Prévia do material em texto
Hematologia Prof. Giovanny Rebouças Pinto Coagulopatias hereditárias e adquiridas Considerações gerais Coagulopatias Hereditárias Hemofilias Doença de von Willebrand Outras coagulopatias hereditárias Coagulopatias Adquiridas Defeitos na síntese de fatores coagulantes Coagulação intravascular disseminada Doenças hepáticas Inibidores adquiridos da coagulação Considerações gerais As doenças hemorrágicas provocadas por alteração no mecanismo da coagulação podem ser classificadas, de um modo geral, em hereditárias e adquiridas. As coagulopatias hereditárias são resultados de mutações nos genes que codificam os fatores da coagulação, que transmitidos entre as gerações. As coagulopatias adquiridas surgem em indivíduos normais, sem história prévia de sangramento e em geral são secundárias a uma grave doença de base. COAGULOPATIAS HEREDITÁRIAS Entre as coagulopatias hereditárias destacam-se: as hemofilias e a doença de von Willebrand. Hemofilias A hemofilia A (hemofilia clássica) e a hemofilia B (doença de Christmas) são doenças hemorrágicas hereditárias, decorrentes de deficiências quantitativas dos fatores VIII e IX, respectivamente. A hemofilia A corresponde a 80% dos casos e ocorre em cerca de 1:10.000 homens. A hemofilia B apresenta uma incidência 3-4 vezes menor que a hemofilia A. Estas frequências são descritas como não tendo diferenças étnicas, porém são raros os casos de hemofilias entre os chineses e incomuns nos africanos. Genética das hemofilias As hemofilias A e B são exemplos clássicos de doenças recessivas ligadas ao cromossomo X, pois os genes dos fatores de coagulação VIII e IX estão localizados no braço longo do cromossomo X. O gene do fator VIII localiza-se em Xq28, contém 26 éxons e codifica uma proteína de 2.332 aminoácidos. Enquanto que, o gene do fator IX localiza-se em Xq26, contém 8 éxons e codifica uma proteína de 415 aminoácidos. Nos indivíduos do sexo masculino que não possuam o alelo normal, a deficiência manifesta-se clinicamente. O indivíduo afetado não irá transmitir a doença aos filhos (cromossomo Y normal). Contudo, todas as suas filhas serão portadoras de um alelo alterado (mulheres portadoras de hemofilia), uma vez que herdam o cromossomo X paterno. A maioria destas mulheres será clinicamente normal, devido à presença do alelo normal materno. A mulher portadora irá transmitir a doença para 50% dos seus filhos e o estado de portadora para 50% de suas filhas. Para a ocorrência de mulheres hemofílicas, existem as seguintes possibilidades: (1) “hiperlyonização” em mulheres heterozigotas, onde a “lyonização” (inativação aleatória de um dos cromossomos que ocorre nas células somáticas numa fase muito precoce da embriogênese) é extrema, resultando na inativação do alelo normal na maioria das células e, consequentemente, em valores extremamente baixos do fator VIII e IX coagulantes; (2) resultado da união de um hemofílico com uma mulher portadora, o que é um evento pouco frequente; (3) presença de um alelo anormal hemofílico em uma mulher com somente um cromossomo X, como no mosaicismo para a síndrome de Turner (genótipo XX/X). Sabe-se que em pelo menos 1/3 dos hemofílicos não se encontram evidências ou história de sangramento anormal em outros membros da família. Em outros casos, mortes neonatais ou a passagem do alelo com mutação através de uma sucessão de mulheres portadoras podem explicar a história familiar negativa. Assim, a historia familiar negativa é de pouco valor para fins de exclusão da possibilidade de hemofilia num determinado indivíduo. Os estudos dos genes das hemofilias por métodos moleculares detalhados têm demonstrado uma grande variabilidade nos tipos de mutações encontradas: deleções, inserções, inversão de sequência e mutações de ponto. Todas estas mutações estão depositadas em bancos de dados públicos, atualizados periodicamente. Defeitos moleculares na hemofilia A Estima-se que aproximadamente 1/3 dos casos de hemofilia A decorram de mutação nova (não presente no cromossomo X da mãe do paciente). Esta elevada frequência de mutações novas estaria ligada principalmente a 3 fatores: (1) em decorrência do grande Coagulopatias hereditárias e adquiridas 2 tamanho do gene do fator VIII, (2) da presença de ilhas CpG que facilitam a ocorrência de