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Wanderley C. Oliveira
Filosofia da Educação
2011
O48f Oliveira, Wanderley C. Filosofia da Educação — São João del-Rei, MG : UFSJ, 2011. 96p.
 Curso de Graduação em Pedagogia. 1. Educação - Filosofia I. Título
CDU: 37.01
Reitor Helvécio Luiz Reis 
Coordenador UAB/NEAD/UFSJ Heitor Antônio Gonçalves
Comissão Editorial: Fábio Alexandre de Matos
 Flávia Cristina Figueiredo Coura
 Geraldo Tibúrcio de Almeida e Silva
 José do Carmo Toledo
 José Luiz de Oliveira
 Leonardo Cristian Rocha (Presidente)
 Maria Amélia Cesari Quaglia
 Maria do Carmo Santos Neta
 Maria Jaqueline de Grammont Machado de Araújo
 Maria Rita Rocha do Carmo
 Marise Maria Santana da Rocha
 Rosângela Branca do Carmo
 Rosângela Maria de Almeida Camarano Leal
 Terezinha Lombello Ferreira
Edição Núcleo de Educação a Distância
 Comissão Editorial - NEAD-UFSJ
Capa/Diagramação 
 Eduardo Henrique de Oliveira Gaio
SUMÁRIO
PRA COMEÇO DE CONVERSA... . . . . . . . . 05
UNIDADE 1. Introdução à Filosofia da Educação . . . . . 07
1.1 O que é Filosofia da educação? . . . . . . . . 09
 1.1.1 Introdução . . . . . . . . . . 09
 1.1.2 O que é um Diálogo? . . . . . . . . 09
 1.1.3 As condições que tornam possível um Diálogo . . . . . 09
 1.1.4 Os problemas filosóficos da Educação . . . . . . 15
 1.1.5 A Filosofia da Educação como um terceiro discurso . . . . 21
1.2 Para que Filosofia da Educação? . . . . . . 24
 1.2.1 Introdução . . . . . . . . . . 24
 1.2.2 O retorno às questões da filosofia . . . . . . . 25
 1.2.3 As relações entre crise e filosofia . . . . . . . 26
 1.2.4 Para que Filosofia da Educação? . . . . . . . 29
 1.2.5 Considerações finais . . . . . . . . 33
UNIDADE 2. Problemas da Educação na Perspectiva Filosófica . . . 37
2.1 O Problema dos Valores e Objetivos na Educação e seus Fundamentos Filosóficos . 39
 2.1.1 Introdução . . . . . . . . . . 39 2.1.2 O Telos e os Valores na Ação Educativa . . . . . . 39
 2.1.3 Do Pressuposto Antropológico aos Valores e Objetivos na Educação . . 41
 2.1.4 O Ser Humano, sua Circunstância e a Educação . . . . . 44
 2.1.5 Eu Sou Eu e Minha Circunstância . . . . . . . 44
 2.1.6 O Compromisso com a Circunstância e a Educação no Brasil . . . 45
 2.1.7 Considerações finais . . . . . . . . 46
2.2 Os Discursos: Ideológico, Pedagógico e Filosófico . . . . . 47
 2.2.1 Introdução . . . . . . . . . . 47
 2.2.2 O discurso Ideológico . . . . . . . . 48
 2.2.3 O Discurso Pedagógico e o Discurso Ideológico . . . . 49
 2.2.4 O Discurso Filosófico . . . . . . . 53
 2.2.5 Considerações finais . . . . . . . 55
2.3 Entre a retórica e a dialética: onde situar a fala professor em sala de aula? . . 56
 2.3.1 Introdução . . . . . . . . . . 59
 2.3.2 Caracterização da Retórica e da Dialética . . . . . . 58
 2.3.3 Retórica e Dialética em sala de aula: quadro comparativo. . . . 61
 2.3.4 Considerações finais . . . . . . . . 64
UNIDADE 3. A Filosofia na perspectiva dos problemas da Educação . . 67
3.1 A Educação como Mestiçagem na Filosofia de Michel Serres . . . 69
 3.3.1 Introdução . . . . . . . . . . 69
 3.1.2 A história de Arlequim, Imperador da Lua . . . . . 72
 3.1.3 A história de Arlequim e a Filosofia Mestiça da Educação em Michel Serres . 74
 3.1.4 A relação entre Exposição e Mestiçagem . . . . . 76
 3.1.5 O Desprendimento: condição necessária para a Exposição . . . 80
 3.1.6 Considerações finais . . . . . . . . 85
Pra final de conversa... . . . . . . . . 91
REFERÊNCIAS . . . . . . . . . 92
 
5
PRA COMEÇO DE CONVERSA...
Prezado(a) Estudante: 
Apresentamos a você o curso de Filosofia da Educação. Ele está organizado em três 
unidades.
A primeira unidade, de Introdução à Filosofia da Educação, é composta de dois tópicos. 
No primeiro, intitulado “O que é Filosofia da Educação?”, nosso objetivo é apresentar-
lhe uma definição para esta disciplina, a partir da qual desenvolveremos as unidades 
seguintes. No segundo tópico, com o título “Para que Filosofia da Educação?”, procuramos 
pensar a função desta disciplina na formação do educador. 
Na segunda unidade, a partir do título Problemas da Educação na Perspectiva Filosófica, 
desenvolvemos três tópicos.
No primeiro, mostramos como um problema da educação, aquele dos valores e objetivos, 
nos remete aos seus fundamentos filosóficos, mais exatamente aos três campos da filosofia 
identificados na unidade anterior, a saber a Epistemologia, a Axiologia e a Antropologia 
Filosófica.
No segundo, estudamos as relações entre os Discursos Ideológico (DI), Pedagógico (DP) e 
Filosófico (DF). Para isso, primeiramente, caracterizamos o DI, em seguida, o referimos ao 
DP, para finalmente, identificar e caracterizar o DF como importante ao DP, caso queiramos 
defini-lo como um discurso comprometido com o saber e não com poder e a dominação.
Finalmente, no terceiro tópico, refletimos sobre a seguinte questão: entre retórica e a 
dialética, onde situar o discurso do professor em sala de aula? Começamos por uma 
caracterização da retórica e da dialética. Depois, traçamos um quadro comparativo entre 
elas para, em seguida, considerarmos a questão central do texto: entre elas, onde situar a 
fala do professor? Concluímos indagando-nos quanto à possibilidade ou não de se abdicar 
completamente da retórica em sala de aula.
A terceira unidade do curso tem como título: A Filosofia na Perspectiva de Problemas 
da Educação. Nesta unidade faremos um movimento inverso em relação àquele realizado 
na segunda unidade. Nela, partimos de problemas da Educação e caminhamos em direção 
6
à Filosofia. Agora, partiremos da Filosofia em direção à Educação. Nossa intenção é estudar 
o pensamento de um filósofo na perspectiva da educação, ou seja, trata-se, nesta unidade, 
de ver o que uma determinada filosofia sugere ou propõe como reflexão para a educação. 
O filósofo que estudaremos é o francês Michel Serres (1930). Procuraremos analisar sua 
obra no sentido de uma concepção da educação como mestiçagem. Daí o título do único 
tópico que desenvolvemos nesta unidade: A educação como mestiçagem na filosofia de 
Michel Serres. 
Esperamos que você goste do curso e que ele seja proveitoso para sua formação como 
pedagogo(a). Passamos então ao desenvolvimento das unidades. 
Bons estudos!
7
INTRODUÇÃO À FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO
Objetivos
•	 Elaborar uma definição de Filosofia da Educação.
•	 Explicitar os campos da Filosofia nos quais a Educação encontra seus fundamentos 
filosóficos.
•	 Refletir a questão: Para que Filosofia da Educação na formação do professor?
unidade 1
9
unidade 1
1.1 O que é Filosofia da Educação?
1.1.1 Introdução
Concebemos a Filosofia da Educação como um diálogo entre a educação e a filosofia, a 
partir dos problemas filosóficos da educação, visando a um terceiro discurso, que não é 
apenas o da educação ou apenas o da filosofia, mas que é Filosofia da Educação.
Dada a definição acima, nossa tarefa agora é explicá-la detalhadamente, uma vez que 
é a partir dela que desenvolveremos as unidades seguintes desta disciplina. Pedimos a 
sua atenção para os termos escritos em itálico no parágrafo anterior, pois conduziremos 
o aprofundamento da compreensão da noção de Filosofia da Educação por meio deles. 
Começamos, então, com o termo diálogo. Quando propomos a Filosofia da Educação como 
um diálogo entre a educação e a filosofia, o que entendemos por “diálogo”?
1.1.2 O que é um Diálogo?
Numa definição sucinta e precisa, o filósofo alemão Martin Heidegger (1973) ensina-
nos que o diálogo consiste, “evidentemente, no fato de falarmos uns com os outros 
sobre alguma coisa” (p. 49). Tomemos esta definição bastante simples e, aparentemente, 
evidente (como afirma Heidegger) e vejamos o que ela nos desvela do ‘diálogo’ quando 
nos perguntamos: à luz da noção heideggeriana de diálogo, o que é que o tornapossível?
1.1.3 As condições que tornam possível um Diálogo 
- O Poder-Falar
A primeira condição que a citação de Heidegger parece nos apontar para que exista um 
diálogo é o fato de as partes nele envolvidas poderem falar. Sem o poder-falar, será que o 
diálogo é possível? Mas que significa poder-falar? Entendamo-nos, primeiramente, quanto 
ao falar. Dentre os vários sentidos deste termo, um dos mais corriqueiros é aquele pelo 
qual ele significa expressar-se ou exprimir-se por meio de palavras. Falar significa também 
se fazer compreender e tem como sinônimos revelar, indicar, manifestar, exprimir-se ou 
expressar-se. Podemos, assim, ampliar o sentido de falar, como se exprimir por meio de 
palavras, para o sentido de fazer-se compreender, expressar-se. É nessa perspectiva que, 
por exemplo, dizemos que os mudos falam por gestos, são capazes de falar com as mãos, 
isto é, têm a capacidade de se fazerem compreender através da linguagem dos sinais. Falar, 
nestes termos, quer dizer, então, exatamente isto: articular e comunicar uma mensagem 
10
que tenha significado para outrem, independentemente do recurso usado para dar corpo 
à mensagem.
Mas, no poder-falar, qual o sentido do termo poder? Aqui, propomos dois. Poder como 
ter a capacidade de se fazer compreender, ter a potência de fazer-se entender não só por 
palavras, mas por qualquer outro veículo capaz de dar corpo ao que queremos significar. 
O primeiro sentido do poder no poder-falar é, portanto, aquele do poder como potência 
ou capacidade de comunicar uma mensagem significativa. Mas a este sentido é preciso 
acrescentar outro, sem o qual o poder-falar permanece incompleto como condição para a 
existência do diálogo. Trata-se, agora, de compreender o poder como ter o direito de falar, 
de expressar-se, de fazer-se compreender. 
Se ao poder como potência não se acrescenta o poder como direito, o diálogo persiste 
barrado. É o que vemos, por exemplo, na sala de aula em que apenas o professor faz uso de 
seu poder-falar, mas não dá direito de voz ao aluno, embora este também possa ou tenha 
capacidade de falar. Este outro ao qual negamos o direito de dispor de seu poder de falar 
se reedita para além da sala de aula sob várias figuras em nossa sociedade: a criança, o 
idoso, o louco, a mulher, o negro, o índio, o imigrante, o operário são apenas algumas delas. 
Embora todas possam falar, nem sempre têm o direito à fala. Em tais casos, na ausência 
do poder como direito negado, o caminho é a busca de imposição da fala como potência. 
Trata-se, aqui, de ver o direito à voz não como um dom, algo que nos é dado, mas como 
uma conquista, algo pelo qual precisamos brigar.
- O Poder-Escutar
Contudo, nas situações em que exercemos nosso direito à fala, e o outro não reconhece nossa 
capacidade de falar, o diálogo se encontra igualmente barrado; porque, embora o outro 
não possa negar-me o direito, há sempre a possibilidade de ele negar minha capacidade. 
Assim, tenho o direito de falar, mas o outro não acredita que eu seja capaz de falar algo que 
faça sentido. Mais uma vez, abrem-se aqui inúmeras cenas de impossibilidade do diálogo 
em nosso cotidiano. Os professores, os pais, os patrões, os políticos, os adultos, os jovens 
não negam direito à fala, respectivamente, aos alunos, filhos, empregados, eleitores, às 
crianças e aos idosos, mas não admitem que eles possam dizer algo significativo.
Logo, para que o diálogo exista, ao poder-falar é preciso corresponder o poder-escutar. Só 
o poder-falar não basta para que o diálogo se torne possível. De nada adianta poder-falar 
sem que se possa ser ouvido. Assim, além do poder-falar, precisamos acrescentar ainda, 
11
unidade 1
como condição para a experiência do diálogo, o poder-escutar não apenas no sentido de 
ter a capacidade de acolher a fala do outro, de apreender seu sentido, mas, sobretudo, de 
querer que o outro fale, de ter vontade de escutar sua fala, mesmo que seja para discordar dela. 
- O Dissenso, o Consenso e o Conflito
Resultando no dissenso ou no consenso, o diálogo é sempre uma experiência formativa 
para aqueles que o vivenciam. No conflito não há diálogo, porque, nele, um quer eliminar 
o outro, aniquilar seu logos ou seu discurso, silenciar sua voz; mas são frutos do diálogo 
o consenso e o dissenso, e ambos são formativos. O consenso nos conduz ao encontro do 
outro e à compreensão de seu ponto de vista. É formativo, porque nele aprofundo e amplio 
minhas ideias com aquilo que acolho ou recebo do outro. Mas o dissenso também o é, 
pois nele conheço melhor minhas posições, à medida que busco esclarecê-las, para que se 
tornem mais nítidas as diferenças entre o que estou dizendo e o que o outro diz.
Experiência difícil de ser vivida e com a qual estamos pouco acostumados, a dissidência 
possibilita o exercício e o aprofundamento das diferenças, sem que isso conduza ao conflito. 
Diante dos discursos ou práticas imperialistas, totalitaristas e homogeneizantes em sala 
de aula, na família, na política, na economia, na religião, nas ciências etc., a dissidência 
abre espaço para a possibilidade de outros modos de ver e de viver. Institui espaços de 
liberdade ou de diferença vivenciados, exatamente, como “o cuidado de se mover em 
direção a esta diferença.” (LAIGNEL-LAVASTINE, 1998, p. 92).
Diante de todo sentido, que se pretende como único, a dissidência se apoia, primeiramente, 
“sobre o reconhecimento de que o sentido é sempre algo problemático” e, em seguida, 
“sobre a vontade [...] de sustentar esta problematicidade até o fim” (p. 81. Itálicos nossos). 
Retornam aqui personagens de nosso cotidiano, máscaras que usamos no dia a dia, cada 
qual com seu duplo: professores e alunos, pais e filhos, patrões e empregados, políticos 
e eleitores, adultos e crianças, jovens e idosos, homens e mulheres, dentre tantas outras 
figuras que povoam nossas vidas e das quais testemunhamos, quando não somos nós 
mesmos estas figuras, a facilidade do conflito entre elas e a dificuldade de construção do 
dissenso na liberdade da diferença ou do consenso sem que haja submissão. 
Logo, o diálogo, quando acontece, resultando no consenso ou no dissenso, sempre amplia 
nossa visão do mundo, de nós mesmos e dos outros, pois o consenso soma os pontos de 
vista, ao passo que o dissenso os multiplica. Contudo, o conflito, à medida que requer a 
anulação de um deles, os diminui.
12
- Uns e Outros: o Ego e o Alter-Ego
Mas, além do poder-falar e do poder-escutar, que outras condições são necessárias 
para vivenciarmos o diálogo? O poder-falar e o poder-escutar são duas exigências para 
a existência do diálogo. Mas precisam pertencer a alguém. Voltemos à definição de 
Heidegger e vejamos a quem elas pertencem. É claro que pertencem, conjuntamente, a 
“uns” e “outros”, compreendidos aqui como polos de logos distintos, fontes de discursos 
diferentes, mas não necessariamente antagônicos pois, neste caso, como já foi dito, o 
resultado é o conflito, e não o dissenso ou o consenso. Vejamos, portanto, para a existência 
do diálogo, a importância de “uns” e “outros” se reconhecerem como alter-ego. 
Para que o diálogo se torne possível é preciso que o outro, ao mesmo tempo, seja igual a 
mim, isto é, um outro-EU, mas diferente de mim, isto é, um OUTRO-eu. Por outras palavras, 
o outro precisa ser reconhecido, ao mesmo tempo, como idêntico a mim, mas também 
como realmente uma alteridade, diferente de mim. Se for apenas idêntico a mim, não há 
diálogo, falamos a mesma coisa, e o que temos é um monólogo a dois. Se for completamente 
diferente de mim, também não há diálogo, mas puro estranhamento, sem a base comum 
do EU que permite a identificação entre nós.
Portanto, o diálogo exige o reconhecimento entre “uns” e “outros”, ao mesmo tempo, tanto 
como identidade quanto como diferença, mas nunca como antagônico. Quando afirmo o 
outro como idêntico a mim, ou seja, também como Ego ou Sujeito, sou destituído de minha 
posição central, não sou maiso único a poder-falar; pois o outro também pode fazê-lo; 
mas, ao reconhecê-lo como diferente de mim, sei que não dirá a mesma coisa que eu, que 
não vê o mundo do lugar em que o vejo. 
Cumpre acrescentar ainda que o outro jamais aparece diante de mim como um objeto. 
Ele surge primeiramente como um desdobramento de mim mesmo, uma réplica de mim 
mesmo: vejo que o outro vê ou percebe o mundo em torno dele como eu o percebo em torno 
de mim. O reconhecimento do outro se dá, primeiramente, pautado pela semelhança; mas, 
se ele é verdadeiramente outro, como afirma Merleau-Ponty (1969), “é preciso que em 
certo momento eu seja surpreendido, desorientado, e que nós nos encontremos, não mais 
no que tínhamos de semelhança, mas no que temos de diferente” (p. 198), o que engendra 
uma transformação tanto em mim quanto no outro, pois “a percepção de um verdadeiro 
alter ego supõe que seu discurso [...] tenha o poder [...] de nos abrir para outro sentido [...], 
uma nova situação de conhecimento” (p. 199) de mim mesmo, do outro e do mundo. É 
13
unidade 1
13
assim que o diálogo tem o poder de nos lançar em direção a significações que, antes dele, 
não possuíamos. 
Esclarecida a relação de reconhecimento recíproco que precisa haver entre “uns” e 
“outros” para a existência do diálogo, podemos estabelecer agora que, ao “poder-falar” 
de “uns” deve corresponder o “poder-escutar” de “outros” e vice-versa. Sem essa permuta 
entre “poder-falar” e “poder-escutar” entre “uns” e “outros” não é possível haver diálogo.
Numa suposta conversa, entre as duplas de figuras ou personagens que elencamos em 
parágrafos anteriores, se apenas um fala enquanto o outro apenas escuta, não haverá 
diálogo, porque, como vimos, para que o diálogo exista, é preciso que ambos os lados 
possam falar e possam escutar uns aos outros, reciprocamente. Portanto, no diálogo, o que 
“uns” falam é escutado por “outros”, que ao falarem também serão ouvidos. O diálogo 
pressupõe esta permuta do Poder-Falar (PF) e do Poder-Escutar (PE) entre Uns e Outros. 
Já temos, portanto, quatro condições para a experiência do diálogo. Esquematicamente, 
podemos apresentá-las assim: 
UNS OUTROS
PF ----------------- > PE
PE <----------------- PF
 CINE
Os filmes abaixo são indicados para discutir e aprofundar o conceito de diálogo 
apresentado até agora. Em cada um deles, você pode procurar identificar situações 
ou cenas nas quais existem ou não o diálogo e analisá-las à luz das condições para 
a existência do mesmo estudadas até aqui.
•	 KOLYA - UMA LIÇÃO DE AMOR.
- Ficha Técnica: Direção: Jan Sverák. País: República Tcheca. Gênero: Drama. 
Lançamento: 1996. Duração: 105mim.
- Sinopse: Por motivos políticos na República Tcheca, violinista é impedido de 
trabalhar. Um dia conhece uma jovem russa que precisa de marido tcheco para 
regularizar sua situação. Ele decide ajudar, mas a polícia desconfia. A mulher foge 
e deixa o filho. 
cine
14
•	 O OITAVO DIA
- Ficha Técnica: Direção: Jaco van Dormael. País: (França / Bélgica / Inglaterra). 
Gênero: Drama. Lançamento: 1996. Duração: 118 minutos. 
- Sinopse: Harry (Daniel Auteuil) é um empresário estressado, que trabalha no 
departamento comercial de um banco belga e foi abandonado por sua esposa e 
filhas há pouco tempo. Deprimido, ele se dedica ao trabalho durante os 7 dias 
da semana. Até que um dia ele decide vagar pelas estradas da França, sem rumo 
definido. Após quase atropelar Georges (Pascal Duquennes), que sofre de síndrome 
de Down, Harry decide levá-lo para casa, mas não consegue se desvencilhar dele.
•	 CASA DE AREIA E NÉVOA
- Ficha Técnica: Direção: Vadim Perelman. País: EUA. Gênero: Drama. Lançamento: 
2003. Duração: 126 minutos
- Sinopse: Duas pessoas travam uma disputa até às últimas consequências. De um 
lado está Kathy (Jennifer Connelly), jovem que sofre profunda depressão após 
ter sido abandonada pelo marido. Por um erro do governo, ela é expulsa da casa 
em que morava. Inconformada, contrata um advogado para recuperar o que ela 
acredita ser o último símbolo de sua sanidade. Do outro lado está Massoud Amir 
Behrani (Ben Kingsley), imigrante iraniano que comprou a casa de Kathy em leilão, 
o que para ele é a oportunidade de dar conforto à mulher e ao filho e de recuperar 
o padrão de vida que tinham no Irã.
- Para que haja um diálogo é necessário um assunto
Esperamos que tenha gostado dos filmes que indicamos.
Voltamos agora ao esquema do diálogo que apresentamos anteriormente. Nele, falta ainda 
uma condição, sem a qual o “diálogo” não é possível. Para que ele exista é preciso que uns 
e outros possam falar e possam escutar reciprocamente. Mas o que ainda falta?
Ao retomarmos a definição do diálogo como “o fato de falarmos uns com os outros sobre 
alguma coisa” (HEIDEGGER, 1973, p. 49. Itálico nosso), podemos ver que o que falta no 
esquema é “alguma coisa”, o assunto sobre o qual dialogar, o campo ou o tema comum sobre 
o qual se estabelecerá o diálogo. O assunto é o mundo compartilhado no qual podemos 
nos encontrar. Podemos, agora, completar o esquema das condições para a experiência do 
diálogo: 
15
unidade 1
UNS OUTROS
PF --------------------> PE
Alguma coisa
PE <-------------------- PF
Com estes esclarecimentos sobre o “diálogo”, retomemos a definição de Filosofia da 
Educação dada no início desta unidade. Dizíamos que a concebemos como um diálogo 
entre a educação e a filosofia, a partir dos problemas filosóficos da educação, visando a 
um terceiro discurso, que não é apenas o da educação ou apenas o da filosofia, mas que é 
Filosofia da Educação. Com as condições que desvelamos para a existência de um diálogo, 
podemos estruturar, agora, esta concepção de Filosofia da Educação da seguinte forma: 
(Uns/Filosofia) (Outros/Educação)
Poder-Falar-----------------------------→ Poder-Escutar
(Problemas Filosóficos da Educação)
Poder-Escutar←-----------------------------Poder-Falar
Assim, ao pensarmos a Filosofia da Educação como um diálogo entre filosofia e educação, 
precisamos ver que pertencem, igualmente, a uma e a outra, o poder-falar e o poder-
escutar. Não se trata de submeter uma ao discurso da outra, pois elas são diferentes. 
Trata-se de, pelo esquema acima, fazê-las dialogar a partir de assuntos que lhes sejam 
comuns, a elas saber, justamente, os Problemas Filosóficos da Educação. Eles são o tema 
do diálogo entre elas. Mas aqui surge uma outra questão: o que são Problemas Filosóficos 
da Educação? Para melhor tratarmos desta pergunta, vamos dividi-la, procurando saber, 
primeiramente, o que é “problema”? Em seguida, identificaremos problemas da educação, 
mostrando como eles podem nos conduzir a Problemas Filosóficos da Educação. 
1.1.4 Os Problemas Filosóficos da Educação
1.1.4.1 O que é um problema? 
Para este ponto nos servimos de Saviani (1989), que nos explica que um problema não 
é sinônimo de questão, seja ela simples ou complexa. Por exemplo, a questão simples 
(quantos são 2 + 2?) não é um “problema”; do mesmo modo, a questão complexa (quais os 
nomes de cada uma das cerca de 7.100 ilhas que compõem o arquipélago das Filipinas?) 
16
também não é um problema? O fato de não sabermos a resposta para uma questão não basta 
para que tenhamos o real significado da palavra problema. Algo que não sei e não preciso 
saber não é um problema. Também é comum identificarmos o problema com vocábulos 
tais como obstáculo, dificuldade, dúvida, etc. Mas eles nem sempre são problemas. Posso 
me deparar com um obstáculo sem ter a necessidade de transpô-lo, então, este obstáculo 
não será um problema. Do mesmo modo, não são problemas uma dificuldade que eu não 
precise supera ou uma dúvida que não necessite ser dissipada.
