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ECONOMIA BRASILEIRA AULA 5 Prof. Walcir Soares da Silva Junior CONVERSA INICIAL Falar da história recente é sempre um desafio. Seja pela falta de bibliografia adequada e atualizada, seja pela falta do distanciamento que nos possibilite enxergar os fatos de uma maneira menos enviesada e pessoal. Ainda assim, embarcamos nesse desafio, com a ressalva de que a história continua se escrevendo e que apenas o tempo pode ser capaz de dar mais lucidez e clareza aos fatos econômicos. No âmbito da história política e econômica recente do Brasil, um período marcante de transformações e desafios se apresentou, abrangendo desde o primeiro governo de Dilma Rousseff até o novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2023. Essa trajetória tumultuada, repleta de mudanças no modelo econômico, reviravoltas políticas e a promessa de renovação, está diante de nós para análise minuciosa aqui. Ao adentrar essa jornada, exploraremos as oscilações de um país em constante busca por equilíbrio. O primeiro governo de Dilma Rousseff emergiu como um período de intervenção estatal, no qual medidas como desoneração fiscal e ampliação do crédito foram tomadas para estimular o consumo e o investimento. Contudo, ao longo do tempo, o Brasil se viu confrontado por desafios econômicos, como desaceleração do crescimento, inflação elevada e desequilíbrio nas contas públicas. Em meio às adversidades, surgiram as mudanças no modelo econômico, com o intuito de estabilizar o país. Esse período foi marcado pelo controle de preços e tarifas, redução de taxas de juros e a criação de programas de estímulo à indústria nacional. No entanto, tais esforços não foram suficientes para reverter o cenário adverso que se desenhava, levando-nos a uma nova fase turbulenta da história brasileira. O segundo governo de Dilma Rousseff se viu envolto em uma tempestade perfeita, com agravamento da situação econômica, aumento do desemprego e recessão. Além disso, escândalos de corrupção abalaram o país, gerando uma crise de confiança sem precedentes. O resultado desse contexto tumultuado foi o processo de impeachment de Dilma em 2016, marcado pela perda de apoio político e as chamadas “pedaladas fiscais”. Michel Temer assumiu a presidência nesse momento de crise política e econômica, com a missão de reconstruir a confiança no país. Seu governo buscou implementar reformas estruturais, como a reforma trabalhista e da 3 Previdência, na tentativa de recuperar a estabilidade fiscal e estimular o crescimento econômico. No entanto, as decisões tomadas e as medidas adotadas geraram polêmicas e divisões, alimentando a polarização política e afetando o cenário econômico e a confiança dos investidores. O governo Jair Bolsonaro, a partir de 2018, buscou implementar, com uma postura mais à direita, reformas voltadas para a redução do tamanho do Estado, desburocratização e abertura comercial. No entanto, esse período também foi marcado por controvérsias e um ambiente político acalorado, influenciando diretamente o cenário econômico e a confiança dos agentes econômicos, além de alimentar um grande cenário de incerteza em termos das reais intenções antidemocráticas dos partidários do governo. Em um novo capítulo da história brasileira, o país se depara com a ascensão de um novo governo: o retorno de Luiz Inácio Lula da Silva à presidência, pela terceira vez. Diante desse cenário, surgem expectativas e questionamentos sobre as perspectivas da economia brasileira. Será que o novo governo de Lula conseguirá superar os desafios econômicos e políticos que assolaram o país nos anos anteriores? Quais serão as medidas adotadas para impulsionar o crescimento econômico, gerar empregos e promover a inclusão social? Assim, faremos uma análise dessas questões cruciais na tentativa de traçar os rumos e perspectivas da história econômica brasileira no cenário mais desafiador: enquanto ela acontece. TEMA 1 – PRIMEIRO GOVERNO DILMA (2011-2014) O primeiro governo de Dilma Rousseff, iniciado em 2011, foi marcado por um conjunto de políticas econômicas que despertaram tanto expectativas quanto controvérsias. Rousseff assumiu a presidência do Brasil em um momento de otimismo, mas também de desafios econômicos e incertezas globais. Sua gestão se caracterizou por uma abordagem intervencionista, buscando fortalecer o papel do Estado na economia e promover a inclusão social. Uma das principais características desse governo foi a adoção de políticas de estímulo ao consumo e ao investimento. Dilma implementou medidas como a desoneração fiscal, a ampliação do crédito e o incentivo ao consumo de bens duráveis, com o objetivo de impulsionar a economia interna. Essas políticas foram concebidas como uma forma de enfrentar a desaceleração do crescimento e estimular a atividade econômica. 