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Come a Abordagem Centrada na Pessoa trata as doenças mentais? É possível usar alguma técnica no atendimento em ACP? Existe a “alta”, segundo a ACP? Sao Carrenho Márcia Tassinari Marcos Alberto da Silva Perguntas como estas e muitas outras são feitas por profissionais em Psicologia que acabaram de se formar e ou que depois de experimentar al- gumas orientações como psicoierapeutas, optam pela Abordagem Cen- trada na Pessoa. Muitos desses proí mais estão realmente cheios de dúvidas, medos € até angustiados na ânsia de desejarem acertar e fazerem o melhor. Praticando a Abordagem OCT go (o DER: Dú vidas e perguntas mais frequentes Praticando a Abordagem Centrada ne Pessoa é um livro que surgiu da gecessidade em atender esses profissionais, através da experiência prática de três Psicólogos da ACP: Esther Carrenho, Márcia Tassinari e Márcos Albertb da Silva Pinto. | Neste livro, você encorirará uma parte teórica. coiá a história ge Carl Rogeis, os princípios da Abordagem Centrada na Pessoa, suas mbesçõs e dimensões e, uma segunda parte, com as dúvidas e perguntas nais fr quentes que estes três profissionais ouvem no dia a dia. cacõe: o ;es A intenção não é oferecer uma receita pronta que se for seguida, dará certo. É apenas a opinião resultante dos anos já vividos e o ponto de vista adquirido pela experiência desses profissionais. “Acreditamos que o melhor aprendizado é o que parie da experiência e da vivência de cada pessoa. Mas temos o desejo de que a partir deste livro o ieitor sinta o desejo de vivenciar e de continuar praticando o trabsiho enriguecedor de promover ferramentas para que ouíros também cresçam a partir de suas próprias vivências e percepções.” Esther Carrenho Ras) e. pe) Aga 8) | e) [ok [6] UR?) Ra S [o] E] er o» to) [42] JE a) [4º] po [od “aa pod) O » =) Feb] E TU (D a - RA We) e) MN | 7 TT 62492-04-4 NA CATRRNHO O N EDIT AT 768562 492044 ” Esther Carrenho Márcia Tassinari Marcos Alberto da Silva Pinto Praticando a Abordagem Centrada na Pessoa Dúvidas e perguntas mais frequentes CA E RRENHO DITOR 1 IAL São Paulo - 2010 Todos os direitos reservados a Carrenho Editorial Rua Fidalga, 471 Cj 03 Vila Madalena - São Paulo - SP - CEP 05432-070 Fone: 011 3816 1270 Projeto gráfico e diagramação Miriam Garcia Pereira Capa Cassia Carrenho Revisão Fernando Alves Eliel Carrenho Produção editorial Cassia Carrenho Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Carrenho, Esther Praticando a abordagem centrada na pessoa : dúvidas e perguntas mais frequentes / Esther Carrenho, Márcia Tassinari, Marcos Alberto Pinto. -- São Paulo : Carrenho Editorial, 2010. Bibliografia. ISBN 978-85-62492-04-4 1. Comportamento humano 2. Personalidade - Teoria 3. Psicoterapia centrada no cliente 4. Rogers, Carl R., 1902-1987 |. Tassinari, Márcia. Il. Pinto, Marcos Alberto. Ill. Título. 10-06897 CDD-150.198 Índices para catálogo sistemático: 1. Abordagem centrada na pessoa : Psicologia 150.198 É proibida a reprodução total ou parcial desta publicação sem autorização A vida de Carl Ramson Rogers (Esther Carrenho) Sumário As diferenças somam (Cassia Carrenho) Introdução (Esther Carrenho) ...... Sua família. Contexto religioso Teologia. iaussassesasaas sms Psicologia.. Primeiro emprego .. ' Universidade Estadual de Oni Os: Universidade de Chicago De volta a Wisconsin........... : nao pia de aceno pas curar Laolla, Califórnia: .....cserersarosnseraes seco is TERASESSREETEE Spina eai Desa setenvenõ os Linha do tempo........... Livros de Carl Rogers... eee Influência de Carl Rega na minha vida... A ACP no Brasil (Márcia Tassinari) ...........ssssssssiesesessntcines Comentários gerais sobre a pesquisa... Momento atual da ACP no Brasil........... Lista dos fóruns internacionais da ACP Lista dos encontros latino-americanos da ACP.. Lista dos encontros nordestinos da ACP .. Lista dos Fóruns Brasileiros da ACP. Ee Lista dos Fóruns Sudestinos da ACP .................. Lista dos Encontros do Norte da ACP... Lista dos Fóruns Paulistas da ACP Ss tnaae tus senao resussore somam Lista dos Encontros Mineiros da ACP... A aa Centrada na Pessoa e seus princípios (Marcos Alberto da Silva Pinto). . ceras aeedo a sara irrraçrrn aan Os princípios. ; ssa o naniacaveninca cias era ee canienateas escavar gerar 0] Tendência de atualização sreogando extensor perrarar zon esascuspes cesso Compreensão: EMpálica: ssa ssa real eauenaidô Congruência pssvensmegas enLa Consideração Incondicional Positiva. DR PRN PERDER 79 Algumas considerações importantes... BB A Abordagem Centrada na Pessoa e suas dimensões: Psicoterapia Breve e/ou Plantão Psicológico (Márcia Tassinari)...............95 A pessoa por trás do diagnóstico (Marcos Alberto da Silva Pinto) ......... 107 Grupos de Encontro (Marcos Alberto da Silva Pinto)......................... 117 Perguntas e Respostas... ss e rnros DT Como a ACP trabalha a ludoterapia? cemrereneme aerea aeee T2Q Qual a diferença entre psicoterapia, orientação e aconselhamento?....................... sore ui 3B Como a ACP trabalha com a “transferência”? E a “contratransferência"? . 134 O que fazer quando percebo que meu cliente não está crescendo? ................ creme T3O É possível usar gu técnica no atendimento em ACP?.. passava 148 Podemos encaminhar um cliente para atendimento DSIQUIáNICO ama. .scrroceresestnna had osaa san deb NA V8 ANA MONO HARI A NÓS DAR LADA DA HS RV 154 Qual é a fraqueza mais frequentes dos profissionais da ACP? ............... 157 A Abordagem Centrada na Pessoa e o uso da medicação.................... 160 É importante que o psicoterapeuta faça terapia? 163 Existe a “alta”, segundo a ACP?................ .169 Como lidar com o silêncio em Psicoterapia?.......... 17 Como se dá a supervisão em Psicoterapia na ACP?........ 175 Que é mais importante para o bom desempenho do psicoterapeuta da ACP ermtuseterrenera serao tresiaontesre PE O 179 Como a ACP trata as doenças mentais?............. cesmneçisssanna cerva aro 0O Dê exemplos de como se pratica a congruência..............iim 185 Que fazer quando um familiar liga para contar alguma coisa do meu CHENLS PE. crrnrnsraosaroierm nove nieeaicanrtora cre ersesateras seseasveratusveim cr rnerrenoguieaso esuoae BB Considerações finais .. E aterEaar aneis io ma ecos nran1OB OC AUÍOTOE cores ssmeprissas cncaaronrsentea ses eisotrsreree orientar neces TOR Sites e cursos indicados da ACP... RR AR 199 Bibliografia As diferenças somam Cassia Carrenho O primeiro contato que tive com a Abordagem Centrada na Pessoa foi há 15 anos, quando morava nos EUA e tinha aula de Introdução à Psicologia com um professor que conheceu Rogers pessoalmente. Esse professor marcou profundamente meus momentos na- quela sala, embora nem lembre mais seu nome. Logo no pri- meiro dia, pediu que deixássemos um papel na carteira dizendo alguma característica nossa e o nome. Eu escrevi que era brasi- leira. Na segunda aula, ao entrar na sala, ele virou-se para mim e disse: “Oi, Cassia! Eu já estive no Rio de Janeiro.” Ele fez isso com muitos outros alunos, numa classe de mais de cem! Durante todo o curso, ele me surpreendeu. Sua porta estava sempre aberta, era acessível e uma vez, ao ligar para seu escritó- rio, quando eu ia me identificar, ele disse: “Hi, Cassia” Minha segunda experiência foi na minha terapia. No total, já se vão seis anos de terapia e para mim foi fundamental expe- rimentar a “teoria” na prática e me desenvolver. Minha terceira experiência acontece agora, produzindo um livro sobre a Abordagem Centrada na Pessoa, ao mesmo tempo em que também ainda cursos de formação. Dentre eles destaca-se o Centro de Psicologia da Pessoa (CPP/R]), que oferece cur- sos de formação, desde 1976, para terapeutas individuais (de crianças, adolescentes e de adultos) e para a facilitação de grupos, quer em nível de psicoterapia de grupo ou de grupos vivenciais. O CPP continua atuante e está comple- tando 35 anos (em 2010). Em Petrópolis — RJ, o CEPEP fun- cionou por quase 15 anos, realizando cursos de formação e, desde o encerramento enquanto instituição, seus sócios-funda- S e g OU d O V V 47 É! A AC P no Br as il 48 dores continuam praticando e divulgando a abordagem, indivi- dualmente. Com referência à produção, por décadas, foi encontrado um maior volume de livros entre 80 e 89 (14), seguido da década de 70, com sete livros e somente dois livros desde 1993, sendo que o último foi publicado em 1994 e refere-se a seis artigos ori- ginais de Rogers, denominados “artigos seminais”, acompanha- dos por uma análise crítica de John Wood e seus colaboradores brasileiros (Grupo de Jaguariúna). Interessante notar que 15 dos 24 livros foram publicados no Sudeste do país, especialmente em São Paulo. Essa tendência não reflete integralmente a nossa realidade, pois foram encon- trados autores de outros estados publicando no Sul do Brasil. Por outro lado, os núcleos da abordagem são mais numerosos no eixo Rio-São Paulo, congregando profissionais que têm me- lhores oportunidades (via cursos formais e informais) de trans- formar suas reflexões em livros. As temáticas dos livros variam desde grupos, supervisão, psicoterapia, aprendizagem, teoria da personalidade e da moti- vação até comparações com a teoria freudiana. A maioria con- templa pelo menos um capítulo para a psicoterapia individual com adultos e raramente aparecem referências ao trabalho com crianças, família ou casal. Esses autores, além de explicitarem os conceitos básicos da Teoria Centrada no Cliente/Pessoa para a psicoterapia, legitimam a sua aplicação nos trabalhos por eles desenvolvidos, demonstrando que a proposta psicoterápica centrada no cliente/pessoa ajusta-se à realidade brasileira. Vale ressaltar que poucos autores destacam questões relativas ao con- texto sócio-político-cultural tão diferente das raízes do pensa- mento de Rogers. Esse fato é interessante, principalmente ao ser verificado que diversos trabalhos isolados apresentados nos Encontros Latino-Americanos contemplam essa questão. Foi realizada uma pesquisa junto à Livraria Martins Fontes Editora, principal editora responsável pela tradução e distri- buição das obras de Rogers no Brasil, a saber: Tornar-se pessoa (1972), Terapia centrada no cliente (1974), Grupos de encontro (1978), O tratamento clínico da criança-problema (1978), inclu- sive o livro de Natalie Rogers, 4 mulher emergente (1980). A editora informa que o ápice de venda se deu na década de 70 até meados dos anos 80. Naquela época (1996), embora com vendas mais reduzidas, o livro Tornar-se pessoa ainda era consi- derado o livro mais vendido das obras de Rogers. As entrevistas que serviram de material para a pesquisa reve- Jaram que os “precursores”, ao se identificar com os postulados básicos propostos nos escritos de Carl Rogers, apaixonaram-se por suas ideias. Interessante notar que a formação desses profis- sionais pode ser caracterizada como “autodidata”, pois só tive- ram contato pessoal com Rogers (quando tiveram), quando já estavam praticando a abordagem. Além disso, Rogers visitou o Brasil somente três vezes (1977, 1978 e 1985), o que permitiu um desenvolvimento autônomo da comunidade brasileira, bus- cando aplicar os conceitos básicos, com base em nossa realidade concreta de terceiro mundo/país em desenvolvimento. Encon- tramos uma profissional, Mariana Alvim, que talvez tenha sido a primeira brasileira a ter contato direto com Rogers, em 1945, quando foi fazer um curso sobre a entrevista não diretiva e trou- xe o novo método para o Brasil. Quase todos os entrevistados foram mais influenciados, no início, por experiências pessoais, isto é, a partir da participação em alguma vivência, sentiram-se profundamente “tocados” e identificados com os princípios norteadores da abordagem. Este “ritual de iniciação” tem se modificado, pois os atuais inician- tes têm tido oportunidade diversas dentro e fora das academias para estudar Rogers e participar da comunidade centrada. A presença de participantes brasileiros nos Fóruns Interna- cionais, nos Encontros Latinos e em outros eventos, bem como II Se Jg OU dO V V 49 A AC P no Br as il 50 a organização de eventos nacionais e internacionais, são fatores importantes no desenvolvimento da abordagem no Brasil. Os diversos trabalhos e artigos apresentados nesses eventos demons- tram o potencial de contribuição dos profissionais brasileiros. O material da pesquisa foi organizado em cinco partes, que se interligam, mas que apresentam suas especificidades: I. Influência geral da obra de Carl Rogers, incluindo a pro- dução escrita em forma de livros tanto de Carl Rogers quanto de autores estrangeiros. II. Núcleos de profissionais e boletins por eles veiculados. II. Eventos oferecidos ao público em geral, de caráter mais vivencial, e eventos profissionais, incluindo os cursos de forma- ção e sua produção escrita, através das monografias de conclu- são, trabalhos apresentados nos fóruns internacionais, Encon- tros Latino-Americanos e Fórum Brasileiro. IV. Material publicado por autores brasileiros: artigos de re- vistas nacionais especializadas ou jornais de grande circulação; teses de mestrado, doutorado e de livre docência e livros de au- tores brasileiros ou estrangeiros que escreveram a partir de suas experiências no Brasil. V. Depoimentos obtidos através de cartas e/ou entrevistas gravadas em áudio e vídeo, com profissionais de longa experién- cia, nossos “desbravadores” ou “precursores”. Momento atual da ACP no Brasil Sem dúvida, podemos perceber novo movimento de expansão da ACP em relação às regiões brasileiras, às academias, às pu- blicações e às ofertas de cursos de formação e/ou especialização. Parece-nos que a sociedade está mais receptiva à visão do ser humano como digno de confiança, ainda que alguns empreen- dimentos humanos pareçam ir na direção contrária. A própria Psicologia também tem se esforçado por oferecer modelos e compreensões que respondam de maneira mais efeti- va ao sofrimento humano. Nesse sentido, a consideração de que a resposta privilegiada do psicólogo era a psicoterapia individu- al, de longa duração, tem sido diretamente confrontada pelos praticantes da ACP em suas diversas formas de atuação, atra- vés de trabalhos com pequenos grupos (grupos de encontro), atendimento psicológico às famílias e casais, orientação a pais, trabalho em diversos contextos, além do consultório (hospital, delegacias, presídios, varas de família, escolas, comunidades, hospitais geral e psiquiátrico etc.). Nessa diversidade, destaca- mos as propostas do Plantão Psicológico, que serão apresentadas em outra parte deste livro. Interessante ressaltar que os eventos profissionais realizados no Brasil desde o I Encontro Latino-Americano (em 1983, em Pedro do Rio, RJ) têm utilizado os princípios norteadores da ACP para a organização do próprio evento. O Brasil já organi- zou cinco dos 15 Encontros Latinos-Americanos, oito fóruns brasileiros e, desde 1987, tem realizado os encontros nordesti- nos, cuja versão de 2010 será a XVII, em Teresina, Piauí. (Con- sultar as tabelas dos eventos, a seguir.) Alguns movimentos de criação de uma associação brasilei- ra têm sido ensaiados, sem ter alcançado um consenso na co- munidade, entretanto, os profissionais do Estado de São Paulo conseguiram formalizar a Associação Paulista da ACP, fundada em 27/11/2005 (“se constituindo como instância organizado- ra e apoiadora de eventos”), que realiza, desde então, eventos pequenos (jornadas, palestras) e grandes (Fórum Paulista, cuja terceira versão está anunciada para julho de 2010). Essa associa- ção mantêm um acervo considerável de trabalhos publicados, apresentados e manuscritos. Em Minas Gerais, com a revitalização do grupo mineiro que existe desde a década de 60, formalizaram em 2006 o CPHMi- li Is ei g ou do v V 51 | 4 A AC P no Br as il 52 nas (Centro de Psicologia Humanista de Minas Gerais), “visan- do promover o desenvolvimento pessoal e profissional de forma integrada e a melhoria na qualidade das relações interpessoais”. Ainda no Sudeste, encontramos nessa década o grupo do ARETE Instituto Brasileiro de Psicologia Centrada na Pessoa, de Vitória/ES, que tem organizado eventos locais e já recebe alunos para a sua segunda turma de formação de psicoterapeu- tas centrados na pessoa (curso de pós-graduação lato sensu). Em Recife, temos o Instituto Carl Rogers, fundado em 2006, fruto de “trabalhos desenvolvidos por um grupo de estudantes, nos anos de 2004 e 2005”. Nessa cidade, destaca-se o redirecio- namento das principais profissionais (Carmem Barreto e Iaracai Advíncula, ambas da UNICAP) para orientações teóricas mais existencialistas (Heidegger), deixando de frequentar e colaborar com a comunidade centrada (em termos de trabalhos e partici- pação nos eventos). A UNOESC, Universidade do Oeste de Santa Catarina, tem oferecido, desde 2008, curso de Especialização em Psi- cologia Clínica Humanista, com ênfase da ACP. No Sul, em Novo Hamurgo/RS, também encontramos oferta de curso de Especialização na Feevale Centro Universitário. No Ceará, conhecemos vários grupos de pesquisadores, a maioria professores da UNIFOR e da UFC, destacando-se a liderança do Professor Francisco Cavalcante Junior, que fundou em 2005 a Rede Lusófona de Estudos da Felicidade - RELUS, objetivando “congregar pesquisadores e estudantes, de países e regiões que falam Português (além do Brasil, Portugal, Mo- çambique, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Angola, Guiné- Bissau, Timor Leste, Goa, Macau, Galícia, entre outros), para promover estudos e práticas da felicidade aplicada à construção de uma cultura de sustentabilidade e bem-estar coletivos”. Ainda que o grupo seja composto por gente muito jovem (de idade e de prática na ACP, menos de cinco anos, com exceção do Professor Cavalcante), esse grupo se destaca (FONSECA, 1994). Outras instituições mais recentes também têm realizado esse trabalho de formação de psicoterapeutas, tais como: o Centro de Psicologia Humanista de Niterói/RJ], Espaço Vida (RJ), o DELPHOS Instituto de Psicologia (RS), o CPHB (Centro de