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Arte e Direito - Aulas - Daniel Nicory

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ARTE E DIREITO
Aluna: Maria Carolina Ribeiro
Professor: Daniel Nicory
Aulas 2015.2
1. NOÇÕES PRELIMINARES:
1.1. Introdução: A arte é uma forma de expressão cultural, bem como o direito. Tanto direito
como arte expressam um sentimento, um tempo histórico. No caso do direito, o sentimento
expresso é o de liberdade e o de justiça. Segundo Aristóteles, a arte imita, representa a vida
(mimese). O olhar subjetivo de um artista sobre algo da vida, é recolocado na obra. A criação da
arte pode ser renunciada, mas a criação do direito não. O direito tem um certo tipo de
constrangimento da liberdade que a arte não tem. Tanto direito quanto arte são formas de
linguagem, e como objetos culturais pretendem passar uma mensagem, logo, precisam ser
compreendidos, interpretados. Direito e artes são formas de cultura que perseguem propósitos
diferentes, logo, os valores pelos quais se julga o direito e a arte são diferentes. O direito
persegue o valor da justiça ou da correção normativa. A arte persegue o valor estético, o valor
do belo. Direito e arte tratam de todos os aspectos da vida social. Direito e arte reconstroem um
ao outro.
1.2. Direito da Arte: O direito da arte trata do conjunto de disposições do ordenamento
jurídico que regulam a arte. É o campo que estuda as relações do artista com sua obra, do
artista com o público, do artista com outros artistas, do público com a obra e da relação entre
obras. Nesse campo estuda-se direitos autorais, responsabilidade penal e civil do artista,
liberdade de expressão, acesso à cultura, proteção e preservação da diversidade cultural.
1.3. Direito na Arte: O direito sempre foi tema para a arte. O campo do direito na arte é o
que estuda os temas jurídicos nas obras de arte, estuda como a arte reflete o direito e reflete
sobre o direito nas suas obras. Desde a Grécia Antiga, as tragédias já tratavam os temas
jurídicos.
1.4. Direito como Arte: Estudam-se as aproximações estruturais entre os fenômenos
jurídicos e artísticos, principalmente no campo filosófico. Tanto direito como arte precisam da
interpretação para revelar o seu sentido. Tanto direito como arte precisam dominar a expressão,
logo, se aproximam no campo da retórica. Tanto direito como arte, ao reconstruir a vida,
reorganizam fatos, contam histórias, logo, se aproximam no ponto da narrativa. O fato é
contado com instrumentos narrativos.
2. LIÇÕES DA ARTE PARA O DIREITO:
2.1. Introdução: Ética, política e poética em Aristóteles tem grande influência humanística
atualmente.
2.2. Conceito aristotélico: O conceito básico de arte para Aristóteles é o conceito de
imitação da vida. Do termo ‘imitação da vida’ é possível extrair os termos ‘mito’ e ‘mimese’.
Mito, em sua origem, significa uma história que explica um mistério. Os mitos mais importantes
são os mitos fundadores e criadores. Com avanço da ciência, o mito ganha o sentido de ilusão,
porém, o que existe na verdade é uma metáfora da explicação científica. O mito como história é
uma sequência de acontecimentos, de forma organizada para cumprir determinado efeito de
sentido. Mimese é a imitação mais propriamente, é o reflexo dos acontecimentos, porém, não é
uma mera reprodução dos acontecimentos (não é exatamente como, é como si). 
 Poesia x história x direito: No sentido grego de poesia, estavam englobadas narrativas,
teatro, música, etc. Segundo Aristóteles, o historiador conta o que aconteceu, a poesia trata
do que pode acontecer (essa distinção ainda é usada entre ficção e realidade). O direito
também é uma imitação da vida, o direito é um campo ideal (dever-ser), logo, direito e artes
são formas de imitação da vida que guardam uma relação com o real, mas não
necessariamente o reproduzem, a poesia fala sobre o que pode acontecer e o direito fala o
que deve acontecer, ambos mostram que o real pode se confundir com o ideal (devido), mas
existem pontos de divergência.
