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20 - RUMOS – Março/Abril 2011 Março/Abril 2011 – RUMOS - 21 á mais semelhanças do que diferen- ças entre mulheres e homens líderes, pois quem ocupa um cargo executi- vo acaba se encaixando nas exigên- cias principais da função, indepen- dentemente da questão de gênero. Segundo a psicóloga Fela Moscovici, autora do livro Desenvolvimento Interpessoal, que acaba de chegar à 20ª edição pela José Olympio Editora (além das 14 impressões anteriores lançadas pela LTC), o papel de líder exige uniformização de com- portamentos. As diferenças de gênero entre os detentores do cargo existem, mas não são as princi - pais, segundo os resultados inferidos de novo estu- do exploratório divulgado este ano por Fela, desta vez com 102 mulheres líderes, sendo 69 brasileiras, 23 argentinas e 10 paraguaias. A especialista, que é fundadora e didata mestra da Sociedade Brasileira de Dinâmica de Grupo, não se surpreendeu com o indicativo do estudo a respeito da falta de treina- mento interpessoal necessário ao exercício da fun- ção também entre as mulheres. Diante dos resultados do estudo, Fela destaca como principal mensagem que treinamento geren- cial técnico é extremamente útil mas não suficiente. “Pessoas não são máquinas. O líder deve ser com- petente técnica e interpessoalmente. Aconselho que o desenvolvimento gerencial reserve um grande espaço para o desenvolvimento interpessoal no mes- mo programa, não separado, porque a técnica não é aplicada no vácuo, e sim com pessoas”, explica. O estudo fez parte do programa pioneiro de capacitação desenvolvido pelo Sebrae do Paraná, em 2010, chamado Líder-Mulher – burilando o dia- mante, voltado para questões relativas à liderança feminina no Brasil, na Argentina e no Paraguai. O questionário Dimensões Interpessoais , de autoria de Fela – que tem sido aplicado sistematicamente em programas de desenvolvimento de executivos e gestores, desde sua primeira utilização-piloto na década de 1970 – foi respondido pelas participan- tes, buscando captar a autopercepção delas a res- peito das situações em que se sentem mais ou menos confortáveis no exercício da função. A ordenação das respostas possibilitou visuali- zar 20 dimensões interpessoais. Nos extremos, como os quatro pontos mais “fortes”, foram encontrados: competição/independência; experi- mentação; saber ouvir/apoio catalisador; e sensibi- lidade. Os pontos mais fracos foram: reação a feed- back, resistência a estresse, persuasão e espontanei- dade/lidar com conflitos. De posse dos resultados, Fela resolveu examinar os resultados da pesquisa ori- ginal, feita com 297 gerentes brasileiros do sexo mas- culino, em 1975, e compará-los com os atuais, decorridos 35 anos. Os resultados são muito pareci- dos, sobretudo nos pontos fracos. Os pontos mais fortes entre os homens haviam sido: competição, independência, flexibilidade e autoconfiança. E os mais fracos: reação a feedback, espontaneidade, lidar com conflito e resistência a estresse. “Competição é importante em todos os líderes, H senão ele ou ela não ficam no cargo. E a competição é bem-vinda – não para derrubar o outro, mas no sentido de buscar mais qualidade para o grupo. O líder tem que lutar pela sua área, pelo orçamento des- tinado à sua gerência, por melhores condições para sua equipe, por mais resultados. Se a liderança não for competitiva, ela não consegue”. “Meu chefe é uma mãe” – Independência e expe- rimentação se equivalem. Autoconfiança, por sua vez, seria mais própria do homem e saber ouvir à mulher. “Isso é cultural. Dá uma feição mais mater- nal, de apoio à liderança feminina, enquanto o homem estaria numa feição mais autocrática, domi- nadora. Não se trata de avaliar o que é melhor, mas de observar a influência cultural sobre o perfil do A presença crescente das mulheres no comando das empresas e instituições não imprime uma nova marca às chefias. O perfil cultural feminino, associado à mãe, a saber ouvir e à sensibilidade, não se sobressai