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História Antiga: recortes, temas e fontes Apresentação O estudo da História Antiga apresenta uma série de oportunidades de pesquisa, e muito ainda se tem por estudar, recuperar arqueologicamente, traduzir, analisar e compreender. Muitas são as lacunas históricas que permanecem em aberto esperando que se descubram fontes, desvendem línguas e desenterrem vestígios. Porém, graças aos trabalhos de dedicados pesquisadores de diversas áreas, já se pode reconstituir parte dos fatos e das culturas das sociedades antigas, principalmente daquelas que deixaram fontes escritas e já decifradas pelos pesquisadores. Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai estudar as relações entre política e religiões no período da antiguidade clássica e tardia. Você vai conhecer as formas de escravidão e trabalhos compulsórios e, por fim, como o cinema abordou a antiguidade e a possibilidade do uso de filmes para ensiná-la em sala de aula. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Discutir as relações entre religião e política na História Antiga.• Reconhecer a presença da servidão e da escravidão na História Antiga.• Analisar a História Antiga retratada no cinema.• Infográfico As imagens e o cinema estão impactando o mundo e são responsáveis por boa parte das apreensões de conhecimentos na contemporaneidade. Os filmes, em especial os filmes "históricos" ou os romances com fundo histórico, podem funcionar como bons chamarizes e boas ferramentas para a introdução de temas da História Antiga, desde que passem por uma crítica e um processo de comparação entre realidade histórica e imaginação. No Infográfico, você vai descobrir alguns preparos importantes a se fazer antes de passar um filme para os alunos – os dados básicos a conhecer e apreender para posteriormente construir uma análise histórica. Também vai ver que as questões do presente influenciam as leituras do passado e as composições biotípicas dos personagens. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://statics-marketplace.plataforma.grupoa.education/sagah/cd45368f-a7d9-4df7-b50c-1588846c43e5/b957ac9e-47ef-4cba-b905-cb72e7aa6a84.jpg Conteúdo do Livro Nas sociedades, o bom fluir dessas relações é responsável, entre outras coisas, por sua constituição e continuidade. As crenças e a religião estão presentes em todas as sociedades, das mais simples e não estatais às mais complexas. As relações entre poder político e poder religioso podem afetar a sociedade para o bem ou para o mal. O mesmo se dá em se tratando de economia, sem uma base econômica sólida dificilmente um Estado que integre soberania, território e povo se manterá estável. No capítulo História Antiga: recortes, temas e fontes, da obra História Antiga, você vai aprender como se davam as relações entre poder político e religião em diferentes povos da antiguidade. Vai estudar sobre escravidão e trabalho compulsório e vai descobrir como a forma de pensar e institucionalizar a escravidão impactou a economia e a vida de gregos e romanos. A visão dos cineastas sobre a História Antiga e a utilização de filmes como instrumentos pedagógicos também serão abordados. Boa leitura. HISTÓRIA ANTIGA Ana Cristina Zecchinelli Alves A História Antiga: recortes, temas e fontes Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Discutir as relações entre religião e política na História Antiga. Reconhecer a presença da servidão e da escravidão na História Antiga. Analisar a História Antiga retratada no cinema. Introdução Didaticamente, a história pode ser dividida por temporalidades e te- máticas. Quando se estuda a História Antiga, é necessário considerar as relações entre religião e política, as formas de submissão por meio da escravidão e dos trabalhos compulsórios, bem como as interpretações feitas sobre esse período ao longo do tempo. Neste capítulo, você vai descobrir a íntima relação que existia entre po- lítica e religião na Antiguidade. Você também vai estudar o trabalho com- pulsório na prática da corveia e o seu formato mais ignóbil, a escravidão. Além disso, você vai ver como o cinema representa a Antiguidade. Como você vai notar, embora romanceadas para as telas e descomprometidas com a realidade histórica, as narrativas cinematográficas sobre a História Antiga podem ser instrumentos pedagógicos e fontes interessantes. Religião e política na História Antiga Tratar da relação entre política e religião na Antiguidade é complicado. Afi nal, a História Antiga é um período longo que apresenta uma variedade de divisões políticas, cujos registros nem sempre estão disponíveis. Muitas sociedades não deixaram fontes escritas e outras ainda não foram estudadas em profundidade. Por isso, a seguir, você vai estudar as sociedades mais conhecidas. Por meio delas, é possível obter uma imagem generalizada das relações entre religião e política na Antiguidade Clássica e Tardia. Consideram-se, para isso, os estudos de grandes mestres como Fustel de Coulanges e Ciro Flamarion Cardoso. Oriente Próximo No Oriente Próximo, na Antiguidade, a religião era central no pensamento social e político. As monarquias se assentavam sobre ela para justifi car e fundamentar o seu poder. Contudo, as relações entre religião e política apresen- tavam diversas modalidades (CARDOSO, 1990). Os faraós, por exemplo, eram considerados deuses que regiam o Egito; outros monarcas eram intermediários entre os deuses e a humanidade. O temor da ofensa aos deuses era imenso, por isso mantinham-se o formalismo e o ritualismo e evitavam-se as impurezas. Segundo Cardoso (1990), no que tange ao Oriente Próximo na Antigui- dade, somente de forma artificial e para fins analíticos ou didáticos pode-se separar política, religião e economia. Os templos eram parte integrante do complexo do Estado. Embora elementos produtivos fossem entregues pelo rei à administração dos templos, isso era apenas uma forma de gerenciar riquezas, e não uma entrega definitiva. No Império Assírio, o imperador tudo fazia em nome e para o deus Assur, que assume a primazia no referido período. Os neobabilônicos de Nabucodono- sor tinham Marduc como seu deus principal. Já os judeus tinham Yaveh, para quem construíram o Templo de Jerusalém — seu único lugar de culto, onde inicialmente outros deuses também eram aceitos. Somente depois da divisão do reino e do exílio na Babilônia, com a compilação dos textos sagrados e a revisão deuteronômica, é que os judeus se tornam totalmente refratários a outros deuses, praticando um monoteísmo radical e único para a época. Yaveh, durante milênios, foi o condutor das decisões dos judeus em todos os campos. Mesopotâmicos Para os mesopotâmicos, o mundo humano, o natural e o divino são contínuos; tudo é animado. O que surge na Terra é projetado pelos deuses, inclusive cidades-estados, monarquias e impérios. A monarquia é uma criação divina que “desceu dos céus” duas vezes: antes e depois do dilúvio. O Estado é organizado pelos deuses de forma hierárquica, tendo estes também uma assem- bleia divina. Tudo e todos, a começar pelo rei, são servidores das divindades (CARDOSO, 1990). A História Antiga: recortes, temas e fontes2 Nos diversos impérios surgidos na região mesopotâmica, o politeísmo esteve presente. Os deuses das cidades eram cultuados. Durante o Império Assírio, o deus Assur assume a primazia e a ele se seguem os demais deuses. É Assur o deus que determina a ação dos reis, que tudo fazem em seu nome. No Império Babilônico sob Hammurabi e no neobablônico caldeu, é Marduc o deus principal a quem servem e obedecem aos reis. Egípcios No Egito, antes da unifi cação, as associações administrativas territoriais regionais iniciais formavam nomos ou spat, que reuniam pessoas em traba- lhos de irrigação e armazenavam grãos e metais, o que pressupunha alguma forma de tributação. Esses nomosem tribos ou fratrias e posteriormente em cidades produziam um novo deus, desenhado em seus atributos as características que cada novo grupo desejava que fossem repassadas aos cidadãos. C) Escolhia-se um novo deus entre deuses de outros povos e adotava-se como o deus da tribo ou fratria, quando estas se juntavam para formar uma cidade, repetiam o processo buscando outro deus que não fosse o já cultuado por nenhuma das tribos. D) Ao se unirem para formar tribos ou fratrias, as famílias gregas ou latinas concebiam um novo deus, divindade superior às domésticas pertencente a vários grupos para a qual criavam altar e culto; o mesmo ocorria por ocasião da união de tribos ou fratrias para formação da cidade. E) Na Grécia, onde a democracia era dominante, exceto por Esparta e algumas outras pequenas cidades, o deus da fratria e da cidade eram eleitos pelos cidadãos. Em Roma, vencia o deus lar ou antepassado da família mais poderosa na formação da tribo ou cidade , a quem os deuses de todas as outras famílias passavam a se subordinar 3) O cristianismo a princípio era entendido tanto por judeus-cristãos quanto por romanos como uma seita judaica. A influência de Paulo foi decisiva para a universalização do Cristianismo. As divisões entre o Judaísmo e o Cristianismo sempre estiveram presentes, tanto nas relações entre apóstolos como entre grupos distintos do Judaísmo. A separação definitiva entre as duas vertentes religiosas ocorre: A) a partir da conversão de Paulo, um judeu-romano,que anteriormente caçava cristãos e após se converter resolveu abandonar o Judaísmo e levou os chamados judeus-cristãos a negarem sua parte judia, tornando-se somente cristãos. B) a partir da morte de Paulo e Pedro em Roma, os devotos da doutrina de Jesus, revoltados com os judeus que o mataram e com os romanos que consideravam Pedro e Paulo como judeus-cristãos, resolveram tirar a palavra judeu de sua confissão religiosa. C) a separação final ocorreu quando os romanos destruíram o segundo templo e arrasaram Jerusalém, dando início à diáspora judaica, em 70 d.C.; pouco antes do evento, os cristãos já haviam abandonado a cidade, passando ao outro lado do Jordão. D) em verdade, eles não se separaram até que a Igreja Cristã conseguisse se tornar aceita em Roma e posteriormente religião oficial do Império, momento em que os cristãos não precisavam mais se dizer judeus-cristãos. E) não houve separação; com a queda de Jerusalém e a destruição do segundo templo, o Judaísmo desapareceu, só voltando a reaparecer na Europa no final da Idade Média. A Igreja Cristã, no entanto, continuou viva e cresceu em força e poder, tornando-se independente. 