Buscar

terapia_nutricional_na_disfuncao_cardiaca_da_crianca

Prévia do material em texto

1
Projeto Diretrizes
Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina
O Projeto Diretrizes, iniciativa conjunta da Associação Médica Brasileira e Conselho Federal 
de Medicina, tem por objetivo conciliar informações da área médica a fim de padronizar 
condutas que auxiliem o raciocínio e a tomada de decisão do médico. As informações contidas neste 
projeto devem ser submetidas à avaliação e à crítica do médico, responsável pela conduta 
a ser seguida, frente à realidade e ao estado clínico de cada paciente.
Autoria: Sociedade Brasileira de Nutrição 
Parenteral e Enteral 
Associação Brasileira de Nutrologia
Elaboração Final: 11 de julho de 2011
 Participantes: Oba J, Delgado AF
Terapia Nutricional na 
Disfunção Cardíaca da Criança 
2 Terapia Nutricional na Disfunção Cardíaca da Criança 
Projeto Diretrizes
Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina
DESCRIÇÃO DO MÉTODO DE COLETA DE EVIDÊNCIA:
Foram revisados artigos nas bases de dados do MEDLINE/PubMed e outras fontes de 
pesquisa, como busca manual, sem limite de tempo. A estratégia de busca utilizada 
baseou-se em perguntas estruturadas na forma P.I.C.O. (das iniciais “Paciente”, 
“Intervenção”, “Controle”, “Outcome”). Foram utilizados como descritores (MeSH 
Terms): disfunção cardíaca, cardiopatias congênitas, criança, terapia nutricional.
GRAu DE RECOMENDAÇÃO E fORÇA DE EVIDÊNCIA: 
A: Estudos experimentais ou observacionais de melhor consistência. 
B: Estudos experimentais ou observacionais de menor consistência. 
C: Relatos de casos (estudos não controlados). 
D: Opinião desprovida de avaliação crítica, baseada em consensos, estudos fisioló-
gicos ou modelos animais. 
OBjETIVO: 
Esta diretriz tem por finalidade proporcionar aos médicos generalistas e especialistas 
uma visão geral sobre a abordagem nutricional na criança com disfunção cardíaca, 
com base na evidência científica disponível. O tratamento do paciente deve ser indi-
vidualizado de acordo com suas condições clínicas e com a realidade e experiência 
de cada profissional. 
CONfLITO DE INTERESSE: 
Nenhum conflito de interesse declarado.
3Terapia Nutricional na Disfunção Cardíaca da Criança 
Projeto Diretrizes
Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina
 Introdução
A disfunção cardíaca na criança abrange as doenças cardía-
cas congênitas (CC), que incluem as anomalias congênitas do 
coração e dos grandes vasos, e as cardiopatias adquiridas, como 
endocardite bacteriana, miocardite, febre reumática e insufici-
ência cardíaca. As disfunções cardíacas na criança propiciam 
um risco significativo para o desequilíbrio energético, devido 
ao aumento das necessidades e insuficiente ou inadequada nu-
trição. O desequilíbrio energético leva ao desenvolvimento da 
desnutrição, que prejudica o desenvolvimento e o crescimento 
da criança. Nesse contexto, a terapia nutricional é essencial para 
proporcionar adequado ganho de peso e estatura. O processo 
de desnutrição nessas crianças é rápido e pode se tornar mais 
grave se elas necessitarem de correção cirúrgica no período 
neonatal ou na infância. 
1. A dIsfunção cArdíAcA nA crIAnçA InfluencIA o estAdo 
nutrIcIonAl e o metAbolIsmo?
As disfunções cardíacas são dependentes da hemodinâmica e 
dos efeitos da lesão1(D) e prejudicam o adequado ganho de peso 
e/ ou estatura por inadequada ingestão calórica, por aumento do 
gasto metabólico de energia ou por ambos fatores2(B)3(C)4(D). 
A inadequada ingestão calórica pode ser decorrente de taquip-
neia, fadiga, restrição hídrica e acidose. A hipoxia celular, por 
aumentar o gasto metabólico, também contribui para deteriorar 
mais rapidamente o estado nutricional. O gasto metabólico 
na criança com CC é mais elevado e pode advir do aumento 
da temperatura basal, de infecções repetidas e do balanço ni-
trogenado negativo, entre outros. O conjunto desses sintomas 
clínicos que são frequentemente observados nas crianças com 
CC pode associar-se à prematuridade, às síndromes genéticas 
e outras malformações, tornando o quadro clínico mais grave. 