Psicologia Humanista de Brasília), o recém-criado CPHMinas e o Espaço Viver, em Florianópolis/SC, assim como alguns pro- fissionais, de forma isolada, por todo o país. Atualmente, três redes eletrônicas permitem troca de infor- mações e ideias entre os praticantes, simpatizantes e interessa- dos na ACP. São elas: Rede Ibero Americana da ACP Disponível em: . Rede Brasileira da ACP Disponível em: . Rede Paulista da ACP Disponível em: . Lista dos Fóruns Internacionais da ACP Ano País Cidade 1982 México | Yautepec DU 1984 “Inglaterra | Nomwich LS. 1987 EUA LaJola Na aa “1989 "Brasil Toc | Paulo de Frontin Pa 1992 | Holanda n Terscheling LIA 1995 Grécia ' Leptokaria RI 1998 — AfricadoSul BonseroPark 2001 |Japão Ao 2004 ' Argentina : Mar del Plata, Chapadmalal “2007 | Espanha 2010 Rússia Zvenigorod, Moscou | | Mallorca, Calviã, Magalluf II SB Ig OU JO Y V 53 A AC P no Br as il > Lista dos Encontros Latino-Americanos da ACP Lista dos Fóruns Brasileiros da ACP 5 Ano País Cidade “ano | Estado Cidade 3 1983 Brasil | Petrópolis sa 1996 RiodeJaneiro Paulo de Frontin E Do m “1985 Argentina San Miguel del Monte | “997 | RioGrande do Sul Canela na 8 19860 Brasi Sapucaí Mirim [OT 1999 | Minas G sGerais Ouro Preto E! 1988 | Uruguay | La Pedrera INI “2001 * Goiás Pirenópolis bao y “1990 | Argentina | Mar del Plata a! “2003 | Pernambuco | Jaboatão dos s Guararapes 1992 | Bolívia | Huatajata o “2005. . “RioG Grande do Sul "Canela O 1994 Brasil Maragogi “2007 Rio de Janeiro Nova Friburgo Mono 1996 | México | Aguascalientes 2009 * Santa Catarina ) Florianópolis, Cachoeira de Bom Jesus 1999 | | Costa Rica San José o! zon Pará o — Belém 4 teor el 2000 Argentina | | La Falda qu TEC 2002 | Brasil pit | Estância iligromneralda seco! Lista dos Encontros Sudestinos da ACP a 2005 | Uruguay | Maldonado : 2006 Bolívia Cochabamba, Pihami Ê Ano Estado Cidade “2008 Colômbia Cartagena de Indias 1998 | RiodeJaneiro Petrópolis O 2010 | Brasil | ng * Ouro Preto ]] 2000 SãoPaulo Nat Natividade da Serra. ista dos Encontros do Norte da ACP Lista dos Encontros Nordestinos da ACP Lista do: : Ano Estado | Cidade Ano Estado Cidade 19 oe 8. Pará Salinópolis o 1987 Pernambuco | Gravatá 200 0 Pará Vigia aaa 1988 | Alagoas | Paripuera = DIC ICICICICIL EI E 4 S al . o parilbo jeeão ressoa = Lista dos Fóruns Paulistas da ACP 1991 Ceará | Caucaia Ano Estado Cidade 1992 Rio Grande do Norte Natas, Ponta Negra : | Ê 2006 São Paulo ' Vinhedo NE | CEA o 1995 Paraíba | João Pessoa, Praia de Tambaú — —— — sa R dro —— 1997 | Ceará | Beberibe, Praia das Fontes 2008 * São Paulo | q soro — 1998 | Alagoas Maragogi 2010 * São Paulo RES Sebastião, Praia de Cambury 1999 | Bahia | Valença nO 2000 | Pernambuco Ipojuca, Praia Ponta de Serrambi Lista dos Fóruns Mineiros da ACP 2001 Paraíba | João Pessoa, Praia de Tambaú Ano Estado Cidade 2002 Rio Grande do Norte | Natal, Praia da Redinha | 2009 Minas Gerais Santa Luzia 2003 | Maranhão ' São Luis FEITO 2006 | | Bahia | Salvador 2008 | Pernambuco Cabo de Sto Agostinho 2010 | Piauí | Terezinha ai A Abordagem Centrada na Pessoa e seus princípios Marcos Alberto da Silva Pinto “Se eu deixar de interferir nas pessoas, elas se encarregam de si mesmas. Se eu deixar de comandar as pessoas, elas se comportam por si mesmas. Se eu deixar de pregar as pessoas, elas se aperfeiçoam por si mesmas. Se eu deixar de me impor as pessoas, elas se tornam elas mesmas”. LAO-TSÉ (Citação de Carl Rogers, resumindo o princípio da Abordagem Centrada na Pessoa — 1977) Tive contato com a Abordagem Centrada na Pessoa em 1985, no meu primeiro ano de universidade, nas aulas do profes- sor Rodolfo Arqueles. Conheci através da experiência, senti a Abordagem Centrada na Pessoa em minha própria pele. Depois descobri a teoria. Durante as minhas aulas de psicologia geral, vivenciei a ACP em toda a sua intensidade; o meu professor não roubou a liberdade da classe e se colocou à disposição para aprendermos dentro dos nossos interesses. Isto no início me pa- receu um favor: dar a liberdade! Mais tarde, descobri através dessa própria abordagem que liberdade não se dá, apenas não se atira. Somos livres! Encontrei a Abordagem Centrada na Pessoa através do meu desespero em perceber como era difícil ser dono de mim mesmo em uma sala de aula. Senti medo, angústia, raiva, vontade de ter um professor autoritário, vontade de mu- dar de universidade, de chorar... Senti tantas vontades, até o momento que percebi que eu poderia aproveitar o fato de poder aprender tendo o professor como um facilitador do ensino e pude, a partir daí, olhar as minhas vontades em sala de aula. Minha vida nunca mais seria a mesma... Gosto de falar por mim e não pela Abordagem Centrada na Pessoa. Quero falar da minha visão dessa abordagem. Temos di- versas “Abordagens Centradas nas Pessoas”, temos várias visões so id jo uu d sn as a BO SS od eU B p e j u o S w s b e p i o g y y o o A Ab or da ge m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os dessa abordagem pelo mundo todo e em minha opinião não há como ser de outra forma. Quem é o dono da ACP afinal? Carl Rogers passou a vida abrindo mão desse título. Sabia ser o precursor dessa abordagem e tinha pavor que ela ficasse restrita ao que ele pensou, falou e escreveu. Rogers era antir- rogeriano. Não gostava do termo rogeriano, pois achava que resumia a ACP a ele e de alguma forma tirava das pessoas a responsabilidade de serem elas mesmas a partir dos princípios centrados na pessoa. Ele nos disse: Tenho medo que minhas hipóteses a respeito de facilitação de cresci- mento humano se transformem pelo fervor dos rogerianos em verdades estabelecidas, estáticas, em dogmas consagrados pela veneração à pessoa e percam o seu frescor original e o caráter hipotético que as mantém no âmbito do científico. Tenho medo que os rogerianos façam o mes- mo que os freudianos e os adlerianos e congelem o meu pensamento em outra ortodoxia que coloque freio a novas formulações (ROGERS, apud LAFARGADA, 2002). Rogers, ao longo da vida, relutou em aceitar ter o seu nome em diversos locais e eventos, pois não queria ser um mito. Que- ria ser e era apenas uma pessoa. y A Abordagem Centrada na Pessoa não tem dono e ao mesmo tempo é de todos nós que a pensamos e a vivemos e cabe a cada um de nós a responsabilidade de recriarmos essa abordagem através de nossas reflexões e atitudes e é esta a minha intenção na minha participação nesse livro. Gosto de uma Abordagem Centrada na Pessoa simples e sem rótulos. Gosto de poder exercer a minha liberdade em ser e em pensar e é nessa Abordagem Centrada na Pessoa que acredito e quero escrever aqui, através de todo tempo que dediquei de minha vida a ler, estudar, discutir, repensar e principalmente experienciar essa abordagem durante os meus 20 anos como psicoterapeuta € facilitador de grupos de encontro. Os Princípios A Abordagem Centrada na Pessoa vai além das psicoterapias, podendo ser utilizada em todas as relações de ajuda assim como nas relações humanas. É uma abordagem que se diferencia das demais, sobretudo por pão haver técnica. Acreditamos que a melhor maneira de se ajudar alguém é acreditar na condição natural da pessoa de pensar, sentir, buscar e se direcionar no caminho de suas pró- prias necessidades. É nessa visão que essa abordagem se apoia para tentar facilitar condições ideais à pessoa, para que ela possa entrar em contato consigo mesma para buscar o seu jeito de ser e suas próprias respostas. Pela visão centrada na pessoa, o outro precisa apenas de condições especiais para isto e 6 papel do psi- tcoterapeuta (educador etc.) é o de facilitar através de determina- da postura e alguns pressupostos básicos para que a pessoa possa buscar em si própria o seu caminho e as suas respostas. A minha intenção nesse capítulo é a de falar a respeito dessa postura e pressupostos, lembrando que não basta, no entanto, o psicoterapeuta assumir determinadas posturas e acreditar nesses pressupostos se, em sua aplicação, isto virar uma técnica. Um psicoterapeuta centrado na pessoa deve acima de tudo viver es- ses princípios, que falaremos adiante; caso contrário, estará ape- nas sendo um técnico e ferindo 6 imprescindível numa relação de ajuda centrada na pessoa, que é a autenticidade. A Abordagem Centrada na Pessoa parte do seguinte pressupos- to: “Todo organismo é movido por uma tendência inerente para ; desenvolver todas as suas potencialidades e para desenvolvê-las de maneira a favorecer o seu enriquecitnént” (ROGERS, 1959). s o i d i o u u d sn as a e O S S o d eu e p e m g u s o w e b e p i o g y wy A A b o r d a g e m C e n t r a d a na P e s s o a e se us pr in cí pi os É a partir desse pressuposto, que tem o nome de tendência de atualização, que existem alguns princípios que acreditamos serem facilitadores na relação de ajuda. Desejo no decorrer deste capítulo falar dessa tendência de atualização, assim como dos demais princípios facilitadores. Tendência de Atualização Toda pessoa possui uma capacidade ngtural de se autodirigir no sentido de buscar suprir as suas necessidades. Existe emgrodo organismo uma tendência natural de evolução, uma tendência. natural de atualização a todo o momento. Por diversos motivos, mas principalmente em função de va- lores externos, de alguma maneira, todas as pessoas são influen- ciadas por uma série de formas de ser impostas que fazem com que, muitas vezes, se distanciem daquilo que são ou sentem como o melhor para si. Mesmo assim, a tendência atualizante continua o seu ciclo, no intuito de nos levar adiante, mas em função de a pessoa estar dis- tante do seu jeito, acaba muitas vezes por caminhar de uma ma- neira distorcida daquilo que realmente seria o melhor pra si. Em uma entrevista concedida a revista Veja em 1977, Carl Rogers nos diz: Costumo exemplificar esse processo lembrando batatas que guardáva- mos no porão da nossa casa na fazenda. Elas criavam brotos porque havia uma janelinha no quarto. Era uma tentativa inútil, mas parte da tentativa do organismo de se satisfazer. Você consegue um produto muito diferente quando planta uma batata na terra, e comparo esse processo ao que pode ser encontrado em delinquentes e em pessoas que são tidas como doentes mentais: o modo como suas vidas se de- senvolveram pode ser muito bizarro, anormal; no entanto, tudo o que elas estão fazendo é Ama tentativa para crescer, para atualizar seus po- tenciais. O fato de essa tentativa causar maus resultados situa-se mais no meio ambiente do que na tendência básica do indivíduo. à pedra fundamental da psicologia humanista, pelo menos como egkyeio, é, portanto, essa crença de que o ser humano tem um organismo positiva. e construtivo (ROGERS, 1977). Quando são proporcionadas condições facilitadoras para que a pessoa se autodirija, ela tende a buscar uma harmonia interna e, em consequência, buscar uma maior harmonia com o seu meio. Dessa forma, em um ambiente de ajtrda, penso que a melhor aneira de se estar com o outro seja criar condições ideais para a facilitação desse processo em busca dessa autodireção. Pela minha visão, não há como se ter um meio termo em se tratando dessa abordagem. Ou eu creio no potencial da pessoa e busco facilitar condições para que ela se desenvolva por ela mes- ma ou eu não creio e se não acreditar provavelmente irei tentar orientá-la para determinado caminho a partir de um referencial externo e dessa forma, a meu ver, ainda que bem intencionado, a estarei manipulando para um caminho predeterminado pela so- ciedade ou por alguém ou pelas minhas próprias crenças pessoais. Esta já é uma grande diferença desta para outras abordagens. Na Abordagem Centrada na Pessoa, eu não visto uma capa ou uma máscara. Não “atuo”. Faço parte de uma relação verdadei- fa crendo de fato no potencial do outro: Se eu tiver medo do outro, do que o outro irá se tornar atra- vés da relação de ajuda, a meu ver fica impossível que eu busque ajudá-lo através dos princípios centrados na pessoa, pois, como eu disse anteriormente, nesse caso, provavelmente eu acabe es- perando do outro algum caminho que eu deseje que ele tome e, em minha visão, para que exista de fato uma relação de ajuda; a minha expectativa deverá ser apenas a de facilitar condições para que o outro se torne ele mesmo, seja do jeito que for. . eai eai so id jo uu d sn as à eo ss od eu e p e j u o S wo eb ep io gy y A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os “Se eu deixar de interferir nas pessoas, elas se encarregam de si mesmas. Se eu deixar de comandar as pessoas, elas se comportam por si mesmas. Se eu deixar de pregar as pessoas, elas se aperfeiçoam por si mesmas. Se eu deixar de me impor as pessoas, elas se tornam elas mesmas”. LAO-TSÉ ( Citação de Carl Rogers, resumindo o princípio da Abordagem Centrada na Pessoa — 1977) Fica impossível, em minha opinião, facilitar condições para que o outro seja ele mesmo caso tenha alguma dúvida ou medo de como o outro será dessa forma. Sinto por parte dos profissionais iniciantes que estudam a ACP uma grande preocupação nesse sentido e acho pertinente exemplificar essa questão com uma resposta do próprio Rogers na mesma entrevista à revista Veja em 1977, citada anterior- mente, dessa vez a respeito da possibilidade ou não de, ao enal- tecer a bondade nas pessoas, ele deixar de lado o maquiavelismo e o espírito de competição que naturalmente existe em nossa sociedade: Fui muitas vezes acusado de não compreender a maldade nas pessoas — e levo a sério esse tipo de crítica, isso pode até ser verdade. Mas che- guei a uma posição, não através de pensamentos passivos, mas através de meus contatos diretos com pessoas, tanto em terapia quanto em grupos, ou mesmo em salas de aula, nos quais percebi que, se con- fio plenamente em sua capacidade de se compreenderem melhor e ser mais autodirigidas, estas escolhem direções que são sociais e não an- tissociais, ou más. Dizem que, com esse tipo de terapia, o indivíduo pode muito bem ser um melhor ladrão ou um melhor assassino, e para mim esta é uma possibilidade bastante lógica. Mas, de acordo com minhas experiências, isso simplesmente não acontece. Se ofereço a uma pessoa a possibilidade de se expressar, de buscar suas próprias dire- ções, ela não escolhe ser um melhor ladrão ou coisa semelhante, mas procura seguir a direção de maior harmonia com seus companheiros (ROGERS, 1977). A partir desse exemplo, penso que seja interessante citarmos um dos grandes mitos da Abordagem Centrada na Pessoa que é a “bondade do homem”. A crença na tendência atualizante nada tem que ver com bondade ou maldade, que já são por si julgamentos. A tendên- cia atualizante também não é algo que existe apenas em de- terminados momentos ou dependendo do caminho escolhido pela pessoa. Já ouvi até mesmo de algumas pessoas envolvidas com essa abordagem que a tendência atualizante é algo que só existe quando a pessoa busca “caminhos positivos”. Como se essa ten- dência ficasse “adormecida” em determinado período de nossas vidas e que a falta dessa tendência acarretaria “escolhas ruins” e que o objetivo da relação de ajuda seria a de ativar essa tendên- cia na pessoa. Esta é uma visão totalmente distorcida, pois, em sua nature- za, a tendência à atualização não é boa nem ruim; o conceito de maldade ou bondade já é um julgamento em função dos aspec- tos sociais que vivemos e que variam de acordo com o meio e a cultura de que fazemos parte. Tendência atualizante é apenas o movimento natural em pro- gredirmos e esse movimento tem que ver com um conjunto de fatores como a nossa visão de mundo e as nossas perspectivas. É positiva apenas no sentido de que todo mundo busca o; melhor pra si. Estou convencido de que isto acontece o tempo todo em todas as pessoas e, se formos além, isto acontece em todos os seres vivos. Tenho uma planta em meu consultório e ela está sempre vol- so id io uu d sn as à eo ss ad eu e p e J u s o w e b e p i o g y v A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os tada para a direção da janela da sala de espera. Tenho o hábito de virá-la contra a janela de tempos em tempos, e naturalmente ela, em seu ritmo, volta-se novamente na direção da janela. Não sou agrônomo, botânico, biólogo nem sei explicar como esse fenômeno ocorre, embora saiba que, de alguma forma, aquela planta busca voltar-se para a direção que a mantém de forma mais viva. Durante a minha vida acadêmica, aprendi, infelizmente, na grande maioria das vezes, a não confiar na capacidade da pessoa de se autodirigir e percebo que isto acontece nas universidades de forma intensa até hoje. Quando sou convidado a falar da Abordagem Centrada na Pessoa, menciono a busca da pessoa em fazer aquilo que lhe parece melhor e normalmente muitos alunos e professores discordam da minha fala. Eu costumo per- guntar se eles buscam o melhor pra si e sempre ouço que sim. Tenho o hábito de dizer que aprendemos na universidade a nos acharmos superiores aos seres humanos que estão lá fora, pois acreditamos que apenas nós temos essa busca de viver melhor. Sempre desafio esses alunos e professores a perguntar para qual- quer pessoa, mesmo para aquelas que eles acreditam que não querem o melhor pra si, e tenho certeza de que eles ouvirão a mesma resposta: que essa pessoa também quer o melhor pra si e que tem agido sempre no sentido de encontrar a melhor saída dentre aquelas que a pessoa consegue enxergar nesse momento. Muitos estudiosos do comportamento humano, na tentativa de provar que as pessoas naturalmente não buscam o melhor pra si, tendem a usar exemplos de pessoas estigmatizadas, como aquelas que possuem algum diagnóstico psiquiátrico, por exem- plo, partindo do pressuposto de que essas pessoas não estariam buscando o melhor pra si por estarem naquelas condições. Se falarmos de loucura, por exemplo, Oswaldo di Loreto busca facilitar a compreensão dessa tendência de movimento nos dizendo: Vocês sabem que não é esta a visão que tenho da loucura. Bem ao con- trário, ela é uma forma de viver; guando a visão realística de si mesmo 4 da realidade tornar-seênsuportável resta a loucura, isto é, agijsão irre- alística. É a estratégia