4) Você aprendeu que a escravidão esteve presente em quase todas as sociedades antigas, e que ocorria a partir de diferentes situações para atender a diferentes demandas. Segundo o entendimento de Perry Anderson, a escravidão sempre existiu, porém ela toma outra característica a partir da ação de gregos e romanos. A que transformação realizada na instituição da escravidão a partir das sociedades gregas e romanas Anderson está se referindo? A) Anderson se refere à escravidão por dívidas que entre os Romanos foi abolida pelo código das Doze Tábuas e entre os gregos variou de cidade a cidade, sendo proibido por Aristóteles aos gregos escravizar outros gregos. B) Os escritos e as decisões de Péricles que, a partir de Atenas, envia aos gregos uma mensagem sobre a importância de somente fazer escravos entre os povos mesopotâmicos e sempre poupar da escravidão romanos e egípcios. C) A transformação da escravidão em um modo de produção escravo adotado inicialmente pelos gregos e posteriormente pelos romanos, permitindo, segundo o autor, constituir uma base definitiva tanto para suas realizações quanto para seu eclipse. D) Antes que gregos e romanos começassem a escravizar pessoas, a escravidão somente se dava por dívida ou por crime, sendo essas formas, segundo o autor, “impuras” juridicamente falando. Isso não ocorreu na Grécia e em Roma, pois esses povos também escravizavam por guerra. E) Anderson se refere ao colonato, que em Roma, por tabela na Grécia, depois de Roma, e nos locais do antigo Império, substituiu com louvor a escravidão e produziu muito mais para o Estado que o sistema anterior. 5) A antiguidade vem sendo retratada pelo cinema há tempos e, nos últimos anos, alguns filmes com temáticas antigas vêm sendo refilmados ou ganhando novas versões. Utilizar filmes para ensinar História Antiga em sala de aula exige atenção, pois, segundo o entendimento de Marc Ferro: A) desde que se tornou uma arte, o cinema, sob a aparência da mera representação, introduz nos filmes ficção e documentários, doutrinas e glorificações . B) é necessário conhecer bem os diretores, os roteiristas e as fontes que foram usadas por eles antes de utilizar um filme em sala de aula. Principalmente, é preciso levantar os currículos dos menos conhecidos. C) as histórias e os grandes épicos hollywoodianos sempre primaram por sua isenção e imparcialidade na representação da antiguidade. D) exceto os filmes sobre o Judaísmo e o Cristianismo que se baseiam nas palavras e nos textos da Bíblia, sendo, portanto, verdade intestável, os demais são apenas ficções E) desde que se tornou arte, seus pioneiros passaram a pesquisar e tratar a história de forma científica, retratando-a e representando-a com verossimilhança. Na prática Quando o ser humano pensa que a escravidão e as formas de trabalho compulsório análogas a ela acabaram, abre o jornal ou liga a TV e lá está a escravidão contemporânea desmentindo as esperanças e debochando das leis. Na antiguidade e em outros períodos históricos, a escravidão foi tratada como algo naturalizado pela sociedade e defendido por filósofos como Aristóteles e Platão, recebendo a condescendência da Igreja Católica, que a naturalizava em troca de uma suposta evangelização dos indígenas pelos portugueses e espanhóis. Enquanto decidia se africanos tinham alma, ela também tinha escravos. Até o século XIX, a escravidão em alguns lugares no Ocidente era legal. Veja como aproveitar o assunto dos alunos para introduzir temáticas e debater assuntos do presente e do passado. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://statics-marketplace.plataforma.grupoa.education/sagah/aa58ba10-1609-49f4-bc58-9a7421454fab/0e28091e-213c-4f46-b696-abe9009d1ee7.png Saiba mais Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Governando camponeses: colonato e mobilidade no Império Romano tardio Para uma visão sobre a instituição do colonato e suas legislações, leia este artigo. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Escravo, servo ou camponês? Relações de produção e luta de classes no contexto da transição da antiguidade à Idade Média Veja este artigo e compreenda debates historiográficos sobre escravidão, servidão e colonato na Hispânia entre os séculos V e VIII d.C Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. O grande monumento da engenharia romana | HUMANIDADE | HISTORY Veja este vídeo em que uma equipe multidisciplinar tenta reproduzir as construções da Roma antiga. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://seer.ufrgs.br/anos90/article/view/65579/46837 http://periodicos2.uesb.br/index.php/politeia/article/view/3809/3134 https://www.youtube.com/watch?v=8Vy6XMumBQQ Mulheres Faraó [COMPLETO] – As rainhas do Nilo Veja o vídeo e tenha uma visão sobre rainhas egípcias. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Cinema e história – as funções do cinema como agente, fonte e representação da história No artigo, Barros, refletindo a partir da convergência entre História cultural e História política, analisa e discutepossibilidades de interação entre cinema e História e uso do cinema como fonte histórica. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://www.youtube.com/watch?v=qCIWriMT3R0 https://journals.openedition.org/lerhistoria/2547se tornaram províncias no Egito unifi cado. O primeiro rei era a divindade Hórus, que assumiu o trono após a morte de seu pai, o deus Osíris; os monarcas que se seguem são a sua encarnação. Veja: Na teoria político-religiosa da monarquia egípcia, formada muito cedo e mantida por quase três milênios com poucas alterações [...], o rei se define literalmente como o centro de todas as coisas, incluindo mesmo os países estrangeiros, destinados à subordinação por ele [...] O rei, como deus, é a origem de todos os poderes (CARDOSO, 1990, p. 41–43). O faraó é também chamado filho de Rá (Sol), podendo falar pelos deuses e por si mesmo. No Egito, os cultos aos deuses locais dos nomos se mantêm, embora os deuses monárquicos possam variar conforme o momento e a dinastia. Alguns deuses locais acabaram por se tornar nacionais por conta da escolha monárquica. O que transformava o rei em Hórus vivo era sua entronização, e a partir da quinta dinastia ele se tornou filho de Rá. Havia uma série de regras de hereditariedade, que cobriam por meio de casamentos os casos em que o rei não era o filho do último faraó. De qualquer forma, era a coroação que o fazia divino, e não o nascimento. No processo, o faraó vinculava-se à linha sucessória divina e simbolizava a união entre o cosmos e a humanidade. Também a partir da quinta dinastia os sacerdotes adquirem importância e se hierarquizam (CARDOSO, 1990). No Egito, a visão do faraó como um deus vivo demonstra a inseparabilidade da religião e da política, embora nem sempre os sacerdotes dos diversos templos tivessem ingerência direta sobre o faraó, o que não obstava sua força política. No reinado de Akhenaton, ocorreu uma revolução religiosa de cima para baixo: o faraó decidiu ser Aton, o deus único, uma tentativa de monoteísmo 3A História Antiga: recortes, temas e fontes que pereceu com o próprio faraó, assim como Amarna, cidade que fundou para Aton e na qual obrigou a corte a permanecer. Sobre o período, Cardoso (1990, p. 11) explica: A historiografia de há algumas décadas costumava explicar a reforma religiosa empreendida pelo soberano egípcio Akhenaten (1353–1335 a.C.) como algo análogo à luta entre imperadores e papas na Idade Média, com motivações mais políticas e econômicas do que religiosas. O culto de um novo deus so- lar — Aten —, surgido na corte já antes de Akhenaten, e posteriormente sua imposição como deus único do Egito, seriam formas de reação dos faraós [...] contra o incremento exagerado do poder político e da riqueza do clero das divindades tradicionais, em especial o do deus Amon-Ra — incremento que teria ocorrido em detrimento do poder e da riqueza do próprio rei. Perceba que o faraó decidiu que haveria um único deus e a sociedade se tornou oficialmente, naquele período, monoteísta, retornando ao politeísmo quando da assunção do novo faraó. Isso não significa que as pessoas comuns tenham deixado de crer nos seus deuses, apenas que o culto oficial e público era dirigido a um único deus, Aton. Nas guerras religiosas europeias, os reinos, em um primeiro momento, eram seguidores da religião de seu rei ou príncipe. Quando