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C A P Í T U L O 4 MECANISMOS DE FAGOCITOSE A CHEGADA DAS CÉLULAS NOS TECIDOS Quando ocorre uma infecção tecidual, o processo inflamatório local induz um aumento na migração de células do sangue para o tecido afetado (Capítulo 3). No tecido, estas células migram até o local da infecção seguindo um gradiente de concentração de fatores químicos denominados fatores quimiotáticos. Este movimento das células, em direção ao fator químico, dissociado nos tecidos, denomina-se quimiotaxia. Um outro tipo de movimento celular é a haptotaxia, que ocorre em direção à fatores aderidos numa célula, como é o caso da IL-8 ou do MCP-1, associados às membranas das células do endotélio vascular (Capítulo 3). Os principais fatores quimiotáticos, liberados durante um processo inflamatório, podem ser peptídeos de baixo peso molecular (Formil-Met-Leu-Phe), liberados por bactérias, como também peptídeos de fibrina e colágeno teciduais, oriundos da degradação por enzimas bacterianas ou celulares. Outros fatores quimiotáticos são produzidos a partir de ácidos graxos (ácido aracdônico), presentes nos fosfolipídeos de membrana das células ativadas no processo inflamatório, tais como o Tromboxano A2 (TBxA2) e o Leucotrieno B4 (LTB4). Outras moléculas que atuam como fator quimiotático são os peptídeos oriundos do sistema complemento tais como as moléculas denominadas C5a e C5bC6C7. (Como será estudado no Capítulo 10, o sistema complemento é um conjunto de proteínas ativadas em cascata de forma semelhante à ativação do sistema da coagulação. Estas proteínas, denominadas C1, C2, C3 ... C9 (C=Complemento), FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 24 são clivadas, durante uma resposta imune, em dois fragmentos denominados a e b, por exemplo: C5a e C5b, com diferentes atividades fisiológicas). Recentemente, foram descobertas citocinas de baixo peso molecular com atividade quimiotática; que são as chamadas quimiocinas. A IL-8 e a MCP-1, já estudadas no capítulo 3, são quimiocinas com atividade quimiotática sobre neutrófilos e monócitos/macrófagos, respectivamente. A partir do momento em que os neutrófilos e os monócitos chegam no local onde estão os microorganismos infectantes, estas células iniciam o processo de ingestão destas partículas através de um mecanismo conhecido como fagocitose. BREVE HISTÓRICO SOBRE A FAGOCITOSE A primeira descrição da fagocitose foi realizada, em 1882, por um cientista russo chamado Metchnikoff (1845-1916), que a partir desta observação, defendeu a hipótese de que a resposta imune é mediada exclusivamente por células. Na época, outros cientistas, tais como Koch e Pasteur, defendiam a idéia de que a resposta imune é humoral, ou seja, mediada por fatores solúveis presentes nos humores (líquidos do corpo). Hoje, como se sabe, tantos os defensores da teoria celular quanto da humoral, tinham razão e dá-se o nome de imunidade celular, aos mecanismos mediados por Linfócitos T e de imunidade humoral aos mediados por Linfócitos B. Quando estas denominações foram dadas, não se sabia que os linfócitos T também produzem moléculas solúveis, as quais são denominadas linfocinas; na época, acreditava-se que apenas os linfócitos B produziam este tipo de molécula, no caso as Imunoglobulinas (ou Anticorpos). FAGOCITOSE A fagocitose consiste de várias etapas: adesão, endocitose ou engolfamento, morte intracelular, digestão e no caso dos macrófagos, apresentação de peptídeos (oriundos da digestão da partícula estranha) na membrana. CAP. 4 - MECANISMOS DE FAGOCITOSE 25 1. Fase de adesão entre a célula fagocítica e o microorganismo Uma célula fagocítica pode ingerir vários tipos de partículas inertes tais como ágar, gelatina, carvão, eritrócitos danificados ou estranhos, carbono ou prata coloidal e partículas de óxido de ferro. A maioria destas partículas é ingerida de forma inespecífica sem a necessidade da associação com receptores de membrana nas células fagocíticas. No entanto, no caso de bactérias, que são extremamente móveis, a etapa inicial de adesão entre as células fagocíticas e as bactérias é mediada por receptores de membrana. Alguns destes receptores