 Diferenças entre as formas de poética: tragédia x comédia: Se diferenciam pela
forma de imitação. A tragédia imita as pessoas melhores do que elas são, e a tragédia as
imita piores do que elas são. Aristóteles toma para si como modelo ideal de arte a tragédia.
Qualquer forma de arte com a natureza narrativa é a construção de um mito. O objetivo de
arte para Aristóteles é a ‘catarse’, ou seja, despertar o sentimento do público, e é pelo
sentimento que a arte se comunica. A ‘catarse’, para Aristóteles, era construída na obra a
partir da ‘peripérsia’ e dos reconhecimentos. A peripérsia é (mudança da sorte do
personagem – da fortuna para o infortúnio, ou vice-versa). A partir do reconhecimento, a
qualidade oculta de um personagem passa a aparecer. O herói trágico normalmente é um
homem acima dos homens e abaixo dos deuses. Se o herói for contra os deuses ou o
destino, significa que ele se excedeu, e, esse excesso, chamando de ‘hubres’ ou desmedida,
desencadeia a peripérsia. A queda do herói desperta o sentimento de compaixão do público.
O reconhecimento tem função de revelação. Reconhecimento e peripérsia podem não se dar
ao mesmo tempo (exemplo: Édipo-rei, Sófocles).
2.3. Verossimilhança e absurdo na ficção: A ideia de verossimilhança é um conceito
chave do pensamento de Aristóteles. Verossimilhança é a aparência de realidade (é o provável,
o que espera-se que tenha acontecido ou algo que possível pode vir a acontecer). A experiência
prévia de mundo é o que diz que algo é verossímil ou não. No direito, tem-se como exemplo a
liminar, que é uma antecipação da tutela, a partir da probabilidade e da urgência. O
verossimilhante pode não ser real, mas segundo Aristóteles, “é melhor escolher o impossível
verossímil do que o possível incrível”. As ficções possuem verossimilhança pois possuem
coerência interna no mundo da obra (também possui fundamentação externa). Na ficção, os
absurdos, bem como os erros jurídicos, são encontrados na realidade. Muitas vezes os absurdos
revelam o real que devemos evitar.
2.4. Erros e contradições do direito na arte: No texto “a luta pelo direito” de Ihering
discute uma questão muito importante. No positivismo o direito objetivo fundamenta o direito
subjetivo. Segundo Ihering, a condição humana de detentor de direito, e a reinvindicação do
direito é o que garante a sua existência. Se um direito não é utilizado, ele acaba caindo em
desuso segundo o autor. Quanto mais as pessoas deixam de lutar pelo seu direito, mais o direito
se enfraquece. A luta pelo direito não é somente a luta por um direito pessoal, mas sim pelo
direito de todos. Além de garantir a justiça, o direito garante liberdade. Os erros da prática
judiciária são contradições que estão presentes no direito. É necessário conhecer os absurdos
da prática para que eles, aos poucos, sejam sanados. As vezes o direito intencionalmente é
colocado nas obras com um ar de erro ou absurdos para causar uma discussão acerca das
questões expostas.
 O Mercador de Veneza – Shakespeare: Bassanio, um rapaz sem posses quer casar com
Portia, porém, precisa pagar o dote, e, para isso, recorre à Antônio. No entanto, Antônio está
sem dinheiro, mas, este recorre a Shylock. Antônio era um mercador cristão, e Shylock era
agiota e judeu. Antônio faz um acordo com Shylock, e, se não pagar o que é devido no
prazo, deve retirar uma libra de carne do seu peito. Antônio não consegue pagar Shylock.
Diante do contrato inadimplido, Shylock recorre a Doge, representante da justiça. Doge
invoca o jurisconsulto, que não pode ir, mas manda um jovem jurista em seu lugar. Segundo
o jurista, Shylock poderia tirar uma libra de carne no peito de Antônio, mas, a libra deve ser
tirada exatamente na medida do peito e sem derramar nenhuma libra de sangue. Ao fim da
história, Shylock é condenado à perda dos seus bens e a pena de morte que poderia ser
perdoada.O jurista na verdade era Portia. Ihering crê que o contrato não deveria ser
validado, porém, já que foi validado, deveria ter sido cumprido. O Mercador de Veneza é uma
metáfora acerca da justiça e do direito, e o que deve prevalecer.