4 Segundo Carvalho (2018), a defesa por mudanças no modelo econômico brasileiro começou com a constatação dos limites da baixa produtividade da indústria nacional. O país precisava, segundo essas correntes, de um modelo nos moldes asiáticos, centrado no desenvolvimento industrial, principalmente daqueles setores exportadores. As mudanças deveriam começar pela desvalorização do real, excessivamente valorizado à época, em conjunto com a redução das altas taxas de juros brasileiras. As demandas dos representantes da indústria incluíam, além da redução da taxa de juros, a desoneração da folha de pagamentos e medidas que compensassem os problemas de competitividade causados pelo câmbio sobrevalorizado. O conjunto de políticas como juro baixo, taxa de câmbio competitiva, uma consolidação fiscal “amigável ao investimento” e uma intensa desoneração dos investimentos e da produção, ficou conhecido por “Nova Matriz Econômica”, também chamado pela autora de “Agenda Fiesp” (Carvalho, 2018). Essas estratégias foram utilizadas em conjunto com uma forte contenção de gastos e investimentos públicos, expansão do crédito do BNDES e represamento das tarifas de energia. Segundo Carvalho (2018, p. 59), pode-se dizer com segurança que os resultados de sua adoção foram desastrosos. A desaceleração da economia e a deterioração fiscal que se seguiram acabaram criando as condições para uma segunda mudança de modelo a partir de 2015, desta vez levando ao abandono do pouco que havia sobrado dos pilares de crescimento do Milagrinho. As estratégias adotadas durante o primeiro governo de Dilma não estiveram isentas de críticas e desafios. Um dos principais pontos de debate foi o crescente papel do Estado na economia, com alguns setores questionando a interferência excessiva do governo e o impacto disso na liberdade econômica e na competitividade do país. Além disso, houve preocupações em relação ao equilíbrio fiscal, uma vez que a implementação de medidas expansionistas poderia comprometer as contas públicas. Outro aspecto relevante foi a gestão dos recursos públicos, com a implementação de programas sociais e de infraestrutura. Essas iniciativas foram vistas como importantes para promover a inclusão social e reduzir as desigualdades no país. Em contrapartida, surgiram questionamentos sobre a eficácia e a sustentabilidade desses programas, bem como a transparência na utilização dos recursos públicos. 5 Após uma inflação de 5,91% (IPCA) em 2013, a inflação acumulada em doze meses registrada em setembro de 2014 chegou a 6,75%. Atribuída à alta do dólar, a aceleração da inflação se deu em conjunto com uma desaceleração da economia. O crescimento real, que em 2013 foi de 3%, fechou o ano de 2014 em 0,5%, a menor taxa desde a crise de 2008. Segundo Carvalho (2008), essa desaceleração pode ser atribuída tanto à ineficácia da política econômica como aos impactos da queda nos preços das commodities. No entanto, o desemprego ainda era considerado baixo,em torno dos 7%. Medidas de ajuste entre o fim de 2014 e o início de 2015 – redução nos gastos com o PAC, alteração nas regras do seguro-desemprego, aumento da alíquota dos combustíveis e da folha de pagamentos, volta do IPI para veículos – resultaram na redução dos investimentos públicos, agravando ainda mais a crise econômica. A aceleração da inflação causada pelo brusco reajuste de preços nas tarifas de energia elétrica, gás de cozinha e gasolina levou o Banco Central a elevar a taxa básica de juros de 11,75% (em dezembro de 2014) para 14,25% (em julho de 2015). Segundo Carvalho (2018, p. 98), “a crise política, os efeitos da Operação Lava Jato sobre os setores de construção civil e petróleo, a forte desvalorização do real e a queda dos preços dos produtos que exportamos também contribuíram para o trágico desempenho da economia brasileira em 2015”. Tabela 1 – Taxa de crescimento anual de variáveis selecionadas para a economia brasileira em quatro