este mudava de religião, em teoria, todo o reino e os seus súditos também o faziam. Alguns exemplos do poder e da relação entre religião e política são emblemáticos: a conversão de Henrique de Navarra (“Paris bem vale uma missa”) para tornar-se rei da França (nesse caso, a maioria do povo era católico sem conversão e não haveria condições de assumir e permanecer no trono); o rompimento de Henrique VIII com a Igreja Católica, por lhe negar o divórcio, levando-o a criar a Igreja Anglicana, da qual se tornou o chefe; e o apoio dos príncipes alemães a Lutero, que acabou por permitir que se livrassem do domínio papal. Voltando ao Antigo Egito e ao seu rápido período de monoteísmo, veja as conclusões de Cardoso (1990, p. 12): O faraó Akhenaten, como senhor supremo dos bens do Estado, fechou os templos e confiscou os seus bens, em seu próprio proveito e no dos santuários do seu deus Aten, sem encontrar qualquer resistência, já que a concepção e a tradição da monarquia egípcia lhe davam pleno direito de o fazer. Mais tarde, morto Akhenaten, outro rei reverteu tais medidas e restaurou os deuses e suas propriedades: mas não como efeito de uma luta ou resistência do “clero de Amon”, ou de qualquer outro corpo sacerdotal. A impopularidade da reforma tentada deve ter influído na decisão de encerrar a experiência; mas foi só depois de encerrada que se geraram, por monárquica, textos e outras reações desfavoráveis à mesma e ao rei já falecido que a empreendera. A História Antiga: recortes, temas e fontes4 Uma diferença que deve ser considerada é a que existe entre as monarquias egípcias e mesopotâmicas e as siropalestinas. Segundo Cardoso (1990), as primeiras eram mais estáveis devido à sua ecologia. Por conta de sua alta produtividade agrícola, da densidade populacional e da mão de obra para prestar corveias, havia estabilidade, o que permitia a formação de complexos político-econômicos duradouros. Na região da sírio-palestina, a situação era diferente. Como o local era menos povoado e produtivo, tornava-se propor- cionalmente mais complicado para a sociedade manter os luxos e gastos das monarquias, classes dominantes e burocratas, reduzindo o tempo de duração desses sistemas — que, embora pareçam mudar, são reconhecíveis — de milhares de anos no caso do Egito e da Mesopotâmia para centenas de anos no caso da Siría Palestina, com renovações ocorrendo a partir de guerras, rebeliões, migrações e invasões (CARDOSO, 1990). Hititas Os hititas viviam na Ásia Menor e apresentavam condições bastante diferen- ciadas em sua estrutura ecológica, com qualidade de pastagens e fertilidade variada em seu território. Porém, a sua agropecuária era de rendimento inferior à dos povos mesopotâmicos e egípcios. A sua população era pequena e rarefeita. Durante a sua história, os hititas sofreram ataques e invasões de diversos povos que os infl uenciaram em diferentes dimensões. Os deuses próprios ou importados de outros povos eram cultuados conforme o rito original e não se praticava sincretismo. Entre os hititas do período imperial, o rei era tam- bém, e acima de tudo, o sumo sacerdote mediador entre os deuses e homens, agindo sob a tutela da divindade; a sua esposa era a sacerdotisa principal. Ao morrerem, os reis eram divinizados (CARDOSO, 1990). O Antigo Império Hitita (cerca de 1650 a.C.) surgiu aos poucos a partir da Anatólia Central, conquistando cidades ou saqueando-as, inclusive a Babilônia na Baixa Mesopotâmia (1595 a.C.), sem, no entanto, permanecer por longo tempo na região. Era um reino com problemas internos (lutas dinásticas e aristocráticas) e externos (adversários). Em 1525 a.C., Telepinush chega ao trono hitita e estabelece regras dinásticas de sucessão, procurando consolidar o seu poder e a monarquia. Durante o Médio Império, ocorre a expansão. No reinado de Supiluliuma I (cerca de 1380 a 1346 a.C.), o reino hitita se transforma num vasto império com capital em Hattusha (atual Boghazköy). A Ásia Menor, no entanto, não se unificou politicamente; reinos subordinados aos hititas possuíam autonomia interna considerável, o que também ocorria com relação a povos não estatais, como os kasha, asi e kayasa a eles submetidos. A sua 5A História Antiga: recortes, temas e fontes organização política era em forma de estados confederados, preservando-se alternadamente por via de casamentos dinásticos, tratados, juramentos ou guerras punitivas, de forma a “[...] manter o fluxo de tributos e o envio de tropas auxiliares” (CARDOSO, 1990, p. 53). Havia variação no tratamento dado às províncias conforme sua importância estratégica e sua localização. Entre 1306 e 1250 a.C., aproximadamente, hititas e egípcios disputaram a área da sírio-palestina, chegando a um acordo por conta da pressão exercida sobre eles pelos assírios. Nesse período imperial, os reis se autorreferiampela expressão “meu Sol”; eram sumo sacerdotes, generais supremos, exercendo ainda as funções de legislador e, se necessário, juiz. É interessante notar a posição da rainha hitita: A rainha tinha uma posição própria no Estado e na religião, e uma sucessão separada (ou seja, só ao morrer a rainha anterior a esposa do soberano atual se tornava rainha). Ela recebia cartas e intervinha na diplomacia paralelamente ao rei (CARDOSO, 1990, p. 54). As mulheres encontraram poder real entre hititas, no reino de Kush, no período meroítico e no Egito, onde algumas se fizeram faraós e outras inter- feriram ativamente no governo. Judeus Os judeus se consideram o povo eleito pelo deus Yaveh. Moisés seria o homem escolhido por Yaveh como seu líder, responsável por tirá-los do cativeiro egípcio. De seu retorno à síria-palestina até o período do pós-exílio babilônico, os judeus percorreram um longo caminho. Houve episódios de retorno ao politeísmo e de monolatria, até que chegaram fi nalmente a um monoteísmo radical, origem do judaísmo. As regras dessa religião foram desenvolvidas juntamente à compilação dos textos sagrados salvos da destruição do templo pelos deuteronomistas durante o exílio. Suas tribos, já na Palestina, eram governadas por líderes que aos poucos formaram ligas ou confederações, reunindo-se “[...] em santuários como Gigal ou Silo para consultar a divindade, Iahweh, por ocasião de certas festas anuais” (CARDOSO, 1990, p. 62). Nesse período de confederações e ligas, surgiram os juízes, que emergiam como elementos carismáticos em momentos de crise ou perigo. Posteriormente, o profeta Samuel unge o primeiro dos reis israelitas: Saul (cerca de 1020 a 1000 a.C.), sucedido por David (cerca de 1000 a 961 a.C.), que vence os filisteus, também ungido por Samuel. A História Antiga: recortes, temas e fontes6 Entre os governos de Saul e David, dá-se a formação do Estado dos israeli- tas. David organiza a administração, a cobrança de impostos e o recrutamento militar, amplia o território e faz povos tributários e acordos com Hiram, rei de Tiro, na Fenícia. Ele foi ungido por deus e aclamado pelo povo. Seu filho Salomão (961–922 a.C.) é escolhido por David em vida como sucessor no trono, sendo então ungido e aclamado, iniciando assim a hereditariedade na monarquia israelita. Salomão reinou pacificamente e construiu o templo de Yaveh em Jerusalém, cidade que David havia conquistado e que se tornou sede do reino. As religiões dos povos mesopotâmicos, egípcios e hititas tinham em comum o fato de serem não reveladas, desenvolvidas com base em cultos locais, não diferenciando as esferas do humano, do divino e do natural. Já o javismo (de Yaveh) é considerado uma religião revelada: Yaveh, o deus, escolheu o povo israelita como seu povo e com ele fez uma aliança; ele falou com Moisés, a quem entregou os mandamentos gravados a fogo celeste em pedra. Yaveh é visto pelos teólogos israelitas: [...] como entidade radicalmente heterogênea, descontínua, em relação aos homens e ao universo que criara. Deus garante a fertilidade e a abundância, mas não é um deus da fertilidade; comanda os astros e cavalga a tempestade, sem poder ser, em si, na sua natureza, associado a qualquer destas coisas (CARDOSO, 1990, p. 67–68). Além disso, considere o seguinte: O Deus de Israel não se associa aos acontecimentos repetitivos e até certo ponto previsíveis da natureza, mas à história, que ele comanda numa forma em geral inescrutável. Ao contrário das outras civilizações orientais, a israelita era dotada de um firme sentido de finalidade histórica, garantido pela crença na providência divina e na aliança com o Deus nacional (CARDOSO, 1990, p. 68). A teocracia é o regime político decorrente da aliança. É em nome de Yaveh que líderes carismáticos, juízes e posteriormente monarcas governam, tributam, fazem guerra, etc. Todos eles tinham de receber tanto sanção divina quanto aclamação ou eleição humana. Para Cardoso (1990), durante o reinado de Davi, forjou-se a teoria político-religiosa pela qual uma nova aliança era realizada vinculando Yaveh, Jesuralém e a casa de David (CARDOSO, 1990). Durante os séculos seguintes, no que tange ao pensamento do povo hebreu- -israelita-judeu, em todas as instâncias da vida, tudo está relacionado ao cumprimento das regras da aliança com Yaveh. Quando descumpridas, este se afasta e pune o povo. 7A História Antiga: recortes, temas e fontes Os reis persas, como os mesopotâmicos, reinavam e agiam pela graça e pelo apoio dos deuses, em especial sob Dario I (521–486 a.C.), vinculado ao deus supremo Ahuramazda. Sua religião principal, cujo