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Semana 10 - PESQUISA

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Semana 10
Questão 1 – Realize pesquisa legal, doutrina e jurisprudencial sobre o assunto a fim de se instrumentalizar sobre as possibilidades modalizadoras a favor do réu.
Abordagem Policial "Blitz" e os Direitos do Cidadão*
A  violência no Brasil, fruto de uma legislação penal antiquada e pela notória falta de política e investimentos para a segurança pública, não autoriza as autoridades policiais a suprimir alguns princípios e direitos constitucionais de garantias individuais e coletivas dos cidadãos. 
Em caso de “blitz” de trânsito, possui previsão legal  no Código de Trânsito, Art. 4.º, anexo I, com o objetivo de prevenir e reprimir atos relacionados com a segurança pública e de garantir obediência às normas relativas à segurança de trânsito, assegurando a livre circulação e evitando acidentes. Destarte, deve ser realizada para verificação de documentos de veículos, sua condição de circulação e a identificação e habilitação dos seus condutores; porém não se pode usar “blitz” ou barreiras de trânsito como forma de abordagens de veículos e pessoas, como medida preventiva de delitos, que, sendo realizada com a finalidade de submeter o cidadão à revista pessoal individual ou coletiva de forma compulsória e genérica, é constrangimento ilegal previsto no Art. 146 do Código Penal. 
“Art. 146. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda”. 
Nas abordagens de rotina as autoridades policiais não podem agir suprimindo direitos dos cidadãos brasileiros e estrangeiros que estejam no país. Tomando medidas abusivas e ilegais sob a simples justificativa de interesse social de segurança pública. O Brasil, Estado Democrático de Direito conforme Art. 1.º da Constituição Federal possui como Princípios, entre outros, “a cidadania e a dignidade da pessoa humana”. 
Não se confunde o poder da polícia administrativa com o poder de polícia judiciária. Celso Antônio Bandeira de Mello assevera que: "O que efetivamente aparta Polícia Administrativa de Polícia Judiciária é que a primeira se predispõe unicamente a impedir ou paralisar atividades antissociais enquanto a segunda se preordena à responsabilização dos violadores da ordem jurídica.”.
O funcionamento e atuação das polícias responsáveis pela Segurança Pública, elencados vide Art. 144 da Constituição Federal, estão vinculados e condicionados ao Princípio Constitucional da Legalidade, insculpido no inciso II, do art. 5.º, da Constituição Federativa do Brasil, e premissa primeira do Estado Democrático de Direito. 
Referindo-se à busca pessoal independerá de mandado da autoridade judiciária, somente nos casos autorizados expressamente pelo art. 244 do CPP: 
“Art. 244. A busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar.”
Sendo indubitável que a realização da busca pessoal em local público pode ser vexatória e ridícula ao cidadão, se sustenta a exigência legal da "fundada suspeita", que deve ser real e explicada ao cidadão antes de tudo. Não se valendo de motivos subjetivos, que em regra deve conter os requisitos do artigo 243 do CPP. 
Júlio Fabbrini Mirabete conceituou busca pessoal como: "A busca pessoal consiste na inspeção do corpo e das vestes de alguém para apreensão dessas coisas, incluindo toda a esfera de custódia da pessoa, como bolsas, malas, pastas, embrulhos e os veículos em sua posse (automóveis, motocicletas, barcos etc.)”. 
Não é legal e legítima a solicitação do agente policial para que o condutor de um veículo saia do mesmo para se submeter à revista pessoal, salvo quando ocorrer a “fundada suspeita” de que esteja transportando produto de natureza ou de origem criminosa. Não se admitem critérios subjetivos, assim é admissível a recusa do condutor em sair do veículo, não constituindo esta simples recusa em crime de desobediência do art. 330 do Código Penal e pelo mesmo motivo não há que se falar em crime de desacato. 
O crime de desobediência somente se configura se a ordem é legal! Neste sentido é a jurisprudência pacífica dos tribunais. (STJ, RT 726/600; HC 1.288, DJU 16.11.92, p. 21163, in RBCCr 1/235; TACrSP, RT 722/467, 655/304).
