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1 2 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................ 3 2 DISTÚRBIOS DA FALA E DA LINGUAGEM .............................................. 4 3 DESENVOLVIMENTO DA COMUNICAÇÃO .............................................. 5 4 DISTÚRBIOS DA COMUNICAÇÃO NA INFÂNCIA .................................... 9 5 LINGUAGEM ORAL .................................................................................. 13 6 TRANSTORNOS DA LINGUAGEM .......................................................... 21 6.1 A dislalia e suas origens ..................................................................... 22 6.2 Disfemia ............................................................................................. 25 6.3 Afasia ................................................................................................. 27 6.4 Apraxia ............................................................................................... 35 6.5 Avaliação na Apraxia de Fala ............................................................. 37 6.6 Intervenção Clínica Fonoaudiológica ................................................. 38 7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................... 40 3 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 4 2 DISTÚRBIOS DA FALA E DA LINGUAGEM Fonte: alphafono.com.br Os distúrbios da fala e da linguagem são doenças prevalentes na infância, passíveis de prevenção e tratamento quando diagnosticados precocemente. Os pediatras, como profissionais responsáveis pela saúde da criança, são os primeiros a avaliar o desenvolvimento infantil e, muitas vezes, são questionados sobre os aspectos comunicativos da criança. Assim, conhecimentos oriundos da Fonoaudiologia são abordados no presente artigo com o objetivo de orientar o público de pediatras a respeito do desenvolvimento e dos distúrbios da comunicação em crianças. A comunicação é um meio pelo qual o indivíduo recebe e expressa a linguagem, sendo um elemento essencial para a socialização e integração na comunidade. Portanto, os distúrbios da comunicação causam impacto direto sobre a vida social da criança e sobre o sucesso acadêmico e ocupacional, sendo reconhecidos como importantes questões de saúde pública. (PRATES, 2011, p, 1). Os distúrbios da comunicação constituem algumas das doenças infantis mais prevalentes, manifestando-se como atraso ou desenvolvimento atípico envolvendo componentes funcionais da audição, fala e/ou linguagem em níveis variados de gravidade. Na maioria das vezes esses distúrbios são percebidos pelos pais, que referem que a criança tem dificuldade para falar ou que não fala, é dificilmente compreendida, incapaz de dizer alguns sons corretamente ou que gagueja. Sabe-se, por exemplo, que crianças com atraso no desenvolvimento da linguagem irão 5 apresentar, na idade escolar, importantes e persistentes anormalidades neuropsicológicas, entre elas os transtornos específicos de aprendizagem. O fonoaudiólogo é o profissional habilitado para identificar, diagnosticar e tratar indivíduos com distúrbios da comunicação oral e escrita, voz e audição. Entretanto, nesse processo, é fundamental a participação de outros profissionais que acompanham o desenvolvimento infantil, como pediatras, educadores, psicólogos, terapeutas ocupacionais, agentes comunitários de saúde, entre outros. De maneira geral, pediatras e professores são os primeiros profissionais solicitados a opinar e orientar, por serem mais presentes no acompanhamento do desenvolvimento infantil. Mas tal intervenção só ocorrerá em bom nível técnico com a presença direta ou indireta de um fonoaudiólogo. 3 DESENVOLVIMENTO DA COMUNICAÇÃO Fonte: tuasaude.com Antes de iniciar a apresentação do desenvolvimento da fala e da linguagem, é importante retomar a diferença entre esses dois conceitos. Linguagem é o sistema simbólico usado para representar os significados em uma cultura, abrangendo seis componentes: fonologia (sons da língua), prosódia (entonação), sintaxe (organização das palavras na frase), morfologia (formação e classificação das palavras), semântica (vocabulário) e pragmática (uso da linguagem). A fala é o canal que viabiliza a expressão da linguagem e corresponde à realização motora da linguagem. Em outras 6 palavras, a linguagem significa trocar informações (receber e transmitir) de forma efetiva, enquanto que a fala refere-se basicamente à maneira de articular os sons na palavra (incluindo a produção vocal e a fluência). Desta forma, no desenvolvimento inicial da comunicação, é importante observar o vocabulário; a extensão frasal (número de palavras utilizadas); a complexidade sintática das frases; a entonação; a articulação de cada um dos fonemas (sons) da língua; as trocas presentes na fala da criança; o uso da linguagem pelo discurso e pela iniciativa comunicativa; bem como a fluência de fala (número de rupturas ou disfluências na fala e velocidade de fala). (PRATES, 2011, p, 1). De acordo com Prates, desde o nascimento a criança se comunica através do choro, olhar e gestos. A criança pequena é capaz de discriminar vozes, diferenciar padrões de entonação, gestos e movimentos corporais, que são bases para o desenvolvimento comunicativo e de linguagem. É a partir da interpretação do adulto que os comportamentos inatos adquirem significado para a criança e, posteriormente, são reproduzidos intencionalmente por ele. Assim, o contato mãe-criança por meio do olhar e melodia da fala são pré-requisitos para o desenvolvimento comunicativo. Além disso, a amamentação, além de ser um importante momento de trocas entre mãe e filho, assume destacado papel no desenvolvimento e maturação dos órgãos fonoarticulatórios, possibilitando, futuramente, a complexa tarefa de articulação dos sons da fala. Nos primeiros meses de vida a criança apresenta vocalizações automáticas como, por exemplo, choro, grito e sons primitivos que, além de assumirem papel comunicativo, são fundamentais para o exercício do trato vocal. O balbucio e o sorriso iniciam-se a partir do segundo mês de vida e, apesar de ainda reflexos, expressam satisfação ou prazer. Aos quatro meses transformam-se em jogo vocal, quando a criança amplia seu repertório incluindo sons consonantais e, mais tarde, produções silábicas, mas ainda sem intenção comunicativa. No primeiro ano de vida descobre a própria voz e sua capacidade de se comunicar e, no final deste, inicia a produção das primeiras palavras com valor de enunciado, enquanto seu vocabulário aumenta progressivamente. Por volta dos dois anos é capaz de manter conversação com turnos e aos três já está pronta para manter uma conversa coesa. Na Tabela 1 é possível observar39 diferentemente, na apraxia de fala, o destaque maior da abordagem terapêutica está em conseguir resgatar os gestos articulatórios na produção correta da fala, preconizando um enfoque fonético, a fim de produzir de maneira correta os fonemas e palavras (SOUZA e PAYÃO, 2008). A evolução no tratamento da apraxia da fala é muito lenta e por isso requer um terapeuta que seja experiente e empenhado, e também que o paciente seja disposto a realizar todos os exercícios apresentados a ele, e que ocorra a imitação de tais durante horas e de forma intensiva, ocorrendo esse processo diariamente A intervenção precoce em quaisquer alterações na fase da aquisição da linguagem, inclusive na suspeita de Apraxia, é de extrema importância, para se obter resultados mais significativos (GIUSTI, 2019, apud KEITEL, 2019, p. 7). Ainda conforme a autora, a criança com Apraxia, também conhecida como Síndrome do Déficit de programação Fonológica, necessita de terapia individual, realizada pelo profissional fonoaudiólogo com experiência nessa área. Pode ser encaminhada também para outros profissionais, como terapeutas ocupacionais, psicólogos, neuropediatras, para ser submetida a avaliações minuciosamente voltadas para todos os aspectos de fala, da linguagem e da motricidade oral, incluindo as habilidades práxicas. Os resultados da terapia Fonoaudiológica em crianças com a apraxia de fala podem ser obtidos à longo prazo; considerando-se outros fatores, como a gravidade do caso e a idade da criança, o paciente tem melhoras significativas nas habilidades comunicativas. Além da terapia individual, deve ser considerado o apoio da família e da escola: os professores necessitam receber orientações para que o processo de aprimoramento seja o mais breve possível, já que apraxia de fala pode acarretar grandes dificuldades que irão persistir na idade adulta. (GIUSTI, E. 2019). 40 8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ________. Fonoaudiologia Informação para a Formação. Guanabara Koogan, 2003. Wertzner, H.F. 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(PRATES, 2011, p, 2). 