RNA do</p><p>VHD, que pode ser medido no soro. O antígeno do VHD pode ser detectado nos espécimes de fígado. A infecção VHE pode</p><p>ser diagnosticada pela quantidade de anticorpos no soro ou pela detecção do vírus ou seus componentes nas fezes, soro ou</p><p>no fígado em si.</p><p>Epidemiologia e Transmissão</p><p>A incidência de VHA tem se reduzido significativamente desde a introdução de vacinas eficazes, porém a vacinação não é</p><p>rotina em todos os países. A hepatite A é comum em países do Terceiro Mundo, com taxas de soropositividade de quase</p><p>100% em algumas populações. A infecção ocorre na infância e é facilitada pela falta de higiene e de condições sanitárias. Os</p><p>índices de infecção são muito mais baixos nos países desenvolvidos. Nos Estados Unidos, cerca de 10% das crianças e 35%</p><p>dos adultos foram infectados pelo VHA. Apesar da disponibilidade da vacinação, 6.000 casos foram relatados nos Estados</p><p>Unidos  em  2004,  provavelmente  representando  60.000  casos  estimados  em  todo  o  país. A  via  primária  de  infecção  pelo</p><p>VHA  é  a  fecal‑oral.  A  maioria  dos  casos  de  VHA  ocorre  como  consequência  da  ingestão  de  água  ou  alimentos</p><p>contaminados e do contato de pessoa para pessoa. A transmissão parenteral é possível, mas incomum. A transmissão sexual</p><p>foi documentada em homossexuais masculinos.</p><p>A  hepatite  B  é  um  problema  de  saúde  em  todo  o  mundo.  Há  mais  de  300  milhões  de  portadores  e  250.000  óbitos</p><p>associados  anualmente. A  prevalência  da  infecção  pelo VHB  tem uma  considerável  variação  geográfica. Áreas  de  baixa</p><p>prevalência,  como  os  Estados  Unidos  e  a  Europa  ocidental,  têm  taxas  de  portadores  de  0,1%  a  2%.  Nestas  regiões,  a</p><p>transmissão é geralmente por relação sexual ou uso de drogas intravenosas</p><p>(IVDAs). Os índices de portadores em áreas de</p><p>prevalência intermediária, como Japão e Singapura, são de 3% a 5%. Em áreas de alta prevalência, como o sudeste da Ásia e</p><p>a África subsaariana, os índices de portadores variam de 10% a 20%. Nas áreas de alta prevalência, a transmissão ocorre em</p><p>grande escala no período perinatal e por transmissão horizontal na infância.</p><p>A infecção pelo VHB associada à transfusão de hemoderivados era muito comum nos anos 1960, e naquela época o risco</p><p>foi  estimado  em  50%.  Atualmente  os  programas  de  rastreamento  e  limitação  de  doação  de  sangue  para  doadores</p><p>voluntários diminuíram o risco de contração do VHB pela transfusão de sangue para 1 em 63.000. A transmissão percutânea</p><p>pelo  uso  de  agulha  contaminada  é  a maior  rota  de  infecção  do  VHB,  sendo muito  comum  entre  os  usuários  de  droga</p><p>intravenosa. Nos países de baixa prevalência, a transmissão sexual é muito comum e estima‑se que nos Estados Unidos seja</p><p>responsável por cerca de 30% dos casos. Existe uma incidência particularmente elevada entre homossexuais masculinos e</p><p>homens heterossexuais com múltiplas parceiras sexuais. A  infecção perinatal pelo VHB é responsável por menos de 10%</p><p>dos casos nos Estados Unidos, mas é muito comum em áreas endêmicas, com índices de  transmissão de 90% em alguns</p><p>lugares. A transmissão horizontal entre crianças é comum e é provável que esteja relacionada com pequenas escaras na pele</p><p>ou  nas  mucosas.  O  VHB  é  o  vírus  transmitido  com maior  frequência  entre  os  profissionais  da  saúde,  e  a  transmissão</p><p>geralmente ocorre de paciente para paciente ou de paciente para profissional. O risco de transmissão com agulha tem sido</p><p>relacionado com a positividade de HBeAg. Têm sido registrados casos raros de transmissão de médico para paciente.</p><p>Nos Estados Unidos, a hepatite C, que é a causa mais comum de doença crônica do fígado, tem uma prevalência estimada</p><p>de 1,8%, sendo responsável por 3,9 milhões de pessoas infectadas. Novos casos têm ocorrido em uma população mais jovem</p><p>(20 a 39 anos), e o fator de risco mais comum é a IVDA. Os profissionais da saúde têm índices maiores como portadores do</p><p>que o público em geral. A transmissão entre profissionais da saúde é geralmente relacionada com acidentes com agulhas, e</p><p>o risco de transmissão é maior que a do VHB e do HIV. No passado, as transfusões de sangue eram as maiores fontes da</p><p>infecção pelo VHC e responsáveis por cerca de 85% dos casos. Atualmente, menos de 2% das infecções agudas são causados</p><p>por transfusões, e o risco de transmissão associada à transfusão é estimado em cerca de 1 em 10.000. Embora o VHC nunca</p><p>tenha  sido  registrado  no  sêmen,  estima‑se  que  aproximadamente  20%  das  infecções  por  esse  vírus  são  causadas  por</p><p>transmissão  sexual.  A  possibilidade  de  transmissão  sexual  parece  estar  relacionada  com  outras  doenças  sexualmente</p><p>transmissíveis.  Alguns  parceiros  sexuais  monogâmicos  que  têm  relações  sexuais  com  pessoas  infectadas  pelo  VHC</p><p>apresentam  resultado  positivo  ao  teste  do  VHC  na  ausência  de  outros  fatores  de  risco, mas  isso  é  raro.  A  transmissão</p><p>perinatal  tem  sido  assinalada,  mas  raramente.  Cerca  de  30%  a  40%  dos  casos  de  VHC  não  têm  um  fator  de  risco</p><p>identificável.</p><p>A infecção por VHD ocorre no mundo inteiro, com uma distribuição variável que se iguala à da infecção pelo VHB. Cerca</p><p>de 5% dos pacientes HBsAg positivos  também contraem a  infecção pelo VHD. A  transmissão do VHD é parenteral  e  só</p><p>pode ocorrer em pacientes previamente infectados pelo VHB.</p><p>O VHE é endêmico nas regiões sudeste e central da Ásia e ocorre com baixa frequência em outras áreas do mundo. Em</p><p>geral os distúrbios de  infecção por VHE são elevados,  afetando centenas a milhares de pessoas ao mesmo  tempo, quase</p><p>sempre após fortes chuvas e inundações. Há uma incidência particularmente alta e mortalidade elevada entre gestantes. A</p><p>transmissão  é  fecal‑oral  e  geralmente  relacionada  com  a  ingestão  de  água  ou  alimentos  contaminados. As  transmissões</p><p>pessoa a pessoa e vertical são raras.</p><p>Patogênese e Apresentação Clínica</p><p>A patogênese da lesão hepática a partir destas infecções virais não é totalmente elucidada. Para todos os vírus discutidos</p><p>nesta seção, a inflamação hepática parece ser causada por citotoxicidade direta ou fenômenos imunológicos relacionados.</p><p>Uma combinação destes dois mecanismos provavelmente seria a responsável pelas lesões hepáticas.</p><p>Os seres humanos são os únicos hospedeiros do VHA e nenhum reservatório de infecção foi identificado. Após ingestão</p><p>oral, o VHA sobrevive ao pH ácido do suco gástrico, mas o mecanismo de captação hepática não é conhecido. A infecção</p><p>pelo  VHA  resulta  na  inflamação  aguda  do  fígado  e  não  tem  uma  sequela  crônica  associada.  Os  dados  mais  recentes</p><p>sugerem que a lesão ao hepatócito é mais por uma resposta imunopatológica, em vez de hepatotoxicidade direta. A maioria</p><p>das crianças com infecção pelo VHA com menos de 2 anos de idade é assintomática, enquanto entre pacientes pediátricos</p><p>com  mais  de  5  anos,  80%  irão  apresentar  sintomas.  A  hepatite  fulminante  se  desenvolve  em  1%  a  5%  dos  casos  e  a</p><p>mortalidade é geralmente inferior a 1%.</p><p>Cerca de 70% dos pacientes com infecção aguda por VHB têm hepatite subclínica ou anictérica; os outros 30% apresentam</p><p>hepatite  ictérica. O período de  incubação por  infecção por VHB varia de um a quatro meses. A síndrome prodrômica de</p><p>aparente doença sorológica pode desenvolver‑se, e  isso é acompanhado por uma infinidade de sintomas como mal‑estar,</p><p>anorexia  e  náusea.  Os  sintomas  duram  cerca  de  10  dias  e  depois  são  seguidos  por  icterícia  em  30%  dos  pacientes.  Os</p><p>sintomas  clínicos  geralmente  desaparecem  em  três meses.  A  insuficiência  hepática  fulminante  desenvolve‑se  em  0,1%  a</p><p>0,5% dos pacientes. Cerca de 80% dos pacientes com hepatite fulminante relacionada com o VHB morrerão, a menos que o</p><p>transplante de fígado seja realizado.</p><p>O  risco  de  infecção  crônica  pelo  VHB  está  relacionado  com  a  competência  imunológica  e  a  idade.  Os  adultos</p><p>imunocompetentes apresentam um risco inferior a 5%, enquanto 30% das crianças e 90% dos bebês desenvolverão doença</p><p>crônica.  A  maioria  dos  pacientes  com  infecção  crônica  pelo  VHB  é  assintomática,  mas  alguns  podem  experimentar</p><p>exacerbações dos sintomas. Os resultados dos exames laboratoriais podem ser totalmente normais em portadores do VHB</p><p>ou  pequenas  elevações  das  transaminases  podem  ser  os  únicos  achados.  