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Importância e valoração 
da Biodiversidade
Enrico Bernard
Laboratório de Ciência Aplicada à 
Conservação da Biodiversidade
Depto. de Zoologia - UFPE
Introdução
• As atividades humanas estão alterando o 
planeta.
• O nível e a extensão destas atividades podem 
variar de uma escala local até planetária.
• Um certo nível de alteração é esperado, 
necessário e tolerável uma vez que humanos 
precisam sobreviver.
• Mas o grau da alteração atingiu níveis 
alarmantes.
Responsabilidade moral?
• Se a espécie humana é a maior causadora de 
impactos, caberia também a ela a 
responsabilidade moral de proteger o meio 
ambiente.
• Gerações futuras dependem do meio ambiente.
• Ao evitar a extinção por causas não-naturais, o 
homem estaria sendo ético, e justo com as 
gerações futuras. 
• Cautela: má interpretações e extremismos…
Percepção do problema
Pesquisa de prioridades ambientais com 119 países
Fonte: GEF 2010/UNEP Yearbook 2011
Níveis de Biodiversidade
– Espécies e suas variabilidades genéticas (história evolutiva, pool gênico, 
polimorfismo, variabilidade → adaptabilidade)
– Populações e suas espécies (trocas gênicas, meta-populações, 
recolonização)
– Comunidades e suas espécies (relações evolutivas, relações 
ecológicas)
– Ecossistemas e suas comunidades (fluxo de matéria, serviços 
ecosistêmicos, estabilidade de processos vitais)
– Todos os processos por eles desempenhados
↔ ↔
Mudança de abordagem
Conservar a biodiversidade
Conservar e valorar os 
serviços por ela prestados
Tipos de valores
Instrumental ou Utilitário
Intrínseco ou Inerente
A classificação de um valor depende do ponto de 
vista, do interesse e do envolvimento pessoal:
Antropocêntrico X Biocêntrico
Valores Inerentes da Biodiversidade
Valor espiritual
Local de orações, de práticas e rituais; canal de 
contato com o universo espiritual. 
Refletir sobre a nossa própria existência, valores 
e perspectivas
Valores Inerentes da Biodiversidade
Valor de reflexão
A beleza “das coisas”, da diversidade, das 
diferentes manifestações, formas e detalhes; 
experiências cognitivas 
Valores Inerentes da Biodiversidade
Valor estético
Apreciação e contemplação; recreação 
Valores Inerentes da Biodiversidade
Valor apreciativo
Valores instrumentais ou utilitários
Bens
- ex.: Matéria prima, alimento, combustíveis, fibras, 
fármacos… 
Serviços
- ex.: Polinização, ciclagem de nutrientes, fixação de 
nitrogênio, decomposição, regulação 
homeostática…
Informação
- ex.: soluções evolutivas, sugestões de design, 
abordagens práticas, repositório de dados…
Outros valores da Biodiversidade?
Valor geo-político?
Brasil detém:
- cerca de 15 a 20% da biodiversidade mundial
- o último grande bloco de florestas tropicais 
(Amazônia)
- um estoque de carbono capaz de influenciar o 
clima do planeta
- Cerca de 12% da água doce do planeta
Estimativa de valor de alguns mercados associados 
à bens biodiversidade
Fármacos: 118 dos 150 remédios mais prescritos dos EUA se 
originam de fontes naturais.
Alimento: Trigo, arroz e milho respondem por 60% das calorias e 
56% das proteínas consumidas pela humanidade.
Só o mercado de trigo movimenta cerca de US$ 120 bi/ano
9 dos 25 
produtos mais 
importantes
7 dos top 10
~20% do $ 
comercializado
A participação de bens da biodiversidade na 
Balança Comercial Brasileira
A Biodiversidade como 
fonte de informação
Baiacu
28 km/l
Biodiversidade, bem estar e saúde
Alterações na biodiversidade e doenças emergentes
Febre amarela, malária, leishmaniose, doença de Chagas, dengue, 
encefalite do Oeste do Nilo, hantaviroses, arboviroses, 
esquistossomose, mal de Lyme, raiva, dissenteria, asma…
Quitridiomicose → maior ameaça atual a sobrevivência de algumas 
espécies de anfíbios 
Alterações na biodiversidade e doenças emergentes
Montira et al. 2009. BioScience 59(11)
Serviços de Ecossistema
são benefícios diretos e indiretos
que os ecossistemas provém para
os humanos
Dúvida frequente
• A biodiversidade é um serviço ecosistêmico?