quando elas exercem postos de comando. A influência cultural existe, mas na liderança homem e mulher ficam iguais. Fela Moscovici A Por Silvia Noronha N oe l J oa q u im F ai ad E X P E R TI SE COMPETÊNCIA GERENCIAL líder”, ressalva. Por isso, diz-se: “Meu chefe é uma mãe” para os líderes que sabem ouvir, em contrapo- sição ao dominador, controlador. Nos Estados Unidos há, inclusive, estudos sobre a imagem inconsciente do líder e do subordi- nado, sendo que o chefe ocupa a figura do pai, e o subordinado, a do filho. Este está sempre depen- dendo do pai, traz a imagem da infância do pai cobrador, que exige e não dá quase nada, enquanto com a mãe ele tem relação de afeto e apoio. “Isso está no inconsciente, porém tende a mudar, embora não seja um processo rápido. A nossa sociedade está caminhando para a padronização, para diminuir ou até acabar com as diferenças individuais – não é questão de gênero, e sim de indivíduos”, avalia Fela, que foi professora de cursos de graduação e de pós- nossa sociedade está caminhando para a padronização, para diminuir ou até acabar com as diferenças individuais. Mulheres na chefia N oe l J oa q u im F ai ad 20 - RUMOS – Março/Abril 2011 Março/Abril 2011 – RUMOS - 21 á mais semelhanças do que diferen- ças entre mulheres e homens líderes, pois quem ocupa um cargo executi- vo acaba se encaixando nas exigên- cias principais da função, indepen- dentemente da questão de gênero. Segundo a psicóloga Fela Moscovici, autora do livro Desenvolvimento Interpessoal, que acaba de chegar à 20ª edição pela José Olympio Editora (além das 14 impressões anteriores lançadas pela LTC), o papel de líder exige uniformização de com- portamentos. As diferenças de gênero entre os detentores do cargo existem, mas não são as princi - pais, segundo os resultados inferidos de novo estu- do exploratório divulgado este ano por Fela, desta vez com 102 mulheres líderes, sendo 69 brasileiras, 23 argentinas e 10 paraguaias. A especialista, que é fundadora e didata mestra da Sociedade Brasileira de Dinâmica de Grupo, não se surpreendeu com o indicativo do estudo a respeito da falta de treina- mento interpessoal necessário ao exercício da fun- ção também entre as mulheres. Diante dos resultados do estudo, Fela destaca como principal mensagem que treinamento geren- cial técnico é extremamente útil mas não suficiente. “Pessoas não são máquinas. O líder deve ser com- petente técnica e interpessoalmente. Aconselho que o desenvolvimento gerencial reserve um grande espaço para o desenvolvimento interpessoal no mes- mo programa, não separado, porque a técnica não é aplicada no vácuo, e sim com pessoas”, explica. O estudo fez parte do programa pioneiro de capacitação desenvolvido pelo Sebrae do Paraná, em 2010, chamado Líder-Mulher – burilando o dia- mante, voltado para questões relativas à liderança feminina no Brasil, na Argentina e no Paraguai. O questionário Dimensões Interpessoais , de autoria de Fela – que tem sido aplicado sistematicamente em programas de desenvolvimento de executivos e gestores, desde sua primeira utilização-piloto na década de 1970 – foi respondido pelas participan- tes, buscando captar a autopercepção delas a res- peito das situações em que se sentem mais ou menos confortáveis no exercício da função. A ordenação das respostas possibilitou visuali- zar 20 dimensões interpessoais. Nos extremos, como os quatro pontos mais “fortes”, foram encontrados: competição/independência; experi- mentação; saber ouvir/apoio catalisador; e sensibi- lidade. Os pontos mais fracos foram: reação a feed- back, resistência a estresse, persuasão e espontanei- dade/lidar com conflitos. De posse dos resultados, Fela resolveu examinar os resultadosda pesquisa ori- ginal, feita com 297 gerentes brasileiros do sexo mas- culino, em 1975, e compará-los com os atuais, decorridos 35 anos. Os resultados são muito pareci- dos, sobretudo nos pontos fracos. Os pontos mais fortes entre os homens haviam sido: competição, independência, flexibilidade