A  progressão  para  cirrose  é  marcada  pela</p><p>disfunção  da  síntese  hepática  e  pelas  frequentes  citopenias  relacionadas  com  hiperesplenismo.  Manifestações  extra‑</p><p>hepáticas da infecção pelo VHB causadas por complexos imunes circulantes ocorrem em aproximadamente 10% a 20% dos</p><p>pacientes  e  incluem poliarterite nodosa, glomerulonefrite,  crioglobulinemia essencial mista  e acrodermatite papulosa. As</p><p>sequelas da infecção por VHB crônica variam entre inexistência de cirrose, CHC, insuficiência hepática e morte. Tem sido</p><p>observado  que  pacientes  nos  quais  se  julgavam  resolvidas  suas  infecções  podem  sofrer  uma  reativação,  especialmente</p><p>durante um período de imunossupressão. Em áreas não endêmicas, o risco em longo prazo parece ser baixo, mas em áreas</p><p>endêmicas a infecção crônica por VHB é uma causa importante de morbimortalidade.</p><p>A  infecção  aguda  por  VHC  geralmente  se  apresenta  com  pequena  elevação  das  concentrações  de  enzimas</p><p>hepatocelulares. Em geral, 80% dos casos ocorrem cinco a 12 semanas após a infecção. Os sintomas ocorrem em menos de</p><p>30% dos pacientes e geralmente são tão leves e inespecíficos, que não afetam as atividades cotidianas. A icterícia ocorre em</p><p>menos de 20% dos pacientes e a falência hepática fulminante decorrente do VHC é extremamente rara. A infecção crônica</p><p>pelo VHC se desenvolve em aproximadamente dois terços dos pacientes; o outro terço parece ter resolução espontânea</p><p>da</p><p>infecção.  A  maioria  dos  pacientes  com  infecção  crônica  pelo  VHC  é  assintomática,  sem  evidência  de  doença  hepática</p><p>ostensiva e apenas apresenta concentrações das enzimas hepatocelulares levemente elevadas. Apesar deste tranquilo curso</p><p>clínico, os pacientes com infecção por VHC têm risco de desenvolver cirrose e CHC. Algumas estimativas assinalam o risco</p><p>de cirrose em 2% a 20% em um intervalo de 20 a 30 anos. A possibilidade de desenvolver CHC a partir desse estado tem</p><p>sido estimada em 1% a 4% por ano. A evolução da lesão hepática pode ser variável e vários fatores parecem afetar sua taxa.</p><p>Os  fatores  associados  à  evolução mais  rápida  incluem  sexo masculino,  idade mais  avançada  no momento  da  infecção,</p><p>imunossupressão  (p.  ex.,  infecção  pelo  HIV),  coinfecção  pelo  VHB,  consumo  moderado  de  álcool  e  obesidade.  As</p><p>manifestações extra‑hepáticas, como linfoma e doenças autoimunes, podem ocorrer com a infecção pelo VHC e relacionar‑</p><p>se com os imunocomplexos circulantes.</p><p>A manifestação clínica da infecção por VHD está relacionada com a complexa relação entre o grau da infecção por VHB e</p><p>por VHD. A coinfecção com alta expressão de VHB e VHD resulta em taxas mais altas de hepatite aguda  fulminante. A</p><p>superinfecção em portador prévio de VHB geralmente resulta em lesão hepática crônica rapidamente progressiva. Algumas</p><p>formas mais leves de infecção por VHD estão associadas à diminuição da manifestação do VHD e à supressão da infecção</p><p>pelo VHB.</p><p>A hepatite E tem um quadro histológico diferente das outras hepatites virais, e um tipo colestático de hepatite é visto em</p><p>mais de 50% dos pacientes. O VHE é introduzido oralmente, e não se sabe como atinge o fígado. O período de incubação do</p><p>VHE varia de duas a nove semanas. A apresentação mais comum da doença é a hepatite aguda ictérica; a maioria das séries</p><p>relata  icterícia  em mais de  90% dos pacientes. As  formas  assintomáticas da doença  ocorrem e,  provavelmente,  são mais</p><p>comuns que a forma ictérica, mas a real incidência não é conhecida. Em geral, a doença é autolimitada, mas a insuficiência</p><p>hepática fulminante pode ocorrer em um pequeno percentual de pacientes. No total, é provável que a taxa de mortalidade</p><p>seja  significativamente  inferior  a  1%. As mulheres  grávidas  tendem  a  apresentar  uma  evolução  clínica mais  grave,  com</p><p>taxas de mortalidade que variam de 5% a 25%.</p><p>Prevenção</p><p>A  profilaxia  da  infecção  por  VHA  depende  de  medidas  sanitárias  e  da  administração  de  imunoglobulina  (Ig).  O</p><p>desenvolvimento de vacinas contra o VHA seguras e eficazes, no entanto, fez o uso da pré‑exposição à Ig desnecessário. A</p><p>imunoglobulina sérica ainda é a terapia mais eficaz para a profilaxia pós‑exposição e pode ser administrada com segurança</p><p>para  a  imunização  ativa.  Nos  Estados  Unidos,  os  Centers  for  Disease  Control  and  Prevention  (CDC)  recomendaram</p><p>recentemente a vacinação universal de crianças com base na segurança e eficácia da vacina em populações de alto risco. Os</p><p>pesquisadores de saúde pública estão investigando planos de vacinação para erradicar a infecção por VHA nas populações</p><p>de alto risco em nível mundial, no entanto as análises de custo‑benefício não sustentaram esse tipo de conduta. Da mesma</p><p>forma, a profilaxia da infecção por VHE tem como foco as medidas sanitárias, em particular as estratégias direcionadas à</p><p>água que se bebe. Infelizmente, VHE Ig não foi bem‑sucedido na prevenção pré‑exposição e/ou pós‑ ‑exposição da infecção</p><p>por VHE, enquanto os anticorpos anti‑VHE parecem ser eficazes para atenuar a síndrome clínica. As vacinas para infecção</p><p>por VHE foram desenvolvidas e avaliadas em ensaios clínicos.</p><p>Avanços notáveis  foram feitos na prevenção da  infecção pelo VHB. No passado, a prevenção da  infecção por VHB era</p><p>limitada  à  imunização  passiva  com  imunoglobulina  contendo  altos  títulos  de  anticorpo  para  HBsAg.  Atualmente,  a</p><p>imunização  com  imunoglobulina  só  é  usada  na  profilaxia  pós‑exposição.  As  vacinas  que  contêm  HBsAg  foram</p><p>desenvolvidas com um perfil de boa segurança e eficácia. Estas vacinas são utilizadas primeiramente para a profilaxia pré‑</p><p>exposição,  mas  também  podem  ser  usadas  em  uma  situação  pós‑exposição,  juntamente  com  Ig.  A  vacinação  VHB  é</p><p>recomendada para grupos de alto risco, como os profissionais da saúde. Também existem programas de vacinação do VHB</p><p>para prevenir a transmissão perinatal; atualmente, todas as crianças de 11 ou 12 anos de idade devem ser vacinadas, se isso</p><p>não  foi  feito anteriormente. Foram desenvolvidas vacinas alicerçadas no DNA de VHB, e a vacina combinada de VHB e</p><p>VHA foi  aprovada pela U. S. Food and Drug Administration  (FDA) em 2001. Embora nenhuma vacina esteja disponível</p><p>para infecção por VHD, a prevenção efetiva para infecção por VHB previne a infecção por VHD.</p><p>A única estratégia preventiva eficaz para a infecção por VHC é baseada nos princípios de saúde pública voltados para os</p><p>grandes  fatores  de  risco  de  transmissão.  Formalmente  preparada,  a  imunoglobulina  anti‑VHC  tem  sido  avaliada  em</p><p>inúmeros  estudos  e  jamais  comprovou  evitar  a  hepatite  não A  e  não  B  relacionadas  com  as  transfusões. Atualmente,  o</p><p>rastreamento dos doadores de sangue tornou esta questão  irrelevante.  Infelizmente, em decorrência de vários obstáculos,</p><p>uma vacina bem‑sucedida contra o VHC ainda não foi desenvolvida.</p><p>Tratamento</p><p>O tratamento da infecção por VHA ou VHE é de suporte e geralmente tem como objetivos a correção da desidratação e a</p><p>provisão  de  absorção  calórica  adequada.  Embora  a  fadiga  possa  demandar  períodos  significativos  de  repouso,  a</p><p>hospitalização geralmente não é necessária, exceto em casos de insuficiência hepática fulminante.</p><p>O tratamento da infecção por VHB é recomendado para pacientes com doença ativa crônica. As duas terapias aprovadas</p><p>são  interferon‑α  e  o  análogo  da  lamivudina  nucleosídea.  O  interferon‑α  é  um  agente  imunomodulador  com  algumas</p><p>propriedades antivirais que pode induzir uma resposta virológica em 35% a 40% dos pacientes. O benefício em longo prazo</p><p>com a terapia com interferon‑α não está definitivamente comprovado. Muitos nucleosídeos análogos para o tratamento da</p><p>infecção por VHB têm sido desenvolvidos e é provável que atuem pela  inibição da síntese de DNA. Eles  têm  índices de</p><p>resposta  viral  similares  aos  do  interferon‑α,  não  são  onerosos,  são  administrados  via  oral  e  apresentam  poucos  efeitos</p><p>colaterais. Por outro lado, os nucleosídeos análogos sempre demandam uma terapia de longa duração (> 1 ano) e tem sido</p><p>registrado o desenvolvimento de mutantes resistentes de VHB. Estudos randomizados mostraram que a lamivudina oral foi</p><p>eficaz na redução do risco de progressão da cirrose e do CHC. Novos agentes antivirais estão em desenvolvimento e são</p><p>passíveis de melhorar os resultados.