possível de sobrevivência. Numa frase: a loucura é a saída para as situações sem saída (DI LORETO, 1997). Podemos afirmar que um ladrão, quando tenta roubar, não tem tendência atualizante? Em minha forma de enxergar, a tendência atualizante é o que o movimenta ao roubo dentro da sua visão do que é melhor pra si naquele momento. A tendência atualizante acontece o tempo todo em mim e em você. Todas as nossas escolhas e saídas são tentativas de nos atualizarmos, de vivermos melhor. Segundo Rogers: Pouco importa que o estímulo venha de dentro ou de fora, pouco im- porta que o ambiente seja favorável ou desfavorável. Em qualquer des- sas condições, os comportamentos de um organismo estarão voltados para a sua manutenção, seu crescimento e sua reprodução. Esta é a própria natureza do processo que chamamos de vida. Essa tendência está em ação em todas as ocasiões. Na verdade, somente a presença ou ausência desse processo direcional total permite-nos dizer se um dado está vivo ou morto (ROGERS, 1983). Uma vez, entre as discordâncias de sempre, perguntei em uma palestra se alguém ali não buscava o melhor para si e pela primeira e única vez até hoje um estudante levantou a mão e contou à sala que em um período de sua vida acreditava não ter buscado o melhor pra si por ter escolhido usar drogas. Eu perguntei se ele podia nos contar o motivo e ele me respondeu que naquele período estava vivendo um momento de vida tão ruim que se ocupava das drogas para fugir da sua realidade, pois não encontrava outra saída pra viver naquele momento. Às pró- prias pessoas da sala o interromperam dizendo que então ele so id io uu d sn es a EO SS ed eu e p e u u o o u e b e p i o g y y A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os estava, dentro do seu desespero, através das drogas, buscando aquilo que julgava ser uma saída para aquele momento, ou seja, buscava o melhor pra si dentro das possibilidades que conseguia encontrar naquele período de vida. Talvez eu esteja sendo repetitivo, pois sinto necessidade de dirimir essa confusão a respeito de tendência atualizante e bon- dade. Essa tendência de movimento pode ser considerada algo bom apenas se enxergarmos como sendo algo positivo o simples fato de estarmos em movimento. Não há bondade ou malda- de nisto. Há apenas o movimento no intuito de encontrarmos saídas melhores dentro das situações que vivemos a todo mo- mento. Já que buscamos melhores saídas a todo momento, acredita- mos dentro da visão centrada na pessoa que, sob ambiente faci- litador, teremos maiores condições de prestar mais atenção em nossa vida e dessa forma provavelmente teremos a oportunidade de repensarmos uma série de coisas em nós, nos outros e na vida, o que pode nos possibilitar o encontro de novas saídas que sejam mais saudáveis, do ponto de vista do que é mais saudável para a própria pessoa. A partir daí, a ACP propõe princípios e posturas que podem funcionar em um ambiente de ajuda como facilitadores desse processo de crescimento. Falarei agora destes princípios. Compreensão Empática Basicamente, compreensão empática é a capacidade do psico- terapeuta em se colocar no lugar do outro sempre, olhande; a pessoa através do seu olhar, buscafido se aproximar ao máximo da forma como a pessoa enxerga ou se sente a partir do seu con- texto, sem, no entanto, sentir-se o outro. É um “como se” sem ser, ou seja, dentro da visão da Abordagem Centrada na Pessoa, é de fundamental importância que o psicoterapeuta tenha a ca- pacidade verdadeira de se colocar na pele do outro. Através da minha própria experiência, aprendi que gsse mq- pimento facilita no psicoterapeuta a possibilidade de despir-ses ppaquele instante dos seus próprios valores e julgamentos, para ppoder estar de corpo e alma com o outro em sua visão de mun- Wo, seus sentimentos e verdades. Citando Rogers: “Estar com o outro desta maneira significa deixar de lado, neste mo- mento, nossos próprios pontos de vista e valores, para entrar no mundo do outro sem preconceitos. Num certo sentido, significa por de lado nosso próprio eu, o que pode ser feito apenas por uma pessoa que esteja suficientemente segura que não se perderá no mundo possivelmente estranho ou bizarro do outro e que poderá voltar sem dificuldades ao seu próprio mundo quando assim desejar” (ROGERS, 1977). Na tentativa de conseguir me expressar melhor, penso ser útil um exemplo: vamos supor que a pessoa que busca ajuda tenha determinada religião que enxergue a importância de não se envolver sexualmente com outra pessoa antes do casamento e que ela esteja se sentindo culpada por ter mantido uma relação sexual de forma diferente dos padrões de sua crença. Supondo que o psicoterapeuta tenha valores diferentes dessa pessoa, caso ele não consiga verdadeiramente ser empático com cela, terá di- ficuldades de compreender a culpa dessa pessoa, pois estará le- vando em conta a sua visão a respeito do tema e não o contexto da própria pessoa. Naturalmente, ainda que bem intencionado, o psicotera- peuta, sem conseguir ser empático, terá grande tendência de manipular o outro a partir da sua visão de mundo, na tentativa de ajudar a pessoa a se livrar da sua culpa. Na minha opinião, é pouco provável que exista alguma ajuda em uma relação onde o psicoterapeuta, ainda que de forma ingênua e bem intencio- so id io uu d sn as a B O S S A EU P P e J u o S W e b e p i o g y v A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os nada, busque compreender o outro empaticamente levando em conta os seus próprios valores. Já ouvi alguns profissionais dizerem que na tentativa de ajudar o cliente, sem conseguir ter uma compreensão empática verda-, deira, buscam apenas demonstrar essa compreensão, sem, no en-; tanto senti-la de forma real, pois acreditam que, assim, essa “si- mulação” causará no cliente a satisfação de ser compreendido. Em minha opinião, essa postura nada tem que ver com a princípio de empatia dentro da visão centrada na pessoa, pois caso eu simule essa compreensão, estarei me utilizando desse princípio como uma “técnica de me colocar no lugar do outro”. Para mim, quando falamos de Abordagem Centrada na Pessoa, estamos falando de uma relação verdadeira entre duas pessoas, e se eu apenas “simulo” essa compreensão, essa relação verdadeira se perde, tornando-se algo meramente técnico. Quando consigo ter de fato a compreensão empática, natu- ralmente coloco os meus valores de lado para estar focado no. mundo interior do outro, livre dos meus conceitos, preconcei- tos, valores e crenças pessoais. É nessa pessoa, única, diferente de mim e de todas as outras, que eu consigo me sintonizar, compreendendo-a a partir dela, para e com ela. Sinto que sendo verdadeiramente empático, de alguma for- ma facilito condições para que a pessoa também possa se con- sultar em seus sentimentos e em sua genuinidade. Sentindo-se compreendida, provavelmente ela sinta-se livre para “colocar-se em sua própria pele” e isto talvez facilite nela a percepção de uma tendência em si para buscar essa mesma capacidade para a compreensão no outro em suas relações. A este respeito, Marina Pacheco Jordão afirma: Sendo a empatia uma tendência e, portanto, comum ao ser humano, ele também é um atributo do cliente a ser levado em conta e a ser de- senvolvido na relação. Um cliente no final da sua terapia provavelmen- te estará com a sua atitude empática mais desenvolvida. Ele terá mais capacidade de se colocar no lugar do outro, sem se perder. Portanto, podemos afirmar que a empatia pode ser desenvolvida e pode ser con- siderada como um padrão de crescimento (JORDÃO, 1987). Ao mesmo tempo em que é imprescindível a capacidade des- sa compreensão empática por parte do psicoterapeuta, entendo que por ser uma relação, quando estamos sintonizados de fato com a pessoa do cliente, essa compreensão torna-se algo natural e de mão dupla, ou seja, não há mais apenas uma compreen- são empática por parte do psicoterapeuta, há algo muito maior, uma facilitação na compreensão do fenômeno da empatia. A capacidade de haver de fato um encontro, uma ligação de senti- mentos entre psicoterapeuta e cliente. Um bom exemplo desse fenômeno é relatado por um clien- te de Rogers: “Éramos nós dois, trabalhando juntos na minha situação como se fosse só eu” (ROGERS apud WOOD,1994). Falando a respeito desse tema, John Wood nos diz: A compreensão empática, em outras palavras, é um estado de consci- ência no qual uma pessoa experiencia e participa de um fluxo de pen- samentos e sentimentos e seus significados com outra pessoa, enquanto ao mesmo tempo também está consciente do conceito maior dentro do qual os dois existem (WOOD, 1994). Mais do que estar aberto à experiência do outro, a compre- ensão empática significa estar aberto a essa experiência junto com o outro, fazendo parte do mundo do outro, caminhando os passos do outro, estando conectado a esse mundo de forma natural, verdadeira e intensa. Citando novamente John Wood: Na psicoterapia, não basta simplesmente tentar compreender o mundo do outro, nem mesmo sentir alguma coisa que o cliente esteja sen- so id io uu d sn as a BO SS oA EU B P R J U S D U o b e p J o d y y A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os tindo (e certamente não é suficiente enxugar as lágrimas em atitude de “apoio”). O cliente deve também experienciar ser compreendido (WOOD, 1994). Acredito que a compreensão empática, quando existente na relação de ajuda, seja algo curador, revolucionário. Sentir-se compreendido é, de alguma forma, perceber-se vivo no mais amplo sentido da palavra. É sentir que há ressonância naquilo que se exprime e que há alguém que naquele momento está junto. É a possibilidade de sentir-se acompanhado em seus sentimentos e verdades muitas vezes escondidas em função de medos, angústias e padrões condenados por si mesmo ou pelo mundo exterior. É a possibilidade de perceber que alguém realmente tem in- teresse genuíno por suas histórias, seus sentimentos, suas dif- culdades ou seu silêncio. É alguém que simplesmente confia e acompanha os passos, com interesse genuíno, sem interesse em apressar ou retardar o processo. Como diz Rogers, “passamos a ser um companheiro confian- te dessa pessoa em seu mundo interior” (ROGERS, 1977). Sendo ouvida e verdadeiramente compreendida, talvez a pes- soa também se ouça e se compreenda e, nesse instante, muitas coisas estarão acontecendo com ela em seu processo de cresci- mento e é isto o que importa. Congruência À Abordagem Centrada na Pessoa não nasceu pronta, ela foi se construindo aos poucos a partir das percepções e discordâncias de Carl Rogers pelos modelos de atendi- mentos que existiam. Nossa abordagem não está pronta, está em contínuo processo de atualização. Se estivesse parada em si mesma, de alguma forma estaria se negando e negando a visão de tendência atualizante, imprescindível para o embasamento da ACP. Em uma das diversas entrevistas em que Rogers (1983) se deixou filmar, ele conta que certa vez atendeu uma pessoa que falava em voz monótona e que embora sentisse interesse e se esforçasse para ouvi-la, ele sentia dificuldade em estar com ela de forma inteira em função do seu tom de voz. À partir do seu incômodo, após relutar bastante, Rogers resolver expressar à pessoa que não sentia nenhum orgulho no que iria falar a ela, mas que ele estava com dificuldades em ouvi-la, pois embora o conteúdo de sua fala parecesse interessante, a forma como ela se expressava o deixava cansado. Ele cita que no início a pessoa ficou chocada com o que foi dito e que discutiram um pouco a respeito do assunto. Em determinado momento, o cliente disse: “Acho que descobri o motivo da minha fala monótona. Acho que ao longo da minha vida eu nunca tive a expectativa real de ser verdadeiramente ouvido.” Assim nasceu a congruência como princípio facilitador. Rogers nos diz: Descobriu-se que a transformação pessoal é facilitada quando o psi- coterapeuta é aquilo que é, quando as suas relações com o cliente são autênticas e sem máscaras nem fachada, exprimindo abertamente os sentimentos e as atitudes que nesse momento ocorrem. Utilizamos o termo congruência para tentar descrever essa condição. Com esse termo, procura-se significar que os sentimentos que o terapeuta estiver experienciando são válidos para ele, válidos para a sua consciência e ele pode viver esses sentimentos, assumi-los e pode comunicá-los se for o caso. Ninguém realiza plenamente essa condição e, portan- to, quanto mais o terapeuta souber ouvir e aceitar o que se passa em si mesmo, quanto mais ele for capaz de assumir a complexidade dos seus sentimentos, sem receio, maior será o seu grau de congruência (ROGERS, 1961). so id jo uu d sn as é eo ss od eu e p e j u s o w e b e p i o g y y A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os Ele percebeu que não era apenas importante compreender o outro, mas sim ter a capacidade de expressar-se de forma verda- deira nessa relação. [Congruência significa a capacidade do psi- coterapeuta em ser autêntico em relação aos seus sentimentos no que diz respeito à pessoa que está buscando ajuda. | É importante que tudo que o psicoterapeuta sinta em rela- ção à pessoa seja dito, de maneira cuidadosa, porém genuína. É direito da pessoa que está buscando ajuda saber o que a psicote-. rapeuta sente a respeito do que ela está expressando. Em uma relação de ajuda, onde a base é a confiança e a ver- dade, em minha opinião, não ajuda esconder do cliente senti- mentos que estejam emergindo no psicoterapeuta a respeito da pessoa do cliente. É importante que o psicoterapeuta diga o que. sente, deixando claro, no entanto, que esta é apenas a sua per- cepção e não a verdade absoluta ou uma verdade inconsciente do outro. Pelo fato de o psicoterapeuta estar vivo e ativo escutando o outro, é natural que ele sinta diversas coisas com relação a essa pessoa. Para a Abordagem Centrada na Pessoa, o outro merece saber o que se passa dentro do psicoterapeuta com relação a ela enquanto a ouve. Rogers (1983) definia a sua forma de ser congruente, dizendo que costumava expressar ao outro os seus sentimentos quando estes lhe eram sentimentos persistentes. Ele dizia que quando sentia algo apenas por um instante, não se preocupava em tentar guardar ou lembrar, mas que se esse sentimento fosse persistente ele não hesitava em compartilhar com o seu cliente. Em minha opinião, se eu busco estar com a pessoa do cliente de forma inteira, e se estou sentindo algo a respeito dessa pessoa, fica óbvia a importância de compartilhar com ela o que está se passando em mim com relação a ela. Pela minha forma de en- xergar a congruência dentro da Abordagem Centrada na Pessoa, é necessário que eu me esvazie dos sentimentos que tenho com relação à pessoa no ambiente psicoterápico para poder nova- mente estar com ela de forma inteira. Caso eu fique guardando sentimentos enquanto eu a atendo, naturalmente irei me preen- cher de pensamentos a respeito do que ela me disse e me ocu- parei disto me distanciando dela que está ali comigo. Costumo dizer que se eu ficar remoendo os meus sentimentos enquanto atendo uma pessoa, mesmo que esses sentimentos tenham a ver com ela ou com a psicoterapia, essa pessoa sem saber não pas- sará de uma boca em movimento na minha frente, pois eu não estarei mais com ela. Estarei perdido em meus pensamentos. Quando eu sinto a coragem e a confiança em me mostrar congruente nessa relação, ganho condições de me esvaziar da- quilo de que eu estava me ocupando e voltar a estar genuina- mente com ela. Outra grande questão da congruência, a meu ver, é que se es- tou verdadeiramente buscando uma sintonia e ouvindo a pessoa de forma inteira e intensa, por estar tentando me colocar na sua pele, sem ser ela, provavelmente algumas de minhas percepções poderão ajudá-la em seus sentimentos, reflexões e percepções de si mesma. A congruência nos leva certamente a um novo nível na re- lação de ajuda e muitas vezes na tentativa de não perdermos o “controle” do atendimento, nos escondemos atrás de explicações teóricas de outras abordagens para justificar a nossa omissão em não dizer algo para o outro. Por diversas vezes, supervisionando outros profissionais, ouvi coisas do tipo: “Acho que ele ainda não está preparado para ou- vir o que eu senti ou sinto por ele com relação à determinada história” O que sempre me ocorre nessas situações é: como é possível saber se a pessoa está ou não preparada para ouvir o que eu tenho pra dizer se eu não disse? Se confiamos verdadeiramente no potencial da pessoa, como eu posso decidir por ela o que ela aguenta ou não ouvir? s o i d i o u u d sn as & O S S O eU B p e J u o o w e b e p i o g y y A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os Não estarei, nesse momento, ainda que de forma disfarçada, acreditando que sei mais do outro do que ele mesmo e que eu sei qual é o momento exato em que algo deve ser dito? Uma das grandes questões da congruência, a meu ver, é que o psicoterapeuta, ao ser congruente, perde o controle do am- biente psicoterápico, ou seja, se o profissional quiser manter o controle desse ambiente, não há possibilidade de ser congruen-. te, pois a partir do momento em que eu me expresso em meus. sentimentos de forma genuína com relação ao outro, esse senti- mento já não mais me pertence. Já é do outro também e ele fará o que quiser com isto. No exemplo já citado, contado por Rogers na descoberta da importância da congruência na psicoterapia, a pessoa poderia, ao invés de ter tido uma percepção de si mesma, ter ficado brava, ter ido embora ou ter julgado Rogers um péssimo profissional. Numa relação de ajuda em que o psicoterapeuta assume os seus sentimentos como seus, além de não roubar do outro o direito de pensar a respeito, a tendência é que o outro assuma os seus sentimentos também, livre de ameaças, apoiado na aceita- ção, na autenticidade e no acolhimento. Uma vez, uma colega de profissão me contou que viu ou- | tra profissional dar um abraço caloroso de despedida na sua | cliente e que assim que essa cliente virou de costas, a profissio- | nal mostrou a