2.5. Mitos fundadores do direito: Texto de Ost. Com o deslocamento do divino da figura
central de explicação do mundo, para o antropocentrismo, o direito sofreu muito, pois antes era
fácil aplica-lo e interpretá-lo (cânones). Todo monoteísmo tem o direito de salvação e o dever de
evangelização. Quando Deus perde o lugar central de mito fundador, é necessário que exista
uma nova fundamentação para o direito. No lugar do mito divino de criação do homem e
estabelecimento da sociedade, vem afirmar o direito, o mito mundano e humanista do contrato
social, que tinha como princípio a liberdade. O aspecto de negociação ganha mais força, assim
como a autonomia. A natureza da interpretação acaba sendo modificada também, antes era
tarefa de poucos autorizados, agora é tarefa de alguns especializados. Agora que o juiz não é
mais boca de Deus, mas no máximo boca da lei, ele passa a ter uma carga de responsabilidade
maior. O mito do contrato social é democrático e por isso a legitimidade do juiz que é
concursado e não eleito, vem da fundamentação, da argumentação, que deve ser consistente.
3. FICÇÃO E NARRATIVA HISTÓRICA:
3.1. Ficção e história – Ricouer: Ricouer reconhece as duas principais narrativas na ficção e
na narrativa histórica. Se inspira em Aristóteles, e crê na tríplice mimese.
3.1.1. Pretensão de veracidade: Na narrativa histórica, a intenção é reproduzir os fatos tais
como ocorreram.
3.1.2. Pretensão de credibilidade: Ficção - Transmitir credibilidade (inspirar confiança do leitor).
Transporta o leitor para o mundo da ficção e o faz acreditar nas regras e coerência interna.
3.2. Representação da ação – Ricouer: Existem três etapas que um texto percorre para
transmitir a sua mensagem. Cada uma dessas etapas e uma forma da mimese (tríplice
mimese).
3.2.1. Pré-figuração: O autor pré-figura a ação (vontade da lei). Intenção. Se o autor pretende
criar uma narrativa com pretensão de veracidade ele deve utilizar todo o material que ele
possui sobre o tema que ele quer representar. O autor não procura contar cada etapa, mas
sim dar um sentido à totalidade de informação. Uma história é uma narrativa consistente
com um sentido, é uma narrativa que transmite uma mensagem. A história é um fenômeno
que muda constantemente, por isso, muda de acordo com os materiais disponíveis. No texto
de ficção ao autor possui os limites de sua experiência previa, pois, por mais que a
criatividade de alguém seja fértil, ela parte da algum lugar. Se o autor quer que sua arte seja
conhecida, existem limites que o autor encontra na capacidade de compreensão dos outros,
a linguagem, por exemplo, deve ser inteligível, deve ser compreendida pelos outros, não
significa que precisa ser aceita entretanto. O autor tem a sua disposição de grandes recursos
culturais, recursos esses que devem ser analisados e colocados na história. Tão importante
do que o autor diz é o que ele deixa de dizer.
3.2.2. Configuração: O texto configura a ação (vontade do legislador). Expressão. A partir de
quando o texto já está produzido e publicado, ele se torna independente do autor, que será
somente mais um leitor e intérprete do mesmo. É importante saber a intenção do autor, mas
isto não significa que a sua interpretação seja o sentido correto do texto. Após o texto ser
produzido e publicado, sentidos são agregados posteriormente, ou pelo contexto ou pela
intertextualidade (texto + contexto + intertexto). O texto não se esgota nele mesmo. Um
texto está posto, tem o seu efeito de sentido determinado, mas o contexto e até o futuro
trazem sentidos adicionais para o próprio texto.
3.2.3. Refiguração: O leitor refigura a ação (vontade do juiz). Recepção. O texto completa o seu
efeito de sentido, de acordo com o leitor. Embora não seja possível dizer com toda certeza
qual a interpretação correta, pelo menos é possível excluir muitas interpretações erradas, as
quais o texto não permite. A interpretação e a compreensão são etapas prévias que formam
uma opinião de concordância ou discordância acerca do que está sendo dito.
