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MATÉRIA DE CAPA POLÍTICA ELEITORAL E A DESAPROVAÇÃO DE "ONTASDECAMPANH" "Corretamente disciplinou o e. TSE, na Resolução n° 23.376/12, a desaprovação de contas como falta de quitação eleitoral. Trata-se de regra de responsabilização política traduzida por candidatos eleitos, ou não, que participam do regime democrático e recebem o sufrágio dos eleitores, após devidamente escolhidos pelos partidos políticos." • POR MARCOS RAMAYANA Os gastos realizados durante o período de pro-paganda política eleitoral devem ser devida-mente contabilizados na prestação de contasdos candidatos.Significativa é a decisão do c. Tribunal Superior Eleitoral, no Recurso Especial Eleitoral n° 28.448-AM, em que a Corte verificou: (i) que não foram distribuídos pan- fletos antes da obtenção de CNPJ e de abertura de conta bancária específica para a campanha; (ii) ser falso o próprio CNPJ; (iii) ter havido a distribuição de banners sem conta- bilização na despesa das contas; e (iv) ter ocorrido divul- gação de minidoors e cartazes de papel sem contabilização. RECURSO ESPECIAL. ELEITORAL. ELEIÇÕES 2006. SENADOR. REPRESENTAÇÃO. ARRECADAÇÃO E GASTO ILÍCITO DE CAM- PANHA. OCORRÊNCIA. SANÇÃO. PROPORCIONALIDADE. [...]. (Rei. Min. Marco Aurélio, Rel.a para acórdão Min.a NANCY ANDRIGHI,DJ 10.05.12.) No exame do conjunto de atos ilícitos eleitorais, não foi afe- tado o princípio da proporcionalidade. Com isso, os gastos não contabilizados, efetuados na propaganda das campanhas elei- torais, podem ensejar a desaprovação das contas nas eleições municipais de 2012, por acarretar a falta de quitação eleitoral. Normalizando as eleições municipais de 2012, o e. TSE expediu a Resolução n° 23.376, de 1° de março de 2012, assim disciplinando: Art. 52. A decisão que julgar as contas dos candidatos eleitos será publicada até 8 dias antes da diplomação (Lei n° 9.504/97, art. 30, § 1°). § 1° Na hipótese de gastos irregulares de recursos do Fundo Partidário ou da ausência de sua comprovação, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor cor- respondente ao Tesouro Nacional no prazo de 5 dias após o seu trânsito em julgado. § 2° Sem prejuízo do disposto no § 1 °, a decisão que desa- provar as contas de candidato implicará o impedimento de obter a certidão de quitação eleitoral. O art. 11, § 7°, da Lei das Eleições (n° 9.504/97), de forma literal, nega a quitação eleitoral (que é fornecida pela Jus- tiça Eleitoral) aos que deixaram de apresentar as contas das campanhas eleitorais, mas não faz menção expressa à desaprovação destas. A questão é saber se o § 2° do art. 52 da Resolução TSE n° 23.376/12 poderia incluir a desaprovação como uma das hipóteses de ausência de quitação eleitoral. Formam-se dois posicionamentos: o primeiro é o de que a resolução é um ato normativo secundário e estaria limitada apenas como regulamento a disciplinar o teor da Lei n° 9.504/97, sem restringir direitos ou estabelecer sanções distintas das previstas nesta lei. Trata-se da dicção do art. 105 da própria Lei das Eleições. Para os que seguem o enten- dimento literal, o poder regulamentar é de função norma- tiva subordinada; é um poder limitado. Desta forma, como ensina José Afonso da Silva" [...] não é poder legislativo; não pode, pois, criar normatividade que inove a ordem jurídica. Seus limites naturais situam-se no âmbito da competência executiva e administrativa, onde se insere. Ultrapassar esses limites importa abuso de poder, usurpação de competência, torna-se irrito o regulamento dele proveniente".1 Um segundo entendimento leva em consideração a análise teleológica e até sistêmica da subfase do processo eleitoral relativa à prestação de contas de campanhas, con- siderando o arcabouço legislativo eleitoral que se encontra vigente. Sem dúvida é o caminho correto, até porque as resoluções têm força de lei. Com efeito, reafirmamos a posição de que a desapro- vação de contas, especialmente por irregularidade insa- nável, é decorrente de um julgamento cuja natureza jurídica é judicial, o que permite a ampla defesa e o contraditório. 