Aos poucos, vamos percebendo que, embora uma questão, um obstáculo, uma dificuldade 
ou uma dúvida não sejam originariamente problemas, eles podem vir a sê-los. Mas o 
que vai fazer de cada um deles um “problema”?Na resposta a esta questão, chegamos à 
essência do significado da palavra problema. Segunda esclarece Saviani (1989a, p. 21),
uma questão, em si, não caracteriza o problema, nem mesmo aquela cuja 
resposta é desconhecida; mas uma questão cuja resposta se desconhece 
e se necessita conhecer, eis aí um problema. Algo que eu não sei não é 
problema; mas quando eu ignoro alguma coisa que eu preciso saber, eis-
me, então, diante de um problema. Da mesma forma, um obstáculo que 
é necessário transpor, uma dificuldade que precisa ser superada, uma 
dúvida que não se pode deixar de ser dissipada são situações que se nos 
configuram como verdadeiramente problemáticas.
Retornando à pergunta: o que faz de uma questão um problema ou de um obstáculo, 
dúvida ou dificuldade situações problemáticas? A resposta é: a necessidade de solucioná-
las ou superá-las. Usamos, o tempo todo, a palavra problema desatentos ao sentido 
dramático desta palavra. Toda vez que estamos numa situação na qual não podemos 
permanecer, da qual precisamos sair, na qual nos encontramos enrascados e precisamos 
nos livrar, estamos num problema. “Se o problema deixou de ser problemático, cumpre, 
então, recuperar a problematicidade do problema.” (SAVIANI, 1989a, p. 21), sob a pena de 
nos habituarmos a viver tranquilamente entre problemas, distraídos da necessidade, da 
urgência de solucioná-los, de superá-los, de sairmos dele.
Uma vez na posse do real sentido da palavra problema, podemos nos perguntar agora: o 
que são problemas da educação e como eles podem nos conduzir a problemas filosóficos?
17
unidade 1
 CINE
Para discutir o cotidiano escolar e os problemas enfrentados pelos alunos, assista 
ao filme.
•	 PRO DIA NASCER FELIZ.
- Ficha Técnica: Direção: João Jardin. País: Brasil. Gênero: Documentário. 
Lançamento: 2006. Duração: 88 minutos.
- Sinopse: O filme documenta as situações que o adolescente brasileiro enfrenta 
na escola, envolvendo precariedade, violência e esperança. Adolescentes de três 
estados, de classes sociais distintas, falam de suas vidas na escola, seus projetos e 
inquietações. Disponível em <http://www.adorocinema.com/>. Acesso em 01 de 
setembro de 2011.
1.1.4.2 Dos problemas da educação aos problemas filosóficos da educação 
 Nem todo problema da educação é um problema filosófico da educação. Os problemas 
da educação fundamentam-se nos propósitos, fins e meios da educação, ou seja, “os 
problemas da educação são, precisamente, problemas de educação e não de filosofia.” 
(BRAUNER, 1969, p. 18). Contudo, podemos refleti-los até as raízes filosóficas a que 
remontam. Vejamos, portanto, a seguir, como problemas da educação nos enviam a 
problemas filosóficos da educação. 
 - Problemas referentes ao conhecimento
 Uma das metas sempre presente na educação é a aquisição do conhecimento. E a partir 
desta meta, uma vez definida, surge uma série de problemas relativos ao conhecimento na 
educação. Por parte do professor, por exemplo, ele pode se questionar se deve transmitir o 
conhecimento ao aluno ou se deve orientá-lo na elaboração de seu próprio conhecimento; 
ou seja, ele pode se indagar se é um repassador de conhecimento ou um mediador na 
aquisição/elaboração do conhecimento por parte dos alunos, sobre os quais, ainda no 
que diz respeito ao conhecimento, podemos nos perguntar se são uma caixa vazia onde 
o professor depositará seu conhecimento ou se são sujeitos ativos, capazes de elaborar, 
com a mediação do professor, seus próprios conhecimentos. Por parte da administração 
escolar, podemos interrogar pelo tipo de conhecimento que comporá os currículos e que 
será trabalhado em sala de aula. No tocante às didáticas, elas continuam se desdobrando 
na busca de caminhos para otimizar a aquisição do conhecimento.
cine
18
 Todos esses problemas relativos ao conhecimento são problemas da educação e não 
da filosofia. Mas todos eles somente são possíveis porque pressupõem o conhecimento 
como possível. Por outras palavras, é porque, na educação, pressupõe-se que é possível 
conhecer, isto é, pressupõe-se a possibilidade do conhecimento, e por isso que, a partir 
daí, a educação pode pôr como sua meta a aquisição do conhecimento, deparando-se, em 
seguida, com todos os problemas relativos ao conhecimento, tal como exemplificamos 
acima. Se a educação não tomasse como possível o conhecimento ou a questão da 
possibilidade do conhecimento como já resolvida, ela sequer poderia colocá-lo como sua 
meta, o que eliminaria pela base os problemas relativos ao conhecimento na educação.
 Em suma, os problemas referentes ao conhecimento na educação somente são possíveis 
a partir do pressuposto de que é possível conhecer. Mas é então que surge o problema 
filosófico: é possível conhecer? Em caso afirmativo, o que é possível conhecer? Como é 
possível conhecer? Tais questões são, propriamente, problemas filosóficos. E é a filosofia 
enquanto teoria do conhecimento, isto é, enquanto epistemologia, que vai trabalhá-las. 
 ATIVIDADE
Pesquise na Internet sobre os termos: Dogmatismo, Ceticismo e Relativismo e 
defina as principais diferenças entre eles em relação ao conhecimento.
 - Problemas referentes aos valores
 Mas por que é que, na educação, toma-se como meta a aquisição do conhecimento? Será 
que é porque se julga que é melhor ser instruído que ser ignorante? Que é melhor ser culto 
que ser inculto? Que o sujeito culto tem seus horizontes mais ampliados que o inculto? Em 
síntese, será que, na educação, toma-se como meta a aquisição do conhecimento, porque 
se julga que o conhecimento é um valor para o ser humano? Se dermos uma resposta 
afirmativa a esta questão, estamos apenas criando condições para outras questões, desta 
feita, filosóficas, tais como: mas o que é um valor? Como é que algo surge como um valor? 
Por que algo é um valor? Todas estas questões relativas aos valores são problemas da 
filosofia. E é a filosofia, enquanto teoriza os valores, ou seja, enquanto axiologia, que vai 
refleti-las.
 - Problemas referentes ao ser humano
 Porém, se na educação o conhecimento é tomado como um valor que deve ser adquirido, 
é porque se supõe que ele está em função da promoção do ser humano. A educação visa à 
19
unidade 1
promoção do ser humano, e é exatamente por isso que toda literatura ou prática educativa 
pressupõe, explícita ou implicitamente, uma visão ou uma ideia do que é o ser humano 
que ela pretende formar (GADOTTI, 1981). Entretanto, a partir dessas ideias do que é o ser 
humano, pressupostas na educação, podemos nos perguntar: mas o que é o ser humano? 
Como defini-lo? Como ele se constitui naquilo que é? Tais questões, fundamentais para a 
educação, nem sempre são pensadas pelo educador, pois ele já as toma como respondidas 
em sua práxis pedagógica. Entretanto, elas são verdadeiros problemas para a filosofia. E é 
a filosofia, enquanto se preocupa com as questões referentes ao homem, ou seja, enquanto 
Antropologia Filosófica, que vai refleti-las.
 É assim que, partindo da educação, chegamos aos problemas da filosofia, tal como eles 
se apresentam na educação. É assim, também, que chegamos aos três grandes campos 
da filosofia, nos quais a educação busca seus fundamentos filosóficos, quais sejam: a 
Epistemologia (teoria do conhecimento), a Axiologia (teoria dos valores) e a Antropologia 
filosófica. 
 SAIBA MAIS...
Os textos abaixo são indicados para você aprofundar os conceitos de Epistemologia, 
Axiologia e Antropologia Filosófica. 
GOERGEN, P. Educação e valores no mundo contemporâneo. Educ. Soc., Campinas, 
vol. 26, n. 92, p. 983-1011, Especial - Out. 2005. Disponível em: <http://www.cedes.
unicamp.br>. Acessado em: 19 de out. de 2011.
JAPIASSU, Hilton Ferreira. O que é a epistemologia. In:_. Introdução ao pensamento 
epistemológico. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1975. p. 19-29.
JOLIF, J-Y. Compreender o homem: introdução a uma Antropologia Filosófica. São 
Paulo: Herder, 1970.
LIMA VAZ, H.C.Antropologia Filosófica I. São Paulo: Loyola, 1991. 
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Os valores. In:_. Ética. Rio de Janeiro: Civilização 
Brasileira, 1987. p. 115-130.
20
1.1.4.3 A Filosofia da Educação como uma disciplina problematizadora
Portanto, já sabemos como vamos, nas unidades seguintes, promover o diálogo entre 
filosofia e educação. Tomaremos problemas da educação, procurando pensá-los até aquele 
nível em qe eles se remontam a verdadeiros problemas filosóficos. Deste modo vamos nos 
deparar não somente com problemas da educação, mas, sobretudo, com problemas da 
filosofia presentes na educação, ou seja, com problemas filosóficos da educação.
Portanto, ao voltarmos, agora, à concepção de Filosofia da Educação que estamos 
explicando, podemos compreender suas duas primeiras partes: (1) A filosofia da educação 
como um diálogo entre a educação, e a filosofia, (2) a partir dos problemas filosóficos 
da educação. À medida que se institui como este diálogo problematizante, a Filosofia 
da Educação se apresentará mais como uma interrogação do que como uma disciplina 
afirmativa. Neste sentido, a Filosofia da Educação foge dos quadros de disciplinas mais ou 
menos positivas como a Sociologia, a Psicologia ou a Estatística, que nos dão o que dizer, 
que nos oferecem conteúdos mais ou menos positivos, fechados. No caso da Filosofia da 
Educação, tal como a caracterizamos, trata-se mais de dar o que pensar do que o que dizer. 
Antes de afirmar, trata-se muito mais de estabelecer um problema e procurar refleti-lo, 
interrogar-se sobre ele.
 É pelo exposto acima que a Filosofia da Educação se define como uma disciplina 
problematizadora, visto que é no viés dos problemas da educação que seremos remetidos 
à filosofia, mais especificamente, àqueles campos identificados acima como prioritários 
para a reflexão filosófica da educação, a saber, a Epistemologia, a Axiologia e a Antropologia 
Filosófica.
Cabe-nos, por fim, explicar a terceira e última parte da definição de Filosofia da Educação 
que estamos construindo. Trata-se daquela parte na qual a apresentamos como um 
terceiro discurso, resultado do diálogo entre filosofia e educação. 
21
unidade 1
 SAIBA MAIS...
Sobre a concepção de Filosofia da Educação como uma disciplina problematizadora, 
no texto de
PAVIANI, Jayme. A problematização como recurso pedagógico. In:_. Problemas de 
filosofia da educação. Petrópolis: Vozes, 1990. p. 79-89.
Reflita, a partir do texto indicado acima, as seguintes questões:
1. O que é uma educação problematizadora?
2. Em que uma educação problematizadora contribui para a formação do educador?
3. Qual o perfil de um educador problematizador?
4. Como a filosofia da educação pode ser uma disciplina problematizadora?
1.1.5 A filosofia da educação como um terceiro discurso
Estamos terminando a apresentação de nossa concepção de Filosofia da Educação. Falta 
ainda compreendê-la como um terceiro discurso. É disso, portanto, que tratamos agora 
para terminar o primeiro tópico desta unidade.
Você pode perceber que, quando realmente existe um diálogo entre as pessoas, o que sai 
da boca de uma entra pelo ouvido da outra, que, ao falar, traz mesclado em seu discurso 
aquilo que escutou do outro. Como afirma Merleau-Ponty (1969), quando “falo ao outro e 
o escuto, o que escuto vem se inserir nos intervalos do que eu digo, minha fala é recortada 
lateralmente por aquela do outro, eu me escuto nele e ele fala em mim” (p. 197). É assim 
que, no diálogo, suposta a escuta do que outro diz, existe sempre esta reformulação da fala, 
a partir daquilo que acabamos de ouvir, até chegar a um ponto em que um discurso deve 
tanto ao outro que cada um se vê incapacitado de apreciar com justeza aquilo que é seu 
e aquilo que recebeu do outro. Desse modo, como resultado de um diálogo, o que temos 
é sempre um terceiro discurso, que não é nem apenas o discurso de um, nem apenas o 
discurso de outro, mas que é a mescla de ambos, o resultado do acasalamento daqueles 
dois primeiros discursos.
Assim, voltando ao conceito de Filosofia da Educação exposto no início desta unidade, 
podemos compreendê-la agora como este terceiro discurso, resultado do diálogo entre 
filosofia e educação. Nele está presente tanto a filosofia quanto educação. Contudo, como 
resultado de um diálogo, é impossível repartir nele, a cada momento, o que da filosofia e 
22
o que é da educação. 
Educação e filosofia resultam, assim, como intimamente relacionadas, de modo que, ao se 
falar de Filosofia da Educação, não estamos falando apenas de filosofia ou de educação, mas 
estamos falando de filosofia e educação, ao mesmo tempo, presentes numa só disciplina: a 
Filosofia da Educação.
 ATIVIDADE
I - Marque V ou F para cada bloco de questões e, em seguida, marque com um 
X a sequência correta das respostas.
( ) São condições para a existência de um diálogo: o poder-falar, o poder-escutar, 
a existência de duas ou mais pessoas ou logos diferentes e, finalmente, o assunto 
sobre o qual dialogam.
( ) Falar, em sentido amplo, significa articular ou comunicar uma mensagem que 
tenha significado para o outro, independentemente do recurso usado para dar 
corpo à mensagem.
( ) No poder-falar como umas das condições para a existência do diálogo, poder 
tem duplo sentido ter capacidade de falar e ter direito de falar.
1) ( ) V, V,V 2) ( ) F, V, V 3) ( ) F, F, V 4) ( ) F, V, F
______________________________________________________________________
Faça o mesmo exercício. 
( ) Sempre que me deparo com um obstáculo, uma dificuldade ou uma dúvida, 
tenho um problema.
( ) Todo problema da educação é um problema filosófico da educação.
( ) O ‘diálogo’ que tentaremos estabelecer entre filosofia e educação se fará a partir 
dos problemas da filosofia tal como se manifestam na educação ou dos problemas 
da educação alçados à sua dimensão filosófica.
( ) Embora uma questão ou uma dúvida não sejam, a princípio, ‘problemas’ , elas 
podem vir a sê-los caso eu tenha necessidade de resolvê-las ou solucioná-las.
1) ( ) F, V, V, F 2) ( ) F, V, V, V 3) ( ) V, V, F, F 4) ( ) F, F, V, V
23
unidade 1
23
( ) A Epistemologia, a Axiologia e a Antropologia Filosófica são campos da filosofia 
nos quais a educação se fundamenta.
( ) A Epistemologia é um campo da filosofia voltada para as questões relativas ao valores.
( ) A Axiologia é um campo da filosofia voltado para as questões relativas ao 
conhecimento.
( ) A Antropologia Filosófica é a área da filosofia que reflete as questões relativas 
ao conhecimento.
1) ( ) F, F, V, V 2) ( ) V, F, F, F 3) ( ) F, V, F, V 4) ( ) F, V, V, F
______________________________________________________________________
( ) A disciplina Filosofia da Educação, ao buscar refletir os problemas filosóficos 
da educação, apresenta-se mais como uma disciplina afirmativa do que como uma 
disciplina interrogativa.
( ) No diálogo existe sempre a reformulação da fala a partir do que ouvimos até 
chegar a um ponto em que um discurso deve tanto ao outro que cada um se vê 
incapacitado de apreciar com justeza aquilo que é seu e aquilo que recebeu do 
outro.
( ) Como resultado de um ‘diálogo’, o que temos é sempre um terceiro discurso,que 
não é nem apenas o discurso de um, nem apenas o discurso de outro, mas que é a 
mescla de ambos.
( ) A educação visa sempre à promoção do ser humano. Neste sentido, toda 
literatura pedagógica pressupõe uma visão ou uma ideia do que é o ser humano.
1) ( ) F, F, V, V 2) ( ) V, V, F, F 3) ( ) F, F, F, V 4) ( ) F, V, V, V
II - À luz do conceito de diálogo que estudamos neste tópico e das condições 
que possibilitam sua existência, procure responder à seguinte questão: Para 
você, existe diálogo entre professor e aluno em sala de aula? Justifique sua 
resposta.
III - No conceito de Filosofia da Educação tal comoapresentamos neste tópico, 
qual a importância do diálogo entre filosofia e educação?
24
1.2 Para que Filosofia da Educação?
1.2.1 Introdução
Iniciamos aqui o segundo tópico desta unidade de introdução à Filosofia da Educação. 
Nosso objetivo agora é refletir sobre a pergunta: Será que a Filosofia tem alguma 
relevância para o educador? Originalmente, o texto que usamos para desenvolver este 
tópico foi publicado em 2005, em coautoria com duas ex-alunas do curso de pedagogia da 
Universidade Federal de S. João del-Rei (UFSJ), Eliane L. Calsavara e Patrícia Helena Mol 
Silva. Para maiores informações, verifique nas Referências (OLIVEIRA, W.C et al., 2005). 
Passemos, então, ao texto. 
Por muito tempo, o filósofo foi pintado como alguém que andava com os pés no chão, 
mas a cabeça nas nuvens. Ainda hoje há quem o veja como alguém desligado de seu 
tempo e de seu mundo, exilado no universo das ideias, no qual realiza as mais inusitadas 
viagens. Nessa perspectiva, ao voltar-se para a Filosofia, o educador estará, também, se 
tornando um “amigo das nuvens”, sendo-lhe, portanto, mais prudente permanecer longe 
da Filosofia? Mas e se esta descrição do filósofo for apenas um arremedo do que ele é? Se, 
em contrapartida, procurarmos ver o filósofo como alguém que “pensa sua experiência e 
seu mundo” (MERLEAU-PONTY, 1960, p. 103), alguém que faz da realidade em que vive 
o princípio de sua curiosidade e de sua investigação? Nessa perspectiva, é possível que a 
Filosofia traga alguma contribuição para o educador. 
Mais que um nefelibata, é de sua experiência que o filósofo se ocupa. Mais que uma atividade 
abstrata que se passa fora do tempo e do espaço presentes ou um álibi que nos afasta do 
mundo, a filosofia é, sobretudo, esta reflexão que nasce do ater-se à realidade em que 
nos encontramos, assumindo-a como problema, questão, dificuldade, assunto a resolver, 
silêncio à espera da fala que lhe dará voz, mundo mudo aguardando sua expressão. É para 
o mundo em que vivemos que a Filosofia nos remete e, ao se propor fazer filosofia, mais 
que para as nuvens, é ao encontro do próprio mundo que o educador será remetido.
 CINE
Para uma divertida crítica aos filósofos como aqueles que vivem com as cabeças 
nas nuvens e os pés nos chão, assista na Internet ao vídeo “O futebol dos filósofos”, 
do grupo de humoristas inglês Monty Phyton.
cine
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unidade 1
1.2.2 O Retorno às questões da Filosofia
Thévenaz (1966) afirma, não sem ironia, que a Filosofia é “a arte ou a mania de colocar 
questões onde tudo parece normal e de preferência onde nada parece problemático” (p. 
62). E, de fato, ao se ocupar com a Filosofia e ser por ela conduzido ao encontro de seu 
mundo, uma das primeiras questões com a qual o educador pode se deparar diz respeito 
ao seu próprio mundo: que mundo é este em que estou? – ele poderá se perguntar.
De modo geral, o mundo em que está o educador é aquele no qual todos estamos. Um 
mundo onde, segundo a descrição de Delors (2003, p. 11), avançam “a pobreza, a exclusão 
social, as incompreensões, as opressões, as guerras...”. De modo mais específico, nosso 
lugar, como educadores, dentro desta realidade mais ampla, é o mundo da educação. 
Restringindo ainda mais, este mundo é aquele da educação no Brasil. E que significa estar 
neste lugar?
O Brasil é um país que tem um dos piores ensinos da América Latina, com um número ainda 
elevado de analfabetos, escolas com altos índices de evasão, falta de professores, professores 
com baixa qualificação, sem tempo e sem dinheiro para se qualificarem, falta de material 
didático, baixos salários, carga horária excessiva, ensino basicamente comprometido com 
a instrução para o emprego em detrimento de uma formação científica, cultural e crítica. 
Além disso, no Brasil, historicamente, a educação tem sido um setor da sociedade no qual 
as tarefas e funções são definidas sob a óptica das elites econômicas, culturais e políticas 
das classes dominantes, em detrimento de reais necessidades e interesses da maioria da 
população (FERNANDES, 1989). Hoje como ontem, a educação entre nós continua sendo 
usada por ideologias do progresso econômico (cf., dentre outros, LINS, 1985; GENTILI 
E SILVA, 1994; GENTILI, 1995; FIDALGO E MACHADO, 1994), que fazem com que ela 
continue colaborando para que o abismo entre ricos e empobrecidos, incluídos e excluídos 
aumente cada vez mais. E se este é o mundo em que está o educador no Brasil, habitá-lo, 
para aqueles que aí trabalham acreditando quotidianamente que ele possa contribuir, não 
somente para o crescimento econômico, mas sobretudo para a construção de um mundo 
menos violento e desigual, estar neste mundo significa encontrar-se descrente e confuso, 
numa palavra, em crise.
A crise caracteriza bem a situação de nossa educação. E o educador, inserido neste mundo 
em crise, ao tomar consciência dele, acaba se descobrindo, como profissional da educação 
e cidadão, como sujeito em crise. Assim, se outrora o filósofo pensava a crise, se a ave de 
26
Minerva levantava voo após apaziguadas as contendas humanas, hoje, o educador, ao voltar-
se para a filosofia que o leva a situar-se reflexivamente em seu mundo, vê-se obrigado a pensar a crise e em crise.
 SAIBA MAIS...
Sobre a situação, os desafios e as pontencialidades da educação no mundo atual
DELORS, Jacques. Educação: um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez; Brasília: 
MEC: UNESCO, 2003.
FERNANDES, Florestan. O desafio educacional. São Paulo: Cortez: Autores 
Associados, 1989. 
MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: 
Cortez, 2001.
1.2.3 As relações entre crise e filosofia
Mas o que é a crise e o que ela tem a ver com a filosofia? No intuito de refletir sobre essas 
questões e de descrever o próprio advento da filosofia no registro da crise, vejamos, em 
largos traços, a partir de três textos de Vaz (1978, 1984, 1991), o surgimento da filosofia 
na Grécia.
Na Grécia pré-filosófica, aquela em que a filosofia ainda não se fizera necessária, o homem 
compreendia seu mundo, fundamentalmente, através do mito. O discurso mitológico 
justificava o mundo para o homem grego, unificando os universos simbólicos nos quais a 
sociedade grega traduzia e confirmava suas razões de ser (VAZ, 1984, p. 12). Esse mundo, 
justificado pelo mito, se oferecia, assim, ao homem grego sem nenhuma ruptura, de modo 
que, anterior aos séculos VII e VI a.C., esse homem estava em paz com seu mundo.
Nesse mundo fechado, finito e harmônico, ocorriam ao homem grego dúvidas quanto à 
explicação mitológica do mundo, elas não chegavam a abalar a autoridade dos mitos como 
suficiente para justificar sua realidade. Dessa forma, a experiência fundamental do homem 
na Grécia pré-filosófica não era de oposição ou confronto ao seu mundo, mas de inocente 
simpatia e harmonia com a realidade na qual desenvolvia sua existência.
Na Grécia anterior aos séculos VII e VI a.C., o homem prosseguia sua vida tranquilamente 
adaptado a um mundo já feito e explicado pelo discurso mitológico. E como não tinha razões 
27
unidade 1
para duvidar radicalmente dos mitos que lhe explicavam o mundo, sua vida transcorria 
numa atmosfera de segurança fundamental. Entretanto, no decorrer dos séculos VII e VI a.C., 
importantes transformações começam a ocorrer no mundo grego antigo: o padrão urbano 
de vida se cristaliza cada vez mais, a colonização grega se estende rumo ao Mediterrâneo, 
aparece o comércio de longo curso, a sociedade grega se torna mais estratificada (VAZ, 1991). 
Gradualmente, o mundo grego antigo, restrito e fechado, se amplia, e surgem novas 
possibilidades de pensamento e de visões de mundo. Nesse processo, à medida que o mundo 
grego antigo se torna mais rico e complexo, em contrapartida, o mito se torna insuficiente 
para justificar e dar sentido a essa nova realidade. Sua força persuasiva e unificadora começa 
a enfraquecer (VAZ, 1984, p. 16). O homem grego, aos poucos,percebe a insuficiência de seus 
mitos para justificar e dar sentido ao novo mundo que se descortina diante de seus olhos. As 
pequenas dúvidas de outrora, que não chegavam a abalar o sistema de crenças míticas que 
constituía o mundo grego, crescem e se tornam dúvidas radicais.
O homem grego passa, assim, a desacreditar de seus mitos que, até então, lhe bastavam-lhe 
para unificar e justificar sua realidade. E como era o sistema de crenças míticas que constituía 
seu mundo, passa, portanto, a duvidar de seu próprio mundo que, gradualmente, lhe parece 
sem sentido ou injustificado. Aquele homem, que vivia numa atmosfera de segurança 
fundamental num mundo unificado pelo mito que ele não punha em dúvida, sente-se, com a 
crise do mito, sem saber em que acreditar; vê que o mundo, uno e justificado no qual vivia, 
desaparecera para dar lugar a um mundo dilacerado e sem sentido.
