Prévia do material em texto
Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – UniFMU Teoria Constitucional do Processo Professor Gustavo Belucci 1 A D V E R T Ê N C I A Este roteiro é apenas um esboço para o acompanhamento das aulas. Não é material suficiente para fins de estudo completo, que DEVERÁ SEMPRE ser complementado com a bibliografia indicada e com a leitura dos dispositivos legais. O estudo feito aqui pode eventualmente incluir conceitos de outros professores consagrados, pois é elaborado com fins meramente de orientação dos alunos para acompanhamento das aulas, sem finalidade de divulgação ou cópia das respectivas obras. Aula 2 – PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DE PROCESSO. EMENTA: Compreender os princípios processuais previstos na Constituição Federal: devido processo legal, acesso a justiça, contraditório, duração razoável do processo, isonomia, imparcialidade do juiz, duplo grau de jurisdição, publicidade dos atos processuais, motivação das decisões. Examinar os princípios constitucionais a partir de exemplos. 1. Introdução1. O constitucionalismo moderno é o ponto de partida para várias reflexões no âmbito do direito. A correta concepção do estado constitucional e da constituição consubstancia num fator essencial para a investigação de todo e qualquer fenômeno jurídico. O Direito Processual, por sua vez, tem suas linhas fundamentais traçadas pelo Direito Constitucional. A Constituição Federal determina os institutos característicos do desenvolvimento do processo, fixa a estrutura dos órgãos jurisdicionais, garantindo a distribuição da justiça, estabelece regras como os princípios constitucionais processuais e assegura a todos o acesso à Justiça. Não foi por acaso que as Constituições sempre inseriram em seus contextos regras processuais. Antônio Carlos Araújo Cintra2 coloca que ao reconhecer no processo o instrumento público de realização de justiça, a Constituição abre a possibilidade de vê-lo transformado em garantia de liberdade pelo exercício da tutela jurisdicional através dos procedimentos legais. 1 Mais informações, bem como evolução histórica do processo ao longo das Constituições pode ser verificado aqui: http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,a-constitucionalizacao-do-processo-civil,48242.html 2 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pelegrini, DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. São Paulo, SP: Malheiros, 1999, p. 78. http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,a-constitucionalizacao-do-processo-civil,48242.html Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – UniFMU Teoria Constitucional do Processo Professor Gustavo Belucci 2 É exatamente através da Constituição que o processualista terá um entendimento completo do fenômeno processo e de seus princípios. Hoje, acentua-se a ligação entre processo e Constituição no estudo concreto dos institutos processuais, não mais colhidos na esfera fechada do processo, mas no sistema unitário do ordenamento jurídico: é esse o caminho, foi dito com muita autoridade, que transformará o processo de simples instrumento de justiça, em garantia de liberdade. Nesse cenário, é preciso expor qual é o modelo de direito processual imposto pela Constituição (devido processo legal e seus corolários), bem como apresentar as regras sobre competência legislativa em matéria de direito processual e a organização judiciária constitucionalmente imposta. O Direito Processual Constitucional é geral; aplica-se a qualquer espécie de processo e, nessa condição, convém seja de logo apresentado em uma disciplina com finalidade propedêutica3. A propósito, como ponto de partida, pode-se ressaltar a relação indissociável de Constituição e processo no artigo 1º, do CPC: Art. 1o O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código. 2. Princípios constitucionais do processo em espécie. a) Igualdade/isonomia (artigo 5º, inciso I, da CF). Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição. Previsão no CPC: “Art. 7o É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório”. O princípio da isonomia, também conhecido como princípio da igualdade, representa o símbolo da democracia, pois indica um tratamento justo para os cidadãos. A igualdade, de 3 Disponível em: http://www.frediedidier.com.br/wp-content/uploads/2012/06/O-ensino-da-Teoria-Geral-do- Processo.pdf http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm http://www.frediedidier.com.br/wp-content/uploads/2012/06/O-ensino-da-Teoria-Geral-do-Processo.pdf http://www.frediedidier.com.br/wp-content/uploads/2012/06/O-ensino-da-Teoria-Geral-do-Processo.pdf Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – UniFMU Teoria Constitucional do Processo Professor Gustavo Belucci 3 acordo com a Constituição Federal, possui duas vertentes: Igualdade Material: tipo de igualdade, em que todos os seres humanos recebem um tratamento igual ou desigual, de acordo com a situação. Quando as situações são iguais, deve ser dado um tratamento igual, mas quando as situações são diferentes é importante que haja um tratamento diferenciado. Igualdade Formal: é aquela presente na Constituição Federal e que trata da igualdade perante a lei. De acordo com o artigo 5º, isso quer dizer que homens, mulheres e todos os cidadãos brasileiros são iguais conforme a legislação. Esse princípio pode ser usado para limitar o legislador (não será possível criar outras leis que violem o princípio da igualdade), limitar o intérprete da lei (consiste na aplicação da lei de acordo com o princípio), limitar o indivíduo (que não poderá apresentar condutas contrárias a igualdade, ou seja, realizar atos preconceituosos, racistas ou discriminatórios). b) Inafastabilidade da jurisdição (artigo 5º, inciso XXXV, da CF). (...) XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Previsão no CPC: “Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. § 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei. § 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos. § 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial”. Primariamente, trata-se, em poucas palavras, da possibilidade de provocar a prestação jurisdicional para garantir a tutela de direitos; “é um direito fundamental formal que carece de densificação através de outros direitos fundamentais materiais” (CANOTILHO, 2003, p. 496). Ou seja, consiste em um veículo para concretização dos direitos materiais. Contudo, atualmente, o direito à inafastabilidade do Poder Judiciário não mais se resume a provocar o aparato jurisdicional. Além disso, passou a ser entendido também como o direito à tutela jurisdicional efetiva - complexo de direitos, deveres e ônus que estende durante todo o processo, concebido como instrumento para proteção do direito material, como afirma Marinoni4. 4 MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 5. ed, rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011. Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – UniFMU Teoria Constitucional do ProcessoProfessor Gustavo Belucci 4 Há também, nesta temática, quem diferencie os conceitos de acesso ao Judiciário, acesso à Jurisdição, e acesso à Justiça, nos seguintes termos: Cláusula do acesso à justiça: insere o indivíduo em uma sociedade em que ele pode ter acesso a proteger os seus direitos. Proteção dos direitos subjetivos e, caso precise, mediante a atuação/intervenção do Estado. Trata-se do conceito mais amplo. Acesso à jurisdição (direito fundamental à tutela jurídica efetiva) – direito ao devido processo, a que a tutela jurisdicional seja efetiva, que o processo seja equânime, em prazo razoável, com o cumprimento da decisão. Conceito ligado ao processo justo e às garantias processuais, fenômeno endoprocessual. Acesso ao judiciário – acesso ao Poder Judiciário; criação de órgãos jurisdicionais, aproximar a população, justiça itinerante. c) Juiz natural (promotor natural) “ (...) XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção; (...) LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”. O princípio do juiz natural preleciona a utilização de regras objetivas de competência jurisdicional para garantir independência e a imparcialidade do órgão julgador. Trata-se, portanto, de um juiz previamente encarregado, na forma da lei, como competente para o julgamento de determinada lide, o que impede, entre outras coisas, o abuso de poder. Como consequência, não se admite a escolha específica nem a exclusão de um magistrado de determinado caso. Com base nesse entendimento, uma vara de família – que, entre outros assuntos, cuida de divórcios e guarda de filhos - não pode analisar uma ação criminal (latrocínio, por exemplo). No caso de haver mais de uma vara ou turma especializadas no mesmo tema, os processos são distribuídos aos magistrados por meio de sorteio, novamente para garantir a imparcialidade das decisões.5 d) Devido processo legal – “due process of law” (artigo 5º, inciso LIV, da CF)6. (...) LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; 5 Disponível em: http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/85865-cnj-servico-principio-do-juiz-natural 6 Mais informações em: https://jus.com.br/artigos/22857/principio-do-devido-processo-legal http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/85865-cnj-servico-principio-do-juiz-natural https://jus.com.br/artigos/22857/principio-do-devido-processo-legal Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – UniFMU Teoria Constitucional do Processo Professor Gustavo Belucci 5 É o princípio que assegura a todos o direito a um processo com todas as etapas previstas em lei e todas as garantias constitucionais. Se no processo não forem observadas as regras básicas, ele se tornará nulo. Segundo José Afonso da Silva, o princípio do devido processo legal combinado com o direito de acesso à justiça (artigo 5º, XXXV), o contraditório e a ampla defesa (art. 5º, LV), fecha o ciclo das garantias processuais. Assim, garante-se o processo, com as formas instrumentais adequadas, de forma que a prestação jurisdicional, quando entregue pelo Estado, dê a cada um, o que é seu. Inegavelmente, o contraditório, a ampla defesa e o direito de acesso à justiça (princípio da inafastabilidade da jurisdição) são inerentes ao devido processo legal. De fato, representam corolários da aplicação deste princípio. Contudo, a materialização do devido processo legal vai mais além, isto é, se dá de forma ainda mais abrangente, como se pode notar com alguns exemplos: o tratamento paritário conferido às partes envolvidas no processo (art. 5º, I, CPC); a publicidade do processo (art. 5º, LX, CF); a proibição da produção de provas ilícitas (art. 5º, LVI); a imparcialidade do julgador, bem como a garantia do juiz natural (art. 5º, XXXVII e LIII); a motivação das decisões (art. 93, IX); a duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII), etc. Todos esses princípios e garantias solidificam o devido processo legal, ou seja, formam um processo legalmente estabelecido. e) Contraditório e ampla defesa (artigo 5º, inciso LV) e do duplo grau de jurisdição (“meios e recursos a ela inerentes”)7. (...) LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; Previsão no CPC: “Art. 9º Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida. Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica: I à tutela provisória de urgência; II às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III; III à decisão prevista no art. 701. Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”. Segundo Maria Sylvia Zanella di Pietro, o princípio do contraditório, que é inerente ao direito de defesa, é decorrente da bilateralidade do processo: quando uma das partes alega alguma coisa, há de ser ouvida também a outra, dando-se-lhe oportunidade de resposta. Ele 7 Mais informações em: http://www.ambito- juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10512&revista_caderno=26 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm#art311ii http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm#art701 http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10512&revista_caderno=26 http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10512&revista_caderno=26 Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – UniFMU Teoria Constitucional do Processo Professor Gustavo Belucci 6 supõe o conhecimento dos atos processuais pelo acusado e o seu direito de resposta ou de reação. Exige: 1- notificação dos atos processuais à parte interessada; 2- possibilidade de exame das provas constantes do processo; 3- direito de assistir à inquirição de testemunhas; 4- direito de apresentar defesa escrita. A ampla defesa consubstancia-se no direito das partes de oferecer argumentos em seu favor e de demonstrá-los, nos limites legais em que isso for possível. Existe, portanto, uma conexão do princípio da ampla defesa com os princípios da igualdade e do contraditório. O princípio da ampla defesa não supõe uma infinidade de atos no que concerne à produção da defesa a bel prazer, sem limites determinados ou mesmo a qualquer tempo ou a qualquer hora, mas, ao contrário, que a defesa necessária se produza pelos meios e elementos totais de alegações e de provas no tempo processual que será devidamente oportunizado pela lei. Sob enfoque penal, o princípio da ampla defesa figura como uma garantia com destinatário certo, qual seja, o acusado. E a defesa pode ser subdividida em: defesa técnica (defesa processual ou específica), exercida por profissional habilitado; e autodefesa (defesa material ou genérica) exercida pelo próprio imputado. • Atenção com o duplo grau de jurisdição: o princípio do duplo grau de jurisdição nos revela a possibilidade de revisão, mediante o recurso cabível, das causas