língua e fez uma expressão de que não aguentava ' mais olhar para a cara dela. A minha colega profissional assis- tiu a essa cena sem querer, sem que a profissional que teve essa atitude percebesse que havia sido assistida por uma terceira pessoa. Sinto apreço em me colocar no lugar das pessoas e, em- bora infelizmente eu nem sempre consiga fazer isto em minha vida como um todo, tenho certa facilidade em fazer isto em meus atendimentos. Nessa situação que acabei de mencionar, pergunto-me, se eu fosse cliente dessa pessoa, se eu preferiria ser abraçado calorosamente de mentira ou se preferiria que ela me falasse o quão cansada está em me atender? Óbvio que eu iria preferir a segunda opção. Gostaria de saber o que de fato ela sente a meu respeito. Não me interessaria ser abraçado, ainda que de for- ma calorosa, sem que esse abraço fosse genuíno. Mesmo que a psicoterapeuta fosse rude comigo e falasse o seu sentimento real com relação a mim sem nenhum cuidado, ainda assim eu preferiria saber o seu sentimento verdadeiro. Voltando ao fato de gostar de me colocar na pele do outro: Será que só eu gostaria que isto acontecesse? Será que o cliente iria preferir ser abraçado de mentirinha pela sua psicoterapeuta com um abraço “técnico”? Há alguns anos, ministro cursos de curta duração de Intro- dução à Abordagem Centrada na Pessoa em meu consultório e sempre faço questão de contar essa história e até hoje todas as pessoas me falaram que prefeririam saber o sentimento real da psicoterapeuta, ainda que fosse dito de forma totalmente inadequada. Penso que quando eu acredito que eu aguento a verdade e o meu cliente não, estou novamente colocando-o um degrau abaixo de mim. Estou subjugando a pessoa. Já disse anteriormente, mas quero me aprofundar um pouco mais nessa questão: congruência significa a capacidade do psico- terapeuta em ser genuíno com a pessoa do cliente, levando em conta os seus sentimentos e suas percepções para que ele possa tentar contribuir com uma possível reflexão do cliente a respeito de si mesmo para quem sabe colaborar com o crescimento da pessoa. Serve também para que o profissional possa se esvaziar desses sentimentos para conseguir voltar a estar atento de forma inteira nessa relação. s o i d i o u u d sn es a EO SS od eu e p e u u o 9 w s b e p i o q y v 7 A A b o r d a g e m C e n t r a d a na P e s s o a e se us pr in cí pi os É muito importante lembrarmos que existem muitas formas de se dizer algo a alguém e que em minha opinião ser con- gruente significa falar à pessoa de forma cuidadosa e respeitosa, deixando claro que essa fala não é uma verdade absoluta, mas apenas a minha expressão a respeito da minha percepção e que a pessoa é livre pra fazer o que quiser com isto. É muito comum confundirmos congruência com “fa- lar qualquer coisa” ou falar de forma mal educada ou desres- peitosa./ Quando falamos dos princípios centrados na pessoa, não estamos falando de princípios que se contradizem, mas sim de princípios que se complementam, ;jÀ congruência sozi- nha talvez me iluda a acreditar que é Mostane que eu diga ao outro de qualquer forma aquilo que se passa dentro de mim. Já vi muitas vezes, em grupos ou fóruns da ACP, profissionais experientes se valerem da congruência para justificarem atitudes desrespeitosas ou intempestivas. À forma como eu compreendo os princípios da Abordagem Centrada na Pessoa como comple- mentares me faz acreditar que se, de fato, tiver uma compre- ensão empática do outro, será pouco provável que eu, ao ser congruente, seja ofensivo ou desrespeitoso, pois estarei com ele dentro de sua visão de mundo e isto me facilitaria a ter cuidado em me expressar, seja lá o que eu tenha a necessidade de dizer a ele. John Wood comenta: Ser genuíno tem a ver com honestidade e pureza. Junte-os. Um sen- timento puro é percebido em meio à complexidade de sensações que constituem uma consciência e é expresso de modo direto e honesto, sem autocensura, mas ainda assim de maneira apropriada: congru- ência. Pode parecer simples, mas não é sempre tão óbvio quanto se manifesta. Facilitações de encontros em pequenos grupos são parti- cularmente susceptíveis a confusão entre congruência e impulsividade (WOOD, 1994). Paradoxalmente, para que eu possa estar com o outro é im- portante que eu esteja também comigo. Dentro da visão centra- da na pessoa, é importante que eu leve em conta os meus senti- mentos e eu creio poder facilitar essa relação, prestando atenção em mim através dos meus sentimentos e percepções naquilo que tem a ver com o momento da relação de ajuda, de alguma forma me ajudará a construir a relação com o outro. Para terminar, pelo menos por agora, a minha visão a respei- to de congruência, eu gostaria de citar Maria Bowen falando a respeito do assunto: Quando nós somos congruentes conosco mesmos, nossas necessida- des, nossos desejos e nosso curso de ação são uma coisa só. Seguimos dúvidas. A energia do momento flui suavemente, levando-nos na direção a que nossa trilha naturalmente nos conduz (BOWEN, 1987). o caminho do coração sem sermos assaltados por conflitos e Consideração Incondicional Positiva Refúgio Quando todos parecem conspirar contra você, quando o mundo parece desabar ao seu redor, haverá ainda um lugar aonde ir. Lá você pode sentir e chorar e falar da dor e esvaziar o peito cheio de mágoa. Lá é trégua de guerra, é refúgio tranquilo, é porto seguro. Vem e ancora aqui seu coração. (Clara Feldman de Miranda) = « » Em um mundo repleto de padrões, julgamentos, de “certos e “errados”, sinto o quanto é difícil termos a capacidade genuína so id io uu d sn as a p O s S o d eu e p e j g u a S W w e b e p i o g y w = o A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os de considerarmos o outro independente do que a pessoa pense, seja ou faça. Consideração incondicional positiva nada mais é do que a tentativa de resgatarmos em nós, psicoterapeutas, essa ca- pacidade. A capacidade de considerar o outro, de aceitá-lo den- tro dos seus sentimentos, pensamentos e atitudes, independente de quais sejam. É evidente que aceitar o outro não significa con- cordar. É muito fácil aceitarmos o outro quando concordamos. O grande desafio, a meu ver, na relação de ajuda, é aceitarmos a pessoa quando não concordamos com ela, quando os seus pensamentos e atitudes são opostos aos que temos. Aceitar o. outro incondicionalmente, para mim, é termos a capacidade de enxergarmos essa pessoa como única, é ter a certeza de que as verdades são relativas e que as minhas verdades servem apenas a mim. É ter a convicção que não me serve, na relação de ajuda, acreditar nos padrões sociais ou morais como verdades univer- sais. É ter a capacidade de crer no outro ainda que ninguém creia. É ter a confiança nessa pessoa que busca ajuda, ainda que ninguém confie. É ter a chance de me despir dos meus conceitos e preconceitos para estar com ela. Confiar nessa pessoa a partir de suas próprias experiências. Aceitá-la, desprendendo-me das “verdades aprendidas”. Crer na pessoa a partir de suas próprias experiências. Nada substitui a própria experiência. Segundo Rogers: A experiência é, para mim, a suprema autoridade. A minha própria experiência é a pedra de toque de toda validade. Nenhuma ideia de qualquer pessoa, nem nenhuma de minhas próprias ideias, tem a au- toridade que reveste a minha experiência. É sempre a experiência que eu regresso, para me aproximar cada vez da verdade, no processo de descobri-la em mim. Nem a bíblia, nem os profetas — nem Freud, nem a investigação — nem as revelações de Deus ou dos homens — podem ganhar precedência relativamente a minha própria experiência direta (ROGERS, 1961). De nada me adianta ser apenas empático se eu não tiver a capacidade de considerar essa pessoa e suas experiência de for- ma incondicional. De nada me adianta ser congruente, se da mesma forma não considerar essa pessoa em toda sua comple- xidade. Congruência, sem a capacidade de ter uma considera- ção incondicional positiva, certamente me faria expressar o que sinto ou minhas percepções de forma descuidada ou a partir de determinado ponto de vista que não seja o da própria pessoa, me faria cair no golpe das verdades absolutas. Aceitar a pessoa a partir de suas próprias experiências é a capacidade de “estar”, sem julgamentos. É estar de forma inteira e ativa. Aceitar de maneira positiva, entendendo que a pessoa, da sua forma e a partir de suas experiências, está procurando encontrar as suas próprias saídas dentro das condições que consegue enxergar na- quele momento. Rogers nos diz a este respeito: Quando o terapeuta está experienciando uma atitude calorosa, positiva e de aceitação para com aquilo que está no seu cliente, isto facilita a mudança. Isto implica que o terapeuta esteja realmente pronto a acei- tar o cliente, seja o que for que esteja sentindo no momento — medo, confusão, desgosto, orgulho, cólera, ódio, amor, coragem, admiração. Isto quer dizer que o terapeuta se preocupa com o seu cliente de uma forma não possessiva, que o aprecia mais na sua totalidade do que de uma forma condicional, que não se contenta com aceitar simplesmente o seu cliente quando este segue determinados caminhos e desaprová-lo quando segue outros (ROGERS, 1961). Se o psicoterapeuta acredita de fato na tendência atualizante, fica mais fácil aceitar o outro, mesmo não entendendo ou não concordando. É importante que o psicoterapeuta tenha claro em si o que é seu e o que é do outro, pois mesmo que pense ou sinta de for- ma diferente, terá maiores condições de respeitar o sentimento so id jo uu d sn as a eo ss ad eu ep eJ ju so w e b e p i o g y y A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os ou a atitude da pessoa. Ou o psicoterapeuta tem a capacidade de considerar e aceitar a pessoa verdadeiramente e é possível manter a relação de ajuda ou, na minha forma de enxergar, não haverá relação de ajuda. A partir da aceitação e do acolhimento, a tendência é que a pessoa sinta maior confiança para ser ela mesma em seus senti- mentos, confusões e dificuldades para se perceber e a se autodi- rigir para o seu caminho. — À sensação que tenho é que se a pessoa percebe que o psi coterapeuta “aguenta” aquilo que ela tem de “pior”, segundo a sua própria visão, talvez ela consiga se aproximar de uma forma mais inteira nos seus próprios sentimentos e a partir disto tam- bém encontrar alternativas para aceitar-se. Muitas vezes, ouço de psicoterapeutas que tem como refe- rencial outras abordagens ou de psicoterapeutas iniciantes a res- peito do medo de facilitar condições para que a pessoa se torne ela mesma, como se dentro dessa pessoa houvesse uma “fera a ser domada” e que não impor à pessoa determinados padrões a deixaria solta e isto poderia se tornar perigoso para ela mesma e para o meio em que vive. Para mim, se tenho confiança de fato no outro, tenho a con- vicção de que essa pessoa, em um ambiente facilitador, podendo ser ela mesma de forma inteira, sentindo-se aceita e aceitando-se em sua complexidade, terá maiores condições de reavaliar-se em seus sentimentos, percepções e atitudes para buscar em si novas formas, se for o caso, de estar consigo mesma e com o outro. À este respeito, Marina Pacheco Jordão afirma: À atitude de consideração positiva incondicional do terapeuta para com o cliente poderá resgatar sua autoestima e, posteriormente, reavivar o exercício de sua liberdade experiencial tão massacrada ou postulada por diversos valores externos a si mesmo. O exercício dessa liberdade na relação terapeuta-cliente tende, também, a restabelecer a adequação de seu contato com o mundo externo, no sentido da re-atualização de sua experiência interna. Através da consideração positiva do terapeuta, o cliente começa a ter consideração para consigo mesmo, voltando a ter fé no seu processo, movido pela energia de sua própria vivência experiencial (JORDÃO, 1987). Quero finalizar esse assunto citando Sérgio Gobbi, falando a respeito dessa confiança na pessoa e na capacidade de consi- derá-la de forma incondicional e positiva: É uma atitude desprovida de categorização ética ou moral, não impli- cando aprovação ou desaprovação de comportamento, mas a conside- ração de sua potencialidade e de suas perspectivas. É a prova de Rogers na crença da natureza humana (GOBBI, 2002). Algumas considerações importantes Pretendo fazer algumas considerações para tentar dirimir possí- veis dúvidas a respeito dos princípios citados acima, assim como sua utilização na prática psicoterápica. Costumo dizer, nos cursos que ministro, quando falamos desses princípios, que, na Abordagem Centrada na Pessoa, sem- pre há uma saída. Existe um mito, que acredito que tenha surgido a partir da falta de informação dos professores universitários que não simpatizam ou desconhecem essa abordagem, que ela não tem condições de lidar com determinado tipo de pessoas ou proble- mas, e que ela ficaria restrita a ajuda de pessoas com “problemas leves” ou “superficiais”. Em primeiro lugar, gostaria de questionar o que significa “pro- blemas leves ou superficiais”? Quem determina qual a gravi- dade de um sentimento ou sofrimento? Como se mensura isto? Parece-me que a Abordagem Centrada na Pessoa sofre ainda s o i d i o u u d sn as é p o s s e eU E P e J u o S u w o b e p i o g y A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os grande resistência por parte de vários profissionais, principal- mente por desmistificar o papel do psicoterapeuta, abrindo mão do poder e do saber e devolvendo ao cliente o poder e a liberda- de a respeito da direção de sua própria vida. Cabe ao psicotera- peuta ser um facilitador do processo e não o detentor do poder desse processo da pessoa que busca ajuda. A Abordagem Centrada na Pessoa não se dispõe a ser a ver- dade absoluta. Rogers, precursor dessa abordagem, sempre teve o cuidado de exprimir as suas ideias como hipóteses de trabalho (ROGERS, 1961), tendo grande receio de que os seus pres- supostos se tornassem dogmas. Assumia os seus pensamentos como seus e renovou-se ao longo de sua vida. Tinha grande pa- vor de que a Abordagem Centrada na Pessoa fosse engessada em seus pensamentos, pois a enxergava como um meio e não um fim. Tinha a esperança que essa abordagem fosse repensada o tempo todo. Todos nós somos responsáveis pela Abordagem Centrada na Pessoa. Quando discutimos, escrevemos, pensamos, ensinamos ou aprendemos essa abordagem, na verdade a estamos recons- truindo e em minha opinião não há outra forma de essa aborda- gem existir que não seja estando em movimento contínuo. Quando digo que a meu ver sempre temos uma saída a partir dos princípios de nossa abordagem, refiro que, em minha opi- nião, esses princípios se complementam. Muitas vezes, me perguntam se é possível ter uma conside- ração incondicional positiva sempre. Penso que, enxergando de forma única e separada dos demais princípios, ficaria muito di- fícil eu considerar incondicionalmente de forma positiva muitas atitudes e pensamentos. Quando vejo no jornal algumas histó- rias, elas me arrepiam e me fazem tecer muitos julgamentos a respeito das pessoas. Temos o hábito de enxergar as situações ou os fatos apenas por ele mesmo, não levando em conta o con- texto. Se eu associar a capacidade de aceitar o outro incondi- cionalmente à capacidade de ser empático, a aceitação tende a existir de forma real, pois eu, me colocando na pele da pessoa, me livrando dos meus julgamentos, terei maior possibilidade de aceitar a pessoa, pois estarei levando em conta o seu contexto. Em minha experiência de consultório, muitas vezes atendi pes- soas cujas histórias eram exatamente iguais àquelas que eu recri- minei vendo em noticiários ou em outras situações. Pra mim, fica evidente a diferença entre ouvir falar e estar de frente a uma pessoa com uma história semelhante, mas carregada de vida, de sentimentos e de sofrimento. Na minha vivência, fica mui- to difícil não existir uma consideração incondicional positiva quando ao mesmo tempo somos empáticos. Vou repetir: os princípios facilitadores propostos pela Abor- dagem Centrada na Pessoa se complementam! Alguns psicoterapeutas levantam a seguinte questão: e se eu não for capaz de aceitar o outro incondicionalmente? A minha visão é que, nesse caso, a congruência me auxilia, pois não tenho dúvidas de que a capacidade de poder me ex- pressar de forma genuína é facilitador em mim e no cliente, embora muitas vezes isto possa gerar algum desconforto em ambos. Eu realmente gostaria de poder aceitar sempre as pes- soas de forma incondicional, mas me sinto confortável em saber que posso falar o que realmente sinto se não conseguir aceitá- la. Conforta-me saber que, apesar do meu esforço e da minha intenção em ajudar a pessoa, eu, na condição de ser humano, posso não dar conta de aceitar alguém como gostaria. Ser ape- nas congruente talvez me fizesse expressar isto de forma des- cuidada. Ser congruente, de forma empática, me dá a possibili- dade de, ainda que eu não consiga aceitar a pessoa de um jeito incondicional, eu tenha condições de expressar isto de forma cuidadosa, pois se de fato for empático, o fato de me colocar na pele dessa pessoa me dará condições de expressar o meu sentimento de forma clara, porém cuidadosa. so id io uu d sn os é eo ss ad eu e p e i u e o w e b e p i o g y v A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os Outra questão que por vezes me perguntam é se tenho a obrigação de ser congruente sempre. É claro que eu gostaria de ter essa capacidade o tempo todo, pois, como disse anteriormente, tenho convicção que ser genuí- no em uma relação é altamente facilitador. No entanto, algumas vezes, já me senti incapaz, com medo ou com vergonha de falar algo que se passava em mim com relação à pessoa e, nesse caso, quero ter o mesmo respeito que gosto de ter com as pessoas, comigo mesmo, ou seja, durante os meus 20 anos como psicote- rapeuta, aprendi a respeitar as minhas limitações. Não quero me acomodar ou me justificar nessas limitações na relação de ajuda e tento me aprimorar como pessoa e como profissional cada vez mais para ter a