e autoconfiança. E os mais fracos: reação a feedback, espontaneidade, lidar com conflito e resistência a estresse. “Competição é importante em todos os líderes, H senão ele ou ela não ficam no cargo. E a competição é bem-vinda – não para derrubar o outro, mas no sentido de buscar mais qualidade para o grupo. O líder tem que lutar pela sua área, pelo orçamento des- tinado à sua gerência, por melhores condições para sua equipe, por mais resultados. Se a liderança não for competitiva, ela não consegue”. “Meu chefe é uma mãe” – Independência e expe- rimentação se equivalem. Autoconfiança, por sua vez, seria mais própria do homem e saber ouvir à mulher. “Isso é cultural. Dá uma feição mais mater- nal, de apoio à liderança feminina, enquanto o homem estaria numa feição mais autocrática, domi- nadora. Não se trata de avaliar o que é melhor, mas de observar a influência cultural sobre o perfil do A presença crescente das mulheres no comando das empresas e instituições não imprime uma nova marca às chefias. O perfil cultural feminino, associado à mãe, a saber ouvir e à sensibilidade, não se sobressai quando elas exercem postos de comando. A influência cultural existe, mas na liderança homem e mulher ficam iguais. Fela Moscovici A Por Silvia Noronha N oe l J oa q u im F ai ad E X P E R TI SE COMPETÊNCIA GERENCIAL líder”, ressalva. Por isso, diz-se: “Meu chefe é uma mãe” para os líderes que sabem ouvir, em contrapo- sição ao dominador, controlador. Nos Estados Unidos há, inclusive, estudos sobre a imagem inconsciente do líder e do subordi- nado, sendo que o chefe ocupa a figura do pai, e o subordinado, a do filho. Este está sempre depen- dendo do pai, traz a imagem da infância do pai cobrador, que exige e não dá quase nada, enquanto com a mãe ele tem relação de afeto e apoio. “Isso está no inconsciente, porém tende a mudar, embora não seja um processo rápido. A nossa sociedade está caminhando para a padronização, para diminuir ou até acabar com as diferenças individuais – não é questão de gênero, e sim de indivíduos”, avalia Fela, que foi professora de cursos de graduação e de pós- nossa sociedade está caminhando para a padronização, para diminuir ou até acabar com as diferenças individuais. Mulheres na chefia N oe l J oa q u im F ai ad desenvolvimento gerencial – res- salta Fela – privilegia a competên- cia técnica, em detrimento da com- petência interpessoal, o que revela um descompasso, pois o líder vive e interage com outras pessoas. “O privilégio é sempre técnico por- que nós vivemos numa sociedade tecnicista, estamos escravizados pela tecnologia; por isso os proce- dimentos técnicos estão à frente. E a parte interpessoal fica relega- da a segundo plano”, afirma ela, que é mestre em psicologia social pela Universidade de Chicago. Capacitação traz resultado – Em geral, algumas pessoas têm capacidade espontânea de lidar com as outras; estas seriam os diplomatas natos, mas tal caracte- rística pode ser desenvolvida em todas as pessoas, em maior ou menor grau. A genética traz potencialidades e limites, por exemplo, quem não tem voz não pode ser cantor, mas o que está em potencial pode e deve ser desenvolvido. Algumas pessoas possuem maior disposição para interagir com outras, são mais sociáveis; outras se recolhem, são mais fechadas e são excelentes em determinadas profissões. Qualquer tipo de atributo humano serve para determinada atividade, enfatiza. O hábito faz o monge, observa a especialista. A profissão vai modelando a pessoa, que acaba se encaixando nas exigências principais daquele papel. Não obstante, o exercício da função é sempre uma interação dinâmica entre papel e personalidade. Cada detentor daquele cargo vai imprimir a sua mar- ca pessoal, pois o ser humano não é autômato, não há como programar o comportamento para que ele seja um líder daquela maneira prescrita. Daí, portanto, a importância da capacitação em competência interpessoal. Ao longo da história da humanidade, as invenções rapidamente entram no mercado, mas o