3.3. Conceitos de ação e de verdade – Habermas: Os conceitos de ação e de verdade são
importantíssimos para o direito. A ação é um comportamento humano voluntário. Sendo o
objeto do direito a conduta humana, é necessário conhecê-la afim. A verdade é elemento básico
do processo, pois busca-se sempre por ela.
 Estrutura teleológica da ação: Vontade, finalidade, conhecimento causal, eleição do
meio, definição do plano de ação – ocorre internamente – execução do plano, produção de
efeito, alcance do fim – aspectos externos. Definido por Aristóteles. A estrutura teleológica
da ação, segundo Habermas, considera uma ação humana isolada, porém, elas se dão em
sociedade, e a sociedade é um sistema de interações, ou seja, a ação está considerada
dentro de um contexto de várias ações diferentes. Cada uma das quatro formas baixo é uma
forma diferente de integrar o comportamento de um indivíduo ao comportamento dos
outros. Cada ação, que é um tipo de acoplamento de interações, está ligada a uma
concepção diferente de verdade e uma concepção diferente de mundo: mundo objetivo
(físico), mundo intersubjetivo (social), mundo subjetivo (interior), mundo da vida
(experiência).
3.3.1. Ação estratégica (verdade-correspondência): Conceito baseado na percepção. A
verdade é uma relação entre os fatos e os acontecimentos do mundo real e as afirmações
que são feitas acerca do mundo. O conceito de verdade-correspondência é baseado na
realidade objetiva que pode ser percebida por qualquer e que pode ser testada a partir da
sua conformidade com a realidade. No detalhamento da correspondência, os problemas vão
aparecendo. Conceito de mundo objetivo (coisas reais, palpáveis e concretas). A ação
estratégica é a ação de estrutura teleológica que se acopla ao mundo objetivo em busca do
êxito e do sucesso. É uma ação orientada ao resultado a partir do conhecimento causal. A
ação estratégica maximiza as chances de sucesso de acordo com o comportamento dos
outros sujeitos. É a ação no sistema de interações, que é a sociedade. Pauta-se na premissa
de que cada um dos outros agentes também se orienta de acordo com as possibilidades de
êxito (cooperação ou competição). Busca da máxima eficácia, considerando que todos os
outros sujeitos agem para alcançar seu próprio êxito (não considera juízo de valor).
3.3.2. Ação normativa (verdade-correção): Mundo social ou intersubjetivo. A verdade correção
ou verdade validade, é uma relação entre uma afirmativa, fato, ou comportamento e uma
ordem normativa. Se este fato está em conformidade com a ordem normativa ele é válido e
correto. Se um fato não está em conformidade com a ordem normativa ele é inválido e
incorreto. É no mundo subjetivo que ocorre o controle dos comportamentos. Esta ação se
desenvolve a partir da busca do êxito, porém, estas buscas são limitadas e mediadas pelo
papel social de cada um. O juízo de valor é considerado.
3.3.3. Ação dramatúrgica (verdade-credibilidade): Ligada ao mundo subjetivo ou mundo
interior (pensamentos, desejos, frustações). A este mundo psíquico corresponde a ideia de
sinceridade ou credibilidade. A verdade credibilidade é a relação entre a expressão de uma
vontade de espírito e o próprio estado de espírito, é a relação de conformidade entre um
sentimento e a sua expressão. É a expressão sincera de um sentimento. É a relação entre
crença e exteriorização da crença. Ação dramatúrgica é a melhor representação de si
mesmo na sociedade. Busca-se o sucesso, mas há um limite, que é afidelidade ao próprio
sentimento. A alternativa seria vestir uma máscara para buscar o sucesso.
3.3.4. Ação comunicativa (verdade-consenso): É o grande projeto de Habermas. Ocorre aqui a
unificação das três ações, das três verdades e dos três mundos no mundo da vida. A
verdade-consenso é a verdade comum a qual vários agentes conseguem alcançar. É a
verdade do entendimento, do acordo, da livre concórdia. Agir de acordo com o entendimento
é melhor para ambos do que a plena capacidade de conquistar o êxito. O comum acordo
entre valores é a base da ação comunicativa.