capacidade de viver os princípios em que tanto acredito de forma mais plena, mas há este paradoxo na ACP: Para estar centrado no outro, é importante que eu esteja cen- trado em mim também. Penso que seja impossível eu ter res- peito verdadeiro com o outro se não tiver esse mesmo respeito comigo. Como é possível aceitar as dificuldades do outro se não consigo me aceitar em minhas dificuldades e limitações? Como é possível me colocar na pele do outro se não sou capaz de me ver em minha própria pele? Como posso ser genuíno com o outro se não sou honesto comigo mesmo? Como posso acolher a pessoa se me violento? Mais uma vez, me sinto acolhido pelos princípios dessa abordagem, o que me faz ter a visão nítida de que os princípios expostos acima se complementam. Na minha opinião, ser psicoterapeuta centrado na pessoa significa estar aberto aos próprios sentimentos e ter a capacida- de de viver esses princípios de forma visceral. Não “atuo” como psicoterapeuta. “Sou”! O que me diferencia quando estou aten- dendo uma pessoa em meu consultório das outras situações de minha vida é que no consultório eu busco estar inteiramente concentrado no outro e isto de alguma forma me faz estar mais próximo da pessoa do que nas outras relações da minha vida em que estou vivendo situações diferentes e preocupado com a mi- nha própria existência. Não visto uma roupa de psicoterapeuta. Não utilizo os princípios da Abordagem Centrada na Pessoa como técnica. Sinto estes princípios em mim. Este é o meu jeito de ser. Na minha visão, ou eu vivo esses princípios ou estarei os utilizando como técnica. Ouço muitos colegas da ACP falarem que, quando descobriram essa abordagem, sentiram alívio por saber que esse jeito de fazer psicoterapia existia, pois de algu- ma forma essa maneira de se enxergar ajuda já existia dentro da pessoa. Várias pessoas me disseram que encontraram a ACP, mas que já tinham essa forma de ser e de enxergar ajuda mesmo antes de descobrirem essa abordagem. Foi assim que aconteceu também comigo. Em minha opinião, ou esse jeito de enxergar o ser hu- mano e a relação de ajuda faz todo sentido para o psicoterapeuta que tem a ACP como referencial teórico, ou o profissional vai acabar utilizando esses princípios como técnica e ser for assim, em minha opinião, essa atitude nada tem que ver com o que entendo dessa abordagem. Lembro-me que, há muitos anos, em um grupo de es- tudos que mantenho, um participante queria utilizar técnicas comportamentais o tempo todo, pois dizia que o seu cliente não tinha capacidade para sair da situação que se encontrava por ele mesmo. O grupo discutiu bastante a esse respeito e o participante, que se dizia centrado na pessoa, manteve a sua posição a respeito da descrença no seu cliente. Em determi- nado momento, outro membro do grupo disse a esse partici- pante: “Posso estar enganada, mas você me passa a impressão de que adora a nossa teoria, mas, no fundo, acredita mesmo na abordagem comportamental” O grupo ficou em silêncio até que o participante disse: “Você me pegou de jeito! É uma so id io uu d sn as 9 pO SS od eu e p e j u s o w o b e p i o g y v A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os pena. Acho esses princípios lindos e tenho feito muito esforço para acreditar neles, mas no fundo você tem razão, embora eu seja um simpatizante dessa abordagem, acredito mesmo na psicologia comportamental” Esse momento foi tenso, mas foi também libertador para a pessoa, que, embora triste, pôde perceber que utilizava os princípios centrados na pessoa de forma técnica, parcial e condicional. Isto fez com que ela buscasse apoio na abordagem que realmente fazia sentido para ela. Para estar na relação de ajuda, a meu ver, o psicoterapeuta centrado na pessoa não utiliza os princípios de forma sepa- rada ou pensada. Simplesmente, ele interioriza esses princípios e está na relação de forma inteira com a pessoa, sem a pre- ocupação da teoria. Penso que se de fato tenho esses princí- pios de forma interiorizada como jeito de viver, naturalmente terei condições de utilizá-los de forma natural, priorizando a relação. À esse respeito, Rogers no diz: Eu arriscaria a hipótese de que, no momento imediato do relaciona- mento, a teoria especifica do terapeuta é pouco importante e se está na consciência do terapeuta naquele momento, é provavelmente nociva à terapia. O que estou dizendo é que o encontro existencial é o que é importante, e que no momento imediato do relacionamento terapêu- tico a consciência da teoria não tem um lugar útil. Outra maneira de afirmar isto é que na medida em que estamos pensando teoricamente na relação, tornamo-nos espectadores e não participantes — e é como participantes que somos eficientes (ROGERS, 1967). À não ser que eu tenha interesse em me preservar na relação, não há motivos para que eu não seja um participante ativo desse momento com o cliente. A Abordagem Centrada na Pessoa está distante do modelo de cura, que advém da medicina. Essa abordagem busca facilitar na pessoa um maior grau de autoconhecimento, pois cremos que a partir daí haverá possibilidade de essa pessoa encontrar novas saídas, que, de acordo com a sua própria perspectiva, se- jam mais saudáveis. Cremos que quanto mais uma pessoa tiver acesso ao seu re- pertório interno, mais próxima essa pessoa estará de um funcio- namento ótimo, em um processo de busca de uma vida plena, e que esse funcionamento facilitará condições à pessoa de estar mais inteira consigo mesma e consequentemente nas relações interpessoais e no meio em que vive. Segundo Rogers: A pessoa que estiver completamente aberta a sua experiência terá acesso a todos os dados possíveis da situação sobre que fundamentará o seu comportamento; as exigências sociais, as suas próprias necessi- dades complexas e possivelmente em conflito, a sua recordação em situações semelhantes, a sua percepção do caráter único dessa situação determinada etc. Os dados seriam de fato muito complexos. Mas o indivíduo poderia permitir ao seu organismo total, com a participa- ção da sua consciência, considerar cada estímulo, cada necessidade, cada exigência, à sua intensidade e importância relativas e, a partir desse cálculo e dessa apreciação complexa, descobrir a atitude que mais integralmente satisfizesse as suas necessidades perante a situação (ROGERS, 1961). Para que, em um ambiente psicoterápico, possa existir a faci- litação da ajuda para que a pessoa se aproxime da melhor forma possível de si e da sua possibilidade de se aproximar cada vez mais desse processo de vida plena, é necessário que exista por parte do psicoterapeuta uma postura que combine com os prin- cípios facilitadores já mencionados neste capítulo. Uma grande confusão que há, em minha opinião, para que o psicoterapeuta possa tentar ajudar a pessoa através dessas posturas, é o mito da so id io uu d sn es & pO ss ed eu e p e i u o g w a b e p i o g y y A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os não diretividade, que acaba por engessar aqueles que acreditam nesse conceito. Percebo que, em função desse mito, muitos profissionais sentem-se com dificuldade de se expressar em função de acredi- tarem que qualquer intervenção na relação terá sido diretiva e que isto causará má influência no processo do cliente. Quando Rogers usou a expressão não diretivo, no início da construção da Abordagem Centrada na Pessoa, tal expressão re- feria-se ao fato de a direção psicoterápica ser seguida na relação de ajuda, estar na mão do cliente, e não do psicoterapeuta, em função da crença da pessoa na capacidade de se autodirigir atra- vés do princípio da tendência atualizante. Ele utilizava a expres- são para se contrapor às outras formas de atendimento psicote- rápico que existiam até então e que acreditavam na relação de ajuda como uma relação de poder, onde o profissional exercia o seu “saber” e autoridade para ajudar a pessoa, tendo-se a visão de que era o especialista que tinha condições de dirigir o cliente para o caminho da “cura”. Rogers mesmo desculpou-se algumas vezes por ter usado essa expressão, embora não tenha a certeza de ter sido ele o seu criador, tendo abandonado a expressão não diretivo já no início da década de 60, em função da confusão e de seu mau uso por parte dos profissionais que tinham essa abordagem como refe- rencial teórico. Em uma entrevista concedida a Willard B. Frick, ele disse: “Nunca consegui saber quem inventou a expressão não diretiva. Se fui eu, peço desculpas, embora fosse descritiva, sem dúvida, de certa fase inicial” (ROGERS, 1975). À meu ver, infelizmente, muitas pessoas não só utilizam essa expressão, como também a defendem com veemência na rela- ção de ajuda. Outro termo que ainda hoje é amplamente utilizado e que o próprio Rogers discordava do uso é rogeriano. Que significa ser rogeriano, afinal? Significa fazer do jeito que Rogers fazia? Como posso saber como Rogers faria em uma situação em que ele não está presente? Segundo Juan Lafargada: Rogers reagia com perceptível irritação quando alguém se referia a quem se identificasse com o enfoque centrado na pessoa como “roge- riano”. Certo dia, falou: “O único rogeriano sou eu mesmo”, deixan- do claro que era o único a ter o direito a esse nome (LAFARGADA, 2002). Será que ao nos intitularmos rogerianos e utilizarmos a não diretividade, não estamos nos escondendo de uma relação intei- ra é intensa com o cliente? Maria Bowen contribui com esse assunto: Eu vejo o modelo “rogeriano” não diretivo, de psicoterapia, muitas vezes como uma maneira de encobrir a passividade e o medo de come- ter erros; tirando o corpo fora. É fácil sentar-se em frente ao cliente, balançando a cabeça frente ao cliente, balançando a cabeça e dizendo “Hummm... hummmm”, e não arriscando a engajar-se num nível real de pessoa para pessoa (BOWEN, 1987). Para mim, há uma grande diferença entre ser “rogeriano” e ser centrado na pessoa. Ser centrado na pessoa para mim signi- fica ter os princípios dessa abordagem como referencial teórico e de vida e dentro dele desfrutar da própria liberdade em estar com o cliente de forma inteira e intensa sempre respeitando o seu próprio jeito de ser. Em minha forma de enxergar, quanto mais “rogeriano” o profissional for, menos centrado na pessoa ele será, pois estará ferindo os princípios dessa abordagem, que tem em sua base a liberdade e a experiência, passando dessa forma a utilizá-la como técnica, preso a uma postura que priva o profissional de estar de forma envolvida, inteira e intensa com o cliente. s o i d i o u u d sn as à eO SS ad eU Pp ei ju ag ui sb ep io gy v A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e se us pr in cí pi os Se confio no potencial humano, não há sentido nenhum em ter medo de me posicionar na relação psicoterápica. Novamente, Maria Bowen se posiciona: Penso que um dos grandes paradoxos da abordagem centrada na pessoa está neste segundo aspecto: por um lado, nós profetizamos confiar na capacidade da pessoa para guiar seu próprio processo de crescimento e para escolher sua própria direção. Por outro lado, nós temos a tendên- cia de tratar a pessoa com precaução, por medo de sermos influentes demais, como se ela fosse uma pequena criança maleável facilmente impressionável por comentários parentais. (Eu penso que, mesmo as crianças, não são tão maleáveis assim.) (BOWEN, 1987) Se o foco da psicoterapia for o cuidado em ser “não diretivo”, paradoxalmente, talvez sem perceber, estaremos nos apegando a uma técnica e a uma maneira sutil de manipular a relação de ajuda, pois estaremos priorizando as regras e não a pessoa. Esta- remos oferecendo regras travestidas de falta de regras. Estaremos nos escravizando e a forma como enxergo a nossa abordagem é oposta a se escravizar. Ser um psicoterapeuta centrado na pes- soa, em minha opinião, significa ser livre, respeitando o jeito de ser do cliente, mas respeitando também o seu próprio jeito de ser. Significa confiar no potencial do cliente, mas também con- acabo de ingressar no curso de Psicologia. Por conta disso, li sobre Rogers e também alguns livros de sua autoria, e fiquei imaginando que um livro sobre a Aborda- gem Centrada na Pessoa também deveria seguir seus fundamen- tos na sua própria produção. Minha imaginação foi longe. Algumas ideias foram conti- das por orçamento, tempo ou porque são lindas apenas como ideias. Outras, consegui fazer. O livro foi escrito por três psicólogos (que serão apresenta- dos a seguir), com conteúdo teórico e também perguntas e res- postas. Algumas perguntas foram respondidas por mais de um psicólogo. Ou seja, um livro com muitas linguagens diferentes e escrito por várias pessoas. E foi nesse cenário que resolvi, e todos os envolvidos aceita- ram, manter o estilo de cada um, em todos os momentos diver- sos deste livro. Algumas pessoas dirão que isso causa um ruído na leitura. Eu acredito que são as diferenças que somam. Nesse caso, começando pela linguagem e estilos de cada um. A palavra mais forte que vem para mim quando penso na Abordagem Centrada na Pessoa é aceitação. Então, meu desejo é que você aceite este livro, do jeitinho dele, mesmo que dife- rente, para que some a sua vida. Cassia Carrenho Editora Introdução Esther Carrenho “Nunca parei para pensar no que sinto enquanto atendo al- guém.” Respondeu-me, surpresa, uma psicóloga que tinha me procurado para a supervisão de um caso em que ela se via perdi- da. A pergunta que eu tinha feito era: “O que você sente quan- do está atendendo essa pessoa?” Ao invés de responder, ela fez a declaração do início e me fez outra pergunta. “Por que tenho que prestar atenção no que sinto enquanto atendo?” Perguntas como esta e muitas outras me chegam, vindo de profissionais em Psicologia que acabaram de se formar e ou que depois de ex- perimentar algumas orientações como psicoterapeutas, optam pela Abordagem Centrada na Pessoa. Muitos desses profissio- nais estão realmente cheios de dúvidas, medos e até angustiados na ânsia de desejarem acertar e fazerem o melhor. Nem sempre tenho um contato pessoal com os profissionais que me fazem essas perguntas. Muitas vezes, o contato é via tele- fone ou internet. Meu tempo disponível para isto não é muito, então comecei a pesquisar que livros eu poderia indicar para alguém com esses tipos de dúvidas. E lamentavelmente descobri que teria que indicar muitos livros dentro da Abordagem Cen- trada na Pessoa. O que não é mal, mas considerando que esses questionamentos nem sempre podem esperar por muito tempo em pesquisa, pensei que um livro específico poderia oferecer uma ajuda mais imediata enquanto o aprofundamento acon- teceria com leituras de outros livros. Poderia também indicar cursos de formação de psicoterapeutas ou mesmo supervi- são continuada com algum profissional mais experiente, mas essas pessoas têm urgência e não podem esperar o amadureci- mento profissional, portanto, precisam de algo mais imediato para dar conta das demandas que encontram em seus locais de trabalho. Logo no início, pensei em escolher mais dois profissionais, até mais experientes que eu na prática em psicoterapia, como autores. Na verdade, temos várias pessoas na ACP com capaci- dade e experiência para tanto. Pensei então em Marcos Alberto da Silva Pinto, cujo trabalho conheço bem de perto, e Márcia Tassinari. À alegria deles foi contagiante logo que fiz os primei- ros contatos. Decidimos que faríamos o livro tendo a seguinte base: a experiência prática de cada um; as perguntas feitas por psicólogos e profissionais considerados pessoas envolvidas na relação de ajuda. Usamos também uma pesquisa feita via inter- net, solicitando a vários profissionais a sugestão de perguntas que eles gostariam de ver respondidas. Isto não significa que temos as respostas certas. E também não é nossa intenção ofere- cer uma receita pronta que se for seguida, dará certo. É apenas a nossa opinião resultante dos anos já vividos e nosso ponto de vista adquirido pela experiência. Mas esclareço que o leitor pode avaliar tudo e tirar suas próprias conclusões. E, por último, nos baseamos na fundamentação teórica das descobertas e práticas do próprio Rogers, usando a literatura existente e que citaremos na bibliografia. Entramos em acordo e cada um escolheu escrever sobre o tema em que tinha um domínio maior na prática e no conhe- cimento. Porém há assuntos que todos se dispuseram a escrever e, portanto, serão abordados pelos três, apresentando possivel- mente óticas diferenciadas num mesmo tema. Marcia ficou responsável em descrever a trajetória de Rogers ea história da ACP no Brasil. Dentre nós, ela, com certeza, tem mais condições de fazer esse relato, uma vez que participou pes- soalmente de alguns encontros e vivências com Rogers durante uma de suas passagens pelo Brasil, além de ter realizado uma pesquisa já publicada (de 1990 a 1997) sobre a História da ACP no Brasil. Marcos, até onde sei, é o brasileiro que mais realizou Grupos de Encontro usando como referência a Abordagem Centrada na Pessoa. Neste livro, ficou incumbido de toda a fundamen- tação teórica da Abordagem Centrada na Pessoa, da visão do diagnóstico em nossa abordagem e do capítulo sobre Grupo de encontro. Escolhi escrever sobre quem foi Rogers e trabalhar no con- texto religioso da vida dele. Este é um assunto pouco falado, inclusive na literatura de autoria dele. Mas sempre me interessei por isto. Um pouco por causa da minha criação, também numa família cristá evangélica de valores rígidos, onde tive pouca liber- dade para a expressão de sentimentos, ideias e opiniões. Outro tanto porque acredito que foi justamente por causa desse contex- to que Rogers, uma vez adulto, questionou, pesquisou, estudou e nos deixou uma herança riquíssima sobre liberdade, amor e o potencial da pessoa para fazer suas escolhas. Esta será uma di- ferença dos relatos biográficos sobre a vida de Rogers. Apresen- taremos mais informações sobre as realidades religiosas com as quais Rogers conviveu nas três primeiras décadas do século 20. Nossa proposta não esgotará os assuntos e muito menos as dúvidas levantadas por muitos. Não temos