A cultura grega em crise de um sentido que reunificasse e justificasse sua realidade e sua 
vida procurou socorro na única autoridade em que ainda acreditava: a razão. Desenvolvendo 
o discurso racional em sua expressão mais alta, o logos filosófico, o grego procurou respostas 
que o orientassem no sentido da reconquista da unidade perdida, sob a forma de um novo 
sistema de crenças, de uma nova escala de valores (VAZ, 1984). Essa passagem da crença no 
mito à crença na razão marcou também a passagem do mundo grego antigo para o mundo 
grego moderno. O grego moderno, pela Filosofia, escapou do caos da realidade diluída na 
carência de sentido após a crise do mito, justificando e reunificando seu mundo, conduzindo-o 
do caos ao cosmo.
1.2.3.1 A crise e a passagem do estado das crenças ao estado das dúvidas 
O que podemos aprender sobre a crise com essa breve história do mito na Grécia Antiga? 
Pelo exemplo grego, vemos a crise como “fratura numa substância” (TRIGUEIRO, 1968, p. 
28
225), ou seja, como um espaço de tensão, de ‘con-fusão’ e de ruptura dentro de uma mesma 
substância, em que “o velho não morreu e o novo ainda não pôde nascer.” (GRAMSCI apud 
FRIGOTTO, 1994, p. 34-35). Nesse sentido, se objetivamente a crise se instaura nesse ponto 
de cisão entre o final de um período ou de um sistema de crenças e o advento de um novo 
período ou sistema de crenças por substituição ao anterior, subjetivamente, ela é vivida como 
um momento de dúvida em relação ao constituído ou ao velho e de esperança em relação ao 
que se está constituindo ou ao novo em vir a ser (KUJAWSKI, 1988).
Antes da crise, do velho envelhecer-se ou do constituído ser posto em dúvida, habitamos em 
nossas crenças como em nosso próprio mundo. Elas compõem nossa realidade, e quanto 
mais acreditamos nelas, mais seguros nos sentimos em nosso mundo. Com o advento da crise, 
nossas crenças começam a ruir e, com elas, nosso mundo também começa a desmoronar. Aos 
poucos, nós, que habitávamos em nossas crenças como em nosso próprio mundo, pela crise, 
na qual elas são arruinadas, somos transferidos para uma outra situação ou estado em que 
tudo é duvidoso e sem sentido: o sentido do velho é visto como ultrapassado ou duvidoso, o 
sentido do novo ainda não o vislumbramos. Em suma, a crise nos joga do estado das crenças 
e dos sentidos reificados para o estado das dúvidas e da ausência de sentidos. 
Quanto mais a crise se radicaliza, mais se aprofunda a carência de sentido da realidade em 
que estamos inseridos, e mais cresce o desejo de encontrar um caminho que nos tire da crise 
e reunifique nosso mundo. Esse desejo de sair da crise, levado às últimas consequências, 
abre portas para várias saídas ilusórias: as atitudes extremadas, as esperanças absurdas, 
as propostas redentoras, as previsões escatológicas, os comportamentos mórbidos; mas ele 
também abre caminho para o advento da reflexão crítica da própria crise. Reflexão crítica 
entendida aqui “no sentido forte dos filósofos, como investigação fundamental da realidade, 
isto é, como saber radical e ré-instaurador na ordem objetiva” (TRIGUEIRO, 1968, p. 225). 
Esse foi o caminho tomado pelos gregos.
Desse modo, ainda à luz da breve história da crise do mito na Grécia, se nos perguntarmos: 
o que leva uma determinada cultura a refletir filosoficamente?, podemos responder, com 
Vaz (1984, p. 7), que “o surgimento da filosofia é marcado por uma ruptura, por uma cisão 
interna de uma sociedade cujos valores e representações se tornam questionáveis e que, 
por isso mesmo, não consegue mais viver a vida em sua imediatidade”. Por outras palavras, 
“no momento em que a vida sofre uma ruptura das certezas imediatas surge a necessidade 
de filosofar” (VAZ, 1978, p. 10). Assim, quando uma cultura não é mais capaz de justificar-
se a si mesma em sua imediatidade, torna-se necessária a filosofia. Na filosofia, “a razão é 
29
unidade 1
chamada a decidir os problemas que surgem quando a vida não é mais capaz de justificar-se 
a si mesma como experiência imediata” (VAZ, 1978, p. 8). Desse ponto de vista, a filosofia 
se mostra, primeiramente, como “o processo de uma cultura que erige em si mesma seu 
próprio tribunal para julgar-se e para criticar-se” (VAZ, 1978, p. 8). Contudo, como processo 
de reavaliação e de crítica da cultura, ela só se faz necessária numa cultura em crise, na qual 
a unidade e o sentido do mundo e da vida se perderam e fazem falta. A Filosofia surge como 
necessária para restituí-los ou restaurá-los.
 SAIBA MAIS...
Sobre crise e suas relações com a filosofia:
CALDERA , Alejandro Serrano. Filosofia e crise. Rio de janeiro: Vozes, 1984.
KUJAWSKI, Gilberto de M. A crise no século XX. São Paulo: Ática, 1988.
1.2.4 Para que Filosofia da Educação?
O exemplo grego nos mostra a crise como espaço propício para o surgimento da filosofia. 
O educador no Brasil, dado o estado em que se encontrar, pode fazer da filosofia o lugar 
de crítica e de julgamento de sua própria experiência, a fim de restituir-lhe ou instaurar o 
sentido profundo que ela deve assumir em sua realidade. 
Para o educador, fazer filosofia, tomando como horizonte último de sua reflexão a 
educação em crise, implica definir a filosofia da educação, necessariamente, como uma 
reflexão comprometida com a realidade à qual ela se refere. Primordialmente, a filosofia 
da educação se mostrará como “interrogação continuada” (LEFORT, 1964, p. 345) pelo 
sentido último da educação, isto é, por sua intencionalidade radical no mundo em que 
vivemos. Na perspectiva dessa interrogação, quando consideramos as grandes linhas 
ideológicas presentes na educação brasileira ao longo de nossa história, verificamos que o 
sentido da educação tem sido (embora haja heróicas exceções) o de reproduzir, manter e 
reforçar o estado de fato vigente na sociedade Mas será esse o sentido de toda educação? 
Se ensaiarmos uma resposta negativa para a questão acima, embora a partir daquilo que não 
queremos, estaremos buscando um outro sentido para a educação. Trata-se, primeiramente, 
de começar por uma “filosofia negativa” da educação, na qual procuramos “determinar os fins 
da educação partindo daquilo que, no consenso de todos, não podemos querer” (REBOUL, 
1988, p. 117). Mas essa maneira, a princípio negativa, de refletir o sentido da educação não 
30
se esgota na recusa do que não podemos admitir. A recusa é uma forma de abrir caminho 
para outros sentidos que poderemos buscar. Esta filosofia, de início, negativa da educação, 
abre, portanto, perspectiva para a utopia. Nela, veremos, como afirma Reboul (1988), a 
educação como “o lugar por excelência da utopia”, pois educação – acrescenta o filósofo – 
“que não passasse de submissão ao real e de reprodução do estado de fato, com todas as suas 
injustiças, e não tratasse, incansavelmente, de superar o real, corrigindo o estado de fato, já 
não seria, de modo nenhum, educação.” (p. 118).
 SAIBA MAIS...
Sobre as relações entre educação brasileira, reprodução e ideologias: 
FIDALGO, Fernando S.; MACHADO, Lucília R. S. Controleda qualidade total: uma 
nova pedagogia do capital. Belo Horizonte: Movimento de Cultura Marxista, 1994.
GENTILI, Pablo A. A.; SILVA, Tomaz Tadeu da (Orgs). Neoliberalismo, qualidade 
total e educação: visões críticas. Petrópolis: Vozes, 1994.
SEVERINO, Antônio J. Educação, ideologia e contra-ideologia. São Paulo: EPU, 1986. 
1.2.4.1 Da Explicitação “do que é” à construção “do que deve ser”: o lugar da utopia
A filosofia da educação se apresenta, portanto, como uma reflexão comprometida, 
primeiramente com a explicitação e a apreciação do que é, do presente, do que vivemos 
aqui e agora;
, entretanto, sem jamais perder de vista a perspectiva do que deve ou poderia ser. A filosofia 
da educação entendida como uma racionalidade puramente objetiva, que se contenta 
em constatar o que é, sem apreciá-lo e sem contribuir para a construção do que deve ser, 
não radicaliza suficientemente sua reflexão, quando o que é se configura como um lugar 
no qual não podemos ficar. Por outras palavras, trata-se de, pela filosofia, assumir o que 
é como “realidade problemática” (SAVIANI, 1989), ou seja, uma situação em que nos 
encontramos, mas na qual não podemos permanecer, que precisa ser superada, contudo, 
no sentido do que deve ser, numa palavra, no sentido de nossa utopia. Mas o que utopia?
Na linguagem cotidiana, a utopia possui acima de tudo um sentido pejorativo. Traz o 
estigma de busca impossível, de projeto desmedido, de exílio ou de álibi. Essa é a idéia 
que, no senso comum, temos dela. E, de fato, quando ao invés de tentarmos mudar o aqui 
não seria, de modo nenhum, educação.” (p. 118).não seria, de modo nenhum, educação.” (p. 118).não seria, de modo nenhum, educação.” (p. 118).não seria, de modo nenhum, educação.” (p. 118).não seria, de modo nenhum, educação.” (p. 118).não seria, de modo nenhum, educação.” (p. 118).
31
unidade 1
e agora no qual vivemos, optamos por dele nas evadirmos rumo às terras da promissão 
imaginadas alhures, a utopia realmente justifica seu sentido pejorativo. Em tais termos, 
propô-la ao educador seria sugerir-lhe a fuga de seu mundo concreto para aquele das 
quimeras, dos sonhos inatingíveis. Mas os sentidos da utopia não se esgotam nesse tipo 
de deserção do real.
Por certo, como esclarece Ainsa (1997), há utopias que se caracterizam precisamente 
pela “necessidade de fugir da realidade construindo um mundo de sonho situado em um 
outro lugar” (p. 54). São as utopias de evasão. Mas existe também um outro tipo de utopia 
que se apresenta não como fuga, mas como “crítica política e social do modelo existente 
convergindo numa proposição alternativa para a realidade de todos os dias” (p. 54). São 
as utopias de reconstrução. Elas têm em comum com as de evasão o fato de pressuporem 
a “recusa radical do presente (tempo) ou do lugar (espaço) em que se vive, quando não 
dos dois ao mesmo tempo” (p. 39). Além do mais, em ambas sonhamos com uma realidade 
diferente daquela em que vivemos hoje. Mas a diferença fundamental entre elas reside 
exatamente no modo como cada uma se relaciona com o presente.
A utopia de evasão abstrai o presente, recusa-o ou ignora-o, sem tentar mudá-lo. E por 
deixar tudo como está, é sempre conservadora. Por sua vez, a utopia de reconstrução 
também assume a insatisfação diante do mundo atual, mas, ao contrário daquela de 
evasão, que opta pela fuga dele, esta não o ignora, mas ancora-se nele para criticá-lo como 
é e instaurar a busca de sua transformação no sentido do como deveria ser. 
Sem se perder em abstrações puramente formais e sem qualquer relação com a vida real, 
sem se deixar levar pela “retórica oca” (AINSA, 1997, p. 72), prisioneira de palavras vazias, 
a utopia de reconstrução assume inteiramente a tensão entre o que é e o que deveria 
ser, explorando efetivamente a possibilidade concreta de transformar o real no sentido 
de um outro mundo possível a partir deste em que vivemos. Esse mundo possível é a 
“contra-imagem crítica” (AINSA, 1997, p. 39) daquele em que estamos, um outro mundo 
qualitativamente diferente por correção ao atual. Daí, portanto, o duplo aspecto desta 
utopia: ela é – nas palavras de Reboul (1988) – “crítica radical” ou “recusa apaixonada 
das coisas como são, e dos homens como as fizeram” (p. 77), mas é também proposição 
de uma alternativa, “daquilo que deveria existir”, como complementa Ainsa (1997, p. 58). 
Mais que a evasão ou a fuga, a utopia de reconstrução orienta-se para o afrontamento do 
hoje e a construção do amanhã, o que a leva a se identificar com “esta parte do movimento 
32
do desejo que tende para o futuro” (MANNHEIM apud AINSA, 1997, p. 37), contudo, 
sempre a partir de potencialidades do presente. Ela é o esforço para tornar possível o que 
até então não era, para “abrir uma alternativa para a realidade de todos os dias” (AINSA, 
1997, p. 54) por meio da busca e da fertilização, nesta realidade, de tudo “aquilo que é 
recente, emergente, novo” (MANNHEIM apud AINSA, 1997, p. 41). Ao invés de “exílio” ou 
de “álibi”, a utopia é produto da “criatividade”, “obra da invenção” (CERTEAU, 1993, p. 33); 
ao invés de anulação do presente, é “aprofundamento de seu vir a ser possível”, de seus 
“possíveis laterais.” (RUYER apud AINSA, 1997, p. 36). 
Ancorada no real e distanciada tanto do otimismo automático quanto do pessimismo 
absoluto em relação ao futuro, toda fecundidade da utopia de reconstrução reside em sua 
capacidade de, a partir do presente, invocar, arrancar de seu sono outras possibilidades 
para o futuro, “a partir da topia existente” criar “novas utopias” (AINSA, 1997, p. 70). 
É por isso que, como explicita Ainsa (1997), tal utopia supõe sempre duas coisas: a “fé 
racional numa realidade que existe apenas em potência” e, “ao mesmo tempo, a vontade 
de demonstrar que é sempre possível explorar as possibilidades concretas de transformar 
o real” (p. 66). Se a utopia, como afirma Trigueiro (1968), é aquilo que “não está hoje em 
lugar nenhum”, é preciso que nossa imaginação exija “que ela comece a existir em algum 
lugar” (p. 225). Não se trata mais da utopia como “um mundo impossível, mas de uma 
possibilidade que se torna efetiva na medida em que estejamos dispostos a desentranhá-
la das agruras do mundo atual pela lucidez e pela coragem” (p. 225). Nesse sentido, conclui 
Trigueiro (1968), a utopia “constitui, apenas, uma outra forma de realismo” (p. 226). 
1.2.4.2 Utopia, crise e a função do intelectual
Esclarecido o sentido da utopia em sua função construtiva ou transformadora frente ao 
real, ao retornarmos agora para a crise, compreendida como momento de ruptura com o 
velho, entretanto, em que o novo ainda não pôde nascer, então, é desejável e até mesmo 
urgente que o educador, ao se ocupar com a reflexão do sentido da educação no mundo 
em que vive, delineie suas utopias, resgate em si a dimensão utópica, que lhe permitirá 
ver a crise não como campo de destruição e de morte, mas como canteiro de construção e de vida.
Gênese mais que apocalipse, a crise é terra fértil para a utopia. E utopia é criação de quem 
não está satisfeito com as coisas como estão. Por isso, é próprio do homo utopicus dizer não 
à sua realidade, reinventando-a nas utopias. Mas nem sempre é fácil dizer não ao mundo 
33
unidade 1
em que vivemos. Implica incomodar aqueles que, por comodismo ou por se beneficiarem 
do estado de fato, querem que tudo continue como está. Implica desencadear a tensão 
entre um presente inadmissível e a possibilidade de um futuro diferente. Essa tensão é 
que motiva a crítica da realidade e a ação transformadora sobre ela, no sentido de nossas 
utopias, compreendidas como os sonhos possíveis de que nos falava Paulo Freire.
1.2.5 Considerações Finais
Mas, neste ponto, surgem alguns questionamentos: se a filosofia da educação, nos termos 
em que está sendo apresentada, não é contrária à utopia e até mesmo a estimula, será que 
a função do educador, ao fazer filosofia, é sonhar? Construir utopias e dizer aosoutros 
o que fazer para atingi-las? E se for este o caso, estaríamos ainda fazendo filosofia da 
educação?
Se nos é permitido pensar o educador como um intelectual, Foucault pode nos ajudar a 
pensar as questões acima. Para Foucault (1984), não é função do intelectual “dizer aos 
outros o que eles têm que fazer”, não tem esse direito e tampouco é seu dever “modelar 
a vontade política dos outros”; seu trabalho é o de, atendo-se aos domínios que são seus, 
“reinterrogar as evidências e os postulados, sacudir os hábitos, as maneiras de fazer e de 
pensar, dissipar as familiaridades aceitas, retomar a medida das regras e das instituições”; 
nisso consiste, especificamente, o papel do intelectual (p. 83). Se, a partir dessa 
“reproblematização” (Idem) de seu mundo, uma vontade política começa a se formar, daí 
por diante não é mais o educador como intelectual que tem um papel a desempenhar, mas 
o educador como cidadão.
Nesse sentido, o papel de quem faz filosofia da educação não é construir a utopia dos 
outros para eles, muito menos lhes dizer o que fazer para atingi-la, mas debruçar-se sobre 
a realidade educacional vigente, inserida em seu contexto mais amplo, o mundo em que 
vivemos, para reproblematizá-la em seus sentidos, seus valores, suas maneiras de pensar 
e de fazer, não para confirmá-los ou justificá-los, quando não o são, mas para precisamente 
tentar vê-los de uma outra forma. Trata-se de fazer da filosofia da educação esta reflexão 
pela qual nos libertamos, “com esforços, sonhos e ilusões” do que nos é posto como verdade, 
“a fim de buscar outras regras do jogo”, deslocando ou transformando as “molduras de 
pensamento” habitualmente aceitas, os valores comodamente estabelecidos, levando 
adiante “todo o trabalho que se faz para pensar diversamente, para fazer diversamente, 
para tornar-se outro do que se é.” (FOUCAULT, 1994, p. 137-144).
34
 ATIVIDADE
I - Leia atentamente as questões a seguinte e coloque V para verdadeiro e F 
para falso. Justifique as respostas falsas. 
1- ( ) A experiência fundamental do homem na Grécia pré-filosófica, na qual 
prosseguia sua vida adaptado a um mundo explicado pelo discurso filosófico, não 
era de oposição ou confronto ao seu mundo, mas de inocente simpatia e harmonia 
com a realidade na qual desenvolvia sua existência.
2- ( ) O filósofo é alguém que faz da realidade em que vive o princípio de sua 
curiosidade e de sua investigação.
3- ( ) As utopias de evasão se apresentam como uma crítica ao modelo existente, 
convergindo numa proposição alternativa para a realidade.
4- ( ) A função do educador, ao fazer filosofia da educação, é construir para os 
outros suas utopias e dizer-lhes o que fazer para atingi-las.
5- ( ) Segundo o texto, o sentido da expressão “filosofia negativa” é “ uma maneira 
de se chegar àquilo que se quer a partir da afirmação daquilo que, no consenso de 
todos, devemos aceitar.”
6- ( ) “O surgimento da filosofia é marcado por uma ruptura, por uma cisão interna 
de uma sociedade cujos valores e representações se tornam questionáveis e que, 
por isso mesmo, não se consegue mais viver a vida em sua imediatidade.” (VAZ 
apud OLIVEIRA et al., 2005, p.7). Nesta citação, a palavra IMEDIATIDADE significa: 
viver sem se questionar pelo sentido da vida.
7- ( ) Segundo o texto, o sentido da expressão “realidade problemática” é: realidade 
que não pode ser superada.
8- ( ) As utopias de reconstrução abstraem o presente, recusa-o ou ignora-o, sem 
tentar mudá-lo e, por isso, acabam sendo conservadoras.
9- ( ) O educador deve fazer da filosofia o lugar de crítica e de julgamento de sua 
própria experiência, procurando instaurar o sentido profundo que a educação deve 
assumir em nossa realidade; sendo assim, a filosofia da educação é uma reflexão 
comprometida com a realidade a qual se refere.
10- ( ) A crise se instaura no ponto de cisão entre o final de um sistema de crenças 
e o advento de um novo sistema por substituição ao anterior, o que faz dela um 
momento de afirmação do velho e de negação daquilo que está se constituindo ou 
do novo em devir.
35
unidade 1
35
II – A partir dos conceitos e tema estudados neste tópico, responda às questões 
abaixo.
1. Quais as diferenças entre as duas ideias de filósofo e filosofia presentes no texto? 
Defina a importância da filosofia para o educador à luz dessas diferenças.2. Defina o conceito de crise e explique as relações entre crise e filosofia.
3. Defina utopias de evasão e utopias de reconstrução e identifique as diferenças 
entre elas. 4. Para que filosofia da educação?
37
PROBLEMAS DA EDUCAÇÃO NA PERSPECTIVA 
FILOSÓFICA
Objetivos
•	 Explicar como um problema da educação, aquele dos valores e objetivos, nos 
remete aos seus fundamentos filosóficos, mais exatamente aos três campos da 
filosofia identificados na unidade anterior, a saber, a Epistemologia, a Axiologia e a 
Antropologia Filosófica.
•	 Estabelecer relações entre os Discursos Ideológico (DI), Pedagógico (DP) e 
Filosófico (DF). 
•	 Compreender a questão: entre a retórica e a dialética, onde situar o discurso do 
professor em sala de aula? 
unidade 2
39
unidade 2
2.1 O Problema dos Valores e Objetivos na Educação e seus Fundamentos Filosóficos
2.1.1 Introdução
Prezado(a) Estudante, neste texto, nosso objetivo é mostrar como um problema da 
educação nos remete aos seus fundamentos filosóficos, mais exatamente aos três campos 
da filosofia identificados na unidade anterior, a saber, a Epistemologia, a Axiologia e a 
Antropologia Filosófica. 
O problema do qual trataremos é o dos valores e objetivos na educação. Para refletirmos 
sobre ele, um bom começo consiste na busca de uma definição para educação. Para tanto, 
explorando a própria palavra “educação”, vejamos o que podemos encontrar. Em sua 
etimologia, a palavra “educação” nos remete ao termo latino ex-ducere, no qual ducere é 
um verbo que significa conduzir ou levar; ex é uma preposição latina, que tem o sentido 
indicativo de origem ou procedência, “o lugar de onde se afasta”; ex pode significar ainda 
“para fora de...”. Assim, a palavra “educação”, fiando-se no seu antepassado latino “ex 
ducere”, pode significar: conduzir alguém para fora do lugar onde se encontra; levar para 
fora; conduzir ou levar alguém no seu ir para fora do lugar onde está. (CRITELLI, 1981, p. 
43-44).
Portanto, tal como foi significada acima, a palavra “educação” envolve ação, pois nela 
encontramos os verbos “conduzir” ou “levar”. É nesse sentido que Athayde (1975) 
observa corretamente que “educação [...] é ação” (p. 20). Aliada a esta observação, se 
acrescentarmos ainda que “toda ação, em princípio, é intencional” (PAVIANI, 1990, p. 31); 
logo, podemos concluir que toda educação, à medida que é ação, é também intencional, ou 
seja, visa a um telos (finalidade ou objetivo último) ou o tem. 2.1.2 O Telos e os Valores na Ação Educativa
Não existe educação sem telos, mesmo que ele esteja implicitamente pressuposto. Na 
educação, o telos é basicamente o direcional que coordena e orienta a ação; ou melhor, 
ele é que comanda logicamente a dinâmica educativa tanto na teoria quanto na prática. 
Ademais, é fundamental considerar ainda que é em consonância com o telos objetivado 
pela educação que os valores vão se definindo, fermentando-se e sendo transmitidos no 
seio da dinâmica educativa.
Assim, no sentido do que afirmamos acima, se, por exemplo, o telos da educação, na cidade 
40
de Esparta, da Antiga Grécia, era formar o homem guerreiro para uma sociedade guerreira, 
então, em consonância com esse telos, a coragem e a habilidade no uso de armas eram 
tomadas como valores extremamente importantes na educação dos jovens espartanos. 
Do mesmo modo, nos dias de hoje, para a educação que convém aos “homens de negócio” 
e à sociedade de consumo, diante da globalização da economia, das novas tecnologias e 
da reestruturação do padrão de produção capitalista, a flexibilidade, a criatividade,as 
capacidades de abstração e de decisão são tidas como valores essencialmente pretendidos 
na formação dos novos operários para o mercado de trabalho contemporâneo.
 SAIBA MAIS...
Sobre as relações entre educação e ideologias políticas em
FRIGOTTO, Gaudêncio. Educação e formação humana: ajuste neoconservador e 
opção democrática. In: GENTILLI, Pablo A.A.; SILVA, Tomás T. Neoliberalismo, 
qualidade total e educação. Petrópolis: Vozes, 1994, p. 31-92.
REZENDE, Antônio Munis de. O saber e o poder na universidade: dominação ou 
serviço? 4. ed. São Paulo: Cortez, 1986.
SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. São Paulo: Cortez, 1989. 
Os valores, na educação, atuam no sentido de normatizar o comportamento dos atores 
envolvidos no agir educativo tento em vista o telos almejado. Desse modo, por exemplo, se 
um professor que, trabalhando numa escola onde o objetivo é formar técnicos, prioriza, 
no seu agir educativo, a reflexão crítica, explicitando os contrastes e contradições da 
sociedade e os interesses ideológicos infiltrados na educação, este professor, obviamente, 
não estará se comportando de acordo com o padrão que os valores dessa escola esperam 
dele, pelos quais as prioridades orientam-se para o saber fazer (tecné) e não para o saber pensar.
