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Serviço Público Federal Ministério da educação Universidade Federal de Sergipe Campus Universitário “Professor Antônio Garcia Filho” Graduação em Medicina Sanni Silvino Parente Revisão: Malária HISTÓRICO E EPIDEMIOLOGIA Cerca de 40% da população mundial vive em áreas que existe risco de transmissão. É endêmica nas regiões tropicais e subtropicais da Ásia, África e Américas Central e do Sul. Incidência anual de 300 a 500 milhões de casos, dentre eles mais de 90% ocorrem nas regiões de savana e floresta equatorial da África subsaariana. Nessa região, 1 a 2 milhões de pessoas morrem de malária por ano (crianças <5 anos e gestantes sobretudo). BRASIL: zona rural da Amazônia Legal (Acre, Amazonas, Amapá, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, parte do Maranhão e Tocantins). É crescente a incidência em aglomerados urbanos e periferia de cidades como Manaus (AM), Porto Velho (RO) e Cruzeiro do Sul (AC). 2008: >300.000 pacientes; 99,9% na AL; vivax 90%; internações : 1,3% em 2008 e 2,6% em 2003. Espécies: Plasmodium falciparum (houve aumento da proporção de casos durante os anos de 1995-2005, mas declínio em 2006 e 2007); Plasmodium malariae; Plasmodium vivax. = 70 a 80% dos casos atuais. Plasmodium ovale; Surtos de autoctonia estão sendo identificados em pequenos focos residuais, principalmente no Paraná, São Paulo e Espirito Santo. TRANSMISSÃO: picada do mosquito infectado ou malária induzida (pouco habitual) – contato com o sangue infectado (uso compartilhado de agulha contaminada ou hemotransfusão). Também malária congênita ou perinatal – diagnóstico do plasmódio em RN até 7 dias ou mais tardiamente quando excluído outras causas. VETOR: Fêmeas hematófagas; atividade crepuscular e noturna. Ordem: Diptera; Família: Culicidae; Gênero: Anopheles; Espécie: Na. Darling; An. Albitarsis; An. Aquasalis; An kertezia bellator; An kertzia cruzi. ASPECTOS BIOLÓGICOS DO AGENTE ETIOLÓGICO São conhecidas diversas variantes das quatro espécies de plasmódios. Os plasmódios infectam 1 hospedeiro vertebrado e 1 invertebrado. A variante humana somente é capaz de infectar humanos e algumas espécies de macacos e o mosquito. 1) Esporozoíto: forma infectante para o hospedeiro invertebrado; aloja-se nas glândulas salivares de mosquitos fêmeas; são injetados na corrente sanguínea de humanos durante o repasto sanguíneo; em menos de 30m são capazes de invadir hepatócitos. (Proteína circunsprozoíta = antígeno que os reveste e é capaz de reconher moléculas sulfactadas na membrana de hepatócitos). Ligam- se a receptores para proteínas séricas trombospondina e properdina. 2) Criptozoítos: intra-hepáticos; estruturas arrendodadas unicelulares. Na infecção por P. vivax ou P. ovale, alguns esporozoítos, ao invadir hepatócitos, dão origem a formas latentes (hipnozoítos); 3) Esquizogonia tecidual/ pré- eritrocitária/ exoeritrocitária: reprodução assexuada com a formação de uma célula multinucleada (esquizonte). Ao final de um período variável entre 8 a 15 dias o hepatócito rompe liberando dezenas de milhares de merozoítos. 4) Merozoítos: invadem as hemácias; principal molécula de adesão parasitária = EBA-175: antígeno de ligação a eritrócitos com massa molecular de 175kDa. Aderem a resíduos siálicos da superfície celular por meio de uma molécula semelhante a lectina. a. P. vivax: exclusivamente reticulócitos/ somente capaz de invadir hemácias que expressem o grupo sanguíneo Duffy; b. P. falciparum: hemácias de todas as idades, mas preferencia por mais jovens. Principal receptor: Glicoforina A. 5) Trofozoítos: intra-eritrocitários. 