essa intenção. Até porque acreditamos que o melhor aprendizado é o que parte da experiência e da vivência de cada pessoa. Mas temos o desejo de que a partir deste livro o leitor sinta o desejo de vivenciar e de continuar praticando o trabalho enriquecedor de promover ferramentas para que outros também cresçam a partir de suas próprias vivências e percepções. Consideramos que o mais importante, no processo de viver numa plenitude maior, é a interação pessoa a pessoa. E como cada pessoa é única, essa interação está ligada a um mistério inesgotável, onde cada um terá sua própria vivência e suas pró- prias histórias, decorrente dos encontros que se sobrepõem a todo e qualquer conhecimento e informação por mais intenso que eles sejam. Que esse mistério vá se desvendando e que mui- tos outros livros possam ser compilados e editados! Esperamos também que a partir deste livro o leitor tenha maior interesse em continuar suas pesquisas e leituras do mui- to material já disponível tanto em livros impressos, como em artigos, teses de mestrado e doutorado disponíveis em sites. No final, deixaremos uma lista de sites onde muitas dessas leituras estão disponíveis. Finalmente, como entendemos que os leitores deste livro se- rão aqueles que buscam uma riqueza maior, no crescimento, como pessoa e profissional da relação de ajuda, desejamos que, de alguma forma, nosso trabalho possa contribuir nessa busca. A vida de Carl Ramson Rogers Esther Carrenho A biografia de Carl Ransom Rogers é muito fácil de ser encon- trada. E biografia tem dados concretos que não são alterados. O diferencial aqui será uma abordagem um pouco mais extensa do que muitas fiar no seu próprio potencial e na própria capacidade em estar presente de forma inteira e intensa nessa relação. E, a meu ver, quando temos uma postura “rogeriana” de não diretividade, nos afastamos desse propósito. Esta é a Abordagem Centrada na Pessoa em que acredito e com que me sinto a cada dia mais envolvido. Uma abor- dagem que se propõe a estar sempre em movimento. Uma abordagem que busca se manter sempre como hipótese e não como verdade. Uma abordagem onde eu possa me sentir envolvido no seu contínuo processo de criação, sendo criador e não criatura. Onde eu possa me sentir livre e ao mesmo tem- po responsável pela reconstrução, pelas minhas atitudes e sen- timentos. A minha intenção é, a partir do exposto, convidar você, lei- tor, à uma reflexão a respeito dos assuntos discutidos para que você possa, se for do seu interesse, chegar às suas próprias con- clusões e que, a partir delas, você encontre o seu jeito de en- xergar a relação de ajuda, pois em minha opinião esta é a única forma de mantermos a Abordagem Centrada na Pessoa viva e em contínuo movimento, dirimindo a possibilidade de ela se transformar em um dogma, desenvolvendo-se cada vez mais e dessa forma tendo condições de contribuir de forma crescente para o desenvolvimento dessa teoria e na ajuda à pessoa. so id jo uu d sn es a eO SS od eu ep el ju so u e b e p J o g y v A Abordagem Centrada na Pessoa e suas dimensões Márcia Tassinari 95 “Somos agentes de mudança social quando colaboramos em planejamentos institucionais, quando oferecemos nossa presença no cotidiano da comunidade” Rosenberg, 1987, p. 11 Na contemporaneidade, assistimos à ampliação da Psicologia Clínica, saindo da vertente meramente curativa, de tratamento em consultórios individuais, de longa duração, fundamentados prioritariamente na psicanálise freudiana para trabalhos com grupos e/ou indivíduos em diferentes contextos (hospital, co- munidades, organizações, delegacias etc.), ou de curta duração, fundamentados em diversas orientações teóricas, contemplan- do também a dimensão preventiva e de crescimento pessoal, tendo o psicólogo o papel de agente de mudança social. A denominação Psicoterapia Breve (PB) teve origem na própria Psicanálise, como uma resposta à demanda social das guerras, especialmente da Primeira Guerra, quando os médi- cos psiquiatras e psicólogos precisaram responder à necessidade de atendimento ao sofrimento gerado pelas consequências da guerra. A possibilidade existente e que estava se constituindo era a psicanálise, que precisava ser individual, de longa duração e com ritmo de três a cinco vezes por semana, o que tornaria impraticável trabalhar com as pessoas necessitadas. A possibilidade de um atendimento breve, por alguns de- nominado de psicoterapia de crise (Mofat, citado em Small, 1974) ou de Emergência (Bellak & Small, 1980), surgiu nessa época como uma tentativa de responder a situações de crise, p se ns e po ss ed eu e p e q u o o L e b e p i o g y v se os uo uu ! A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e su as di me ns õe s especialmente ao aumento de reações depressivas. Na época, a orientação teórica predominante era a Psicanálise, que, encon- trando dificuldades práticas para aplicar suas técnicas, viu-se forçada a introduzir reformulações, inicialmente na prática e, posteriormente, na teoria. Assim, nasceu o conceito de “foco”, desenvolvendo-se uma psicoterapia em torno de um tema ou problemática ou conflito central, que podia ser realizada em um tempo delimitado a priori. Desde então, a psicoterapia breve tem sido muito utilizada em situações de crise, em serviços de emergência psiquiátrica. Para Small (1974, p. 14) o serviço de emergência pode ser enca- rado como um “meio de reduzir as demoras experimentadas nos serviços de saúde mental, demoras essas que só contribuem para O agravamento de condições sérias”. Nos momentos de crise, Small continua, “uma ajuda rápida e eficaz pode resultar numa diminuição do sofrimento, no encurtamento do período de per- turbação e numa maior realização para a vida do indivíduo”. A maioria dos autores que pratica a psicoterapia breve são oriundos da psicanálise. Sifneos (citado em Bellak, 1992) pro- põe um método de tratamento a curto prazo com pacientes pré- selecionados, enquanto Mann (citado em Bellak, 1992) focaliza a ansiedade de separação. Bellak (1992), sistematizando a psico- terapia breve ou de emergência, afirma que ela “focaliza no que foi pobremente aprendido, o que necessita ser desaprendido e reaprendido de maneira mais eficaz” (p. 4), selecionando os sin- tomas principais e mais perturbadores, além de suas causas. O'Hara (1998), interessada na duração ótima de um proces- so psicoterápico centrado na pessoa e bem-sucedido, realizou um levantamento informal via Internet, confirmando estudos anteriores que apontaram resultados positivos para processos que duram em torno de 20 sessões, outros reportando uma mé- dia de oito sessões. Ainda que a proposta da psicoterapia centra- da na pessoa não seja focal, O'Hara considera que esse modelo de psicoterapia tem muito a oferecer ao que é denominado de psicoterapia breve, mesmo trabalhando com a pessoa inteira e não apenas com focos ou demandas. Em 1942, Rogers já de- clarava que a terapia não diretiva, como era então denominada, podia oferecer ajuda positiva e duradoura em um curto espaço de tempo. O desenvolvimento do campo da psicoterapia breve aponta- va para a fragilidade da psicologia clínica clássica. Esta entende que qualquer sofrimento humano necessita de tratamento lon- go, várias vezes por semana. Em função de mudanças socio- políticas, da ampliação do conceito de saúde e da expansão da própria Psicologia, essa concepção de clínica psicológica tem sido desconstruída para responder, de maneira mais adequada, às novas demandas da modernidade. A proposta do atendimento em Plantão Psicológico vem pre- encher parcialmente essa lacuna, adequando-se às necessidades da pessoa que necessita conversar com um profissional capaz de ajudá-la a entender melhor sua realidade, em seus momentos de aflição. Aguardar numa longa fila de espera e/ou submeter-se às entrevistas de triagem para avaliação e encaminhamento são procedimentos que parecem dificultar o engajamento na psico- terapia, especialmente para as pessoas que se encontram pouco interessadas no processo de reconstrução da personalidade, mas que precisam de uma atenção especial em determinados mo- mentos de suas vidas. Ainda que a atividade do Plantão não seja nova no Brasil (surgiu em 1969), a primeira sistematização pública apareceu no final da década de 1980 (Rosenberg, 1987). Atualmente, nota-se um número crescente de profissionais e instituições ino- vando seus atendimentos, encontrando no Plantão respostas a muitas de suas inquietações, em especial a aplicabilidade da Psi- cologia em instituições. Inicialmente visto como uma proposta alternativa, o Plantão So QS US LU I ps en s 9 pO SS ad eu e p e g u s o w e b e p i o g y y A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e su as di me ns õe s tem conquistado espaços, constituindo-se como uma modalida- de independente de ajuda psicológica. Mahfoud (1999, p. 43) nos esclarece: O próprio Conselho Federal de Psicologia chegou a se pronunciar em documento oficial, classificando Plantão Psicológico dentre as técnicas alternativas emergentes. Alternativa de maneira distinta daquelas de origem confusa ou esotérica, mas entendida como proposta inovado- ra, que em certa medida rompe parâmetros estabelecidos e que ainda estava aguardando uma avaliação mais rigorosa de sua eficácia pelas instituições de ensino superior e de pesquisa.” Em uma primeira aproximação (Tassinari, 2003), pode-se definir Plantão Psicológico como um tipo de atendimento psico- lógico que se completa em si mesmo, realizado em uma ou mais. consultas sem duração predeterminada, objetivando receber qualquer pessoa no momento exato de sua necessidade para aju- dá-la a compreender melhor sua emergência e, se necessário, en- caminhá-la a outros serviços. Tanto o tempo da consulta quanto os retornos dependem de decisões conjuntas (plantonista/clien- te) no decorrer do atendimento. É exercido por psicólogos que ficam à disposição das pessoas que procuram espontaneamente o serviço em local, dias e horários preestabelecidos, podendo ser criado em diversos locais e instituições. Em cada ambien- te, precisará criar estratégias específicas, desde sua divulgação (processo de sensibilização à comunidade) até sua relação com a própria instituição/local. O encaminhamento para a psicoterapia ou para outras es- pecialidades ou a realização do psicodiagnóstico são objetivos secundários que não devem ocupar a atenção principal do plan- tonista. O atendimento em Plantão não visa somente a uma catarse, ainda que a inclua, mas objetiva facilitar maior compre- ensão da pessoa e de sua situação imediata. O plantonista e o cliente vão juntos procurar no “momento-já” as potencialidades inerentes que podem estar adormecidas ou que precisem ser deflagradas a partir de uma relação calorosa, sem julgamentos, onde a escuta sensível e empática, a expressividade do planto- nista e seu genuíno interesse em ajudar desempenham papel primordial. Nesse sentido, entendemos o Serviço de Plantão como uma atividade de promoção da saúde, já que a escuta do plantonista visa a possibilitar que a pessoa se situe melhor naquele momen- to e consiga clarear para si mesma o que necessita. Acreditamos que ser atendida no momento de sua necessidade, por iniciativa própria, estimula o cuidado consigo mesma, atingindo assim os objetivos da prevenção primária. — O Plantão Psicológico pode ser uma potente aplicação da Abordagem Centrada na Pessoa, permeado pelas atitudes de consideração positiva incondicional, compreensão empática e congruência ou autenticidade, que fornecem um ambiente faci- litador para a autoexpressão, bem como a possibilidade de, em até um único encontro, a pessoa conseguir clarear sua demanda, ou seja, uma compreensão mais nítida de como se compreende em determinada situação. Fundamenta-se, assim como a abor- dagem, no postulado central da Tendência Atualizante/Forma- tiva, isto é, na hipótese que assume o ser humano como um organismo vivo, global, digno de confiança, com capacidade natural de desenvolvimento de suas potencialidades. Para ilustrar, apresento um atendimento especial que tive o privilégio de vivenciar como plantonista. Trata-se de um me- nino, R., de 12 anos, da primeira série do ensino fundamen- tal, que veio pela primeira vez acompanhado de um grupo de quatro meninos e duas meninas, alguns querendo desenhar, ou contar piadas ou acompanhar os colegas e outros sem explici- tar o que queriam. No meio da algazarra, comecei a colocar alguns limites e os convidei a decidir o que faríamos, já que os interesses eram conflitantes e as cadeiras e material expressivo p se ns o eo ss ed 'e u e p e g u s o LU SD EP IO QY V se os ue uu l A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e su as di me ns õe s eram insuficientes. Decidimos que iríamos nos apresentar (eu já conhecia alguns) e R. me ajudou a manter os limites (falar um por vez, não empurrar). Após as apresentações, começamos a conversar, o que foi logo em seguida interrompido por outro aluno, avisando que a professora já estava em sala e todos saíram correndo. R. avisou-me que retornaria. Quinze minutos depois, reaparece R., acompanhado da sua professora, que pediu-me que conversasse um pouco com ele. Perguntei se ele também queria. Consentiu sorrindo e encaminhou-se direto à mesa para desenhar. Tentando saber por que veio trazido pela professora, recebi respostas evasivas: “Vim porque sou o compositor da tur- ma.” “A professora gosta de mim porque respeito ela.” Mas R, queria mesmo era desenhar a bandeira brasileira, e começou a tarefa, enquanto cantarolava algo que eu não entendia. Tentei explorar sua faceta de compositor e ele cantou uma música que fez para a professora e, em seguida, se ofereceu para fazer uma música para mim, compondo um 74p cujo conteúdo básico era a finalidade do Plantão: “Aqui é um lugar de 'conversamento, de fazer experiências e a tia Márcia pode me entender...” Continuando a desenhar a bandeira, pediu-me para escrever “aquela frase que tem na bandeira, que eu esqueci”. Suspeitei que seu pedido fosse por não saber escrever e, então, falei “Or- dem e Progresso”. R. insistiu para que eu escrevesse a frase em seu desenho, pois “o lápis cera não estava muito firme”. Pergun- tei diretamente se ele precisava de minha ajuda por não saber escrever muito bem. Ele desconversou, cantarolando outra mú- sica e aí tive um insight: comecei a conversar com ele também cantarolando, no mesmo ritmo (rap). R. olhou para mim com uma expressão mista de surpresa e cumplicidade, sorriu e conti- nuamos a conversar cantando. À partir desse momento, R. pôde falar de si (cantando), de sua família, de seu parceiro musical, que o acompanhou ao “Programa famoso de TV” para cantar, e que depois foi assassi- nado na chacina no Rio de Janeiro. Falou que já havia fugido de casa duas vezes, que tinha três irmãs e uma havia sido vendida (sic) pela avó quando a mãe fora baleada e agora tinha uma irmá recém-nascida (22 dias) de quem gostava muito. Falou da vergonha que tem por não saber escrever direito e que preR sou sair da escola na época da chacina, vindo morar próximo à escola (em um bairro da zona sul) com a mãe, o padrasto e a irmá mais nova. Olhava-me com ternura, dizendo “seu nome é parecido com o de minha mãe, que se chama M. e vocês são até parecidas”. “Terminou o desenho e fez mais duas bandeiras, variando as cores e, agora, copiando a frase “Ordem e Progresso”, demons- trando certo orgulho em estar sendo capaz de copiá-la “direiti- nho” (sic). Uma bandeira seria para levar para a mãe e a outra me deu de presente. Ao sair, disse-me que era muito bom ir ao Plantão, poder contar os segredos e desenhar. Saiu saltitante, dizendo que voltaria na próxima semana. A solidez de nosso vínculo interpessoal foi legitimada na se- mana seguinte, quando encontrei R. me procurando na ERA e, meio zangado, disse: “A sala do Plantão já está aberta desde às oito horas e pensei que você não viesse hoje.” Nesse dia, o colé- gio havia organizado a feira de ciências e a maioria dos alunos estava ocupada nas diversas barracas. Como não conseguia achar o inspetor responsável pela chave da sala, fiquei passeando pela feira, julgando que não haveria alunos interessados no Plantão. Fomos juntos para a sala do Plantão e agora R. podia conversar mais abertamente, através do desenho, não necessitando de usar somente a música para se expressar. Nesse atendimento, desenhou quatro corações, cortados por flechas, dois deles chorando (gotas escorrendo). Comentei, num tom brincalhão: “Você sabia que o desenho fala?” Confirmou com a cabeça, sorrindo. Quando fez o segundo coração, que chorava menos (quantidade menor de lágrimas escorrendo), co- ps en s 9 p o s s o eu e p e a u a o u o b e p i o g y v se os ua uu ! A A b o r d a g e m Ce nt ra da na Pe ss oa e su as di me ns õe s mentei: “Agora que você pode falar de sua tristeza, o coração está menos triste.” Ele não respondeu e, em seguida falou: “Você não sabe que o desenho fala?” e complementou: “A garota que estou interessada não quer saber de mim.” Disse-me também do interesse que tem em desenhar, mas não pode frequentar as aulas de artes por não saber escrever. Antes de sair fez o meu co- ração (sic), cor de rosa, com meu nome escrito no centro. Como R. apresentava dificuldade para escrever, fui soletrando, ele es- crevendo, demonstrando muito prazer em fazé-lo corretamente. O quarto desenho levou de presente para a mãe. “Minha emoção ficou evidente, ao perceber que, cantan- | do, ao invés de conversar, estabeleci uma “ponte” entre nós, | criando uma linguagem comum. Não estávamos mais isola- | dos. Interessante notar que cantar, para mim, é extremamen- (te constrangedor, pois sou muito desafinada. Pude ousar por | também me sentir aceita por ele. A percepção de R. de que eu | o compreendia sem julgamentos levou-o a falar de si cantando. | Antes, estava se esquivando, dando respostas evasivas, não me | permitindo entrar em seu mundo interno. O meu interesse genuíno em acolher sua experiência levou | à maior autenticidade de R., na atualização de suas potencia- | lidades. Em um curto espaço de tempo, ao redor de 25 mi- | nutos, estávamos próximos. À partir disso, ele pôde se revelar | mais, clarear seu pedido de ajuda, ser mais ele mesmo, falar | de suas facetas pouco aceitas (não saber escrever, ter fugido de | casa, não conseguir conquistar a garota que deseja, não poder | frequentar a aula de artes e ser repetente) e também das coisas | que gosta, de seus valores (da irmã recém-nascida, da forte li- | gação com a mãe, ser torcedor do Flamengo, gostar de cantar e | de compor músicas, de desenhar, da professora que o valoriza, | da sala do Plantão etc.). O retorno ao Plantão, explicitando o desejo de R. em con- tinuar clareando sua aflição, demonstra a possibilidade desse serviço como gerador de movimentos, funcionando como uma referência existencial. É como se R. tivesse percebido que en- contraria um espaço de liberdade, onde poderia se expressar, ser entendido, começar a se aceitar e avançar no autoconhecimen- to: “Somos agentes de mudança social quando colaboramos em planejamentos institucionais, quando oferecemos nossa presen- ça no cotidiano da comunidade” (Rosenberg, 1987, p. 11). p se ns 9 se gs ue u! p o s s a eu ep eJ ju so u e b e p g y A pessoa por trás do diagnóstico Marcos Alberto da Silva Pinto (Texto escrito em 2003 e apresentado no VII Fórum Brasileiro da Abordagem Centrada na Pessoa em Nova Friburgo/RJ em 2007.) 