– Não. Embora frequentemente confundida, a 
biodiversidade em si não é um SE, mas suporta 
vários SE. 
Mostrar Tabela Ecosystem Service, de Groot 2002
Uma classificação para a natureza 
das funções de ecosistema
• Funções de fonte: provém recursos para as 
atividade humanas
• Funções de sumidouro: absorvem, 
neutralizam e reciclam sub-produtos da 
atividade humana
• Funções de suporte à vida: agem para a 
manutenção dos ecosistemas e seu 
funcionamento
• Funções de saúde e bem-estar humano: 
contribuem diretamente para a saúde e bem 
estar humano
Outra classificação para a natureza 
das funções de ecosistema De Groot et al. 2000
• Funções de regulação: capacidade dos ecosistemas 
de regular processos ecológicos essenciais e 
sistemas de suporte à vida
• Funções de habitat: provém refúgio, abrigo e habitat 
reprodutivo para as espécies
• Funções de produção: conversão de energia e 
matéria por autótofros para uso pelos demais 
organismos 
• Funções de informação: oportunidades para reflexão, 
enriquecimento espiritual, desenvolvimento cognitivo, 
recreação e experiências estéticas.
1997: valoração econômica de 17 SE em 16 biomas do 
planeta → US$ 33 trilhões por ano.
1997: PIB de todos os países juntos → U$ 18 
trilhões por ano.
Super citado e super criticado…
Críticas desde a metodologia (super-estimada ou sub-estimada), até o custo 
real (A EXTINÇÃO)
Novo cálculo de 1997 a 2011:
- US$ 125 a 145 trilhões/ano
Cálculo da perda de serviços em função de 
desmatamento e degradação:
- US$ 4.3 a 20.2 trilhões/ano
Serviços de regulação das florestas
• Florestas do planeta contém um estoque 
estimado de 547 Gt de carbono (Trumper et al. 2009)
• Elas podem ainda sequestrar até 4.8 Gt de 
carbono/ano (Lewis & White 2009)
• Usando-se de US$ 7.00 a 15.00/tonC
►Estoque: US$ 3.8 a 8.2 trilhões
► Sequestro anual: US$ 33.6 a 72 bilhões/ano
Colocar um preço na Natureza?
• Há valoração porque nem todos são sensíveis ao 
valor intrínseco. Valoração é mais paupável.
• Ao dar valor, a Economia mostra-se interessada.
• Há a valoração porque há problemas (reconhecimento
de impactos).
• Há valoração porque os bens naturais estão se 
tornando escassos.
• Há valoração porque sem ela não há como estimar o 
impacto econômico sobre o meio ambiente (quantificar 
→ avaliar → priorização).
• A estimativa de valoração pode influenciar no 
processo de tomada de decisões (comparar benefícios e 
desvantagens de diferentes projetos; maximizar o 
investimento).
• A valoração gera incentivos para o uso racional (dói 
no bolso).
Tipos de Valores
• Valor de Uso Direto: é o valor de mercado atual dos 
bens ou serviços (ex.: prancha de imbuia R$ 2.683,00/m3; bacalhau 
do Porto R$ 89,90/kg)
• Valor de Uso Indireto: preço que custaria o bem ou 
serviço se fosse pago (ex.: polinização por insetos) 
• Valor de Opção: valor potencial de uso futuro (ex. 
Composto de uma planta que as pesquisas mostram potencial para cura) 
• Valor de Existência: valor que as pessoas estariam 
dispostas a pagar para garantir a existência ou evitar 
a destruição de um bem ou serviço (ex.: quanto você pagaria 
para salvar a ararinha azul?)
• Valor de Legado: valor que as pessoas estariam 
dispostas a pagar para deixar um recurso ou serviço 
para as próximas gerações (ex.: quanto você pagaria para que 
seus filhos tivessem ar e água limpos na cidade de Recife até 2080?)
VALOR ECONÔMICO TOTAL DO 
AMBIENTE
Valores de Não UsoValores de Uso 
Valor de Uso 
Direto
O que pode ser 
consumido: alimento, 
biomassa, recreação, 
saúde.
Valor de Uso 
IndiretoValor de 
Opção
Valor de 
Existência
Valor de Legado
Benefícios 
Funcionais: 
funções ecológicas, 
controle de cheias, 
proteção contra 
tempestades, 
qualidade do ar, da 
água, beleza cênica
Valores de uso futuro 
direto e indireto: 
biodiversidade,
Preservação de 
habitats
Valor atual da 
existência: habitats, 
espécies em extinção
Valores de 
conservação para as 
próximas gerações: 
habitats, mudanças 
irreversíveis
Valor Econômico Total
VET = VUD + VUI + VO + VE + VL
Se algumas das variáveis não estão claras…
… o VET também não o será.