profeta era Zaratustra (por volta dos séculos VII e VI a.C.) era o zoroastrismo ou mazdeísmo, uma religião que pregava uma concepção dualista do mundo e que predominou na região até o advento do islamismo, no século VII d.C. (PINTO, [201-?]). Com isso, pode-se afirmar que, no Oriente Próximo, religião e política estiveram sempre entrelaçadas. A única exceção é o povo judeu, cujo deus Yaveh estava radicalmente separado das demais dimensões da realidade. Yaveh era seu criador, mas não era parte da criação. A monarquia era ungida, eleita e aclamada. Nela, o rei algumas vezes assumia o papel de sacerdote. O corpo sacerdotal se desenvolveu de forma paralela e os profetas tinham ingerência sobre o todo político, social e religioso. No entanto, nem sempre o palácio e os sacerdotes concordavam. Embora o rei devesse seguir os ditames da aliança com Yaveh, não era o mediador entre o deus e os homens. Gregos e romanos Coulanges (2006) trata da importância das crenças para os homens da Anti- guidade, reconhecendo que tais crenças se modifi cam com o tempo, a partir das mudanças dos próprios homens. Para Coulanges (2006), é impossível entender as instituições sem compreender as crenças dos homens. Ele refere- -se aos cultos familiares — aos mortos, ao fogo sagrado —, aos domésticos e àqueles da Cidade — aos fundadores, aos deuses da cidade e, na Roma Imperial, ao imperador. De acordo com Coulanges (2006), as famílias gregas e romanas foram constituídas a partir de uma religião primitiva, que estabeleceu algumas pre- missas: as formas de casamento, a autoridade paterna, os direitos de sucessão e propriedade. Posteriormente, da associação de famílias, originou-se uma instituição maior: a cidade (pólis e civita), que herdou os seus princípios da religião. Tais princípios foram adaptados e modificados, evoluindo ao sabor das transformações sociais. Para esse autor, as estruturas mentais dos homens guardam memórias de outros tempos e crenças que, mesmo não deixando vestígios materiais ou escritos, se fazem presentes nas estruturas linguísticas. Assim, ele entende que a partir de tais memórias seria possível conhecer as crenças mais antigas. Para Coulanges (2006), as crenças dos homens afetaram a constituição da família e a constituição e as instituições das cidades: religião, política e direito. A História Antiga: recortes, temas e fontes8 Para Coulanges (2006), a constituição do direito privado foi realizada da família para a cidade. Caso contrário, seria diferente, posto que talvez o patriarca não tivesse tanto poder em suas mãos. Ele considera que a ideia religiosa e a sociedade caminharam juntas. Grupos de famílias gregas forma- ram frátrias, enquanto as latinas formaram cúrias, concebendo, no momento em que se uniam, uma divindade superior às domésticas, que pertenceria a vários grupos, velando por eles. Para essa divindade, criavam altares e cultos, tornando-a a protetora do grupo. Frátrias e cúrias constituíam assembleias que tinham direito a promulgar decretos. Crescendo, as associações de frátrias e cúrias formavam tribos e o processo (altar/culto) se repetia. Em geral, o deus da tribo era um herói ou um homem divinizado. As tribos tinham assembleia e tribunal com direito de justiça sobre seus membros. Aos deuses humanos, antepassados divinizados, provenientes da formação familiar,somam-se outros deuses que Coulanges (2006) classifica como deuses de natureza física (Zeus, Hera, Juno, Marte, etc.). Duas religiões distintas, mas não concorrentes, passam a coexistir: uma, a religão doméstica de cunho familiar e privado; outra, a religião da cidade, de cunho público, social e político. Com relação à última, muitas vezes, seus deuses eram apropriados de forma personalizada pelas famílias. Da união das tribos (voluntária ou não), surgiram as cidades, tendo como vínculo constituinte o culto, o fogo sagrado aceso no templo no meio da nova cidade e uma religião comum. Era erguido um templo (Vesta em Roma e Primateu entre os gregos) onde ficava o altar da cidade; nele, o fogo sagrado permanecia sempre aceso. Em Roma, as sacerdotisas de Vesta, as vestais, eram muito respeitadas e levavam vidas de dedicação exclusiva, sendo pe- nalizadas caso deixassem o fogo apagar ou cometessem atos que de alguma forma maculassem o culto ou a sua castidade, o que era entendido como um perigo para a cidade. Os cultos dos deuses da cidade eram interditados a estrangeiros. Por sua vez, os sacerdotes eram vinculados às suas cidades e templos (COULANGES, 2006). Os deuses das cidades eram força e sustentáculo e estavam presentes em todas as situações que a ela se referiam: políticas, sociais, culturais, econômicas e bélicas. Gregos e romanos, especialmente, tinham tanto respeito pelos deuses das cidades, que antes das batalhas conjuravam seus deuses a não abandonarem a cidade e faziam agrados e oferendas aos deuses dos inimigos, para que lhes abandonassem e ficassem ao lado de Roma, pelo que receberiam templos e cultos. Algumas vezes, os gregos preferiam roubar a estátua dos deuses dos templos inimigos. As cidades sitiadas, por sua vez, tudo faziam para proteger seus deuses. Clausewitz (2005, p. 90) afirma “[...] que a guerra é simplesmente 9A História Antiga: recortes, temas e fontes a continuação da política por outros meios”. No caso dos gregos e romanos, a religião e a política estavam juntas e eram inseparáveis, posto que os deuses eram a força e cuidavam da fortuna da cidade. O seu apoio e a sua proteção eram alvo de suborno ou furto. Dessa forma, pode-se dizer que os antigos começavam a guerra — continuação da política — pelo ato religioso, não havendo separação entre religião e política. Com exceção dos hebreus, em geral, os povos da História Antiga não separavam a política da religião, nem o divino do humano e do natural. Os casos distintos se devem à influência da filosofia, em determinado momento na Grécia, e do cristianismo, que em princípio separa os poderes espirituais dos temporais, mas não deixa de influenciar a política. O cristianismo O cristianismo surge entre os judeus na época da dominação romana. Ini- cialmente, é considerado mais uma entre diversas seitas judaicas, certamente incômoda para os sacerdotes judeus, dada a perseguição que sofrem os após- tolos depois da morte de Jesus. Da Palestina, o cristianismo espalha-se para o mundo antigo. No norte e no nordeste da África, entre os séculos I e IV d.C., a religião encontra abrigo e acolhimento para a sua vanguarda intelectual, que, mais tarde, no século VII d.C., sucumbiria com o advento de outra religião, o islamismo (BRANCO, 2015). Por volta de 350 d.C., a Etiópia, antigo reino de Axum, se converte ao cristianismo a partir da conversão do rei Ezana, da rainha e da família real. Então, os templos dos antigos deuses são transfor- mados em igrejas. Com o advento do cristianismo e a sua relação com o Império Romano, especialmente após se tornar a religião oficial do Império, algumas mudanças se verificam na relação entre Estado e religião. O governante político não é mais o pontífice máximo da religião romana e, embora a Igreja Cristã seja a religião oficial do Império, ela é também universal, portanto sem fronteiras. Os deuses pagãos, que em geral conviviam em harmonia respeitosa, são excluídos, considerados falsos ídolos, vencidos pelo poder do deus cristão. A História Antiga: recortes, temas e fontes10 O imperador e os reis, no entendimento dos cristãos, não são deuses, mas estão a serviço do deus cristão, empoderados por ele. O deus cristão, que na época em que Jesus viveu era o mesmo deus dos judeus (Yaveh), deste se distancia e se diferencia religiosamente, sendo in- terpretado de outra forma: aquela descrita pelo Novo Testamento, baseada na doutrina pregada por Jesus e pelos apóstolos. Com a queda de Jerusalém, a destruição do segundo templo e a diáspora judaica, em 70 d.C., cristãos e judeus definitivamente se separam. Daí em diante, o cristianismo cresce em volume de adeptos e em relação às classes que a ele aderem. Torna-se, assim, a religião oficial do maior império daqueles tempos. Para além do Império, e antes mesmo de conquistá-lo, a religião já havia se espalhado pelo norte da África e por diversos pontos do Oriente. Também se infiltrara entre os povos bárbaros. O cristianismo adquiriu força espiritual e moral e moldou consciências, inclusive as dos senhores do poder. Nos anos finais de Roma, o cristianismo já havia convertido muitos reis e chefes “bár- baros”. Assim, a religião se converteu numa potência espiritual e temporal, de modo que a política se realizava dentro e fora da Igreja. Em síntese, o cristianismo adquiriu poder e estrutura financeira. Para Friguetto (2010), na Antiguidade Tardia, época de grandes transforma- ções religiosas, políticas, sociais, culturais e econômicas, o cristianismo foi um dos elementos principais que contribuíram para o processo de transformação e renovação ocorrido. O cristianismo católico serviu como veículo de afirmação de poder político durante a Antiguidade Tardia. Se os imperadores, a partir dos concílios de Niceia (325 a.C.) e Constantinopla I (381 a.C.), se tornam defensores da comunidade dos homens, também se vinculam ao divino por meio da fé. Dessa forma, o imperador aparece como “eleito”, escolhido como representante da unidade da eclésia. Com o fim do Império, duas figuras despontam como substitutas no que tange à defesa e à manutenção da unidade: bispos