Neste sentido é o entendimento do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: 
"Por ausência de justa causa, a Turma deferiu habeas corpus para determinar o arquivamento do termo circunstanciado de ocorrência por meio do qual se autuara o paciente pela prática do crime de desobediência (CP, art. 330), em razão de o mesmo haver se recusado a ser revistado por policial militar quando chegava à sua casa. Considerou-se que a motivação policial para a revista – consistente no fato de o paciente trajar "blusão" passível de encobrir algum tipo de arma – não seria apta, por si só, a justificar a fundada suspeita de porte ilegal de arma, porquanto baseada em critérios subjetivos e discricionários (CPP, art. 244: "A busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida..."). 
HC 81.305-GO, rel. Min. Ilmar Galvão, 13.11.2001. (HC-81305). 
No mesmo sentido é o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo: 
"A busca é autorizada nos casos previstos no art. 240 e s. do CPP, como exceção às garantias normais de liberdade individual. Mas, como exceção, para que não degenere a medida, sem dúvida violenta, em abusivo constrangimento, a lei estabelece normas para a sua execução, normas que devem ser executadas com muito critério e circunspecção pela autoridade" (TJSP – AP – Rel. Dalmo Nogueira – RT 439/360). 
A Constituição Federal estabelece no seu Art. 5.º Os Direitos e Deveres Individuais e Coletivos dos Cidadãos dentre as quais, para o caso em estudo, destaco os incisos II e X, LVII e § 2.º da Constituição Federal, in verbis: 
“Art. 5.º (...) 
II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. 
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. 
LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
§ 2.º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. 
As garantias do art. 5.º da Constituição da República Federativa do Brasil se equiparam aos direitos constantes da IV Emenda da Constituição dos Estados Unidos da América, bem como também da Declaração Universal dos Direitos Humanos, da qual fora proclamado pela Assembleia Geral das Nações Unidas. 
“Conforme VÁZQUEZ ROSSI, dentro de um moderno Estado de Direito democrático, de base constitucional, onde o poder se encontra limitado por sua mesma regulamentação e legitimado pelo respeito de direitos fundamentais, a finalidade do ordenamento punitivo não pode ser outra se não a proteção dos direitos humanos e dos bens jurídicos imprescindíveis a sua coexistência”. 
É importante acrescentar que a partir da Constituição Federal de 1988 a decretação de prisão é ato exclusivo do poder Judiciário, com as exceções taxativas como a prisão em flagrante delito. Assim as chamadas prisões para averiguações, também chamadas de prisões de polícia, como as detenções em quartéis, cias. de polícia ou local similar, é a privação ilegal de liberdade. 
Nesse sentido, é o entendimento do Professor Dr. Alexandre de Morais e do Promotor de Justiça Gianpaolo Poggio Smanio:
“Concluímos, portanto, pela total insubsistência das chamadas prisões para averiguações, por flagrante inconstitucionalidade e ilegalidade, inclusive no regime castrense, que consistem em verdadeiro desrespeito ao direito de liberdade e sãopassíveis de responsabilização civil (indenização por danos morais e materiais), criminal (abuso de autoridade – lei nº 4.898/65) e por ato de improbidade administrativa (Lei nº 8.429/92 – art.11, caput e inciso II)”. 
Assim decidiu o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: 
“INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL CONTRA O ESTADO. PRISÃO INJUSTA. Caracterizada a ilegalidade da prisão, realizada por falha da máquina administrativa, submetendo o autor à situação vexatória, em plena via publica, com a privação de sua liberdade, merece ser mantida a sentença de procedência da ação. Quantum indenizatório fixado com adequação. Apelo improvido. (3 fls.) (APELAÇÃO CÍVEL N.º 70000246512, QUINTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: SÉRGIO PILLA DA SILVA, JULGADO EM 10/02/2000)”. 
A lei n.º 4.898/63 de 09 de dezembro de 1963 define o que é crime de Abuso de Autoridade e estabelece quais as punições para esta prática. 