Problemas…
• Há um grande grau de incerteza...
• ... que pode levar à uma sub-estimativa do real 
valor.
• Um baixo valor encontrado pode desmotivar a 
sua conservação.
• Pode haver uma enorme variabilidade caso-a-
caso.
• Tomadores de decisões podem fazer mal-uso
das estimativas (se o valor encontrado for “baixo”, o bem 
ou serviço pode ser “vendido”) 
• Estimar o real valor pode custar caro e ser 
demorado (mais caro que o preço encontrado…)
Valoração da Biodiversidade
A valoração da biodiversidade é 
um desafio teórico e prático
para as Ciências Econômicas.
A valoração leva à 
questionamentos de métodos e 
justificativas.
Quanto vale um serviço de ecosistema?
• Alguns serviços não são facilmente mensuráveis (ex.: 
um dia de lazer num parque; a vista da mata da janela)
• Alguns serviços não produzem benefícios diretos (ex.: a 
vista em si pode não ter valor, mas pode levar a um melhor ambiente de 
trabalho → maior produtividade)
• Embora as pessoas dêem valor aos bens públicos, 
elas não se sentem incentivadas à pagar por eles. (ex. 
praias!)
• Se os direitos de propriedade para bens públicos não 
são claramente definidos, estes bens tendem a ser 
super-explorados, porque não há incentivos para sua 
conservação (ex. estoques de pesca)
Dilemas da valoração da biodiversidade
• Nem todo recurso gera benefícios perceptíveis para o usuário 
direto (ex. polinização, dispersão de sementes, decomposição)
• Para os recursos que geram, a decisão de conservá-los ou não 
é resultado de uma percepção de ganho financeiro privado, 
quando comparado com outros usos do solo ou do meio 
aquático. (Vale conservar diante da possibilidade de ganho real?)
• Problema: a maioria destes benefícios não tem valor de 
mercado (Quanto vale a dispersão de sementes por morcegos?)
• Ou são realizáveis somente no longo prazo (ex. efeitos da poluição)
• O horizonte temporal do usuário não permite que ele perceba 
estes benefícios (resultado: velhos agricultores e madeireiros arrependidos)
• O usuário pode ser influenciado pelo imediatismo
• Ecosistemas são complexos e podem apresentar relações 
indiretas (ex. recarga de manaciais, florestas e dispersão)
• Pode ser difícil para o usuário perceber estas relações
• Ele pode exaurir ou degradar os recursos sem perceber
relações diretas.
Adams et al. 2008 – WTP - Morro do Diabo S.P. – Atlantic Forest - 60.39
Rentabilidade da soja: 8-12 sacas/ha X US$ 17.00/saca (atual) 240-360
Rentabilidade do milho: 50-100 sacas/ha X US$ 7.00/saca (hist.) 350-700
(Pode haver 2 a 3 safras por ano!)
Valor estimado (US$/ha/ano) para algumas áreas 
protegidas no Brasil
A percepção do usuário: o 
exemplo dos “Rios Voadores”
• “Rios Voadores”: grandes volumes de vapor d’água 
que percorrem a Floresta Amazônica de leste para 
oeste
• Se iniciam em Belém e vão até São Paulo.
• Volume de um destes rios voadores: 3.200 m³/s
(Iguaçú ~ 2.500 m3/s na cheia!)
• Volume de 1 dia = consumo de água dos paulistanos 
por 115 dias ou a 27 vezes a vazão do Rio Tietê.
• No Pantanal, 85% das chuvas retornam para a 
atmosfera e chegam a SP em 24 horas. 
Métodos de Valoração
Valorar alguns bens e serviços é complexo.
Uso de substitutos: técnicas que indicam o valor 
atribuído aos beneficiários da conservação dos 
ecossistemas, das espécies ou dos serviços 
oriundos da natureza.
Métodos de Valoração
• Preço de mercado: baseado no valor de bens 
comercializáveis (ex. valor da madeira)
• Produtividade: baseia-se na contribuição de bens e serviços 
de ecosistema na produção de bens comercializáveis (ex. o valor 
do mangue para a produção de camarão)
• Precificação Hedônica: baseado em bens e serviços que 
afetam o valor de outros bens (ex. a vista da mata → valor do imóvel)
• Custo de Viagem: quanto as pessoas estariam dispostas a 
pagar para irem até o local
• Dano Evitado, Reposição ou Substituição
• Valoração Contingente: baseado na disposição à pagar
• Substituição Contingente: disposição à pagar para substituir 
• Transfêrência de Benefícios: transfere o valor calculado de um local 
para outro (ex. valores encontrados no PN Iguaçú são usados para o PN da Tijuca, 
ou valores dos mangues do SE Asiático usados no Brasil).