107 108 s ânci Nessa tendência geral, a terapia centrada no cliente se coloca no final da fila ao afirmar, com o seu ponto de vista, que o diagnóstico psicológico, da maneira como usualmente é compreendido, é desnecessário para a psicoterapia e pode, na verdade, ser prejudicial ao processo terapêutico.” Rogers, 1951 É improvável que alguém tenha condições de precisar há quan- to tempo o diagnóstico é utilizado como forma de ajuda no campo da Psiquiatria e da Psicologia. O primeiro Manual de diagnóstico e estatísticas de transtor- nos mentais, da Associação Americana de Psiquiatria, foi edita- do em 1952, sendo este, o primeiro manual oficial de distúr- bios mentais a conter um glossário de descrições de categorias diagnósticas. Esse manual, hoje em sua quarta edição devidamente revisa- da e ampliada, foi e é amplamente aceito pela maioria da comu- nidade que trabalha com saúde mental no Brasil e no mundo, e segundo ele mesmo, tem a função de “realizar o tratamento do paciente”. Na própria Psicologia, existe uma vasta literatura a respeito do diagnóstico, sua importância, suas formas, técnicas e métodos. Todos eles, devidamente embasados e demonstrando a sua importância e funcionalidade na relação de ajuda. É importante verificarmos o sentido original da palavra diag- nóstico (gnossis = conhecimento; dia = através), ou seja, conhecer o outro através. Conhecer o outro inteiro, por trás da fachada, em seus sentimentos e sentidos. Em minha opinião, infelizmente, o que vemos hoje como o o n s o u b e l p op se u 10 d p o s s a d y 109 A pe ss oa po r tr ás do di ag nó st ic o diagnóstico é algo completamente oposto a essa concepção. Gostaria de convidar o leitor, através deste capítulo, a refletir a respeito do diagnóstico (este que temos hoje em dia), tão pou- co questionado em função de uma quase unanimidade quanto à sua importância na relação de ajuda. Em um de seus livros, Carl Rogers (1983) menciona o seu medo em escrever algo que seja controverso e que, ao escrever, fazia isto como se fosse apenas para ele próprio ler, pois se escre- vesse pensando que outros o leriam, provavelmente mediria as suas palavras e não seria inteiro e autêntico em suas ideias. É com esse espírito que eu desejo me posicionar com relação ao tema, mesmo tendo claro que esta é uma visão muito pessoal e diferente da grande maioria dos profissionais que lidam com a “saúde mental”. Quando eu era criança, lembro-me que adorava bife de fi- gado, até o dia em que descobri o que era um fígado. Perdi a fome, o desejo e o interesse no tal bife. Ainda que me contem o quanto ele é necessário e faz bem à saúde, simplesmente não o como. Já não me importa mais nem o seu gosto, se há grande quantidade de ferro etc. Assim funciona o rótulo. Durante a minha vida profissional, tenho acompanhado em meu consultório, pessoas que chegam já devidamente diagnos- ticadas tanto por colegas psicoterapeutas quanto por outros profissionais de saúde. Muitos chegam por sua própria conta, buscando o seu diag- nóstico. Em minha opinião, o diagnóstico tem nos servido muito mais pra estigmatizar e menos para ajudar. Por meio do diagnóstico, a pessoa já não interessa. Os seus sentimentos, medos, necessidades. A pessoa que está por detrás do diagnóstico vira mero coadjuvante. Embora muitas vezes travestida de necessidade, a minha im- pressão é que o diagnóstico tem servido, na maioria das vezes, como manutenção a um modelo confortável e arcaico para o profissional de ajuda, que, dessa forma, abre mão do contato, do relacionamento e do vínculo, que é o que de fato importa nessa relação. Quando se diagnostica o outro, está se colocando a pessoa em uma condição inferior. A pessoa passa a ser o segundo plano. O diagnóstico afasta o profissional da pessoa. “ Muitas vezes, em meu consultório, tenho encontrado pes- soas previamente diagnosticadas, e o que tenho visto é que essa situação tem colaborado para que ela se sinta inferiorizada e conformada com a situação, em muitas vezes até se alimentando e trabalhando para a própria manutenção desse diagnóstico. Frases como: “Afinal, eu sou mesmo depressivo” e “O que se pode esperar de um esquizofrênico como eu”, a meu ves co- laboram para que a pessoa perca a crença na sua possibilidade de se desenvolver e enfrentar a sua dificuldade em condições de igualdade, buscando a sua libertação e melhoria da qualidade de vida. Ao invés de cuidar, o diagnóstico tem servido para que haja uma total descrença e preconceito com a pessoa que sofre. Há muitos anos, em uma visita a um hospital psiquiátrico, conversei com uma senhora que me contava estar em sua oitava internação. Contou-me que dessa vez derrubara um prato de comida no chão e soltara um palavrão, o que fez com que a sua família acreditasse ser o início de uma nova crise, resultando em sua atual internação. Questionei essa senhora, dizendo que eu já havia, por muitas vezes, derrubado coisas e dito palavrões e que isto não fazia com que eu fosse internado. A senhora olhou pra mim com lágrimas nos olhos, dizendo que eu não tinha o estigma de louco e por essa razão eu derrubar um prato e ficar irritado tinha um significado para as pessoas, mas em relação a ela a mesma atitude tinha significado totalmente diferente. Em outra ocasião, uma cliente me disse que não aguentava mais passar pelas tais crises de depressão. Eu disse a ela que se o o n s o g u b e i p op se u) Jo d e o s s a d y A p e s s o a po r tr ás do d i a g n ó s t i c o estivesse passando pela mesma situação de vida que ela, prova. velmente também estaria muito triste e sofrendo. Ela ficou meio chocada e me disse que eu era a primeira pessoa que entendia o seu sofrimento sem rotulá-la. Depois disso, sentiu necessidade de questionar a sua própria “depressão” e concluiu que este era o nome que davam para o seu sofrimento, e que ela merecia sim- plesmente se sentir triste ou alegre de acordo com o andamento da sua vida. Decidiu que não seria mais apenas um rótulo que a empurrava pra baixo. Resolveu buscar em si a sua capacidade de caminhar em direção à vida. E — O Certa vez ainda, um rapaz diagnosticado como “esquizo- frênico” me procurou e toda vez que eu aceitava as suas ati- tudes e enxergava por trás do seu rótulo o seu sofrimento ele me dizia que não tinha jeito, pois era um “esquizofrênico”. | Eu sempre mencionava que entendia que ele vivera a maior | parte de sua vida com esse diagnóstico, mas eu me interessava mesmo por seu sofrimento, independente do nome que lhe | deram. Um dia, ele chegou ao consultório com aquela fisiono- mia de sempre, trazido por um parente, e, ao fechar a porta, me disse que andava pensando no que andávamos conversan- do e que ele, em função do diagnóstico que recebera, nunca se dera ao trabalho de encarar seus sofrimentos e sua vida, é | que a partir daquele momento queria olhar para si, para as | suas angústias, medos e sonhos. No início, me disse que não se sentia confiante em demonstrar para todos que havia se perce- bido, finalmente, como um ser não inferior, pois tinha medo da reação das pessoas que já estavam acostumadas com isto. | Depois, começou a pensar que do mesmo jeito que podia ser | ele mesmo ali comigo, gostaria de tentar ser assim com os ou- | tros. Para isto concluiu que deveria começar a se posicionar. | A família espantada passou a questioná-lo e a me questionar, * pois ele começou a ser meio hostil e questionador. Começou a dizer não e isto desagradava à família que havia se acostumado com uma pessoa dependente e “dócil”. Na opinião da família, ele estava piorando, embora para ele este era o início de sua libertação. Para minha tristeza, depois de algum tempo, ele desistiu da psicoterapia. Disse que não tinha forças para lutar contra o rótulo que lhe fora imposto de “esquizofrênico”, e que de certo modo, a psicoterapia estava lhe fazendo mal, pois nela, se via uma pessoa “normal”, mas que como apenas ele e eu o víamos assim, ele não encontrava forças para enfrentar as pessoas que amava. Disse-me chorando que iria escolher ser o “velho esquizofrênico” conhecido e aceito de sempre. Este é apenas um de tantos exemplos dos males que os diag- nósticos produzem. Talvez o maior problema para se abrir mão do diagnóstico seja acreditar na capacidade natural da pessoa em se autodirigir. Outra dificuldade é que abrir mão do diagnóstico significa que o profissional pode perder parte do seu “poder” e “superio- ridade” sobre o “paciente”. ” Provavelmente, poucos profissionais de ajuda queiram se co- locar numa condição de igual perante o outro, pois isto acarre- tará numa perda de seu status e provavelmente. “em nome do bem”, será mantida essa tradicional forma de “ajuda” de opres- sor versus oprimido. É sabido por todos os profissionais que buscam a Abordagem Centrada na Pessoa como sua referência que, desde o início, essa abordagem foi consequência da percepção de Carl Rogers a respeito do mal, ou pelo menos da “ausência de ajuda” que o diagnóstico pode causar. O próprio Rogers nos conta, em várias situações, a sua expe- riência quando trabalhava em um centro de orientação infantil em Rochester, onde uma mãe que ele entrevistava através de um questionário pronto, visando ao diagnóstico do filho, ao o o N s q u b e i p op se 1 Jo d e o s s a d y A p e s s o a po r tr ás do di ag nó st ic o se despedir, comentou algo como: “Que pena! Achei que aqui poderíamos conversar a respeito daquilo que me aflige” Nesse momento, ele percebeu que o enfoque estava sendo dado ao questionário, às regras, ao diagnóstico, e não à pessoa que era a parte realmente importante em todo o processo. Este foi o primeiro passo de Rogers em direção a essa nova vi- são que hoje conhecemos como Abordagem Centrada na Pessoa, Há aqueles que possuem como referência a Abordagem Cen- trada na Pessoa e defendem o diagnóstico como forma de o pro- fissional poder se comunicar com outros profissionais que não tem como referência essa abordagem. Dessa forma, em minha opinião, estamos nos enquadrando em um modelo que coloca a pessoa em segundo plano e estamos nos curvando à pressão e ao padrão de outras referências. O mesmo respeito que deve- mos ter com colegas que possuem outras referências devemos saber exigir ao nos posicionarmos contra o diagnóstico da forma como este é realizado e mantido. Não podemos esquecer que o importante, na relação de aju- da, é a pessoa. Para mim, não agrada colaborar para que a pessoa do clien- te seja ou se sinta contaminada com rótulos, pois isto apenas colabora para que ela perca a crença em si e em sua condição de buscar um movimento de libertação interna. Crescimento está intimamente ligado à liberdade e o diagnóstico em nada colabora para isto. Interessa-me a pessoa que está por trás do diagnóstico. À pessoa que sofre, que tem sentimentos e histó- rias. À mim, agrada olhar o outro em sua unicidade, respeitá-lo em seus sentimentos e sentidos e não roubar o seu direito de caminhar em seu caminho. Quero ter a sabedoria de apenas facilitar condições favoráveis para que ele se desenvolva em sua própria direção. Este talvez seja o momento de nós, que acreditamos em uma forma de ajuda mais humana, nos unirmos em torno do não diagnóstico e buscarmos uma ajuda cada vez mais livre de re- gras, nos libertando também para irmos em direção à pessoa que sofre de uma forma verdadeiramente genuína. o o n s g u b e I p op se 1) Jo d e o s s e d y Grupos de Encontro Marcos Alberto da Silva Pinto 117 o O grupo de encontro pretende acentuar o crescimento pessoal e o desenvolvimento e aperfeiçoamento da comunicação e relações interpessoais, através de um processo experiencial. Rogers, 1994 Nos primeiros anos como estudante universitário, tive a opor- tunidade de conhecer os movimentos de grupo ou workshops de diversas abordagens e logo tive o interesse em me aprofundar no assunto. Resolvi conhecer as diferentes formas de se realizar esses gru- pos, submetendo-me a estar como cliente desses processos, e pude aprender através da minha própria experiência o que sig- nificava participar de um grupo. Como já disse, participei de grupos de diversas abordagens e de alguns que até hoje não sei definir quais eram ou se possuíam algum referencial teórico. Participei de muitos grupos com for- te tendência mística e outros onde se estimulava a sexualidade entre os participantes. Participei como cliente de mais de 40 grupos. Nesse período, eu já me identificava e estudava a ACP fora da universidade com o meu ex-professor Cláudio Bérgamo. Um dia, já cansado de parti- cipar de grupos por discordar de muitas coisas que eu presencia- va, falei pra ele que pensava em parar de participar, pois andava muito decepcionado coma forma como muitos deles aconteciam. Ele me disse: “Você não aprende coisas boas lá?” Respondi afirmativamente, mas disse que também aprendia muitas coisas que para mim não faziam o menor sentido. o J j u o d u a ep s o d n u s 119 Gr up os de En co nt ro 120 Ouvindo a minha resposta, ele me falou: “Se eu estivesse na sua pele, continuaria participando e abriria bem os olhos para aprender tudo aquilo que você vê de bom e abriria ainda mais os olhos para aprender tudo o que você enxerga como ruim, para nunca repetir...” Sua resposta repercutiu em mim e decidi continuar parti- cipando e aprendendo a como fazer e a como não fazer. Poder experienciar todos aqueles grupos me ajudou a construir o meu jeito de ser facilitador de grupos de encontro. Facilitei o meu primeiro grupo e desde 1996 tenho a parce- ria da amiga e psicóloga Esther Carrenho. Após ter sido facilitador de mais de uma centena de grupos, posso dizer que tenho aprendido mais a cada novo grupo e que quanto mais me sinto capaz de confiar no processo do grupo, livrando-me das minhas expectativas, mais me sinto inteiro e parceiro dos demais membros. Os Grupos de Encontro propostos por Rogers e sua equi- pe tiveram maior difusão a partir do início dos anos 60. Em 1970, Carl Rogers escreveu o livro Grupos de encontro, onde des- creve de forma minuciosa as suas ideias e teorias a respeito do assunto. Assim como em qualquer relação deajudasoba perspectivacen- tradanapessoa, partimosdo pressupostodequeogrupopossuicapa- cidade de se autodirigir e de se autoregular, e que o “papel” do facilitador deve ser favorecer condições especiais para que esse movimento aconteça. Para mim, confiar no grupo é algo funda- mental e óbvio, pois se ele é formado por pessoas e se cremos no potencial de desenvolvimento das pessoas, logo, fica evidente que só é possível facilitar um grupo partindo dessa confiança. Não há uma estrutura predefinida com relação ao número de participantes ou duração dos encontros e o grupo é soberano em suas escolhas para o seu desenvolvimento sejam lá quais fo- rem os caminhos escolhidos. O Grupo de Encontro pode acontecer em um final de sema- na ou por um tempo maior, onde se busca um clima de comu- nidade durante o período de encontro entre as pessoas. Não existe um número específico de pessoas para participa- rem de um Grupo de Encontro, sendo que esse número depen- derá da habilidade e disponibilidade dos facilitadores. Cada participante do grupo tem os seus próprios objetivos, expectativas, medos e dificuldades e, a partir daí, ser facilitador de um grupo de encontro é ter a capacidade de estar presente, aceitar, acolher e respeitar o ritmo de cada um e do grupo, livre das próprias expectativas e dos padrões preestabelecidos. Todos buscam naquele momento algo para si. Respeitá-los e facilitar as condições para que se expressem, sintam-se perdidos ou fiquem em silêncio é fundamental para esse processo. Tentar direcionar ou manipular o grupo para determinado caminho, em minha opinião, significa muito mais a ansiedade bem intencionada do facilitador em tentar ajudar do que uma ajuda propriamente dita, pois, para mim, qualquer forma de manipulação pode favorecer a pessoa a se distanciar do seu pró- prio processo, que é único, além de se poder passar a ideia de que o facilitador sabe qual é o melhor caminho para a pessoa e que a sua vida está nas mãos do outro e não em si mesma. Dessa forma, pode-se colaborar para que a pessoa acredite que não vale a pena crer em si mesma, Embora muitos profissionais que se identificam com a Abor- dagem Centrada na Pessoa vejam de maneira diferente, em mi- nha opinião não há uma forma específica de facilitar um Grupo de Encontro. Muitas pessoas enxergam esses grupos sob a pers- pectiva de que devam ser necessariamente “não estruturados” e “não diretivos”; esse último, a meu ver, um termo totalmen- te questionável e distorcido dentro da própria proposta dessa abordagem. A esse respeito, Maria Bowen nos diz: O J U O d U I Op so dn iu s) Gr up os de En co nt