subperíodos Variáveis 1999- 2002 2003- 2005 2006- 2010 2011- 2014 2015- 2016 Salário mínimo (% a. a. em termos reais) 1,8 6,8 5,9 3,0 1,2 Preço das commodities – FMI (% a. a.) 10,3 19,1 10,5 -7,0 -6,5 Investimentos federais (% a. a., em termos reais) -2,0 -4,7 27,6 1,0 -28,4 PIB (% a. a., em termos reais) 2,3 3,4 4,5 2,3 -3,5 Consumo das famílias (% a. a., em termos reais) 1,6 2,6 5,8 3,5 -3,8 Investimento total (% a. a., em termos reais) -1,2 2,0 9,1 2,2 -12,1 Exportações (% a. a., em termos reais) 8,5 11,7 2,5 1,6 4,3 Inflação – IPCA (% a. a.) 8,8 7,5 4,7 6,2 8,5 Fonte: FMI (Primary Commodity Prices Index); IBGE (Contas Nacionais Trimestrais e Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios); Orair, 2016; Ipeadata, citados por Carvalho, 2018. Nota: as taxas anualizadas foram obtidas por média geométrica. 6 Na Tabela 1 anterior, apresentamos uma comparação das taxas de crescimento anual de diversas variáveis econômicas de 1999 a 2016. É possível observar que, até meados de 2010, concomitantemente com o aumento no preço das commodities – cenário internacional favorável – as políticas do tripé macroeconômico, que representaram a continuidade das políticas econômicas dos governos FHC e Lula, tiveram resultados positivos em termos de consumo, investimento e controle inflacionário. Esse cenário foi impactado principalmente em decorrência da crise de 2008 e da queda no preço das commodities a partir de 2011. TEMA 2 – MUDANÇAS NO MODELO ECONÔMICO De acordo com Corsi (2016, p. 2), “em linhas gerais, o governo Dilma manteve a política econômica do seu antecessor. Em seus dois mandatos, Lula não alterou substantivamente a política macroeconômica de FHC. Metas de inflação, câmbio flexível e superávits primários continuaram a nortear a sua política econômica”. Essa política, conhecida como “tripé macroeconômico”, por sua vez, se traduzia basicamente em altas taxas de juros e tendência à valorização da moeda. No entanto, durante o governo Lula, medidas adotadas para incrementar o mercado interno – investimentos em infraestrutura, aumento do crédito para o setor imobiliário, ampliação da atuação do BNDES no fomento de setores estratégicos, adoção de políticas sociais de combate à pobreza e desigualdade, entre outras – estiveram aliadas à grande expansão mundial entre 2003 e 2007, conciliando os efeitos adversos dessas políticas (Corsi, 2016). Contudo, após a crise mundial de 2008, as contradições do tripé macroeconômico quanto ao crescimento da economia começaram a aparecer. Ainda que em 2010 o crescimento do PIB tenha registrado sólidos 7,5%, a aproximação da taxa de inflação ao teto da meta exigiu do governo Dilma Roussef políticas contracionistas como o aumento das taxas de juros, restrições de crédito e cortes de gastos públicos. A desaceleração da economia foi iminente. Corsi (2016, p. 5) descreve esse período: As medidas adotadas no primeiro semestre de 2011, somadas ao repique da crise internacional e a crescente deterioração das contas externas, acarretaram uma desaceleração mais forte do PIB em 2011 […]. No período que se seguiu, a postura mais intervencionista por 7 parte do governo e mudanças em alguns marcos institucionais, que desagradaram setores da burguesia, contribuíram para inibir o investimento. A tendência à valorização da moeda, que perdurava desde o início do plano real e que decorria, em grande parte, da própria política macroeconômica neoliberal, de efeitos tão deletérios para a indústria, também inibia a acumulação de capital no setor. A valorização do câmbio foi um dos fatores que corroeram o apoio do setor ao governo. Tendência que se manifestaria de forma cada vez mais forte à medida que avançava o governo Dilma. A partir de agosto de 2011, Dilma Roussef, na tentativa de conter a desaceleração econômica, inicia uma tardia redução das taxas de juros, chegando a 7,25% em outubro de 2012. Essa política foi acompanhada de outras políticas expansionistas como redução dos depósitos compulsórios e do Imposto Sobre Operações Financeiras (IOF) sobre o crédito pessoal, aumento de gastos públicos e dos investimentos em políticas sociais e desoneração fiscal para alguns setores considerados importantes. Esse é conjunto de políticas que representou uma mudança no modelo econômico, denominado “Nova Matriz Econômica”. Esse novo modelo foi a resposta encontrada pelo governo para lidar com