e monarcas romano-bárbaros (rex). Friguetto (2010, p. 126) pontua que a sociedade política na Antiguidade Tardia era composta por um: [...] conjunto de indivíduos detentores de importantes cargos e funções políticas, administrativas e militares, integrantes dos grupos sociais mais destacados, inclusive do ponto de vista cultural, das instituições políticas existentes na Antiguidade Tardia, como o império e os reinos. Aqui encontramos os partí- cipes das aristocracias regionais de origem senatorial romana e pré-romana, que envolviam tanto os segmentos laicos como os eclesiásticos, ao lado dos líderes tribais bárbaros presentes, de forma efetiva, desde os primórdios do século V nos territórios romanos ocidentais. Foram estes grupos políticos e 11A História Antiga: recortes, temas e fontes sociais os maiores interessados pela construção de princípios teóricos e ide- ológicos que defendiam a noção de unidade presente no discurso eclesiástico desde Niceia com uma lógica extensão ao conjunto das instituições políticas e sociais que indicavam o imperador, o rei e o bispo como responsáveis pela preservação unitária do universo político e religioso no ocidente tardo-antigo. O autor refere-se a cristianismos que podiam ser entendidos como legítimos ou não. De qualquer forma, forneciam uma: [...] explicação lógica sobre a natureza do Deus cristão e a sua conexão ao mundo terrestre, especialmente seu vínculo com a máxima autoridade política e secular, legitimando-a e, em teoria, fortalecendo-a ideologicamente diante das ameaças existentes (FRIGUETTO, 2010, documento on-line). O bispo era a figura mais emblemática e representativa dessa ideia. Num período em que a alteridade e a identidade, a heresia e o paganismo, a civilização e a barbárie eram conceitos em conflito e em busca de definição, ser cristão podia estar muito próximode ser civilizado, urbano, conhecedor da lei e da fé. Por outro lado, os que se retiraram para o mundo rural eram tidos como camponeses, rústicos, agrestes, cultuadores de ídolos e pagãos. Os “homens santos cristãos” buscam no ambiente rural e nas dificuldades que apresenta tanto se aperfeiçoar quanto combater o paganismo. Desde o século III a.C., o Império vinha assinando tratados e fazendo alianças com povos bárbaros, criando novos foedus. Ele utilizava esses povos tanto nos limes quanto no exército, internalizando-os. Muitos desses povos se tornaram cristãos (católicos ou arianos), embora nem todos os clãs aceitassem o cristianismo, o que resultou em conflitos internos. Para Friguetto (2010), a evangelização e a conversão de bárbaros ao cristianismo (em especial ao cristianismo ariano), principalmente no século IV d.C., tem a ver com uma busca, por parte desses povos, de “[...] inserção e aceitação no interior da romana civitas” (cidadania romana, no caso, indicando a busca por aceitação de sua cidadania legal para que se torne real ante os romanos) (FRIGHETTO, 2010, documento on-line). Entre bárbaros, cristãos e pagãos, constrói-se a diferença: uns cristianizados e interiorizados no território imperial e partícipes da romana civitas e outros que, permanecendo pagãos, continuam considera- dos “bárbaros”, “incivilizados”. Nesse caso, religião e política permanecem caminhando juntas, como elementos complementares entre si, sem relação de subalternidade. A História Antiga: recortes, temas e fontes12 Na Antiguidade Clássica, não parece ter havido o que se conhece hoje como Estado laico. Religião e Estado andavam de mãos dadas, quando não eram representados por um único elemento real ou família. A Antiguidade Tardia e a Alta Idade Média demonstram que mesmo a separação entre Estado (reino, império) e Igreja não significa realmente uma divisão entre a religião e o poder governante temporal. Essa ligação se torna evidente em 800 d.C., quando Leão III (750–816), após solicitar e receber a ajuda de Carlos Magno (747–814), o rei dos francos, o coroa como imperador romano, o que sob vários aspectos foi uma demonstração do poder da Igreja. Os deuses, a política e os sacrifícios Como você viu, para os povos da Antiguidade, política e religião eram uma dimensão contínua, sem divisas claras (embora pudessem parecer separadas, por exemplo, no binômio palácio/templo). Também é necessário reconhecer que, até advento do cristianismo, as demais religiões, além de orações, ofe- reciam aos seus deuses: fogos, frutas, alimentos da terra, água e sacrifícios de diversos tipos de animais (em alguns casos, até de seres humanos). Não orar, não oferendar e não sacrifi car aos deuses, ou seja, não respeitá-los, eram atitudes consideradas impiedades e podiam causar diversos transtornos: fomes, guerras, perdas, doenças, pestes, morte, destruição. A literatura, a mitologia e as escavações apontam para a realização de sacrifícios humanos de diversos tipos. Os sacrifícios não eram meros assas- sinatos, mas rituais em que se oferecia a vítima como algo que, se já não era sagrado, sacralizava-se no próprio ritual. Na Íliada, de Homero, por exemplo, para vencer a Guerra de Troia, Agamenon, o líder dos gregos, sacrifica a sua filha Ifigênia à deusa Ártemis para vencer a guerra. Nenhuma rogativa da esposa ou da filha foi capaz de demovê-lo. Agradar a deusa para obter a vitória dos gregos sobre Troia era mais importante do que a própria família. O preço de sangue foi cobrado a Atenas pelo rei Minos, de Creta, cujo filho Androgeu, campeão dos jogos ginásticos, havia sido assassinado por rivais atenienses (PLATÃO, 1991; CANDIDO, 2007). A compensação foi exigida na forma do envio periódico de sete moços e sete moças atenienses a serem sacrificados ao Minotauro em seu labirinto. Isso se repetiu até que Teseu, um jovem ateniense determinado a pôr fim ao Minotauro, embarcou junto aos demais destinados ao sacrifício com a finalidade de matar o mons- tro. Ao chegar a Creta, foi visto por Ariadne, filha de Minos e Pasífae, que 13A História Antiga: recortes, temas e fontes se apaixonou por ele, entregando-lhe um novelo e permitindo que, por uma artimanha, conseguisse entrar no labirinto, derrotar o Minotauro e sair de lá vivo (BULFINCH, 2002; GRIMAL, 2009). Os faraós egípcios, dada a sua crença em outra vida em que tudo era melhor, construíram pirâmides e tumbas. Nelas, para além das pinturas de cenas do processo de passagem ao outro mundo, das cerimônias, dos textos de evoca- ção e invocação, das oferendas aos deuses e das representações da vida no além, eram colocados o enxoval mortuário e comidas e bebidas. Inicialmente, também eram enterrados nas tumbas — sacrificados — servos que pereciam para servir aos faraós na outra vida. Aos poucos, contudo, o corpo dos servos foi sendo substituído pelos shabti ou ushabti, “pequenas estatuetas, colocadas nas tumbas, representando servos cuja função era substituir o morto em seus trabalhos na pós-vida”. Os fenícios e cartagineses praticavam sacrifícios humanos ou “sacrifícios Moloc” (KORMIKIARI, 2017), além de sacrifícios infantis. Eles consideravam tais sacrifícios rituais de devoção, que também se refletiam em uma posição privilegiada da sociedade junto aos deuses. Embora pesquisadores discutam se o que havia era sacrifício infantil ou uma necrópole para crianças, a tendência é considerar que realmente havia espaços da sacrifício de crianças e animais aos deuses Baal Harmom e Tanit (KORMIKIARI, 2017). Moloc (2019) é o nome de um antigo deus amonita. A adoração de Moloc foi praticada pelos cananeus, pelos fenícios e por culturas relacionadas no norte da África e no Levante. Como um deus adorado pelos fenícios e pelos cananeus, Moloc estava associado com um tipo especial de sacrifício infantil propiciatório realizado pelos pais. Arqueólogos encontraram diversos tofetes, espaços sagrados, cercados e abertos onde eram depositadas: [...] urnas contendo bebês ou crianças muito pequenas e/ou animais bebês, normalmente cordeiros, cremados, por vezes sob marcadores de pedra (as chamadas estelas), e com vários tipos de altares, capelas e outros tipos de ins- talações de culto ali posicionados. (KORMIKIARI, 2017, documento on-line). A História Antiga: recortes, temas e fontes14 Na Bíblia, uma peroração demonstra que o deus dos judeus, Yaveh, des- gostava dos atos que vinham sendo praticados: Porque os filhos de Judá fizeram o que era mau aos meus olhos, diz o Senhor; puseram as suas abominações na casa que se chama pelo meu nome, para contaminá-la. E edificaram os altos de Tofete, que está no Vale do Filho de Hinom, para queimarem no fogo a seus filhos e a suas filhas, o que nunca ordenei, nem me subiu ao coração. Portanto, eis que vêm dias, diz o Senhor, em que não se chamará mais Tofete, nem Vale do Filho de Hinom, mas o Vale da Matança; e enter- rarão em Tofete, por não haver outro lugar (JEREMIAS, 7:30-32, 2019, documento on-line). Disso é possível concluir que, além dos fenícios, parte dos judeus tam- bém praticava sacrifícios humanos. Em Levítico (18:21, 2019, documento on-line), aparece uma ordem de Yaveh: “E da tua descendência não darás nenhum para dedicar-se a Moloque, nem profanarás o nome de teu Deus. Eu sou o SENHOR”. César relata que celtas realizavam sacrifícios humanos aos deuses e ofereciam a Marte todo o “butim animado”. Diodoro da Sicília e Estrabão também relatam sacrifícios humanos realizados aos deuses pelos celtas (MARCO-SIMÓN, 1999). Langer (2004) estuda sacrifícios humanos entre os vikings. Segundo as suas pesquisas, os escravos, por sua condição jurídica entre vikings até o cristianismo, eram considerados seres semelhantes aos animais, sendo por isso a maior parte das vítimas imoladas, juntamente a prisioneiros de guerra e criminosos. Na Anatólia (atual Turquia), durante a ocupação celta, no período helenís- tico (cerca de 360 a 110 a.C.), também eram praticados sacrifícios humanoscujos vestígios físicos foram encontrados na cidade de Gordion, em uma microrregião denominada Lower Town. Posteriormente, no período romano, os vestígios indicam que eram realizadas práticas funerárias de enterramento de tipo convencional (CARDOSO, 2014). Especialistas e estudiosos do assunto são capazes de diferenciar por meio de análises a morte sacrificial do enterramento. 