8 É por meio da audição que a criança tem acesso à linguagem oral, sendo capaz de detectar, identificar, discriminar, reconhecer os sons da fala para, posteriormente, compreendê-los e produzi-los. Nos primeiros anos de vida, pela função auditiva, a criança se familiariza com a estrutura da língua materna e organiza informações linguísticas necessárias ao desenvolvimento da linguagem oral. Durante o desenvolvimento da fala a criança adquire o inventário fonético, articulação dos sons e os organiza de acordo com as regras linguísticas da língua materna. Para isso, a criança experimenta diversos processos fonológicos na tentativa de aproximar a sua produção de fala à do adulto para que, aos quatro anos, já tenha condições de produzir e utilizar adequadamente todos os sons da língua materna. A Tabela 2 exibe as possíveis trocas que ocorrem na fala da criança e os prazos finais para que tais processos sejam eliminados. TABELA 2 PRATES, 2015, p. 3 9 Aos cinco anos a criança assimila as principais regras gramaticais e está pronta, linguisticamente, para se comunicar como um adulto e iniciar o aprendizado formal da linguagem escrita. As habilidades e capacidades linguísticas continuam a se desenvolver quantitativamente ao longo da vida e, para que a criança seja competente nessa tarefa, é necessário que, no período crítico de desenvolvimento de linguagem, tenha condições orgânicas e psicoemocionais. Da mesma forma, é fundamental que a criança esteja inserida em um ambiente estimulador e rico em experiências linguísticas e de comunicação. A partir dos seis anos tem início o aprendizado da linguagem escrita, cuja base neurobiológica tem componentes inatos menos fortes do que a linguagem oral. Para que esse aprendizado ocorra de maneira adequada é fundamental que a criança já tenha concluído, em termos de qualidade, o desenvolvimento da linguagem oral e perceba e manipule os componentes sonoros da fala (palavras, sílabas e fonemas), ou seja, tenha consciência fonológica. Portanto, se a Distúrbios da fala e da linguagem na infância criança tiver atraso ou alteração no desenvolvimento de qualquer subsistema da linguagem (semântico, fonológico, morfossintático, prosódico e pragmático), poderá ter problemas na aquisição e desenvolvimento da linguagem escrita. 4 DISTÚRBIOS DA COMUNICAÇÃO NA INFÂNCIA Fonte: terra.com.br 10 A etiologia dos distúrbios da comunicação pode envolver fatores orgânicos, intelectuais/cognitivos e emocionais (estrutura familiar relacional), ocorrendo, na maioria das vezes, inter-relação entre todos esses fatores.15 De acordo com a "American Speech, Language and Hearing Association", os distúrbios da comunicação podem ser conceituados como impedimentos na habilidade para receber e/ou processar um sistema simbólico, observáveis em nível de audição (sensibilidade, função, processamento e fisiologia); linguagem (forma, conteúdo e função comunicativa); e processos de fala (articulação, voz e fluência). (PRATES, 2011, p, 3). Esses distúrbios podem variar em gravidade; ser de origem desenvolvimental ou adquirida; resultar numa condição de déficit primário (doenças de manifestação primária ou idiopáticas) ou secundário (doenças de manifestação secundária, decorrentes de manifestação maior) e, ainda, ocorrer isolados ou combinados. Na Tabela 3 são destacados os principais distúrbios da comunicação diagnosticados em crianças e adolescentes, bem como suas principais características. TABELA 3 PRATES, 2015, p. 4 11 Para Prates (2011), os distúrbios de desenvolvimento da fala e da linguagem (oral e escrita) de causa idiopática em crianças e adolescentes são aqueles que não ocorrem em conjunto com outras anormalidades, tais como: deficiência mental, paralisia cerebral, deficiências auditivas e outras. Tais distúrbios, idiopáticos ou secundários, podem ser acentuados por influências externas, como, por exemplo, diferenças culturais, instrução insuficiente ou inapropriada. De maneira geral, os estudos epidemiológicos em distúrbios da comunicação apresentam os valores de prevalência e incidência quanto à idade, sexo, nível socioeconômico e diagnóstico do distúrbio da comunicação. Desta forma, observa-se que, a partir dos três anos, a prevalência de distúrbios idiopáticos da comunicação eleva-se até os oito anos de idade, sendo que a fase crítica vai dos quatro aos seis anos, decrescendo a partir dos sete anos; mais alta prevalência no sexo masculino; predomínio geral dos distúrbios articulatórios e/ou fonológicos; predomínio de alteração do desenvolvimento da linguagem em crianças menores de três a quatro anos, transtorno fonológico dos quatro aos oito anos e alteração na linguagem escrita a partir dos nove anos. Em relação aos fatores socioeconômicos, os estudos revelam que pais com baixo nível educacional têm mais chances de ter filhos com problemas de linguagem e podem ter mais dificuldades para perceber e relatar tais problemas. As alterações no desenvolvimento da fala e da linguagem podem causar sérios problemas no desenvolvimento cognitivo e socioemocional na idade escolar ou adolescência. Estudos demonstram que a detecção de tais alterações aos dois a três anos reduz 30% a necessidade de acompanhamento terapêutico (fonoaudiologia, psicologia, educação especial, entre outros) aos oito anos de idade. Da mesma forma, reduz 33% o número de crianças com problemas na linguagem escrita. Tais dados reforçam a importância do pediatra na detecção precoce dos atrasos e desvios no desenvolvimento da fala e da linguagem. (PRATES, 2011, p, 1). De acordo com Prates (2011), muitos distúrbios da comunicação que ocorrem na infância poderiam ser evitados ou minimizados por meio de medidas simples de estimulação de linguagem, orientação aos familiares e identificação precoce. Sabe-se que as dificuldades de aprendizagem estão intimamente relacionadas à história prévia de alteração no desenvolvimento da linguagem. Desta forma, a identificação precoce dessas alterações no curso normal do desenvolvimento pode prevenir posteriores consequências educacionais e sociais desfavoráveis. 12 Alguns sinais de possíveis alterações podem ser detectados na criança ainda muito pequena, como ausência de contato de olhos; não reação a sons como telefone e campainha; não reação quando chamada pelo nome; volume de televisão muito alto; ausência de fala ou fala incompreensível; vocabulário restrito; dificuldade de interação social e agressividade. Aneja indicou alguns sinais de alerta para desordens da linguagem na criança, tais como: nenhuma palavra emitida até os 18 meses; não colocação de duas palavras juntas aos dois anos; ausência de desempenho imitativo e simbólico aos dois anos; não formação de sentenças aos três anos; discurso incompreensível aos três anos. Para Oller et al., o balbuciar que normalmente é produzido por volta dos 10 meses de idade, quando atrasado, pode prognosticar desordens da fala. Sabe-se que o input linguístico que a criança recebe antes dos três anos de idade está fortemente relacionado com o subsequente desenvolvimento cognitivo ede linguagem. Estudo recente mostra a importância da conversa entre adultos e crianças para o desenvolvimento inicial da linguagem. Tal estudo ressalta que a conversa entre adultos e crianças é determinante para o adequado desenvolvimento de fala e linguagem, pois, interagindo com adultos, a criança tem oportunidade de errar e ser corrigida, além de praticar e consolidar o conteúdo recém-adquirido. De maneira oposta, a grande exposição da criança à televisão está relacionada a atrasos no desenvolvimento da linguagem, pois contribui para a redução das oportunidades de interação entre ela e o adulto. Ela precisa de oportunidades para vivenciar o aprendizado da linguagem, com interações ricas com adultos e outras crianças, em que o adulto é responsável por fornecer o modelo adequado de fala. Assim, orienta- se que pais e educadores conversem com as crianças de maneira simples, porém correta e adequada em forma e conteúdo para a idade. É importante, nessa interação, que a criança tenha oportunidade de expressar e manifestar seus desejos. Assim, o adulto deve deixá-la falar e perguntar o que quer em vez de tentar adivinhar. Além disso, como forma de estimulação da linguagem, a família e educadores devem ser orientados a brincar com as crianças utilizando músicas, livros, desenhos de colorir, faz-de-conta, etc. A criança aprende brincando e suas atividades de vida diária, como tomar banho e comer, podem ser momentos de interação prazerosos e ricos em aprendizagem. 