44 REVISTA JURÍDICA CONSULEX - ANO XVI - N° 370 - 15 DE JUNHO/2012 O maior percentual dos casos em que as contas de campanhas são julgadas irregu- lares tratam de referências às falhas que não traduzem gravidades. São fatos não desprezíveis, mas que não desequilibram as campanhas eleitorais, como a ausência de certos recibos. Cada caso merece especial análise e deve ser examinado com suas particularidades pela Justiça Eleitoral. Não se trata aqui, evidentemente, de pretender sobrepor o texto da Resolução (ato normativo secundário) à dicção da Lei das Eleições, pois, como previsto no art. 105 supra- citado, não é possível estabelecer sanções distintas. À primeira vista, podemos interpretar que a Resolução TSE n° 23.S76/12 seria ilegal. Não é a melhor solução. Um exame mais rigoroso da questão nos permite concluir pelo acerto do texto normativo, considerando alguns pontos fundamentais. O art. 105 da Lei n° 9.504/97 impõe que as resoluções expedidas em razão do poder normativo da Justiça Eleitoral não estabeleçam sanções distintas "das previstas nesta Lei". Assim, observamos que a desaprovação das contas por irregularidade insanável não se limita à violação apenas de dispositivos da Lei das Eleições, mas também do Código Eleitoral e, principalmente, da Lei dos Partidos Políticos (n° 9.096/95), da qual citam-se alguns dispositivos interli- gados à desaprovação das contas de campanhas eleitorais: • Art. 33, inciso III- Inclui as despesas de caráter eleitoral com especificação de gastos nos balanços contábeis dos par- tidos políticos, que devem ser encaminhados anualmente à Justiça Eleitoral; • Art. 34, caput - É expresso ao determinar que a Jus- tiça Eleitoral fiscalize as despesas de campanhas eleitorais, inclusive "devendo atestar se elas refletem adequadamente a real movimentação financeira, os dispêndios e recursos aplicados"; • Art. 34, inciso V- Estabelece a obrigatoriedade da pres- tação de contas dos candidatos no encerramento das cam- panhas, com recolhimento imediato à tesouraria do partido dos saldos financeiros eventualmente apurados; e • Art. 61 -Autoriza o TSE a expedir resoluções para a fiel execução da lei, sem limitar as sanções distintas nos termos do art. 105 da Lei das Eleições. Frisamos que o art. 1°, parágrafo único, do Código Elei- toral, e o art. 61 da Lei dos Partidos Políticos também auto- rizam a edição de resoluções pelo TSE, com a finalidade de regulamentar todas as fases e subfases do denominado processo eleitoral. A preferência de uma regra estará sempre na lei. No entanto, não se pode presumir que a lei disponha sobre todos os detalhes da legislação eleitoral, principalmente quando a função da resolução é exatamente coadunar diversos dispositivos legais e determinar a melhor inter- pretação da Justiça Eleitoral em prol da normalidade e legitimidade das eleições. À vista do exposto, podemos concluir que a desaprovação de contas se insere nos moldes do art. 3° do Código Elei- toral, quando firma que "qualquer cidadão pode pretender investidura em cargo eletivo, respeitadas as condições cons- titucionais e legais de elegibilidade e incompatibilidade"; bem como na moldura do inciso II do § 3° do art. 14 da Lei Maior, o qual estabelece como condição de elegibilidade, na forma da lei [o que inclui não apenas a Lei das Eleições, mas o próprio Código Eleitoral e a Lei dos Partidos Políticos], o pleno exercício dos direitos políticos. Os direitos políticos, hodiernamente, se inserem em um trinômio indissociável: eleitor, partido político e can- didato. É suficiente observar