15A História Antiga: recortes, temas e fontes Como você viu, na Antiguidade, o sacrifício humano esteve presente em algumas so- ciedades: fenícia, cartaginesa, grega, celta da Anatólia, númida, egípcia. Não cabe ao pesquisador julgar tais práticas, mas compreendê-las a partir do contexto histórico-cultural em que eram realizadas. Como ensina Carr (1978 apud LANGER, 2004), “O historiador sério é aquele que reconhece o caráter de todos os valores historicamente condicionados, não aquele que reivindica para seus próprios valores uma objetividade acima da história”. O trabalho compulsório e a escravidão na História Antiga A escravidão parece ter surgido quando o homem se deu conta de que po- deria submeter outros à sua vontade. As teorias sobre a escravidão mais antiga supõem que ela começou com o desenvolvimento das sociedades. Nas sociedades antigas, era usual o estatuto da escravidão. Ela se dava por meio de condições diversas: guerra, dívidas, crimes. Além disso, podia apresentar várias faces: escravidão urbana, rural, sexual, para prestação de serviço nas galés, construção civil, minas. Ademais, podia apresentar diversifi cados níveis de direitos: de nenhum a quase todos menos a liberdade. A escravidão era legislada pelo menos desde Hammurabi e, antes disso, organizada pelos costumes. O escravo era o outro, o estrangeiro, na maioria das vezes. Porém, no caso da escravidão por dívidas ou por crime, o escravo podia ser compatriota, tornado outro devido à sua condição. A escravidão podia ser uma condição individual ou coletiva. Sendo coletiva, referia-se a um grupo de soldados, por exemplo, ou a uma cidade ou nação. Entre os filósofos da Grécia Antiga, Platão concebia e defendia a escra- vidão, mas não que se escravizassem gregos. Aristóteles refletia que há os que nascem para ser livres e mandar e os que nascem para ser escravos e obedecer. Ao mesmo tempo, admitia exceções. Segundo Anderson (1991, p. 23), Aristóteles também observava que os Estados tendiam a conter grande número de escravos. Para Xenofonte, uma das formas de reconstituir as fortunas atenienses era que o Estado possuísse “[...] escravos públicos até que houvesse três para cada cidadão ateniense”. Entre o povo hebreu, as regras eram bem definidas tanto em relação à escravidão do estrangeiro e ao direito dos herdeiros sobre os escravos quanto no que tange à escravização de judeus por outros povos ou pela venda de si mesmo. Veja como a dinâmica se dava entre judeus: A História Antiga: recortes, temas e fontes16 Eu sou o Senhor vosso Deus, que vos tirei da terra do Egito, para vos dar a terra de Canaã, para ser vosso Deus. Quando também teu irmão empobrecer, estando ele contigo, e vender-se a ti, não o farás servir como escravo. Como diarista, como peregrino estará contigo; até ao ano do jubileu te servirá; então sairá do teu serviço, ele e seus filhos com ele, e tornará à sua família e à possessão de seus pais. Porque são meus servos, que tirei da terra do Egito; não serão vendidos como se vendem os escravos. Não te assenhorearás dele com rigor, mas do teu Deus terás temor (LEVÍTICO, 25:38-43, 2019, documento on-line). Entre judeus e estrangeiros: Quanto a teu escravo ou a tua escrava que tiveres, serão das nações que estão ao redor de vós; deles comprareis escravos e escravas. Também os comprareis dos filhos dos forasteiros que peregrinam entre vós, deles e das suas famílias que estiverem convosco, que tiverem gerado na vossa terra; e vos serão por possessão. E possuí-los-eis por herança para vossos filhos depois de vós, para herdarem a possessão; perpetuamente os fareis servir; mas sobre vossos irmãos, os filhos de Israel, não vos assenhoreareis com rigor, uns sobre os outros (LEVÍTICO, 25:44-46, 2019, documento on-line). Entre estrangeiros e judeus: E se o estrangeiro ou peregrino que está contigo alcançar riqueza, e teu irmão, que está com ele, empobrecer, e vender-se ao estrangeiro ou peregrino que está contigo, ou a alguém da família do estrangeiro, depois que se houver vendido, haverá resgate para ele; um de seus irmãos o poderá resgatar (LEVÍTICO, 25:47-48, 2019, documento on-line). No entanto, o livro anterior ao Velho Testamento, o Êxodo, legisla de modo diferente, demonstrando claramente que havia escravidão entre judeus: Se comprares um servo hebreu, seis anos servirá; mas ao sétimo sairá livre, de graça. Se entrou só com o seu corpo, só com o seu corpo sairá; se ele era homem casado, sua mulher sairá com ele. Se seu senhor lhe houver dado uma mulher e ela lhe houver dado filhos ou filhas, a mulher e seus filhos serão de seu senhor, e ele sairá sozinho. Mas se aquele servo expressamente disser: eu amo a meu senhor, e a minha mulher, e a meus filhos; não quero sair livre, então seu senhor o levará aos juízes, e o fará chegar à porta, ou ao umbral da porta, e seu senhor lhe furará a orelha com uma sovela; e ele o servirá para sempre. E se um homem vender sua filha para ser serva, ela não sairá como saem os servos. Se ela não agradar ao seu senhor, e ele não se desposar com ela, fará que se resgate; não poderá vendê-la a um povo estranho, agindo deslealmente 17A História Antiga: recortes, temas e fontes com ela. Mas se a desposar com seu filho, fará com ela conforme ao direito das filhas. Se lhe tomar outra, não diminuirá o mantimento desta, nem o seu vestido, nem a sua obrigação marital. E se lhe não fizer estas três coisas, sairá de graça, sem dar dinheiro (ÊXODO 21:2-11). Havia hierarquia entre os escravos dos judeus. Os judeus escravos estavam hierarquicamente acima dos escravos estrangeiros. Entre estes, os netínim — “escravos sagrados”, aqueles que serviam no templo — eram superiores (CAMPOS, 2007). Outro tipo de escravidão muito comum no Oriente era aquela resultante da venda direta de crianças, fosse praticada em forma de venda ou de adoção, realizada por contrato. Havia também a autovenda, realizada para saldar dívidas ou em troca de roupa e comida. Os escravos eram marcados fisicamente de maneiras diversas. As condições referentes a casamentos, filhos e direitos diversos, inclusive o de comprar-se a si mesmo e os referentes à herança e à manumissão, variam conforme a sociedade e a época; em geral, são legislados. Há sociedades em que os escra- vos desempenham um papel econômico importante, e outras em que as suas funções não impactam a economia. Em outras ainda, os escravos convivem com os senhores como “parte da família”, ou, por serem mulheres e crianças, acabam se agregando à tribo. No Egito, os escravos não causam grandes impactos na economia, e as grandes obras são realizadas por corveia. A corveia é um entre vários tipos de trabalho compulsório, como a peonagem, a clientela, o colonato e a servidão. A escravidão é a sua face mais terrível. Em Roma, os escravos fazem toda a diferença em tempos imperiais. A redução de seu número, ocasionada pelo término da expansão territorial e pela ampliação da cidadania, foi um dos fatores que colaboraram para o declínio da economia romana. Outros povos, como judeus, a depender da ocasião, podiam se ver forçados a prestar serviços de corveia ou impô-los a outros. Na Antiguidade Tardia, o colonato, prévia da servidão, também se enquadra na categoria de trabalho compulsório. Para Anderson (1991), embora a escravidão existisse no mundo antigo sob várias formas — com relação ao Oriente Próximo, ele chama de juridicamente “impuras” (servidão por débitos ou trabalho penal, entre outros tipos) —, “[...] o modo de produção escravo foi uma invenção decisiva do mundo greco- -romano, que constituiu abase definitiva tanto para suas realizações quanto para seu eclipse” (ANDERSON, 1991, p. 21). Para ele, as cidades gregas foram as responsáveis por tornar “[...] a escravidão absoluta na forma e dominante na extensão, transformando-a assim de um sistema auxiliar em um modo sistemático de produção” (ANDERSON, 1991, p. 21). Esse modo de produção foi dominante tanto na Grécia Clássica quanto em Roma. A História Antiga: recortes, temas e fontes18 No Império Romano, do final do século III ao século V, as soluções pas- saram pelos foedus, que assentavam bárbaros nas terras, e pelo cololonato, legislado pelo Império como forma de manter braços no campo e, com isso, a produção, a tributação, a ocupação dos espaços de forma útil, entre outros fatores. A escravidão também era um comércio. Os cartagineses comercia- vam escravos a longa distância. Os escravos de guerra, muitas vezes, faziam parte do “butim” de alguns graduados dos exércitos, que ficavam com eles ou os vendiam. Mulheres e crianças eram vendidas para fins de casamento, prostituição ou concubinato. Quando necessitavam de braços, os judeus com- pravam escravos aos