Ação
Social
Verdade Resultado
Esperado
Mundo
correspondente
Limites
Estratégica Correspondên
cia
Êxito apenas Mundo objetivo Fatores
eficaciais
Normativa Correção Êxito + validade Mundo social ou
intersubjetivo
Institucionais
Dramatúrg
ica
Credibilidade Êxito +
autenticidade
Mundo interior ou
subjetivo
Autenticidade
Comunicati
va
Consenso Êxito + acordo Mundo da experiência ou
vida
Acordo
3.4. Maurice Marleau-Ponty – “Fenomenologia da Percepção”: Formação do
conhecimento de mundo.
 Percepção: É a captação dos sinais do mundo com os órgãos sensoriais. É possível que
as pessoas possuam capacidades perceptivas diferentes.
 Recordação (memória).
 Imaginação.
 Intuição ou empatia: Forma mais impalpável de conhecimento.
Para que se compreenda as coisas é necessário que haja a interpretação destes sinais
(percepção, recordação, imaginação, intuição). Assim, constrói-se o conhecimento acerca dos
fatos. No direito, a tomada de decisões ocorre através destes sentidos (percepção, recordação,
imaginação e intuição).
3.5. A narrativa jurídica – Larenz: Tenta explicar como os fatos jurídicos viram narrativa. O
direito trata de fatos, mas os fatos só são acessíveis para o direito quando eles são enunciados
(texto). O fato jurídico sobre o qual o direto vai incidir deve virar texto para ser valorado pelo
direito. A enunciação do fato é a narrativa jurídica.
3.5.1. Conformação da situação de fato: É a passagem do fato bruto para o fato definitivo por
meio de um processo de conformação jurídica. O que levado ao juiz não é um retrato
perfeito do fato, pois ninguém conhece os fatos na totalidade, e porque há omissão acerca
de alguns fatos (muitas vezes não intencional). O juiz não pode contar somente com a
versão de uma das partes, por isso o contraditório é importante. O juiz complementa,
aprofunda, aceita ou ignora os fatos a depender do caso. Aos fatos, devem ser atribuídos
sentido, e é a narrativa que dá esse sentido. A narrativa dá sentido aos institutos materiais
da prova. O fato bruto ou a situação de fato em bruto é na verdade um relato originário
segundo Larenz; mas o relato originário já chega construído previamente para o juiz. O fato
bruno na realidade é reconstruído como texto adequado a linguagem jurídica. O fato já é
descrito da forma que o direito quer (técnica jurídica).
Fato → enunciação do fato → ordenamento → aplicador → executor → consequência
3.5.2. Teorias do fato e da conduta: Causalidade, reponsabilidade, culpa ou dolo, ação ou
omissão. Todos esses dados são importantes para a narrativa. A narrativa jurídica já é
previamente organizada. O fato é transformado quando vira relato. Às vezes a ficção é um
atalho da lei. Às vezes a lei cria ficção jurídicas para evitar conflitos e resistência por parte
da sociedade.
3.6. A ficção jurídica – Larenz: 
 Ficção x presunção: uma presunção é algo que não sabe-se se é verdade, mas trata-se
como se fosse. Na ficção sabe-se que algo não é verdade, mas trata-se como se fosse. A
ficção jurídica como técnica legislativa é muito criticada. 
4. MODELOS NARRATIVOS APLICADOS AO DIREITO:
4.1. Introdução: 
4.2. James Bond – Uma Combinatória Narrativa – Umberto Eco: Estruturalismo Literário.
Umberto Eco encontra nos romances de Ian Fleming três principais categorias de relação de
James Bond em 007 (Cassino Royale), que se repetem independentemente do romance e da
obra:
 Relações com o adversário: Quase invulnerabilidade – Li Chiffre; o Bond inicial ainda
apanha muito do adversário. O adversário de Bond é ‘o outro exótico, o não branco e o não
britânico’, e representa o mal na diferença; isto vem do próprio Ian Fleming, pois a obra foi
escrita no período da Guerra Fria (maniqueísmo racista).