o cenário internacional, agora desfavorável à política do tripé macroeconômico, conduzida desde os governos FHC. Segundo Carleial (2015), o governo Dilma sofreu, desde 2011, as consequências das mudanças no cenário internacional, como a redução do crescimento dos países emergentes, a crise do euro e a lenta recuperação estadunidense. Contudo, o descontentamento com essas políticas adotadas pelo governo Dilma não tardou a aparecer. Pressionado por todos os lados, o governo Dilma, ainda antes das eleições em que venceria para seu segundo mandato, “cedeu às pressões conservadoras e abandonou sua breve e tímida tentativa de flexibilização da política macroeconômica neoliberal” (Corsi, 2016, p. 8). A elevação das taxas de juros com o objetivo de combater as pressões inflacionárias inibiu os investimentos que já não eram altos, em razão da expectativa dos empresários; o câmbio sobrevalorizado desviou parte do crescimento da demanda para as importações; o crescimento do consumo, um dos propulsores do crescimento econômico até então, encontrou seu limite no endividamento das famílias. A crise econômica rapidamente se transformou em uma grave crise política. Com ela, a perda da governabilidade. 8 TEMA 3 – IMPEACHMENT DE ROUSSEFF E GOVERNO TEMER Segundo Carvalho (2018, p. 99), “[…] os defensores da estratégia passaram a vender a ideia de que o ajuste fiscal não havia sido posto em prática devido a uma suposta resistência da própria presidência da República e do Congresso”. No entanto, Carvalho (2018) demonstra que as despesas primárias do governo caíram 2,9% em 2015 em termos reais, com uma queda de 6,1% descontando as despesas com a Previdência que não poderiam ser cortadas. No entanto, o fim das desonerações tributárias concedidas ao setor empresarial, a implementação do teto de remunerações para os servidores públicos ou a volta da CMPF foram medidas de ajuste que não se realizaram. A queda na confiança dos investidores diante das amargas projeções de crescimento levou a quedas subsequentes no investimento privado, elevando a taxa de desemprego para 9% já em 2015. De 11,75% em dezembro de 2014, a taxa básica de juros saltou para 14,25% em julho de 2015, na tentativa de levar a inflação para o centro da meta. Como esperado para políticas contracionistas, o equilíbrio das contas públicas e externas, bem como da inflação, teria como custo a queda do emprego e dos salários. O que se seguiu foram taxas de crescimento doPIB de –3,5% e –3,28%, respectivamente, em 2015 e 2016. Há ainda muita controvérsia sobre os motivos que levaram ao impeachment de Dilma Roussef e sua legalidade, que fogem ao escopo de nossos estudos. Segundo Carvalho (2018, p. 108), “enquanto a parte legal do processo de impeachment concentrava-se em supostos crimes orçamentários de Rousseff, os discursos políticos ignoravam o ajuste de 2015 e atribuíam à irresponsabilidade fiscal da presidente um papel central na crise vivida pela população”. Entre atribuições das culpas que responsabilizariam Rousseff pela crise econômica, se destacavam as teses da falta de ajuste fiscal pelo governo e da falta de confiança dos investidores na figura da presidente. O impeachment resolveria, na visão dos seus defensores, os dois problemas ao mesmo tempo. O Programa Uma Ponte para o Futuro, apresentado, ainda em 2015, a empresários paulistas por Michel Temer culpabilizando os direitos adquiridos pela sociedade como principal causa do desajuste fiscal, sugeria um cenário futuro ainda pior (Carvalho, 2018). 9 O programa do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) de Michel Temer contemplava “flexibilização de leis trabalhistas, o fim da obrigatoriedade de gastos com saúde e educação e a desindexação de benefícios previdenciários ao salário mínimo” (Carvalho, 2018, p. 109). A crença era de que Michel Temer na presidência representaria a condição necessária para resolver a crise política e econômica. Após seis dias de julgamento, em 31 de agosto de 2016, o Senado concluiu o impeachment de Rousseff e cassou seu mandato, mas mantendo seus direitos políticos. Assumiu, então, como presidente interino, Michel Temer (Quadro 2), então vice de Rousseff, que concluiria o tempo de mandato. Seu governo foi marcado por uma série de medidas controversas e impopulares, com o objetivo de reverter a crise econômica e restaurar a confiança dos investidores. Quadro 1 – Lista de presidentes da República de 2011 a 2023 Período Presidente Denominação 2003-2010 Luiz Inácio Lula da Silva Sexta República 2011-2016 Dilma Roussef 2016-2019 Michel Temer 2019-2022 Jair Bolsonaro 2023- Luiz Inácio Lula da Silva Fonte: Walcir Soares da Silva Junior, 2023. Uma das principais iniciativas do governo Temer foi a aprovação da emenda constitucional que estabeleceu um teto para os gastos públicos, com o intuito de controlar o déficit fiscal e reequilibrar as contas do país. Essa medida gerou polêmica e críticas, uma vez que alguns alegaram que ela poderia afetar negativamente os investimentos em áreas como saúde e educação. Carvalho (2018, p. 132) resume: A queda acumulada do PIB desde o fim de 2014 alcançava 7,2% em níveis absolutos e 9,1% em termos per capita no fim de 2016. O ritmo de contração da economia, que diminuiu entre o segundo trimestre de 2015 e o segundo trimestre de 2016, parece ter acelerado desde o fim do processo de impeachment. Ao contrário do prometido, a troca de liderança não foi suficiente para o retorno à estabilidade e a retomada dos investimentos. […] Essa deterioração veio mesmo com a melhoria no cenário externo […]. O desemprego alcançou 12% no fim do ano [de 2016], tendo subido 3 pontos percentuais desde o fim de 2015. […] Quase não há registro histórico de uma crise dessa magnitude em um país com tamanho, instituições e renda per capita minimamente comparáveis aos nossos. […] Atribuir todo o colapso a uma irresponsabilidade com as contas públicas ou ao descontrole de preços parece pouco plausível. 10 Além o teto de gastos, o governo Temer conduziu uma reforma trabalhista, que flexibilizou alguns direitos trabalhistas e alterou as relações entre empregadores e empregados. No âmbito político, o governo de Temer foi marcado por escândalos de corrupção, que envolveram diversos membros de seu partido e de outros partidos aliados. Vários políticos foram investigados e presos durante seu mandato, o que contribuiu para a continuação da instabilidade política. No que concerne aos índices macroeconômicos, após a recessão de 2016, os anos de 2017 e 2018 apresentaram uma tímida recuperação, com taxas de crescimento de 1,78% e 1,22%, respectivamente. A inflação medida pelo IPCA cedera para 2,95%, em 2017, e 3,75%, em 2018, mas a inflação dos aluguéis, o IGP, zerada em 2017, fechou 2018 a 7,10%. Ainda que a taxa de desemprego continuasse próxima dos 13%, a esperança da estabilidade em um próximo governo pairava sobre os brasileiros. TEMA 4 – GOVERNO BOLSONARO E NOVO GOVERNO LULA A transição do governo Temer para o governo Bolsonaro marcou um momento de mudança significativa na política brasileira. Após o período conturbado do impeachment de Dilma Rousseff e da gestão de Michel Temer, Jair Bolsonaro assumiu a presidência em 2019 com promessas de renovação. A falta de apoio popular e a instabilidade política foram heranças deixadas por Temer para Bolsonaro, o que contribuiu para um ambiente desafiador desde o início. O governo Bolsonaro trouxe consigo um discurso conservador e polêmico, que se mostrou diviso e controverso. Além disso, a promessa de combate à corrupção e a defesa de valores tradicionais foram pontos-chave de sua campanha, refletindo uma postura antagônica em relação aos governos anteriores. A crise econômica persistiu, assim como as desigualdades sociais. As expectativas geradas durante a campanha de Bolsonaro encontraram obstáculos ao longo do seu mandato, resultando em polarização, retrocessos e dificuldades na aprovação de reformas estruturais. Em 2019, o PIB cresceu 1,22% com uma taxa de desemprego de 12%. Em termos econômicos, houve a implementação de medidas de ajuste fiscal, uma política monetária expansionista com forte redução das taxas de juros e a promessa de promover a desburocratização e a abertura do mercado. No 11 entanto, os resultados econômicos foram mistos, com uma taxa de desemprego ainda elevada e um crescimento econômico aquém do esperado. Além disso, a política ambiental do governo enfrentou críticas tanto internas quanto externas, especialmente em relação ao desmatamento na Amazônia. A polarização política e a frequente disseminação de desinformação também caracterizaram esse governo. No ano seguinte, com a pandemia de Covid-19, o cenário se agravou ainda mais, registrando uma queda no PIB de 3,28% e taxa de desemprego em 