6) Multiplicação esquizogônica: esquizontes eritrocitários maduros têm entre 6 e 32 núcleos, que originam igual número de merozoítos. Multiplicam-se dentro de um vacúolo gigestivo, promovendo a hidrólise de hemoglobina, tendo o pigmento malárico como produto final. 7) Merozoítos liberados na corrente sanguínea com rompimento das hemácias: picos febris periódicos característicos da doença. O intervalo entre os picos febris é determinado pela duração da esquizogonia eritrocitária. Os merozoítos liberados invadem novas hemácias e podem: a. Transformar-se em trofozoítos – esquizontes; b. Diferenciar-se em gametócitos: estágio plasmódico infectante para os mosquistos. VIRULÊNCIA POR P. falciparum A identificação da espécie de plasmódio é importante para diferenciar os esquemas terapêuticos, o padrão de resistência a antimaláricos, a presença de hipnozoítos e a gravidade da doença causada pelo falciparum. São fatores que explicam sua maior virulência: Produção de grande número de merozoítos ao final da esquizogonia hepática; Capacidade dos merozoítos de invadirem hemácias de todas as idades; Citoaderência: adesão das hemácias parasitadas em pequenos vasos; Formação de rosetas: adesão a outras hemácias não parasitadas; Esses últimos fenômenos são possíveis f=graças a produção de knobs, que são protuberâncias na superfície dos eritrócitos. A proteína PfEMP-1 é a principal molécula parasita envolvida na aderência a receptores endoteliais. Essa proteína pode ligar-se a diversos receptores no endotélio: moléculas sulfactadas, CD36 e moléculas de adesão. Teorias que explicam a gravidade da infecção: Eritrócitos aderidos ao endotélio e rosetas ocasionariam obstrução de pequenos vasos, levando a hipóxia; Citocinas pró-inflamatórias seriam estimuladas por moléculas do parasita e liberadas no local da esquizogonia. RESPOSTA IMUNE E FISIOPATOGENIA A resposta imune é espécie-específica e estágio-específica. Logo, a imunidade gerada por uma infecção é fraca e de curta duração. Entretanto, indivíduos residentes em áreas endêmicas e que sofrem sucessivas infecções desenvolvem diferentes graus de imunidade e apresentam quadro-clínicos menos severos e curso distinto da doença. Razões da baixa imunidade ao plasmódio: a) Intenso polimorfismo dos antígenos do parasita; a inoculações do parasita pelo vetor, é, em geral, oligoclonal; b) Variação antigênica; a mesma proteína parasita pode ser expressa por genes distintos; c) Ativação mitogênica policlonal de moléculas do parasita; resposta imune dirigida a antígenos não relacionados a indução de anticorpos protetores (antígenos de fumaça); as hemácias rompidas reagem com anticorpos, tornando-os menos disponíveis para função protetora. GPI= possível toxina produzida pelo parasito com atividade pró-inflamatória, exerce efeito regulador nas células do hospedeiro, atuando nos macrófagos e induzindo a produção de TNF e IL-1. Essas citocinas levariam ao aumento de NO. Ela também seria responsável por aumentar a expressão de moléculas de adesão em sinergia com o IFN-gama. P. falciparum = produção de PGs (D2, E2, F2) e deficiência do efeito de contra regulação exercido pela IL-10 sobre a produção de TNF e IL-1. Mecanismos na primoinfecção: Exoantígenos solúveis resultantes da lise dos eritrócitos induzem a liberação e produção de TNF-alfa; ligam-se aos linfócitos T CD4+ (iniciando a resposta imune celular) e induzem mínimos sintomas clínicos. Mecanismos da reinfecção: As células T CD4+ produzem muito IFN-gama,que atua sinergicamente com as endotoxinas do parasita, resultando em aumento expressivo do TNF-alfa e alterações histopatológicas. RESISTÊNCIA INATA Doenças com alteração das hemácias: anemia falciforme, talassemia (anemia do Mediterrâneo). Grupo sanguíneo Duff negativo (vivax). RESISTÊNCIA MEDIADA POR MECANISMOS IMUNOESPECÍFICOS Esporozoítas no ciclo pré-eritrocitário: durante os 45m que antecedem a penetração dos esporozoítas nos hepatócitos, anticorpos anti-CSP reagem com a superfície do parasita formando uma capa que leva a sua imobilização e à perda da capacidade infectante, bloqueando sua adesão ao hepatócito. Esses parasitas opsonizados são posteriormente eliminados por fagócitos. Células T CD8 com atividade citotóxica são capazes de destruir hepatócitos infectados. Os eritrócitos infectados apresentam epítopos no contexto de MHC- I de moléculas dos esporozoítas (CSP, outras) e de antígenos peculiares aos estágios intra-hepáticos. Células T CD4 ativadas participam, por meio da produção de INF- gama e TNF- alfa da destruição intracelular de parasitas. Merozoítas: anticorpos dirigidos contra antígenos de superfície (MSP 1- falciparum – polimorfismo antigênico importante) podem bloquear sua penetração nas hemácias e levar a eliminação posterior por fagocitose; Hemácias parasitadas: o parasita sintetiza moléculas que podem ser transportada para a membrana dos eritrócitos ou serem liberadas no exterior da célula. Anticorpos ligam-se a esses antígenos. A ligação da porção Fc com os seus receptores nas células fagocitárias é capaz de promover a liberação de radicais tóxicos de oxigênio que podem atravessar a membrana celular e atingir os parasitas no interior. Essa interação é facilitada pela passagem das hemácias pelo baço. Na infecção, os macrófagos e neutrófilos dos órgãos linfoides apresentam certo grau de ativação devido a citocinas inflamatórias produzidas pelos próprios macrófagos e por citocinas (IFN-gama) produzidas por linfócitos T CD4 ativados. Anemia: não é justificada apenas pela invasão (ex: em infecções graves pelo falciparum, apenas 1 a 2% dos eritrócitos são parasitados). Hemácias não parasitadas também são rapidamente eliminadas. Adesão de antígenos parasitários a qualquer hemácia. Redução da vida média e aumento do clareamento pelo baço. Retardo na hemopoiese na medula óssea (produção de TNF-alfa). Isquemia em diversos órgãos: agregação de hemácias parasitadas e não parasitadas nas vênulas; hemácias parasitadas apresentam maior rigidez, dificultando sua passagem por microcapilares; expressão de moléculas de superfície (EMP) que interagem com moléculas de adesão do endotélio (ICAM-1, VCAM-1, CD 36); Maior expressão de moléculas de adesão do endotélio em virtude da ação do TNF-alfa; Knobs : maior densidade de proteínas envolvidas com adesão. Microtombos > diminuição da circulação local > redução tensão de O2 > aumento de ácido lático > agressão tecidual e bloqueio da circulação. TGI: áreas focais de lesão da mucosa > invasão bacteriana > sepse; RIM: necrose tubular aguda > insuficiência renal aguda; Glomerulonefrite crônica : pacientes de áreas endêmicas, complexo antígeno-anticorpo depositado na membrana basal (P. malariae). Malária cerebral: P. falciparum; Citoaderência> bloqueio mecânico da circulação vascular> hipóxia tecidual > comprometimento da nutrição dos astrócitos > coma/ óbito. Hipoglicemia: inicio do quadro; aumento do consumo de glicose pelas células parasitadas; falta de ingestão e inibição da gliconeogênese hepática (TNF-alfa). Agravada em gestantes e usuários de quinino. QUADRO CLÍNICO Período de incubação: Falciparum: 7- 11 dias; Vivax: 10- 14 dias; Malariae: 14- 28 dias; Transfusão: 10h a 60 dias; Congênita: 3- 8 semanas. Paroxismo: Febre terçã (48h): falciparum e vivax; Febre quartã (72h): malariae; Indivíduos em áreas endêmicas, múltiplas picadas: mais de um ciclo de esquizogonia, paroxismo <48h. Malária no indivíduo não imune I. FRIO : 15- 60m; brusco aumento de temperatura = frio e calafrios marcados por tremores generalizados; cefaleia, náuseas e vômitos; pulso fino e acelerado; pela seca; lábios