Essas anomalias, cardíacas ou não, dificultam a alimentação 
da criança nos primeiros dias de vida e se tornam mais graves 
quando associadas ao refluxo gastroesofágico, aos distúrbios da 
sucção-deglutição, à diminuição da capacidade gástrica causada 
por hepatomegalia e ao retardo de esvaziamento gástrico secun-
dário ao baixo débito cardíaco 2(B)3(C)1,4(D).
4 Terapia Nutricional na Disfunção Cardíaca da Criança 
Projeto Diretrizes
Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina
Recomendação
A disfunção cardíaca na criança influencia 
no adequado ganho de peso e/ou estatura, por 
inadequada ingestão calórica e/ou por aumento 
do gasto metabólico de energia, e pode estar as-
sociada à prematuridade, às síndromes genéticas 
e a outras malformações.
2. o estAdo nutrIcIonAl dA crIAnçA In-
fluencIA A dIsfunção cArdíAcA?
A deterioração do estado nutricional da 
criança com disfunção cardíaca pode iniciar-se 
nos primeiros dias de vida, especialmente nos 
neonatos e nos pré-termos, que têm menor 
reserva metabólica e são muito vulneráveis 
aos efeitos negativos induzidos pelo estresse. 
A perda de massa corporal se deve princi-
palmente às perdas de gordura e de tecido 
muscular, incluindo o coração e os músculos 
respiratórios5(B). 
O resultado final compromete grave-
mente a função miocárdica e pulmonar. As 
respostas imunológicas celulares e humorais 
estão alteradas nas crianças desnutridas, bem 
como nas prematuras, aumentando ainda 
mais os riscos de infecções e a capacidade 
de cicatrização6(D).
Recomendação 
O estado nutricional da criança influencia 
na disfunção cardíaca, podendo apresentar perda 
de massa muscular cardíaca, comprometimento 
da função miocárdica e pulmonar.
3. QuAIs são os objetIvos dA terApIA 
nutrIcIonAl no pAcIente com dIsfunção 
cArdíAcA?
Os principais objetivos da terapia nutricional 
das crianças com disfunção cardíaca são: repor as 
reservas corporais e recuperar o crescimento. O 
baixo ganho de peso e de estatura pode ser fator 
indicativo de que a intervenção nutricional é 
insuficiente ou inadequada. A terapia nutricio-
nal pode iniciar com base na avaliação do gasto 
energético e a progressão é controlada com a 
tolerância de aceitação, com o ganho de peso e 
aumento de estatura7(B). A taxa metabólica basal 
de crianças é quase o dobro daquela apresentada 
por um adulto, por quilograma de peso, e das 
crianças com insuficiência cardíaca congestiva 
pode ser até cinco vezes maior do que aquelas sem 
doença. Isto pode ser decorrente do aumento do 
trabalho dos sistemas cardíaco e respiratório1(D). 
As necessidades energéticas podem variar de acor-
do com o comprometimento cardíaco, assim, nas 
doenças leve a moderada pode ser de 130-150 
kcal/kg por dia, enquanto nas lesões moderada a 
grave, de 175-180 kcal/kg/dia8(D). 
Recomendação
Os objetivos da terapia nutricional na 
criança com disfunção cardíaca são adequar 
crescimento em estatura e aumento de peso por 
meio da oferta de valor calórico//kg/dia adequa-
do, conforme gravidade da doença.
4. QuAndo A terApIA nutrIcIonAl está IndIcA-
dA no pAcIente com dIsfunção cArdíAcA?
Intervenções terapêuticas nutricionais devem 
ser iniciadas assim que se identifiquem os riscos 
nutricionais, tais como as dificuldades alimen-
tares, a presença de infecções e outros fatores 
risco, como a necessidade de cirurgia cardíaca. 
O início da terapia nutricional é indicado antes 
que os processos de desnutrição comprometam o 
estado geral, a fim de melhorar o prognóstico5(B). 
5Terapia Nutricional na Disfunção Cardíaca da Criança 
Projeto Diretrizes
Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina
Recomendação
A terapia nutricional está indicada no 
paciente com disfunção cardíaca nomomento 
em que for detectado baixo ganho de peso ou 
estatura ou mesmo alteração na ingestão caló-
rica e de alimentos.