 ATENÇÃO!
Entretanto, é preciso ressalvar aqui que o fazer não é, necessariamente, inconciliável 
com o pensar. No texto, o fazer que não se concilia com o pensar é aquele que 
reifica e dogmatiza a tecné, à qual cabe obedecer dispensando o pensar. Não se 
trata, portanto, do fazer livre e artístico, que é “ponto de encontro entre a matéria 
e o espírito”, pelo qual “as coisas vêm a nós [...] com o selo de nossa criatividade” 
(TRIGUEIRO, 1973, p. 229). Nesse fazer, tecné e logos, ao invés de inconciliáveis, 
encontram-se integrados numa perspectiva que vai além deles, enquanto “busca 
do humano como criação gratuita, que não obedece aos a priori do logos, nem à 
mera funcionalidade da tecné” . 
na formação dos novos operários para o mercado de trabalho contemporâneo.
41
unidade 2
Com o exemplo acima, o que se pretende mostrar é que os valores priorizados numa 
determinada ação educativa agem no sentido de moldar o perfil e o comportamento dos 
atores envolvido nesta ação. Além disso, eles atuam ainda no sentido de determinar a 
escolha dos conteúdos a serem trabalhados, como também a maneira de trabalhá-los e 
avaliá-los; tudo isso tendo em vista o telos pretendido ou visado.
Assim, se numa determinada escola o objetivo é formar o educando como um técnico 
ou um “fazedor de coisas”, evidentemente, os conteúdos práticos vinculados à tecné, ou 
seja, ao saber fazer, serão priorizados na ação educativa desta escola. De maneira sucinta, 
podemos estabelecer que os valores priorizados numa ação educativa serão tão diferentes 
quanto forem os telos objetivados por esta ação. Por outras palavras, o que queremos 
dizer é que os valores priorizados numa ação educativa estão em função do modo de ser 
humano que aí se quer formar. Sendo assim, para se explicitar a visão de ser humano que 
uma ação educativa toma como seu telos, é fundamental esclarecer as bases axiológicas 
desta ação, isto é, o conjunto de valores que a sustenta. 
2.1.3 Do Pressuposto Antropológico aos Valores e Objetivos na Educação
A ação educativa, mesmo que de modo inconsciente, sempre pressupõe, na definição 
de seus valores, uma determinada visão de homem. É nesse sentido que, por exemplo, 
Saviani (1989b) distingue as pedagogias da essência e da existência. As pedagogias da 
essência pressupondo uma visão de homem que não muda no tempo e no espaço, ou 
seja, que permanece a mesma em qualquer tempo ou lugar. As pedagogias da existência 
pressupondo uma visão de homem que se constitui naquilo que é no decorrer de sua 
existência; o ser do homem, portanto, variando no tempo e no espaço, o que faz com que o 
homem, neste lugar e neste momento, não seja o mesmo de outro tempo e lugar. Em suma, 
segundo Saviani (1989b), nas pedagogias da essência, a essência precede e determina a 
existência, ao passo que, nas pedagogias da existência, a existência precede e determina 
a essência. 
Mas, para que fique mais clara a importância da pressuposição de uma visão de homem 
na definição dos valores a serem priorizados numa ação educativa, tomemos, ainda a 
título de exemplo, uma prática educativa que pressuponha uma visão essencialista do ser 
humano e uma prática educativa que pressuponha uma visão existencialista. A partir daí, 
procuraremos ver como estes pressupostos determinam diferentes valores para cada uma 
das práticas em questão. A escola tradicional será o exemplo da prática educativa que 
42
pressupõe uma visão essencialista de homem; a escola nova ou renovada, o exemplo da 
prática educativa que pressupõe uma visão existencialista. 
Na escola tradicional, porque está pressuposta uma visão essencialista do homem, o 
objetivo principal da educação é o de atualizar no educando as potências inerentes à sua 
essência. Consequentemente, valorizar-se-á o ensino humanístico como aquele pelo qual 
o educando atingirá, pelo próprio esforço, a plena atualização de suas potências. Além do 
mais, o professor será o modelo a ser imitado pelo aluno, visto que o professor representa 
aquele ser humano que realizou plenamente as potências inerentes à sua essência humana. 
Sendo assim, o processo educativo será centrado no professor, ao qual cabe conduzir o 
aluno à atualização ou à realização plena das potências próprias a sua essência de ser 
humano. 
Na escola nova, porque está pressuposta uma visão existencialista do homem, o objetivo 
principal da educação não será o de conduzir o educando a torna-se idêntico a si mesmo 
pela atualização daquilo que ele já é em potência a partir de sua essência; o objetivo da 
educação será o de levar o educando a tornar-se um outro de si, ou seja, conduzi-lo à 
constituição de sua essência no decorrer de sua existência. Nesse sentido, valorizar-se-
ão, principalmente, os conhecimentos que o educando traz de sua própria experiência. E 
porque não há mais essência humana da qual o professor seria a expressão realizada, este 
deixa de ser o centro do processo educativo que se desloca para o aluno. 
Assim, nas considerações da escola tradicional e da escola nova, podemos ver, mesmo que 
de maneira introdutória, como a definição dos valores numa ação educativa é norteada 
pela visão de ser humano pressuposta como telos desta ação. 
 CINE
Para discutir como a definição dos valores numa ação educativa é norteada pelas 
visões de ser humano e de sociedade pressupostas como telos desta ação, assista 
aos filmes:
•	 OS FILHOS DA GUERRA
- Ficha técnica: Direção: Agnieszka Holland. Países: Alemanha / França / Polônia. 
Gênero: Drama. Ano de Lançamento: 1990. Duração: 107 minutos.
cine
43
unidade 2
- Sinopse: o filme conta a história de Solomon Perel, um jovem sobrevivente do 
Holocausto, que esconde sua identidade judaica, encontrando refúgio junto à 
juventude hitlerista. “Sua trajetória começa quando sua família alemã, mas de 
origem judaica, é perseguida pelos nazistas e se refugia em Loda, na Polônia. 
Com a invasão, o que parecia ser o começo de uma vida tranquila, rapidamente 
se transforma num grande pesadelo. Perel consegue fugir levando seu irmão, 
mas acaba se perdendo dele e busca refúgio entre os bolcheviques. Depois, ele é 
transferido para um orfanato na região leste da Polônia. Mesmo assim, acaba sendo 
capturado pelos nazistas. Sua única alternativa é se alinhar ao exército de Hitler 
e para isso tem que esconder sua verdadeira identidade... Essa é sua história...” 
Disponível em <http://www.interfilmes.com/filme>. Acesso em 31 de agosto de 2011.
 ATIVIDADE
Nas três educações (judaica, socialista e nazista) recebidas por Solomon, o 
personagem principal do filme, procure identificar os valores e objetivos presentes 
em cada uma delas, observando a seguinte:
- Qual a visão de homeme de sociedade presente nela?
- Que valores incorporam tal visão? Observe os símbolos, os costumes presentes 
nas cenas; as atitudes, posturas, o modo de vestir dos personagens; os diálogos do 
filme.
- Que conhecimentos ou saberes são priorizados em cada uma delas e por quê?
•	 A SOCIEDADE DOS POETAS MORTOS
- Ficha Técnica: Direção: Peter Weir. País: EUA. Gênero: Drama. Lançamento: 1989. 
Duração: 129 minutos.
- Sinopse: Um carismático professor de literatura chega a um conservador colégio, 
onde revoluciona os métodos de ensino ao propor que seus alunos aprendam a 
pensar por si mesmos. 
Nos dois modelos de educação (a tradicional e a renovada) presentes no filme, 
procure identificar os valores e objetivos presentes em cada uma delas, observando 
a seguinte:
- Qual a visão de homem e de sociedade presente nela?
- Que valores incorporam tal visão? Observe os símbolos, os costumes presentes 
nas cenas; as atitudes, posturas, o modo de vestir dos personagens; os diálogos do 
filme.
- Que conhecimentos ou saberes são priorizados em cada uma delas e por quê?
44
2.1.4 O Ser Humano, sua Circunstância e a Educação
Não há dúvidas de que o homem só pode tornar-se humano pela educação (KANT, 1974). 
E, de fato, o telos, por excelência, de toda educação é o desenvolvimento e a promoção 
humana. Entretanto, a educação só realiza sua finalidade (telos), de levar o homem a 
tornar-se humano, se ela se transforma em ação. A finalidade da educação não tem sentido 
fora da ação que a concretiza.
É na concretização de sua finalidade (telos) que a educação se define como ação que 
envolve valores, tal como evidenciamos no item anterior. Todavia, se a finalidade geral de 
toda educação é promover o ser humano, as ideias do que é o homem, que concretamente 
cada ação educativa pressupõe ao definir seus valores, divergem bastante. 
Assim, se, realmente, por detrás dos valores de toda ação educativa está postulado, 
como telos implícito ou explícito, um determinado perfil de ser humano que se pretende 
confirmar ou atingir, o que precisamos compreender agora é que, enquanto ação, a 
educação não se dá fora de um tempo e espaço concretos, nos quais se encontrar situado 
o educando ao qual ela se refere. 
Desse modo, educar alguém é educá-lo sempre para uma situação, ou seja, para uma 
circunstância, na qual ele vive e constrói seu ser, à qual ele vai confirmar ou tentar 
transformar. Logo, no momento em que se impõe o problema dos valores de uma ação 
educativa, é preciso que interroguemos não somente pelo perfil de ser humano que aí está 
se pressupondo (às vezes, sem se dar conta), mas sobretudo pela circunstância em que se 
encontra inserido o educando ao qual esta ação se refere, uma vez que, como veremos a 
seguir, esta circunstância é parte constitutiva daquilo que ele é. 
2.1.5 Eu sou eu e minha circunstância
A humanidade é um gênero tão universal que nos engloba a todos como seres iguais. Por 
outro lado, as circunstâncias nas quais cada um de nós vive diferem muito. E como nos 
construímos na interação com nossas circunstâncias, embora sejamos todos humanos, 
somos todos diferentes uns dos outros. É nesse sentido que lemos em As Meditações do 
Quixote (1967), do filósofo Ortega y Gasset (Espanha, 1883-1955), a afirmação: “Eu sou 
eu e minha circunstância” (p. 52). Na ideia de homem que esta afirmação estabelece, 
temos um “Eu” que está nativamente aberto à sua circunstância, isto é, à realidade que 
o circunda. Esta realidade, que é tudo aquilo que o envolve atualmente (as coisas, os 
45
unidade 2
outros, o momento existencial, a situação histórica etc.), é, sem dúvida, distinta do Eu, 
mas, ao mesmo tempo, inseparável dele, de modo que não há como tomar o Eu sem sua 
circunstância, posto que ela é parte constitutiva de seu ser. 
2.1.6 O compromisso com a circunstância e a Educação no Brasil
Portanto, se a circunstância é parte constitutiva do ser do homem, logo, as diferenças de 
circunstâncias implicam diferenças no ser humano. Sendo assim, uma ação educativa que 
não esteja, em seus valores e objetivos, profundamente comprometida com a circunstância 
em que vive o ser humano a que ela se refere, será uma ação alienada e abstrata, por não ter 
suas raízes afundadas no solo da circunstância em que ela se insere;,mas será também uma 
ação alienante e ideológica, por afastar o homem a que ela se refere de sua circunstância, 
afastando-o assim de si mesmo, visto que sua circunstância é parte constitutiva de seu ser. 
Assim, se nos colocamos agora a questão: como deveriam ser definidos os valores e 
objetivos de uma ação educativa para o homem no Brasil? Para sermos coerentes com o 
que estamos dizendo, precisamos nos interrogar, primeiro, pela circunstância na qual este 
homem se constitui em seu ser humano.
Num sentido amplo, podemos dizer que a circunstância do homem brasileiro é a própria 
América Latina, visto que, enquanto país latino-americano, o Brasil participa da mesma 
circunstância de opressão, exploração, exclusão e inferiorização em que se encontram os 
países latino-americanos frente aos países desenvolvidos. Num sentido restrito, que não 
exclui o sentido amplo, a circunstância deste homem é o próprio Brasil, país tão abaixo 
de suas potencialidades, com enormes injustiças e desigualdades, com um fosso enorme 
entre uma minoria rica e opressora e a imensa maioria empobrecida, oprimida, carente de 
cultura, de participação política, de saúde, de moradia, de comunicação social, de escolhas 
livres etc.
Ora, se, pelo menos a princípio, a meta geral de toda educação é o desenvolvimento 
ou a promoção do ser humano, discutir educação para o homem que se forma nestas 
circunstâncias, implica perguntar-se quais deveriam ser os valores e objetivos de uma 
educação que o levasse a superar essas circunstâncias, que lhe negam na plenitude de seu 
direito de ter uma vida digna, com casa, comida e cultura, participando nas decisões que 
definem os rumos da sociedade da qual ele faz parte, podendo criar, escolher, decidir e 
sonhar, para si, os projetos de sua própria existência. 
46
Caso contrário, uma ação educativa para este homem, que tenha os seus valores e objetivos 
definidos à revelia da circunstância (política, econômica, cultura e, sobretudo, social) na 
qual ele se constitui, confirma o ser (empobrecido, oprimido e marginalizado) que nesta 
circunstância se forma, afirmando sua negação que, com isso, perpetua-se. E, assim, mais 
uma vez, o que se tem é uma educação que, ao invés de promover o ser humano a partir 
da circunstância concreta em que ele se encontra, simplesmente reproduz o estado de 
fato (Status quo), confirmando e conservando as coisas como estão e os homens como as 
fizeram.
2.1.7 Considerações Finais
Portanto, se queremos uma ação educativa que, de fato, pretenda em seus valores e 
objetivos comprometer-se com a promoção do ser a partir de seu acontecer concreto, esta 
ação precisa estar calcada no conhecimento profundo da circunstância real em que este 
homem se encontra inserido, orientando-se, com ele, no sentido da negação de tudo aquilo 
que, em sua circunstância, o nega e educando-o para a superação desta circunstância 
numa outra em que ele poderá, de maneira incoativa e criativa, desenvolver-se pessoal 
e socialmente até o limite de suas possibilidades, crescendo, assim, numa sociedade em 
que, concretamente, todos possam ser e viver como humanos.
 ATENÇÃO!
Não estamos defendendo aqui a tese da educação como panaceia para todas 
as mazelas de nossa circunstância. Essa é uma crença ingênua que felizmente 
superamos. Entretanto, igualmente ingênua é a crença de que a função da educação, 
por essência, seja a reprodução do status quo. Nos dois casos, entre educação e 
circunstância, está subjacente a ideia de uma causalidade unilateral, quando, tal 
como pensamos, esta causalidade é recíproca: a circunstância determina a educação 
tanto quanto, ao menos, é determinada por ela. Desse modo,a ação educativa, pela 
pouca mas real liberdade que a ela é não seria “concebida”, não deixa de ser uma 
importante alavanca de transformação de nossa circunstância.
Mas, se não há novidade em se estabelecer a necessidade de se tomar a circunstância 
concreta do educando como o núcleo central e a razão de toda a ação educativa que vise a 
promovê-lo, esta necessidade, no caso da educação brasileira, está longe de ser atendida. 
Isso porque, desde o ponto de vista político dos governantes para a educação até as 
discussões sobre educação no interior de cada escola, os valores e objetivos para a ação 
pedagógica têm sido definidos mais à luz dos interesses do mercado ou deste ou daquele 
47
unidade 2
plano econômico, dos alinhamentos ideológicos dos donos do poder, do que a partir das 
necessidades, limitações e potencialidades do educando e de sua circunstância. Entretanto, 
é urgente que mudemos essa atitude, pois só assim chegaremos a uma outra dinâmica no 
agir educativo caracterizado, em seus valores e objetivos, pelo reconhecimento de que os 
homens são mais importantes que o capital (REZENDE, 1986), de que o tempo de cada 
homem concreto é limitado e o seu desenvolvimento pessoal e social não pode esperar 
até o infinito.
 ATIVIDADE
A partir dos conceitos e tema estudados neste tópico, responda as questões 
abaixo
1- Que definição de educação é explorada neste tópico e qual sua opinião sobre ela?
2 – Os valores e objetivos priorizados nas ações educativas possuem qual objetivo? 
3 – Como deveriam ser definidos os valores e objetivos de uma ação educativa para 
o homem no Brasil? Justifique sua resposta. 
2.2 Os Discursos: Ideológico, Pedagógico e Filosófico
2.2.1 Introdução
Prezado(a) Estudante, nas Considerações Finais do primeiro texto desta unidade, 
afirmamos a “necessidade de se tomar a circunstância concreta do educando como o 
núcleo central e a razão de toda a ação educativa que vise a promovê-lo; esta necessidade, 
- dissemos ainda - no caso da educação brasileira, está longe de ser atendida. Isso porque, 
desde o ponto de vista político dos governantes para a educação até as discussões sobre 
educação no interior de cada escola, os valores e objetivos para a ação pedagógica têm 
sido definidos mais à luz dos interesses do mercado ou deste ou daquele plano econômico, 
dos alinhamentos ideológicos dos donos do poder, do que a partir das necessidades, 
limitações e potencialidades do educando e de sua circunstância.” No texto que você 
começa a ler agora, pretendemos, à luz das afirmações acima, mostrar como, em linhas 
gerais, o Discurso Ideológico (DI) invade e contamina o Discurso Pedagógico (DP) ao longo 
da história da educação brasileira, tornando justificável a presença do Discurso Filosófico 
(DF) na Educação como contraponto do DI presente nela. Para tanto, organizamos este 
texto da seguinte forma: primeiramente, caracterizamos o DI, em seguida, o referimos ao 
48
DP para, finalmente, identificar e caracterizar o DF como importante ao DP, caso queiramos 
defini-lo como um discurso comprometido com o saber e não com poder e a dominação.
2.2.2 O Discurso Ideológico
Propomos, aqui, que entendamos o DI como aquele que exprime a visão de mundo de uma 
determinada classe social (dominante), pretendendo que esta visão seja a de todos. Nesse 
sentido, ele surge sempre a partir de um posicionamento da consciência frente à realidade 
social, ou melhor, o processo social é que o impulsiona ou alimenta enquanto processo teórico. 
Entretanto, o ideólogo (um intelectual, um partido, uma classe social, etc) não reconhece as 
forças da realidade que impulsiona o seu discurso. Desse modo, o ideólogo, embora ciente 
do que diz, ignora as forças que impulsionam seu discurso. Assim, ele pensa que desenvolve 
um discurso livre e incondicionado, quando, na verdade, seu discurso é determinado pela 
realidade social que o envolve.
O DI, baseado no falso perfil de discurso imparcial e incondicionado da realidade, coloca-se, 
assim, como um discurso legítimo, verdadeiro e válido para todos. Daí a função ilusória do 
DI, pois ele, mesmo sendo uma visão de certa classe social (dominante) sobre a realidade, 
portanto, visão parcial e determinada, pretende-se como uma visão indeterminada e 
universal do mundo, por isso mesmo, devendo ser válida e legítima para todos. Ainda por 
este motivo, o DI apresenta-se, também, como um discurso dualista, visto que define o seu 
ponto de vista como única verdade, sendo todo outro ponto de vista falso. Desse modo, o DI 
tende a ver as coisas em preto e branco: ou algo é falso ou verdadeiro, ou é claro ou é escuro. 
Nessa perspectiva, Serres (1990a) compara o DI à Lua, pois, enquanto
Na Terra, podemos enxergar de um lado do muro quando a fonte de luz 
está no outro. Isso porque há atmosfera e o raio de luz se parte, se difunde, 
se refrata de modo complexo e dá a volta ao muro. Na Lua, ao contrário, 
onde não existe atmosfera, fica absolutamente claro de um lado do muro e 
absolutamente escuro do outro. (p. 181). 
Tal como na Lua onde aparece apenas o claro e o escuro, no DI aparece apenas o verdadeiro e o 
falso. Contudo, ainda segundo Serres (1990a), comparando o conhecimento com um modelo 
de visão, é preciso afirmar contra o DI, “que não se pode conhecer senão na complexidade da 
atmosfera terrestre” (p. 181), na infinita possibilidade de nuanças entre o claro e o escuro, o 
verdadeiro e o falso, o branco e o preto.
Além do mais, se estamos caracterizando o DI como aquele que fixa seu ponto de vista sobre o 
mundo como se ele fosse a visão completa do mundo (Weltanschauung), é preciso considerar, 
49
unidade 2
ainda, contra o DI, que, por definição, não existe ponto de vista de onde tudo seja visível. 
Logo, universalizando seu ponto de vista, o DI faz desaparecer outros pontos de vista sobre a 
realidade, ocultando, assim, a própria realidade, à medida que ela só se torna visível a partir 
de seu ponto de vista. Contudo, mais uma vez contra o DI, é preciso considerar que, como 
ensina-nos Marías (1983), “a realidade, como uma paisagem, tem infinitas perspectivas, 
todas elas igualmente verídicas e autênticas” (p. 177). Daí, a única perspectiva falsa ser esta 
que se pretende única.
Ademais, porque pretende impor seu ponto de vista como único, o DI realiza uma inversão 
no seguinte sentido: ele abstrai do todo o seu ponto de vista e pretende que esta perspectiva 
particular seja universal, ou seja, o DI põe o particular como se fosse o universal, põe a parte 
como se fosse o todo. Ao operar esta inversão, ele se assevera como um discurso do poder, 
pois, enquanto visão de mundo de uma classe social, ele tenta abafar as outras visões e se 
colocar como se fosse a única. Em sua face política e, supostamente, universal, o DI visa a 
justificar as relações de dominação, afirmando-as como se fossem inerentes ao processo 
social, tal como aparecem numa visão “científica” e “imparcial” da realidade. 
Uma vez caracterizado, em largos traços, o DI, cumpre, agora, perguntar: como é que ele 
invade o espaço da educação e contamina o DP? 
2.2.3 O Discurso Pedagógico e o Discurso Ideológico
O DP pode ser abordado pelo menos em três planos diferentes: o plano 1) do que se diz sobre 
educação (plano teórico), 2) do que se faz em educação (plano prático) e 3) do que se legisla 
à educação (plano legal).
Estes três planos se implicam mutuamente: se a teoria nasce da prática e a ela retorna 
iluminando-a, por sua vez, é também pela prática que se corrige a teoria, ademais, enquanto 
atividade no seio de uma sociedade, a prática educativa não escapa da instância político-
jurídica que normatiza, gerencia e controla a vida social. 
O Estado, através dos ministérios e das secretarias legisla, regulamenta e controla o trabalho 
pedagógico (CHAUÍ, 1980). Assim, a legislação, entendida aqui como o ponto de vista do 
Estado sobre a educação, faz a ponte entre o DP no plano legal e oDP no plano prático. Mas, 
se se entende a legislação como o ponto de vista do Estado sobre a educação, por sua vez, 
entenda-se o Estado como representante da classe hegemônica. Daí poder-se-ia perguntam, 
o que pretende o Estado com a legislação? Não seria a legislação um instrumento usado 
50
pelo Estado para impor seu ponto de vista sobre a educação? Em caso afirmativo, através da 
legislação, as concepções ideológicas dominantes do DP no plano legal não invadiriam, assim, 
o DP enquanto atividade prática e teórica? Por outras palavras, a legislação serviria, assim, 
de ponte entre as concepções ideológicas dominantes e o “aparelho escolar” (SEVERINO, 
1986, p. 55), contaminado-o com a ideologia da classe dominante, levando-o a reproduzi-la.
Os vários momentos da educação brasileira, em suas grandes linhas ideológicas, confirmam 
o DP como reprodutor do discurso das classes dominantes. Nesse sentido, do ponto de vista 
do DI dominante no DP, a história da educação brasileira pode ser dividida, grosso modo, em 
três períodos: 1) de 1500 a 1889; 2) de 1889 a 1964; 3) de 1964 a ... (SEVERINO, 1986, p. 61). 
No primeiro período, predomina no DP o DI da Igreja Católica; no segundo, prevalece o DI do 
liberalismo e no terceiro, o DI tecnológico (SEVERINO, 1986, p. 62).
2.2.3.1 O predomínio do DI do Catolicismo no DP brasileiro de 1500 a 1889
Como afirma Severino (1986), no período indicado acima, a “História da Educação [...] está 
intimamente ligada à presença e à atuação da Igreja Católica” (p. 62). A Igreja Católica, por 
sua vez, está tão intimamente vinculada ao Estado, que passa a atuar como uma “autêntica 
instituição estatal” (p. 65).
Assim, no período em questão, a ideologia católica serviu sob medida aos objetivos do 
Estado junto à classe dominada. Não importava o destino profissional ou social do educando, 
importava somente formá-lo como bom cristão. Segue daí que a aristocracia agrária pôde 
gerir, sem maiores problemas, a exploração colonizadora, contando, para isso, com uma 
grande massa de escravos e trabalhadores pobres “educados” pela Igreja Católica.
Com a vinda de Dom João para o Brasil, a sociedade brasileira foi se tornando mais 
estratificada, dando origem a uma camada média (intelectuais, pequenos comerciantes etc.), 
que desempenhará importante papel político e social na fase seguinte.
2.2.3.2 A consolidação da ideologia liberal: 1889-1964
Neste período o Estado, em sua política educacional, abandona gradualmente a ideologia 
católica enquanto passa a assumir a ideologia liberal da burguesia leiga ascendente. Tal 
processo se deu de forma conflitiva, com o embate dos defensores das duas ideologias sendo 
mediado pelo Estado que, mesmo não tendo mais interesse na ideologia católica, não podia 
dispensar uma aliada tão forte como ela.