já julgadas pelo juiz de primeiro grau (ou primeira instância). Dessa forma, esse princípio nos garante a possibilidade de revisão por uma instância superior. A raiz desse princípio encontra-se na própria história do homem que insatisfeito com o resultado busca sempre rever uma decisão ou seja, pede uma segunda opinião. De forma geral, os princípios ficam a critério das partes, para serem examinados por uma instância superior, ad quem, em razão de não concordar com a decisão da instância inferior. Não é expresso na CF. • Quadro esquemático de organização judiciária no Brasil (vide artigos 92 a 126, da CF): Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – UniFMU TeoriaConstitucional do Processo Professor Gustavo Belucci 7 f) Inadmissibilidade da prova ilícita (artigo 5º, inciso LVI). (...) LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos; Os dois clássicos sistemas sobre a prova ilícita (ou seja: obtida por meio ilícito) são: (a) o da admissibilidade (male captum, bene retentum) e (b) o da inadmissibilidade. Até meados da década de 70 vigorava o primeiro no Brasil; a partir daí passou a prosperar na jurisprudência do STF sobretudo o segundo, que acabou sendo acolhido pela CF de 1988 (art. 5º, inc. LVI). Inadmissibilidade significa que a prova ilícita não pode ser juntada aos autos. E se juntada? É ineficaz e deve ser desentranhada. E se a sentença nela se baseou? É nula. As provas ilícitas, bem como todas aquelas delas derivadas, são constitucionalmente inadmissíveis, devendo, pois, serem desentranhadas do processo, não tendo, porém, o condão de anulá-lo, permanecendo válidas as demais provas lícitas e autônomas delas não decorrentes (teoria dos frutos da árvore envenenada). Corroborando este entendimento, Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – UniFMU Teoria Constitucional do Processo Professor Gustavo Belucci 8 Ada Pellegrini Grinover aduz que: a posição mais sensível às garantias da pessoa humana e, consequentemente, mais intransigentes com os princípios e normas constitucionais, é a que professa a transmissão da ilicitude da obtenção da prova às provas derivadas, que são, assim, igualmente banidas do processo. g) Publicidade e fundamentação das decisões judiciais (artigo 5º, inciso LX e artigo 93, IX, da CF). (...) LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem; Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: (...) IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse público o exigir, limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes. Previsão no CPC: Art. 11. Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade. Parágrafo único. Nos casos de segredo de justiça, pode ser autorizada a presença somente das partes, de seus advogados, de defensores públicos ou do Ministério Público. (...) Art. 140. O juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico. Parágrafo único. O juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em lei. h) Princípio da Celeridade ou Princípio da Brevidade: (artigo 5º, inciso LXXVIII, da CF). (...) LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. Previsão no CPC: Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa. Art. 5º Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar se de acordo com a boa-fé. Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. Esse princípio já se encontrava assegurado nas normas infraconstitucionais, sendo previsto inclusive punições processuais no caso de apresentarem recursos meramente Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – UniFMU Teoria Constitucional do Processo Professor Gustavo Belucci 9 protelatórios, dentre outras possibilidades. Com a Emenda Constitucional nº 45, o art. 5º., LXXVIII passou também a referir-se a essa garantia. OBS: para se ter ideia do tempo de duração de um processo, bem como número atual de processos em curso no país, produtividade do Poder Judiciário, verifique-se o relatório “Justiça em Números”, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e disponível em: http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/pj-justica-em-numeros. 