substituições do tipo C�T e G�A, e (3) da organização peculiar do gene do fator VIII, que contém cópias de um outro gene (gene A) no seu interior e na sua proximidade, o que facilita a ocorrência de inversões. As ilhas de CpG são comuns no gene do fator VIII e são consideradas pontos preferenciais (hot spots) para a ocorrência de mutações. Os dinucleotídeos CpG sofrem metilação seguida de desaminação, originando as mutações de substituições mencionadas acima. O íntron 22 do gene do fator VIII contém 32 kb de comprimento e em 40% dos casos de hemofilia A grave apresenta-se invertido. Esta inversão decorre de recombinação homóloga entre a região contendo o gene A no íntron 22 e uma de suas cópias localizadas a mais de 400 kb a 5' do gene do fator VIII. Defeitos moleculares na hemofilia B Em sua maioria as mutações associadas à hemofilia B são pequenos defeitos, e de fato em apenas 5% dos casos são observadas alterações genéticas grosseiras. Mutações em dinucleotídeos CpG são frequentes no gene do fator IX e correspondem a cerca de 25% dos casos de hemofilia B. Um tipo incomum de hemofilia B é caracterizado por aumento dos níveis de fator IX e atenuação do quadro hemorrágico durante a puberdade. Este quadro, conhecido como hemofilia B Leiden, é associado a mutações na região promotora a 5’ do gene, as quais interferem com a ligação de fatores de transcrição à região promotora. Os mecanismos pelos quais ocorre o aumento dos níveis de fator IX na puberdade não são bem conhecidos, mas os dados disponíveis apontam para um efeito de andrógenos afetando a transcrição do gene do fator IX. Diversos polimorfismos dentro ou próximo dos genes dos fatores VIII e IX foram descritos, apresentam significativa diversidade étnica e representam ferramentas úteis na detecção de portadoras de hemofilia. Detecção de mulheres portadoras Em cada família com hemofilia podem existir várias mulheres com risco de serem portadoras do alelo anormal e, portanto, com risco de conceberem filhos hemofílicos. O diagnóstico preciso do estado de portadora nestas mulheres é um aspecto importante do aconselhamento genético das famílias. A detecção de mulheres portadoras envolve a obtenção do heredograma (mulher, filha de hemofílico com certeza será portadora, p. ex.), por estudos de coagulação (para se medir a atividade dos fatores VIII e IX) e estudos de genética molecular (para se seguir a segregação do gene através das famílias afetadas e a pesquisa direta de mutação específica). A pesquisa direta (técnica dispendiosa e demorada) de uma mutação específica permite a determinação de portadoras em quase todas as famílias, independentemente da presença ou não de história familiar da doença. Achados laboratoriais Como os fatores VIII e IX fazem parte do mecanismo “intrínseco” da coagulação, o teste que avalia esta via (tempo de tromboplástina parcial ativada – TTPA) está alterado, havendo normalidade da contagem plaquetária, do tempo de sangramente (TS) e do tempo de protrombina (TP). Contudo, a intensidade do prolongamento do TTPA irá depender da gravidade da hemofilia. As dosagens dos favores VIII e IX são indispensáveis para o diagnóstico diferencial das hemofilias A e B. Manifestações clínicas Como as hemofilias apresentam manifestaçõeshemorrágicas semelhantes, não é possível distinguir a hemofilia A da hemofilia B somente com base em critérios clínicos. A frequência e a gravidade do quadro hemorrágico estão, geralmente, relacionadas com as concentrações plasmáticas do fator deficiente, de modo que a gravidade da doença é diretamente proporcional ao grau de deficiência do fator. As hemofilias são classificadas como: grave (atividade plasmática residual de fator VIII ou IX inferior a 1%); moderada (atividade residual entre 1-5%); leve (níveis plasmáticos entre 5-40%). Na hemofilia grave, os pacientes apresentam manifestações hemorrágicas de repetição (2-4/mês) e hemartroses graves, que, quando não tratadas adequadamente, evoluem para artropatias crônicas e incapacitantes. Estes pacientes estão sujeitos a hemorragias graves, que podem comprometer órgãos vitais (cérebro, p. ex.). As manifestações hemorrágicas são intermitentes e alguns pacientes podem não apresentar sangramentos por semanas ou meses. Na hemofilia moderada, os hematomas e hemartroses nem