O art. 3º da lei 4.898/63 estabelece as modalidades de Abuso de Autoridade, entre outros quando ocorrer qualquer atentado a: 
a) à liberdade de locomoção; 
b) à inviolabilidade do domicílio; 
c) ao sigilo da correspondência; 
d) à liberdade de consciência e de crença;
e) ao livre exercício do culto religioso; 
f) à liberdade de associação; 
g) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício do voto; 
h) ao direito de reunião;
i) à incolumidade física do indivíduo; 
j) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional. (Incluído pela Lei n.º 6.657, de 05/06/79)
O Art. 4.º da lei 4.898/63 afirma ainda que constitui também abuso de autoridade: 
a) ordenar ou executar medida privativa da liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder; 
b) submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei;
c) deixar de comunicar, imediatamente, ao juiz competente a prisão ou detenção de qualquer pessoa; 
d) deixar o Juiz de ordenar o relaxamento de prisão ou detenção ilegal que lhe seja comunicada; 
e) levar à prisão e nela deter quem quer que se proponha a prestar fiança, permitida em lei; 
f) cobrar o carcereiro ou agente de autoridade policial carceragem, custas, emolumentos ou qualquer outra despesa, desde que a cobrança não tenha apoio em lei, quer quanto à espécie quer quanto ao seu valor; 
 g) recusar o carcereiro ou agente de autoridade policial recibo de importância recebida a título de carceragem, custas, emolumentos ou de qualquer outra despesa; 
 h) o ato lesivo da honra ou do patrimônio de pessoa natural ou jurídica, quando praticado com abuso ou desvio de poder ou sem competência legal; 
 i) prolongar a execução de prisão temporária, de pena ou de medida de segurança, deixando de expedir em tempo oportuno ou de cumprir imediatamente ordem de liberdade. (Incluído pela Lei nº. 7.960, de 21/12/89).
De acordo com o art. 5.º lei 4.898/63, “Considera-se autoridade, para os efeitos desta lei, quem exerce cargo, emprego ou função pública, de natureza civil, ou militar, ainda que transitoriamente e sem remuneração”. 
Ademais é oportuna a transcrição do seguinte julgado: 
"Os agentes policiais devem compenetrar-se de que se usam a força na estrita medida da necessidade, pena de descambar para a arbitrariedade violenta e agressão, que não se confunde com discricionariedade. Assim, responde por abuso de autoridade o policial que, a pretexto injustificado, detém alguém mediante emprego de força física e agressões, máxime porque, embora possa o agente da lei, nas hipóteses legais, suprimir a liberdade do cidadão, impõe-se o respeito à incolumidade física e às condições primárias de vida do detido." (TACRIM-SP- AC - Rel. Geraldo Gomes- JUTACRIM 44/425). 
O cidadão quando impelido e coagido a ser submetido à busca pessoal e ou a prisão ilegal, sem que a autoridade policial apresente mandado judicial ou um motivo legal e plausível, deve manter-se calmo. Ademais deve tomar nota dos nomes dos agentes envolvidos, das testemunhas, que podem ser outras pessoas submetidas ao mesmo tipo de ação abusiva e ilegal, bem como o número da placa de veículos e tudo mais que possa ser útil para uma futura ação penal contra os autores do fato e ou contra o Estado quando for o caso. O cidadão ofendido deve exercer os seus direitos e sempre denunciar o fato à Ouvidoria de Polícia e também ao Promotor de Justiça Criminal de sua cidade. 
Referências Bibliográficas 
1. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
2. FREITAS, Gilberto Passos de; FREITAS, Vladimir Passos. Abuso de Autoridade. 9.ª ed. São Paulo: RT, 2001.
3. JESUS, Damásio de. Código Penal anotado. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005. 
4. MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo – Elementos de Direito Administrativo. 4. ed., São Paulo: Malheiros, 1993. 
5. MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: Teoria Geral. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2006. 
6. MORAES, Alexandre de: SMANIO, Gianpaolo Poggio. Legislação Penal Especial: Fundamentos Jurídicos. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2002. 
7. MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado. 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2003. 
8. ROSSI, Vasquez. Derecho Procesal Penal. Argentina, Rubinzal Culzoni, p. 106, Tomo I. 
_______________
* Texto confeccionado por Alexandre do Couto Souza
Acessível em: <http://uj.novaprolink.com.br/doutrina/3807/abordagem_policial_blitz_e_os_direitos_do_cidadao>
Crítica garantista à criminalização do desacato*
Lélio Braga Calhau
No Brasil o crime de desacato está previsto no artigo 331 do Código Penal. Ao nosso ver, foi acertada a configuração da referida ação como crime, mas errou o legislador ao criar um tipo penal excessivamente aberto, facilitando um número quase ilimitado de condutas que podem ser enquadradas penalmente, gerando, inclusive, uma grande insegurança jurídica na aplicação da referida norma penal.
O delito de desacato é de grande importância para a própria manutenção da Administração Pública. Existe interesse público primário no sentido de que os funcionários públicos sejam respeitados no exercício ou em razão das funções que ocupam. Pelo contrário não haveria como o Estado cumprir devidamente as suas atividades, pois sempre existiriam aqueles que, com interesses jurídicos resistidos, poderiam querer tumultuar as ações da Administração, passando a atacar as pessoas de seus representantes legais (01).
Todo o funcionário público, desde o mais graduado ao mais humilde, é um instrumento de soberana vontade e atuação do Estado. Consagrando-lhe especial proteção, a lei penal visa a resguardar não somente a incolumidade a que tem direito qualquer cidadão, mas também o desempenho normal, a dignidade e o prestígio da função exercida em nome ou por delegação do Estado. Na desincumbência legítima de seu cargo, o funcionário público deve estar coberto de quaisquer violências ou afrontas (02).
São, ainda, conhecidos os casos de abuso por parte de agentes públicos na interpretação do crime de desacato. Existe uma grande desconfiança por parte da sociedade civil quanto à aplicação correta do crime de desacato, notadamente, pela interpretação elástica dada comumente por policiais.
Em verdade, tais problemas decorrem também da falta de técnica legislativa do tipo de desacato. Vejamos o Código Penal Brasileiro: Desacato. Artigo 331 - Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa.
Para Luigi Ferrajoli, a norma penal não pode ser dúbia a ponto de trazer dúvida sobre o limite da sua aplicação pelo juiz de direito. A existência de crimes excessivamente abertos agride de forma reflexa o princípio da legalidade. Vê-se que, então, o princípio da legalidade deixa de ter apenas um cunho meramente formal. Nesse contexto, segundo Luiz Flávio Gomes, os tipos penais abertos estão em permanente conflito com a garantia da lex certa (03). A lei penal deve ser certa, não devendo utilizar descrições de formas vagas de condutas, abertas ou lacunosas.
Essa característica abertaou abrangente do tipo de desacato é criticada por Ferrajoli. Para ele o Direito Penal é uma técnica de definição, comprovação e repressão da desviação penal. Tal técnica, independentemente do modelo normativo e epistemológico que a inspira, manifesta-se através de coerções e restrições aos potenciais desviantes, aqueles suspeitos de sê-lo, ou, ainda, aqueles condenados enquanto tais. As restrições são três, e correspondem em igual número, aos momentos da técnica punitiva (04).
Para Luigi Ferrajoli, para que o desvio punível não seja constituído, mas regulado pelo sistema penal, não é suficiente, com efeito, que esteja pré-configurado por regras de comportamento. Comportamentos como o ato obsceno ou o desacato, por exemplo, correspondem a figuras delituosas, por assim dizer, em branco, cuja identificação judicial, devido à indeterminação de suas definições legais, remete inevitavelmente, muito mais do que as provas, as discricionárias valorações do juiz, que de fato esvaziam tanto o princípio formalista da legalidade quanto o empírico da fatualidade do desvio punível. Para que estes mesmos princípios sejam satisfeitos é necessário, além disso, que não só a lei, senão também o juízo penal, careçam de caráter constitutivo e tenham caráter recognitivo das normas e cognitivo dos fatos por elas regulados (05).
