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APG 3º PERÍODO ACADÊMICA: AMANDA MARTINS COSTA AGENTE ETIOLÓGICO DAS ARBOVIROSES As arboviroses são infecções causadas por vírus transmitidos por artrópodes (mosquitos, carrapatos e outros insetos), principalmente mosquitos do gênero Aedes e Culex. Os vírus responsáveis pertencem a famílias e gêneros específicos, caracterizados por serem vírus de RNA, muitos deles neurotrópicos e capazes de causar doenças febris, hemorrágicas e neurológicas. Principais Agentes Etiológicos das Arboviroses 1. Família Flaviviridae Gênero Flavivirus Essa é a família e gênero mais representativos das arboviroses humanas. Vírus Dengue (DENV) Possui 4 sorotipos antigenicamente distintos (DENV-1, DENV-2, DENV-3, DENV-4) o que dificulta a imunidade duradoura cruzada, permitindo reinfecções. Vírus de RNA simples fita positiva. Transmitido principalmente pelo mosquito Aedes aegypti. Causa febre alta, dor articular, mialgia e, em casos graves, hemorragia e choque. Vírus Zika Vírus de RNA fita positiva, similar ao dengue. Transmitido por Aedes aegypti e albopictus. Causa doença geralmente leve, mas pode causar microcefalia e outras malformações congênitas se infectar gestantes. Pode ser transmitido sexualmente. Vírus Febre Amarela Vírus RNA fita positiva. Transmitido por mosquitos Haemagogus e Sabethes (ciclo silvestre) e Aedes aegypti (ciclo urbano). Pode causar desde febre leve até insuficiência hepática e renal grave. S13P1: ARBOVIROSE Objetivos: Compreender a epidemiologia, gente etiológico das arboviroses; Entender os fatores de risco, fisiopatologia e as manifestações clínicas das arboviroses (foco dengue); Elucidar as classificações, complicações; Explicar o diagnóstico, tratamento medicamentoso e seu mecanismo de ação e prevenção. 1. EPIDEMIOLOGIA DAS ARBOVIROSES Transmissão: Ocorre principalmente pela picada de mosquitos infectados, após terem se alimentado do sangue de uma pessoa ou animal infectado. O ciclo pode ser: Urbano: humanos → mosquitos → humanos (ex: dengue, zika, chikungunya). Silvestre: primatas → mosquitos silvestres → primatas (ex: febre amarela silvestre). Rural/periurbano: mistura de ciclos, como em áreas desmatadas. Distribuição geográfica: Predominam em regiões tropicais e subtropicais, como: América Latina África Sudeste Asiático A alta densidade populacional, a urbanização desordenada e as mudanças climáticas favorecem a expansão dos vetores. Situação no Brasil: O Brasil tem epidemias recorrentes de dengue desde os anos 1980. A introdução do vírus Zika em 2015 e a reintrodução da febre amarela silvestre colocaram o país em alerta sanitário. Em 2024, o Brasil enfrentou uma epidemia de dengue com alta incidência em todas as regiões (Fonte: Ministério da Saúde, 2024). DADOS RECENTES (exemplo de 2024): Casos de dengue no Brasil: mais de 4 milhões. Casos de chikungunya: cerca de 250 mil. Casos de zika: mais de 10 mil. APG 3º PERÍODO ACADÊMICA: AMANDA MARTINS COSTA FISIOPATOLOGIA DA DENGUE (FORMA CLÁSSICA) 1. Entrada do vírus no organismo A infecção começa após a picada do mosquito Aedes aegypti infectado. O vírus é inoculado na pele e infecta primeiramente as células dendríticas, como as células de Langerhans. 2. Replicação inicial e disseminação Ocorre a replicação viral no local da entrada (pele). Em seguida, as células infectadas migram para os linfonodos regionais. A partir daí, o vírus atinge a corrente sanguínea (viremia). 3. Ativação do sistema imunológico O vírus infecta monócitos e linfócitos. Essas células produzem citocinas inflamatórias, como: TNF-alfa (Fator de Necrose Tumoral alfa) IL-6 (Interleucina-6) Essas citocinas são responsáveis pelos sintomas sistêmicos, como a febre. 