reconhecem açúcares comuns, presentes na membrana das bactérias, tais como a manose e a fucose enquanto que outros reconhecem moléculas de lipopolissacarídeo (LPS), presentes em bactérias gram- negativas (Figura 1). O receptor de LPS em macrófagos é denominado CD14 [CD = classe de diferenciação - esta sigla é utilizada para nomear uma série de moléculas, com diferentes funções, tais como receptores (CD14, CD16), moléculas de adesão (CD31) e moléculas co-estimulatórias (CD3)]. Para que a adesão entre os receptores das células (rMan/Fuc – receptor de Manose/Fucose, rLPS – receptor de LPS) e as moléculas de membrana das bactérias (Man/Fuc, LPS) ocorra, a célula fagocítica tem que entrar em contato com o microorganismo em superfícies teciduais e por isso raramente a fagocitose ocorre em meios fluidos. A fagocitose pode ocorrer também, com maior facilidade, quando a partícula estranha está presente num coágulo de fibrina, na superfície de um vaso ou tecido. FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 26 Figura 1 – Fagocitose mediada por receptores de Manose/Fucose (ou LPS) 2. Fase de endocitose ou engolfamento Após a adesão à membrana da célula fagocítica, a partícula estranha é endocitada por expansões citoplasmáticas do fagócito denominadas pseudópodes (Figura 1). Os pseudópodes formam uma vesícula intracelular denominada fagossomo, que consiste na própria membrana celular evertida. O fagossomo funde-se com os lisossomos celulares formando um fagolisossomo, no qual ocorre a liberação de enzimas lisossômicas. Antígenos não viáveis são rapidamente digeridos nos fagolisossomos. rMan/Fu Bactérias Fagossomo Pseudópode Retículo endoplasmático Lisossomos Fagolisossom Corpúsculo residual MHC + peptídeo Macrófago CAP. 4 - MECANISMOS DE FAGOCITOSE 27 3. Mecanismos de morte intracelular Quando o microorganismo fagocitado ainda encontra-se viável, antes da digestão por enzimas lisossômicas, mecanismos de morte intracelular são desencadeados. Os mecanismos de morte intracelular, induzidos nos neutrófilos e macrófagos, podem ser de dois tipos: Mecanismos de Morte Intracelular Independentes de Oxigênio. Estes mecanismos ocorrem pelo efeito citotóxico de moléculas, produzidas pelas células fagocíticas, geralmente em ambientes anaeróbicos. Estes mecanismos levam o microorganismo à morte pelo acúmulo de ácido láctico, proveniente do metabolismo anaeróbio da glicose. O acúmulo de ácido láctico leva à diminuição do pH intracelular (entre 4 e 5), criando um ambiente bactericida ou bacteriostático, dependendo da bactéria em questão. Este mecanismo ocorre em todos os fagócitos em repouso, exceto nos macrófagos alveolares, que estão presentes em ambiente rico em oxigênio. Outro fator atuante neste tipo de mecanismo é a lisozima, que pode hidrolisar a parede de bactérias gram- negativas. Proteínas catiônicas também podem interagir com bactérias com cargas elétricas negativas interferindo no transporte iônico e na sua sobrevivência. A produção de lactoferrina também contribui para que, com a retirada de ferro extracelular, a capacidade proliferativa das bactérias diminua (Capítulo 1). Mecanismos de Morte Intracelular Dependentes de Oxigênio. A endocitose de microorganismos, aumenta nas células fagocíticas, o consumo de oxigênio, o que desencadea o chamado desvio da hexose monofosfato (“a explosão respiratória”) e a formação de Intermediários Reativos de Oxigênio (ROI). A ativação destes mecanismosenvolve a participação de duas enzimas principais: 1. A NADP oxidase (Nicotinamida-Adenina Dinucleotídeo Fosfato oxidase), que remove um hidrogênio do NADPH para formar NADP+, convertendo simultaneamente o O2 em radical superóxido (••••O2 -). O radical superóxido, pela presença de um elétron não partilhado, torna-se extremamente reativo e é tóxico para várias espécies bacterianas. FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 28 2. A Superóxido dismutase (SOD), que atua sobre o radical superóxido e o converte em peróxido de hidrogênio (H2O2) e O2 simples, segundo a reação: •••• O2 - + •••• O2 - + 2H+ ⇒⇒⇒⇒ H2O2 + 1O2 O H2O2, produzido pela superóxido dismutase, é degradado pela mieloperoxidase, na presença de Cl- e I- para