13 Para avaliar se a criança se encontra dentro do esperado para o desenvolvimento da fala e da linguagem, é fundamental que o pediatra complemente sua observação com as informações e/ou queixas da família e/ou da escola, uma vez que estudos recentes salientam que a detecção inicial dos distúrbios da comunicação em crianças é realizada principalmente por pais e educadores. Assim, o pediatra, ao deparar com queixas de familiares referentes ao desenvolvimento da comunicação da criança, como atraso na aquisição da fala, vocabulário pobre, trocas articulatórias ou dificuldades escolares, deve imediatamente investigar o desenvolvimento global da criança, bem como o histórico familiar para tais alterações e o ambiente comunicativo em que a mesma está inserida. Em muitos casos, é necessário investigar fatores orgânicos como alterações auditivas e neuropsicológicas. O pediatra deve estar atento aos sinais de risco de deficiências auditivas na infância, como história de prematuridade, complicações pré, peri e pós-natais, hereditariedade, otites médias recorrentes, hospitalizações, traumatismos cranianos, entre outros. Após tais investigações, que deverão ser realizadas em curto espaço de tempo, é fundamental encaminhar a criança para avaliação completa de linguagem, realizada pelo fonoaudiólogo e equipe interdisciplinar, quando for o caso. 5 LINGUAGEM ORAL Fonte: amenteemaravilhosa.com.br 14 A linguagem é um fator importante para o desenvolvimento e aprendizagem do indivíduo, sendo através dela que podemos nos comunicar de forma mais rápida e efetiva com nossos semelhantes. A linguagem é constituída por sistemas que atuam de forma inter-relacionada: fonética, fonologia, sintaxe, semântica, pragmática, morfologia e prosódia. Esses sistemas são extremamente importantes para efetivar a comunicação e contribuir para o aperfeiçoamento linguístico das crianças, sendo que, dias após o nascimento, o bebê já se comunica com a mãe através do olhar, do choro, demonstrando assim um dos sistemas da linguagem, a pragmática, que se refere a intenção comunicativa que o bebê demonstra para com a mãe (MOUSINHO et al, 2008). As crianças que apresentam Apraxia de Fala na Infância não apresentam dificuldades com esses sistemas, pois demonstram intenção comunicativa, compreendem a linguagem, entendem muito bem o que escutam, conseguem organizar o que querem dizer, porém no momento da linguagem expressiva, apresentam dificuldade na precisão dos movimentos a serem realizados para o ato da fala. A aquisição da linguagem se inicia muito cedo através da linguagem não verbal quando o bebê utiliza o toque, o choro, o olhar, os gestos e o balbucio para se fazer entender, sendo que essa fase se mantém até por volta dos 11 meses. Aos 12 meses o bebê fala suas primeiras palavras, que são constituídas pelos fonemas labiais /p/, /b/ e /m/. Conforme o mesmo se desenvolve, ele aprende cada vez mais fonemas e consequentemente expande seu vocabulário, sendo que, aos dois anos a criança deve estar realizando a emissão de frases simples. Contudo, fonemas como as consoantes líquidas /r/, /l/, /lh/ são mais difíceis de serem pronunciados, sendo os últimos a serem adquiridos (MOUSINHO et al, 2008 apud KEITEL, 2019, p. 5). Por volta dos cinco anos de idade, a fala da criança já deve estar semelhante à do adulto. Crianças com a Apraxia de Fala na Infância demoram mais a falar, podendo apresentar alterações nessas fases como consequência da dificuldade no ato motor voluntário necessário para a emissão das palavras. A Apraxia Desenvolvimental de Fala compreende algumas dificuldades específicas que podem ser variáveis de acordo com cada criança, ou variar até na mesma criança conforme o avanço da idade ou de acordo com o contexto no qual ela está inserida; de modo geral o contexto educacional, familiar ou quaisquer outros ambientes devem ser atenciosamente analisados. 15 A DAS é um distúrbio raro e há o pressuposto de um déficit apráxico na fala. Observa-se uma redução no ritmo de fala com segregação de sílaba, associada à percepção de isocromia ou tempo similar, sílabas e palavras segregadas ou não co-articuladas, consideradas como correlatos prevalentes nos quadros de apraxia da fala. O déficit rítmico pode ser altamente específico, comparado com o prejuízo no acento, que pode prevalecer em outros tipos de distúrbios comunicativos (SOUZA, 2008, apud KEITEL, 2019, p. 5). De acordo com Hall (2007), a execução da fala é grandemente requintada devido as estruturas anatômicas envolvidas no processo do desenvolvimento linguístico. Quando o processo neural de integração das vias neurais acontece de forma eficiente, resultam em um importante processo linguístico que de forma natural contribui para que a criança desenvolva a linguagem oral. Para a autora supracitada, na apraxia, a realização dos processos neurais responsáveis pela fala ocorre de forma irregular fazendo com que a execução dos músculos da face, da boca, da língua, do palato e faringe operem de forma desarmoniosa ocasionando a apraxia articulatória. Como a Apraxia Desenvolvimental é uma alteração ligada diretamente com a linguagem oral, quaisquer alterações apresentadas durante a produção da fala no processo linguístico depois dos dois anos de idade, pode ser um sinal indicativo do quadro apráxico; porém, é preciso indicar alguns meses de terapia diagnóstica para confirmação do quadro clínico; antes deste período não é possível diagnosticar uma criança com Apraxia Verbal do Desenvolvimento, porque ainda não conseguirá compreender as instruções especificadas para cumprir as tarefas essenciais para o diagnóstico, pois a criança antes dos dois anos de idade ainda está sujeita ao aperfeiçoamento da aquisição da linguagem (SOUZA e PAYÃO, 2008). Na mesma perspectiva, Giusti (2019), considera que a Apraxia Desenvolvimental se manifesta de forma clara após os dois anos de idade, porém, as dificuldades apresentadas pelo apráxico se manifestam ainda quando bebê. Entre elas podem ser observados: bebês que são considerados “quietos”; vocalizam e balbuciam pouco; repertório limitado de vogais (dificuldade em produzir as vogais) e de consoantes; variabilidade de erros (a criança pode apresentar diferentes “trocas na fala”); fala de difícil compreensão; maior número de erros quanto maior a complexidade silábica ou discursiva(quanto mais extensa a palavra, maior será a dificuldade); instabilidade na produção da fala (tem dia que a fala está pior, ou melhor); alteração prosódica (melodia da fala é diferente/”estranha”). 16 Ainda conforme a autora supracitada, outros sinais, são: fala que pode ser monótona; déficits no tempo de duração dos fonemas, pausas (podem apresentar prolongamentos, hesitações). “Lentidão” para falar; procura do ponto articulatório (a criança fica procurando o ponto articulatório, por exemplo, ao falar “pato”, pode falar “bato” “cato” “lato” até chegar no “pato”; pobre inventário fonético. Conforme a percepção dos pais, costuma-se ter como demandas: pais têm a impressão de que a criança não sabe o que fazer com a boca, parece desconhecer os movimentos necessários para a fala (não movimenta adequadamente a língua); atraso no aparecimento das primeiras palavras (os pais relatam que demorou a começar a falar); alterações em outros aspectos da linguagem oral (como por exemplo, vocabulário pobre, dificuldade para produzir frases mais elaboradas, para relatar fatos, etc); pode apresentar além da dificuldade motora na fala, outras dificuldades, como na coordenação motora fina, para se alimentar, mastigar, se vestir, para andar de bicicleta (os pais podem perceber uma inabilidade motora geral) (GIUSTI, 2019). 6 DISTÚRBIO ESPECÍFICO DA LINGUAGEM (DEL) / TRANSTORNO DO DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM (TDL) Fonte: clinicaproorl.com.br O Distúrbio Específico de Linguagem (DEL) hoje chamado de Transtorno do Desenvolvimento da Linguagem (TDL) é um comprometimento no desenvolvimento 17 da linguagem, que pode atingir uma ou mais áreas da linguagem, como a fonologia (sons da língua), o léxico (vocabulário) e a sintaxe (estrutura). Acomete cerca de 7% da população mundial e é mais comum em meninos do que em meninas. O DEL manifesta-se de modo muito diversificado em cada caso e é um quadro que pode ser modificado. O diagnóstico é realizado a partir da exclusão de todas as outras causas prováveis de atraso de linguagem, como alterações auditivas, ausência/escassez de estímulos, alterações sensoriais, lesão neurológica, déficit intelectual, transtornos psiquiátricos ou ainda Transtorno do Espectro Autista. Idealmente, devem ser consultados os médicos otorrinolaringologista e neurologista, bem como um profissional fonoaudiólogo e um psicólogo para a conclusão diagnóstica. (GARCEZ, 2016, p. 2). Diante disso, pode-se verificar que, na verdade, a criança com DEL / TDL apresenta todas as condições orgânicas e ambientais favoráveis ao seu pleno desenvolvimento, mas ainda assim não desenvolve a linguagem como o esperado para sua faixa etária. Alguns estudos mencionam que o