51
unidade 2
A partir de 1930, o confronto entre as duas facções ideológicas se acirra, com cada uma delas 
querendo fazer valer a sua proposta pedagógica perante o Estado.
No largo período histórico que vai de 1930 a 1945, persiste o conflito entre as duas facções 
ideológicas, cada qual representando uma ala da classe dominante: a ideologia católica 
vinculada à oligarquia agrária e a ideologia liberal vinculada à burguesia urbano-industrial.
A partir de 1945, a facção liberal, insistindo sempre numa educação baseada num humanismo 
científico e em processos ativos de aprendizagem, passa a prevalecer proclamando a 
necessidade da renovação da escola como condição do progresso e democratização do País. 
“A reconstrução educacional seria instrumento para a reconstrução social.” (SEVERINO, 
1986, p. 81).
Em 1960, a concepção liberal de educação e de mundo constituía, em última análise, o pano 
de fundo do cenário educacional brasileiro. A ideologia liberal serviria de ponte para a nova 
ideologia que se delinearia a partir de 1964.
Os dois períodos tematizados até aqui têm em comum o fato de nunca terem questionado o 
sistema vigente. Portanto, de 1500 a 1964, a educação brasileira continuou reproduzindo e 
legitimando, pelo menos em termos de educação oficial, a estrutura social vigente.
2.2.3.3 A supremacia da ideologia tecnológica de 1964 a ? 
A mudança de regime em 1964 significou também uma reorientação ideológica para o País e 
para a educação em especial. Os militares pretendiam modernizar o País e inseri-lo na divisão 
internacional do trabalho no sistema capitalista. Para tal propósito, a educação deveria dar 
a sua contribuição. Assim, tão logo os militares se instalaram no poder, surgiram os acordos 
do Brasil com os EUA (MEC-USAID) para a reestruturação do sistema educacional brasileiro, 
visando a reorganizar a educação em função do crescimento econômico do País.
A ideologia tecnológica passa, assim, a orientar os caminhos da educação brasileira. Daí 
por diante, tratava-se, acima de tudo, de formar técnicos para o progresso da nação. O que 
se cobrava do sistema educacional era “a produtividade, o baixo custo da mão-de-obra 
técnica, disciplinada e dócil, adequada às necessidades da manutenção da ordem vigente.” 
(SEVERINO, 1986, p. 92).
As escolas transformaram-se, assim, em indústrias para a produção em série de técnicos, 
não cabendo a elas discutir o sentido ou a finalidade última da educação e da escola numa 
sociedade, mas somente atender às demandas da sociedade capitalista. 
52
Assim, concluindo este breve e panorâmico passeio pela história da educação brasileira, na 
perspectiva do DI dominante no DP, pode-se afirmar que o DP não fez outra coisa senão 
reproduzir o DI da classe dominante.
Todavia, se neste aporte histórico se enfatizou o DP como reprodutor do DI, isto não quer 
dizer que o DP não possa produzir um discurso contra-ideológico e comprometido com a verdade da realidade brasileira.
 SAIBA MAIS...
Para aprofundar a afirmação do parágrafo acima, leia
CUNHA, Luiz Antonio. O golpe na educação. 5. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1988. 
É na perspectiva de um DP descontaminado do DI e comprometido com a realidade brasileira 
de imensas desigualdades e injustiças que o DF pode ser útil e salutar ao educador, servindo-
lhe de instrumento para a explicitar a inverdade que o DI impinge ao DP, transformando-o 
num mero instrumento para a estratégia de dominação.
Assim, para que se possa compreender melhor o DF como instrumento de desvelação do DI 
embutido no DP, passemos ao estudo do DF.
 SAIBA MAIS...
Sobre as relações entre ideologia e educação em
CHAUÍ, Marilena de Souza. Ideologia e educação. Educação & Sociedade. São Paulo, 
n.5, p.24-40, jan. 1980. 
CRITELLI, Dulce Mara. Educação e dominação cultural: tentativa de reflexão 
ontológica. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1981. 
SEVERINO, Antônio Joaquim. Educação, ideologia e contra-ideologia. São Paulo: 
EPU, 1986. 
 CINE
Para discutir o poder do DI no DP, assista ao filme
•	 A ONDA
cine
53
unidade 2
- Ficha Técnica: Direção: Dennis Gansel. País: Alemanha. Gênero: Drama. 
Lançamento: 2008. Duração: 117 minutos. Disponível em <http://cinema.cineclick.
uol.com.br >. Acesso em: 31 de agosto de 2011.
- Sinopse: Baseado em uma história real, o filme “A Onda” mostra como é possível a 
criação de doutrinas ideológicas em sala de aula, não só no passado, mas atualmente. 
O filme que, foi adaptado do ensaio The Third Wave (A Terceira Onda), do professor 
de História Ron Jones, no qual relata sua experiência numa escola da Califórnia 
(EUA), em 1967, na tentativa de explicar na prática como Hitler e o Partido Nazista 
chegaram ao poder na Alemanha. Disponível em <http://www.nomundoenoslivros.
com/2010/08/filme-onda.html >. Acesso em: 31 de agosto de 2011.
2.2.4 O Discurso Filosófico
O que constitui a especificidade do DF? Qual a sua “marca registrada”? O que o caracteriza 
fundamentalmente? Enfim, qual a essência do DF? 
O DF se distingue pela radicalidade de suas questões, pelo rigor com que persegue uma 
possível resposta e pela universalidade da verdade que pretende encontrar.Um bom exemplo 
do DF assim caracterizado (radical, rigoroso e universal) é o texto Meditações, do filósofo 
francês René Descartes (1596-1650).
Nas Meditações, Descartes (1970, p. 26) tem um propósito radical: “Começar tudo de novo 
desde os fundamentos, visando a estabelecer algo de firme e constante nas ciências”. Ao 
fazer da dúvida o seu caminho seguro (Méthodos), Descartes persegue de modo rigoroso 
seu objetivo, até que, finalmente, atinge o Cogito como o fundamento universal de todo saber 
epistemológico.
Mas as Meditações desvenda-nos também uma outra característica importante do DF: é um 
discurso sem pressupostos, ou seja, que não admite nenhuma verdade incontestável a partir 
da qual se começaria a filosofar. Trata-se, como dizia Descartes (Idem), de “começar tudo de 
novo desde os fundamentos”, sem nada pressupor, negligenciando o adquirido e correndo 
o risco de abrir um caminho que não conduza a parte alguma. Por aí se vê que não é no 
sossego do espírito que frui de suas antigas verdades que o discurso filosófico germina, mas 
na coragem de constantemente empreender novos começos, de enveredar-se em “tentativas 
onde se atola e de onde (muitas vezes) sai após esforços gastos em pura perda” (LEFORT, 
1992, p. 251; 1964, p. 341. Parênteses nossos).
54
Entretanto, para além da radicalidade, da rigorosidade, da universalidade e da ausência de 
pressupostos, haveria outras características do DF?
Merleau-Ponty, filósofo francês (1908-1961), afirma em seu texto Elogio da Filosofia (1979) 
que “o filósofo se reconhece pela posse inseparável do gosto pela evidência e pelo sentido da 
ambiguidade” (p. 2). Decorre daí que o DF, embora pretenda habitar na evidência, abrigue 
sempre o sentido da ambiguidade, o que nos permite caracterizá-lo também um discurso 
ambíguo.
Mas por que o DF é um discurso ambíguo? Ainda segundo Merleau-Ponty (1979), pode-se 
dizer que é porque o filósofo é aquele que recusa “o direito de se instalar na posse do saber 
absoluto” (p. 2). Daí o dizer filosófico ser ambíguo, ser uma mescla de sombra e de luz, enfim, 
ser este “movimento que leva incessantemente do saber à ignorância, da ignorância ao saber” 
(Idem). O que faz da filosofia, não “um ‘ponto de vista superior’ de onde se abarquem todas 
as perspectivas locais” (MERLEAU-PONTY, 1991, p. 22), mas esse constante reaprendizado 
do olhar para o mundo.
Não é outra coisa senão este movimento em duplo sentido (da ignorância ao saber e do 
saber à ignorância) o que se verifica, por exemplo, no discurso de filósofos tais como Platão, 
Husserl e, mesmo, Merleau-Ponty. Esses pensadores, na maturidade de suas filosofias, 
mesmo quando já eram considerados mestres, trilharam, novamente, o caminho que leva do 
saber à ignorância, através da revisão crítica de seus pensamentos.
Assim, porque a filosofia não pretende manter o mundo deitado aos seus pés, porque ela 
se aborrece no saber já pronto, na verdade reificada, é por isso que o discurso filosófico se 
assevera também como um discurso crítico do pensamento sobre o próprio pensamento em 
vistas de uma forma de pensar ainda mais radical, rigorosa e universal. Tal é o sentido dos 
questionamentos de Foucault (1984a):
[...] o que é filosofar hoje em dia - quero dizer, a atividade filosófica - senão 
o trabalho crítico do pensamento sobre o próprio pensamento? Se não 
consistir em tentar saber de que maneira e até onde seria possível pensar 
diferentemente em vez de legitimar o que já se sabe? (p. 13).
Mas o que faz o DF ser esse dizer especulativo e crítico, que se move sempre na direção de 
uma forma de pensar diferente? Na resposta a esta questão julgamos encontrar a essência do 
DF, ou seja, o seu sentido fundamental, isto é, o sentido que justifica todas as características 
que a ele foram referidas.
55
unidade 2
O DF é um discurso que se pretende radical, rigoroso, universal, dinâmico (movente), aporético 
(indagador), crítico e ambíguo pela mesma razão que faz do filósofo um philosophos. Trata-
se sempre da amorosa amizade (philó) pela sabedoria (sophia). Porque cultiva a amizade 
(e não a posse) da sabedoria, o dizer filosófico se institui com todas as características nele 
verificadas. Na essência do DF é o amor à Verdade que vamos encontrar. E é nesta medida 
que ele pode servir ao educador como instrumento para descontaminar o DP do DI que 
abriga em seu íntimo mais profundo a ânsia pelo poder e a pretensão de posse da Verdade.
 SAIBA MAIS...
Sobre o discurso filosófico em:
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? Rio de Janeiro: Editora 34, 
2007. 
MERLEAU-PONTY, Maurice. Elogio da filosofia. Tradução de A.B.Teixeira. Lisboa : 
Guimarães & C, 1979.
2.2.5 Considerações Finais
Para terminar este texto, resta dizer que, é se tornando filosófico que o DP pode desmascarar 
o DI nele incrustado; é se fazendo cheio de amor à Verdade, de amizade amorosa pela 
Sabedoria, que o DP não se deixa contaminar pelo DI. Talvez este seja um dos caminhos 
pelo qual o DP pode atingir sua maioridade, deixando a inocência “a-crítica” e dogmática de 
um mero veículo ou títere do DI, tornando-se responsável pelo seu próprio dizer como um 
dizer próprio (CHAUÍ, 1980), contra-ideológico (SEVERINO, 1986) e comprometido com a 
verdade da realidade em que se encontra inserido, com a busca do sentido profundo que 
deve assumir perante esta verdade.
 CINE
Para discutir as relações entre os discursos filosófico e político. assista ao filme
•	 GIORDANO BRUNO
- Ficha Técnica: Direção: Giuliano Montaldo. País: Itália. Gênero: Drama. Lançamento: 
1973. Duração: 114 minutos.
- Sinopse: Giordano foi um dos grandes pensadores de Esquerda de sua época, num 
momento em que o poder da Igreja Católica estava acima de tudo.
cine
56
Ao menor descuido, qualquer um poderia ser acusado de herege e queimado em 
praça pública. Preso pela inquisição, o filme conta o processo pelo qual passa 
Giordano até sua morte. Disponível em <http://cinema.uol.com.br/resenha/
giordano-bruno-1973.jhtm>. Acesso em: 31 de agosto de 2011.
2.3 Entre a retórica e a dialética: onde situar a fala professor em sala de aula?
Prezado(a) Estudante, no segundo texto desta unidade, você viu que caracterizamos o 
Discurso Ideológico como aquele comprometido com o poder, e o Discurso Filosófico 
como aquele comprometido com o saber. No texto que lhe apresentamos agora, vamos 
levar essa discussão sobre saber e poder, que no segundo texto foi abordada do ponto de 
vista da história da educação, para dentro da sala de aula, numa perspectiva de abordagem 
filosófica do discurso do professor neste ambiente. 
Você está fazendo um curso de Pedagogia a distância e sua sala de aula é virtual, mas, até 
aqui, sua trajetória escolar a colocou, por vários anos, num sala de aula com a presença 
física de professores e alunos diante uns dos outros. Este texto trata da sala de aula 
presencial, mas tentaremos,no decorrer de nossa reflexão, pensar o modo como podemos 
relacionar os problemas que trabalhamos nele com aqueles que também podem estar 
presentes em uma sala de aula virtual ou na relação à distância entre o professor e o 
aluno. É neste sentido que o (a) convidamos, na leitura a seguir, a refletir conosco sobre 
o real compromisso da fala (ou do texto) docente: é com o poder ou com o saber? Esta 
questão, na nossa opinião, transcende o ensino presencial e se aplica também ao ensino 
a distância, pois o que você está lendo e estudando desde a primeira unidade deste curso 
não é mais que a fala escrita de um docente, presente virtualmente diante de você, através 
deste texto. 
2.3.1 Introdução
Este trabalho é resultado da tentativa de produzir um texto incitado por um debate iniciado, 
na disciplina Filosofia da Educação, com os (as) estudantes do 5º período de Pedagogia 
da Universidade Federal de São João del-Rei, no primeiro semestre de 2004. Discutimos, 
em grupos de até quatro pessoas, a seguinte questão: a partir de sua experiência,desde o 
primeiro grau, passando pelo nível médio e, agora, no ensino superior, em sala de aula, quem 
fala mais, o professor ou o aluno? Nas respostas dadas pelos dez grupos formados na sala, 
todos identificaram o professor como aquele que, na maioria das vezes, mais fala em sala 
57
unidade 2
de aula. E, mesmo quando não é este o caso, mesmo quando opta por metodologias mais 
dialógicas, como seminários, debates, estudos em grupo, leituras ou vídeos comentados, 
ainda assim, a fala do professor é aquela que o aluno mais leva em conta. Tais constatações 
não surpreenderam a ninguém. Pelo contrário, surgiram como naturais.
 REFLITA
Algumas respostas dadas pelos grupos: “O professor fala mais porque detém o 
conhecimento”, “porque seu discurso é mais amplo por deter uma bagagem maior 
de conhecimento e experiências”, “pois ele tem uma postura de detentor do saber”, 
“porque é tido como aquele que sabe mais”, “porque na maioria das vezes é visto 
como o único detentor do conhecimento”.
Procuramos, então, indagar: Por que isso? De diversas maneiras, as respostas giraram em 
torno da ideia de que o professor fala mais porque, pelo menos supostamente, sabe mais 
que os alunos, possui um logos ou discurso mais rico que aquele dos alunos à medida que 
se encontra “enriquecido pela memória cultural, aquela de que falava Gasset, formada por 
vivências acumuladas e enriquecidas ao logo do tempo” (TRIGUEIRO, 1968, p. 226). Logo, 
para o próprio aluno parece natural que o professor possa falar mais ou tenha de sua fala 
uma escuta privilegiada. É para que promova o saber - seja aquele que possui e repassa ou 
transmite para o aluno, seja o saber incipiente que o aluno traz da própria experiência e 
que será potencializado ou atualizado na relação com o professor, seja ainda o saber que 
o próprio aluno constrói ou adquire na relação mediatizada pelo professor com o saber já 
produzido em nossa cultura - é por isso que, pelo que surgiu no debate, o professor pode 
(no sentido de que tem o direito) falar mais e sua fala tem mais poder (no sentido de que é 
acatada pelo aluno, senão pelo respeito, pelo menos, por medo ou como matéria de prova).
Em suma, pela discussão com a turma, o professor tem mais poder à fala e sua fala tem mais 
poder, porque com sua fala ele promove o saber. Mas será sempre este o caso? E se o poder 
à fala e o poder da fala do professor puder ser usado para promover seu poder sobre os 
alunos? E se o logos docente, em sala de aula, estiver a serviço, não do saber, mas do poder 
de um (o professor) sobre os outros (os alunos)? No horizonte desses questionamentos, 
procuraremos relacionar a fala do professor em sala de aula a duas maneiras de falar 
identificadas e caracterizadas por H. Arendt (1993), em seu livro A dignidade da política, 
entre os gregos do tempo de Sócrates. As duas maneiras são a retórica e a dialética. Nossa 
intenção é refletir a seguinte pergunta: entre essas duas formas de falar, onde situar a fala 
do professor em sala de aula. Começamos por uma caracterização da retórica e da dialética. 
Depois, traçamos um quadro comparativo entre elas para, em seguida, considerarmos a 
58
questão central do texto: entre elas, onde situar a fala do professor? Finalmente, concluímos 
indagando-nos quanto à possibilidade ou não de se abdicar completamente da retórica 
em sala de aula.
2.3.2 Caracterização da Retórica e da Dialética
No que diz respeito à retórica, foi criada por Protágoras de Abdera e, historicamente, se 
impôs sobre Atenas por volta de 450 a.C. sob a forma da sofística. Atenas, nesta época, estava 
no auge de sua democracia. Nela, todo cidadão, ao completar 18 anos, podia participar 
da Assembleia, na qual era dada a palavra final em assuntos relativos à guerra, à paz, 
aos tratados, à legislação e obras públicas, enfim, a todas as atividades governamentais. 
A Assembleia era um grande comício ao ar livre, com todos os cidadãos que quisessem 
comparecer e as decisões eram tomadas pela maioria simples dos votos dos cidadãos 
presentes. (FINLEY, 1988). 
 ATENÇÃO!
Mas todo habitante de Atenas, na época da qual falamos, era cidadão? Quem dera! 
O cidadão era o homem livre, filho de pai e mãe atenienses. Estavam excluídos da 
democracia ateniense, as mulheres, os escravos, em sua maioria, prisioneiros de 
guerra e os metecos, estrangeiros, em grande parte, artesãos e comerciantes, que 
mesmo sendo gregos, não sendo atenienses, estavam fora da democracia. 
Nesta democracia, repleta de jovens ambiciosos e sedentos de poder, o sofista aparece 
como “o mestre devotado, que ensina que não há verdade em si, que existe apenas opiniões 
variando com os indivíduos ou com as cidades; e a melhor opinião é aquela que assegura 
o êxito” (REBOUL, 1998, p.11). O relativismo é, portanto, o fundamento da retórica sofista. 
Com ela, a palavra torna-se um instrumento de poder pelo qual a retidão do que se diz é 
menos importante do que “a maneira de dizê-lo para impô-lo ao outro. Tornar-se hábil 
para falar a fim de tornar o homem poderoso” (MANON, 1992, p. 39), esta é a arte dos 
retóricos, na qual o que se pretende é convencer os outros do que quer que seja, “de fazer 
do mais fraco argumento o mais forte” (REBOUL, 1998, p.12). Daí, Arendt (1993) definir 
a retórica como a fala, por excelência, persuasiva. E compreendamos “por ‘persuadir’ 
o ato de suscitar no outro, por meios tanto afetivos quanto racionais, uma crença” em 
determinada opinião (REBOUL, 1998, p.7-8).
Obreira da persuasão, a retórica conduz à crença (PLATÃO, 1989). E acreditar, como define 
Manon (1992) é “consentir por outras razões que não as próprias, aderir sem ter em si 
59
unidade 2
o recurso para distinguir a idéia falsa da idéia verdadeira” (p. 35). Na crença demitimos 
nossa capacidade de discernir por nós mesmo e submetemo-nos ao jogo do outro. E é 
isso, precisamente, o que almeja o retórico, que acreditemos nele; por isso, para suscitar 
em sua plateia a crença em sua opinião, ele busca atingi-la tanto pelo logos quanto pelo 
pathos, ao mesmo tempo “pela verdade e pela volúpia”, como dizia Pascal (apud REBOUL, 
1998, p. 8). Manipulando sentimentos e argumentos, por deduções e seduções, o retórico 
ataca seus ouvintes tanto na cabeça quanto no coração. Insinuando-se no outro e impondo 
a ele sua lei, a retórica paralisa o espírito crítico e o subjuga, deixando-lhe, entretanto, a 
impressão de que continua livre. 
A retórica define, assim, “o poder em estado puro, aquele que se exerce sem ser reconhecido, 
que escraviza também, com o consentimento dos que se submetem a ele” (MANON, 1992, 
p. 36). É nesse sentido que, para Arendt, a retórica não deixa de ser um tipo de violência, 
de governo pela violência, só que ao invés de se usar a força física ou as armas, usam-se 
as palavras. A “violência só com palavras, [...] a violência com meras palavras” (ARENDT, 
1993, p. 96), afirma a filósofa. É a tirania simpática da doxa de um sobre as dos outros.
Num dos sentidos que Arendt (1993) nos oferece da doxa, ela é a “formulação em fala [...] 
daquilo que me parece” (p. 96). Nessa perspectiva, ela equivale ao verossímil, aquilo que 
parece verdade, que pode ou não ser verdadeiro. Na doxa, portanto, expressamos nossa 
compreensão do mundo tal como ele se mostra para nós. Fundada nesse posicionamento 
da consciência perante o real ou nesse aparecer do mundo tal como se apresenta para 
nós ou como o vemos do lugar em que estamos, a doxa não é mera “fantasia subjetiva” ou 
resultado da pura “arbitrariedade” daquele que fala (ARENDT, 1993, p. 96). Ela surge de 
nosso ponto de vista sobre o mundo e sob esse aspecto não há violência alguma no ato de 
alguém querer expor aos outros a sua doxa sob determinado assunto. 
Entretanto, para Arendt (1993), a violência surge quando se pretende impor a própria 
opinião como “alguma coisa de absoluto e válida para todos” (p. 96), quando se busca 
colocar o próprio ponto de vista sobre o mundo comose fosse a visão completa do mundo. 
Deste momento em diante, ao universalizar seu ponto de vista, o que o retórico pretende é 
fazer desaparecer ou escamotear os outros pontos de vistas sobre a realidade, ocultando, 
assim, a própria realidade, à medida que ela só se torna visível a partir de seu ponto de 
vista. Ao realizar esta inversão, na qual abstrai do todo o seu ponto de vista e pretende 
que esta perspectiva particular seja universal, é exatamente aí que a retórica se assevera 
como um discurso que visa, por excelência, o poder, pois, embora seja uma perspectiva 
60
sobre o mundo, procura abafar as outras, prevalecer sobre elas e se colocar como a única 
e verdadeira maneira de ver o mundo. Em suma, portanto, “o problema moral que a 
retórica põe não é aquele da mentira”, pois a doxa, a princípio, não é necessariamente 
falsa, mas aquele “do poder” (REBOUL, 1998, p. 109). Daí, Arendt (1993) concebê-la como 
a “forma especificamente política de falar” (p.91), porque, em última análise, o que ela 
visa, essencialmente, é o poder de um sobre os outros.
 SAIBA MAIS...
Sobre a Retórica em
ARISTÓTELES. Retórica. São Paulo: Rideel, 2007.
CITELLI, Adilson. Linguagem e persuasão. 4. Ed. São Paulo: Ática, 1989.
HALLIDAY, Teresa Lucia. O que é a retórica. São Paulo: Brasiliense, 1990.
PLATÃO. Górgias ou a oratória. 3. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.
PLATÃO. Fedro. São Paulo: Martin Claret, 2007.
Consideremos, agora, a dialética. Arendt (1993) a identifica com a “forma de falar 
especificamente filosófica” (p. 95). Nela, o que se pretende é “discutir algo até o fim com 
alguém” (p. 96). Por isso, para a filósofa, em contrapartida à retórica na qual temos a 
fala de um para muitos, a dialética “só é possível em um diálogo entre dois” (p. 96). Em 
Sócrates, através da maiêutica, ela se apresenta como a “a arte da obstetrícia”, pela qual o 
filósofo ajudava “os outros a darem à luz o que eles próprios pensavam, a descobrirem a verdade em sua doxa” (p. 97).
Com Sócrates e sua “arte de parturejar os espíritos” (GRESSON, 1956, p. 83), vemos a 
dialética empenhada em “gerar essa verdade que cada um possui em potencial” (ARENDT, 
1993, p. 97). Para Sócrates, não se tratava de, na cidade, engendrar o poder de um sobre 
os outros, mas de “tornar a cidade mais verdadeira fazendo com que cada cidadão desse 
à luz suas verdades” (Idem). Não é intenção do dialético ter o poder ou “dizer verdades 
filosóficas,” mas tornar a todos “mais verdadeiros” (Idem) O método para isso era “a 
dialegesthai, discutir até o fim” para “revelar a doxa em sua verdade” (idem, p. 97), sem 
que fosse, necessariamente, preciso chegar a essa verdade. Na perspectiva socrática, “ter 
discutido alguma coisa até o fim, ter falado sobre alguma coisa, sobre a doxa de um cidadão, 
isso já parecia um resultado suficiente.”(Idem, p. 98). 