desenvolvimento social é muito mais lento, porque há ritmos diferentes para as máquinas e para pessoas. “As máquinas podem ter ritmo acelerado. O carro você acelera até onde você quiser. Mas o desenvolvimento humano acontece mais de acordo com a natureza. Você tem as quatro estações que não podem ser apressadas. Vamos diminuir o verão? Não chegou tecnologia para isso. O ritmo humano de vida também: há a infância, a juventude, a maturidade, a velhice, estamos esten- dendo o ciclo de vida graças à tecnologia, mas não estamos fazendo abreviar cada ciclo. A própria aprendizagem é um exemplo disso. O que você vê ou participa é assimilado mais depressa, mas é diferente da máquina, porque há um tempo de processamento interno ainda não explicado pela ciência. Como se adquire experiência? Vivenciando. A experiência vem com o tempo”. Mulher na presidência do país – E com o tempo cresce também a presença nas mulheres em cargos de liderança no Brasil. A presença delas nas chefias já é expressiva, na opinião de Fela, tendo em vista, no Brasil, durante todo o período colonial, as pessoas do sexo femi- nino nem frequentarem escola. Elas tinham o papel social prede- terminado de mãe e dona de casa. Com o desenvolvimento do país é que houve uma grande guinada. Desde 2004, por exemplo, o núme- ro de mulheres em cursos de dou- torado é maior do que o de homens, e vem crescendo cada vez mais, segundo dados do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, órgão supervisionado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. Além disso, o Brasil é o terceiro país do mundo com a maior proporção de mulheres douto- ras, atrás apenas de Portugal e Espanha, e à frente dos Estados Unidos. “Elas estão à frente na Acade- mia; mas no mercado de trabalho as transforma- ções ocorrem mais lentamente porque envolvem mudanças culturais, que acontecem mais lentamen- te”, explica ela, também autora dos livros Psicologia Educacional e Desenvolvimento Humano, de 1966; e Razão e Emoção, de 1967. Outra pesquisa citada pela especialista indica que as mulheres doutoras recebem em média 11% a menos do que os homens doutores. Além disso, nos cargos de chefia mais procurados a preferência é dos homens, pois o fator cultural machista ainda revela sua influência. Nos Estados Unidos, para cada dólar pago ao homem com qualificação supe- rior, a mulher recebe 77 centavos. Uma diferença grande, segundo Fela, para cargos de mesma qualifi- cação. “O progresso é lento, mas está acontecendo”, pontua. O fato de o Brasil ter uma mulher na Presi- dência da República, na opinião de psicóloga, é uma grande demonstração de maturidade e de dis- posição do povo brasileiro para grandes mudanças sociais. Colocar o destino do Brasil nas mãos de uma mulher é a maior demonstração de maturida- de de um povo, e neste contexto as mudanças soci- ais e culturais podem ocorrer mais depressa, finali- za Fela. o graduação da Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro. Segundo a psicóloga, essa questão da uniformi- zação é seriíssima para a liderança, que muitas vezes gostaria mesmo que todos da sua equipe fizessem tudo como ele manda. Entretanto – lembra Fela –, entre os seres humanos isso é impossível. “A padro- nização tem de ocorrer em máquinas, mas não exis- te no comportamento humano, embora haja tenta- tivas,sobretudo nos regimes totalitários. Todos devem falar e pensar igual. Você vê isso no telemar- keting, por exemplo”, observa a especialista. De uma certa maneira, como o líder quer que todos atinjam os objetivos, para ele seria útil uma padronização relativa, que todos fossem em dire- ção ao objetivo comum, mas não necessariamente da mesma maneira. “A padronização busca cortar relações interpessoais, tanto que para não haver conflito, não se deve discutir futebol, religião nem casamento. Essa busca de padronização pode ser útil até certo ponto para não haver determinados comportamentos muito desviantes dentro de um grupo de trabalho”, pondera. O líder não é preparado