sempre estão associados a traumatismos evidentes. Embora as hemartroses não sejam tão intensas quanto na hemofilia grave, se não tratadas adequadamente poderão evoluir com instabilidade articular, resultando em sangramentos importantes e frequentes. Deste modo, a doença se expressa de maneira mais grave do que poderia indicar o nível plasmático do fator deficiente. Na hemofilia leve, os sangramentos somente ocorrem após traumas ou cirurgias, porém podem apresentar hemartroses espontâneas, especialmente em articulações onde previamente ocorreu hemorragia pós-traumática não tratada corretamente. Muitas vezes, essa forma de hemofilia é diagnosticada somente na idade adulta. Tratamento O maior objetivo do tratamento das hemofilias é a prevenção das hemartroses, uma vez que a artropatia crônica hemofílica é a maior causa de morbidade nesses pacientes. A reposição com concentrados de fator da coagulação é o componente mais importante do tratamento do hemofílico, embora o emprego do DDAVP possa tornar completamente desnecessária esta modalidade terapêutica, nos pacientes com hemofilia A leve ou moderada. O DDAVP (1-Desamino-8-D-Arginina Vasopressina = Desmopressina) é uma droga sintética que produz um aumento transitório do fator VIII e do FvW em pessoas normais, em alguns indivíduos com hemofilia A leve ou moderada, e em alguns pacientes com DvW. Coagulopatias hereditárias e adquiridas 3 Doença de von Willebrand A doença de von Willebrand (DvW) é uma doença hemorrágica hereditária, causada por uma alteração quantitativa ou qualitativa do FvW, por consequência de uma mutação no gene do FvW. O gene do FvW, localizado no braço curto do cromossomo 12 (12p12), é composto por 52 éxons e codifica um precursor com 2.813 aminoácidos. O FvW é uma glicoproteína que se apresenta como multímeros de diversos pesos moleculares. Este fator, sintetizado por células endoteliais e megacariócitos, possui 2 funções: (1) é o responsável pela adesividade plaquetária ao subendotélio, em sítios de lesão vascular; e (2) forma um complexo com o fator VIII, funcionando como sua proteína de transporte e impedindo que este seja rapidamente degradado da circulação por proteases. A DvW é considerada a forma mais comum de doença hemorrágica hereditária, pois é herdada quase sempre com padrão autossômico dominante, ou seja, a história familiar geralmente é positiva e ambos os sexos são acometidos. Sua prevalência é estima entre 1-3%, mas somente 10% apresentam doença sintomática. A DvW afeta basicamente o componente primário da hemostasia, pelo prejuízo à adesão plaquetária. Na maioria das vezes é do tipo brando, manifestando-se apenas pelo aumento da hemorragia imediatamente após procedimentos invasivos, como a extração dentária. A diminuição do fator VIII ocorre pelo aumento da sua degradação enzimática, mas não a ponto de causar hemorragia por distúrbio da hemostasia secundária. Existem 3 tipos da DvW, sendo os tipos 1 e 2 os mais comuns. Na DvW tipo 1, responsável por 80% dos casos, há uma redução leve ou moderada nos níveis plasmáticos do FvW (50% de atividade). Na DvW tipo 2, os níveis plasmáticos são normais, porém, há um defeito qualitativo do fvW ou no tamanho dos multímeros. Pode ser dividida em tipo 2A, que apresenta deficiência dos multímeros de pesos moleculares alto e intermediário; e tipo 2B, onde somente os multímeros de alto peso encontram-se deficientes, simplesmente por terem uma adesão exagerada às plaquetas. O resultado é a formação de agregados plaquetários que são rapidamente degradados no plasma. Neste caso, pode haver também trombocitopenia. A DvW tipo 3 é raríssima. Nesta situação temos ausência quase total do FvW, com atividade do favor VIII muito baixa no sangue. É o único tipo de herança autossômica e que se manifesta com hemorragia grave (semelhante à hemofilia). Nos exames laboratoriais o TS (indicador da hemostasia primária) encontra-se prolongado. O TTPA, por refletir os níveis plasmáticos do fator VIII coagulante, poderá ser normal ou ter prolongamento de intensidade variável. A contagem de plaquetas é, em geral, normal, mas pode haver trombocitopenia leve nos pacientes com tipo 2B. O tratamento dos pacientes com DvW tem a finalidade de corrigir os 2 defeitos hemostáticos presentes nesta doença: (1) os baixos níveis