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AO JUIZO DA 1ª VARA DO TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA DE PORTO SEGURO/BA Autos sob nº XXXXXXX BRUTUS, já qualificado nos presentes autos, por intermédio de seu defensor constituído, conforme procuração anexa a este instrumento, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência, com fundamento no art. 581, IV do Código de Processo Penal, propor RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Em face de decisão de pronúncia determinando o julgamento pelo Tribunal Popular do Recorrente, pelo qual pede primeiramente a retratação, nos termos das razões anexas. Requer o recebimento, com a devida intimação do Ministério Público, para apresentar suas contrarrazões recursais, bem como a realização do juízo de retratação por Vossa Excelência, nos termos do art. 589 do Código de Processo Penal. Na hipótese de Vossa Excelência não considerar os argumentos e manter a r. Sentença de pronúncia, que seja encaminhado, com as razões inclusas, ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado da Bahia. Ressalta-se que, na forma do art. 583, II, do CPP, o recurso subirá nos próprios autos. Nesses termos, pede deferimento. Porto Seguro, 14 de fevereiro de 2024. ASSINATURA ADVOGADO OAB Nº EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA RAZÕES DO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO RECORRENTE: BRUTUS RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA PROCESSO Nº XXX Colenda Câmara, Ínclitos Desembargadores, Em que pese a respeitável decisão do Excelentíssimo Juiz de Direito a quo, não merece prosperar a pronúncia do recorrente pelas razões fáticas e jurídicas a seguir expostas, vejamos: 1. DA TEMPESTIVIDADE DO RECURSO Tendo em vista que a intimação do acusado ocorreu na data de 06/02/2024 (terça-feira), a contagem se iniciará no dia seguinte, encerrando em 14/02/2024 já que os dias 12/02/24 e 13/02/2024, o fórum estará fechado em razão do feriado de Carnaval. Portanto demonstra-se que o prazo se encontra tempestivo, com fulcro no art. 586 do Código de Processo Penal, que determina o lapso de 5 dias para sua apresentação, findando então em 14 de fevereiro de 2024. 2. SÍNTESE DO PROCESSO O acusado foi preso foi processado criminalmente pela seguinte capitulação penal: art. 121, §2º, II (motivo fútil) e VIII (emprego de arma de fogo de uso restrito), do Código Penal, por duas vezes (duas vítimas), combinado com o crime do art. 16, caput (porte ilegal de arma de fogo de uso restrito), da Lei nº 10.826/03, por duas vezes (fuzil e pistola 9 mm), e art. 33, caput (tráfico de drogas), da Lei nº 11.343/06, todos em concurso material de crimes, na forma do art. 69 do Código Penal. Em audiência de instrução e julgamento, comprovou-se por meio de testemunha de defesa que as provas produzidas desobedeceram a vários artigos de lei, bem como não foi feita nenhum exame de corpo de delito que comprovasse a materialidade delitiva dos crimes narrados. Não obstante a isso, o Magistrado entendeu por bem pronunciar o acusado nos termos exatos da denúncia, sem arredar qualquer fundamentação indicada pelo membro do Ministério Público, razão pela qual a Defesa manejou o presente recurso em sentido estrito. Eis a síntese dos fatos necessários para o deslinde da questão. 3. DO DIREITO - PRELIMINARES 3.1 DA NULIDADE ABSOLUTA Inicialmente, ressalta-se que o interrogatório do acusado, como meio de prova e de defesa, deveria ter sido feito ao final, em homenagem aos princípios do contraditório, ampla defesa e devido processo legal, o que não ocorrera, restando aqui um caso de nulidade que deve ser alegado em preliminar de mérito. Para tanto, citam-se os artigos que embasam o referido pensamento, nesses termos: Artigo 5º, LV, CF - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado; Art. 186, CPP. Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas. Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa. Art. 187. O interrogatório será constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos Art. 411. Na audiência de instrução, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, se possível, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado e procedendo-se o debate. Dessa forma, percebe-se claramente que o Juiz da instrução e julgamento feriu de morte os preceitos constitucionais e legais que regulamentam o interrogatório. Com o intuito de embasar o pensamento legal, tem-se, ainda, a posição jurisprudencial acerca da matéria, que entende tratar-se de nulidade a inversão do rito processual, notadamente a realização do interrogatório ao início do processo, nesses termos: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. DIREITO PROCESSUAL PENAL. TEMA 1.114. INVERSÃO DA ORDEM NO INTERROGATÓRIO DO RÉU. ART. 400 DO CPP. NULIDADE QUE SE SUJEITA À PRECLUSÃO TEMPORAL. ART. 571, INCISO II E ART. 572, AMBOS DO CPP E À DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO À DEFESA - ART. 563 DO CPP. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E NESTA EXTENSÃO PROVIDO. (REsp 1933759 / PR). Pelo que consta dos autos, o interrogatório do acusado foi feito no início da audiência de instrução, o que fere de morte os princípios do contraditório e da ampla defesa, bem como posicionamento dos Tribunais Superiores, devendo ser declarada nula a audiência realizada desde o início, na forma do art. 564, IV, do CPP. Assim, a Defesa vem requerer a nulidade absoluta do presente feito, reiniciando-se por nova audiência de instrução e julgamento, de forma a proteger os preceitos constitucionais e legais apontados. Além disso, relevante noticiar a ausência de exame de corpo de delito para os crimes que deixam vestígios, quais sejam, homicídio, posse e porte ilegal de arma de fogo e tráfico de drogas. Quanto à prova pericial, trata-se de meio admitido também no Código de Processo Penal, devendo ser bem observado que há uma certa taxatividade para a sua realização nos crimes que deixam vestígios (delitos não transeuntes), não sendo possível outro meio substitutivo de prova, o que torna imprescindível a sua realização, nesses termos: “Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado”. Os crimes de homicídio, porte ou posse de arma de fogo e tráfico de drogas necessitam de exame pericial, pois são delitos que deixam vestígios e necessitam de ter a materialidade atestada. O suprimento do exame pericial, no crime de homicídio, pode até ser feito por outros meios de prova lícitos, o que não ocorre quando policiais militares praticaram delitos (tortura e abuso de autoridade) para a obtenção de provas contra o acusado, na forma da jurisprudência mencionada a seguir: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PROVA INDIRETA DA MATERIALIDADE DOS DELITOS. ARTS. 158 E 167 DO CPP. POSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DO ART. 41 DO CPP. NÃO OCORRÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA. DESCONSTITUIÇÃO DO LIVRE CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A ausência de exame de corpo de delito no crime de homicídio não constitui, necessariamente, nulidade, podendo a prova da materialidade da conduta ser suprida, tanto de forma direta quanto indireta, com base no conjunto probatório, o que atende aos pressupostos do art. 41 do CPP. 2. A desconstituição da formação do livre convencimento motivado a respeito da presença da justa causa para ação penal, em especial quanto aosindícios de autoria e materialidade apresentados pelo órgão ministerial no momento do oferecimento da denúncia, demanda necessária dilação probatória, procedimento vedado na estreita via do habeas corpus. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC 661479 / PA). Na mesma linha de pensamento, os crimes de posse ou porte de arma de fogo e tráfico de drogas necessitam de perícia para fins de ter validade a prova produzida, conforme se depreende do conteúdo abaixo mencionado do Superior Tribunal de Justiça, nesses termos: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL DA DROGA APREENDIDA. NÃO OCORRÊNCIA. MATERIALIDADE DELITIVA. ALTERAÇÃO DO JULGADO. INVIABILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência do STJ estabelece que, para a condenação por tráfico de drogas, é necessário comprovar a materialidade do delito com a apreensão da droga e a elaboração de laudo pericial. A ausência desse laudo impossibilita a comprovação da materialidade e resulta na absolvição do réu por falta de provas (HC n. 686.312/MS, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, relator para acórdão Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 12/4/2023, DJe de 19/4/2023). 2. Destaca-se que a apreensão da droga pode ocorrer com o acusado ou qualquer um dos corréus, desde que demonstre a sua ligação com a organização criminosa. Nesse sentido, a jurisprudência do STJ reconhece que a falta de apreensão direta com o agente não afasta a materialidade do tráfico quando há evidências da sua relação com outros membros da organização criminosa responsáveis pela guarda das drogas (HC n. 536.222/SC, Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe de 4/8/2020). 