13,78%. Inicialmente, houve uma minimização da gravidade da doença e uma resistência às medidas de prevenção recomendadas pelas autoridades de saúde, o que gerou críticas e contribuiu para a polarização política. Em resumo, a gestão de Bolsonaro foi marcada por tensões políticas, ataques a instituições democráticas, embates com outros poderes, além de uma base de apoio fiel, mas também uma crescente insatisfação e mobilização social contrária ao seu governo. De acordo com Santos (2023), Luiz Inácio Lula da Silva venceu as eleições de 2022 com uma diferença menor que três milhões de votos, o que demonstra o quadro de polarização política e social no Brasil. Em meio a escândalos de acusação do uso de notícias falsas, o desafio de preservação da democracia e diversas controvérsias de ambos os lados, a perspectiva de um novo governo Lula despertou expectativas e incertezas em relação às políticas econômicas a serem adotadas. O novo governo, por meio de uma candidatura que utilizava termos-chave como “reconstrução” e “transformação”, prometeu um programa econômico voltado para a retomada do crescimento e a redução das desigualdades sociais. Durante seu governo anterior, Lula implementou programas sociais importantes, como o Bolsa Família, que contribuíram para a redução da pobreza e a inclusão de milhões de brasileiros. No entanto, também ocorreram críticas em relação à falta de medidas estruturais para promover o crescimento econômico de forma sustentável. O governoLula foi marcado por altos gastos públicos, aumento da dívida e uma política de incentivos que, em alguns casos, privilegiou setores específicos sem uma visão mais ampla de desenvolvimento. Segundo Santos (2023), um dos desafios do novo governo será recuperar o protagonismo do país no cenário internacional e conciliar uma melhora nas relações com os Estados Unidos e a retomada de iniciativas revisionistas com o 12 Brics. Do ponto de vista latino-americano, a nova onda de governos de esquerda e centro-esquerda no continente se apresenta em um contexto institucional, dificultando ainda mais o estabelecimento de uma América Latina autônoma. Além disso, há preocupações sobre a retomada de políticas econômicas intervencionistas e a falta de foco na necessidade de reformas estruturais. A capacidade de promover a estabilidade fiscal e atrair investimentos pode ser afetada caso haja uma ampliação exagerada do papel do Estado na economia. Essas políticas podem resultar em distorções, falta de competitividade e dificuldades para estimular o crescimento sustentável. Portanto, é necessário um olhar crítico e cauteloso em relação às suas políticas econômicas. Embora seja importante buscar a redução das desigualdades e o avanço social, é fundamental encontrar um equilíbrio entre as medidas de inclusão e os estímulos à produtividade e ao empreendedorismo. A implementação de reformas estruturais, como a tributária e a previdenciária, pode ser necessária para impulsionar a economia de forma saudável e sustentável. A vigilância e o debate público são essenciais para garantir que as políticas econômicas adotadas sejam efetivas, transparentes e contribuam para o desenvolvimento equilibrado do país. TEMA 5 – PERSPECTIVAS DA ECONOMIA BRASILEIRA Como colocado na introdução, falar da história recente é sempre um desafio. Nos últimos anos, a economia brasileira enfrentou desafios significativos, resultando em um cenário incerto e preocupante. Apesar das expectativas e promessas de progresso, a realidade tem se mostrado desanimadora. O Brasil, outrora conhecido por sua diversificação industrial, tem visto sua base produtiva enfraquecer-se constantemente. A falta de políticas efetivas de incentivo à indústria nacional, aliada a uma taxa de câmbio desfavorável, tem resultado em uma crescente dependência de importações e na perda de competitividade no mercado global. Portanto, a busca por uma maior complexidade econômica é um dos principais desafios na diversificação industrial brasileira. Outro fator que contribui para a atual crise é a persistência de políticas econômicas ineficientes. O país tem sido atormentado por uma combinação desastrosa de instabilidade fiscal, baixo investimento público, altas taxas de 13 juros e uma burocracia excessiva. A ausência de uma agenda consistente de reformas estruturais e a falta de comprometimento político têm minado a confiança dos