para divergências, assi- nala a psicóloga. Também nesses aspectos o desen- volvimento da competência interpessoal teria muito a contribuir, garante Fela, autora de outras obras téc- nicas publicadas no Brasil e no exterior, entre elas Equipes Dão Certo (1994) e a Organização por Trás do Espelho, ambas pela José Olympio Editora. O geren- ciamento de conflitos fica relegado nos processos de capacitação gerencial, quando é possível admi- nistrar conflitos utilizando metodologia de compe- tência interpessoal. Tanto que o estudo detectou como pontos fracos aspectos relacionados à comu- nicação: reação a feedback, por exemplo. Em geral o líder não aceita crítica e desqualifica o feedback para não aceitar uma informação muitas vez útil, mas que mostra que ele não é perfeito. “Em geral, o líder se coloca de fora da situação-problema. Os defeitos estão nos outros”. Mais uma vez, pontua Fela, a rela- ção interpessoal mostra-se fundamental na lideran- ça, pois o trabalho é realizado em grupo. O fato de a chefia ser ocupada por uma mulher não muda essas considerações. “A mulher que tem aspirações na empresa tem que assumir o papel de líder. As exigências do cargo são essas, o perfil é esse. O homem sensível na liderança ainda é consi- derado fraco. Acredita-se que exista uma meta a ser cumprida e não tem nada que ficar ouvindo os outros”, afirma a consultora. Líder-servidor – A tendência para o futuro são as características do homem e da mulher se aproxima- rem. Cada vez mais a tecnologia gerencial mostra que o líder tem que se aproximar daquele tipo que incorpora emoções. Quer dizer, não pode ser uma gerência puramente mecanista; é o conceito do líder servidor, ou seja, ele está ali para servir ao grupo, ele não faz ações para o seu bel-prazer. A espontaneida- de ainda é muito difícil, porque todos têm experiên- cia de que a transparência total não deu certo. Isso deixa um lastro negativo associado à transparência e torna-se difícil saber qual a dose possível a ser usada. O conselho de Fela às empresas e instituições seria promover o desenvolvimento interpessoal sem perder a tecnologia. “As pessoas precisam de algo mais, e em primeiro lugar precisam aprender a lidar consigo mesmas”, frisa ela, que fez especiali- zação em consultoria internacional no NTL Insti- tute of Applied Behavioral Science, nos Estados Unidos. Vários aspectos ajudam a explicar as razões do descompasso entre o desenvolvimento tecnológico e o psicossocial. Em primeiro lugar, Fela lembra que empresas são pessoas que, por sua vez, têm receios. Outro motivo é que desenvolvimento interpessoal não traz resultados imediatos; é um trabalho de médio e longo prazos, ao contrário das técnicas gerenciais. Em terceiro, o fato de o estudo explora- tório comparando o resultado de hoje com o de 35 anos atrás indicar o quão pouco essa área avançou, também significa que os fatores culturais são muito fortes. Por outro lado, há inúmeros avanços sociais, tan- to que na década de 1970, o estudo foi feito apenas com homens, simplesmente porque só havia pesso- as do sexo masculino nos grupos de gerentes. Isso foi mudando nesses 35 anos. Nesse período, surgi- ram lideranças como Margareth Thatcher, a Dama de Ferro. Fela lembra que, simbolicamente, ferro é o homem; ao passo que a mulher é a doçura do mel, mas os dois elementos se completam, o yin e o yang. Resistência a estresse – Outro ponto fraco assina- lado tanto por homens como por mulheres foi resis- tência a estresse. Fela observa que com a tecnologia tão avançada o estresse tem sido maior, principal- mente devido à dimensão temporal, que é combati- da pelo mundo contemporâneo. Hoje há pressa e impaciência de esperar. E o homem ou a mulher não tem como lidar com esse estresse sobre-humano. E o líder – mais uma vez – não tem qualquer tipo de treinamento para fazer frente a esse estresse, embo- ra haja maneira de utilizar melhor o tempo e de rela- xar. Para piorar, o executivo ou a executiva não aprende a dizer não para as exigências que