</p><p>Nos últimos 20 anos ocorreram importantes avanços no tratamento da infecção pelo VHC. O benefício de utilização do</p><p>interferon‑α no tratamento das hepatites não A e não B foi mostrado na íntegra em 1986, antes da descoberta do VHC. Com</p><p>o atual regime de tratamento com interferon‑α, uma resposta viral completa (definida como a perda sustentada do RNA</p><p>sérico viral) ocorre em 12% a 20% dos pacientes. A adição de ribavirina ao interferon‑α resultou em índices de respostas</p><p>positivas de 35% a 45%. Nos estudos mais recentes, o tratamento PEG‑interferon‑α e ribavirina por 48 semanas resultou em</p><p>depuração viral em 55% dos pacientes. O genótipo específico parece ser preditor da resposta com alguns tipos resultando</p><p>em taxas de resposta de 80% e outros, de 45%. Recaídas podem sobrevir, mas geralmente ocorrem com a monoterapia ou na</p><p>redução  do  curso  da  terapia.  Como  a  terapia  com  interferon‑α  apresenta  efeitos  colaterais  significativos,  controvérsias,</p><p>como as indicações de tratamento e doses/duração ideais de tratamento, ainda estão sendo avaliadas.</p><p>Leitura sugerida</p><p>Blumgart LH. Video atlas: Liver, biliary and pancreatic surgery.</p><p>Philadelphia: Elsevier; 2011.</p><p>Uma revisão clínica abrangente da anatomia hepatobiliar. O texto é especificamente orientado em direção à cirurgia do</p><p>fígado  e  da  árvore  biliar.  Abrange  anatomia,  fisiopatologia,  imunologia,  biologia  molecular,  genética,  diagnóstico  e</p><p>tratamento.  Além  disso,  é  acompanhada  por  um  DVD  com  vídeos  detalhados  dos  procedimentos  laparoscópicos,</p><p>permitindo efetivamente usá‑lo como um atlas cirúrgico.</p><p>Blumgart LH. Surgery of the liver, biliary tract, and pancreas. ed 5 Philadelphia: Elsevier; 2012.</p><p>Este  videoatlas  inclui  uma  extensa  biblioteca  de  vídeos  narrados  e  legendados  que  apresentam  histórico,  evidência</p><p>radiológica e procedimentos cirúrgicos para cirurgias hepática e biliar. Também inclui abordagens laparoscópicas para</p><p>ressecções hepáticas.</p><p>Bruix J, Sherman M. American Association for the Study of Liver Disease Management of hepatocellular carcinoma: An</p><p>update. Hepatology. 2011;53:1020–1022.</p><p>Esta é uma atualização das diretrizes originais da AASLD no tratamento do carcinoma hepatocelular.</p><p>Fong Y, Fortner J, Sun RL, et al. Clinical score for predicting recurrence after hepatic resection for metastatic colorectal cancer:</p><p>Analysis of 1001 consecutive cases. Ann Surg. 1999;230:309–318.</p><p>No momento da publicação, esta  foi a maior série de única  instituição de ressecção hepática por metástase de câncer</p><p>colorretal.  Um  sistema  de  classificação  dos  prognósticos  muito  útil  é  apresentado  e  permanece  extremamente</p><p>importante na avaliação atual dos pacientes.</p><p>Foster JH, Berman MM. Solid liver tumors. Philadelphia: WB Saunders; 1977.</p><p>Uma clássica e abrangente monografia que contém uma história completa da cirurgia hepática.</p><p>Herrera JL. Management of acute variceal bleeding. Clin Liver Dis. 2014;18:347–357.</p><p>Este artigo de revisão discute o tratamento do sangramento varicoso com especial ênfase no papel adequado de várias</p><p>modalidades de tratamento na era atual e em quando escalonar a terapia e avançar para o estágio seguinte.</p><p>House MG, Ito H, Gonen M. Survival after hepatic resection for metastatic colorectal cancer: Trends in outcomes for 1,600 patients</p><p>during two decades at a single institution. J Am Coll Surg. 2010;210:744–752.</p><p>Este estudo analisa os fatores associados às diferenças nos resultados em longo prazo após ressecção hepática por câncer</p><p>colorretal metastático. Apesar da piora das características clínicas e patológicas, as  taxas de sobrevida após  ressecção</p><p>hepática por metástase colorretal melhoraram, o que pode ser atribuído a melhorias na seleção, tratamento cirúrgico e</p><p>quimioterapia.</p><p>Jang HJ, Yu H, Kim TK. Imaging of focal liver lesions. Semin Roentgenol. 2009;44:266–282.</p><p>As  modalidades  de  imagem  são  a  base  no  diagnóstico  e  na  diferenciação  de  várias  lesões  hepáticas  focais.  Esta</p><p>monografia  cobre  os  elementos  fundamentais  da  ultrassonografia,  tomografia  computadorizada  e  ressonância</p><p>magnética de lesões focais hepáticas.</p><p>Jarnagin WR, Gonen M, Fong Y. Improvement in perioperative outcome after hepatic resection: Analysis of 1,803 consecutive cases</p><p>over the past decade. Ann Surg. 2002;236:397–406.</p><p>Uma das maiores séries de ressecções hepáticas que mostra a notável melhora nos resultados peroperatórios.</p><p>Kelly K, Weber SM. Cystic diseases of the liver and bile ducts. J Gastrointest Surg. 2014;18:627–634: quiz 634.</p><p>Este artigo de revisão cobre o diagnóstico e o tratamento da doença hepática cística, incluindo doença hidática.</p><p>Leung U, Fong Y. Robotic liver surgery. Hepatobiliary Surg Nutr. 2014;3:288–294.</p><p>Este manuscrito revê o papel e a evolução da robótica na era atual da cirurgia hepática minimamente invasiva.</p><p>Llovet JM, Ricci S, Mazzaferro V, et al. Sorafenib in advanced hepatocellular carcinoma. N Engl J Med. 2008;359:378–390.</p><p>A  primeira  fase  3  do  teste  clínico  aleatório  em  pacientes  com  carcinoma  hepatocelular  avançado  que  mostrou  um</p><p>benefício da média de sobrevida melhor e o tempo de progressão radiológica para pacientes tratados com um agente</p><p>quimioterápico em comparação com pacientes que receberam placebo.</p><p>Mi�al S, El‑Serag HB. Epidemiology of hepatocellular carcinoma: Consider the population. J Clin</p><p>Gastroenterol. 2013;47(Suppl):S2–S6.</p><p>Uma revisão concisa e abrangente sobre o tema.</p><p>Ochsner A, DeBakey M, Murray S. Pyogenic abscess of the liver. Am J Surg. 1938;40:292–319.</p><p>Um estudo  clássico de  referência  em abscessos piogênicos do  fígado. Essa  foi  a primeira  tentativa  séria para  estudar</p><p>abscessos hepáticos e chegou à era moderna do tratamento.</p><p>Sandhu BS, Sanyal AJ. Management of ascites in cirrhosis. Clin Liver Dis. 2005;9:715–732.</p><p>Esta é uma revisão abrangente, excelente e prática do tratamento da ascite em pacientes com cirrose.</p><p>Referências Bibliográficas</p><p>1. Tsung A, Geller DA, Sukato DC, et al. Robotic versus laparoscopic hepatectomy: A matched</p><p>comparison. Ann Surg. 2014;259:549–555.</p><p>2. Biernat J, Pawlik WW, Sendur R, et al. Role of afferent nerves and sensory peptides in the mediation</p><p>of hepatic artery buffer response. J Physiol Pharmacol. 2005;56:133–145.</p><p>3. de Franchis R. Revising consensus in portal hypertension: Report of the Baveno V consensus</p><p>workshop on methodology of diagnosis and therapy in portal hypertension. J</p><p>Hepatol. 2010;53:762–768.</p><p>4. Garcia‑Tsao G, Bosch J. Management of varices and variceal hemorrhage in cirrhosis. N Engl J</p><p>Med. 2010;362:823–832.</p><p>5. Bureau C, Garcia‑Pagan JC, Otal P, et al. Improved clinical outcome using polytetrafluoroethylene‑</p><p>coated stents for TIPS: Results of a randomized study. Gastroenterology. 2004;126:469–475.</p><p>6. Orloff MJ, Orloff MS, Orloff SL, et al. Three decades of experience with emergency portacaval shunt</p><p>for acutely bleeding esophageal varices in 400 unselected patients with cirrhosis of the liver. J Am Coll</p><p>Surg. 1995;180:257–272.</p><p>7. Bernard B, Lebrec D, Mathurin P, et al. Beta‑adrenergic antagonists in the prevention of</p><p>gastrointestinal rebleeding in patients with cirrhosis: A meta‑analysis. Hepatology. 1997;25:63–70.</p><p>8. Villanueva C, Minana J, Ortiz J, et al. Endoscopic ligation compared with combined treatment with</p><p>nadolol and isosorbide mononitrate to prevent recurrent variceal bleeding. N Engl J</p><p>Med. 2001;345:647–655.</p><p>9. de la Pena J, Brullet E, Sanchez‑Hernandez E, et al. Variceal ligation plus nadolol compared with</p><p>ligation for prophylaxis of variceal rebleeding: A multicenter trial. Hepatology. 2005;41:572–578.</p><p>10. Funakoshi N, Segalas‑Largey F, Duny Y, et al. Benefit of combination beta‑blocker and endoscopic</p><p>treatment to prevent variceal rebleeding: A meta‑analysis. World J Gastroenterol. 2010;16:5982–5992.</p><p>11. Fong Y, Wong J. Evolution in surgery: Influence of minimally invasive approaches on the hepatobiliary</p><p>surgeon. Surg Infect (Larchmt). 2009;10:399–406.</p><p>12. Meddings L, Myers RP, Hubbard J, et al. A population‑based study of pyogenic liver abscesses in the</p><p>United States: Incidence, mortality, and temporal trends. Am J Gastroenterol. 2010;105:117–124.</p><p>13. Lai HC, Lin CC, Cheng KS, et al. Increased incidence of gastrointestinal cancers among patients with</p><p>pyogenic liver abscess: A population‑based cohort study. Gastroenterology. 2014;146:129–137:e1.