produzir hipoclorito (OCl-) ou hipoiodeto (OI-), também tóxicos para espécies bacterianas. H2O2 + CL - ⇒⇒⇒⇒ H2O + OCl - H2O2 + I - ⇒⇒⇒⇒ H2O + OI - O peróxido de hidrogênio pode reagir com o radical superóxido, na presença de ferro, produzindo oxigênio, íons hidroxila e radical hidroxila. •••• O2 - + H2O2 ⇒⇒⇒⇒ O2 + OH - + -OH O radical hidroxila é um produto de redução do elétron do H2O2 e o mais potente agente oxidante produzido em sistemas biológicos. Esta molécula também contribui para a morte intracelular. Mais recentemente, foi descoberta uma via de morte intracelular dependente de oxigênio que leva à produção de Intermediários Reativos de Nitrogênio (RNI). A principal molécula produzida por esta via é o óxido nítrico (NO), que é tóxico para bactérias, protozoários e células tumorais. Para que esta via seja induzida, os macrófagos precisam ser previamente ativados pelo TNF-α e pelo IFN-α/β (Interferon alfa/beta) ou IFN-γ (Interferon-gama). 4. Digestão e apresentação de antígenos Após a morte intracelular, alguns microorganismos tornam-se susceptíveis às enzimas lisossômicas. Estas enzimas degradam as partículas mortas atuando sobre açúcares, proteínas, lipídeos e ácidos nucleicos; dentre elas, estão a acetilglucosamina hidrolase, a fosfatase ácida, a ribonuclease ácida, a desoxirribonuclease ácida, a arilsulfatase, a colagenase, as catepsinas, a citocromo C redutase, a β-glucuronidase, a hialuronidase, a elastase, a esterase, a β-galactosidase, a lipase, a lisozima, a neuraminidase e a α-manosidase. CAP. 4 - MECANISMOS DE FAGOCITOSE 29 O processo digestivo que ocorre no macrófago ainda é pouco compreendido. Caso o material fagocitado seja intensamente digerido este é excretado por corpúsculos residuais (Figura 1). No entanto, quando o material fagocitado é digerido em peptídeos contendo de 8 a 30 aminoácidos, os macrófagos podem apresentá-los associados a proteínas presentes na sua membrana (Figura 1). Estas moléculas apresentadoras de peptídeos são denominadas moléculas de classe I e classe II do Complexo Principal de Histocompatibilidade (MHC - Major Histocompatibility Complex – Capítulo 7). Estes peptídeos são apresentados aos linfócitos T, que expressam receptores específicos para estas estruturas, ou seja moléculas do MHC associadas aos peptídeos (Capítulo 9). OUTROS MECANISMOS FAGOCÍTICOS Quando estudamos a natureza de qualquer fenômeno biológico temos que ter uma visão dos aspectos da evolução dos seus mecanismos ao longo da tempo. Esta visão inclui não só o conhecimento de todos os fatores ambientais atuantes no momento, como também aqueles anteriores, relativos ao tempo e espaço, que o levaram ao padrão atual. Ou seja, qualquer fenômeno natural é fruto das alterações ocorridas num determinado espaço físico, ao longo de um tempo, num processo que denominamos evolução. Outro aspecto que temos que ter em mente é que a natureza não é tendenciosa; ela não escolhe uma espécie para sobreviver e outra para ser extinta; ela propicia ao longo do tempo mecanismos adaptativos e as espécies de acordo com seu sucesso de relação com o ambiente sobrevivem ou perecem. Neste sentido, a fagocitose propiciou ao longo do tempo um mecanismo efetivo para que espécies de invertebrados e vertebrados impedissem a infecção por microorganismos de seu meio-ambiente. No entanto, estes mesmos microorganismos sofreram modificações que permitiram o escape frente à morte intracelular durante o processo de fagocitose. Alguns exemplos destes mecanismos: As micobactérias inibem a fusão dos lisossomos aos fagossomos, interferindo com o movimento dos lisossomos. O glicolipídeo fenólico de Mycobacterium leprae neutraliza as espécies reativas de oxigênio. FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 30 A hemolisina da Listeria monocytogenes inibe a morte intracelular, podendo inibir a apresentação de antígenos pelo macrófago. O Toxopasma gondii inibe a fusão do fagossomo aos lisossomos. O Trypanosoma cruzi lisa a membrana do fagossomo, antes da sua fusão aos lisossomos, e entra no citoplasma onde prolifera. A Leishmania inibe a síntese de óxido nítrico (NO), em macrófagos não ativados, tornando-os refratários a posteriores