3. Outros princípios relacionados na Constituição. Além disso, também se pode relacionar no artigo 8º, do CPC: Art. 8o Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência. Pela redação do dispositivo, tem-se: a) dignidade da pessoa humana: fundamento do Estado Democrático de Direito – artigo 1º, inciso III, da CF8; b) proporcionalidade (sem previsão expressa, mas contida na intepretação do artigo 37, caput, combinado com o artigo 5º, inciso II, todos da CF); c) razoabilidade (também sem previsão expressa, mas contida na intepretação do artigo 37, caput, combinado com o artigo 5º, inciso II, todos da CF); d) legalidade (artigo 5º, inciso II, da CF9); e) publicidade (verificado acima) e; f) eficiência: que se abstrai da redação do artigo 37, da Constituição Federal, onde se relacionam os princípios que regem a Administração Pública10 (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, cujas iniciais formam a palavra “limpe”) – critérios que o juiz atenderá ao aplicar o ordenamento jurídico. • Material complementar: 8 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III - a dignidade da pessoa humana (...). 9 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. 10 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...). http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/pj-justica-em-numeros Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – UniFMU Teoria Constitucional do Processo Professor Gustavo Belucci 10 1) Constituição interpretada pelo STF: neste link é possível consultar a Constituição interpretada pelo STF gratuitamente – servirá para todo o curso de direito: http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/constituicao.asp 2) Leitura do Livro: Princípios de Processo na Constituição Federal – Nelson Nery Jr.: JÚNIOR, Nelson Nery. Princípios de Processo na Constituição Federal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 12ª Edição, 2016. 3) Artigo sobre princípios constitucionais do processo no site do STF: http://www.stj.jus.br/internet_docs/ministros/Discursos/0001114/Princ%EDpios%20e%20Gar antias%20Constitucionais%20do%20Processo.doc. A D V E R T Ê N C I A Este roteiro é apenas um esboço para o acompanhamento das aulas. Não é material suficiente para fins de estudo completo, que DEVERÁ SEMPRE ser complementado com a bibliografia indicada e com a leitura dos dispositivos legais. O estudo feito aqui pode eventualmente incluir conceitos de outros professores consagrados, pois é elaborado com fins meramente de orientação dos alunos para acompanhamento das aulas, sem finalidade de divulgação ou cópia das respectivas obras. AULA 3 – PRINCÍPIOS DE PROCESSO NO CPC/15. EMENTA: Compreender os princípios previstos no Código de Processo Civil: dispositivo, oralidade, persuasão racional, boa- fé, cooperação etc. Introdução. Além do estudo dos princípios processuais contidos na Constituição Federal,é indispensável que se bem conheçam os princípios previstos no Código de Processo Civil. É fato que os princípios processuais são inferiores, qualitativamente, do que os princípios constitucionais mas, na medida em que auxiliam na própria interpretação e aplicação das normas de processo civil, seu estudo merece atenção11. 11 Disponível em: http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI187837,61044- Os+principios+processuais+no+Codigo+de+Processo+Civil+projetado http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/constituicao.asp http://www.stj.jus.br/internet_docs/ministros/Discursos/0001114/Princ%EDpios%20e%20Garantias%20Constitucionais%20do%20Processo.doc http://www.stj.jus.br/internet_docs/ministros/Discursos/0001114/Princ%EDpios%20e%20Garantias%20Constitucionais%20do%20Processo.doc http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI187837,61044-Os+principios+processuais+no+Codigo+de+Processo+Civil+projetado http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI187837,61044-Os+principios+processuais+no+Codigo+de+Processo+Civil+projetado Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – UniFMU Teoria Constitucional do Processo Professor Gustavo Belucci 11 Enfatizando a necessidade do estudo destes princípios, o professor Eduardo Couture, leciona que "o sistema legal é, pois, um sistema de princípios que constituem uma espécie de esqueleto, a estrutura rígida e interna da obra, seu arcabouço lógico, sobre o qual se ordenam os detalhes da composição. A lei processual é a lei que determina as minúcias por meio das quais se realiza a justiça. Toda lei processual, todo texto particular que regula um tramite do processo é, em primeiro lugar, o desenvolvimento de um princípio processual; esse princípio é em si mesmo, um partido adotado, uma escolha entre vários postulados análogos feito pelo legislador para assegurar a realização da justiça, enunciada pela Constituição". 