A crítica de Ferrajoli é novamente levada à criminalização do desacato ao abordar os modelos autoritários de Direito Penal. Ferrajoli lembra que o primeiro aspecto da epistemologia antigarantista é a concepção não formalista nem convencional, mas sim ontológica ou substancialista do desvio penalmente relevante. Segundo esta concepção, objeto de conhecimento e de tratamento penal não é apenas o delito enquanto formalmente previsto na lei, mas o desvio criminal enquanto em si mesmo imoral ou antissocial e, para além dele, a pessoa do delinquente, de cuja maldade ou antissociabilidade o delito é visto como uma manifestação contingente, suficiente, mas nem sempre necessária para justificar a punição (06).
No plano das técnicas jurídicas, estas representações se refletem em uma desvalorização do papel da lei como critério exclusivo e exaustivo de definição dos fatos desviados. A técnica mais difundida é a previsão de figuras de delitos elásticas e indeterminadas, idôneas para conotar, em termos vagos ou valorativos, modelos globais de desvio – como a obscenidade, o desacato, a propaganda ou a associação subversiva, a associação de tipo mafioso, a ofensa à moral familiar e similares – em vez de indicar univocamente tipos de delitos empiricamente determináveis (07).
Comentando a questão da embriaguez no crime de desacato Jorge Beltrão registra que o que se depreende é que a doutrina e a jurisprudência têm entendido que nos crimes de desacato cabe uma grande parte para sua classificação ao juiz ou Tribunal, pois a estes compete analisar cada caso para aplicação da pena e isto nos ensina Boissanade que em todo o caso é preciso que a intenção de ofender o funcionário público seja certa: a vivacidade, a cólera, a falta de educação, a embriaguez, podem fazer pronunciar palavras malsonantes, sem intenção de injuriar; o Tribunal, tomará, também, em consideração a condição respectiva das pessoas (grifo de Beltrão) (08).
Nesse contexto, a criminalização do desacato deve ocorrer em um ponto de equilíbrio, de forma que preserve os interesses da Administração Pública (e consequentemente da honra de seus funcionários), mas que ao mesmo tempo, não coíba de forma indevida e excessiva a liberdade de expressão (e o consequente direito fiscalizatório da crítica aos atos do Estado) dos cidadãos (09).
Em suma, vê-se que o tipo penal de desacato numa ótica garantista é por demais aberto, permitindo a existência de um espaço discricionário muito grande para a decisão do Poder Judiciário (e também previamente da Polícia e do Ministério Público), o que viola de forma reflexa o princípio da legalidade do Direito Penal, que exige certeza e clareza na sua descrição.
Isso não é difícil de ser constado no Direito Penal brasileiro onde são numerosos os tipos com elementos normativos, crimes culposos, crimes omissivos impróprios e os que possuem uma excessiva margem discricionária em sua norma penal secundária (sanção penal) como, por exemplo, o crime de corrupção ativa ou o de tráfico de drogas.
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NOTAS
(01) CALHAU, Lélio Braga. Desacato. Belo Horizonte, Mandamentos, 2004, p. 107.
(02) HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. Volume IX, Rio de Janeiro, Forense, 1958, p. 418.
(03) GOMES, Luiz Flávio. Direito Penal – Parte Geral, São Paulo, RT, 2003, p. 138.
(04) FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão – teoria geral do garantismo. Tradução de Ana Paula Zomer, Fauzi Hassan Choukr, Juarez Tavares e Luiz Flávio Gomes. São Paulo, RT, 2002, p. 167.
(05) FERRAJOLI, Luigi, op. cit., p. 32.
(06) FERRAJOLI, op. cit., p. 35.
(07) FERRAJOLI, op. cit., p. 35-36.
(08) BELTRÃO, Jorge. Desacato, desobediência, resistência. 2ª ed., São Paulo, JULEX, 1988, p. 103.
(09) Calhau, Lélio Braga. Desacato. Belo Horizonte, Mandamentos, 2004, p. 24.
*Acessível em: http://jus.com.br/revista/texto/5734/critica-garantista-a-criminalizacao-do-desacato#ixzz2D2soIPnN

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