estímulos. OPSONIZAÇÃO Como pôde ser observado, vários microorganismos que são fagocitados evoluiram mecanismos de escape da morte intracelular e sobrevivem dentro da célula fagocítica. No entanto, algumas bactérias desenvolveram um mecanismo mais sofisticado que impede a aproximação das células fagocíticas: apresentam uma cápsula rica em polissacarídeos, que pela sua carga negativa, repele as células fagocíticas, que quando ativadas também apresentam um potencial negativo de membrana. Ao longo do tempo, no entanto, a natureza proporcionou que novos mecanismos de fagocitose surgissem e propiciassem a ingestão deste tipo de bactéria. Os cientistas hipotetizam que, provavelmente, neste período da evolução surgiu o mecanismo de opsonização. Como as células fagocíticas não conseguem aderir à estas bactérias, moléculas que permitem este tipo de associação precisam estar presentes para que a ingestão da partícula ocorra. As moléculas que permitem a ingestão destes microorganismos são as opsoninas (Figura 2). As opsoninas podem ser moléculas de imunoglobulinas (anticorpos das classes IgG1 e IgG3, nos seres humanos), moléculas do sistema complemento (C3b, C4b) e proteínas de fase aguda liberadas durante o processo inflamatório por células hepáticas (a Proteína C-reativa é uma delas). Para que a opsonização ocorra, as opsoninas devem revestir a superfície do patógeno e aderir a receptores específicos na membrana das células fagocíticas. A Proteína C-Reativa (PCR), uma das proteínas de fase aguda, atua nas fases iniciais da resposta inflamatória, antes que mecanismos mediados por linfócitos (neste caso, produção de Igs) tenham sido ativados. A produção desta proteína é induzida por citocinas pró-inflamatórias tais como o CAP. 4 - MECANISMOS DE FAGOCITOSE 31 TNF-α, as IL-1e IL-6 (Capítulo 3). Quando a PCR associa-se à superfície bacteriana, ocorre a ativação do sistema complemento pelas vias alternativa e clássica e por intermédio dos receptores para C3b/C4b, ocorre a opsonização (Figura 2). Nas fases mais tardias da resposta imune (ver abaixo respostas primária e secundária), a ativação dos linfócitos leva à produção de Imunoglobulinas que atuam como opsoninas, em associação com as moléculas do sistema complemento, ativadas pela via clássica (Capítulo 10). Após a fase de adesão da partícula à superfície da célula fagocítica, o processo de endocitose continua de forma semelhante à fagocitose normal. Figura 2 – Opsonização mediada pela Proteína C-reativa (PCR) e moléculas do Complemento RESPOSTA IMUNE PRIMÁRIA Quando um microorganismo entra, pela primeira vez, no corpo do hospedeiro, vai desencadear um tipode resposta denominada resposta imune primária. Nesta resposta, a produção de anticorpos é relativamente demorada, levando de 7 a 14 dias para ocorrer. Esta demora ocorre porque uma série de interações entre macrófagos, Linfócitos Tauxiliares e Linfócitos B são necessárias para que os C3b/C4b RC3b/C4b Macrófago PCR rPCR FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 32 anticorpos sejam produzidos nos linfonodos, que drenam o local da infecção. Os anticorpos são produzidos por linfócitos B ativados, que se tornam células secretoras de anticorpos, os plasmócitos. Na resposta imune primária, há uma produção predominante de anticorpos da classe IgM em relação à de outras Imunoglobulinas, tais como a IgG, a IgA e a IgE. Quando a IgM começa a ser produzida, ela associa-se à superfície dos microorganismos e propicia a ativação das moléculas do sistema Complemento pela via clássica (Capítulo 10). Como os macrófagos e neutrófilos não possuem receptores de membrana para a IgM não é possível a ocorrência da opsonização, ativada por esta Imunoglobulina. No entanto, como o sistema complemento é ativado, existem duas possibilidades: O microorganismo sofre lise pela ativação do sistema complemento, pela via clássica (Capítulo 10). A lise pelo complemento ocorre porque com a ativação destas moléculas ocorre a formação de poros na membrana do microorganismo, levando a um desequilíbrio osmótico. Na circulação sanguínea pela dificuldade de ocorrerem mecanismos de ingestão de partículas (fagocitose, opsonização), o