3. No presente caso, constatou-se a realização de perícia nas drogas apreendidas, mesmo que relacionadas aos corréus, o que invalida a alegação absolutória pretendida. A alteração do julgado demandaria um indevido reexame do conjunto fático-probatório, o que não é permitido nessa via estreita. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC 812752 / PE) Importante destacar que a ausência do exame de corpo de delito é, inclusive, caso de nulidade processual, conforme se destaca do art. 564, III, b), do CPP, nesses termos: Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos: (...) III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes: (...) b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto no Art. 167; Dessa forma, como não há prova lícita ou válida para a condenação, importante mencionar o disposto no art. 414 do CPP, que determina a impronúncia em tais situações. 3.3 DA PRELIMINAR DE ILICITUDE DAS PROVAS Além do que foi exposto anteriormente, há um outro ponto fundamental. Em situações de comprovada prática de crimes para obtenção das provas produzidas em violação à legislação processual, ilicitude da prova é algo que se impõe e deve ser levada em consideração para fins de julgamento, o que cai por terra a ideia de presunção de legitimidade dos depoimentos prestados por policiais militares. Essa é a redação do art. 157 do CPP, nesses termos: Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. § 1º São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras A ilicitude das provas pode ser visualizada quando há a prática de um crime para fins de produção de prova contra alguém, como sói acontecer nos crimes de tortura e abuso de autoridade, a seguir mencionados: Lei nº 9.455/97 Art. 1º Constitui crime de tortura: I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa; II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. Pena - reclusão, de dois a oito anos. Lei nº 13.869/19 Art. 22. Invadir ou adentrar, clandestina ou astuciosamente, ou à revelia da vontade do ocupante, imóvel alheio ou suas dependências, ou nele permanecer nas mesmas condições, sem determinação judicial ou fora das condições estabelecidas em lei: Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. Em especial no crime de invasão de domicílio sem o consentimento do morador, mencionado na Lei nº 13.869/19, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o militar deve registrar, com vídeo e áudio, o aludido consentimento, sob pena de a prova obtida por esse meio não ter validade, nesses termos: AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE REVISÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. BUSCA DOMICILIAR EFETUADA POR POLICIAIS MILITARES SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. FUNDADAS RAZÕES PARA REALIZAÇÃO DA BUSCA. INVERSÃO DA ORDEM DO INTERROGATÓRIO. ART. 400 DO CPP. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 2022620 / AC) No mesmo sentido narrado, a prova obtida pelos militares sem que tenha havido o consentimento do morador para ingressar em seu domicílio macula de nulidade o processo penal, não podendo ser levada em consideração por parte do Poder Judiciário, nesses termos: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. LEGISLAÇÃO EXTRAVAGANTE. TRÁFICO DE DROGAS (140 G DE MACONHA E 19,5 G DE COCAÍNA). NULIDADE. PROVAS ILÍCITAS. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. INVASÃO DOMICILIAR. DENÚNCIA ANÔNIMA. MANIFESTA ILEGALIDADE. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. CARÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL, BEM COMO DE CONSENTIMENTO VÁLIDO DO MORADOR. MANUTENÇÃO DA ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 2022620 / AC) O que se percebe pela jurisprudência citada é que a prova é eivada de nulidade, desde a fase investigatória, contaminando-se todas as provas produzidas posteriormente, na forma do art. 157, § 1º, do CPP. Caso não haja nenhuma outra prova hábil a condenar o acusado, a impronúncia é medida que se impõe, na forma do art. 414 CPP. 4. DO MÉRITO 4.1 Da prova testemunhal Caso não se reconheça a patente nulidade absoluta demonstrada anteriormente e a ilicitude das provas produzidas, apenas por amor ao debate, passa-se à análise das provas produzidas em audiência de instrução e julgamento. A única testemunha ouvida em juízo que trouxe algo relevante e sem qualquer mácula foi aquela arrolada pela Defesa, a qual disse que presenciou os policiais militares adentrarem na casa do acusado sem autorização expressa, bem como espancou o acusado para indicar onde estavam os instrumentos e produtos dos crimes, o que coloca em destaque tudo aquilo que teria sido produzido na fase policial, afastando qualquer autoria ou materialidade delitiva. Dessa forma, percebe-se que o agente não deve ser pronunciado, pois ausentes elementos mínimos para tanto. 