plasmáticos do fator VIII coagulante e (2) o TS prolongado. Essas alterações hemostáticas podem ser compensadas através do uso de agentes farmacológicos, que estimulam a liberação endógena do fator VIII coagulante e do FvW (DDAVP, p. ex.), ou com o tratamento transfusional de substituição exógena, realizado com a administração de concentrados contendo os fatores deficientes. Outras coagulopatias hereditárias Coagulopatias hereditárias causadas por mutações em genes que codificam os outros fatores da coagulação (I, II, V, VII, X, XI, XII, XIII) foram descritas. No entanto, estas coagulopatias são muito raras (por apresentarem padrão de transmissão autossômico recessivo) comparadas com as hemofilias e a DvW. COAGULOPATIAS ADQUIRIDAS As coagulopatias adquiridas podem se manifestar por: (1) defeitos na síntese de fatores coagulantes, (2) coagulação intravascular disseminada (CIVD), (3) doenças do fígado e (4) inibidores adquiridos da coagulação. Defeitos na síntese de fatores coagulantes Alteração no metabolismo da vitamina K A vitamina K existe naturalmente nos vegetais verdes, frutas e também é sintetizada no intestino por bactérias. A necessidade diária de vitamina K é pequena (1 mg/kg), sendo metade sintetizada no intestino por bactérias e metade é fornecida pela dieta. A vitamina K é lipossolúvel e sua absorção intestinal depende da presença da bile. A vitamina K atua no fígado promovendo a carboxilação de resíduos de ácido glutâmico na porção N-terminal dos fatores II, VII, IX e X, o que os torna capazes de se ligar ao cálcio. Quando a vitamina K é deficiente, formam-se precursores inativos desses fatores, que se acumulam no plasma. Por esse motivo, os fatores II, VII, IX e X são ditos vitamina K-dependentes. A vitamina K também é necessária para a carboxilação da proteína C, a qual inibe as formas ativas dos fatores V e VIII da coagulação. Assim, a falta de vitamina K funciona como pró-coagulante, deprimindo a ativação da proteína C e como anticoagulante, deprimindo a síntese dos fatores II, VII, IX e X. As causas de deficiência de vitamina K são: deficiência alimentar, má absorção, ingestão de drogas que inibem sua capacidade de carboxilação e hepatopatias. Síndrome de má absorção A síndrome de má absorçãointestinal na criança ou adulto pode levar à deficiência de vitamina K e, como consequência, a uma doença hemorrágica com sintomas como equimoses, hematomas, epistaxe, gengivorragia e hemorragia gastrintestinal. A síndrome de má absorção é encontrada em casos de diarréia crônica, doença celíaca, terapias prolongadas com antibióticos, colite ulcerativa, fibrose cística, grandes ressecções ou fístulas intestinais e icterícia obstrutiva. Nos exames laboratoriais o TP e o TTPA encontram-se alongados, enquanto que o TT, o fibrinogênio e a contagem de plaquetas encontram-se normais. O tratamento é feito com vitamina K, pela via parenteral, até a normalização do quadro clínico e testes laboratoriais. Nos casos de grandes hemorragias deve-se recorrer à transfusão de plasma fresco congelado. Coagulopatias hereditárias e adquiridas 4 Doença hemorrágica do recém-nascido Aparece na 1º semana de vida, devida à imaturidade do fígado na formação dos fatores vitamina K-dependentes, associada a um baixo teor de vitamina K no leite materno e à falta de sua síntese no intestino, ainda não colonizado por bactérias. O sangramento pode ocorrer pelo cordão umbilical, tubo gastrintestinal e pela pele. A doença pode aparecer após o 1º mês, ocorrendo deficiência de vitamina K por diarréia crônica, síndrome de má absorção e atresia das vias biliares. Nos exames laboratoriais o TP e a TTPA encontram-se alongados. No entanto, o TT, o fibrinogênio e a contagem de plaquetas são normais, permitindo o diagnóstico diferencial com a CIVD. O tratamento pode ser profilático, administrando-se 1 mg de vitamina K por via oral, a todo recém-nascido. Nos casos de diarréia, síndrome de má absorção e atresia de vias biliares, deve-se usar a via parenteral. Nos casos de sangramento grave, deve-se fazer transfusão de plasma fresco. Coagulação intravascular disseminada A CIVD é uma síndrome clínica caracterizada pela ativação intravascular dos processos da coagulação, pela liberação ou exposição do FT na corrente sanguínea. Como resultado, ocorre a