principal mecanismo de morte é a ativação do sistema complemento. O microorganismo fica revestido das moléculas do sistema complemento (C3b ou C4b e C5a), que passam a ser reconhecidas pelos macrófagos, que têm receptores (CR1 e rC5a) para estas moléculas (Figura 3). Quando o microorganismo está revestido de IgM e as moléculas de C3b/C4b associam-se aos receptores específicos, na ausência de C5a, a opsonização é inibida. No entanto, na presença de C5a, que se associa a receptores específicos (rC5a), a interação entre C3bC4b e seus receptores, induz a opsonização. CAP. 4 - MECANISMOS DE FAGOCITOSE 33 Figura 3 – Mecanismo de opsonização mediado por receptores do sistema Complemento RESPOSTA IMUNE SECUNDÁRIA Durante a resposta imune primária, os plasmócitos (secretores de anticorpos) e muitos linfócitos T morrem após 2 ou 3 dias da sua ativação inicial. No entanto, durante esta resposta além das células efetoras (as que foram participativas na resposta) são formados linfócitos de memória, que não são ativados e são reservados para contatos posteriores com o mesmo mesmo tipo de partícula estranha (ou antígeno). Estes linfócitos de memória (LT e LB), num segundo contato com o mesmo antígeno, propiciam uma resposta mais rápida, com a produção de anticorpos em 2 a 3 dias. Esta resposta é denominada resposta imune secundária. Na resposta secundária, geralmente é produzida uma maior concentração de IgG (ou de IgA ou de IgE) e uma menor de IgM. A produção de IgG altera a forma com que o microorganismo pode ser destruído, porque enquanto que a molécula de IgM é altamente eficiente na ativação do sistema complemento, o mesmo não ocorre com a IgG. Isto é evidenciado pelo fato de uma única molécula de IgM poder causar um orifício na membrana celular pela ativação do sistema complemento, enquanto que este mesmo efeito é produzido por 2000 a 3000 moléculas de IgG. C3b/C4b IgM RC3b/C4b C5a - + Macrófago Receptor para C5a FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 34 Apesar da IgG não ser tão eficiente na ativação do sistema Complemento, esta Ig é importante no mecanismo de opsonização por dois principais motivos: as células fagocíticas expressam receptores para IgG. a IgG também ativa o sistema complemento e as células fagocíticas expressam receptores para C3b e C4b. Desta forma a opsonização pode ocorrer pelo reconhecimento de moléculas de IgG e do sistema complemento ligadas à membrana do microorganismo (Figura 4). Figura 4 – Opsonização mediada por moléculas de IgG e do sistema Complemento. Para compreendermos como as Igs reconhecem os antígenos e associam-se a receptores de membrana da célula fagocítica temos que conhecer a estrutura destas moléculas (Figura 5). ESTRUTURA DAS IMUNOGLOBULINAS A estrutura das Imunoglobulinas será abordada de forma mais detalhada no capítulo 7; aqui serão feitas algumas considerações para que seja compreendido como estas moléculas exercem a dupla função de reconhecimento do antígeno e de associação a receptores na membrana das células. IgG rFcIgG + Macrófago rC3b/C4b C3b/C4b CAP. 4 - MECANISMOS DE FAGOCITOSE 35 As Imunoglobulinas são proteínas constituídas de 4 cadeias polipeptídicas sendo que duas delas apresentam peso molecular alto (PM = 55 a 70 kilodaltons [kD]) e as outras duas, peso molecular menor (PM = 24 kD). As cadeias de alto e baixo PM são denominadas, respectivamente, cadeias pesadas e leves (Figura 5). Ambas cadeias possuem regiões em que as sequências de aminoácidos são constantes (em tons de verde, na figura 5) e regiões em que as sequências são variáveis (em vermelho pálido, na figura 5). As regiões variáveis das cadeias leves e pesadas são as responsáveis pelo reconhecimento de sequências de aminoácidos presentes na superfície de um microorganismo ou outro tipo de antígeno. As regiões constantes das cadeias pesadas são as responsáveis pela associação à receptores presentes em células, tais como os receptores para Igs em macrófagos, que permitem a ocorrência da opsonização. Quando as Igs são submetidas à digestão enzimática, estas se dissociam em três fragmentos: dois Fab (Fragment antigen binding - fragmento que se associa ao antígeno) e um Fc (Fragmento que