os termos da Resolução TSE n° 22.610/07, que disciplina a perda do mandato eletivo por desfiliação partidária sem justa causa para se deduzir, com acerto, que os partidos políticos e seu regular funcio- namento, incluindo as regrasde prestação de contas, fazem parte da essência das condições de elegibilidade. Por outro lado, a falta de quitação eleitoral não é matéria reservada a lei formal, pois as resoluções que são pautadas na sistematização da legislação eleitoral possuem sua gênese na autorização da própria lei, em especial o art. 1°, parágrafo único, do Código Eleitoral; o art. 105 da Lei das Eleições; e o art. 61 da Lei dos Partidos Políticos, que delegam competência normativa a favor da fonte do Direito Eleitoral (resoluções eleitorais). Não há reserva legal abso- luta quanto a esta disciplina, até porque a falta de quitação eleitoral não é causa de inelegibilidade, mas de ausência infraconstitucional de condição de elegibilidade. A disciplina das inelegibilidades está reservada ao campo normativo de lei complementar. De fato, a desaprovação de contas se insere na categoria de falta de condição de elegibilidade. Observamos ainda que: • Os limites de gastos de recursos são incluídos nos da própria candidatura, sujeitando-se os responsáveis pela extrapolação dos mesmos à multa de 5 a 10 vezes a quantia em excesso, além de eventual responsabilização por abuso do poder econômico (art. 18, § 2°, Lei das Eleições; e art. 3°, § 5°, Resolução TSE n° 23.376/12). • A arrecadação de recursos para campanha eleitoral só pode ser feita mediante recibo eleitoral com numeração seriada (arts. 4° e 5°, Resolução TSE n° 23.S76/12). • Somente com a criação de comitês financeiros, devi- damente registrados, é que se podem arrecadar recursos para as campanhas (art. 19, caput e § 3°, Lei das Eleições). • É obrigatório ao candidato abrir conta bancária espe- cífica para movimentar os recursos da campanha (art. 22, Lei das Eleições; e art. 12, Resolução TSE n° 23.376/12). t> REVISTA JURÍDICA CONSULEX - WWW.CONSULEX.COM.BR 45 MATÉRIA DE CAPA • A movimentação de recursos financeiros que não seja por conta específica acarreta a desaprovação de contas de campanhas eleitorais (art. 22, § 3°, Lei das Eleições; e art. 17, Resolução TSE n° 23.376112). • As doações devem ser feitas para os candidatos por meio de cheques cruzados e nominais, transferências ban- cárias, boletos de cobrança, cartão de crédito ou de débito, depósitos em espécie, doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, fazem parte da pres- tação de contas e podem ensejar sua desaprovação (art. 22, Resolução TSE n° 23.376712). • A prestação de contas pode detectar recursos ilícitos decorrentes de fontes vedadas (art. 24, incisos I a XI, Lei das Eleições; e art. 27, Resolução TSE n° 2S.376/12). • Os recursos de fontes vedadas deverão ser transfe- ridos ao Tesouro Nacional (art. 27, § 1°, Resolução TSE n° 23.376/12). • O material impresso de campanha também está adstrito ao controle na prestação de contas (art. 38, Lei das Eleições). • A prestação de contas dos comitês financeiros é feita em conjunto com a prestação de contas da direção municipal do partido político (art. 36, Resolução TSE n° 23.376/12), sujeitando os responsáveis às sanções que atingem o repasse do Fundo Partidário (art. 25, Lei das Eleições). Assim, não há ofensa ao art. 105 da Lei n° 9.504/97 nas determinações da Resolução TSE n° 23.376/12, conside- rando que não estão sendo estabelecidas sanções distintas, mas a correta interpretação finalística da legislação eleitoral que envolve os artigos acima referidos e outros contidos na Lei n° 9.096/95, pois o partido político que descumpre normas referentes à arrecadação financeira e gastos de recursos (que compreende os gastos em campanha elei- toral) acarreta reflexos ao candidato na