61
unidade 2
Vemos, portanto, a dialética como um tipo de diálogo mais comum entre amigos, que - 
como escreve Arendt (1993) - ao “falarem sobre o que têm em comum entre si, isso se 
torna muito mais comum entre eles. Não só o assunto ganha sua articulação específica, 
mas desenvolve-se, expande-se e finalmente, no decorrer do tempo e da vida, começa a 
constituir um pequeno mundo particular, que é compartilhado na amizade” (p. 98).
Ao invés, portanto, do poder de um sobre os outros, a dialética fomenta a amizade entre um 
e outro. E a amizade, como explica Arendt (1993), referindo-se a Aristóteles, faz com “que 
os amigos se tornem [...] parceiros iguais em um mundo comum” (p. 99). Nesse sentido, o 
que alcançamos com ela “é justamente a comunidade” (p. 99), uma comunidade fundada 
no diálogo, na qual não se busca impor a própria opinião sobre aquelas dos demais, mas 
procura-se “compreender a verdade inerente à opinião do outro” (p.99), ver o mundo “do 
ponto de vista do outro” (p. 99). Nesse “mundo comum, construído sobre a compreensão 
da amizade”, o governo, o controle ou o poder de um sobre os outros não tem nenhuma 
razão de ser, é desnecessário (p. 100).
2.3.3 Retórica e Dialética em sala de aula: quadro comparativo
Na Retórica
• A doxa ou a opinião do outro (do 
aluno) não é considerada.
• Tem-se a fala de um (o professor) 
para muitos (os alunos), visando à 
persuasão, isto é, fazer com que os 
outros acreditem na opinião de um, 
permitindo-lhe impô-la a eles.
• Engendra o poder de um sobre os 
outros.
• Serve-se do discurso para alcançar o poder.
• Engendra-se um Dualismo, no qual 
uma fala se põe como verdadeira e as 
outras são falsas.
• Institui um centro do discurso 
supostamente verdadeiro. 
Na Dialética 
• Considera-se a doxa ou a opinião do 
outro.
• É a fala de um com o outro e visa à 
descoberta da verdade presente na 
opinião tanto de um quanto na do 
outro.
• Cria a amizade de um com o outro.
• Serve-se do discurso para buscar o 
conhecimento.
• Todas as falas podem ser parcialmente verdadeiras.
• A fonte do discurso verdadeiro não 
está centrada em um único indivíduo.
62
• Doutrina-se, à medida que se puxa 
o aluno para dentro do discurso 
(docente) supostamente verdadeiro. 
• Educa-se à medida que conduz o aluno 
ao encontro de si mesmo e dos outros.
 CINE
Para identificar e discutir as características da Retórica, assista ao filme
•	 OBRIGADO POR FUMAR
- Ficha Técnica: Direção: Jason Reitman. País: EUA. Gênero: Comédia. Lançamento: 
2006. Duração: 92 minutos.
- Sinopse:-O porta-voz das grandes empresas do tabaco manipula informações para 
minimizar o risco do uso de cigarros. Porém o interesse de seu próprio filho em seu 
trabalho faz com que ele repense o que faz. Disponível em <www.adorocinema.
com>. Acesso em: 31 de/agosto de 2011.
Explicitadas, em seus principais pontos, as diferenças entre a retórica e a dialética, resta-
nos agora voltar à questão inicial, motivadora deste texto, qual seja; onde situar, entre 
a retórica e a dialética, a fala do professor em sala de aula? A resposta parece ser óbvia. 
Do lado da Dialética, diríamos, o que nos permitiria mudar essa cena tão comum nas 
escolas, na qual temos dezenas de alunos ouvindo e copiando conteúdos que, concebidos 
como “verdades absolutas” ou “saberes já feitos”, vão sendo “torrencialmente lançados da 
cátedra” (TRIGUEIRO, 1968, p. 230) pelo professor, sem se preocupar em articulá-los com o logos do aluno, sem que seja necessária sua participação ativa, pois o ritmo, a sequência e 
a complexidade dos conteúdos, enfim, tudo é determinado pela retórica docente, cabendo 
ao aluno a tarefa de armazenar, tanto quanto possível, os conhecimentos que lhe são 
transmitidos e que depois serão cobrados na prova.
Nessa perspectiva, mesmo que o professor fale bem e tenha um bom conteúdo, ao ceder à 
retórica, seu canto de sereia se institui como um “esforço unilateral” que é mais verbosidade, 
tagarelice estilizada do que propriamente um verbo, demonstrando, com isso, apenas que 
não há confiança na criatividade do estudante (TRIGUEIRO, 1968, p. 230). Como adverte 
Alain (1978), “ninguém se instrui escutando” (p. 103), ninguém aprende a escrever e a 
pensar ouvindo alguém “que fala e pensa bem. É preciso tentar, fazer, refazer, até que o 
ofício entre, como se diz” (p. 91). O conhecimento acontece através da relação do educando 
cine
63
unidade 2
com o objeto e não pela ação do professor. É no diálogo com o pensamento, com a cultura 
presente nas obras, nas práticas sociais que o aluno aprende, sendo o papel do professor 
mais o de um mediador que o de um transmissor ou repassador do conhecimento (CHAUÍ, 
1980).
Entretanto, optar pela dialética não significa que o professor tenha que deixar de falar 
em sala de aula, mas que faça de sua fala uma fala dialógica, isto é, aberta ao logos do 
aluno um logos menos rico que o do professor, um logos ainda imaturo; contudo, “não uma 
imaturidade tábula rasa, mas uma imaturidade abertura” (TRIGUEIRO, 1968). Trata-se, 
assim, de atribuir ao aluno o direito de se colocar no diálogo, ultrapassandoesse modelo 
de comunicação entre professor e aluno tão comum em nossas salas de aula: esse que 
se produz entre “o rico e o pobre, o ato e a potência, o informado e o desinformado” 
(Idem, p. 226); enfim, entre o professor que, supostamente, sabe, por isso, fala e ensina e 
o aluno que não sabe; por isso, deve se calar e aprender.
O erro dessa visão costumeira, segundo Trigueiro (1968), está em não concedermos que 
o aluno tenha seu logos e que, primeiro, é só a partir deste que ele pode engrenar uma 
“comunicação verdadeira com o logos do mestre”; e, segundo, que “o logos do aluno é 
válido por si mesmo, não por simples complacência, demagógica ou paternalística” por 
parte do professor (p. 226). Acompanhando ainda as reflexões do professor Trigueiro 
(1968), o que é necessário encontrar é “o modo de captar o logos: do aluno pelo professor, e 
deste por aquele”(p. 226). Assim, dialeticamente, estaremos fazendo da aula uma conversa 
entre dois logos. No trânsito de um ao outro, “o tempo de germinação: um propõe, o outro 
acolhe, e, ao devolver o que lhe foi proposto, a resposta será a recusa, pela proposição de 
outro verbo, ou a adesão, na qual o verbo de quem recebeu se integra – enriquecendo-o – no 
verbo de quem deu.” (TRIGUEIRO, 1968, p. 230).
Mas, se o que se propõe aqui é o abandono do monólogo retórico em prol do diálogo 
ou da conversatio dialética, esta também não está isenta de todo risco. É preciso que 
nos perguntemos: qual seria o verbo veiculado nessa conversa entre dois logos? O risco 
que corremos é o de fazer da conversatio um espaço em que transita um assunto que 
não acrescenta em nada a capacidade (do professor e do aluno) de compreensão, de 
discernimento da realidade em que se encontram. Transitar da retórica para a dialética, do 
monólogo persuasivo ao diálogo não implica fazer da aula um espaço para a verborragia: 
muitas palavras, mas pouca substância. 
64
Como afirma Paulo Freire em seus diálogos com Ira Shor, “uma experiência dialógica que 
não se baseia na seriedade e na competência é muito pior do que uma experiência ‘bancária’, 
em que o professor simplesmente transfere conhecimento” (FREIRE E SHOR, 2001, p.101). 
Fazer da aula um lugar para o “papo furado” entre professor e aluno é, como identificam os 
educadores citados acima, dar aos alunos testemunho “de irresponsabilidade intelectual”, 
passar-lhes a impressão de que “aprender é uma coisa impulsiva e desorganizada [...], 
que o conhecimento é uma coisa que acontece [...] por acaso” (Idem), quando não se trata, 
absolutamente, disto. O conhecimento exige disciplina e só tem sentido se nos serve de 
instrumento para a compreensão ou transformação da realidade (MORIN, 2000). Desse 
modo, a tarefa do professor na perspectiva dialética é a de, com zelo e rigor, ajudar o 
aluno a tomar consciência das necessidades postas por sua realidade, colaborando na 
articulação delas com o objeto de conhecimento trabalhado por eles (professor e alunos). 
Vemos, portanto, que a opção pela dialética também envolve seus riscos. Contudo, ainda 
assim, do ponto de vista de um logos docente que vise ao saber e não ao poder, são maiores 
as razões para situar a fala do professor em sala de aula do lado da dialética que da retórica. 
Mas como a filosofia é essa mania quase obsessiva de criar problemas onde nada parece 
problemático ou de colocar questões onde nada parece questionável (THÉVENAZ, 1966), 
a pergunta final que pretendemos refletir, à guisa de conclusão, é a seguinte: é realmente 
possível para o professor abster-se completamente da retórica em sala de aula? 
 SAIBA MAIS...
Sobre dialética, educação e sala de aula em:
LIMA, Paulo Gomes. Transversalidade e docência universitária: por uma recorrência 
dialética do ensinar-aprender. Educação - Revista do Centro de Educação, Santa 
Maria, s.n, v.33, n.3, p. 457-468, set./dez. 2008.
VASCONCELLOS, Celso dos S. Metodologia dialética em sala de aula. 
Revista de Educação AEC, Brasília, s.n, n.83, p. 28-55, abr./jun. 1992. 
VASCONCELLOS, Celso dos S. A questão da disciplina: dialética da interação 
professor-aluno. Revista de Educação AEC, Brasília: s.n, n.87, p. 82-87, abr./jun. 
1993. 
2.3.4 Considerações finais
Nossa realidade como professor não é novidade. Contando, quase todo tempo, apenas, 
65
unidade 2
como se diz, “com o cuspe e o giz”, deparamo-nos com salas de aula lotadas de alunos que 
nem sempre têm tempo, ânimo ou hábito de ler, nem sempre estão interessados pelo que 
se estuda na escola, nem sempre têm dinheiro para adquirir o livro ou o xerox do texto que 
o professor precisa para suas aulas. Nessa realidade, será que podemos, nós professores, 
realmente passar sem a retórica? Talvez seja preciso admitir que, para ensinar, temos 
necessidade da retórica.
Quantas vezes temos que, apenas com a fala, despertar a atenção do aluno, sustentar 
seu interesse, ilustrar aquilo que falamos, criar imagens e argumentos que facilitam sua 
compreensão. Quantas vezes precisamos convencer os alunos da importância do que 
ensinamos, persuadi-los a encontrarem o que pretendemos que aprendam. E toda esta 
prática docente não é da ordem da retórica? Todo professor sabe que, em sala de aula, 
muitas vezes, “para ser crível, não basta a um discurso que seja verdadeiro, que seja claro 
para ser compreendido, é preciso toda uma técnica para que ele seja escutado, assimilado 
e retido.” (REBOUL, 1998, p.110-111). E essa técnica docente para dissuadir, estimular e 
levar o aluno a ler, a estudar e a compreender o que propomos, mesmo que o professor 
não tenha consciência dela, é, em grande parte, de ordem retórica.
Vemos, portanto, que não é tão fácil prescindir da retórica em sala de aula. Contudo, é 
possível amenizá-la, tomando consciência do uso que se faz dela, conduzindo os alunos 
à compreensão de sua utilidade no ensino e dos quadros conceituais que lhes permitam 
identificá-la e dominá-la, ao invés de, sem se darem conta, a ela se submeterem. Entre a 
retórica e a dialética, onde situar a fala do professor? Concluindo, provisoriamente, este 
texto que pretende ser apenas uma introdução e um convite à reflexão desse assunto, a 
resposta mais razoável talvez seja entre elas, oscilando entre elas, servindo-se da retórica 
para abrir espaço para a dialética.
No ensino massificado, com condições sofríveis tanto para o trabalho do professor quanto 
para o estudo do aluno, a dialética não é caminho fácil; mas, se quisermos ir além das 
imagens opostas, mas irmãs, do professor como operário da reprodução ou “Peregrino 
da Revolução” que, “sem discutir a ‘verdade’”, busca simplesmente colocá-la “dentro 
do maior número possível de cabeças” (FREIRE E SHOR, 2001, p. 108), a dialética é o 
caminho necessário. Nessa perspectiva, aprendemos (professores e alunos) a fazer da 
sala de aula um espaço para dialogarmos sobre nossa experiência, para construirmos ou 
reconstruirmos nossos saberes sobre ela, iluminando-a e orientando nossa ação, seja para 
confirmá-la, seja para transformá-la.
66
 ATIVIDADE
Use a seguinte chave para responder as questões de 1 a 3:
( A ) se somente as afirmações I e II forem verdadeiras.
( B ) se somente as afirmações I e III forem verdadeiras.
( C ) se somente as afirmações II e III forem verdadeiras.
( D ) se somente as afirmações II e IV forem verdadeiras.
( E ) se somente as afirmações I, II e IV forem verdadeiras.
( F ) se somente as afirmações I, III e IV forem verdadeiras.
( G ) se todas as afirmações forem verdadeiras.
1- ( )
I. Na retórica, a fonte do discurso verdadeiro é um diálogo entre dois indivíduos.
II. O professor em sala de aula, muitas vezes, precisa utilizar a retórica para 
convencer os alunos da importância do que ensina e persuadi-los a encontrarem o 
que pretende que aprendam.
III. A retórica se impôs sobre Atenas com os Sofistas, que ensinavam que não há 
verdade em si, que existe apenas opiniões variando com os indivíduos ou com as 
cidades; e a melhor opiniãoé aquela que assegura o êxito.
IV. Arendt identifica a retórica como a forma de falar especificamente filosófica.
2- ( )
I. Optar pela dialética não significa que o professor tenha que deixar de falar 
em sala de aula, mas que faça de sua fala uma fala dialógica, isto é, aberta ao logos 
do aluno.
II. O problema moral que a retórica põe não é aquele do poder, mas o da mentira.
III. Na doxa, expressamos nossa compreensão do mundo tal como ele se mostra 
para nós.
IV. Quando emitimos nossa opinião (doxa) sem querer que ela seja a de todos, 
estamos sendo retóricos.
3- ( )
I. Com Sócrates e sua “arte de parturejar os espíritos” vemos a dialética 
empenhada em gerar a verdade que cada um possui em potencial.
II. Não é intenção do dialético ter o poder e dizer verdades filosóficas, mas tornar 
todos mais verdadeiros e amigos.
III. Para Arendt, a retórica não deixa de ser um tipo de violência, que surge quando 
se pretende impor a própria opinião como alguma coisa de absoluto e válida para 
todos, quando se busca colocar o próprio ponto de vista sobre o mundo como se 
fosse a visão completa do mundo.
IV. A dialética é um tipo de diálogo mais comum entre amigos, em que cada um 
procura compreender a verdade inerente à opinião do outro.
67
A FILOSOFIA NA PERSPECTIVA DOS PROBLEMAS DA 
EDUCAÇÃO
Objetivos
•	 Expor a filosofia de Michel Serres dando uma visão panorâmica de sua obra.
•	 Conceituar concepção de educação como mestiçagem na filosofia de Serres.
•	 Explicitar a relação entre exposição e mestiçagem. 
•	 Esclarecer a necessidade do desprendimento para que haja exposição. 
unidade 3
69
unidade 3
3.1 A Educação como Mestiçagem em Michel Serres
“Ama o outro que engendra em ti o espírito.”
Michel Serres (1993a, p. 62)
“Sem terra nem tribo, vemo-nos como
 cidadãos do mundo e irmãos dos homens.”
Michel Serres (2005, p. 192)
3.1.1 Introdução 
O texto que utilizamos para desenvolver esta unidade foi publicado como capítulo de 
livro, em coautoria com Maria E. E. Santos, ex-bolsista de Iniciação Científica do curso de 
Pedagogia da UFSJ. Para referência completa, verifique Oliveira e Santos (2007). Feito esse 
esclarecimento, passemos ao texto.
Michel Serres é uma das figuras mais instigantes da vida intelectual contemporânea. 
Contudo, ainda é pouco conhecido no meio acadêmico brasileiro. Por isso, antes de 
passarmos para a exposição e o detalhamento do objetivo específico deste trabalho, 
faremos uma pequena apresentação da vida e da obra deste pensador.
O filósofo descende de uma família de camponeses e marinheiros. Nasceu em Agen, 
sudoeste da França, em 1930. Começou seus estudos superiores na Escola Naval Francesa, 
onde cursou matemática, entre os anos de 1949 e 1951. Depois, entrou na Escola Normal 
Superior, de Paris, concluindo, em 1955, o curso de Filosofia. Alistou-se, em seguida, na 
marinha francesa e viajou pelo mundo até 1958. De volta à academia, defendeu, em 1968, 
sua tese de doutorado sobre Leibniz, filósofo e matemático alemão. Neste mesmo ano, 
participou com Michel Foucault da criação da Universidade de Vincennes. Foi indicado, 
logo após, para lecionar História das Ciências no Departamento de História da Sorbonne. 
Desde 1984, leciona também em Stanford, nos EUA.
 SAIBA MAIS...
Para mais informações e esclarecimentos sobre a vida e a obra de Michel Serres, 
a melhor referência é o livro Eclaircissements (SERRES, 1994), um conjunto de 
cinco entrevistas do filósofo com o amigo e ex-aluno Bruno Latour. Este livro foi 
traduzido no Brasil por Luiz Paulo Rouanet, com o título Luzes, lançado pela editora 
Unimarco de São Paulo (SERRES, 1999).
70
Autor de uma vasta obra (são mais de 50 livros até 2010), difícil de classificar dentro das 
correntes do pensamento ocidental, Serres compõe, em passadas largas, uma filosofia 
original e sedutora. Ao percorrer os confins dos grandes domínios do pensamento (ciências 
exatas e humanas, literatura, artes e religiões), o filósofo “sonha com uma reconciliação 
dos diversos ramos do saber, longe dos dogmas e dos imperialismos teóricos.” (SERRES, 
1990a, p. 178). 
Inimigo do espírito de sistema e partidário de um novo enciclopedismo, publicou seu 
primeiro livro em 1968. Deu continuidade à sua obra com uma série de cinco livros, 
escritos entre 1969 e 1980, que têm como título geral Hermes. Nesses livros, o filósofo 
desenvolve as múltiplas facetas de sua reflexão sobre as ciências e sua influência sobre a 
literatura e as artes, temas que ainda desenvolve em vários ensaios até 1987. 
Um novo período na filosofia de Serres se inicia com Statues (1987), meditação sobre a 
morte e a ausência de comunicação entre os homens. A partir desta obra, a comunicação 
passa, cada vez mais, a ocupar sua reflexão. Nesse sentido, após Statues, o filósofo escreve 
Le contrat naturel (1990b), que faz apelo a uma relação contratual ou simbiótica do homem 
com a natureza; Le tiers-instruit (1991), que trata da educação e da célebre mestiçagem 
cultural; La légende des anges (1993b), que propõe uma compreensão filosófica para a 
evolução das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) e seu impacto nas relações 
dos homens entre si e com o conhecimento; Hominescence (2001), no qual o filósofo procura 
refletir como o homem se inventa e se transforma com o progresso das biotecnologias e 
das TIC; e L’incandescent (2003), que propõe a refundação do humanismo e a consolidação 
da paz através da ruptura da fronteira entre natureza e cultura.
O estudo que aqui apresentamos se situa na fase da filosofia de Serres aberta com Statues 
(1987). Dentro dessa fase, especificamente no Le tiers-instruit, livro em que Serres 
condensa sua reflexão sobre a educação. Reconhecido pelos críticos franceses como 
pequena obra-prima, garantiu ao filósofo, logo após sua publicação em 1991, a eleição 
para a Academia Francesa. Em 1993, foi traduzido no Brasil com o título Filosofia Mestiça. 
É a partir dele que abordamos o sentido da educação em Serres.O livro Filosofia Mestiça (1993a) está organizado em três partes: Criar, Instruir e Educar, 
precedidas por um prólogo intitulado Laicidade, no qual Serres apresenta-nos Arlequim. 
Com este personagem da commedia dell’arte, o filósofo nos faz refletir sobre a educação 
não através de conceitos, mas, sobretudo, através dessa figura que erra ou vagueia pelas 
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unidade 3
paisagens do mundo, que é capaz de vibrar entre a pessoa e o símbolo, que alia o singular 
ao Universal, um personagem que, portanto, muito mais que um conceito abstrato, possui 
as singularidades capazes de encarnar o ideal pedagógico de mestiçagem proposto 
em Filosofia Mestiça. Nos demais capítulos do livro, o filósofo descreve com precisão e 
originalidade o processo de formação de um aprendiz, que tem sua educação pautada na 
concepção da pluralidade do mundo e das coisas e na tolerância à alteridade.
Para Serres, toda educação consiste numa exposição e numa mestiçagem. Exposição, que 
implica desprender-se de uma posição ou de um lugar no qual nos mantemos ou que nos 
aprisiona e ir ao encontro dos outros e do mundo; mestiçagem, que implica dilatar-se, 
dividir-se, tornar-se vários através desses encontros. Assim, para Serres, quanto mais 
exposto mais nos mestiçamos, e quanto mais mestiços, mais educados nos tornamos. 
O sentido da educação configura-se, assim, sempre como um movimento de exposição 
e de mestiçagem. Esta é a principal ideia que tematizamos neste trabalho. Para melhor 
compreender o sentido desse ideal pedagógico, primeiramente apresentamos a história, 
contada por Serres, da figura que o incorpora, Arlequim. Em seguida, procuramos ver, em 
linhas gerais, o que essa história nos ensina sobre a filosofia de Serres. Daí por diante, 
centramo-nos, mais especificamente, na questão da educação, propondo a reflexão 
da relação entre exposição e mestiçagem e, por fim, explicitando a necessidade do 
desprendimento para que haja exposição. 
 SAIBA MAIS...
Sobreas relações da filosofia de Serres com a Educação:
CALLONI, Humberto. Paulo Freire e Michel Serres: aproximações na perspectiva 
interdisciplinar num diálogo a múltiplas vozes. (Tese de doutorado). Rio Grande do 
Sul: UFRGS, 2002. (Mimeo)
SANTOS, Maria Emanuela Esteves dos. Michel Serres: a possível nova hominescência 
e os desafios para a educação do homem contemporâneo. São Paulo: Unicamp, 
2010. Dissertação (Mestrado em Educação). 
PEREIRA, Wani Fernandes Pereira. Por uma pedagogia da complexidade: 
cartografia das ideias de Clarival. (Tese de doutorado). Rio Grande do Norte: 
UFRGN, 1999.
72
3.1.2 A História de Arlequim, Imperador da Lua.
Serres nos conta que Arlequim, Imperador da Lua, chega de sua viagem de inspeção às 
terras da Lua e aparece no palco, diante de seus súditos, para responder às perguntas 
deles. A plateia, ansiosa, está “na expectativa de grandes extravagâncias”. Todos esperam 
ouvir o rei falar das maravilhas que viu, “atravessando lugares extraordinários”. Mas, 
contrariando a expectativa geral, Arlequim anuncia apenas que não há novidade alguma 
para contar, que em toda parte tudo era como ali onde estavam, tudo igual ao que estavam 
acostumados a ver. Decepcionados, os ouvintes relutam em acreditar no rei e insistem: “Lá 
fora, obviamente, tem que ser diferente! Será que Arlequim não conseguiu observar nada 
durante a viagem?” (SERRES, 1993a, p. 1). 
Mudos, estupefatos, todos começam a se agitar, enquanto Arlequim, arrogante e 
desdenhoso, desafia a plateia repetindo doutamente sua lição: nada de novo sob o Sol, 
nada de novo na Lua. Mas é neste momento que Serres faz intervir na cena o que qualifica 
como “algum belo e maldoso espírito”, que se levanta no meio da plateia e, apontando o 
casaco de Arlequim, grita: “Hei! [...] você aí, que diz que tudo em toda parte é como aqui, 
quer que a gente acredite também que sua capa é feita de uma mesma peça, tanto na 
frente como na traseira?” (Idem, p. 1).
 O rei, que proclamava ser o mundo um espaço homogêneo e sem novidades, diante de sua 
própria roupa, é pego em contradição. A roupa de Arlequim dá a ver o contrário do que 
anunciam suas palavras. E como é a roupa de Arlequim? Serres assim a descreve:
Composição descombinada, feita de pedaços, de trapos de todos os 
tamanhos, mil formas e cores variadas, de idades diversas, de proveniências 
diferentes, mal alinhavados, justapostos sem harmonia, sem nenhuma 
atenção às combinações, remendados segundo as circunstâncias, à medida 
das necessidades, dos acidentes e das contingências (Idem, p. 2).
 Será que a roupa do Rei - indaga Serres - “mostra uma espécie de mappa-múndi, o mapa das 
viagens do artista, como uma mala constelada de marcas?”. E prossegue Serres como quem 
reflete com a plateia de Arlequim: “O lá-fora, então, nunca é como aqui. Nenhuma peça se 
parece com a outra, nenhuma província jamais pode ser comparada com tal outra, e todas as 
culturas diferem. A pelerine-portulano desmente o que pretende o Rei da Lua” (Idem, p. 2).