lhe são fei- tas. “Ele aceita tudo, mas ele não é super-homem. São as altas exigências da função num mundo apres- sado que não tem tempo para as pessoas”, ressalta. Quem ocupa função de comando, seja homem ou mulher, geralmente é submetido a programas de capacitação para poder exercer a liderança de forma efetiva nos vários níveis hierárquicos. Porém, o Fela Moscovici 22 - RUMOS – Março/Abril 2011 Março/Abril 2011 – RUMOS - 23 EXPERTISE tendência para o futuro são as características do homem e da mulher se aproximarem. Cada vez mais a tecnologia gerencial mostra que o líder tem que se aproximar daquele tipo que incorpora emoções. A Líder homem Pontos mais fortes 1. Competição 2. Independência 3. Flexibilidade 4. Autoconfiança Pontos mais fracos 1. Reação a feedback 2. Espontaneidade 3. Lidar com conflito 4. Resistência a estresse 1. Competição/ Independência 2. Experimentação 3. Saber ouvir/ Apoio catalisador 4. Sensibilidade 1. Reação a feedback 2. Resistência a estresse 3. Persuasão 4. Espontaneidade/ Lidar com conflito Líder mulher Pontos mais fortes Pontos mais fracos desenvolvimento gerencial – res- salta Fela – privilegia a competên- cia técnica, em detrimento da com- petência interpessoal, o que revela um descompasso, pois o líder vive e interage com outras pessoas. “O privilégio é sempre técnico por- que nós vivemos numa sociedade tecnicista, estamos escravizados pela tecnologia; por isso os proce- dimentos técnicos estão à frente. E a parte interpessoal fica relega- da a segundo plano”, afirma ela, que é mestre em psicologia social pela Universidade de Chicago. Capacitação traz resultado – Em geral, algumas pessoas têm capacidade espontânea de lidar com as outras; estas seriam os diplomatas natos, mas tal caracte- rística pode ser desenvolvida em todas as pessoas, em maior ou menor grau. A genética traz potencialidades e limites, por exemplo, quem não tem voz não pode ser cantor, mas o que está em potencial pode e deve ser desenvolvido. Algumas pessoas possuem maior disposição para interagir com outras, são mais sociáveis; outras se recolhem, são mais fechadas e são excelentes em determinadas profissões. Qualquer tipo de atributo humano serve para determinada atividade, enfatiza. O hábito faz o monge, observa a especialista. A profissão vai modelando a pessoa, que acaba se encaixando nas exigências principais daquele papel. Não obstante, o exercício da função é sempre uma interação dinâmica entre papel e personalidade. Cada detentor daquele cargo vai imprimir a sua mar- ca pessoal, pois o ser humano não é autômato, não há como programar o comportamento para que ele seja um líder daquela maneira prescrita. Daí, portanto, a importância da capacitação em competência interpessoal. Ao longo da história da humanidade, as invenções rapidamente entram no mercado, mas o desenvolvimento social é muito mais lento, porque há ritmos diferentes para as máquinas e para pessoas. “As máquinas podem ter ritmo acelerado. O carro vocêacelera até onde você quiser. Mas o desenvolvimento humano acontece mais de acordo com a natureza. Você tem as quatro estações que não podem ser apressadas. Vamos diminuir o verão? Não chegou tecnologia para isso. O ritmo humano de vida também: há a infância, a juventude, a maturidade, a velhice, estamos esten- dendo o ciclo de vida graças à tecnologia, mas não estamos fazendo abreviar cada ciclo. A própria aprendizagem é um exemplo disso. O que você vê ou participa é assimilado mais depressa, mas é diferente da máquina, porque há um tempo de processamento interno ainda não explicado pela ciência. Como se adquire experiência? Vivenciando. A experiência vem com o tempo”. Mulher na presidência do país – E com o tempo cresce também a presença nas mulheres em cargos de liderança no Brasil. A presença delas nas chefias já é expressiva, na opinião de Fela, tendo em vista, no Brasil, durante todo o período colonial, as pessoas do sexo femi- nino nem frequentarem escola. Elas tinham o papel social prede- terminado