</p><p>14. Salles JM, Salles MJ, Moraes LA, et al. Invasive amebiasis: An update on diagnosis and</p><p>management. Expert Rev Anti Infect Ther. 2007;5:893–901.</p><p>15. Mezhir J, Fong Y, Jacks L, et al. Current management of pyogenic liver abscess: Surgery is now second‑</p><p>line treatment. J Am Coll Surg. 2010: 975–983.</p><p>16. Wuerz T, Kane JB, Boggild AK, et al. A review of amoebic liver abscess for clinicians in a nonendemic</p><p>se�ing. Can J Gastroenterol. 2012;26:729–733.</p><p>17. Haque R, Mollah NU, Ali IK, et al. Diagnosis of amebic liver abscess and intestinal infection with the</p><p>TechLab Entamoeba histolytica II antigen detection and antibody tests. J Clin</p><p>Microbiol. 2000;38:3235–3239.</p><p>18. Benede�i NJ, Desser TS, Jeffrey RB. Imaging of hepatic infections. Ultrasound Q. 2008;24:267–278.</p><p>19. Chavez‑Tapia NC, Hernandez‑Calleros</p><p>J, Tellez‑Avila FI, et al. Image‑guided percutaneous procedure</p><p>plus metronidazole versus metronidazole alone for uncomplicated amoebic liver abscess. Cochrane</p><p>Database Syst Rev. 2009;(1):CD004886.</p><p>20. Nunnari G, Pinzone MR, Gru�adauria S, et al. Hepatic echinococcosis: Clinical and therapeutic</p><p>aspects. World J Gastroenterol. 2012;18:1448–1458.</p><p>21. Agayev RM, Agayev BA. Hepatic hydatid disease: Surgical experience over</p><p>15 years. Hepatogastroenterology. 2008;55:1373–1379.</p><p>22. Dziri C, Haouet K, Fingerhut A, et al. Management of cystic echinococcosis complications and</p><p>dissemination: Where is the evidence? World J Surg. 2009;33:1266–1273.</p><p>23. Brune�i E, Kern P, Vui�on DA. Expert consensus for the diagnosis and treatment of cystic and</p><p>alveolar echinococcosis in humans. Acta Trop. 2010;114:1–16.</p><p>90</p><p>91</p><p>92</p><p>As artérias hepáticas direitas substitutas ou acessórias originam‑se da AMS numa proporção que varia de 11% a</p><p>21%. Neste caso, o vaso substituto ou acessório passa por trás da cabeça do pâncreas, posteriormente à veia porta no espaço</p><p>porto‑cava. A artéria hepática direita, em seu padrão normal de ramificação, também pode cursar anteriormente ao ducto</p><p>hepático comum. Uma artéria hepática esquerda substituta ou acessória está presente em 3,8% a 10% das vezes, originando‑</p><p>se  da  artéria  gástrica  esquerda  e  cursa  no  interior  do  omento  menor  em  direção  à  cissura  umbilical.  Outras  variações</p><p>importantes incluem a origem da artéria gastroduodenal, a qual já foi observada originando‑se da artéria hepática direita e,</p><p>ocasionalmente,  duplicada.  A  anatomia  da  artéria  cística  também  é  variável;  o  conhecimento  destas  variações  é  de</p><p>particular importância na execução da colecistectomia (Fig. 53‑12). Uma artéria cística acessória pode se originar da artéria</p><p>hepática comum ou da artéria gastroduodenal, onde cursa anteriormente ao ducto biliar. A artéria cística pode se originar</p><p>em qualquer lugar da artéria hepática comum, da artéria gastroduodenal ou diretamente do tronco celíaco. Estas variantes</p><p>das  artérias  císticas  podem  cursar  anteriormente  ao  ducto  biliar  e  não  estão  necessariamente  presentes  no  triângulo  de</p><p>Calot.  Todas  essas  variações  na  anatomia  arterial  hepática  têm uma  grande  importância  nas  ressecções  hepáticas  ou  na</p><p>execução de procedimentos de radiologia intervencionista.</p><p>FIGURA 53­11  A anatomia variável da artéria hepática é demonstrada. A artéria hepática comum pode­se</p><p>originar da artéria mesentérica superior (AMS), e não do tronco celíaco. Uma artéria hepática substituta ou</p><p>acessória origina­se da AMS e corre posterior à cabeça do pâncreas, para a direita da veia porta e atrás do ducto</p><p>biliar comum, no interior do hilo. Uma artéria hepática esquerda substituta ou acessória origina­se da artéria</p><p>gástrica esquerda e corre pelo omento menor na fissura umbilical. (Netter FH: Netter anatomy</p><p>collection. www.netterimages.com. © Elsevier Inc. Todos os direitos reservados.)</p><p>FIGURA 53­12  Variações na anatomia da artéria cística são demonstradas. A, Anatomia mais comum. B,</p><p>Artéria cística dupla – uma originada da artéria hepática própria. C, Origem da artéria hepática própria e cursando</p><p>anterior ao ducto biliar. D, Originando­se da artéria hepática direita e cursando anterior ao ducto biliar. E,</p><p>Originando­se da artéria hepática esquerda e cursando anterior ao ducto biliar. F, Originando­se da artéria</p><p>gastroduodenal. G, Originando­se do tronco celíaco. H, Originando­se de uma artéria hepática direita</p><p>acessória. (De Blumgart LH, Hann LE: Surgical and radiologic anatomy of the liver and biliary tract. In Blumgart LH, Fong Y,</p><p>editors: Surgery of the liver and biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 3–34.)</p><p>Veias hepáticas</p><p>As três principais veias hepáticas drenam da superfície posterossuperior do fígado diretamente para a VCI (Figs. 53‑4 a 53‑</p><p>6). A veia hepática direita cursa na cissura direita (entre os segmentos anteriores e posteriores do fígado direito) e drena a</p><p>maior parte do fígado direito tendo um curto (1 cm) trajeto extra‑hepático no lado direito da VCI. Na maioria das vezes, as</p><p>veias hepáticas esquerda e média juntam‑se na intimidade do parênquima e entram no lado esquerdo da VCI como um vaso</p><p>único, embora em alguns casos possam entrar separadamente. A veia hepática esquerda cursa na cissura esquerda, entre os</p><p>segmentos 2 e 3,  e drena os  segmentos 2 e 3; a veia hepática média cursa na cissura portal entre o segmento 4 e o  setor</p><p>anterior do fígado direito, composto pelos segmentos 5 e 8, e drena o segmento 4 e uma parte do setor anterior do fígado</p><p>direito.  A  veia  umbilical  (veia  adicional)  cursa  por  baixo  do  ligamento  falciforme,  entre  as  veias  esquerda  e  média,  e</p><p>costuma  afluir  para  a  veia  hepática  esquerda.  Um  número  de  pequenos  ramos  venosos  posteriores  derivados  do  setor</p><p>posterior direito e do lobo caudado drena diretamente na VCI. Comumente encontra‑se uma veia hepática direita acessória</p><p>substancial  localizada inferiormente. Muitas vezes há também uma tributária venosa a partir do lobo caudado que drena</p><p>superiormente para a veia hepática esquerda.</p><p>Sistema biliar</p><p>Os  ductos  biliares  intra‑hepáticos  constituem  as  porções  terminais  dos  ramos  ductais  hepáticos  direito  e  esquerdo  que</p><p>invaginam  da  cápsula  de  Glisson  no  hilo,  juntamente  com  a  veia  porta  correspondente  e  ramos  da  artéria  hepática,</p><p>formando a cobertura peritoneal da tríade portal, também conhecida como pedículos portais. Juntamente com este pedículo</p><p>portal intra‑hepático, os ramos ductais biliares situam‑se superiormente à veia porta, enquanto os ramos arteriais hepáticos</p><p>correm inferiormente. O ducto hepático esquerdo drena os segmentos 2, 3 e 4, que constituem o fígado esquerdo. Os ramos</p><p>ductais do fígado esquerdo juntam‑se para formar o ducto principal esquerdo na base da cissura umbilical, onde cursa em</p><p>sentido  transversal,  em  direção  à  base  do  segmento  4,  para  se  juntar  ao  ducto  hepático  direito  no  hilo.  Em  sua  porção</p><p>transversal, o ducto hepático esquerdo drena de um a três pequenos ramos do segmento 4. O ducto hepático direito drena o</p><p>fígado  direito  e  é  formado  pela  união  entre  o  ducto  setorial  anterior  (que  drena  os  segmentos  5  e  8)  e  o  ducto  setorial</p><p>posterior (que drena os segmentos 6 e 7). O ducto setorial posterior cursa na direção horizontal posterior, enquanto o ducto</p><p>setorial anterior cursa verticalmente. O ducto hepático direito principal bifurca‑se bem acima do ramo D da veia porta. O</p><p>ducto  hepático  direito,  que  é  bem  curto,  encontra  o  ducto  hepático  esquerdo  (mais  longo),  formando  uma  confluência</p><p>anterior  ao  ramo  direito  da  veia  porta  e  constituindo  o  ducto  hepático  comum. O  lobo  caudado  (segmento  1)  tem  sua</p><p>própria drenagem biliar,  que  é  geralmente pelos  sistemas direito  e  esquerdo,  no  entanto,  em  até  15% dos  indivíduos,  a</p><p>drenagem é feita pelo sistema esquerdo e, em 5%, pelo sistema direito.</p><p>O ducto hepático comum drena  inferiormente. Abaixo do ponto de emersão do ducto cístico, é  referido como o ducto</p><p>biliar comum (colédoco). O ducto biliar comum geralmente mede de 10 a 15 cm de comprimento e tem, em média, até 6 mm</p><p>de diâmetro. O colédoco cursa no lado direito do ligamento hepatoduodenal (borda livre do omento menor), à direita da</p><p>artéria hepática e anterior à veia porta. O colédoco continua  inferiormente por  trás da primeira porção do duodeno e na</p><p>cabeça  do  pâncreas  em  direção  inferior  e  levemente  à  direita.  