desenvolvimento da linguagem é atrasado cerca de 12 meses em crianças com DEL / TDL, quando comparadas com crianças com desenvolvimento típico da linguagem. Sua causa ainda é desconhecida, mas os estudiosos seguem, principalmente, duas teorias na busca de compreender o quadro. A primeira teoria indica que crianças com DEL / TDL possuem um comprometimento no processamento auditivo, especialmente na percepção e diferenciação de aspectos linguísticos, trazendo para essa criança prejuízos de compreensão e emissão. Já o segundo modelo, postula que as crianças com DEL / TDL, na verdade, apresentam um distúrbio na organização cerebral para o processamento e construção de informações linguísticas, isto é, haveria uma “falha” no funcionamento cerebral específico da linguagem. De acordo com Garcez (2016) as principais características presentes em um caso de DEL / TDL. 1. Emissão tardia das primeiras palavras; 2. Aquisição lenta da linguagem; 3. Dificuldade de construir frases, mesmo frases simples; 4. Alterações nos sons da fala não esperados para a faixa etária (veja nossos posts sobre desenvolvimento típico da linguagem); 5. Organização atípica de frases (Exemplo: “Duda bola qué”) 6. Dificuldades com o uso de verbos; 7. Dificuldade no uso de preposições e artigos (Exemplo: “a casas das dois”) 8. Prejuízo no uso de flexão verbal ou nominal (Exemplo: Ela fui?) 9. Vocabulário pobre ou reduzido para a faixa etária; 10. Dificuldade para construir um relato pessoal, contar de forma coerente como foi seu dia; 11. Compreensão de informações implícitas no discurso ou texto; 18 12. Fala muitas vezes ininteligível; Dificuldade significativa para aprender a ler e escrever. (GARCEZ, 2016, p. 3). Por ser um déficit de difícil diagnóstico, existem várias hipóteses sobre a manifestação de DEL / TDL na fase de aquisição da linguagem pelas crianças. Alguns estudiosos adotam uma abordagem mais cognitiva, sem levar em conta a gramática da língua, assumindo que outras habilidades, não só a habilidade linguística, podem afetar a compreensão ou produção da fala por parte das crianças. Outro grupo de estudiosos adota uma abordagem relacionada estritamente ao mecanismo gramatical no desempenho linguístico da criança. DEL / TDL como déficit de processamento: Dentre o grupo das hipóteses que utilizam uma abordagem cognitivista, destaca-se a Hipótese da Superfície de Leonard. Segundo Leonard (1998), as crianças teriam dificuldade de percepção em relação a certos fenômenos da língua, portanto, esta dificuldade de percepção interferiria na compreensão e produção da fala por parte da criança, indicando que a criança não consegue produzir, pois não consegue compreender ou perceber determinados aspectos da língua. Essa hipótese seria, então, uma espécie de combinação de dificuldades de percepção com dificuldades gramaticais. Segundo Silveira (2002), [...] esta hipótese admite que a criança não utiliza a marca de passado - ed nos verbos do inglês, por exemplo, por uma mera questão de percepção e afirma que este problema perceptual se deve à tonicidade das sílabas. Ainda tomando, por exemplo, a língua inglesa, as crianças portadoras de DEL não percebem a utilização desse morfema, pois -ed constitui uma sílaba fraca, i.e, de baixa substância fônica. SILVEIRA, 2002, apud PASSOS, 2015, p. 44). DEL / TDL como déficit no mecanismo linguístico: No grupo dos estudos que tratam o DEL / TDL como uma deficiência linguística, encontramos como base para pesquisa a Teoria Gerativa de Chomsky, pois esta teoria se preocupa com a questão da aquisição da linguagem e estuda os diferentes tipos de mecanismos envolvidos no processamento da linguagem pelos seres humanos. No Programa Minimalista, elaborado por Chomsky (1995) o sistema de linguagem é visto como um sistema computacional com operações estruturadas que resultam na compreensão ou produção da fala. “Programa Minimalista [...] É antes um programa, uma metodologia, que visa a estudar e entender o modelo dos Princípios & Parâmetros, adotado a partir de Chomsky (1981). Dessa forma, todas as noções apontadas como sendo proposta do Programa Minimalista inserem-se também no modelo teórico dos 19 Princípios e Parâmetros” (LIMA & HERMONT, 2010, apud PASSOS, 2015, p. 44). O sistema computacional da linguagem, então, fornece informações necessárias para o processamento da língua. A um arranjo de itens lexicais aplicam- se operações do sistema computacional, a saber, Merge, Agree, Move – as quais compõem, estabelecem relações de concordância e movimentam elementos de sua posição básica de interpretação semântica para sua posição superficial de materialização fonológica. As operações são deflagradas a partir da presença de traços gramaticais (formais) que compõem, conjuntamente com os traços semânticos e os fonológicos, os itens lexicais que alimentam uma derivação sintática. Ao se exaurir um arranjo de itens lexicais, tem-se o momento de envio (spell-out) da estrutura para os sistemas de desempenho, por meio de níveis de representação – LF – forma lógica (semântica) e PF – forma fonológica. Esse modelo de língua adotado no minimalismo deixaclara a relação entre sintaxe – considerado componente central da gramática – semântica e fonologia, conforme ilustra a figura a seguir: (Chomsky, 1999/200, apud PASSOS, 2015, p. 45). Além disso, na metodologia adotada no Programa Minimalista, nota-se uma preferência pelas operações mais simples, que envolvam poucas representações operacionais, ao invés de operações complexas que envolvam um número maior de informação e, consequentemente, de operações e movimentos sintáticos. A ideia é que este sistema computacional esteja disponível no estado inicial de aquisição da 20 linguagem e com a exposição à língua, as crianças receberiam input para disparar as operações deste sistema de linguagem adequadas à sua língua específica. Baseando-se nessa nova metodologia, elaborada a partir do modelo de Princípios e Parâmetros da Teoria Gerativa, foram elaboradas hipóteses sobre o Déficit Específico da Linguagem, como um déficit no mecanismo de processamento, i.e, um déficit em algumas operações desse sistema computacional. Uma das hipóteses relacionadas ao DEL / TDL como um mecanismo linguístico é a Hipótese do Déficit Representacional de Relações Dependentes. Elaborada por Van der Lely (1998), esta hipótese propõe que as crianças portadoras do DEL / TDL tenham problemas com operações que exijam movimentos de elementos. Após inúmeras reformulações, Van der Lely conclui que o DEL pode ser resultado de um processo denominado Economia II, em que a escolha do movimento seria livre: há o movimento de traços quando o alvo atrai o traço do item lexical - facilitando a checagem de traços ou fazendo com que o movimento de traços não ocorra - consequentemente, não há checagem de traços. Essa hipótese leva em conta o Programa Minimalista que associa ao mecanismo de derivação das sentenças da língua um sistema computacional. Outra hipótese seria a Hipótese da Complexidade Computacional elaborada por Jakubowicz (Jakubowicz, 2003; 2006). Esta hipótese indica que; [...] as crianças portadoras do DEL possuiriam deficiências com itens funcionais da língua, i.e, a criança seria capaz de selecionar categorias sintaticamente importantes ou semanticamente motivadas. Essas relações representariam certo grau de complexidade na língua, que, segundo Jakubowicz, seriam adquiridas tardiamente no processo de aquisição de linguagem das crianças portadoras de DEL ou seriam, simplesmente, omitidas pelas mesmas. (JAKUBOWICZ, 2003; 2006, apud PASSOS, 2015, p. 45). As hipóteses sobre o DEL / TDL ora enfatizam questões cognitivas, ora linguísticas. De fato, é importante salientar que as crianças DEL/ TDL não apresentam comprometimentos cognitivos específicos, o que diferencia o DEL de Síndromes como a de Down e a de Williams. “Persiste, contudo, grande controvérsia a respeito de qual seria a maneira mais adequada de explicar as manifestações do déficit. Parte dessa controvérsia pode estar vinculada à heterogeneidade da população de sujeitos com DEL. É possível que algumas propostas teóricas dêem conta somente de subgrupos específicos de sujeitos com DEL, não mostrando, necessariamente, uma incompatibilidade” (Silveira, 2002, apud PASSOS, 2015, p. 46). 