 Relações com a mulher: Quase insensibilidade - Vesper Lynd; Bond autenticamente se
apaixona por Vesper. É um arquétipo do machismo, da satisfação do desejo e da conquista.
Após sofrer com a perda de Vesper, Bond passa a ser insensível com as outras mulheres.
 Relações com o comando: Fidelidade quase absoluta – “M”; às vezes ele contraria as
determinações do comando para o cumprimento da missão.
 No lugar da voz da musa, ocorre a autoafirmação da voz masculina do herói. Mesmo em
obras diferentes, essa tríade permanece. Mesmo em obras muito diferentes, encontram-se
pontos em comum. O estruturalismo buscava um padrão universal nas narrativas. Isto
começa com o formalismo de Propp, que buscava no folclore russo elementos comuns a
partir da indução. Bond é um exemplo de literatura policial.
4.3. Intriga mínima completa – Tzvetan Todorov: Tenta identificar um modelo comum a
toda literatura policial. Percebe que há uma lógica binária, uma subdivisão entre a história do
crime e a história da investigação – crime ocorrido, mistério, detetive empenhado em descobrir
o mistério a partir das pistas. Em Bond, na verdade não há a consumação do crime, mas sim o
objetivo de evitar o resultado, mas ainda assim existem as duas lógicas, paralelas ou
entrelaçadas (história do detetive vulnerável – sujeito aos riscos que o crime oferece). Todorov
propõe um modelo universal para todo o tipo de narrativa – toda narrativa representa a
passagem de um equilíbrio para um período de desequilíbrio até chegar a um estado novo de
equilíbrio, que pode ser diferente deste primeiro. Durante esse período ocorre um processo de
degradação e/ou de melhora relativo ao personagem (modelo da intriga mínima completa).
Trata-se da célula da narrativa – as narrativas contêm várias células encadeadas, usualmente.
Na história de Bond, a passagem de uma célula para outra é marcada pela passagem de
cenários, que é plano de fundo de histórias que possuem início meio e fim.
4.4. Modelo quinário – Yves Reuter: Greimas e Bremond. Define o modelo quinário.
Segundo este modelo as narrativas começam no estado inicial, que é alterado por uma força
perturbadora, que desencadeia uma dinâmica que é uma sucessão de forças que segue até que
uma força equilibradora a encerra e instaura um estado final. O segundo modelo enfatiza a ideia
de força (pontos centrais), enquanto no modelo da intriga mínima a ideia de força está diluída
na ideia de equilíbrio. 
4.5. Comparação e utilidade para o direito: Nos comportamentos da vida real sobre os
quais o direito vai incidir identifica-se uma estrutura narrativa da ação. A ação só vem ao direito
pois é um relato conformado juridicamente. O direito trata ações e omissões que ocorrem no
mundo e se transformam em narrações explicitadas. As ideias de força rementem a ideia de
causa na teoria da ação e na teoria da conduta (força pode não ser uma ação humana). A
relação de causa e efeito está na base da responsabilidade civil e penal, logo, o nexo de
causalidade é importante. Se consegue-se em uma narrativa isolar a força perturbadora, isola-
se a causa.
 Auto de prisão em flagrante – Daniel Nicory: O flagrante delito é a maior possibilidade
de restringir a liberdade de alguém sem seguir as vias judiciais. Um auto é um registro
escrito de um ato. O delegado de polícia é quem lavra o auto de prisão em flagrante. O auto
de prisão em flagrante contém várias versões sobreo mesmo fato. No auto de prisão em
flagrante existem três histórias: a história da apresentação, a história da prisão e a história
do crime. No auto a narrativa não é cronológica. Essas três histórias podem ser encaixadas
no modelo quinário. O estado inicial seria a rotina da delegacia, a força perturbadora seria a
chegada das pessoas, a partir daí ocorre a dinâmica, a decisão do delegado é a força
equilibradora que instaura um outro estado. Na história do crime, a cessação da conduta
delituosa é a força equilibradora, e o estado final é a condição de preso em flagrante.

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