O  colédoco  distal  intrapancreático  junta‑se  com  o  ducto</p><p>pancreático  principal  (Wirsung),  formando  ou  não  um  canal  comum,  e  penetra  na  segunda  porção  do  duodeno  pela</p><p>papila major  duodenal  ou  ampola  de  Vater.  Na  junção  coledocoduodenal,  um  aparelho muscular  complexo,  conhecido</p><p>como esfíncter de Oddi, regula o fluxo biliar e previne o refluxo do conteúdo duodenal para a árvore biliar. Este esfíncter é</p><p>composto por três partes: (1) o esfíncter coledocociano, que é um músculo circular que regula o fluxo biliar e o esvaziamento</p><p>da vesícula biliar; (2) o esfíncter pancreático, presente em graus variáveis, que circunda o ducto pancreático intraduodenal;</p><p>e (3) o esfíncter ampolar, que é constituído de um músculo longitudinal, o qual previne o refluxo duodenal.</p><p>A vesícula biliar é um reservatório de bile  localizado na superfície  inferior dos segmentos 4 e 5 do fígado, usualmente</p><p>fazendo  uma  impressão  na  superfície  do  fígado. Um  folheto  peritoneal  cobre  a maior  parte  da  vesícula  biliar,  exceto  a</p><p>porção aderente ao fígado. Aqui, a vesícula biliar se adere ao fígado por uma camada de tecido fibroconectivo conhecida</p><p>como  placa  cística,  uma  extensão  da  placa  hilar  (Fig.  53‑7).  A  vesícula  biliar  é  variável  em</p><p>tamanho,  mas  tem</p><p>aproximadamente 10 cm de comprimento e 3 a 5 cm de largura, sendo composta por fundo, corpo, infundíbulo e colo, que</p><p>continua  como ducto  cístico.  Em  geral  o  fundo  projeta‑se  além  da  borda  do  fígado  anteriormente  e  a  vesícula,  quando</p><p>dobrada sobre si mesma, é definida como um “barrete frígio”. Continuando na direção do ducto biliar, o corpo da vesícula</p><p>biliar  localiza‑se próximo da segunda porção do duodeno e do cólon  transverso. O  infundíbulo  (ou bolsa de Hartmann)</p><p>inclina‑se para diante ao longo da borda livre do omento menor e pode recobrir o ducto cístico. A porção da vesícula biliar</p><p>entre o infundíbulo e o ducto cístico é referida como colo. O ducto cístico é variável em seu comprimento, curso e inserção</p><p>na via biliar principal. A primeira porção do ducto cístico geralmente é tortuosa e contém duplicaçõesmucosas conhecidas</p><p>como válvulas espirais (Heister) que regulam o enchimento e o esvaziamento da vesícula biliar. Em geral, o cístico se junta</p><p>ao ducto hepático para formar o ducto biliar comum.</p><p>O conhecimento das múltiplas e frequentes variações na anatomia da árvore biliar é imprescindível para a realização de</p><p>procedimentos  hepatobiliares.  As  anomalias  da  confluência  ductal  hepática  são  comuns  e  estão  presentes  em</p><p>aproximadamente  um  terço  dos  pacientes.  As  anomalias  mais  comuns  da  confluência  biliar  envolvem  variações  na</p><p>drenagem dos ductos setoriais direitos. Geralmente este é o ducto setorial posterior. A confluência pode ser uma trifurcação</p><p>do ducto setorial anterior direito, do ducto setorial posterior direito e dos ductos hepáticos esquerdos. Cada um dos ductos</p><p>setoriais direitos pode drenar no ducto hepático esquerdo, ducto hepático comum, ducto cístico ou, raramente, na vesícula</p><p>biliar (Fig. 53‑13).</p><p>FIGURA 53­13  Variações da confluência do ducto hepático. A, Anatomia mais comum. B, Trifurcação na</p><p>confluência. C, Ambos os ductos setoriais direitos drenam no ducto hepático comum. D, Ambos os ductos</p><p>setoriais direitos drenam para o ducto hepático esquerdo. E, Ausência de uma confluência do ducto hepático. F,</p><p>Ausência do ducto hepático direito e drenagem do ducto setorial posterior direito para o ducto cístico. (De Blumgart</p><p>LH, Hann LE: Surgical and radiologic anatomy of the liver and biliary tract. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and</p><p>biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 3–34.)</p><p>As  anomalias  da  vesícula  biliar  são  raras. A  agenesia  da  vesícula  biliar,  a  vesícula  bilobular  com um ou dois  ductos,</p><p>septações e o divertículo congênito da vesícula biliar têm sido descritos. As anomalias da localização da vesícula biliar são</p><p>mais  comuns  e  incluem  uma  posição  intra‑hepática  e, mais  raramente,  podem  aparecer  no  lado  esquerdo  do  fígado. A</p><p>vesícula biliar também pode ter um pedículo mesentérico que predisponha à torção.</p><p>A posição e a conexão do ducto cístico no sistema ductal principal são variáveis. Os ductos císticos duplos drenando uma</p><p>vesícula biliar unilocular e a drenagem nos ramos de ductos hepáticos já foram registrados. Geralmente o ducto cístico se</p><p>junta ao ducto hepático comum em um determinado ângulo, mas pode correr paralelo e conectá‑lo de maneira mais distal;</p><p>na última situação, o ducto cístico pode se fundir ao ducto hepático, ao longo do seu curso paralelo, pela conexão com o</p><p>tecido conjuntivo interposto. O ducto cístico também pode seguir um curso espiral anterior ou posteriormente e se conectar</p><p>com  o  lado  esquerdo  do  ducto  hepático.  Finalmente,  o  ducto  cístico  pode  ser muito  curto,  ou  até mesmo  estar  ausente</p><p>(Fig. 53‑14).</p><p>FIGURA 53­14  Variações na anatomia da vesícula biliar e do ducto cístico. A, Vesícula bilobular. B, Septações</p><p>da vesícula biliar. C, Divertículo da vesícula biliar. D, Variações na anatomia do ducto cístico. Os três tipos de</p><p>união dos ductos cístico e hepático comum estão ilustrados. (De Blumgart LH, Hann LE: Surgical and radiologic anatomy</p><p>of the liver and biliary tract. In Blumgart LH, Fong Y, editors: Surgery of the liver and biliary tract, London, 2000, WB Saunders, pp 3–</p><p>34.)</p><p>O  ducto  biliar  infra‑hilar  e  supraduodenal  são  predominantemente  supridos  por  dois  vasos  axiais  que  seguem  nas</p><p>posições  de  3  e  9  horas.  Os  vasos  têm  origem  nas  artérias  pancreaticoduodenal  superior,  hepática  direita,  cística,</p><p>gastroduodenal  e  retroduodenal. Estimou‑se que apenas  2% do  suprimento arterial para  esta porção do ducto biliar  são</p><p>segmentares  e  derivam  diretamente  da  artéria  hepática  comum.  O  ducto  biliar  e  sua  bifurcação  no  hilo  obtêm  seu</p><p>suprimento arterial de uma rica rede de múltiplos pequenos ramos dos vasos circundantes. Da mesma forma, o ducto biliar</p><p>retropancreático obtém seu suprimento arterial da artéria retroduodenal, que fornece uma rica rede de múltiplos pequenos</p><p>ramos (Fig. 53‑15). A drenagem venosa do ducto biliar assemelha‑se ao suprimento arterial e drena para o sistema venoso</p><p>portal. A drenagem venosa da vesícula biliar escoa para as veias que drenam o ducto biliar e não flui diretamente para a</p><p>veia porta.</p><p>FIGURA 53­15  O suprimento sanguíneo para os ductos biliar e hepático comum é ilustrado: artéria hepática</p><p>direita (a); artéria 09:00 (b); artéria retroduodenal (c); artéria hepática esquerda (d); artéria hepática própria (e);</p><p>artéria 03:00 (f); artéria hepática comum (g); artéria gastroduodenal (h). (De Blumgart LH, Hann LE: Surgical and</p><p>radiologic anatomy of the liver and biliary tract. In Blumgart LH, Fong Y, editors:Surgery of the liver and biliary tract, London, 2000,</p><p>WB Saunders, pp 3–34.)</p><p>Nervos</p><p>A inervação do fígado e do trato biliar é de via fibras simpáticas originárias de T7 até T10, bem como fibras parassimpáticas</p><p>de ambos os nervos vagos. As fibras simpáticas passam através dos gânglios celíacos, liberando as fibras pós‑ganglionares</p><p>para o  fígado e os ductos biliares. O gânglio  celíaco do  lado direito e o nervo vago direito  formam um plexo de nervos</p><p>hepáticos  anteriores  que  acompanham  a  artéria  hepática.  O  gânglio  celíaco  do  lado  esquerdo  e  o  nervo  vago  esquerdo</p><p>formam um plexo  hepático  posterior  que  cursa  posteriormente  ao  ducto  biliar  e  a  veia  porta. As  artérias  hepáticas  são</p><p>supridas pelas fibras  simpáticas,  enquanto  a  vesícula  biliar  e  os ductos  biliares  extra‑hepáticos  recebem a  inervação das</p><p>fibras simpáticas e parassimpáticas. A importância clínica destes nervos ainda não é bem compreendida. A distensão aguda</p><p>do fígado e, consequentemente, da cápsula de Glisson podem resultar em dor no quadrante superior direito, que pode ser</p><p>referida no ombro direito consequente à irritação do nervo frênico diafragmático.</p><p>Linfáticos</p><p>Grande  parte  da  drenagem do  fígado  é  feita  para  os  linfonodos  do  ligamento  hepatoduodenal.  A  partir  deste  ponto,  a</p><p>drenagem linfática se faz ao longo da artéria hepática para os linfonodos celíacos e daí para a cisterna linfática (cisterna de</p><p>Piquet). A drenagem linfática  também pode seguir as veias hepáticas para os  linfonodos da área supra‑hepática e para a</p><p>região  do  hiato  diafragmático.  