21 7 TRANSTORNOS DA LINGUAGEM Fonte: aparelhoauditivo.com Levando em consideração que a linguagem é um meio sistemático de comunicação, para que os seres humanos consigam interagir, observa-se que podem surgir dificuldades em diferentes campos da vida do indivíduo, seja no campo social seja no intelectual. Geralmente, tais barreiras se apresentam por algo que é classificado, de um modo geral, como Transtornos de Linguagem. Assim, vale acrescentar que existem diferentes tipos de Transtornos de Linguagem, embora especialistas afirmem ser mais frequente a presença destes associados a transtornos psicológicos. Dessa forma, muitas crianças, que apresentam problemas ou dificuldades na aquisição da linguagem, possuem problema nos segmentos de leitura e escrita e nos relacionamentos interpessoais, o que consequentemente poderá afetar o rendimento escolar. Um estudo recente, realizado por pesquisadores da Universidade Tuiuti do Paraná - UTP e Faculdade Assis Gurgacz- FAG, no ano de 2016, demonstra que os fatores que motivaram os pais a realizar os encaminhamentos de seus filhos à clínica centram-se na preocupação em relação ao fato de não avançarem no processo de apropriação da linguagem escrita. Isso acontece, especialmente, no que se refere aos seus aspectos formais, ou seja, a dificuldades relacionadas à sistematização do uso de letras, à conversão grafema-fonema/fonema-grafema e à produção gráfica (MAZZAROTTO et al, 2016). 22 Mas quais seriam as causas para a ocorrência de tais transtornos? Fontes (2017, p. 1) nos informa: As etiologias das alterações da linguagem e da fala podem envolver aspectos genéticos, degenerativos, lesionais, ambientais e/ou emocionais. Alguns autores classificam os transtornos com base em dois tipos de fatores que podem alterar e incidir desfavoravelmente na evolução da comunicação e da linguagem: fatores orgânicos, sejam eles genéticos, neurológicos ou anatômicos e fatores emocionais. (FONTES, 2017, apud MESQUITA, 2018, p. 220). Há ainda autores que dizem que tais fatos podem resultar mais no adulto, embora os fatores mencionados sejam integrados. Já na criança, considera-se que tais diferenciações estejam ultrapassadas, pois o efeito de qualquer fator orgânico ou psicológico tem repercussão sobre um conjunto de processos psicológicos que possuem influência direta na aquisição da linguagem. Após a definição e o detalhamento das causas do transtorno de linguagem, faz-se necessário explanar sobre os tipos de transtornos. Estes podem ser classificados em pelo menos três principais, como Dislalia, Disfemia e Afasia. 7.1 A dislalia e suas origens Fonte: orientacionandujar.es Ao se produzir o som da fala, existe todo um processo que vai desde a respiração, sinapses neurais até a articulação da boca (língua e dentes) e, na escrita, 23 é produzido da maneira que falamos. Dessa forma, se existe algum distúrbio no processo da fala, por conseguinte, a produção da escrita poderá ser afetada. Um dos distúrbios da fala é a dislalia que, de acordo com Menezes, Souza e Silva (2013, p. 67) consiste em; “(...) um distúrbio que acomete a fala, caracterizado pela dificuldade em articular as palavras, provocando fala errônea das palavras, acontecendo a omissão ou troca de letras. ” (SILVA, 2013, apud BUENO, 2018, p. 2). Souza e Fontanari (2015) explicam que esse distúrbio é bastante comum na sociedade e que pode interferir no aprendizado da escrita. Eberhart e Cauduro (2013, p.10) esclarecem que: Na dislalia surge uma alteração na fala, onde há imprecisão articulatória afetando padrões de produção de sons da língua, relacionados às fases de programação e ou execução neuromotora. Esta ocorre quando a criança está começando a falar. (EBERHART, 2013, apud BUENO, 2018, p. 2). Nota-se que as definições dos autores são convergentes, pois concebem a dislalia como uma disfunção de linguagem perceptível na pronúncia inadequada das palavras em decorrência de alterações do aparelho fonador. A dislalia ainda é subdividida em quatro tipos: 1. Evolutiva: ocorre quando criança e tende a desaparecer ao logo do desenvolvimento; 2. Funcional: é a mais frequente. Existem diversos tipos, sendo os de maior ocorrência a omissão, substituição, distorção ou acréscimo de letras. Na omissão alguns sons não são pronunciados. Exemplo: “Aela aanha” (Aquela aranha). No acréscimo ou distorção há a introdução de som. Exemplo: “Atelântico” (Atlântico). Quando há a troca de sons, é chamado de substituição. Exemplo: “Quelo o calo” (Quero o carro). 3. Audiógena: a criança possui deficiência auditiva, o que leva ao erro na pronúncia; 4. Orgânica: causada por lesõesno encéfalo, anomalias ou alterações na boca, impossibilitando a pronúncia correta das palavras. Um indivíduo com distúrbio de articulação pode ser considerado, de acordo com a classificação e quadro clínico, um portador de necessidade especial. 24 A etimologia da palavra dislalia vem do grego, o termo “dys” que significa dificuldade e “lalien”, do verbo falar (LIMA, 2008). Em conformidade com o processo histórico explicado por Cabrera (1999), os transtornos da fala antigamente eram diagnosticados como “dislabia”. Entretanto, nos anos 30 do século XIX, o suíço Schulter utilizou o termo “dislalia” para distingui-lo do termo “alalia” que se refere à ausência de linguagem. A dislalia pode caracterizar-se de quatro formas diferentes, tais como: evolutiva, que desaparece durante o desenvolvimento; funcional, se desenvolve devido as distorções dos sons com as letras; audiógena, acarreta erros nas pronúncias por deficiência auditiva ou até por lesões no encéfalo e orgânica, provoca uma estrutura de comunicação incorretas (SOUZA, & FONTANARI, 2015, apud BUENO, 2018, p. 2). Estudos conduzidos por fonoaudiólogos demonstram que na dislalia ocorre, normalmente, a substituição do som /R/ por /L/”, pois ocorre “(...) alteração de padrões articulatórios que conduzem a realizações sonoras do sistema linguístico. ” (LIMA, 2008, apud SOUSA, 2016, p. 7). Esse distúrbio manifesta-se na pronúncia de palavras de formas diferentes, seja ela, por omissão, substituição, acréscimo e/ou por deformação dos fonemas, como por exemplo, /Aela aanha/ (Aquela aranha), /Atelântico/ (Atlântico), /Tota-Tola/ (Coca-cola), /balata/ (barata), /pobrema/ (problema), /Framengo/ (Flamengo) /socollo/ (socorro). (NASCIMENTO, CARVALHO, COSTA, & BASTOS, 2007). Compreende-se, então, que os erros mais comuns na dislalia são fonéticos e fonológicos, acontecendo, respectivamente, por distorções ou anomalias no processo auditivo ou neuromuscular, assim como por problemas na habilidade de planejar ou executar o sistema articulatório seletivo, com sistema próprio e sistemático (JAKUBOVICZ, 1997). Para explicar o fenômeno das dislalias, Winitz (1969 apud JAKUBOVICZ, 1997) levantou algumas hipóteses em relação à família, ao desenvolvimento físico, às anormalidades orgânicas e às dificuldades perceptuais que podem ocorrer nessas crianças. De fato, a criança repete sons incorretamente emitidos pelos pais, que podem ser ocasionados pela idade, conflitos, defeitos de fala ou físicos. Porém, o adulto (à princípio) não percebe os erros nas articulações da criança. Essa incorreção na fala pode ocasionar doenças cerebrais ou atraso no desenvolvimento físico / mental / linguístico ou ausência de treino completo da articulação de modo suficiente. Até mesmo, podem ocorrer perdas, 25 dificuldades e memórias auditivas, discriminação fonética e de análise dos sons (WINITZ, 1969 apud JAKUBOVICZ, 1997). Ripper (1963 apud JAKUBOVICZ, 1997), após um estudo sobre os erros constantes nas dislalias, percebeu erros no contato, velocidade, estrutura, duração ou direção, força e sonorização do contato da língua. Isso devido a criança dislálica apresentar respiração e pressão intra-oral dos movimentos de forma incorreta, bem como os mecanismos velofaríngeos não funcionando ou funcionando de forma deficitária. Compreende-se, então, que a dislalia é avaliada como um procedimento que envolve o organismo humano e que acarreta distúrbios na fala, bem como a possibilidade de distúrbios na escrita. A troca de sons aponta essa má articulação nas palavras, que pode prejudicar o desenvolvimento da criança. Sendo assim, é muito importante que a articulação da criança seja avaliada para realizar as intervenções necessárias, evitando maiores prejuízos futuros. 