 Para além das palavras de Arlequim, que vitrificam o mundo e dão dele uma imagem 
homogênea e sem novidades, monótona como as paisagens lunares, sobressai a roupa 
do Rei, que, mais que suas palavras, revela a verdadeira paisagem de suas viagens. Uma 
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unidade 3
paisagem “inesperada em todo canto, miserável, gloriosa, magnífica de cortar o fôlego e de 
fazer o coração bater”. Diante da palavra “poderosa e banal”, que “reina, monótona, e vitrifica 
o espaço; soberbo de miséria, - comenta Serres - o traje, improvável, deslumbra”. Então, 
novamente, “o belo espírito pérfido”, do meio da sala, questiona Arlequim: “Tu te vestes como 
o roteiro de tuas viagens?” A plateia cai no riso diante do rei envergonhado com a pergunta 
que o apanha. (Idem, p. 2).
 Arlequim, que não é bobo, prossegue Serres, “logo advinha a única saída para o ridículo da 
situação: basta tirar o casaco que o desmente.” Serres descreve a cena da seguinte forma: 
primeiro, o rei “se levanta, hesitante, olha boquiaberto os panos de seu traje; em seguida, com 
ar de bobo, olha para o público e de novo para seu casaco, como que tomado de vergonha. A 
plateia ri, um pouco abobalhada. Ele demora, se faz esperar”; mas, enfim, decide-se e retira o 
casaco. (Idem, p. 3).
Ao se despir, o rei aparece nu? Debaixo do casaco de Arlequim, o que aparece? Outro casaco, 
idêntico ao primeiro, e, debaixo deste segundo, um outro e mais outro, até que, despido 
de todos os seus casacos, o Rei, finalmente, aparece nu. Contudo, a nudez do rei desfaz a 
contradição que o levou a se despir? O corpo do rei, livre das vestes multifacetadas que 
se opunham à mesmice do mundo que defendia suas palavras, iria colocá-lo em coerência 
com o que dizia? Vejamos como Serres nos descreve a nudez real:
Estupor! Tatuado, o Imperador da Lua exibe uma pele multicor, muito 
mais cor do que pele. Todo corpo parece uma impressão digital. Como um 
quadro sobre uma tapeçaria, a tatuagem - estriada, matizada, recamada, 
tigrada, adamascada, mourisca - é um obstáculo para o olhar, tanto quanto 
os trajes ou os casacos que jazem no chão. [...] Até mesmo a pele de Arlequim 
desmente a unidade pretendida por suas palavras. Também ela é um casaco 
de arlequim (Idem, p. 3).
 Como fazer para livrar-se da contradição? O mundo dito, pelas palavras de Arlequim é um; o mundo visto pela plateia, no próprio corpo do rei, é outro. Há ainda uma última saída, que 
Arlequim se esfole; que arranque a própria pele. Mas, pondera Serres, “pode-se pedir a 
alguém para arrancar a própria pele?” (Idem, p. 4).
 Diante do rei nu, brutalmente, seus espectadores, mudos, “acabam por descobrir todo 
o mistério”. Não apenas a pele de Arlequim é como seu casaco, como ainda “Arlequim é 
hermafrodita, corpo mesclado, macho e mulher [...] homem perdido na fêmea, mulher 
mesclada no macho.” E mais: a plateia já havia percebido, enquanto ele se despia, que 
Arlequim se servia das duas mãos, que era um “canhoto completado”, pois, ao tirar suas 
capas, elas rodopiavam para os dois lados. (Idem , p. 4).
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 A nudez do rei, sua pele e seu corpo à mostra revelam, sobretudo, sua mestiçagem: “mulato, 
temperado, híbrido em geral”. E agora pergunta Serres, “que nos poderia exibir [...] o monstro 
comum, tatuado, ambidestro, hermafrodita e mestiço sob a própria pele?” Seu sangue e sua 
carne. Mas, ainda assim, continua Serres, o que a carne designa é, “precisamente, [...] a mistura 
de músculos e de sangue, de pele e de pêlos, de ossos, de nervos e de funções diversas”. A 
carne e o sangue se confundem também com o casaco de Arlequim. A contradição da realeza 
persiste. E vários espectadores já perderam a paciência e abandonaram, decepcionados, a 
sala. Ora, vieram ali para rir e agora eram obrigados a pensar. Contudo, finalizando a história, 
Serres escreve: 
Quando todos já estavam virando costas, [...] e sentia-se que naquela noite 
a improvisação terminaria em fiasco, alguém lançou um súbito apelo, 
como se algo de novo estivesse acontecendo num lugar onde tudo, até 
então, se repetira. O público inteiro se voltou de um só golpe e todos os 
olhares convergiram para o palco, dramaticamente iluminado pelos últimos 
focos moribundos dos projetores [...]. No lugar exato do Imperador da Lua 
erguia-se agora uma massa ofuscante, incandescente, mais clara que pálida, 
mais transparente que diáfana, lilácea, nevada, cândida, pura virginal, 
inteiramente branca (Idem, p. 5-6).
 Arlequim havia-se transformado em Pierrô. “Pierrô ! Pierrô ! - gritavam os tolos, quando 
a cortina se fechou”. E, assim, todos saíram se perguntando: “- Como as mil cores do casaco 
podem se dissolver numa soma branca?” (Idem, p. 6). Fim da história. 
3.1.3 A História de Arlequim e a Filosofia Mestiça da Educação em Michel Serres
O que podemos aprender com essa história sobre a filosofia de Serres e, mais 
especificamente, de sua filosofia da educação? Em linhas gerais, a contradição que 
identificamosna narrativa entre o mundo dito, no discurso de Arlequim, e o mundo visto, 
através de seu casaco e corpo, aponta para uma relação crítica, constante nos livros de 
Serres, entre a complexidade do mundo (o casaco e o corpo de Arlequim) e as simplificações 
absurdas das ideologias (o discurso do Rei Lunático).
Para Serres, o discurso de Arlequim, tal como as ideologias, se parece com a Lua: o claro 
e o escuro, sem nuanças entre eles. Na Terra, se estamos de um lado do muro, enquanto 
a fonte de luz está do outro, ainda assim, podemos vê-lo. Isso porque, devido à atmosfera, 
o raio de luz se parte, se refrata e dá volta no muro. Na Lua, como não há atmosfera, “fica 
absolutamente claro de um lado do muro e absolutamente escuro do outro”. Nas ideologias 
também é assim: ou claro ou escuro. São sempre dualistas, definem o certo e o errado, o 
verdadeiro e o falso, o bem e o mal. Contra o discurso do rei e em prol da complexidade de 
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unidade 3
seu casaco, para Serres não existe “um caso em que as coisas possam se resolver de forma 
tão simples.” Desse modo, se comparamos o conhecimento com a visão, podemos afirmar 
com o filósofo “que não se pode conhecer senão na complexidade da atmosfera terrestre”, na 
infinita possibilidade de nuanças entre o claro e o escuro, o verdadeiro e o falso, o branco e o 
preto. (SERRES, 1990a, p. 181).
No mundo, para Serres, “as verdades são sempre locais, distribuídas pelo espaço de um modo 
um tanto complicado.” O oposto desse pluralismo é exatamente a ideologia, quando afirma 
“que uma única verdade é válida para todo o espaço, que ela é universal”. A diferença aqui está 
entre “um espaço homogêneo, inteiramente ocupado por uma única verdade, e um espaço 
complexo, onde todo trabalho consiste em passar de uma singularidade a outra.” Quando um 
discurso pretende ocupar todo o espaço, para Serres, isso é uma tentativa de “imperialismo”. 
O que, segundo o filósofo, é muito comum nas “multinacionais do pensamento” ou no que se 
chama de “grandes correntes do pensamento”, que, na concepção de Serres, são, na verdade, 
“pequenos pensamentos locais que procuraram conquistar o espaço apresentando-se como 
universais.” (SERRES, 1990a, p. 182-183).
Além da crítica às ideologias, a fábula de Arlequim revela uma outra forte característica 
da filosofia de Serres, aquela pela qual contar histórias, reanimar os mitos é também uma 
maneira de filosofar. “Philomuthos, philosophos pôs. Philosophos, philomuthos pôs” é o 
que lemos, antes mesmo do prólogo, no livro Filosofia mestiça. Serres resgata a ideia do 
filósofo como, de certa maneira, um filomito, um amigo do mito, das narrativas fabulosas, 
como uma maneira de trabalhar conceitos. Mas se, desse ponto, ele aproxima a filosofia 
da literatura, um dos problemas que mais o assedia, de livro a livro (cf., por exemplo, 
SERRES, 1969, 1972, 1974, 1977a-b, 1980a) é, sobretudo, de cunho epistemológico. Trata-
se de pensar como nossos principais saberes se perpetuam hemiplégicos. Ou seja, como 
aconteceu de as ciências humanas ou sociais não falarem jamais do mundo, e as ciências, 
ditas “duras”, deixarem os homens de lado? Esta, fala do mundo com exatidão, mas esquece 
completamente a história e a cultura; aquela, fala do homem de modo imperturbável, mas 
ignora o mundo e suas mudanças (SERRES, 1990a, p. 179). Ambas persistem, assim, no 
que Serres (1993a, p. 10) designa como a “tola patologia da divisão”. 
Logo, o que Serres (1980a) procura, em sua filosofia, é a passagem entre elas, “a passagem 
do noroeste”, diz o filósofo, por analogia com o labirinto de gelo que une o oceano Atlântico 
ao Pacífico no Pólo Norte. Seu objetivo é reunir, através de uma passagem qualquer, as ideias 
científicas mais rigorosas e aquilo que sabemos do ser humano (SERRES, 1990a, p.179). É 
76
a busca de uma “reconciliação dos saberes”, das ciências “duras” e das humanas (Idem), que 
mal toleram uma a outra. Com esse ódio entre irmãs, cada qual continua com um lado de 
seu corpo paralisado, arrastando um lado morto. Fazê-las aprender a caminhar com os dois 
pés, a utilizar as duas mãos, é, para Serres, um dos deveres da filosofia. Daí, Arlequim e seu 
casaco, tecido de misturas, justamente, o que causa horror aos filósofos e cientistas da pureza. 
O casaco é a ideia de cada ciência trabalhando na interseção ou na interferência de várias 
outras. A ambidestria de Arlequim (ele usa as duas mãos para se despir, os casacos rodopiam 
para os dois lados), por sua vez, elogia os corpos completos de canhotos contrariados. Sua 
mestiçaria (Arlequim é mesclado, tigrado, matizado, multicor) convida-nos a abandonar o 
conforto e a segurança do ninho (nossa disciplina, nosso grupo, nossa cultura ou raça) e 
partir, expor-se e, às vezes, perigosamente, ao outro, ao mundo, às coletividades, retendo as 
diversas diferenças vividas durante as viagens, tornando-nos vários, às vezes, incoerentes 
e voltando para casa mestiçados de novos gestos e de novos costumes fundidos em nossas 
atitudes e funções a ponto de acreditarmos que nada mudou para nós (SERRES, 1993a, p. 6). 
Essa é a aprendizagem que Serres pretende para os cientistas: que saiam de seus ninhos, que 
deixem de se combater “para tomar o poder, ocupar o espaço [...], obter medalhas, créditos 
e postos” (SERRES, 1990a, p. 180) e que se mesticem, que completem seus corpo; pois, só 
assim, o “milagre laico da tolerância, da neutralidade indulgente, acolhe, na paz, todas as 
aprendizagens, para delas fazer brotar a liberdade de invenção e, portanto, de pensamento” 
(SERRES, 1993a, p. 6). Finalizando a história, é assim que Arlequim se torna Pierrô, as mil 
cores do casaco se dissolvendo numa soma branca, cor para a qual tendem e da qual provem 
todas as outras, o branco de Pierrô significando, portanto, a possibilidade de criação, após o 
longo processo de instrução ou de mestiçagem.
3.1.4 A Relação entre Exposição e Mestiçagem
3.1.4.1 Mestre é aquele que forma na plenitude de um corpo completo
Sem a travessia para os lados paralisados ou adormecidos de nossos corpos, continuamos 
hemiplégicos. É nesse sentido que, ao iniciar a primeira parte do Filosofia Mestiça, aquela 
referente ao “Criar”, Serres presta homenagem ao mestre anônimo e já falecido que fez 
dele, ainda criança e canhoto de nascença, alguém que aprendeu a escrever com a mão 
direita. Isso não o tornou, na fase adulta, um neurótico ou um perverso, mas fez dele, 
como Arlequim, um “canhoto contrariado”, ou seja, um corpo completado com sua outra 
metade. A este mestre anônimo Serres se declara profundamente grato (SERRES, 1993a, 
p. 9). Vejamos, a seguir, o sentido dessa gratidão.
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unidade 3
O filósofo esclarece, ao aprofundar sua reflexão sobre o próprio corpo, que quando se permite 
aos canhotos e destros permanecerem o que são, faz-se deles corpos hemiplégicos, pois 
passam a ter um lado do corpo paralisado, já que não lhes é necessário aprender o outro. 
Assim, canhoto e destro valem um pelo outro, cada qual arrastando um lado morto. E nessa 
lateralização, um dos lados do corpo é tão bem assinalado, “tão fortemente existente que 
se toma como referência”, esquecendo o outro (Idem, p. 27). Desse modo, destro e canhoto 
vivem num mundo fracionado, cegos “para seu complemento morto” (Idem, p. 24). Nesse 
sentido, se o corpo já se assemelha a uma estátua, “por seu peso dirigido para baixo, com 
essa estátua ele esculpe uma segunda, por sua lateralização para a direita ou a esquerda.” 
(Idem, p. 33). Entretanto, para Serres, não somos um, só canhoto ou destro, mas dois. Daí ser 
o filósofo contra a pena de morte de um dos lados e nos revelar o sentido da homenagem ao mestre, reconhecendo-o como aquele que forma, na plenitude, de corpos reconciliados 
ou completos. Mestre, então, é aquele que contraria, que empurra o canhoto em direção à 
direita e o destro à esquerda, fazendo-os se exporem ao sentido inverso ao seu, levando-os a 
atravessar rumo à outramargem, ao lado adormecido, desconhecido ou paralisado.
3.1.4.2 O Sentido da mudança de sentido
Essa travessia ou mudança de sentido, em Serres, é de grande significado para que a educação 
como mestiçagem se realize. Como afirma o filósofo, “nada confere mais sentido do que a 
mudança de sentido” (Idem, p.11). Mas, para ele, o que significa mudar? Apenas passar para 
a outra margem? Passar de um domínio para o outro? Certamente, na travessia ou mudança 
de sentido, chega-se a um segundo mundo, alcança-se a segunda margem, aquela para 
a qual se dirige. Mas, segundo Serres, é no meio, entre esses dois mundos, entre as duas 
margens, numa terceira margem ou terceiro mundo pelos quais se transita, é aí que se dá a 
mestiçagem, que ocorrem as mudanças. “A verdadeira passagem ocorre no meio”, sentencia 
o filósofo (p. 12). 
E que meio ou terceira margem é esta? Procuremos compreendê-la por uma imagem. Quando 
atravessamos um grande rio a nado, chegamos a um ponto em que não vemos mais o lugar 
do qual nos lançamos ou fomos jogados e não sabemos ainda aonde vamos chegar na outra 
margem. Este ponto, em que as referências desaparecem e nos encontramos sozinhos, é a 
terceira margem. Ela é, no dizer de Serres (1993a, p.12), o “rio branco que corre dentre do 
rio visível”, o “lugar-meio”(Idem, p. 14), “estado de mudança de fase”, lugar de transposição, 
como o meio do dia, “começo e término ao mesmo tempo”, ou como a soleira da passagem, ao 
atravessá-la, se está num outro mundo, “a viagem atinge um estágio”; mas ao mesmo tempo 
não terminou, porque esse lugar mestiço foi incluído. (Idem, p. 16).
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Na aventura da travessia de um rio está contida virtualmente, para Serres, a aprendizagem 
(Idem, p. 20). Ao abandonar a referência segura da margem, ao lançar-se no rio, o aprendiz se 
expõe, isto é, lança-se para fora de sua posição; à medida que nada e avança para o meio do 
rio, perde as referências das margens, encontra-se sozinho. Mas é neste ponto, da perda das 
referências e da solidão, que está pronto para aprender, tudo receber e integrar. (Idem, p. 14). 
Em toda aprendizagem dá-se a passagem pelo lugar mestiço e sua inclusão. Serres o descreve 
também como tendo a forma de estrela, para mostrar que é possibilidade de todos os sentidos. 
O aprendiz, o pensador ou o inventor “não cessa de passar de um lugar mestiço a outro”, 
é “um passante mestiço”: alguém que nunca está posto, pois na posição “está o equilíbrio 
das estátua”; mas também não está oposto, pois a oposição é uma “segunda estabilidade”, 
outra estátua, mas está incessantemente exposto, isto é, posto para fora de seu lugar, posição 
lançada ou arremessada para fora dela mesma (Idem p. 19). Logo, o que o caracteriza é “o não 
lugar” e o “desaprumo”; no primeiro sentido, não está em nenhuma comunidade, pôs-se ou 
foi posto para fora de todas elas, só para, ao mesmo tempo, estar “um pouco, e levemente, em 
todas” (p. 13); no segundo, o desaprumo ou o desequilíbrio é condição para o aprendizado, 
para a busca do conhecimento (p. 19-20). No aprumo equilibrado, rígido e estático da estátua 
bem posta em seu lugar, não há busca do conhecimento e nada se aprende.
3.1.4.3 A Educação conduz para fora
É assim que, em Serres, a educação exige a exposição, isto é, passagem de um dentro em 
que estamos para um fora onde nos expomos. Como estátuas, ao recusarmos a exposição, 
negamos a possibilidade da educação no sentido mais elementar da palavra. Aquele pelo 
qual aprendemos, com a etimologia, que a educação conduz (ducere) para fora (ex). E, 
de fato, Serres nos lembra que a educação da criança começava, antigamente, quando 
o escravo a pegava pela mão e a conduzia para fora de sua casa rumo à escola. Nesse 
trajeto entre dois interiores (um, a casa dos pais, e outro, a escola), no intervalo em que, 
guiada pelo escravo, a criança se encontrava exposta ao mundo e à própria alteridade de 
seu condutor, é aí, nesse exterior, que, para Serres, realmente, começava sua educação. 
A viagem já era “escola em si mesma”, a “emigração” já era “instrução”, de modo que, 
antes mesmo chegar à escola, de ultrapassar seus portais, a primeira pessoa, o “pequeno 
sabichão” já não era mais o mesmo, havia “re-nascido”, se tornado uma “terceira pessoa”, 
através de sua exposição ao mundo, ao tempo, à singularidade de seu condutor, o escravo 
excluído (SERRES, 1993a, p. 60-61). 
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Vemos, assim, que a educação, em Serres (1993a), remete à viagem, abandono da casa, 
partida; saída de um interior para um exterior, de uma posição para a exposição. No exterior, 
lá fora, falta abrigo, ninho ou referência, é o lugar da errância. Contudo, é aí, lugar em que 
estamos expostos, que nos educamos. A exigência da exposição como condição para a 
educação se impõe de tal modo, para Serres, que ninguém se educa se não se expõe, isto é, 
se não se conduz ou se deixa conduzir para fora do lugar ou da posição em que está. 
Antes da viagem da pedagogia, a estátua, portanto, é nossa primeira posição, “um ser-aí 
tranqüilo e estável, núcleo denso que não se mexe” (Idem, p. 38). Mas, por um pequeno e 
despreocupado empurrão do mestre, que nos desequilibra, por uma sedução do caminho, 
que nos extravia, esse ser-aí, a estátua, coloca o ali, expõe-se, pula para fora de sua posição, 
deixa de ser estável, atira-se da margem, abandona a rigidez dos hábitos para experimentar, 
“viaja, vagueia, conhece, observa, inventa, pensa. Não repete mais”, em suma, como conclui 
Serres, zarpa “do ser-aí.” (Idem, p. 38-39). Se antes sou estátua, ser-aí, “indesenraizável 
posição estável”; depois, não “estou mais aí”, “exponho-me: sou essa exposição-aí.” (Idem, p. 
39). 
No horizonte da constante exposição, quem sou eu, então? Ou o que vou me tornando? Para 
Serres, somos exatamente o volume acumulado de nossas exposições, inseridas em nosso 
ser como as tatuagens de Arlequim, mais as diferentes marcas que o “ponto exposto” traz; 
por outras palavras, somos o que éramos antes de nos depormos ou sermos depostos de 
nossa posição mais aquilo que a exposição aporta de novo ou diferente a este ser. É nesta 
distância entre o que eu era e o que a exposição faz de mim, é aí que estou e sou. Para Serres, 
essa “distância cobre [...] um enorme espaço” e é o que ele chama de alma (Idem, p. 39). 
Segundo o filósofo, “Sempre proporcional à exposição. As almas grandes se expõem muito”; 
por isso, ampliam-se e crescem, ao passo que as pusilânimes muito pouco se expõem, por 
isso, não se dilatam, mas atrofiam, definham-se (Idem, p. 39). É assim que a exposição “abre 
no corpo um lugar de mestiçagens, para ser preenchido por outras pessoas”, o aprendiz ou o 
mestiço “se torna gordo” (Idem, p. 41).
Sem essas dilatações, engendradas pela exposição, não há humano. É nas mestiçagens que a 
exposição opera que “o eu se engendra.” (Idem, p. 42). Através delas, no eu, primeira pessoa, 
fechada, estática e estável, os outros constituem uma terceira pessoa, identidade aberta, 
dinâmica e instável. Mas, por isso mesmo, sempre com a possibilidade de se ampliar, dilatar 
e educar-se (Idem, p. 43). “Cada um, sem dúvida, - afirma o filósofo - pelo menos um dia, 
passa por essa dilatação formidável do ser [...]: a possibilidade infinita de aprender.” (Idem, 
80
p. 44). Assim, se antes de nosso nascimento fomos criados na mistura dos genes de nossos 
pais, uma vez nascidos, nossa criação só evolui através de novos cruzamentos. Daí o sentido 
das palavras de Serres (1993a, p. 61), quanto à pedagogia. Para ele, 
[...] toda pedagogia recomeça o engendramento e o nascimento de uma 
criança: canhoto nato, aprende a se servir da mão direita, permanece 
canhoto, renasce destro, na confluência dos dois sentidos; nascido 
[...] francês, viaja e se faz espanhol, italiano, inglês ou alemão; esposa 
e aprende a cultura deles, sua língua, ei-lo mestiço de quarta ou oitava 
geração, alma e corpo mesclados. Seu espírito se assemelha ao casaco 
furta-cor de Arlequim.(p. 61).
3.1.5 O Desprendimento: condição necessária para a exposição
Explicitada a necessidade da exposição para que a educação se concretize como 
mestiçagem, precisamos elucidar agora a relação entre exposição e desprendimento. Trata-
se de mostrar como esse é condição de possibilidade para aquela. Sem o desprendimento 
não há exposição. Nessa etapa do texto, portanto, recorremos especialmente a dois livros 
de Serres: Le parasite (1980b) e Détachement (SERRES, 1983). O primeiro nos ajudará a 
pensar a situação de apego ou dependência à posição ou ao lugar que nos dá alimento, 
proteção e calor. Pelo segundo, veremos através dos excluídos, mestiços e errantes a 
importância do desprendimento para que a mestiçagem aconteça. Essa obra está dividida 
em quatro partes intituladas Camponês, Marinheiro, Errante, Franciscano. Utilizamos as 
três últimas. 
3.1.5.1 Desprendimento: perdas e ganhos
A mestiçagem, como veremos, exige o desprendimento. Mas esta não é uma exigência fácil 
de ser atendida. Em nosso abrigo, estamos protegidos, aquecidos e alimentados. Então, por 
que abandoná-lo? Nele, conhecemos o espaço e seu funcionamento, temos nossos aliados, 
cultivamos nossos hábitos, falamos uma língua comum, unimo-nos para nos defender ou 
para atacar o inimigo. Enfim, não estamos em perigo, porque muito pouco nos expomos. 
Em contrapartida, nada de novo aprendemos ou inventamos (SERRES, 1993a). Criamos 
nossos pertencimentos, formamos nossos grupos de pressão, nos quais estabelecemos 
hierarquias, comparações, partilhamos prestígio e poder. Com isso, acomodados no grupo, 
seja ele igreja, partido político, disciplina etc, de modo quase imperceptível, tal como nas 
ordens religiosas, fazemos os votos de pobreza, obediência e castidade ao grupo ou ao seu 
papa. Pobreza, nada produzir. Obediência, sempre repetir. Castidade, abster-se de relações 
fora do grupo. Assim, como afirma Serres (1994, p. 35), atados pela “libido da pertença”, 
81
unidade 3
permanecemos aquecidos e protegidos sob as asas destas pequenas coletividades “da 
anestesia intelectual” (SERRES, 1997, p. 29).
Desprender-se desses interiores, certamente, não é fácil, requer coragem para enfrentar 
o exterior, sem calor, alimento ou proteção, enfrentar a solidão que tal desprendimento 
engendra. Mas há também positivo nesse desprender-se. Ele retira “as obrigações do 
pensamento corporativo, alivia a pressão dos pares” e, diante dos problemas, faz-nos 
ganhar tempo, justamente pela economia que fazemos dele, não mais perdendo-o nos 
“conflitos monótonos” e sem outro motivo senão manter ou adquirir status dentro do 
grupo e armar-se contra as outras pertinências. (SERRES, 1997, p. 33-34). Para Serres 
(1983), sair desses espaços fechados “custa quase a vida, a credibilidade”, contudo, “não 
sair daí custará o mundo” (p. 172), pois é exatamente ele que se perde quando o que se 
busca é a glória, a fortuna, a dominação. O “soldado do saber” (Idem, p. 87) só tem ciência 
da batalha, de frente para seus adversários, está sempre de costas para o mundo, para a 
árvore do conhecimento e da vida. Apegado à “sua progressão no grupo, sua pequena 
potência ou sua glória medíocre” (Idem, p.118), ele deixa a árvore do conhecimento secar. 