4. Produção de anticorpos Estímulo à produção de anticorpos IgM específicos contra o vírus dengue. Os anticorpos se ligam aos antígenos virais, formando imunocomplexos. Os anticorpos IgM aparecem por volta do 6º dia e ajudam na neutralização viral, marcando o declínio da viremia. 5. Resposta dos linfócitos T Os linfócitos T liberam interferons (IFNs), que: Inibem a atividade da medula óssea Reduzem a produção de células sanguíneas (leucócitos, hemácias e plaquetas). Isso pode gerar leucopenia e trombocitopenia transitórias, que melhoram conforme a febre regride. 2. Família Togaviridae Gênero Alphavirus Vírus Chikungunya Vírus de RNA fita positiva. Transmitido por Aedes aegypti e albopictus. Causa febre alta, dor articular intensa e rash cutâneo. 3. Outras Famílias Importantes Bunyaviridae: inclui vírus como o vírus da febre da Crimeia-Congo. Reoviridae: como o vírus da febre da Colorado (menos comum em humanos). Características Gerais dos Arbovírus Vírus RNA, com capacidade de rápida mutação. Ciclo de transmissão envolve hospedeiro vertebrado (homem, macacos, aves) e vetor artrópode. Capacidade de infectar células do sistema imune, endoteliais e neurais. Causam síndromes febris agudas, hemorrágicas e/ou neurológicas. Fatores de risco epidemiológicos: Alta presença do mosquito vetor (Aedes aegypti especialmente). Clima quente e úmido, ideal para reprodução do vetor. Armazenamento inadequado de água. Falta de saneamento básico. Baixa cobertura vacinal (no caso da febre amarela). Mobilidade populacional (migrações e viagens internacionais). Fatores de Risco Infecção prévia por outro sorotipo (fenômeno de amplificação imune) Crianças ALT). Comprometimento neurológico (encefalopatia). Miocardite, insuficiência renal aguda, entre outros. 5. Fase de Recuperação Com a resolução da viremia e redução da inflamação: Há reabsorção do plasma extravasado. Plaquetas se recuperam progressivamente. Risco de sobrecarga circulatória se houver reposição excessiva de fluidos. FISIOPATOLOGIA DA DENGUE HEMORRÁGICA (DENGUE GRAVE) 1. Infecção Secundária por Diferente Sorotipo (Reinfecção): A dengue é causada por quatro sorotipos do vírus DENV (1 a 4). Uma infecção por um segundo sorotipo pode desencadear formas graves. Os anticorpos gerados na infecção anterior reagem sem neutralizar o novo sorotipo → formação de imunocomplexos. 2. Fagocitose de Imunocomplexos por Monócitos/Macrófagos: Imunocomplexos são fagocitados por monócitos/macrófagos, que são os principais locais de replicação viral. Isso aumenta a carga viral e gera ainda mais imunocomplexos circulantes. 3. Ativação Exagerada do Sistema Complemento: Os imunocomplexos ativam o sistema complemento. Isso leva à liberação de anafilatoxinas (C3a, C5a), que: Aumentam a permeabilidadevascular. Favorecem o extravasamento de plasma → hipovolemia e choque. 4. Lesão Hepática e Coagulação: O vírus se replica nos hepatócitos, causando lesão hepática. Isso reduz a produção de fatores de coagulação e altera os testes hepáticos (ALT/AST elevados). Também ocorre inibição da maturação dos megacariócitos → trombocitopenia (plaquetas ↓). 5. Quadro Hemorrágico Grave: Ocorre pela combinação de: Trombocitopenia intensa. Disfunção de fatores de coagulação. Aumento da permeabilidade capilar. Pode levar a sangramentos internos e externos, choque hipovolêmico e falência de órgãos. APG 3º PERÍODO ACADÊMICA: AMANDA MARTINS COSTA FASES DA INFECÇÃO PELO VÍRUS DENGUE 1. Fase Febril (3 a 7 dias) Início súbito com febre alta ≥ 38,5 ºC. Sintomas comuns: Cefaleia. Mialgia e artralgia. Dor retro-orbitária. Exantema (erupção macular/maculopapular, com ou sem prurido). Náuseas e vômitos. Achados laboratoriais: Leucopenia. Trombocitopenia (≤100.000/mm³). AST e ALT moderadamente elevados. Outros achados possíveis: Conjuntivite. Eritema faríngeo. Linfadenopatia. Hepatomegalia. Petéquias, hematomas, gengivorragia. Evolução: A maioria melhora após essa fase. Em alguns, evolui para a fase crítica. 