7.2 Disfemia Fonte: fonoonline.com.br De todas as desordens da comunicação humana, a gagueira é a mais desafiante. Aqueles que se dedicam ao seu estudo e tratamento, em determinado momento, se veem perplexos e, às vezes, até impotentes, diante dos inúmeros aspectos e variantes que influenciam na comunicação do indivíduo gago. 26 Disfemia mais popularmente gagueira é definida como um distúrbio da comunicação verbal, manifestada por quebras involuntárias na fluência e ritmo da fala É codificada na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde sob o código F98.5, sendo assim considerada como distúrbio ou transtorno de fluência da fala. [...] a gagueira é caracterizada como uma desordem no ritmo da fala, na qual o indivíduo sabe precisamente o que quer falar, mas não consegue reproduzir o som devido a uma repetição, prolongamento ou bloqueio involuntário. (OMS,1977, apud PEREIRA; SIERENS; BORSEL, 2007, P. 2) A gagueira apresenta sintomas característicos de debilidades nos aspectos temporais e sequenciais da fala, que contêm repetições de palavras inteiras monossilábicas, repetições de partes das palavras, prolongamentos de sons audíveis ou bloqueios. Outros autores acrescentaram características adicionais à fala do portador de gagueira, como hesitações, pausas desnecessárias, inserção de pequenas expressões, comportamental, associadas de batidas de mãos nas pernas, tremor de lábios, batidas de pés nos chãos, movimentos anormais de ombros, pescoço, cabeça e sentimentos negativos com relação à produção da fala (JUSTI; DUARTE, 2016). Como características da gagueira, é possível caracterizar as repetições (repetição de sons, palavras ou frases); prolongamentos (consoantes prolongadas além de sua extensão); bloqueios (ocorrem quando uma consoante é bloqueada no percurso de sua produção, sendo que nenhum som é emitido, ou então, emite-se um som distorcido. Há interrupção do fluxo expiratório e, portanto, da emissão vocal); substituições e abstenções (um som ou uma palavra diferente é escolhido em vez daquele que está causando o problema); movimentos concomitantes (trejeitos faciais, bater de pés, movimentos oculares, bater de mãos nas pernas, trejeitos de cabeça entre outros); contato visual pobre; respiração (mal coordenada com fonação e expressão); extensão do tórax, pescoço e dos músculos faciais (BARBOSA, 2005). Os sintomas centrais da gagueira incluem: três ou mais repetições de sons, silabas ou partes de palavras, prolongamentos audíveis ou silenciosos e bloqueios em que ocorre a interrupção do fluxo do ar ou pausas tensas. Tais podem comprometer a saúde mental das pessoas que gaguejam, levando-as fobias, ansiedade generalizada, além da redução de oportunidades de 27 convívio social e ocupacional (ANDRADE et al., 2014, apud SANTOS, 2018, p. 2). A terapia fonoaudiológica para o tratamento da gagueira consiste na utilização de exercícios com o objetivo de ensinar um novo modelo de produção de fala e favorecer a fluência. Para melhor compreender e tratar a pessoa que gagueja, é preciso construir um raciocínio dialético que articule sua dimensão biológica com a realidade social, na qual o gago está inserido (CARVALHO et al., 2013). Sendo assim, o fonoaudiólogo vai trabalhar com o paciente: relaxamento, postura corporal, respiração, articulação da fala, velocidade, pausas durante a fala, coordenação pneumofonoarticulatória, entre outros (RIBEIRO, 2003). Em outro enfoque, existe, também, a visão psicossocial da gagueira que leva em consideração não apenas o aspecto orgânico funcional, mas também o significado afetivo e emocional da fala gaguejada. Assim a psicologia auxilia tanto a família e ao paciente quanto ao fonoaudiólogo, na compreensão das dificuldades pelas quais ambos estão passando (OLIVEIRA; GARGANTINI, 2003). 7.3 Afasia Fonte: fonoaudiologiabh.com.br Todo ser humano faz uso da linguagem para falar, entender, ler, escrever, fazer gestos,entre outras atividades, porém, se como resultado de uma lesão cerebral uma ou mais áreas do cérebro responsáveis pela linguagem pararem de funcionar 28 apropriadamente, a pessoa pode apresentar dificuldades para falar o que gostaria, e, sendo assim, não pode mais fazer uso da linguagem. Esta dificuldade é chamada de afasia (Afasia – A (= não) fasia (= falar). A afasia é a perda parcial ou total da capacidade de expressar ou compreender a linguagem falada ou escrita. É o resultado de danos às áreas do cérebro que controlam a linguagem. As pessoas podem ter dificuldade de ler, escrever, falar, compreender ou repetir a linguagem. A afasia é grosso modo definida como uma alteração de linguagem e processos a feitos a ela, decorrente de uma lesão cerebral adquirida (em geral, no hemisfério esquerdo). Distintas etiologias, como acidentes vasculares cerebrais, traumatismos cranioencefálicos e tumores podem causar afasia, que pode ser acompanhada de sinais neurológicos (por exemplo, a hemiplegia) e distúrbios cognitivos (como apraxias, agnosias, amnésias) de distintas ordens e graus de severidade. (GUARINELLO, 2007, apud FERREIRA, 2015, p. 4). Em pessoas destras e cerca de dois terços das canhotas, a função da linguagem é controlada pela metade esquerda do cérebro (hemisfério cerebral esquerdo). No outro terço dos canhotos, grande parte da função da linguagem é controlada pela metade direita. Assim, na maioria das pessoas, a função da linguagem é controlada pelas seguintes áreas do cérebro: 1. Parte do lobo frontal esquerdo chamada de área de Broca 2. Parte do lobo frontal esquerdo chamada de área de Wernicke 3. A parte posterior inferior do lobo parietal esquerdo (próxima à área de Wernicke) 4. As conexões entre essas áreas A lesão em qualquer parte dessas áreas interfere em, pelo menos, alguns aspectos da função da linguagem. Normalmente, a escrita e a fala são afetadas da mesma forma. A afasia geralmente resulta de problemas que não causam danos progressivos, como os seguintes: 1. Acidente vascular cerebral 2. Traumatismo craniano 3. Infecção cerebral (encefalite) 4. Nesses casos, a afasia não piora. 29 Mas se ela resulta de uma doença progressiva (como um tumor cerebral em expansão), a afasia pode piorar progressivamente. Conforme o tumor cresce, o mesmo pode fazer mais pressão em áreas do cérebro que controlam a função da linguagem e, assim, prejudicar a capacidade de expressar ou entender a linguagem. Alguns tipos de demência também podem causar afasia que piora progressivamente. Um indivíduo é considerado afásico quando, do ponto de vista linguístico, o funcionamento de sua linguagem, após lesão cerebral, não leva em conta determinados recursos de produção ou interpretação. Por derivar de uma lesão cerebral de extensão e gravidade variadas, não é raro que as afasias sejam acompanhadas também de outras dificuldades de origem neurológica, como paralisia parcial de braços e pernas ou alterações da atividade gestual. Embora sua incidência entre as sequelas de doenças neurológicas, na verdade, não seja pequena, a falta de informação a respeito das afasias ainda é bastante grande em nosso meio. Por esse motivo, muitas vezes, nos deparamos com a falta de objetividade no entendimento e enfrentamento das afasias. Crianças que estão se desenvolvendo normalmente podem perder habilidades de linguagem, devido a dano cerebral. Este distúrbio de linguagem adquirido é conhecido como afasia infantil. A afasia, em crianças, é mais frequentemente causada por um dano cerebral traumático, mas pode também ser causada por um derrame, doença infecciosa, tumor e convulsões. Semelhante à afasia em adultos tipicamente as crianças adquirem déficit de linguagem após danos ao hemisfério esquerdo. (ARAM apud BOONE; PLANTE, 1994, p. 206). Na infância, as crianças podem desenvolver afasia desenvolvimental, que ocorre quando a criança ainda não adquiriu uma capacidade linguística, mas por um motivo externo perde a capacidade de desenvolver essa competência. Ou ainda, a Afasia adquirida, quando a criança já dominava uma determinada competência linguística e devido a um fator externo perde essa capacidade. A grande diferença entre a afasia infantil e no adulto é que nesta não existem afasias desenvolvimentais, como há em crianças. Muitas crianças com afasia apresentam problemas em compreender a linguagem falada, apesar da audição e da inteligência normais. Os problemas de compreensão incluem dificuldade de entender frases complexas, seguir instruções e ler. Já que ler, escutar e seguir instruções são atividades escolares frequentes, não é surpreendente que crianças com afasia experimentem dificuldades acadêmicas. (CRANBERG, apud BOONE; PLANTE, 1994, p. 207). 