Em  geral,  a  drenagem  linfática  da  vesícula  biliar  e  da maior  parte  do  trato  biliar  extra‑</p><p>hepático é feita para os linfonodos do ligamento hepatoduodenal. Essa drenagem pode seguir ao longo da artéria hepática</p><p>para os linfonodos do tronco celíaco, mas também pode fluir para os linfonodos atrás da cabeça do pâncreas ou para o do</p><p>sulco aortocaval.</p><p>Anatomia Microscópica</p><p>Unidade funcional do fígado</p><p>A organização do parênquima hepático nas unidades  funcionais microscópicas  tem  sido descrita de várias maneiras  e  é</p><p>conhecida como ácino ou lóbulo (Fig. 53‑16), conforme conceituado por Rappaport e, mais recentemente, modificada por</p><p>Matsumoto  e  Kawakami.  Um  lóbulo  consta  de  uma  vênula  hepática  central  terminal  envolta  por  quatro  a  seis  tríades</p><p>portais terminais, formando uma unidade poligonal que é revestida, na sua periferia,</p><p>por ramos da tríade portal terminal.</p><p>Entre as tríades portais terminais e a vênula hepática central, os hepatócitos são dispostos em placas, na espessura de uma</p><p>célula,  envolta  em  cada  um  dos  lados  pelo  endotélio  e  sinusoides  repletos  de  sangue.  O  sangue  flui  pela  tríade  portal</p><p>terminal  por  meio  dos  sinusoides  para  a  vênula  hepática  terminal.  A  bile  é  formada  nos  hepatócitos  e  flui  para  os</p><p>canalículos terminais, que se formam nas paredes laterais do hepatócito intercelular. Estas finalmente coalescem em ductos</p><p>biliares e fluem na direção das tríades portais. Esta unidade hepática funcional constitui a base estrutural para as muitas</p><p>funções secretoras e metabólicas do fígado.</p><p>FIGURA 53­16  Ilustração esquemática de um lóbulo hepático visto como uma unidade poliédrica</p><p>tridimensional. As tríades portais terminais (artéria hepática, veia porta e ducto biliar) estão em cada canto e dão</p><p>origem aos ramos ao longo das laterais do lóbulo. Os hepatócitos são em lâminas de célula única com</p><p>sinusoides em cada extremidade alinhados radialmente em direção a uma vênula hepática central. (De Netter FH:</p><p>Netter anatomy collection. www.netterimages.com. © Elsevier Inc. Todos os direitos reservados.)</p><p>Entre a tríade portal terminal e a vênula hepática central existem três zonas que diferem na sua composição enzimática,</p><p>bem  como  na  exposição  ao  sangue  oxigenado  e  nutrientes.  Há  questionamentos  sobre  a  forma  dessas  zonas  e  seu</p><p>relacionamento com a unidade básica lobular, mas, em geral, as zonas 1 a 3 se afastam da tríade portal terminal em direção</p><p>à vênula hepática central. A zona 1 (periportal) é um ambiente rico em nutrientes e oxigênio; as zonas 2 (intermediária) e 3</p><p>(perivenular)  são  expostas  a  ambientes  mais  pobres  em  oxigênio  e  nutrientes.  As  células  das  demais  zonas  diferem</p><p>enzimaticamente  e  respondem de  forma diferente  à  hipóxia  e  à  exposição  a  toxinas.  Esta disposição  anatômica  também</p><p>explica o fenômeno da necrose centrolobular decorrente da hipotensão, com a zona 3 sendo a mais suscetível à diminuição</p><p>da oferta de oxigênio.</p><p>Microcirculação hepática</p><p>O sistema portal com seus ramos venosos e arteriais terminais supre diretamente os sinusoides hepáticos com sangue. Os</p><p>ramos  portais  fornecem  um  fluxo  constante,  porém mínimo,  dentro  deste  sistema  de  baixo  volume;  os  ramos  arteriais</p><p>suprem  os  sinusoides  com  aporte  ativo, mas  de  baixo  volume,  que  aumenta  o  fluxo  nos  sinusoides. Os  ramos  arteriais</p><p>hepáticos terminam em um plexo em torno dos dúctulos biliares terminais e fornecem nutrientes. Os fluxos da veia porta e</p><p>arterial  variam  inversamente  nos  sinusoides  e  podem  ser  compensatórios.  O  controle  local  do  fluxo  sanguíneo  para  os</p><p>sinusoides  provavelmente  depende  da  contração  dos  esfíncteres  arteriolares  e  do  conteúdo  das  células  radiadas  ou</p><p>miofibroblastos  portais. O  sangue  dos  sinusoides  flui  diretamente  para  as  vênulas  hepáticas  terminais  no  centro  de  um</p><p>lóbulo funcional. Esse processo resulta em um fluxo unidirecional de sangue para o fígado a partir das zonas 1 a 3.</p><p>Os  sinusoides  do  lóbulo  hepático  alinhados  pelo  endotélio  compõem  a  unidade  funcional  do  fígado,  onde  o  fluxo</p><p>aferente do sangue transita pelo parênquima funcional hepático antes de drenar para as vênulas hepáticas (Fig. 53‑17).Os</p><p>sinusoides  hepáticos  têm  7  a  15  μm  de  largura,  mas  podem  aumentar  de  tamanho  até  10  vezes,  o  que  produz  baixas</p><p>resistência e pressão (geralmente 2 a 3 mmHg) sistêmica. As células endoteliais sinusoidais representam 15% a 20% do total</p><p>da massa celular hepática.</p><p>FIGURA 53­17  Um hepatócito e seus domínios sinusoidais e laterais. RE, retículo endoplasmático.(De Ross MH,</p><p>Reith EJ, Romrell LJ. The liver. In Ross RH, Reith EJ, Romrell LJ: Histology: A text and atlas, Baltimore, 1989, Williams & Wilkins,</p><p>pp 471–478.)</p><p>As células endoteliais sinusoidais são separadas dos hepatócitos pelo espaço de Disse (espaço perissinusoidal). Este é um</p><p>compartimento  de  fluido  extravascular  dentro  do  qual  os  hepatócitos  projetam  microvilosidades,  o  que  permite  que</p><p>proteínas  e  outros  componentes  dos  plasmáticos  sinusoides  sejam  captados  pelos  hepatócitos.  Dentro  desse  espaço,  as</p><p>células endoteliais são especializadas, visto que carecem de junções intercelulares e de uma membrana basal, mas contêm</p><p>múltiplas  fenestrações.  Essa  disposição  possibilita  o  máximo  contato  das  membranas  dos  hepatócitos  com  este</p><p>compartimento de fluido extravascular  e  sangue no espaço  sinusoidal. Assim,  este  sistema permite um movimento  livre</p><p>bidirecional  de  solutos  (substâncias  de  pesos  moleculares  alto  e  baixo)  para  o  interior  e  para  fora  dos  hepatócitos,</p><p>promovendo  um  enorme  potencial  de  filtração.  Por  outro  lado,  as  fenestrações  das  células  endoteliais  restringem  o</p><p>movimento de moléculas entre os sinusoides e os hepatócitos e variam em resposta aos mediadores exógenos e endógenos.</p><p>Outros  tipos  de  células  são  encontrados  junto  à  ordenação  sinusoidal.  As  células  de  Kupffer,  oriundas  do  sistema</p><p>macrófago‑monocítico,  são  irregulares, em formato de estrela, e  também margeiam os sinusoides,  insinuando‑se entre as</p><p>células endoteliais. As células de Kupffer são fagocíticas, podem migrar dos sinusoides para áreas lesadas e desempenham</p><p>um  importante  papel  no  aprisionamento  de  substâncias  estranhas,  além  de  participarem  do  início  de  uma  reação</p><p>inflamatória. Importantes antígenos classe II do complexo de histocompatibilidade são mensageiros das células de Kupffer,</p><p>mas não têm uma apresentação antigênica eficiente, como fazem os macrófagos em outras partes do corpo. Existem outras</p><p>células linfoides no parênquima hepático, como as natural killer (NK), as NK T, CD4 T e T CD8. Elas suprem o fígado com</p><p>um  sistema  imunológico  inato.  As  células  hepáticas  estreladas,  previamente  conhecidas  como  células  de  Ito,  ricas  em</p><p>conteúdo  retinoide  (responsável  pela  sua  identificação  fenotípica)  e  encontradas  no  espaço  de  Disse,  têm  processos</p><p>dendríticos que se comunicam com as microvilosidades dos hepatócitos e também se envolvem nas células endoteliais. As</p><p>principais funções dessas células estreladas incluem o armazenamento de vitamina A e a síntese de colágeno extracelular e</p><p>outras proteínas da matriz extracelular. Nas lesões hepáticas agudas e crônicas, as células estreladas hepáticas são ativadas</p><p>para  um  estado  miofibroblástico  associado  a  alterações  morfológicas,  contratilidade  celular,  diminuição  da  vitamina</p><p>intracelular  e  produção  de  matriz  extracelular.  Finalmente,  as  células  estreladas  desempenham  um  papel  central  no</p><p>desenvolvimento e na progressão da fibrose hepática para a cirrose e são o alvo para o desenvolvimento de  tratamentos</p><p>antifibróticos.</p><p>Hepatócitos</p><p>O hepatócito, célula poliédrica multifuncional complexa e cujo núcleo central é esférico, é responsável por até 60% da massa</p><p>celular e 80% da massa citoplasmática do fígado (Fig. 53‑17). Como observado, os hepatócitos estão dispostos em um grupo</p><p>de camadas celulares únicas revestidas em cada lado por sinusoides repletos de sangue. Cada hepatócito tem contato com</p><p>hepatócitos adjacentes, com o espaço biliar (canalículo biliar) e com o espaço perissinusoidal, tornando possível que essas</p><p>células  realizem  sua  ampla  gama  de  funções.  