4.2 Da dosimetria da pena – Concurso Material de Crimes - Inexistência O grande ponto de destaque é a ocorrência do princípio da consunção e do chamado erro na execução, pois são institutos que beneficiam o acusado em detrimento do concurso material de crimes. Pelo chamado princípio da consunção, o agente, para chegar ao crime-fim, necessita de passar pelo crime-meio, chamado de crime de passagem, sendo apenas uma etapa do caminho delitivo para alcançar o seu objetivo final. Por exemplo, caso queira praticar um homicídio por meio de arma de fogo, deverá praticar os crimes de posse, porte e disparo de arma de fogo, todos previstos na Lei nº 10.826/03, mas que serão absorvidos pelo delito-fim de homicídio, previsto no art. 121 do CP. Logo, não se justifica a aplicação do concurso materialde crimes com fundamento no art. 69 do CP. Na mesma esteira de pensamento, o art. 73 do CP estipula que, no erro na execução de um crime, devem ser mencionados os institutos dos concursos formais próprio e impróprio de crimes, sendo que, no primeiro, há a aplicação de um crime somente com a pena exasperada, enquanto, no último, há a soma das penas. Essa é a dicção dos artigos em comento, nesses termos: Erro na execução Art. 73 - Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código. Quando o agente queria atingir apenas uma pessoa, mas atinge ambas, tem-se a regra do art. 70 do CP, que é citada na parte final do art. 73. Por tal regra, ocorre aquilo que se chama de concurso formal próprio, em que o agente responde apenas pelo crime mais grave com a pena exasperada, sem que haja a soma delas. Por exemplo, se cometeu um homicídio que almejava e a outra morte não foi desejada, responderá por um crime de homicídio com a pena aumentada, em vez de somar dois homicídios. Essa é a dicção do art. 70, 1ª parte, do CP, nesses termos: Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior. Parágrafo único - Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código. Diferentemente do concurso material de crimes, que está previsto no art. 69 do CP, não há a soma das penas, o que beneficia em muito a dosimetria da pena do acusado e deve ser considerada pelo Magistrado para fins de prolação de uma decisão. A jurisprudência nacional é no sentido do reconhecimento dos institutos desenhados, nesses termos: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO PELO MOTIVO FÚTIL E POR EMPREGO DE RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA (ART. 121, §2º, II E IV, DO CÓDIGO PENAL). DOSIMETRIA. UTILIZAÇÃO DA SEGUNDA QUALIFICADORA PARA EXASPERAR A PENA-BASE. POSSIBILIDADE. 1. O acórdão recorrido encontra-se em harmonia com a jurisprudência desta Corte Superior, no sentido de ser admissível, quando reconhecida a incidência de duas qualificadoras, que uma delas seja utilizada para tipificar a conduta qualificada e a outra para fins de exasperação da pena-base. Precedentes. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO. VALORAÇÃO NEGATIVA DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. FUNDAMENTOS EXORBITANTES DO TIPO PENAL VIOLADO. CULPABILIDADE, CIRCUNSTÂNCIAS E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. AUSÊNCIA DE BIS IN IDEM. (AgRg no REsp 1553373 / SP) Assim, não se pode enquadrar o acusado na forma prevista na exordial acusatória, pois o crime de homicídio absorve o crime de posse e porte ilegal de arma de fogo, bem como não foram dois homicídios em concurso material de crimes, mas apenas um, o qual deve ter a pena exasperada em 1/6, considerando que duas vítimas foram atingidas. 5. DOS PEDIDOS Por todo o exposto, requer seja conhecido e provido o presente recurso para que a decisão de pronúncia seja reformada com os seguintes pedidos: a) Preliminarmente, seja reconhecida a nulidade absoluta do feito, em razão da inversão do rito processual, com prejuízo presumido para o acusado, anulando-se o feito desde a audiência de instrução e julgamento, bem como a ilicitude das provas produzidas, contaminando-se toda a marcha processual até o presente momento; b) Não reconhecendo as teses anteriores, seja o acusado impronunciado, pois ausente autoria e materialidade delitivas próprias para tanto; c) Pelo princípio da eventualidade, não sendo nada reconhecido, que seja dado o devido enquadramento legal sem a aplicação do instituto do concurso material de crimes, reconhecendo-se a hipótese de erro na execução. Nesses termos, pede deferimento. Porto Seguro/BA, 14 de fevereiro de 2024 ASSINATURA ADVOGADO OAB Nº