2. Fase Crítica (entre o 3º e 7º dia da doença) Ocorre em uma minoria dos pacientes. Fatores associados: Infecção secundária (sorotipo diferente). Crianças 2 cm. Aumento do hematócrito com queda rápida das plaquetas (sinal de extravasamento de plasma). Indica risco de progressão para formas graves. Necessita de observação em ambiente hospitalar. 3. Dengue grave É a forma mais severa e inclui: Vazamento grave de plasma, podendo levar a: Choque hipovolêmico. Acúmulo de líquido com desconforto respiratório. Sangramento grave: espontâneo ou após pequenos traumas. Comprometimento grave de órgãos, como: AST ou ALT ≥ 1000 U/L (lesão hepática importante). Alteração do nível de consciência. Falência de órgãos (ex: hepática, renal, cardíaca). Requer internação imediata em UTI. APG 3º PERÍODO ACADÊMICA: AMANDA MARTINS COSTA 2. Diagnóstico Laboratorial – Confirmação Etiológica A confirmação da infecção por DENV pode ser feita por diferentes métodos, com variação de sensibilidade, especificidade, custo e tempo de detecção: a) Detecção do Antígeno NS1 Detecta a presença do antígeno viral NS1 (proteína não estrutural do vírus). Mais eficaz nos 3 a 5 primeiros dias de sintomas (fase virêmica). Alta especificidade – confirma infecção ativa. Método rápido (teste imunocromatográfico), mas pode apresentar sensibilidade reduzida em infecções secundárias (reinfecção por outro sorotipo). b) RT-PCR (Reação em Cadeia da Polimerase com Transcrição Reversa) Detecta o RNA viral diretamente. Alta sensibilidade e especificidade – considerado padrão-ouro na fase aguda. Permite identificar o sorotipo viral (DENV 1, 2, 3 ou 4). Indicado nos primeiros 5 dias de sintomas. Custo elevado e requer laboratório especializado. c) Sorologia – Anticorpos IgM e IgG Método mais acessível e barato, mas com menor especificidade (possíveis reações cruzadas com outros flavivírus, como Zika ou febre amarela). IgM: Detectável a partir do 5º dia do início dos sintomas. Indica infecção recente. IgG: Detectável mais tardiamente. Presente em infecções passadas ou em infecções secundárias (pode complicar a interpretação). Pode haver falsos positivos e negativos dependendo do tempo de coleta. d) Exames Complementares para Monitoramento Clínico Esses exames não confirmam a infecção, mas ajudam a avaliar a gravidade: Hemograma: Leucopenia (↓ leucócitos) Trombocitopenia (↓ plaquetas) – marcador de risco de sangramento Hemoconcentração (↑ hematócrito) – sinal de extravasamento plasmático Função hepática: Aumento de transaminases (AST e ALT) Albumina e coagulograma – para avaliar complicações em casos graves. 3. Fase de Convalescença (recuperação) Fim do vazamento capilar. Reabsorção dos líquidos acumulados. Melhora dos sinais vitais e laboratoriais: o Elevação das plaquetas. o Normalização do hematócrito. Exantema de recuperação: o Eritematoso, pruriginoso, com áreas de pele poupadas ("ilhas de pele sã"). o Aparece 1-2 dias após a febre ceder, dura 1 a 5 dias. Possível fadiga prolongada, especialmente em adultos. Duração: cerca de 2 a 4 dias. DIAGNÓSTICO DA INFECÇÃO POR DENV 1. Abordagem Clínica – Suspeita Diagnóstica Inicial A suspeita de dengue deve ser feita clinicamente, com base em sinais e sintomas típicos e no contexto epidemiológico. A seguir, os principais elementos: a) Manifestações Clínicas Típicas Indivíduos com febre aguda (início súbito) e 2 ou mais dos seguintes sintomas devem levantar suspeita: Febre aguda (≥38,5 ºC) Cefaleia intensa – geralmente frontal. Dor retro-orbital – dor atrás dos olhos, acentuada ao movimento ocular. Mialgia – dores musculares intensas, especialmente em membros e costas. Artralgia – dor nas articulações. Náuseas e