5. de Que formA A terApIA nutrIcIonAl 
pode ser ImplementAdA no pAcIente com 
dIsfunção cArdíAcA?
Quando a função gastrintestinal está 
preservada, deve-se utilizar a via enteral, via 
oral ou sonda nasogástrica. Quando o tempo 
de administração da dieta oral for superior a 
20-30 minutos, recomenda-se a utilização de 
sondas nasogástricas. Sondas finas podem ser 
utilizadas por um período que não ultrapasse 
aproximadamente dois meses. Acima desse 
período, as gastrostomias podem ser uma opção 
segura. Deve ser considerada a administração da 
dieta de maneira intermitente e/ou no período 
noturno, por ser mais fisiológica e por fornecer 
calorias extras, respectivamente. O aumento na 
densidade calórica de alimentos é uma estratégia 
muito utilizada para induzir o ganho de peso 
nesses pacientes7(B)8,9(D).
Quando a função gastrintestinal não está 
preservada, utiliza-se a nutrição parenteral. A 
administração prolongada de nutrição parenteral 
está associada ao desenvolvimento de colestase e 
elevação de transaminases. Portanto, a nutrição 
enteral deve ser iniciada mais rapidamente pos-
sível, mesmo na forma de enteral trófica1,10(D).
Recomendação
A terapia nutricional pode ser implementada 
no paciente com disfunção cardíaca com função 
gastrintestinal preservada, devendo-se utilizar: 
a via oral (se não ultrapassar 20 a 30 minutos 
de tempo de administração), enteral ou sonda 
nasogástrica (se não ultrapassar 2 meses de 
tempo de administração); acima deste período, 
as gastrostomias são indicadas. Se a função 
gastrintestinal não está preservada, utiliza-se a 
nutrição parenteral.
6. Há contrAIndIcAções à terApIA nutrI-
cIonAl nA dIsfunção cArdíAcA?
Não há contraindicações da terapia nu-
tricional na criança com disfunção cardíaca. 
Encontrar as necessidades nutricionais ideais 
para promover o crescimento da criança com CC 
requer cuidados clínico-nutricionais, avaliações 
periódicas, atualização e integração da equipe 
multiprofissional4,9,10(D).
Recomendação
Não há contraindicações da terapia nutricio-
nal na criança com disfunção cardíaca.
6 Terapia Nutricional na Disfunção Cardíaca da Criança 
Projeto Diretrizes
Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina
 referêncIAs 
 1. Kohr LM, Braudis NJ. Growth and nu-
trition. In: Paediatric Cardiology; 2010. 
p.1285-98.
 2. Barton JS, Hindmarsh PC, Scrimgeour 
CM, Rennie MJ, Preece MA. Energy ex-
penditure in congenital heart disease. Arch 
Dis Child 1994;70:5-9.
 3. van der Kuip M, Hoos MB, Forget PP, Wes-
terterp KR, Gemke RJ, de Meer K. Ener gy 
expenditure in infants with congenital heart 
disease, including a meta-analysis. Acta 
Paediatr 2003;92:921-7.
 4. Jackson M, Poskitt EM. The effects of 
high-energy feeding on energy balance and 
growth in infants with congenital heart 
disease and failure to thrive. Br J Nutr 
1991;65:131-43.
 5. Thompson Chagoyán OC, Reyes Tsubaki 
N, Rabiela Barrios OL, Buendía Her-
nández A, Miranda Chávez I, Carrasco 
Quintero R. The nutritional status of the 
child with congenital cardiopathy. Arch Inst 
Cardiol Mex 1998; 68:119-23.
 6. Day MD, Gauvreau K, Shulman S, 
Newburger JW. Characteristics of children 
hospitalized with infective endocarditis. 
Circulation 2009;119:865-70.
 7. Briassoulis G, Venkataraman S, Thompson 
AE. Energy expenditure in critically ill chil-
dren. Crit Care Med 2000;28:1166-72.
 8. Nydegger A, Bines JE. Energy metabolism 
in infants with congenital heart disease. 
Nutrition 2006;22:697-704.
 9. Linde LM, Dunn OJ, Schireson R, Rasof 
B. Growth in children with congenital heart 
disease. J Pediatr 1967;70:413-9.
10. Kogon BE, Ramaswamy V, Todd K, Plat-
tner C, Kirshbom PM, Kanter KR, et al. 
Feeding difficulty in newborns following 
congenital heart surgery. Congenit Heart 
Dis 2007;2:332-7.

Continue navegando