30 A afasia pode ser observada em criança que: ouve a palavra mais não a interioriza com significado; demora a compreender o que é dito; apresenta gestos deficientes e inadequados; confunde palavras ou frases; tem dificuldade de evocação, exteriorizada por ausências de respostas ou tentativas incompletas para achar a expressão ou emissões que a substituem. Assim, a Afasia se caracteriza, mais especificamente, por falhas na compreensão e na expressão verbal, relacionadas à insuficiência de vocabulário, má retenção verbal, gramática deficiente e anormal, escolha equivocada de palavras. As pessoas com afasia têm dificuldade em expressar ou compreender a linguagem. Mas a natureza e o grau de dificuldade variam. A variedade reflete a natureza complexa da função da linguagem. Os principais tipos de afasia são: Afasia de Broca ou Expressiva (Motora), Afasia de Wernicke ou Receptiva (Sensorial) e Afasia global. Afasia de Broca (expressiva): A afasia expressiva (ou de Broca) é uma deficiência que envolve fundamentalmente a fala do paciente; a compreensão que o paciente tem da fala de outros permanece relativamente intacta. Este tipo de afasia está associado à lesão nas regiões frontais do hemisfério esquerdo que controlam a produção da fala, particularmente a região chamada de área de Broca. (SPRINGER, 1998, apud FERREIRA, 2015, p. 6). Se a área de Broca estiver lesionada, as pessoas conseguem em geral entender o significado das palavras e saber como elas desejam responder. No entanto, elas têm dificuldade em encontrar as palavras ao falar. Articulam as palavras lentamente e com grande esforço, às vezes interrompidas por imprecações, mas o que dizem faz sentido a elas. Também não há ritmo e ênfase normais da fala. Elas têm dificuldade em repetir frases. A maioria das pessoas afetadas também são incapazes de escrever palavras. Um paciente com afasia de Broca fala muito pouco. Quando a fala é tentada, há uma hesitação – o paciente tem dificuldade de exprimir as palavras. Há uma ausência de pequenas partes gramaticais da fala e de uma inflexão característica. Tal fala é frequentemente chamada de fala telegráfica ou agramatismo. (SPRINGER, 1998, FERREIRA, 2015, p. 6). Crianças que apresentam afasia motora mostram-se inicialmente, quase mudas, sendo necessário estimulá-las a falar pelo menos pequenas palavras. A fala tem constantemente distúrbios articulatórios e anomalias de ordem fonética. A 31 compreensão verbal está conservada, porém, a dificuldade maior é de compreender e aprender o todo. A leitura, frequentemente, está perturbada. Os distúrbios de escrita são constantes e frequentes. A afasia também pode envolver a perda da capacidade de compreender as palavras escritas (alexia), a perda da capacidade de recordar ou dizer os nomes dos objetos (anomia) algumas pessoas com anomia não conseguem lembrar nem parte da palavra. Outras têm uma palavra em mente, mas não conseguem pronunciá-la. Pessoas com anomia tendem a falar fluentemente, mas utilizam frases que não significam nada ou dizem o que significam de uma forma não clara. A maioria das pessoascom afasia tem anomia. Esse tipo de afasia é chamado de afasia anômica. Afasia de Wernicke (receptiva): A afasia receptiva (ou de Wernicke) é o distúrbio em que o paciente tem grande dificuldade para entender a fala. Está associada a uma lesão na região posterior do primeiro giro temporal, ou área de Wernicke. A fala de um paciente com afasia receptiva é muito mais fluente do que a de um afásico expressivo, mas, dependendo da extensão da lesão, pode variar entre ser levemente estranha e completamente sem sentido. Frequentemente, os pacientes usam palavras inadequadas (parafasia) ou não existentes (neologismos). Em alguns casos, os sons produzidos pelo paciente parecem uma perfeita gíria ou uma “salada de palavras”, embora o ritmo e o fluxo da fala pareçam estar preservados. (SPRINGER, 1998, apud FERREIRA, 2015, p. 7). Ainda nas palavras de Springer (1998), a afasia de Wernicke ou Sensorial é a afasia de compreensão mais grave definida por um conjunto de características bastante específicas. Estando essa área comprometida, os sujeitos teriam dificuldades para compreender a linguagem verbal, já que haveria uma interrupção das fibras nervosas das conexões, bloqueando a chegada das informações às áreas associativas. Neste caso, estão comprometidas tanto a compreensão como a expressão, entretanto sem a existência de dificuldades na articulação das palavras. A expressão é marcada por discurso fluente e abundante, fala logorréica (rápida) e jargonafásica (jargão) e pelo grande número de neologismos, o sujeito fala sem considerar o interlocutor. As pessoas por ela afetadas podem construir frases longas, sem sentido algum, adicionando palavras desnecessárias e até inventando outras. Apresentam grandes dificuldades de entendimento da linguagem falada e, muitas vezes, ignoram os seus próprios erros. 32 Os pacientes com afasia de Wernicke podem com facilidade produzir sons falados, mas estes não fazem sentido. Além disso, a fala de outras pessoas não é compreendida, apesar de a capacidade de ouvir se manter normal. As pessoas com afasia de Wernicke parecem não ter conhecimento de seu distúrbio e a substituição de palavras, chamada parafasia, é comum. A pessoa pode dizer “capitão de escola” em vez de dizer “diretor”. A área correspondente a afasia de Wernicke também é importante para a imagem corporal e para a compreensão das relações do self, isto é, de si e do ambiente em que o paciente vive. (CIORNARI, 2005, apud FERREIRA, 2015, p. 7). Se a área de Wernicke estiver lesionada, as pessoas têm dificuldade em compreender a linguagem e a escrita. Costumam falar fluentemente e com um ritmo natural, mas as frases saem formuladas com palavras confusas (por vezes referida como salada de palavras). Podem não saber que estão falando coisas sem sentido. A maioria das pessoas afetadas também é incapaz de ler palavras. Elas escrevem como falam — de forma fluente, mas incompreensível Perda de quase toda a capacidade de compreender, falar ou escrever a linguagem (afasia global): A afasia global ocorre quando os lobos temporal esquerdo e frontal (incluindo áreas de Broca e Wernicke) estão lesionados. O indivíduo talvez possa verbalizar imprecações, pois o lado direito do cérebro, que controla as emoções, não está lesionado. Os pacientes com afasia global apresentam um profundo problema de entendimento e de fala. As funções de leitura e de fala também estão completamente ausentes. Embora tais pacientes possam ser orientados quanto a tempo e a lugar, sua fala sem sentido, perseverante, torna a maior parte da comunicação impossível. (BOONE; PLANTE, 1994, apud FERREIRA, 2015, p. 8). É considerado o tipo de afasia mais grave, geralmente acompanhada de outros comprometimentos neurológicos e motores. Na afasia global existe a incapacidade de usar a linguagem de qualquer forma. As pessoas com afasia global não podem produzir fala compreensível, compreender a linguagem falada, falar fluentemente, ler ou escrever. Nosso procedimento é falar de modo simples, sem pressa, repetir a pergunta quantas vezes for necessário, usando ferramentas necessárias para motivar o paciente e fazê-lo de interessar estabelecendo um diálogo de entendimento. (CIORNAI, 2005, apud FERREIRA, 2015, p. 8). Uma pessoa com uma afasia severa frequentemente entende apenas as palavras mais importantes de uma sentença. No entanto, entender o mundo à sua volta somente através do significado de poucas palavras, pode causar 33 desentendimentos, pois a combinação de palavras com o conhecimento geral de mundo não é suficiente para a compreensão correta da mensagem transmitida. Quanto ao diagnóstico é feito uma avaliação por um médico, testes padronizados de função cerebral, exames por imagem, como a tomografia computadorizada ou imagem por ressonância magnética Normalmente, os médicos podem identificar a afasia, ao conversar com a pessoa e ao fazer algumas perguntas. No entanto, precisam ter certeza de que os problemas aparentes com a linguagem, não são causados por problemas com a audição ou com a visão ou por problemas musculares ou nervosos, que afetam a fala ou a escrita, incluindo a disartria. A disartria é um problema de fala, que afeta os nervos e os músculos que controlam a capacidade de falar — a capacidade de pronunciar fisicamente sons e palavras. A afasia é uma disfunção da linguagem, indicando um problema no cérebro e que afeta a compreensão, reflexão e descoberta da palavra. Os médicos avaliam o quão fluentemente as pessoas falam, se é difícil começar a falar, e se as pessoas têm dificuldade em encontrar as palavras, nomear os objetos ou repetir frases. Os médicos também verificam como as pessoas entendem o que é dito a elas, por exemplo, se elas conseguem entender e executar um comando. As pessoas são convidadas a escrever e ler em voz alta. Um neuropsicólogo ou fonoaudiólogo pode aplicar testes padronizados de função cerebral (testes neuropsicológicos). Podem ajudar os médicos a identificar a afasia que causa apenas sintomas sutis. Esses testes também ajudam os médicos a planejar o tratamento e a determinar como provavelmente será a recuperação. São feitos exames de diagnóstico por imagem, como a tomografia computadorizada (TC) ou a imagem por ressonância magnética (RM), para descobrir qual o tipo de lesão cerebral que causou a afasia. Podem ser realizados outros testes de acordo com a causa suspeita. Já a recuperação de uma pessoa é influenciada pelo seguinte: 1. A causa, tamanho e localização da lesão 2. A extensão com que a linguagem é comprometida 3. A resposta ao tratamento 4. Em menor grau, a idade, educação e saúde geral da pessoa 34 Crianças menores de 8 anos de idade frequentemente recuperam a capacidade de utilizar a linguagem, mesmo quando o cérebro foi gravemente lesionado. Para pessoas acima de 8 anos, a maior parte da recuperação ocorre nos primeiros 3 