produção exacerbada de trombina. A trombina age sobre o fibrinogênio transformando-o em fibrina, que é depositada nos pequenos vasos. O depósito de fibrina na microcirculação acarreta lesão isquêmica de diversos tecidos e órgãos, contribuindo para a instalação de insuficiência múltipla de órgãos. Além disso, existe a ativação e o consumo excessivos de plaquetas e fatores da coagulação, o que resulta em quadros hemorrágicos graves. A CIVD é sempre o ponto final de processos desencadeados por diferentes doenças de base. As causas mais comuns são: sepse bacteriana (miningococos, pseudomonas, p. ex.) e politraumas, seguidos por neoplasias (adenocarcinoma mucinoso, LMA promielocítica – M3), doenças obstétricas (descolamento prematuro de placenta e embolia de líquido amniótico) e grandes queimaduras. Nos exames laboratoriais o TP, TTPA e TT são todos alongados, evidenciando a deficiência dos fatores da coagulação. Além disso, ocorre uma diminuição na contagem de plaquetas e principalmente do fibrinogênio (fator I) e aumento dos PDF. Embora não seja sempre evidente, pode ser observada a presença de esquizócitos no sangue periférico. O prognóstico da CIVD não é bom, visto que reflete uma doença de base geralmente muito grave. Estima-se uma mortalidade entre 40-80% em casos de sepse, politrauma e grandes queimaduras. A eliminação da doença de base é o componente mais importante do tratamento, e a viabilidade ou não do controle da doença de base irá determinar a evolução do paciente afetado por CIVD. Doenças hepáticas As células hepáticas sintetizam todos os fatores da coagulação (exceto o fator VIII, sintetizado pelas células endoteliais), assim como anticoagulantes endógenos, como a antitrombina, proteína C e proteína S. O fígado é também o local de depuração dos fatores ativados durante a coagulação, pela função do seu sistema retículo- endoteliaI. Na deficiência de vitamina K por má absorção ocorre a diminuição dos fatores vitamina K-dependentes (fatores II, VII, IX e X), porém na lesão aguda ou subaguda da célula hepática ocorre a falta da síntese dos fatores I, II, V, VII, IX, X, XI, XIII e antitrombina. A trombina, por sua vez, agirá intensamente sobre o fibrinogênio transformando-o em fibrina (que poderá ser depositada na microcirculação), por este motivo o fibrinogênio encontra-se diminuído. Os produtos de degradação da fibrina (PDF) encontram-se aumentos, pela atividade aumentada do sistema fibrinolítico sobre a fibrina. Além disso, pode ser observada uma diminuição na contagem de plaquetas, resultado de sequestro esplênico. Em resumo, as hepatopatias graves predispõe à uma CIVD. No laboratório as alterações da hemostasia nas lesões hepáticas são avaliadas com dosagens dos fatores II, VII, IX, X e V, que, quando diminuídos, indicam lesão séria. Os fatores VIII e fvW são normais. O tempo de trombina (TT) alongado indica uma baixa do fibrinogênio. O tratamento hemorrágico das hepatopatias não é simples. A administração de vitamina K só é indicada quando há associação com quadro de má absorção de vitamina K. Nestes casos, com a administração da vitamina K parenteral pode-se corrigir apenas os fatores II, VII, IX e X. Nos casos mais graves, a reposição dos fatores com plasma fresco (que contém antitrombina) ou crioprecipitado (fonte de fibrinogênio) ou concentrado dos fatores II, VII, IX e X deve ser cuidadosa, pois corre o risco de favorecer uma CIVD. A transfusão de plaquetas pode ser indicada quando o número é inferior a 30.000/mm3. Inibidores adquiridos da coagulação Os inibidores adquiridos são substâncias do tipo auto- anticorpos que reagem contra fatores específicos da coagulação e se comportam como anticoagulantes. Estes auto-anticorpos são observados em pacientes acometidos por doenças auto-imunes (lúpus eritematoso sistêmico, p. ex.) e hemofilias. Quando o anticoagulante é dirigido contra um determinado fator, inativando-o, pode haver um quadro clínico hemorrágico. Já foram observados anticoagulantes dos fatores VIII, IX, XIII, V, XI e XII. Bibliografia • Hoffbrand AV, Pettit JE, Moss PAH. Fundamentos em hematologia. Artmed. 2004. • Lorenzi TF. Atlas de Hematologia, Clínica Hematológica Ilustrada. Guanabara Koogan. 2006. • Zago MA, Falcão RP, Pasquini R. Hematologia: Fundamentos e Prática. Atheneu. 2004.