seus vizinhos (CAMPOS, 2007). A escravidão penal era uma forma de aproveitar o criminoso em serviço útil à sociedade em vez de prendê-lo. Em suma, diversas formas de trabalho compulsório e escravidão foram praticadas na Antiguidade. E houve várias formas de legislar sobre o assunto, que não ficava descuidado pelos governos. Há situações interessantes, como o caso dos gregos, que, por sua cultura, eram empregados pelos romanos na educação de seus filhos. Os escravos podiam ser tratados como animais, como bens móveis, como humanos inferiores ou como quase iguais aos livres. Uma série de fatores interferia para gerar este ou aquele tratamento. Assim, apesar de hoje ser extremamente condenada, na Antiguidade, a escravidão era aceita como algo normal. Atualmente, em alguns lugares, ainda se apreendem e vendem pessoas como escravas de forma aberta ou velada. O tráfico de pessoas continua a existir. A escravidão sexual, a escravidão infantil e os trabalhos compulsório, forçado e semiescravo são encontrados em vários lugares do globo. Infelizmente, em muitos casos, a ideia de direitos humanos é totalmente desconsiderada ou desconhecida; ou, ainda pior, só vale para alguns. Cinema e História Antiga O cinema vem retratando a Antiguidade há muito tempo. Alguns dos mais famosos clássicos do cinema são fi lmes épicos que giram em torno desse período histórico, como Cleópatra, Julio César e Ben-Hur. Muitas dessas obras têm sido regravadas como fi lmes e séries. Elas discutem não apenas 19A História Antiga: recortes, temas e fontes o episódio central que inspira a produção (como a escravidão e a revolta em Spartacus), mas outras questões de fundo cultural, social, político e religioso. Além do cinema, as histórias em quadrinhos adaptam muitos episódios da História Antiga; considere, por exemplo, os casos de Asterix e dos Trezentos de Esparta. O filme Apocalypto, de Mel Gibson, busca retratar, embora de forma romantizada, a civilização maia. A produção destaca os costumes, a cultura, a religião e a política daquele povo, bem como as suas relações de dominação para com outros povos. Apocalypto traz um detalhe interessante: é falado na língua dos povos da época. Os filmes sobre a Antiguidade servem como base para análises sobre a História Antiga, porém devem ser encarados, naturalmente, como ficções sobre eventos históricos. Eles apresentam situações, sociedades e culturas, mas não estão restritos ou comprometidos com a fidelidade à realidade histórica. Trabalhar com cinema em sala de aula requer alguns reconhecimentos por parte dos professores. Os alunos devem compreender que a imagem (e não apenas a imagem fílmica) não é somente ilustração, não é algo que apenas reproduz a realidade; ela a reconstrói por meio de uma linguagem própria que é produzida num dado contexto histórico. No momento em que a história se abriu a novos tempos, novas contribuições, novos campos e novas fontes, o filme, nas suas diversas tipologias (ficção, documentário, cinejornal, etc.), adquiriu importância. Ele pode ser utilizado como fonte para apreciação e compreensão de valores, comportamentos, visões de mundo, identidades e ideologias de dadas sociedades (KORNIS, 1992). Tudo, no entanto, deve ser contextualizado: não somente o filme produzido, mas também o momento histórico de sua produção, os seus realizadores, as mensagens enviadas, etc. Como você sabe, o mundo contemporâneo é caracterizado pela alta tecno- logia, que permite o uso de imagens, a sua análise e a sua crítica em sala de aula. Mas a inclusão do filme como instrumento didático requer preparação por parte do professor, tanto em relação à sua formação quanto à sua prática. Considere o seguinte: A História Antiga: recortes, temas e fontes20 Um trabalho com o uso de imagens na formação do professor de História tem que privilegiar, além das reflexões relativas ao novo estatuto teórico desse campo de conhecimento, pelo menos duas perspectivas consideradas relevantes para a prática de sala de aula. Uma delas é considerar as imagens como documento histórico e a outra é atentar para o seu estatuto enquanto recurso imagético, com uma linguagem cuja especificidade requer tratamento próprio, sejam as imagens móveis como o filme, ou imóveis, como a fotografia, a publicidade, o cartaz etc (SCHMIDT, 2002, p. 175). O estudo de Gimouski (2009) sobre o uso das televisões multimídias em escolas públicas do Paraná complementa a ideia. A utilização desse tipo de recurso didático, principalmente nas aulas de história, se tornou uma estratégia comum. Veja: Muitos jovens e até mesmo adultos têm contato com certos temas históricos apenas pelo cinema e, diga-se de passagem, entendem como uma verdade histórica. O cinema nos transmite esta sensação do real. A linguagem audio- visual consegue trabalhar com a emoção e traz a impressão de realidade. A noção de documento na História vem aumentando, todos os vestígios deixados pela humanidade são dignos de análise e servem de objeto de estudo para o historiador, o cinema inclui-se nestes novos documentos (GIMOUSKI, 2009, documento on-line). Para Carvalho e Funari (2007), os estudos da História Antiga e, consequen- temente, os historiadores antiquistas foram beneficiados pela nouvelle histoire, que permitiu a pesquisa de novos temas, assim como pela expansão da história cultural a partir da década de 1990. A isso se somam o desenvolvimento de novas tecnologias e as possibilidades de análises a partir das filmografias. Assim, há boas oportunidades de utilizar esse instrumental imagético e fílmico em sala de aula, desde que haja interesse e preparo por parte dos professores. Em especial, são necessárias práticas como: O respeito pelo trato documental, sua datação e autoria, críticas internas e externas dos discursos, sua linguagem metafórica, enfim, a desconstrução do discurso [...] Sempre aliados ao conhecimento documental e historiográfico, os investigadores antiquistas escolherão seus métodos, técnicas e teorias de abordagem, associando tais interpretações à análise iconográfica e à cultura material (CARVALHO; FUNARI, 2007, documento on-line). Com relação à crítica das fontes, pode-se inserir a filmografia e a sua análise. Também é importante perceber que imagens e filmes são fontes para além de sua óbvia função de “ilustrar e representar” uma realidade (política, 21A História Antiga: recortes, temas e fontes social, cultural, etc.). Elas expressam igualmente os imperativos históricos vigentes no momento de sua produção. Assim, cabe ao professor escolher o filme (ou trecho de filme) adequado. Para isso, ele deve considerar roteiro, diálogos, cenários, objetos, vestimen- tas, costumes reais da época, tecnologias, etc. Também é tarefa do professor verificar as condições técnicas (salas, equipamentos, tomadas). Além disso, ele devedecidir que uso fará do filme. Ele pode, por exemplo: utilizar a história contada para fazer paralelos entre a interpretação fílmica da história e a história real, como meio de chamar a atenção para determinadas instituições (políticas, religiosas, sociais) ou aspec- tos culturais e econômicos (arte, cerâmica, indústrias, vestimentas, ferramentas, armamentos, navios); apresentar as representações realizadas pelos homens de cada época e mostrar como são encaradas por cineastas de diferentes períodos, para levantar um debate sobre uma temática ou temporalidade determinada. As séries Vikings, Roma, Rei Tut, Troia, A legião, A legião perdida, Asterix, Gladiador, Júlio César, Spartacus, Roma: Império de sangue, por exemplo, têm em comum o fato de tentarem retratar a Antiguidade. Por meio delas, o professor pode levar os alunos a se interessarem pelo assunto, partindo da ficção e da história romantizada e fazendo uma ponte para introduzir o conteúdo histórico. Para além disso, as representações de algumas produções resultam de pesquisa e têm acompanhamento de especialistas em Antiguidade. Desse modo, diversas obras de ficção possibilitam a realização de um bom traba- lho em sala de aula quanto a costumes, crenças, moda, escravidão, política, etc. Como você sabe, nunca é possível reproduzir fielmente a história, mas ferramentas como o cinema são capazes de despertar o interesse dos alunos. Em geral, a Antiguidade é retratada como uma época glamourosa, cheia de valores como honra, fidelidade, lealdade e cumprimento do dever, além de ideais de glória, piedade, sacrifício e martírio (em especial em filmes sobre o cristianismo). Considere o seguinte: A História Antiga no Brasil, durante muito tempo, esteve associada a um plano secundário. Civilizações exóticas e pouco importantes, há muito desaparecidas, direcionadas por um sentimento romântico e pela curiosidade. O cinema tratou de reforçar esse romantismo exacerbado sobre o tema. Amor e aventura em um mundo perfeito, sem pobreza, miséria, fome. Apenas homens musculo- sos e mulheres curvilíneas. Hollywood, desde os primórdios da História do Cinema, tratou de absorver essa ideia (CARLAN, 2010, documento on-line). A História Antiga: recortes, temas e fontes22 Apesar da acertada crítica de Carlan (2010), em sala de aula, um olhar direcionado pelo professor permite que os alunos percebam, entre os ele- mentos retratados nos filmes, a vida dura do povo, bem como as suas formas de reagir a situações como escravidão, fome, doenças, violência da guerra e do cotidiano, traição, ambição, ganância, fé, etc. O direcionamento do olhar deve ser realizado pelo