prestação de contas. Ressalte-se que, normalizando as eleições de 2008, o c. TSE expediu texto de Resolução (n° 22.71.5/08) similar ao atual, tratando a desaprovação das contas como falta de quitação eleitoral. Destaca-se: Art. 41. A decisão que julgar as contas dos candidatos eleitos será publicada em até 8 dias antes da diplomação (Lei n° 9.504/97, art. 30, § 1°). § 1° Desaprovadas as contas, o juízo eleitoral remeterá cópia de todo o processo ao Ministério Público Eleitoral para os fins previstos no art. 22 da Lei Complementar n° 64/90 (Lei n° 9.504/97, art. 22, § 4°). § 2° Na hipótese de aplicação irregular de recursos do Fundo Partidário ou da ausência de sua comprovação, a decisão que julgar as contas determinará a sua devolução ao Erário. § 3° Sem prejuízo do disposto no § 1 °, a decisão que desa- provar as contas de candidato implicará o impedimento de obter a certidão de quitação eleitoral durante o curso do mandato ao qual concorreu. Com a vigência da Lei n° 12.034/09, o texto acima, por omissão do legislador, não foi incorporado ao § 7° do art. 11 da Lei n° 9.504/97, incluindo-se apenas a "não apre- sentação das contas", o que produz, de forma inequívoca, um vazio normativo que gera força matriz necessária para restabelecer a normalidade da legislação eleitoral e da efe- tividade da prestação de contas de campanhas, refletindo o controle do uso do dinheiro e da publicidade nas eleições. Corretamente disciplinou o e. TSE, na norma reguladora, a desaprovação de contas como falta de quitação eleitoral. Trata-se de regra de responsabilização política traduzida por candidatos eleitos, ou não, que participam do regime democrático e recebem o sufrágio dos eleitores, após devi- damente escolhidos pelos partidos políticos. Por fim, compete aos juizes eleitorais, nas eleições muni- cipais, examinarem se a causa de desaprovação das contas do candidato referente à eleição pretérita é proporcional, ou seja, se subsistem fundamentos razoáveis para impedir a quitação eleitoral que representa uma falta de condição de elegibilidade, pois a generalidade da imposição contida na nova resolução não nos parece o caminho mais correto. Não se perquire sobre a gravidade da causa de desapro- vação, mas sim, frisamos, de sua razoabilidade. O essen- cial é verificar se a desaprovação das contas de campanhas eleitorais defluiu de fato ilegal, com repercussão razoável no equilíbrio da competição eleitoral. O efeito temporal da duração da causa de desaprovação como falta de quitação eleitoral deve ser contabilizado em razão do tempo do mandato eletivo a que concorreu o ex-candidato. O ônus da prova e a juntada aos autos da documentação que desaprovou as contas cabe ao próprio candidato inte- ressado na obtenção de seu registro, que insatisfeito com a decisão de rejeição da candidatura poderá recorrer ao Tribunal Regional Eleitoral, no prazo de três dias, na forma do art. 56 da Resolução TSE n° 23.376/11 e do art. 30, § 5°, da Lei n° 9.504/97. Não havendo alteração da regra normalizada para as próximas eleições municipais, serão consideradas as desa- provações de eleições pretéritas. Todavia, a desaprovação das contas de campanha das eleições de 2012 causam efeitos nas candidaturas para eleições futuras, o que enseja maior responsabilidade do candidato nos gastos com a propaganda política. • NOTA 1 In: Curso de Direito Constitucional positivo. 28. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 426. MARCOS RAMAYANA é Procurador de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Autor das obras Resumo de Direito Eleitoral: Direito Eleitoral; Código Eleitoral Comentado e Direito Eleitoral - Questões Resolvidas. 46 REVISTA JURÍDICA CONSULEX - ANO XVI - N° 370- 15 DE JUNHO/20.12- ,-, i ',' i"' "ti >" . •.. ' V ;-. \? *
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