Entre  as  muitas  funções  essenciais  dos  hepatócitos  estão  as  seguintes:</p><p>captação,  armazenamento  e  liberação  de  nutrientes;  síntese  de  glicose,  ácidos  graxos,  lipídios  e  numerosas  proteínas</p><p>plasmáticas (incluindo proteína C reativa e albumina); produção e secreção da bile para a digestão de gorduras dietéticas; e</p><p>degradação e inativação de toxinas.</p><p>Para realizar estas funções, a membrana plasmática do hepatócito é organizada de maneira específica em três domínios</p><p>específicos. A membrana  sinusoidal  é  exposta</p><p>ao  espaço  de Disse  e  tem múltiplas microvilosidades  que  fornecem  uma</p><p>superfície especializada no transporte ativo de substâncias entre o sangue e o hepatócito. O domínio lateral existe entre os</p><p>hepatócitos vizinhos e contém as gap junctions (junções fendidas) que sustentam a comunicação intercelular. A membrana</p><p>canalicular, que é um tubo contendo microvilosidades, é formada por dois hepatócitos lado a lado. Esses canículos biliares</p><p>são obliterados por zônulas ocludentes (junções íntimas) que impedem o escapamento da bile. O canalículo biliar forma um</p><p>anel em torno do hepatócito e drena para pequenos ductos biliares, conhecidos como canais de Hering, que, por último,</p><p>deságuam em um ducto biliar na tríade portal. A membrana canalicular contém sistemas de transporte ativo que dependem</p><p>do  trifosfato  de  adenosina  (ATP)  e  possibilitam  aos  solutos  serem  secretados  na  membrana  canalicular  mesmo  contra</p><p>elevados gradientes de concentração.</p><p>O  hepatócito  é  uma  das  células  mais  diversificadas  e  metabolicamente  ativas  no  corpo,  como  se  verifica  pela  sua</p><p>abundância  de  organelas.  Existem  1.000  mitocôndrias/hepatócito,  que  ocupam  cerca  de  20%  do  volume  celular.  As</p><p>mitocôndrias geram energia (ATP) por meio da fosforilação oxidativa e as produzem para as necessidades metabólicas do</p><p>hepatócito. As mitocôndrias do hepatócito também são essenciais para a oxidação do ácido graxo. O anticorpo monoclonal</p><p>HepPar1  (hepatócito  parafina‑1)  identifica  um  antígeno  único  na mitocôndria  hepatócita  e  é  amplamente  utilizado  para</p><p>identificar hepatócitos ou neoplasias hepatocelulares em exame imuno‑histoquímico.</p><p>Um vasto  e  complexo  sistema de membranas  interconectadas  compostas de  retículo  endoplasmático  liso  e  rugoso  e  o</p><p>aparelho de Golgi compreendem o que é conhecido como a fração microssômica do hepatócito. Estes complexos têm uma</p><p>variada gama de funções, incluindo: secreção e síntese de proteínas estruturais; metabolismo de lipídios e glicose; produção</p><p>e metabolismo do colesterol; glicosilação das proteínas secretoras;  formação e secreção de bile; e metabolismo de drogas.</p><p>Finalmente, os hepatócitos  também contêm lisossomos, que são vesículas de membrana intracelulares únicas que contêm</p><p>inúmeras  enzimas. Essas vesículas armazenam e degradam substâncias  exógenas  e  endógenas. Uma coordenação dessas</p><p>numerosas organelas no hepatócito possibilita que estas células realizem uma gama variada de funções.</p><p>Funções</p><p>A disposição anatômica singular do fígado produz um aspecto angular sobre qual das funções múltiplas centrais e críticas</p><p>deste  órgão  pode  ser  executada.  O  fígado  é  o  centro  da  homeostase metabólica.  Ele  serve  como  sítio  regulador  para  o</p><p>metabolismo  da  energia,  coordenando  a  captação,  o  processamento  e  a  distribuição  de  nutrientes  e  seus  produtos</p><p>energéticos. O fígado também sintetiza um grande número de proteínas, enzimas e vitaminas que participam de uma gama</p><p>extremamente ampla de funções orgânicas. Por último, ele desintoxica e elimina muitas substâncias exógenas e endógenas,</p><p>agindo como um grande filtro do corpo humano. As seções a seguir resumirão esta ampla gama de funções.</p><p>Energia</p><p>O  fígado,  principal  intermediário  entre  as  fontes  dietéticas  de  energia  e  os  tecidos  extra‑hepáticos  que  requerem  esta</p><p>energia, recebe os subprodutos dietéticos por intermédio da circulação portal e os classifica, metaboliza e distribui para a</p><p>circulação sistêmica. Também desempenha um papel importante na regulação das fontes sistêmicas de energia, como ácidos</p><p>graxos  e  glicerol  dos  tecidos  adiposos,  lactato,  piruvato  e  certos  aminoácidos  do músculo  esquelético. As  duas maiores</p><p>fontes de  energia  que  o  fígado  libera na  circulação  extra‑hepática  são  a  glicose  e  o  acetoacetato. A glicose  origina‑se da</p><p>glicogenólise  do  glicogênio  armazenado  e  da  gliconeogênese  de  lactato,  piruvato,  glicerol,  propionato  e  alanina.  O</p><p>acetoacetato origina‑se da β‑oxidação dos ácidos graxos. Além disso, os lipídios acumulados, como os triacilgliceróis e os</p><p>fosfolipídios, são sintetizados e armazenados como lipoproteínas pelo fígado, as quais podem circular sistemicamente para</p><p>captação pelos  tecidos periféricos. Estas  funções  complexas e  essenciais  são  reguladas por hormônios,  estado nutricional</p><p>geral do organismo e necessidades dos tecidos que obrigatoriamente precisam de glicose.</p><p>Heterogeneidade Funcional</p><p>Para aumentar a complexidade metabólica do fígado, os hepatócitos variam em sua função, dependendo de sua localização</p><p>dentro do  lóbulo  funcional. Esta heterogeneidade  funcional dos hepatócitos  está  anatomicamente  relacionada  com a  sua</p><p>localização  dentro  das  três  zonas  do  lóbulo  e  especialmente  relacionada  com  a  distância  a  partir  da  tríade  portal.  Por</p><p>exemplo, as células  localizadas na zona periportal  (zona 1) são expostas a uma alta concentração de substratos. Assim, a</p><p>captação de oxigênio dos solutos é maior aqui. Uma função importante dos hepatócitos é a sua habilidade de alterar sua</p><p>funcionalidade  metabólica  e  serem  recrutados  para  realizar  funções  específicas  sob  várias  condições  fisiológicas,</p><p>independentemente  da  localização  anatômica.  Os  sinusoides  na  zona  periportal  são  mais  afilados  e  mais  tortuosos,</p><p>facilitando  a  maior  captação  de  substrato  pelo  hepatócito  nesta  área.  Em  contrapartida,  os  sinusoides  da  zona  3</p><p>(perivenosos) têm fenestrações mais amplas, permitindo a captação de moléculas maiores. Os sinusoides também variam de</p><p>acordo com a forma e a função.</p><p>A  estrutura  enzimática,  as membranas  das  proteínas  plasmáticas  e  a  ultraestrutura  também  são  heterogêneas  entre  a</p><p>população  hepatocítica.  Esta  inconstância  da  proteína  celular  também  ocorre  com  base  na  localização  do  hepatócito</p><p>intralobular. A captação e a  liberação de glicose, a formação da bile e a síntese de albumina e fibrinogênio acontecem na</p><p>zona  periportal,  enquanto  o  catabolismo  da  glicose,  o  metabolismo  xenobiótico  e  a  síntese  de  α1‑antitripsina  e  α‑</p><p>fetoproteína (AFP) ocorrem na zona perivenosa. Outro exemplo da heterogeneidade enzimática segundo as zonas lobulares</p><p>é a localização das enzimas cíclicas da ureia na zona 3 adjacente à veia hepática terminal. A heterogeneidade funcional do</p><p>hepatócito e sua relação anatômica com a unidade lobular são responsáveis pelos padrões de danos decorrentes das lesões</p><p>metabólicas ou fisiológicas no fígado.</p><p>Fluxo Sanguíneo</p><p>Há um duplo suprimento sanguíneo para o  fígado proveniente da veia porta e da artéria hepática. A veia porta  fornece</p><p>cerca de 75% do aporte sanguíneo para o  fígado, que é pobre em oxigênio, porém rico em nutrientes. A artéria hepática</p><p>fornece os outros  25% do aporte  sanguíneo, que  é  rico  em oxigênio  e  representa o fluxo  sanguíneo arterial  sistêmico. O</p><p>grande volume de fluxo da veia porta é responsável por 50% a 70% da oxigenação do fígado. No geral, o fluxo sanguíneo</p><p>hepático representa cerca de 25% do débito cardíaco, demonstrando o seu papel  fundamental no metabolismo de  todo o</p><p>corpo. O fluxo sanguíneo hepático diminui durante o exercício e aumenta após a  ingestão de alimentos. Os carboidratos</p><p>têm efeito mais profundo sobre o fluxo sanguíneo hepático. A pressão arterial hepática representa pressão arterial sistêmica.</p><p>A pressão portal é geralmente de 6 a 10 mmHg e a sinusoidal, de 2 a 4 mmHg.</p><p>O fluxo sanguíneo hepático é regulado por vários fatores. As diferenças nas pressões dos vasos aferente e eferente, bem</p><p>como dos esfíncteres musculares localizados na entrada e na saída dos sinusoides, desempenham um importante papel. O</p><p>tônus  muscular  do  esfíncter  é  regulado  pelo  sistema  nervoso  autônomo,  por  hormônios  circulantes,  sais  biliares  e</p><p>metabólitos.  