cianóticos. II. CALOR : 2- 6 horas; face hiperemiada; pulso cheio; pele seca e quente; intensificação da cefaleia; persistências das náuseas e vômitos; delírio/convulsões principalmente em crianças. III. SUDORESE : 2- 4 horas; febre cede rapidamente com melhora do desconforto; IV. Após cessar o suor, pode haver melhora, sintomas inespecíficos e discreta cefaleia. A duração total do paroxismo é de 6- 12 horas. Os primeiros sintomas podem não se apresentar como o paroxístico típico. Em geral, têm-se um sintoma único de febre contínua, subcontínua, reimitente ou intermitente com remissões. Malária grave Crianças, gestantes e primoinfectados; falciparum. Febre persistente (pode ser muito elevada), não apresenta calafrios nem sudorese. Cefaleia intensa, vômito frequente delírio. Geralmente >2% das hemácias estão parasitadas = anemias. Comprometimento renal, pulmonar, cerebral, hepático, anemia ou trombocitopenia. Malária na criança Em >5 anos nem sempre se observam os sinais clássicos do paroxismo palúdico; erro diagnóstico. Em regiões endêmicas, infecção pelo falciparum é responsável por altas taxas de morbidade e mortalidade em pré- escolares. Lactentes geralmente não apresentam paroxismos típicos. Tornam-se flácidos e sonolentos, perdem o apetite, têm frio e podem apresentar vômitos e convulsões; temperatura entre 38,5° e 40°; febre pode ser contínua, reimitente, intermitente ou irregular; dores abdominais; hepato e esplenomegalia; icterícia e anemia. Malária na gestante Mortalidade 2x maior; parasitemia 10x mais elevada. Anemia e hipoglicemia. Infecção placentária: retardo do crescimento intra-uterino, baixo peso ao nascer, prematuridade. Aborto de até 30% na 1° metade da gestação; Fatores que produzem imunossupressão: elevação de esteroides supra-renais, gonadotrofina corioplacentária e de alfa-fetoprote[ina. Maior disposição para toxemia gravídica, como pré-eclâmpsia e eclampsia. Síndrome da esplenomegalia tropical (baço hiper- reativo da malária) Regiões endêmicas; Defeito nas células supressoras > ativação policlonal de linfócitos B Ausência de parasita no sangue periférico e níveis séricos elevados de anticorpos anti-maláricos de classe IgG e IgM. Boa resposta a quimioprofilaxia anti- malárica. DIAGNÓSTICO I. Investigação epidemiológica; II. Avaliação clínica: febre (pode ser o sintoma inicial); avaliação da presença de complicações. III. Laboratorial: a. Inespecíficos: i. Hemograma: anemia e/ou trombocitopenia discreta, leucometria normal ou alterada; ii. Concentração sérica de enzimas hepáticas: (aminitransferases) normal ou discretamente elevada. b. Casos graves, a depender do órgão: i. Insuficiência renal: elevação de uréia e creatinina; alterações eletrolíticas com hipercalemia; ii. Insuficiências respiratórias: gasometria arterial mostra diminuição da pressão parcial de oxigênio e bicarbonato;Rx tórax: infiltrado difuso; iii. Disfunção hepática: aminotransferases elevadas; bilirrubinas se elevam a depender da intensidade da hemólise e do comprometimento hepático; iv. Albumina tente a decrescer; c. Específicos: identificação do parasita ou de anticorpos no sangue periférico: i. Direto: gota espessa ou esfregaço; QBC ii. Indireto: anticorpos inespecíficos; baixo valor diagnóstico. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Bacteremia: sepse, pielonefrite aguda, febre tifoide, outras. Complicações: hepatite viral, febre amarela, leptospirose, encefalites, outros. Febre alta e contínua: todas as infecções, principalmente bacterianas como pneumonias, sepse, etc. TRATAMENTO Objetivos do tratamento: o Interrupção da esquizogonia sanguínea; o Destruição dos hipnozoítos; o Impedir o desenvolvimento de gametócitos;
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