Quantificação e valoração dos serviços ambientais prestados por morcegos
Controle de populações de insetos
Boyles et al. 2011. Economic importance of bats in agriculture. Science 332:41-42.
Uma única colônia de 150 Eptesicus 
fuscus pode comer quase 1,3 milhões 
de insetos/ano (incluindo pragas)
Método de Substituição
Serviços de supressão de pragas 
fornecidos pelos morcegos: de US$ 
4.80 a US$ 69.20/hectare 
Valor estimado dos morcegos para o setor agrícola:
~ US$ 22,9 bilhões/ano
Questões éticas
• Atribuir valores monetários a bens e serviços 
que podem não ter valor de uso, mas 
significante importância emocional ou 
simbólica, homogeniza e empobrece a sua 
designação cultural. 
• Seria injusto com aqueles ainda por nascer, 
atribuir valores avaliados por usuários atuais
dos benefícios de serviços de ecossistemas, 
tais como a biodiversidade que só pode gerar 
valores de uso para a sociedade num prazo 
muito longo. 
Efeito “tiro pela culatra”
• Uma multa por excesso de velocidade que custe R$ 
10,00 não tem efeito real.
• Uma multa por excesso de velocidade que custe R$ 
1.000,00 é bem mais convincente
• Se o preço a pagar pelo dano ambiental é muito 
baixo, o impactante pode preferir o dano
• Se o preço é muito alto, ele mesmo assim pode 
optar pelo dano por este ser impagável
Usina Hidrelétrica de Santo Antônio é multada em 
R$ 7,7 milhões
MMA/Ambiente Brasil 24/12/08
"Pela morte de 11 toneladas de peixes, a Superintendência do
Ibama de Rondônia multou nesta terça-feira (13) em R$ 7,7
milhões a empresa Mesa, responsável pela construção da
Usina Hidrelétrica de Santo Antônio, no Rio Madeira.
O montante aplicado tem como referência o § 2° do Art. 24 do
Decreto 6.514/2008, que estabelece o valor de R$ 500 por
quilo de espécime da fauna, e a Lei 9.605/98 (Lei da Vida), que
prevê majoração da multa devido a fatores agravantes. Por
isso, aplicou-se 40% sobre o valor base de R$ 5,5 milhões e
chegou-se a R$ 7,7 milhões."
R$ 500,00/kg?? 40% de agravante??
Ok, a diversidade pode ter valor. Mas 
a quem e como devemos pagar?
• Há problemas na identificação do direito de 
pagamento:
– “Conhecimento tradicional”: tradicional de quem??
• povos indígenas, quilombolas e comunidades locais (caiçaras, açorianos, 
caipiras, babaçueiros, jangadeiros, pantaneiros, pastoreiros, quilombolas, 
ribeirinhos/ caboclo amazônico, ribeirinhos/caboclo não amazônico (varjeiro), 
sertanejos/vaqueiro, pescadores artesanais, extrativistas, seringueiros, 
camponeses, faxinais, dentre outros). Agravante: autodeclaração.
• Direito difuso ou generalizado:
– A quem pagar? Quem “inventou”? Quem “descobriu”?
• Propriedade intelectual:
– Comunidade que usa ou empresa que pesquisa e desenvolve?
• O potencial para a geração de renda pode ser incerto:
– Pagar quanto? Por quanto tempo? 
Problemas...
• Ibama multa Natura em R$ 21 milhões por 
biopirataria– O Globo 12/11/2010
• "Não dá para continuar com as restrições de 
acesso à pesquisa. O Brasil tem dois pré-
sais, o do petróleo e o da biodiversidade. São 
duas riquezas que merecem visão 
estratégica." - Izabella Teixeira, Ministra do Meio Ambiente 
• "A regulamentação vigente é um tiro no pé da 
ciência brasileira". Vanderlan Bolzani, ex-presidente da 
Sociedade Brasileira de Química (SBQ)
Uma conclusão talvez…
Valorar a biodiversidade tem seus prós
e contras.
Forças de mercado sozinhas não são 
a melhor solução para a conservação 
da biodiversidade.

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