vômitos – frequentemente associados à anorexia. Exantema – erupção cutânea do tipo maculopapular ou petequial, geralmente surgindo entre o 3º e o 5º dia. Manifestações hemorrágicas – como gengivorragia, epistaxe, petéquias, púrpura, menorragia ou sangramento gastrointestinal. Teste do laço (ou garrote) positivo – indica fragilidade capilar e pode ser utilizado como um sinal de alerta. Leucopenia – comum nos exames laboratoriais iniciais. b) Importância da Epidemiologia A suspeita é reforçada se o paciente: Mora ou esteve nos últimos 14 dias em área com transmissão ativa de dengue. Esteve exposto a vetores (mosquito Aedes aegypti) em áreas endêmicas. Relata casos próximos (familiares, vizinhos) com sintomas semelhantes. APG 3º PERÍODO ACADÊMICA: AMANDA MARTINS COSTA 4. FEBRE AMARELA Fisiopatologia Vírus da família Flaviviridae. Após infecção, replica-se em linfonodos e atinge fígado → necrose hepatocelular → icterícia e sangramentos. Há formas silvestre (vetores Haemagogus e Sabethes) e urbana (Aedes aegypti). Manifestações clínicas Fase inicial: febre, calafrios, mialgia, náuseas. Fase tóxica (grave): icterícia, hemorragiadigestiva, insuficiência hepática e renal. Alta letalidade nas formas graves. Diagnóstico RT-PCR nas fases iniciais. Sorologia IgM. Elevação de transaminases (ALT/AST) com predomínio de AST. Prevenção Vacina 17D (atenuada): dose única a partir dos 9 meses. Obrigatória para entrada em áreas endêmicas. Controle do vetor. 1. DENGUE Fisiopatologia O vírus da dengue possui 4 sorotipos (DENV 1–4). Após a picada do mosquito Aedes aegypti, o vírus infecta células dendríticas e macrófagos. Ativa uma resposta imune intensa → liberação de citocinas inflamatórias. Pode haver aumento da permeabilidade vascular, extravasamento plasmático e, em casos graves, choque. Manifestações clínicas Início súbito com febre alta (39–40°C), mialgia intensa ("febre quebra-ossos"), cefaleia retro-orbital, náuseas e exantema. Sinais de alarme (grave): Dor abdominal intensa Vômitos persistentes Sangramentos mucosos Derrame pleural ou ascite Hipotensão (choque) Diagnóstico Clínico-epidemiológico (área endêmica + sintomas típicos). Laboratorial: NS1 (antígeno viral) – até o 5º dia. Sorologia IgM/IgG – após o 6º dia. RT-PCR – Detecta RNA viral na fase inicial. Hemograma: leucopenia, trombocitopenia, hematócrito aumentado. Prevenção Controle do vetor: eliminação de criadouros. Vacina (QDenga®): liberada para uso no Brasil a partir de 2024 (crianças e adultos de 4 a 60 anos). 2. ZIKA Fisiopatologia O vírus Zika também pertence à família Flaviviridae. Infecta fibroblastos, queratinócitos e células dendríticas. Grande tropismo por tecido neural e placenta. Transmissão vertical pode causar síndrome congênita do Zika. Manifestações clínicas Em 80% dos casos: assintomática. Quando sintomática: Febre baixa Exantema maculopapular difuso Prurido Conjuntivite não purulenta Mialgia, artralgia Em gestantes: risco de microcefalia e outras Diagnóstico RT-PCR: sangue ou urina nos primeiros 7 dias. Sorologia: IgM (pode haver reação cruzada com dengue). Prevenção Sem vacina até o momento. Controle do vetor. Gestantes devem evitar áreas com surto. 3. CHIKUNGUNYA Fisiopatologia Vírus da família Togaviridae. Infecta fibroblastos, sinoviócitos e células endoteliais. Provoca inflamação sistêmica e artrite viral intensa, por vezes prolongada. Manifestações clínicas Febre alta súbita Artralgia/artrite grave (dedos, tornozelos, joelhos), simétrica Exantema, cefaleia, mialgia Casos crônicos: artralgia persistente por meses Diagnóstico RT-PCR: até o 8º dia de sintomas. Sorologia IgM/IgG: após 6–8 dias. Diagnóstico diferencial com dengue (principalmente na fase febril). Prevenção Controle do vetor. Sem vacina disponível atualmente (estudos em andamento).