de mãe e dona de casa. Com o desenvolvimento do país é que houve uma grande guinada. Desde 2004, por exemplo, o núme- ro de mulheres em cursos de dou- torado é maior do que o de homens, e vem crescendo cada vez mais, segundo dados do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, órgão supervisionado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. Além disso, o Brasil é o terceiro país do mundo com a maior proporção de mulheres douto- ras, atrás apenas de Portugal e Espanha, e à frente dos Estados Unidos. “Elas estão à frente na Acade- mia; mas no mercado de trabalho as transforma- ções ocorrem mais lentamente porque envolvem mudanças culturais, que acontecem mais lentamen- te”, explica ela, também autora dos livros Psicologia Educacional e Desenvolvimento Humano, de 1966; e Razão e Emoção, de 1967. Outra pesquisa citada pela especialista indica que as mulheres doutoras recebem em média 11% a menos do que os homens doutores. Além disso, nos cargos de chefia mais procurados a preferência é dos homens, pois o fator cultural machista ainda revela sua influência. Nos Estados Unidos, para cada dólar pago ao homem com qualificação supe- rior, a mulher recebe 77 centavos. Uma diferença grande, segundo Fela, para cargos de mesma qualifi- cação. “O progresso é lento, mas está acontecendo”, pontua. O fato de o Brasil ter uma mulher na Presi- dência da República, na opinião de psicóloga, é uma grande demonstração de maturidade e de dis- posição do povo brasileiro para grandes mudanças sociais. Colocar o destino do Brasil nas mãos de uma mulher é a maior demonstração de maturida- de de um povo, e neste contexto as mudanças soci- ais e culturais podem ocorrer mais depressa, finali- za Fela. o graduação da Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro. Segundo a psicóloga, essa questão da uniformi- zação é seriíssima para a liderança, que muitas vezes gostaria mesmo que todos da sua equipe fizessem tudo como ele manda. Entretanto – lembra Fela –, entre os seres humanos isso é impossível. “A padro- nização tem de ocorrer em máquinas, mas não exis- te no comportamento humano, embora haja tenta- tivas, sobretudo nos regimes totalitários. Todos devem falar e pensar igual. Você vê isso no telemar- keting, por exemplo”, observa a especialista. De uma certa maneira, como o líder quer que todos atinjam os objetivos, para ele seria útil uma padronização relativa, que todos fossem em dire- ção ao objetivo comum, mas não necessariamente da mesma maneira. “A padronização busca cortar relações interpessoais, tanto que para não haver conflito, não se deve discutir futebol, religião nem casamento. Essa busca de padronização pode ser útil até certo ponto para não haver determinados comportamentos muito desviantes dentro de um grupo de trabalho”, pondera. O líder não é preparado para divergências, assi- nala a psicóloga. Também nesses aspectos o desen- volvimento da competência interpessoal teria muito a contribuir, garante Fela, autora de outras obras téc- nicas publicadas no Brasil e no exterior, entre elas Equipes Dão Certo (1994) e a Organização por Trás do Espelho, ambas pela José Olympio Editora. O geren- ciamento de conflitos fica relegado nos processos de capacitação gerencial, quando é possível admi- nistrar conflitos utilizando metodologia de compe- tência interpessoal. Tanto que o estudo detectou como pontos fracos aspectos relacionados à comu- nicação: reação a feedback, por exemplo. Em geral o líder não aceita crítica e desqualifica o feedback para não aceitar uma informação muitas vez útil, mas que mostra que ele não é perfeito. “Em geral, o líder se coloca de fora da situação-problema. Os defeitos estão nos outros”. Mais uma vez, pontua Fela, a rela- ção interpessoal mostra-se fundamental na lideran- ça, pois o trabalho é realizado em grupo. O fato de a chefia ser ocupada por uma mulher não muda essas considerações. “A mulher que tem aspirações na empresa tem que assumir o papel de líder. As exigências do cargo são essas, o