1. Princípios processuais em espécie. Confiram-se os princípios em espécie: a) Dispositivo: O princípio dispositivo informa a condução do processo pelo juiz, bem como a própria atuação das partes. Também conhecido como princípio da inércia da jurisdição, preconiza que o juiz não pode conhecer de matéria a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte. Nesse sentido, o artigo 2º, do CPC, coloca que: “o processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei”. Nas lições de Fredie Didier, a inércia se restringe apenas à iniciativa do processo, pois uma vez provocada a Jurisdição, ou seja, uma vez ajuizada a demanda, haverá o impulso oficial para o andamento do processo. b) Oralidade: A oralidade corresponde um direito fundamental determinado pelo diálogo processual, ou seja, pela comunicação entre as partes. A oralidade abrange outros subprincípios, listados por Chiovenda: a) o predomínio (e não a exclusividade) da palavra como meio de expressão, admitindo-se o uso da escritura na preparação e na documentação; não basta a oitiva das partes e testemunhas, seguida por debates orais em audiência, para caracterizar um processo como oral, mas sim quando forem orais todos os atos que demandam a valoração de uma declaração; de outra parte, a prática de atos escritos não é incompatível com a oralidade, pois a escrita é usada para perpetuar o pensamento e possui dupla função. Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – UniFMU Teoria Constitucional do Processo Professor Gustavo Belucci 12 c) Cooperação (artigo 6º, do CPC12): A doutrina brasileira importou do Direito europeu o princípio da cooperação (ou da colaboração), segundo o qual o processo seria o produto da atividade cooperativa triangular (entre o juiz e as partes). A moderna concepção processual (no sentido de que o processo é um meio de interesse público na busca da justa aplicação do ordenamento jurídico no caso concreto) exige um juiz ativo no centro da controvérsia e a participação ativa das partes, por meio da efetivação do caráter isonômico entre os sujeitos do processo. Trata-se, como já dito, de uma evolução do princípio do contraditório. O dever de cooperação estaria voltado eminentemente para o magistrado, de modo a orientar sua atuação como agente colaborador do processo, inclusive como participante ativo do contraditório, não mais se limitando a mero fiscal de regras. Não pode existir mais o juiz apático, que aguarda manifestações das partes para atuar (“ignorante institucionalizado”). Entretanto, não somente o juiz deve colaborar para a tutela efetiva, célere e adequada. O novo direito processual defende a necessidade de uma “democracia participativa” no processo, com o consequente exercício mais ativo da cidadania, inclusive de natureza processual13. d) Persuasão racional: O juiz deve formar livremente seu convencimento na análise de provas, ressalte-se que em razão do devido processo legal, as decisões têm que ser norteada toda e qualquer conduta, onde o Juiz tem que se ater as provas nos autos, podendo em alguns casos ter a possibilidade, de provas emprestadas e provas supervenientes. O sistema Brasileiro adotou o Sistema da Persuasão Racional do juiz, sendo claro que o convencimento do magistrado é livre, porém, não é ilimitado, tem que se respaldar nas provas descritas nos autos processuais. Exemplos no CPC: Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento. 12 Art. 6o Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. 13 Mais informações em: https://elpidiodonizetti.jusbrasil.com.br/artigos/121940196/principio-da-cooperacao-ou- da-colaboracao-arts-5-e-10-do-projeto-do-novo-cpc https://elpidiodonizetti.jusbrasil.com.br/artigos/121940196/principio-da-cooperacao-ou-da-colaboracao-arts-5-e-10-do-projeto-do-novo-cpc https://elpidiodonizetti.jusbrasil.com.br/artigos/121940196/principio-da-cooperacao-ou-da-colaboracao-arts-5-e-10-do-projeto-do-novo-cpc Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – UniFMU Teoria Constitucional do Processo Professor Gustavo Belucci 13 Art. 479. O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito. e) Princípio da boa-fé e lealdade processual (artigo 5º, do CPC14): As partes têm o dever de se conduzir com ética e lealdade, cabendo ao juiz reprimir qualquer ato atentatório à dignidade da justiça. O desrespeito ao dever de lealdade processual se traduz em ilícito processual (compreendendo o dolo e a fraude processual), ao qual correspondem sanções processuais. ATENÇÃO: Outros princípios também podem ser relacionados, de acordo com a doutrina adotada pelo aluno. • Leitura complementar: FREIRE. Rodrigo da Cunha Lima. CUNHA. Maurício Ferreira. Novo Código de Processo Civil para concursos. Salvador. JusPodium. 7ª Ed - Páginas 37 a 66. 14 Art. 5o Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm#art371