meses, mas elas podem continuar a melhorar até certo grau em até um ano. É importante lembrar que a reabilitação bem-sucedida do afásico é auxiliada pelo desenvolvimento e encorajamento da comunicação. A dimensão linguística é apenas uma parte da comunicação. O processo de reabilitação requer os esforços de médicos, fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais, enfermeiras, psicólogos e fonoaudiólogos – todos trabalhando com o paciente e com a sua família. (BOONE; PLANTE, 1994, apud FERREIRA, 2015, p. 10). O tratamento de certas causas de afasia pode ser muito eficaz. Por exemplo, se um tumor provoca inchaço no cérebro, os corticosteroides podem reduzir o inchaço e melhorar a função da linguagem. A afasia devido a algumas outras causas (como um acidente vascular cerebral) pode diminuir mais lentamente ou apenas parcialmente quando é tratada. Os fonoaudiólogos podem ajudar as pessoas que desenvolvem afasia após o dano cerebral devido a doenças que não causam lesão progressiva.A terapia é geralmente iniciada logo que as pessoas são capazes de participar. Quanto mais cedo a terapia é iniciada, mais eficaz ela é, mas também é útil mesmo quando iniciada tardiamente. Se as pessoas com afasia não recuperam as habilidades básicas de linguagem, elas poderão ser capazes de se comunicarem por meio de um livro ou de um dispositivo de comunicação, como uma placa com imagens ou símbolos de palavras mais utilizadas ou atividades diárias, ou ainda um dispositivo baseado em computador com um teclado e um visor de mensagens. 35 Teste de uma pessoa com afasia: (HUANG, 2019, p. 5) 7.4 Apraxia Fonte: vero.com.br 36 A Apraxia é uma desordem neurológica caracterizada por provocar uma perda da capacidade de executar movimentos e gestos precisos, mesmo que o indivíduo deseje e tenha capacidade física para fazê-lo. A Apraxia de Fala caracteriza-se como um conjunto de alterações articulatórias e prosódicas que ocorrem sem que exista prejuízos musculares (CATRINI et al, 2015, apud KEITEL, 2019, p. 5). Conforme o autor, a explicação mais coerente relaciona-se a um déficit na programação motora dos movimentos para se obter uma fonação ajustada juntamente com uma articulação apropriada da língua. Acerca da classificação, considera-se a Apraxia de Fala na Infância (desenvolvimental) e a Apraxia de Fala Adquirida. A Apraxia de Fala na Infância é definida como um transtorno da articulação no qual há comprometimento da capacidade de programar voluntariamente a posição da musculatura dos órgãos fonoarticulatórios e a função dos movimentos musculares para a produção de fonemas e palavras. Essas dificuldades de programação de posição e sequência dos movimentos ocorrem, apesar de sistemas motores, sensoriais, das habilidades de compreensão, atenção e cooperação encontrarem-se preservados (SOUZA e PAYÃO, 2008). Ocorre desde o início do desenvolvimento da linguagem do bebê, caracterizando-os como bebês silenciosos, lentos, que diferenciam pouco os sons, tendo a primeira vocalização bem como as combinações de palavras iniciando-se tardiamente (PAYÃO et al, 2011, apud KEITEL, 2019, p. 2). Ainda de acordo com esses autores, as crianças fazem uso prolongado de uma única palavra para vários significados, utilizam gestos e outros métodos não-verbais em demasia, além de “perda de palavras”, ou seja, a criança produz certa palavra, e tempos depois não consegue mais fazê-la da forma original. Assim, conforme os autores supracitados, em um paciente apráxico, um movimento pode ser realizado automaticamente, mas não voluntariamente. Essa dificuldade não é acompanhada por fraqueza ou lentidão significativa, ou incoordenação desses músculos nos movimentos reflexos ou automáticos. A apraxia desenvolvimental da fala é uma condição clínica, na qual ocorre uma inconsistência na precisão dos movimentos necessários para a produção de fonemas. O indivíduo apráxico ainda em desenvolvimento pré lingual, manifesta sinais inadequados para o desenvolvimento linguístico normal. Mesmo a criança tendo um raciocínio claro sobre a fala, não consegue emitir as palavras devido à dificuldade para realizar a programação das posturas específicas dos órgãos fonoarticulatórios 37 (OFA’s), os quais são responsáveis pela produção de sons pretendidos, na ordem e sequência adequadas (SOUZA e PAYAO, 2008). Os comandos motores que atingem os órgãos fonoarticulatórios para um dado fonema são, em várias circunstâncias, dependentes do contexto fonético, do ritmo e da entonação de fala. Pode-se afirmar, então, que cada emissão fonêmica é um fenômeno ímpar, não havendo um conjunto finito de comandos motores pré-estabelecidos (RODRIGUES, 1989, apud KEITEL, 2019, p. 3). Os movimentos de lábios, língua e mandíbula são indiferenciados no início da infância, sendo necessário o seu refinamento conforme a criança se desenvolve; quando isso não ocorre, a mesma pode apresentar alterações na fala que levam aos prejuízos no relacionamento emocional, social e consequentemente escolar (SOUZA e PAYÃO, 2008). Já a Apraxia de Fala Adquirida ocorre em sua maioria em adultos, sendo causada por uma lesão na área de Broca ou córtex sensório motor do hemisfério esquerdo dificultando os movimentos responsáveis pela fala mesmo que o indivíduo possua um sistema muscular intacto (SOUZA e PAYÃO, 2008). Os autores explicam ainda, que a apraxia pode vir acompanhada ainda de afasia, desorganização lógica para pensamento ou percepção, desorganização na escrita, agrafia entre outros, pois o lado esquerdo do cérebro também é responsável pelo controle dessas habilidades. Uma pesquisa realizada com 25 pacientes que haviam sofrido um Acidente Vascular Encefálico (AVE), demonstrou que somente possuíam distúrbio no planejamento motor dos movimentos articulatórios aqueles que tiveram a região da ínsula, especificamente no giro pré-frontal esquerdo atingidos, ou seja, essa região parece ser especializada para o planejamento motor da expressão oral. 7.5 Avaliação na Apraxia de Fala A Apraxia de Fala tem muito impacto sobre a realização das atividades, podendo acarretar muitos obstáculos para a criança, como manipular objetos ou até mesmo na expressão de gestos que direcionam a comunicação. Dessa forma, acabam se tornando dependentes de cuidados especiais por conta da impossibilidade de articulação correta, tornando-se um grande empecilho na vida da criança (WETTER; POOLE e HAALAND, 2005). 38 O grau do comprometimento apresentado pelo paciente é um dado muito importante a ser considerado, quando se trata de diagnóstico de apraxia da fala, uma vez que esse distúrbio da comunicação pode apresentar-se em diferentes graus, desde o mais leve, o qual se caracteriza como um distúrbio articulatório, até o mais severo, quando há ausência total ou quase total da fala. Para que ocorra uma avaliação apropriada das apraxias, é de grande importância identificar sua presença para poder classificá-la de forma correta, considerando-se as falhas cometidas pelo paciente, e com bases nas informações, conhecer todos os mecanismos que estão envolvidos no déficit (POLITIS; RUBINSTEIN, 2007, apud KEITEL, 2019, p. 7). Contundo, conforme apontado em estudos de revisão teórica, há uma confusão nos termos que são realizados por distintos autores, visto que o mesmo conceito é utilizado para explicar diferentes tipos de apraxias (KOSKI; IACOBONI e MAZZIOTTA, 2002). É provável que essa condição ocorra porque indivíduos com apraxia podem ter dificuldades distintas, e, portanto, diferentes tipos de alterações práxicas podem ser descritas, baseando-se na dissociação dos déficits. Um dos modelos da neuropsicologia cognitiva bastante difundido para a construção de instrumentos que apresentam a avaliação das habilidades práxicas é o sugerido por Rothi, Ochipa e Heilman (1991). De acordo com esse modelo, podem ser vistos os movimentos que são mediados por distintos subsistemas, a execução, imitação e compreensão de tais movimentos podem serem vistos nesse modelo. Para os autores parece haver dois tipos de léxicos relacionados à ação: entrada (memória dos movimentos reconhecidos) e a saída (realização dos movimentos). 7.6 Intervenção Clínica Fonoaudiológica Na apraxia desenvolvimental, existe um consenso da existência de déficit no controle motor voluntário dos órgãos fonoarticulatórios para a produção da fala. Contudo, essa perspectiva linguístico-fonológica não é eficaz na intervenção clínica fonoaudiológica, pois a abordagem fonológica acaba se baseando no input receptivo, que irá facilitar os movimentos que serão necessários para que ocorra o controle da fala. Nesse caso, as práticas dos gestos essencialmente articulatórios não são suficientemente reforçadas nessa perspectiva terapêutica. Na abordagem fonológica, há concomitância de vários fonemas que são estimulados simultaneamente;