Se quiser conhecer, desprenda-se, desfaça os elos que o prendem ao grupo, abandone o 
corporativismo caseiro pela errância no mundo, em direção aos outros e às coisas. Assim, 
dirá Serres (1983), sua educação se reinicia.
Sem o rompimento com a condição de apego ao ninho, que nos acompanha mesmo antes 
do nascimento, a educação não se inicia. E, de fato, se ela nos empurra para fora (ex ducere), 
então ela começa com nosso próprio nascimento, quando, alimentados pelo sangue de 
nossa mãe, habitamos seu ventre como nossa primeira morada, nosso primeiro ninho. 
Assim como nossos pais bíblicos foram expulsos do paraíso, cada um de nós, ao nascer, 
também é posto para fora por sua mãe. Nascido, banido, expulso, no exterior, “não há 
mais alojamento, nem alimento, nem calor” (Idem, 1980b). O nascimento é, assim, nosso 
primeiro desprendimento, primeira exposição, primeira passagem de um dentro para um 
fora, primeira contrariedade que nos obriga a sair de uma relação que Serres define como 
parasitária. 
3.1.5.2 Educar é ensinar alguém a deixar de ser parasita do outro
A relação parasitária, para o filósofo, é sempre uma relação abusiva pois nela, um “pega 
tudo e nada dá, ao passo que o outro tudo dá e nada recebe” (SERRES, 1980b, p. 9. Itálicos 
do autor). Trata-se, assim, de uma relação que se estabelece “num único sentido”, o 
82
canal que os reúne “e aquilo que ele transporta vai sempre de um ao outro, sem nenhum 
retorno.” (Idem, p.9). Para o filósofo, nos grupos humanos há muitas relações organizadas 
deste modo, ou seja, num “sentido único, [...] sem inversão de sentido”(Idem, p.19), “em 
que um se alimenta do outro sem que o outro nada possa tirar do primeiro”; é a “relação 
em flecha simples irreversível, [...] o fluxo vai num sentido, jamais em outro”; em suma, é 
a “exploração sem retorno.” (Idem, p.20).
Diante dessas relações, retorna novamente com toda evidência, a figura do mestre, descrita 
no item 4.1 deste texto, aquela pela qual dizíamos que o mestre, o educador ou o pedagogo 
é aquele que nos contraria. Ao resgatar o sentido antigo da figura do pedagogo, Serres 
nos lembra que ele, senhor na arte de conduzir a criança mundo afora, sendo escravo, ele 
próprio sabe o que é estar fora, ser excluído, tanto da casa de seus senhores quanto da 
escola, para a qual conduz o menino e onde reina o professor. Contudo, escravo excluído, 
ele sabe que só os heréticos realmente se educam e fazem avançar o saber (SERRES, 1997). 
Excluído, posto para fora, por vontade própria ou por imposição, perde-se a proteção da 
casa ou do grupo, mas se ganha a liberdade de novos encontros, de pensar e de inventar. 
Para Serres (1993a, p. 43), é no fora ou no exterior que realmente estamos abertos para “a 
soma da alteridade” que nos amplia. Daí, o mestre ou o educador ser, portanto, não aquele 
que nos confirma em nossos hábitos e saberes, que nos deixa conformados aos nossos 
ninhos, mas, ao contrário, aquele que constantemente nos faz abandoná-los. 
Assim, a educação nos faz deslocar, lança a errância e, agindo como uma força contrária 
à nossa natureza de dependência, leva-nos a mudar o tipo de relação que estabelecemos 
com os outros, no sentido de romper com o cordão umbilical univetorial que nos liga a um 
hospedeiro, liberando-nos, “pouco a pouco, de nossos costumes primordiais de parasitas” 
(SERRES, 1980b, p. 10. Itálicos do autor), tornando-nos capazes de desenvolver uma relação 
mais igualitária, de trocas mútuas ou contratuais. É nesse tipo de relação que, para Serres, 
está o caminho que nos conduz para além da repetição e exploração, rumo à invenção 
e à produção. Contudo, tais construções pedagógicas, previne Serres, são extremamente 
frágeis, pois, como ele afirma, é frequente vermos, na primeira oportunidade, muitos 
se refugiarem “em condutas de dependências, como se tendessem para o equilíbrio 
fundamental.” (Idem, p. 10).
A relação contratual nos tira da condição de parasitas e da ausência de exposição e nos 
leva para uma condição na qual somos atores de trocas. Para Serres, portanto, educar é 
ensinar o desprendimento, ensinar alguém a deixar de ser parasita do outro, ensinar-lhe 
83
unidade 3
a autonomia. Não somos mais parasitas, somos autônomos. Logo, sem o desprendimento 
não existe vida humana, nem mesmo nascemos, sem ele, não há ritos de iniciação ou 
aprendizagem, não há relações igualitárias, mas apenas aquelas parasitárias. Essas 
relações condicionam a vida e a aprendizagem. (SERRES, 2005, p. 155).
3.1.5.3 A hominidade: entrelaçamento de Arlequim e Pierrô
As condições em que se dá a produção ou a reprodução nas relações em que estabelecemos 
são abordadas, ainda, por Serres, na obra O incandescente (2005).Nesse livro, o autor alia 
a reprodução ou a repetição à memória e a produção ou a invenção ao esquecimento. 
Para ele, a memória nos leva à repetição; portanto, não é preciso apenas desprender-se 
de nossos hospedeiros, deslocarmos de nossas posições, é preciso, antes, esquecer nossa 
antiga fonte de alimento ou de saber, para que, então, estejamos aptos a produzir ou 
inventar. 
Decerto, afirma o filósofo no Filosofia Mestiça, para “criar, deve-se saber tudo e, portanto, 
ter trabalhado imensamente”; é preciso “instruir-se o mais possível, no começo, para se 
chegar à formação: tudo vem do trabalho”; mas, se essa condição é necessária para a 
criação, ela, entretanto, para Serres, não é suficiente. Para ele, “o peso da ciência ou do 
passado esmaga e esteriliza”, “o poderio do saber, tanto das obras já realizadas como das 
instituições que as parasitam” impedem a criação (SERRES, 1993a, p. 114). Sendo assim, é 
preciso buscar compreender tudo, mas para não saber nada. “Duvidar para criar” (Idem). 
Esquecer para inventar. Desprender-se para errar.
O esquecimento é uma forma de desprendimento que “nos condiciona à aprendizagem, 
à adaptação rápida, à desobediência e à invenção”. Ele efetiva a liberdade humana e 
a autonomia do aprendiz. Trata-se de, como Diógenes, atirar ao fogo a camisa e os 
sapatos e partir munido simplesmente do corpo (SERRES, 2005). Diógenes, exemplo de 
desprendimento, o mendigo que abandonou tudo, que deixou todo interior e reduziu 
“tudo ao que é, sem ilusão, discurso ou firulas.” Saiu “da dura casa”, tirou “a vestimenta 
imprecisa”, escapou “das relações viscosas”, permaneceu nu, sozinho, em seu barril. 
(SERRES, 1983, p. 117-118). No exterior, desprovido de tudo, sem abrigo, o corpo sofre 
com as intempéries do tempo. Mas, para Serres, é justamente do sofrimento que nasce o 
eu. “Cada um de nós sente seu corpo apenas quando ele sofre. A consciência emerge com 
a falta e a miséria.” (SERRES, 2005, p.185). 
Assim, o desprendimento leva à miséria, estado pleno de desapego e esquecimento, que 
84
torna o aprendiz limpo, branco, asséptico e estéril, livre de parasitas e de dejetos. Essa 
limpeza, essa brancura o transforma num abrigo “aberto a todos os estrangeiros” (SERRES, 
2005, p.81), “capaz de receber a todos” (Idem, p. 77). Nesse limite extremo do completo 
desapego dá-se o engendramento do eu mestiço. Ninguém, nada, branco. Forma-se com 
a totalidade de cores pintadas sobre esta brancura, não cessa de costurar e tecer com 
o que acolhe dos outros, seu manto de Arlequim. Não é nada e, nesta medida, é infinita 
capacidade de ser, de se “transformar em outro, depois em outros, em todo mundo e, 
finalmente, num sujeito indeterminado [...], soma do eu, do tu, do nós, do vós e do eles. Não 
é ninguém, mas “acrescido de todos os outros” (Idem, p.104). É, ao mesmo tempo, Pierrô, 
que tende para Arlequim, e Arlequim, que tende para Pierrô. Quanto mais cores Arlequim 
acrescenta ao seu manto, mais ele se afirma em sua singularidade, mais se dirige para 
a brancura, que integra todas elas, mas que é, também, possibilidade de toda cor. Para 
Serres, (2005, p. 112), os homens são feitos desse somatório, desse tipo de mistura que 
lhes é exclusiva: “Incandescente como Pierrô; supercolorida como Arlequim.” Ecce Homo? 
Eis, então, o eu mestiço: “Ego nemo et alii.” (SERRES, 2005, p.104).
A relação, portanto, produz o sujeito. Ele se engendra, assujeitado aos laços de comunicação 
com os outros no turbilhão “movediço da intersubjetividade” (SERRES, 1993a, p. 166). 
É, assim, todos aqueles que foi dentro e através dos relacionamentos sucessivos ou 
justapostos nos quais se viu embarcado. É Arlequim, que vive sob mil camadas de casacos 
remendados. É legião, sem que seja o diabo, mas sendo “todo mundo ao mesmo tempo.” 
(Idem, p. 170). É desse modo que, “no sujeito, primeira pessoa, os outros engendram uma 
terceira pessoa, finalmente bem educada.” (Idem, p. 43. Itálicos do autor).
A educação, entendida como mestiçagem cultural, constrói, pois, um ideal pedagógico 
que é capaz de acolher a diferença, fazendo dela o seu objeto, uma pedagogia não da 
violência, mas da tolerância. O sujeito educado é, portanto, uma mistura, mas uma mistura 
contraditória, na qual tudo pode virar ao contrário, ou onde tudo se mistura no mesmo 
tempo e lugar. Entretanto, esse caos, essa aparente irregularidade é, ainda, a gênese da 
regularidade. O mestiço instruído é como uma rede topológica. Na perspectiva topológica, 
explica Moraes (2000, p. 2), uma “rede é formada num dado instante por uma pluralidade 
de pontos ligados entre si, uma pluralidade de conexões [...] nenhum ponto é privilegiado 
em relação a outro, o que faz com que uma rede tenha múltiplas entradas.” 
Assim, aberto em todos os sentidos, a indeterminação do mestiço lhe permite fundamentar 
determinações várias, adequadas a cada circunstância. Logo, ele é flexível, tolerante, uma 
85
unidade 3
totalidade sempre aberta, na qual se sucedem avanços e recuos, que definem progressos, 
invenções ou descobertas, isto é, o mestiço instruído é o dinamismo das diferenças: nem 
aleatório, nem determinismo unívoco, mas construção simultânea do espaço e do tempo, 
onde nada ocupa posição privilegiada, e tudo pode estar no centro. 
3.1.6 Considerações finais
A filosofia de Serres estabelece duas funções simultâneas e complementares para a 
educação. De acordo com o filósofo, sua função inicial é codificar, não importa qual 
seja a forma desse código (SERRES, 2005, p. 108). Mais tarde, entretanto, seu projeto é 
decodificar-se, isto é, desconstruir todo o referencial em que se baseou a aprendizagem, 
retornando à sábia ignorância. Entretanto, a educação “só poderá fazer isso, se souber 
como codificar” (SERRES, 2005, p.108). O sentido primeiro da educação consiste, pois, em 
conhecer a sua cultura, o subconjunto dos seus primeiros pertencimentos, para depois 
prontamente recusá-los e ir ao encontro de outros.
A maior contribuição da Filosofia Mestiça, para pensarmos o sentido da educação em 
Serres, está em descrever essa passagem da codificação à decodificação, na qual o aprendiz 
é levado a recusar seus pertencimentos e a lançar-se em novos encontros. Nesse sentido, 
exposição e mestiçagem são constituintes do ideal pedagógico que Serres apresenta nessa 
obra. Em uma palavra, o sentido da educação na Filosofia Mestiça é movimento, mas não 
movimento como deslocamento, simplesmente, mas movimento como deslocamento 
sucedido de acolhida da alteridade. “O corpo que atravessa aprende certamente um 
segundo mundo, aquele para o qual se dirige [...]. Mas ele se inicia, sobretudo, num 
terceiro pelo qual transita” (SERRES, 1993a, p. 12); este terceiro mundo é o lugar mestiço, 
lugar onde a tolerância mostra a sua lógica, e o aprendiz compreende como e porque ser 
múltiplo. 
O que, portanto, realmente, nos forma e nos torna sábios não é nem o abandono do abrigo, 
nem o esquecimento, nem tampouco a exposição. Aquilo que, realmente, nos educa é a 
passagem pelo lugar mestiço, lugar de intersecções, no qual alguma coisa terminou, mas 
não terminou ao mesmo tempo. Nesse ponto extremo, conhecemos aquilo que liga duas 
realidades até então diversas e contrárias, conhecemos o mecanismo de solidariedade que 
as reúne em uma terceira realidade renovada e original. Aprendemos, pois, a não sermos 
nem um, nem dois, nas trocas que estabelecemos a alteridade, mas a sermos um terceiro, 
um mestiço, capaz de aceitar a todos. 
86
Não podemos deixar de dizer que esse mestiço capaz de acolher a todos e a educação como 
processo de mestiçagem podem parecer coisas advindas do humanismo ingênuo de um 
imaginário filosófico, no qual todos os homens são bons e todas as culturas, sedentas por 
se mestiçarem. Certamente, as coisas não são bem assim. A mestiçagem que Serres propõe 
não é harmônica nem se realiza sem conflitos. Requer que se conjugue em si a parte do 
outro e a sua própria,criando, assim, reestruturações na identidade, que se torna móvel e 
instável. Pela mestiçagem, passa-se da identidade como síntese estabilizada do eu para a 
identidade como síntese aberta, constituída de recomposições permanentes através das 
trocas com a alteridade. 
Assim, o pensamento mestiço de Serres exige a entrada em si da cultura do outro e, com 
isso, a produção de uma cultura inédita, sempre sob a dinâmica do inacabamento. A 
mestiçagem é o inverso da fixidez e da estabilidade. É também, ao propor a reconciliação 
entre culturas separadas e distintas, gerando uma terceira cultura diferente, transgressora. 
Isso porque nega a ideia de cultura pura ou da pureza cultural e supõe a transformação 
da identidade do sujeito ou aquela dos grupos, sem que se coloque a priori uma cultura 
dominante legítima. Não há, para o pensamento mestiço, uma “cultura primeira” fundadora, 
superior às outras, à qual elas devem se integrar ou da qual devem permanecer à margem. 
Nem totalizante, nem excludente, a mestiçagem resiste tanto à opressão do mesmo ou do 
idêntico, à indiferenciação e à uniformização crescente, quanto à diferenciação exacerbada 
e isoladora, que é sempre reacionária a toda mistura. Se ela é o direito à diferença, o é, na 
contrapartida, ao mesmo tempo, à homogeneização e aos particularismos exclusivistas, 
sejam eles de origem racial, epistemológica, religiosa ou étnica. Em suma, no mundo 
globalizado de hoje, a filosofia mestiça de Serres propõe que as culturas e os homens, ao se 
encontrarem, não vejam, na alteridade, o Mal, em quem se devem jogar bombas ou aviões, 
mas um simbionte, que faz de mim um outro com aquilo que acolho dele e que também se 
transforma com o que recebe de mim.
87
unidade 3
 CINE
Para pensar as relações entre desprendimento, exposição e educação em Serres a 
partir de um filme, indico vivamente:
•	 A EXCÊNTRICA FAMÍLIA DE ANTÔNIA.
- Ficha técnica: Direção: Maleen Gorris. Países: Bélgica/Holanda/Reino Unido. 
Gênero: Comédia/Drama. Ano de Lançamento: 1995. Duração: 102 minutos.
- Sinopse: Em uma pequena vila europeia, uma matriarca revive os importantes 
momentos de sua vida, reunida com membros de sua família e amigos, relembrando 
gerações e acontecimentos. Disponível em: <http://www.cineplayers.com>. Acesso 
em: 02 de setembro de 2011.
 ATIVIDADE
I – Assinale, entre as afirmações a seguir, aquela que caracteriza 
CORRETAMENTE a filosofia de Serres.
1. ( ) - Em Filosofia Mestiça, o filósofo descreve com precisão e originalidade o 
processo de formação de um aprendiz, que tem sua educação pautada na concepção 
da homogeneidade do mundo, das coisas e dos saberes.
2. ( ) - Para Serres, toda educação consiste numa exposição e numa mestiçagem. 
Mestiçagem, que implica desprender-se de uma posição ou de um lugar, no qual nos 
mantemos ou que nos aprisiona, e ir ao encontro dos outros e do mundo; exposição, 
que implica dilatar-se, dividir-se, tornar-se vários através desses encontros.
3. ( ) - Para Serres, quanto mais expostos, mais nos mestiçamos e, quanto mais 
mestiços, mais educados nos tornamos. O sentido da educação configura-se, assim, 
sempre como um movimento de exposição e de mestiçagem.
4. ( ) - Pierrô é o personagem criado por Serres que melhor incorpora o ideal 
pedagógico de mestiçagem presente em sua filosofia. 
II - Cada pergunta do primeiro bloco é respondida por um enunciado do 
segundo. Identifique as respostas corretas e numere o segundo bloco de acordo 
com o enunciado do primeiro. 
1. Para que aponta a contradição que identificamos, na história de Arlequim, entre o mundo dito, no discurso do rei, e o mundo visto, através de seu casaco e corpo?
cine
88
2. Para Serres, as verdades são sempre locais, distribuídas pelo espaço de um modo 
um tanto complicado. O que seria o oposto deste pluralismo?
3. Em que consiste, para Serres hemiplegia de nossos saberes? 
4. O que Serres procura, em sua filosofia, com o nome de “a passagem do noroeste”?
- ( ) As ciências humanas não falam do mundo, e as ciências exatas os homens de 
lado. Cada uma continua com um lado de seu corpo paralisado, arrastando um lado 
morto.
- ( ) A ideologia, quando afirma “que uma única verdade é válida para todo o espaço, 
que ela é universal”.
- ( ) A reunião entre as ideias científicas e aquilo que sabemos do ser humano; por 
outras palavras, a reconciliação dos saberes das ciências “duras” e das humanas, que 
mal toleram uma à outra. 
- ( ) A relação crítica, constante nos livros de Serres, entre a complexidade do 
mundo e as simplificações absurdas das ideologias. 
III – Os enunciados abaixo mencionados são verdadeiros, EXCETO o da 
alternativa 
1. ( ) O casaco de arlequim é a ideia de cada ciência trabalhando na interseção ou 
na interferência de várias outras. 
2. ( ) A ambidestria do Rei elogia os corpos completos de canhotos contrariados. 
3. ( ) Sua mestiçaria (Arlequim é mesclado, tigrado, matizado, multicor) convida-
nos a abandonar o conforto e a segurança do ninho e partir, expor-se ao outro, ao 
mundo, às coletividades, retendo as diferenças vividas durante as viagens e tornando-
nos vários.
4. ( ) O multicolorido casaco de Arlequim significa a possibilidade de criação, após 
o longo processo de instrução ou de mestiçagem.
IV –Leia atentamente as afirmações abaixo que dizem respeito às questões 
sobre Exposição, Mestiçagem e Desprendimento em Serres. 
1 - Para Serres, o pensador ou o inventor não é nunca um “passante mestiço”, pois 
jamais abandona sua posição ou passa de um lugar a outro. O que o caracteriza 
essencialmente é a imobilidade das estátuas. 
2 - A educação, em Serres, exige a exposição, pois sem ela negamos a possibilidade 
da educação no sentido mais elementar da palavra, aquele pelo qual aprendemos, 
89
com a etimologia, que a educação conduz (ducere) para fora (ex).
3 - Antes de nosso nascimento, fomos criados na mistura dos genes de nossos pais; 
uma vez nascidos, nossa criação só evolui através de novos cruzamentos. Daí, para 
Serres, toda PEDAGOGIA, compreendida como processo de mestiçagem, recomeçar 
o engendramento e o nascimento de uma criança. 
4- O que há de negativo no desprendimento é o fato de ele retirar as obrigações do 
pensamento corporativo e aliviar a pressão dos pares. 
5 - Sem o rompimento com a condição de apego ao ninho, que nos acompanha 
mesmo antes do nascimento, a educação não se inicia. 
-Marque agora: estão corretos apenas os enunciados. 
( ) 1, 2 e 3
( ) 2, 3 e 4
( ) 2 , 3 e 5
( ) 3, 4 e 5
V - Marque V ou F para as afirmações abaixo. 
1. ( ) O eu mestiço é um sujeito indeterminado, pois é a soma do eu, do tu, do nós, 
do vós e do eles. Não é ninguém, mas acrescido de todos os outros.
2. ( ) A relação produz o sujeito, pois ele se engendra, assujeitado aos laços de 
comunicação com os outros no turbilhão movediço da intersubjetividade.
3. ( ) É a indeterminação do eu mestiço lhe não lhe permite fundamentar 
determinações várias e adequadas a cada circunstância. 
4. ( ) A mestiçagem que Serres propõe é harmônica e se realiza sem conflitos, 
pois requer que se conjugue em si a parte do outro e a sua própria, criando, assim, 
reestruturações na identidade, que se torna móvel e instável.
5. ( ) Pela mestiçagem, passa-se da identidade como síntese estabilizada do eu 
para a identidade como síntese aberta, constituída de recomposições permanentes 
através das trocas com a alteridade. 
6. ( ) A mestiçagem é transgressora, pois nega a ideia de pureza cultural e supõe a 
transformação da identidade do sujeito ou aquela dos grupos, sem que se coloque 
a priori uma cultura dominante legítima.
7. ( ) Todo processo de conhecimento é uma mestiçagem, porque, quando falamos 
uma outra língua, temos um outro corpo; quando pensamos em outra ciência, 
entramos em outro ser humano. E, de tanto falar línguas diferentes, de tanto 
conhecer disciplinas diferentes, fabricamos em nós um mestiçointelectual.
4
90
VI - Escolha duas das questões abaixo para responder. 1. A partir da história de Arlequim, explique o que Serres designa como “a tola 
patologia da divisão”.2. Qual a relação entre ciência, poder e ideologia em Serres?
3. Explique a relação entre educação, exposição e mestiçagem em Serres.4. Como Serres define o Mestre (Educador ou Pedagogo) e qual sua função na 
Filosofia Mestiça?
91
Pra final de conversa...
Talvez você não tenha reparado, mas terminamos nossa conversa com reticências. Pois elas 
foram propositais. Não acho que este curso de Filosofia da Educação que acaba aqui tenha 
sido o final de sua conversa com esta disciplina. Daí o sentido das reticências.
O que lhe propusemoss neste curso foi um percurso pela Filosofia da Educação, dentre 
tantos outros possíveis. Partilhamos com você um pouco de nossa trajetória. Na primeira 
unidade, apresentamos nosso modo de pensar e justificar a filosofia da educação através do 
diálogo, de temas e de problemas. Na segunda unidade, mostramos como é possível partir 
de problemas da educação e chegar aos seus fundamentos na filosofia. Na terceira unidade 
fizemos o caminho inverso: partimos da filosofia e chegamos à educação, ao que um filósofo 
pode propor como reflexão ao educador. 
Agora cabe a você construir seus diálogos entre filosofia e educação, criar seu caminho. 
Se alguma coisa do que lhe apresentamos lhe interessou, comece por aí sua trajetória, vá 
abrindo seus temas e problemas, suas veredas da educação para a filosofia ou da filosofia 
para a educação. 
Esperamos ter contribuído um pouco para sua formação como pedagog(a). Daqui para frente, 
mais do que nosso(a) aluno(a), você passa a ser nosso parceiro nesta empreitada, a de fazer 
filosofia da educação e de ter nela uma importante aliada na tarefa jamais terminada de todo 
educador, que é aquela de refletir e de agir em prol da formação de homens e mulheres cada 
vez mais críticos, autônomos, tolerantes, mestiços, livres e em paz.
Um grande abraço, Parceiro(a).
O Autor
92
REFERÊNCIAS
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AINSA, Fernando. La reconstruction de l’Utopie. Préface de Federico Mayor. Traduction de 
l’espagnol par Nicole Cantò. Paris: Arcantères Éditions, 1997.
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Relume-Dumará, 1993. p. 91-115.
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Aires: Paidos, 1969. (Biblioteca del Educador Contemporaneo, 95).
CERTEAU, Michel de. La culture au pluriel. Nouvelle édition établie et présentée par Luce 
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CHAUÍ, Marilena de Souza. Ideologia e educação. Educação & Sociedade. São Paulo, n.5, p. 
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Nova Cultural, 1988 (Os Pensadores)]
FERNANDES, Florestan. O desafio educacional. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1989. 
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