Os  fatores  endógenos  específicos  conhecidos  por  alterar  o  fluxo  sanguíneo  hepático  incluem  glucagon,</p><p>histamina, bradicinina, prostaglandinas, óxido nítrico</p><p>e muitos hormônios do  tubo digestório,  como gastrina,  secretina e</p><p>colecistocinina. Os  sinusoides  também são  reguladores primários do fluxo  sanguíneo hepático mediante  a  contração  e  a</p><p>expansão das suas células endoteliais, células de Kupffer e células estreladas hepáticas.</p><p>Foi  assinalada  uma  relação  unilateral  recíproca  entre  a  artéria  hepática  e  o  fluxo  da  veia  porta.  O  aumento  do  fluxo</p><p>arterial hepático promove diminuição no fluxo da veia porta, mas o oposto não ocorre. A compensação arterial hepática,</p><p>entretanto, não oferece uma compensação completa para apoiar o parênquima hepático na oclusão total da veia porta, que é</p><p>provavelmente a causa da atrofia ipsilateral neste caso. A evidência experimental sugere que o acúmulo de adenosina no</p><p>fígado desempenha um papel importante nesta resposta compensatória arterial hepática.</p><p>Formação de Bile</p><p>A produção  e  a  secreção de  bile  são  as principais  funções do  fígado. A bile  tem um duplo papel:  descartar  substâncias</p><p>secretadas na bile e fornecer os sais biliares entéricos para ajudar na emulsão das gorduras. A bile é uma substância que</p><p>contém solutos orgânicos e inorgânicos produzidos por um processo ativo de secreção e concentração subsequente desses</p><p>solutos. A concentração dos solutos inorgânicos na bile na via biliar principal assemelha‑se ao plasma (Tabela 53‑1). No caso</p><p>da perda de bile (p. ex., por uma fístula biliar externa), elevadas concentrações de proteína e eletrólitos devem ser repostas.</p><p>A  osmolaridade  da  bile  é  de  aproximadamente  300  mOsmol/kg  devido  aos  solutos  inorgânicos.  Os  principais  solutos</p><p>orgânicos da bile são ácidos biliares, pigmentos biliares, colesterol e fosfolipídios.</p><p>Tabela 53­1</p><p>Concentrações de Soluto da Bile Hepática</p><p>SOLUTO CONCENTRAÇÃO</p><p>Na+ 132‑165 mEq/L</p><p>K+ 4,2‑5,6 mEq/L</p><p>CA2+ 1,2‑4,8 mEq/L</p><p>Mg2+ 1,4‑3 mEq/L</p><p>CL− 96‑126 mEq/L</p><p>17‑55 mEq/L</p><p>Ácidos biliares 3‑45 mM</p><p>Fosfolipídios 25‑810 mg/dL</p><p>Colesterol 60‑320 mg/dL</p><p>Proteína 300‑3.000 mg/L</p><p>Em geral, os componentes da bile são absorvidos da corrente sanguínea pelos sinusoides para dentro do hepatócito, pela</p><p>membrana sinusoidal. A bile é secretada pelos hepatócitos dentro de canalículos pelas microvilosidades especiais contidas</p><p>nas  membranas  laterais  dos  hepatócitos  que  formam  estes  canalículos.  As  estreitas  junções  ao  longo  das  membranas</p><p>canaliculares  impedem  o  escape  de  bile  no  estado  normal.  Isso  também  fornece  uma  via  para  secreção  paracelular  de</p><p>solutos e água na bile. Por último, os canalículos coalescem em ductos maiores contendo epitélio biliar, que, depois, formam</p><p>as  árvores  biliares  intra‑hepática  e  extra‑hepática;  portanto  o  fígado  serve,  em  parte,  como  uma  estrutura  epitelial  que</p><p>movimenta os solutos do sangue para a bile e propicia a via de excreção da bile para os intestinos.</p><p>Aproximadamente 1.500 mL de bile são secretados diariamente e grande parte (≈ 80%) é secretada pelos hepatócitos para</p><p>os canalículos. Tal fluxo de bile canalicular é o resultado do fluxo de água em resposta ao transporte ativo de solutos. Os</p><p>ácidos biliares são transportados do sangue sinusoidal para o hepatócito por transporte ativo que requer ATP. O transporte</p><p>intracelular para a membrana canalicular ocorre por meio das proteínas biliares acopladas aos ácidos, transportadas por um</p><p>sistema vesicular derivado do  complexo de Golgi. Os  ácidos biliares  são,  então,  ativamente bombeados para dentro dos</p><p>canalículos por meio de um sistema de  transporte  ativo que  requer ATP.  Sabe‑se que o fluxo biliar  tem uma associação</p><p>linear com a secreção de ácido biliar, conhecida como fluxo biliar acidodependente. Como os ácidos biliares formam micelas</p><p>na bile e não são provedores de potencial osmótico, é provável que o fluxo relacionado com a secreção de ácido biliar seja</p><p>secundário aos  íons que acompanham os ácidos biliares  (contraíons). O fluxo biliar pode também ocorrer na ausência da</p><p>secreção do ácido biliar e é conhecido como fluxo biliar acidoindependente. A evidência experimental sugere que o fluxo</p><p>biliar acidoindependente é, pelo menos em parte, resultado da secreção biliar de glutationa.</p><p>Uma vez que a bile  tenha passado do canalículo para os dúctulos biliares  e, depois,  aos ductos biliares principais,  ela</p><p>sofre nova  reabsorção  e  secreção. As  células  epiteliais do  revestimento biliar  reabsorvem e  secretam,  ativamente,  água  e</p><p>eletrólitos. A secreção costuma processar‑se por meio de um canal de cloreto, que é ativado pela secretina (o seu ativador</p><p>mais poderoso) e sua subsequente ativação pela produção de monofosfato de adenosina cíclico (ATPc). Geralmente existe</p><p>uma secreção líquida, de água e eletrólitos, sendo responsável por outros 20% da secreção biliar. Finalmente, a bile se torna</p><p>altamente enriquecida em íons de bicarbonato. Muitas substâncias orgânicas, como a glutationa, são degradadas na árvore</p><p>biliar.  Muitos  fármacos  podem  ser  secretadas  dentro  da  árvore  biliar  de  uma  forma  altamente  concentrada  (p.  ex.,</p><p>ceftriaxona). A vesícula biliar atua como um reservatório da árvore biliar, cuja função é armazenar a bile no estado de jejum.</p><p>A vesícula biliar reabsorve água, concentra a bile armazenada e secreta mucina. A contração da vesícula biliar é mediada</p><p>hormonalmente  (amplamente  por  intermédio  da  colecistocinina)  em  resposta  a  uma  refeição,  com  o  simultâneo</p><p>relaxamento do esfíncter de Oddi e a liberação da bile no duodeno.</p><p>Circulação Êntero­hepática</p><p>Os sais biliares são produzidos inicialmente no fígado e secretados para serem usados na árvore biliar e no intestino. Os sais</p><p>biliares  primários,  ácidos  cólicos  e  ácidos  quenodesoxicólicos  são  produzidos  no  fígado  a  partir  do  colesterol  e  depois</p><p>conjugados com glicina ou taurina dentro do hepatócito. Uma vez  lançados no  intestino, os ácidos biliares primários são</p><p>modificados pelas bactérias intestinais, formando os ácidos biliares secundários desoxicólico e litocólico. Os ácidos biliares</p><p>são reabsorvidos passivamente no jejuno e ativamente no íleo, voltando, assim, para o sistema portal venoso, e até 90% dos</p><p>ácidos  biliares  são  extraídos  pelos  hepatócitos. Apenas  uma  pequena  fração  passa  para  a  circulação  sistêmica  devido  à</p><p>eficiente  extração  hepática,  responsável  pelos  baixos  níveis  de  ácidos  biliares  plasmáticos.  Após  a  extração  hepática,  os</p><p>ácidos biliares são recirculados no canalículo e de volta para a árvore biliar, completando o circuito. Uma pequena parte dos</p><p>ácidos  biliares  intestinais  não  é  absorvida  pelo  sistema  portal  e  é  excretada  nas  fezes.  Assim,  a  secreção  ativa  dos  sais</p><p>biliares pelo hepatócito para a bile e dos enterócitos ileais para a veia porta é o motor da circulação entero‑hepática.</p><p>A  circulação  êntero‑hepática  é  mais  do  que  um  único  mecanismo  para  reutilizar  fisiologicamente  os  ácidos  biliares</p><p>valiosos. Esta circulação da bile constitui o principal mecanismo para eliminar o excesso de colesterol, pois o colesterol é</p><p>consumido durante a produção de sais biliares e excretado nas fezes por micelas, formadas pelos solutos biliares orgânicos.</p><p>Sais biliares também desempenham um papel essencial na absorção de gorduras dietéticas, vitaminas lipossolúveis (p. ex.,</p><p>vitaminas A, D, E e K) e fármacos lipofílicos. O movimento da água dos hepatócitos para a bile e a absorção da água pelo</p><p>intestino delgado também são regulados pelos sais biliares. A circulação entero‑hepática, portanto, é fundamental para as</p><p>inúmeras solubilizações, transporte e funções regulatórias.</p><p>Metabolismo da Bilirrubina</p><p>A bilirrubina  é  o  resultado  da  degradação  da  heme. Uma  fase  inicial  da  degradação  da  heme,  responsável  por  20% da</p><p>bilirrubina, ocorre a partir das hemoproteínas (enzimas contendo heme) e em torno de três dias após a sua marcação com</p><p>heme radioativa. Uma fase tardia da degradação da heme, responsável por 80% da bilirrubina, é de eritrócitos senescentes,</p><p>o que ocorre em aproximadamente</p>