perfil é esse. O homem sensível na liderança ainda é consi- derado fraco. Acredita-se que exista uma meta a ser cumprida e não tem nada que ficar ouvindo os outros”, afirma a consultora. Líder-servidor – A tendência para o futuro são as características do homem e da mulher se aproxima- rem. Cada vez mais a tecnologia gerencial mostra que o líder tem que se aproximar daquele tipo que incorpora emoções. Quer dizer, não pode ser uma gerência puramente mecanista; é o conceito do líder servidor, ou seja, ele está ali para servir ao grupo, ele não faz ações para o seu bel-prazer. A espontaneida- de ainda é muito difícil, porque todos têm experiên- cia de que a transparência total não deu certo. Isso deixa um lastro negativo associado à transparência e torna-se difícil saber qual a dose possível a ser usada. O conselho de Fela às empresas e instituições seria promover o desenvolvimento interpessoal sem perder a tecnologia. “As pessoas precisam de algo mais, e em primeiro lugar precisam aprender a lidar consigo mesmas”, frisa ela, que fez especiali- zação em consultoria internacional no NTL Insti- tute of Applied Behavioral Science, nos Estados Unidos. Vários aspectos ajudam a explicar as razões do descompasso entre o desenvolvimento tecnológico e o psicossocial. Em primeiro lugar, Fela lembra que empresas são pessoas que, por sua vez, têm receios. Outro motivo é que desenvolvimento interpessoal não traz resultados imediatos; é um trabalho de médio e longo prazos, ao contrário das técnicas gerenciais. Em terceiro, o fato de o estudo explora- tório comparando o resultado de hoje com o de 35 anos atrás indicar o quão pouco essa área avançou, também significa que os fatores culturais são muito fortes. Por outro lado, há inúmeros avanços sociais, tan- to que na década de 1970, o estudo foi feito apenas com homens, simplesmente porque só havia pesso- as do sexo masculino nos grupos de gerentes. Isso foi mudando nesses 35 anos. Nesse período, surgi- ram lideranças como Margareth Thatcher, a Dama de Ferro. Fela lembra que, simbolicamente, ferro é o homem; ao passo que a mulher é a doçura do mel, mas os dois elementos se completam, o yin e o yang. Resistência a estresse – Outro ponto fraco assina- lado tanto por homens como por mulheres foi resis- tência a estresse. Fela observa que com a tecnologia tão avançada o estresse tem sido maior, principal- mente devido à dimensão temporal, que é combati- da pelo mundo contemporâneo. Hoje há pressa e impaciência de esperar. E o homem ou a mulher não tem como lidar com esse estresse sobre-humano. E o líder – mais uma vez – não tem qualquer tipo de treinamento para fazer frente a esse estresse, embo- ra haja maneira deutilizar melhor o tempo e de rela- xar. Para piorar, o executivo ou a executiva não aprende a dizer não para as exigências que lhe são fei- tas. “Ele aceita tudo, mas ele não é super-homem. São as altas exigências da função num mundo apres- sado que não tem tempo para as pessoas”, ressalta. Quem ocupa função de comando, seja homem ou mulher, geralmente é submetido a programas de capacitação para poder exercer a liderança de forma efetiva nos vários níveis hierárquicos. Porém, o Fela Moscovici 22 - RUMOS – Março/Abril 2011 Março/Abril 2011 – RUMOS - 23 EXPERTISE tendência para o futuro são as características do homem e da mulher se aproximarem. Cada vez mais a tecnologia gerencial mostra que o líder tem que se aproximar daquele tipo que incorpora emoções. A Líder homem Pontos mais fortes 1. Competição 2. Independência 3. Flexibilidade 4. Autoconfiança Pontos mais fracos 1. Reação a feedback 2. Espontaneidade 3. Lidar com conflito 4. Resistência a estresse 1. Competição/ Independência 2. Experimentação 3. Saber ouvir/ Apoio catalisador 4. Sensibilidade 1. Reação a feedback 2. Resistência a estresse 3. Persuasão 4. Espontaneidade/ Lidar com conflito Líder mulher Pontos mais fortes Pontos mais fracos Página 1 Página 2 Página 3 Página 4
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