investidores e desencorajado o crescimento econômico sustentável. Talvez um dos problemas mais importantes e também um sintoma dos percalços econômicos do Brasil é a desigualdade social. Segundo dados do IBGE, em 2022, a parcela 1% mais rica da população brasileira recebia uma renda mensal 32,5 vezes maior que o rendimento da metade mais pobre da população. Enquanto uma pequena parcela da população concentra uma grande parte da riqueza, a maioria sofre com a pobreza e a falta de oportunidades. A ausência de políticas efetivas de redistribuição de renda e o acesso limitado a serviços básicos, como saúde e educação de qualidade, perpetuam a exclusão social e acentuam as disparidades econômicas. A falta de comprometimento com a sustentabilidade é outro ponto crítico na economia brasileira. O desmatamento desenfreado na Amazônia e o descaso com os recursos naturais têm impactos negativos diretos na economia e na imagem do país no cenário internacional. A destruição ambiental prejudica setores como o agronegócio e o turismo, afastando investidores e minando o potencial de crescimento econômico em longo prazo. Além disso, não só no Brasil, mas no mundo, a ideia de se medir crescimento econômico sem levar em conta o desgaste dos recursos naturais tem se mostrado cada vez mais retrógrada. Diante das perspectivas mencionadas anteriormente, fica claro que a economia brasileira está em uma encruzilhada perigosa. É necessária a implementação de políticas coerentes e sustentáveis, que estimulem o crescimento econômico inclusivo, promovam a diversificação da indústria nacional, combatam a desigualdade social e preservem o meio ambiente. O Brasil tem potencial econômico e recursos naturais abundantes, mas a atual trajetória só poderá ser alterada se houver uma mudança profunda na abordagem econômica adotada. Para tanto, há a necessidade de implementação de reformas estruturais que promovam a modernização e a competitividade da indústria nacional, como a redução da burocracia e dos entraves regulatórios, o estímulo à inovação e ao desenvolvimento tecnológico, além do fortalecimento da educação e capacitação profissional. Além disso, é crucial promover a estabilidade fiscal e melhorar a 14 gestão das contas públicas, combatendo o déficit crônico e a alta carga tributária. Essas medidas são fundamentais para restaurar a confiança dos investidores e atrair capital nacional e estrangeiro, impulsionando assim o crescimento econômico. A questão da desigualdade social também deve estar no centro das preocupações. É necessário implementar políticas de redistribuição de renda e de acesso igualitário a serviços básicos, como saúde e educação. Ao garantir um ambiente mais equitativo, o país poderá aproveitar todo o potencial de sua população, aumentando a produtividade e estimulando o consumo interno. Por fim, o incentivo ao desenvolvimento sustentável deve ser considerado parte integrante da estratégia econômica. É essencial adotar políticas que promovam a preservação do meio ambiente e o uso responsável dos recursos naturais, sem comprometer a capacidade das futuras gerações de prosperarem. A economia verde e a transição para energias renováveis devem ser fomentadas, abrindo espaço para o surgimento de novas oportunidades de negócio e investimentos. NA PRÁTICA Responda: 1. Explique qual foi o impacto das políticas econômicas adotadas durante o primeiro governo Dilma Rousseff na economia brasileira e relacione essas políticas com o tripé macroeconômico adotado pelo governo desde 1999. 2. Como as medidas adotadas durante o segundo governo Dilma Rousseff, como o ajuste fiscal e as políticas de estímulo ao consumo, afetaram a economia brasileira e quais foram os principais desafios enfrentados nesse período? 3. Qual foi a proposta da “Nova Matriz Econômica” adotada durante o governo de Dilma Rousseff e como essa estratégia impactou a economia brasileira, especialmente em termos de crescimento, inflação e equilíbrio fiscal? 4. Como os governos de Michel Temer, Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva se diferenciaram em termos de políticas econômicas e quais foram os principais resultados alcançados em relação ao crescimento econômico, desemprego, inflação e equilíbrio fiscal durante esses períodos? 