se cristaliza). Cada Fab é formado pela cadeia leve e por um pedaço de cadeia pesada e o Fc é formado por um fragmento de cadeia pesada (Figura 5). Desta forma, durante a opsonização, o Fab associa-se à superfície do antígeno, enquanto que o Fc, aos receptores para Fc presentes na célula. As Igs possuem diferenças nas regiões Fc (Capítulo 7) e por isso existem receptores específicos para a IgG (e suas subclasses IgG1,IgG2, IgG3 e IgG4), a IgA e as outras Igs. No início deste capítulo, foi mencionado que as IgG1 e IgG3 humana são opsoninas; elas têm esta função porque os macrófagos apresentam receptores somente para estas duas subclasses de Igs. Em síntese, foi visto que: quando um microorganismo está envolvido por anticorpos do tipo IgM, ele pode ser eliminado por lise pelo sistema complemento ou por opsonização via receptores para C3b/C4b (CR1) e C5a (rC5a), oriundos da ativação do sistema complemento e que este mecanismo é mais comum nas respostas do tipo primário. FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 36 Quando um microorganismo está revestido por anticorpos do tipo IgG, ele pode ser eliminado por lise pelo sistema complemento ou por opsonização via receptores para IgG1 e IgG3 e receptores para moléculas C3b/C4b do complemento. Figura 5 – Estrutura das Imunoglobulinas CITOTOXICIDADE CELULAR DEPENDENTE DE ANTICORPOS (ADCC) Quando o antígeno é uma célula tumoral ou um verme helminto, e estes estão revestidos de anticorpos, não existe possibilidade física de ingestão destas partículas, pelo macrófago, porque estas são do mesmo tamanho da célula fagocítica. O mecanismo pelo qual células do sistema imune destróem ou lesionam estes antígenos, por extravasamento de produtos tóxicos, dá-se o nome de Citotoxicidade Celular Dependente de Anticorpos (ADCC). Neste tipo de mecanismo,uma célula mata outra, na dependência da presença de anticorpos. A ADCC ocorre quando uma célula tumoral está revestida de IgG1 e/ou IgG3 e macrófagos e/ou células NK, que possuem receptores para estas Igs, acoplam-se a ela (Figura 6). As células tumorais são mortas pelo macrófago pela secreção dos mesmos produtos que internamente matam bactérias, ou seja, Região variável Região constante Fab Fc Cadeia Leve Cadeia Pesada Região variável Região constante CAP. 4 - MECANISMOS DE FAGOCITOSE 37 produtos tóxicos oriundos do oxigênio (peróxido de hidrogênio, ânion superóxido), produtos oriundos do nitrogênio (NO) e enzimas lisossômicas. A morte mediada pelas células NK é mediada pela liberação de perforina e granzima. O mesmo ocorre quando vermes helmintos estão revestidos de IgE e eosinófilos acoplam-se às IgEs através de seus receptores para a porção Fc desta Ig (Figura 7). Os vermes são lesionados pela ação de uma proteína de alto peso molecular presente no centro dos grânulos dos eosinófilos - a Proteína Básica Principal (Capítulo 2). FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 38 Figura 6 – Mecanismo de ADCC mediado por macrófagos e células NK Figura 7 - Mecanismo de ADCC mediado por eosinófilos NK Cél. tumoral rFcIgG1 M∅∅∅∅ TNF-αααα ROI NO enz.lisoss. Granzima, Lisozima RFcIgG3 Helminto rFcIgE IgE Proteína Básica Principal Eosinófilo MECANISMOS DE FAGOCITOSE A CHEGADA DAS CÉLULAS NOS TECIDOS BREVE HISTÓRICO SOBRE A FAGOCITOSE FAGOCITOSE 1. Fase de adesão entre a célula fagocítica e o microorganismo Figura 1 – Fagocitose mediada por receptores de Manose/Fucose (ou LPS) 2. Fase de endocitose ou engolfamento 3. Mecanismos de morte intracelular 4. Digestão e apresentação de antígenos OUTROS MECANISMOS FAGOCÍTICOS OPSONIZAÇÃO Figura 2 – Opsonização mediada pela Proteína C-reativa (PCR) e moléculas do Complemento RESPOSTA IMUNE PRIMÁRIA Figura 3 – Mecanismo de opsonização mediado por receptores do sistema Complemento RESPOSTA IMUNE SECUNDÁRIA Figura 4 – Opsonização mediada por moléculas de IgG e do sistema Complemento. ESTRUTURA DAS IMUNOGLOBULINAS Figura 5 – Estrutura das Imunoglobulinas CITOTOXICIDADE CELULAR DEPENDENTE DE ANTICORPOS (ADCC) Figura 6 – Mecanismo de ADCC mediado por macrófagos e células NK Figura 7 - Mecanismo de ADCC mediado por eosinófilos
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