professor. Por isso, o conhecimento prévio tanto da obra fílmica quanto da história real e de seus detalhes é fundamental para o trabalho didático com filmes em sala de aula. Para Ferro (1992, p. 13), no cinema, como em outros textos e fontes, sempre está em jogo a intencionalidade de escritores, produtores e diretores: “Desde que o cinema se tornou uma arte, seus pioneiros passaram a intervir na história com filmes, documentários ou de ficção, que, desde sua origem, sob aparência de representação, doutrinam e glorificam”. Se você analisar com atenção, a própria escolha do que filmar em cada época corresponde a uma imagem, mensagem ou ideologia que se quer divulgar para o público. As abordagens cinematográficas, assim como as das ciências, impactam os resultados do texto, posto que o seu ponto de vista é construído de lugares diferenciados. Há uma extensa filmografia sobre os deuses antigos e a sua interferência no mundo dos humanos. Igualmente, são retratadas histórias bíblicas de diferentes épocas. Filmes como Os dez mandamentos, Êxodo: Deuses e Reis e Noé versam sobre as histórias dos judeus, de Jesus e dos cristãos. A história de Moisés virou desenho animado, alcançando o público infantil, e outras histórias bíblicas se- guem o mesmo caminho. No Brasil, vêm sendo produzidas novelas e séries sobre as histórias bíblicas. Embora de viés teológico, com algum esforço, essas obras permitem a introdução da história dos judeus, de sua religião monoteísta e do nascimento do cristianismo. Como em todos os demais casos, cabe ao professor separar a história fundamentada pelas pesquisas daquela ainda por esclarecer, ou seja, do que é mito, fantasia ou inverdade. Nesse sentido, é necessário diferenciar o que é história do que é construção religiosa, ideológica ou comercial. Esta é uma questão importante: como as crenças religiosas de cada época interferem no pensamento social, nos atos culturais, políticos e econômicos? Quando se separa o histórico do romantizado e do fantasioso e se distingue a ideologia apresentada pelos filmes, é possível comparar imagens representativas e realidades históricas. Na última gravação de Troia, o diretor buscou evitar 23A História Antiga: recortes, temas e fontes a referência aos deuses e às suas interferências, disputas e guerras paralelas, deixando a história de Troia na conta das decisões e realizações dos homens. Isso, por um lado, permite observar a história da Guerra de Troia por um viés menos religioso, mas, por outro, retira da produção o pensamento religioso que estava internalizado, naturalizado nos homens da Antiguidade, vinculado à política e às práticas sociais. Você ainda deve considerar que os filmes permitem perceber a visão sobre a Antiguidade que se tinha na época em que foram produzidos. Para perceber isso, é necessário atentar aos fatores são privilegiados em cada filmagem sobre o mesmo tema. Muitas perguntas podem ser feitas, como você pode ver a seguir. Quais são as intencionalidades envolvidas? Que tipo de propaganda e “ideal” são oferecidos ao público? O que muda entre as gravações de épicos hollywoodianos do século passado e os filmes sobre a Antiguidade do século XXI? Por que os temas da Antiguidade voltam a ser gravados, inclusive virando séries? Naturalmente, há um público consumidor amplo interessado na História Antiga. Além disso, as tecnologias atuais permitem inúmeros efeitos especiais antes impossíveis e muito custosos (considere, por exemplo, a quantidade de pessoas que era necessário contratar para cenas de batalhas, hoje produzidas por meio de programas de computador, com custo reduzido). Outro tipo de filme, em geral mais apropriado para as aulas, porém nem sempre atrativo para os alunos, é o documentário. Os documentários, prin- cipalmente aqueles que conseguem equilibrar boas imagens e uma narrativa que não seja monótona ou muito técnica, são capazes de prender a atenção e despertar o interesse dos educandos. Eles podem ser utilizados como con- traponto e elemento de comparação em relação à história romantizada nos filmes. Documentários de arqueólogos costumam ser muito bons para tratar da cultura material em sala de aula, mostrando-a como uma importante fonte de informação sobre a história dos povos. Em suma, é possível fazer um bom trabalho utilizando filmes como recurso didático em sala de aula. Para isso, as representações da Antiguidade precisam passar por uma crítica severa. Também é necessário comparar o mundo antigo expresso pelos produtores nas imagens e nos diálogos com a Antiguidade histórica real. Além disso, é preciso apontar anacronismos, explicitar a diver- sidade das sociedades e, no interior delas, relacionar elementos do passado com suas rupturas e permanências até o presente. A História Antiga: recortes, temas e fontes24 A seguir, veja alguns filmes sobre temas clássicos da Antiguidade. Spartacus (1960), de Stanley Kubrick Cleópatra (1963), de Joseph L. Mankiewicz Quo Vadis (1951), de Mervyn LeRoy Os Dez Mandamentos (1956), de Cecil B. DeMille Ben-Hur (1959), de William Wyler Os 300 de Esparta (1962), de Rudolph Maté Alexandre (2004), de Oliver Stone Troia (2004), de Wolfgang Petersen Gladiador (2000), de Ridley Scott Helena de Troia (2003), de John Kent Harrison Pompeia (2014), de PaulW. S. Anderson ANDERSON, P. Passagens da antiguidade ao feudalismo. 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1991. BRANCO, A. M. V. Do reino de Axum ao reino da Etiópia (Século I D.C. ao século XVII): a força e o isolamento do cristianismo na África do norte e nordeste. Millenium, v. 48, jan./jun. 2015. Disponível em: http://www.ipv.pt/millenium/Millenium48/5.pdf. Acesso em: 21 ago. 2019. BULFINCH, T. O livro de ouro da mitologia: (a idade da fábula): histórias de deuses e heróis. 26. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002. CAMPOS, D. S. A. Um estudo da escravidão em suas relações com a hierarquia social: heranças e particularidades da instituição escravocrata. 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A História Antiga: recortes, temas e fontes26 Dica do Professor Desde a antiguidade os homens professam algum tipo de crença e todas as sociedades têm algum tipo de religião. Na antiguidade, quando deuses e reis eram figuras muito próximas, muitas vezes se confundindo ou se fundindo numa única figura, os deuses iam à guerra, guerreavam entre si, provocavam a guerra ente os homens, ordenavam que reis fizessem guerras, os empoderavam para que ganhassem ou os abandonavam para que perdessem. O certo é que deuses, reis e guerras estavam sempre em relação uns com os outros. Nesta Dica do Professor, você vai ver um pouco dessas relações entre deuses, reis e guerras. As ordens e o poder divinos aparecem como justificativas para atos de guerra, para a vitória ou a derrota, para comprovação do poder do deus e do rei ou para demonstrar o oposto, ou seja, sua inferioridade. Os deuses também aparecem com humores diversos em relação a seus reis e seu povo, e algumas vezes se deixam roubar ou “comprar” abandonando seu povo/cidade original em favor de seus inimigos. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/cee29914fad5b594d8f5918df1e801fd/ae34af5bf2f6e17eec07cff9108c7eb2 Exercícios 1) Em muitas sociedades antigas os reis e imperadores eram divinizados em vida ou após a morte. No Antigo Egito, os faraós, ao serem entronizados, eram transformados em Hórus, se tornavam divinos e, a partir da quinta dinastia, eram chamados de filhos de Rá. A sucessão seguia regras de hereditariedade que incluíam casamentos caso o rei não fosse filho do antigo faraó. A teoria político-religiosa egípcia apresentava o rei como: A) um homem que era incorporado por um deus quando a necessidade imposta pela guerra, a fome ou a peste se fazia presentes, que reinava em nome desse deus, sendo considerado filho de outro deus, mas somente se tivesse nascido do faraó anterior. B) um deus vivo e a origem de todos os poderes, vinculado pela entronização à linha sucessória divina , centro de todas as coisas, inclusive dos países estrangeiros que a ele deveriam se subordinar. C) um rei que era também pontífice máximo e escolhia um entre os deuses do Egito para ser o deus de sua dinastia, cujo culto público e privado impunha aos súditos deixando os demais deuses com cultos suspensos. D) um sacerdote, escolhido e ungido por um profeta que solicitava por meio de oferendas poder aos deuses como forma de legitimação de seu domínio sobre o povo e as terras do Egito. E) qualquer membro da família real poderia sentar-se ao trono e empunhar a coroa do Alto Egito após passar pelo ritual real e sacrificar Ápis, o touro, com as próprias mãos numa cerimônia pública. 2) Os povos da Antiguidade, em geral, eram politeístas. Segundo o entendimento de Fustel de Coulanges, tanto na Grécia quanto em Roma, inicialmente, antes mesmo de existirem cidades, existiam deuses familiares, chamados lares, que não aceitavam culto de estranhos. Quais eram os procedimentos tomados a esse respeito pelos grupos quando da formação de tribos e fratrias e, posteriormente, Pólis e Civitas? A) Democraticamente, os chefes de família se uniam e faziam uma votação que abrangia todos os homens maiores de 21 anos e menores de 60 anos como eleitores e escolhiam o deus da tribo ou fratria; nas cidades isso acontecia por sorteio, crendo-se que o deus mais poderoso faria surgir seu nome no papel ou pedra sorteados. B) As uniões de famílias