15 FINALIZANDO Ao longo desta discussão, examinamos um período tumultuado da economia brasileira, desde o primeiro governo Dilma Rousseff até a recente posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Durante esse intervalo, testemunhamos uma série de desafios e contratempos que afetaram profundamente a estabilidade econômica do país. O governo Dilma enfrentou dificuldades para lidar com questões fiscais e uma crescente desconfiança dos investidores, principalmente após os impactos da crise de 2008 na economia brasileira. A continuidade do tripé macroeconômico e suas consequências restritivas levaram à proposta de umnovo modelo econômico que, em combinação com a situação externa, gerou resultados ambíguos. Por fim, as políticas adotadas não foram suficientes para conter a deterioração econômica, resultando em uma recessão prolongada, aumento do desemprego e uma crise fiscal de grandes proporções que culminou no impeachment de Rousseff no início de seu segundo governo. Michel Temer assumiu a presidência do Brasil em meio a uma grave crise econômica e política. Seu governo enfrentou o desafio de reconstruir a confiança dos investidores e estabilizar a economia do país. Para isso, foram implementadas medidas de ajuste fiscal, como o teto de gastos públicos e a reforma trabalhista. Um dos principais marcos do governo Temer foi a aprovação da reforma da Previdência, considerada uma medida crucial para o equilíbrio das contas públicas. No entanto, a implementação dessas reformas encontrou resistência política e social, o que resultou em um cenário de instabilidade e incerteza. Apesar dos esforços em promover a recuperação econômica, os resultados foram modestos. O país saiu da recessão, mas o crescimento permaneceu lento, o desemprego alto e a desigualdade social persistente. Além disso, o governo Temer também foi marcado por escândalos de corrupção, o que prejudicou a sua imagem e minou a confiança da população. O governo de Jair Bolsonaro iniciou com a promessa de implementar uma agenda liberal, com foco na redução do tamanho do Estado e na atração de investimentos. No entanto, o governo também enfrentou desafios e controvérsias. A gestão econômica foi marcada por altos e baixos, com dificuldades em avançar com reformas estruturais importantes, como a tributária 16 e a administrativa. Além disso, houve instabilidade política e tensões internas no governo, o que afetou a confiança dos investidores e o andamento das políticas econômicas. Outro aspecto relevante foi a gestão da pandemia de Covid-19. O Brasil enfrentou desafios significativos na saúde pública e na economia em decorrência da crise sanitária. As medidas adotadas para controlar a disseminação do vírus tiveram um impacto econômico negativo, com o aumento do desemprego e a queda na atividade produtiva. Em relação à política externa, o governo Bolsonaro adotou uma postura mais alinhada com os Estados Unidos e com uma abordagem mais conservadora em questões ambientais, o que gerou críticas e impactou a imagem internacional do país. Com a ascensão do novo governo Lula, o país vislumbra uma oportunidade de mudança e revitalização econômica. O presidente Lula apresentou um plano ambicioso, comprometendo-se a implementar políticas voltadas para o crescimento inclusivo, o fortalecimento da indústria nacional, a redução da desigualdade e a busca por um desenvolvimento sustentável. No entanto, os acontecimentos recentes ainda não possibilitam a análise dos resultados da sua política. Em suma, a economia brasileira enfrenta desafios complexos, que requerem uma abordagem abrangente e sustentável. É necessário adotar políticas econômicas coerentes, promover a diversificação industrial, combater a desigualdade social e preservar o meio ambiente. Cabe ao futuro se as potencialidades brasileiras serão plenamente aproveitadas nos anos que seguirão. 17 REFERÊNCIAS CARLEIAL, L. M. da F. Política econômica, mercado de trabalho e democracia: o segundo governo Dilma Rousseff. Estudos Avançados, v. 29, n. 85, p. 201–14, dez. 2015. CARVALHO, L. Valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia, 2018. CORSI, F. A política econômica do governo Dilma: baixo crescimento e recessão. Revista Novos Rumos, v. 53, n. 1, p. 153-165, jun. 2016. SANTOS, M. J. da S. o Brasil que sai das urnas em direção ao mundo: considerações sobre o futuro da política externa no governo Lula. Boletim de Conjuntura, Boa Vista, ano 5, v. 13, n. 37, 2023. Disponível em: . Acesso em: 14 jul. 2023.