ro Eu me lembro com nostalgia dos tempos em que a equipe de facilita. dores da ACP (Jared Kass, Joanne Justin, Maurren Miler, Carl Rogers, Natalie Rogers, John Wood e eu) se juntava por quatro ou cinco dias antes de um workshop, e passávamos o tempo desenvolvendo um senso de comunidade entre nós, de maneira a termos coragem de planejar o não planejamento de um workshop. Existia um sentimento de aventu- ra, mistério e tomada de risco que era muito excitante para mim. As- sim, o tempo foi passando, pessoas começaram a publicar o que tinha acontecido nos workshops, participantes retornavam esperando repetir a vivência do ano anterior, workshops similares brotaram em outros lu- gares, expectativas foram criadas e a abordagem perdeu o sentido de novidade e espontaneidade para mim. O não planejar tornou-se uma estrutura, um modelo linear. Os problemas se tornaram previsíveis... (BOWEN, 1987). A minha intenção não é ensinar o leitor a fazer um grupo de encontro, mas sim tentar colaborar para que se possa refletir a partir desse texto no modo como cada um pode facilitar um grupo levando em conta o próprio jeito de ser, as próprias expe- riências pessoais e contextos. Mesmo que eu fosse capaz de explicar de forma minuciosa tudo o que eu já vivenciei em um Grupo de Encontro, ainda assim, de nada serviria para que o leitor se transformasse em um facilitador. Para facilitar grupos de encontro a partir da Abordagem Centrada na Pessoa, é importante que o facilitador busque se aproximar cada vez mais do seu próprio jeito de ser, levando também em conta, obviamente, os princípios facilitadores dessa abordagem. A forma de se facilitar um grupo de encontro é muito pessoal. O meu jeito de facilitar um grupo serve apenas pra mim. Facilitar um grupo de encontro nada tem que ver com criar um método pronto, seja através de proposta ou de não proposta. Seja através da aplicação ou não de alguma dinâmica ou exerci- cio. Facilitar um Grupo de Encontro vai muito além disto. Ser autêntico no processo significa que o facilitador tem a mesma liberdade dos demais em se manifestar, desde que assuma qualquer das suas percepções como suas e não como verdade do outro, sabendo aproveitar os seus conhecimentos e experiências, expressando-os através da fala, de sua atitude ou proposta com a grande diferença de que a soberania em acatar ou não qualquer proposta ou fala do facilitador é do cliente e do grupo. Maria Bowen nos diz: A ACP é uma abordagem que respeita as necessidades e o ritmo dos outros. Mas nós temos que operar dentro dos limites do tempo e, se a estrutura ou sugestão vai facilitar o grupo ou o cliente a fazer o que precisa ser feito dentro do tempo disponível, é importante criar aquela estrutura (ou sugestão) à disposição da pessoa ou do grupo. O que é feito com aquela estrutura ou sugestão, isto é um problema das pessoas envolvidas. O que importa é que o terapeuta ou facilitador não esteja apegado à estrutura e tenha condições de abandoná-la ou modificá- la, de acordo com as necessidades do cliente ou do grupo (BOWEN, 1987). Rogers cita no livro Grupos de encontro (1970), sob o título “Comportamento que creio não facilitar o andamento de um grupo”, alguns pontos onde não lhe agradam determinadas pos- turas de facilitadores de grupo, dentre eles: Não me agrada quando um facilitador apresenta exercícios ou ati- vidades por meio de declarações como esta: “Agora todos nós va- mos...” Isto é simplesmente uma forma especial de manipulação e é muito difícil ao indivíduo resistir-lhe. Se são introduzidos exercícios, penso que qualquer membro devia ter a oportunidade, claramente afirmada pelo facilitador, de decidir não entrar na atividade (ROGERS, 1970). o j u o d U 3 Op s o d n i s 123 G r u p o s de E n c o n t r o 124 Como membro do grupo, tenho todo o direito de propor qualquer coisa que eu sinta que possa ser facilitadora e da mes- ma forma o grupo tem todo o direito de aceitar ou não a minha proposta. Na minha visão, se eu abro mão de me expressar ou de pro- por algo em um grupo por temer ferir a Abordagem Centrada na Pessoa, estarei me ferindo e ferindo a pessoa ou grupo e, aí sim, estarei ferindo os próprios princípios da Abordagem Cen- trada na Pessoa, pois não estarei sendo verdadeiro com as pesso- as que fazem parte daquela relação. Muitas vezes, com medo de nos tornarmos “diretivos”, nos tornamos omissos ou passivos na relação de ajuda e vejo isto com profundo pesar. À esse respeito, Maria Bowen no diz: Eu vejo o modelo “rogeriano” não diretivo, de psicoterapia, muitas vezes como uma maneira de encobrir a passividade e o medo de co- meter erros; tirando o corpo fora. É fácil sentar-se em frente ao clien- te, balançando a cabeça e dizendo “Hummmmm, hummmmm” e não arriscando-se a engajar-se num nível real, de pessoa para pessoa (BOWEN, 1987). Frequentemente, tenho o hábito, como facilitador de gru- pos, de fazer duas perguntas para mim mesmo quando tenho algo a dizer ou a propor para alguém: Estou fazendo isto para quem e para quê? Em várias oportunidades, ao responder a essa pergunta pra mim mesmo, eu me percebi propondo algo apenas para me sentir útil, ou para tentar corresponder a alguma expec- tativa, ou ainda para não ter que lidar com o meu sentimento de impotência com relação àquela situação. É sempre bom quando eu tenho essa percepção, pois isto me dá a chance de ser honesto comigo mesmo e com o grupo. Lembro-me que, ao perceber- me inclinado a suprir a expectativa de um grupo, fui capaz de dizer: “Pode ser impressão minha, mas me sinto tão pressionado por esse grupo para ajudar essa pessoa que me peguei quase fa- zendo algo para corresponder a essa expectativa.” Tenho grande preocupação com que o ambiente do grupo seja de total segurança para os participantes e que exista um compromisso de sigilo. Nos grupos que facilito, tenho o hábito de, no início, salientar a importância de firmarmos esse com- promisso e deixando claro que entendo como sigilo tudo aquilo que for dito ou feito durante o grupo e que envolva qualquer outra pessoa que não seja a si próprio. Digo que se todos firmarem esse compromisso ficará mais fácil para cada um poder estar ali à sua maneira, de forma mais inteira. Esta é uma necessidade que eu tenho e que me ajuda a sentir que fiz a minha parte por tentar estabelecer esse compro- misso entre todos os membros, embora tenha claro que não tenho poderes de saber se todos cumprirão esse compromisso. Uma vez, em um grupo de psicoterapia que eu mantinha em meu consultório, uma das participantes levou uma garrafa de refrigerante para comemorar uma conquista. Ao término do grupo, o marido dessa pessoa foi buscá-la e, como os mem- bros daquele grupo tinham intimidade com o marido, brin- caram com ele, mencionando que a sua mulher havia levado uma garrafa de refrigerante para o atendimento. No encontro seguinte, a mulher demonstrou estar mui- to triste com o grupo e nos contou que havia prometido ao marido, há algum tempo, que não beberia mais refrigerante, embora adorasse beber, em função de um problema de saúde e por ter tido uma grande conquista sentiu vontade de come- morar levando uma garrafa de refrigerante, pois pensou que lá poderia comemorar bebendo o refrigerante, pois havia um compromisso de sigilo. O grupo, por não saber do “pacto” que essa mulher tinha OJ jJ uo dU 3 Op so dn us ) 125 G r u p o s de E n c o n t r o 126 grande problema para aquela mulher. com o seu marido, resolveu brincar com ele, o que gerou E À Esse fato fez com que eu compreendesse ainda mais a im. portância de não mencionar absolutamente nada que ocorra em um ambiente de psicoterapia ou de grupo, pois entendi que mesmo que eu julgue que aquele fato não tenha nenhum signi- ficado, jamais poderei saber se esse meu julgamento está corre- to. O que pode parecer sem importância alguma pra mim pode ter enorme importância para o outro. Tenho total confiança em que, num clima de liberdade e respeitando o ritmo de cada pessoa, esta poderá se aprofundar O tanto que desejar, e tenho a convicção de que, se pra ela for difícil lidar com algo após essa experiência, ela saberá buscar apoio. Acredito que se sentindo livre e respeitada em um ambiente de grupo, a pessoa tende a respeitar-se também em seu ritmo, limites, dificuldades e necessidades. Satisfaz-me o fato da pessoa estar lá do seu próprio jeito, pois tenho grande convicção de que só por estar lá e pelo simples fato de estar viva, muitas coisas acontecem com ela assim como também acontecem comigo. Nesse sentido, mesmo que aparen- temente à pessoa não esteja participando do grupo, de alguma, forma ela estará em movimento e em seu processo de constante atualização. Perguntas e Respostas Esther Carrenho Márcia Tassinari Marcos Alberto da Silva Pinto 127 Como a ACP trabalha a ludoterapia? Esther Carrenho “As crianças conseguem expressar com mais pureza e simplicidade do que os adultos..” Dircenéa de Lazzari Corrêa Sempre que alguém pergunta em supervisão, como a ACP tra- balha a ludoterapia, vêm à minha memória alguns fatos da mi- nha infância e começo a refletir em como gostaria de ter sido atendida caso tivesse ido para algum psicólogo. E a primeira resposta que me vem à mente é que gostaria de ser notada, ser reconhecida e valorizada pelas minhas ideias, pensamentos e comportamentos. Claro que esses desejos refletem o que me faltava enquanto criança. Cada criança tem uma singularidade. Ninguém é igual a ninguém. Nem a criança. Talvez o maior cri- me que se comete contra a criança em atendimento psicológico seja o de classificá-las e generalizá-las como se elas não tivessem uma história de vida única. Quando os pais ou responsáveis buscam ajuda para uma criança, no mínimo eles estão preocu- pados e quem sabe sofrendo e sem saber como resolver o que entendem que é um problema. À criança, em geral, também está sofrendo. Se não sofre por si mesma, sofre em perceber que seus pais sofrem por causa dela. se js od so W e se ju nb ia d 129 P e r g u n t a s e R e s p o s t a s A primeira coisa que um profissional precisa saber quando se compromete a atender uma criança em ludoterapia é algo sim- ples. A criança não é um adúlto, mas nem por isso deixa de ser uma pessoa única, que merece todo respeito e interesse genuíno pelo profissional. Atualmente, já temos muito material bem elaborado dire- cionado para ludoterapeutas. Destaco aqui os livros de Virginia Mae Axline, que conviveu com Rogers e desenvolveu um tra- balho de psicoterapia para crianças, praticando toda a teoria da Abordagem Centrada na Pessoa. Considero também de muita importância o capítulo sobre ludoterapia de Dircenéa de La- zzari Corrêa (Klóckner, 2009) e o de Anita Bacellar (Bacellar 2009). Mas quero listar aqui algumas coisas que ao meu ver são fundamentais no atendimento infantil. Em primeiro lugar, o foco principal é o que a criança apre- senta, fala ou revela na interação terapêutica. É importante ou- virmos as queixas dos pais e/ou da escola, mas o interesse deve ser voltado para a queixa ou aquilo que a criança apresenta, pela fala ou brincando, como dificuldade. O que foi relatado pelos pais será falado com a criança, mas deverá receber do profissio- nal a mesma importância dada pela criança. meme Ed ceia | Lembro-me de uma criança, um menino de oito anos, que | amãeea professora achavam que sofria por ter poucos amigos na | escola e passar muito tempo sozinha. Quando abordei o assun- ' to, ele respondeu imediatamente: “Eu tenho amigos, mas gosto de ficar sozinho.” E na verdade, o que se comprovou é que | ele estava cada vez mais sozinho, porque não se sentia amado | pelo pai, por não gostar de futebol. Quando o pai soube disso, | num dos nossos encontros, mudou sua postura e o menino em | | consequência se tornou mais sociável. / A proposta da ludoterapia na Abordagem Centrada na Pessoa é ajudar a acriança a se ajudar. É facilitar para que ela encontre seu próprio caminho dentro da sua realidade. O contrato é feito com os pais, obviamente, mas o profissional não está lá para fazer parte do quadro de pessoas que tentam moldar a criança de acordo com o que acham correto. A psicoterapia de crianças tem como proposta fortalecer o que é peculiar e específico da- quela criança e que faz sentido para ela. Enfim, é um trabalho que deverá fortalecer o jeito de ser da criança. Qutra confusão que se faz pertinente à ACP, em relação a atendimento infantil, é que, por não se usar o controle e a di- retividade no contexto psicoterapêutico, acredita-se também que não há necessidade de providenciar brinquedos e todos os recursos possíveis para que a criança possa escolher o que quer fazer e se sinta bem. Da mesma forma que não se entra com um script pronto para o atendimento de um adulto, também não se entra com o atendimento planejado para a criança. Ela é quem deve escolher. Mas para que ela escolha, é necessário ter material disponível e ainda deixá-la livre para que ela traga seu próprio material, se assim quiser. Uma psicóloga que faz parte do meu grupo de supervisão tem seu consultório do lado de um terreno grande com jardim e gramado. Ela deixa as crianças livres para escolherem. E muitas crianças já escolheram brincar na grama, mexer na terra do jar- dim. Uma menina diagnosticada com um leve grau de autismo, quando viu a cozinha, sugeriu fazer alguma comida juntas. A terapeuta topou e foi um dos atendimentos onde a garota mais se expressou. Tanto pela fala quanto pelo que iam fazendo. A dificuldade que se apresenta quando se trabalha com crianças com essa liberdade é o relacionamento com os pais. Muitos pais trazem os filhos para a ludoterapia com o desejo de que o psi- coterapeuta se torne alguém que vá mudar a criança de acordo com o que os pais acham correto. Penso que os pais deveriam s e j s o d s a y 9 s e j u n b i a d 131 Pe rg un ta s e Re sp os ta s trazer uma criança para a psicoterapia esperando que o psicólo- É go os ajude a enxergar melhor quem é o seu filho. Quando isto não acontece, cabe ao psicólogo esclarecer bem qual é o alvo da- quele trabalho e aos pais cabe escolher se querem levar adiante ou não a proposta psicoterapêutica. Outra dúvida que sempre surge, na supervisão referente ao atendimento infantil, é a questão dos limites necessários quanto ao horário, determinadas regras na sala e guardar os brinquedos. À questão é a mesma do atendimento de adultos. Não controlar o que vai acontecer no atendimento não significa permissivi- dade para algum comportamento que traga danos para os mó- veis ou qualquer outro elemento da sala. E muito menos algum comportamento que cause mal estar e incômodo para o psico- terapeuta. E desde o início, no primeiro atendimento, é impor- tante que a criança saiba que algumas coisas são necessárias para a ordem e o bom andamento do trabalho do profissional para outras pessoas. Os brinquedos, a sucata e todo material possível deve ficar à disposição da criança. Não ter diretividade e controle não signi- fica não promover os recursos para que a criança possa escolher o que quer fazer ou com o que quer brincar. Ela pode ficar livre para trazer o que quiser de sua casa, mas nada melhor do que ela perceber que o profissional cuida do ambiente e dos materiais que ficarão disponíveis para ela por algum tempo na semana. Enfim, é preciso que a criança sinta que o psicoterapeuta está realmente interessado nela e a aceita. E num clima de aco- lhimento haverá a facilitação para que a criança expresse seus conteúdos internos e os reintegre em suas vivências, construin- do dessa forma sua autonomia. Qual a diferença entre psicoterapia, orientação e aconselhamento? Márcia Tassinari A etimologia das palavras psicoterapia e terapia vem de thera- peuen, palavra grega que significa cura e iniciação, mas também Hherapóm, que significa aquele que dirige o carro do guerreiro. O sherapón limpava as armas (lanças), o escudo e as armaduras do guerreiro. A primeira forma de psicoterapia surgiu no século V a.C. com o sofista Antífon, que propôs a Techné Alupias (arte de ven- cer a depressão ou o tratamento das paixões). Antífon criou o método de techné alupias, um tratado sobre como se elimina a dor. Criou um alojamento para encontrar com as pessoas e os resultados eram alcançados pelo dia logon, com as palavras, por meio do diálogo. Aconselhamento Psicológico. No que diz respeito à etimo- logia do aconselhamento não diretivo, a palavra conselho nos remete a consilium, que significa com/unidade, com/reunião. Essa significação é importante, pois supõe a ação de duas ou mais pessoas voltadas para a consideração de algo. É a própria no- ção de um conselho: várias pessoas reunidas para examinar com atenção, olhar com respeito, para deliberar com prudência e jus- teza (SCHMIDT, 1987). Rogers introduziu a dimensão clínica no aconselhamento psicológico, ao propor mudanças em três eixos: - Do problema para a pessoa - Da avaliação/medição para a relação - Da solução/produto para o processo de mudança A partir desse tipo especial de aconselhamento, da gravação das entrevistas de aconselhamento e das pesquisas a respeito da eficácia da terapia centrada no cliente, Rogers contribuiu, de maneira significativa, para que os psicólogos pudessem também s e j s o d s e y e s e j u n b i s d 133 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 134 praticar a psicoterapia, prática reservada aos médicos de forma- ção psicanalítica. ApartirdeRogers,adiferençaentrepsicoterapiaeaconselhamen- to ficou meio tênue e o próprio Rogers, em entrevista, respondeu: “Quem decide se é psicoterapia ou aconselhamento é o próprio cliente: quando ele tem uma questão pontual e não tem interesse em reorgani- zar sua personalidade, ele está pedindo aconselhamento e eu respondo como conselheiro, mas quando ele solicita reflexões a respeito de sua vida, sem uma questão específica, ele está solicitando psicoterapia e eu respondo como psicoterapeuta.” Essa resposta de Rogers nos indica que não existe diferença conceitual entre uma e outra forma de intervenção, ainda que as intenções sejam distintas. Como a ACP trabalha com a “transferência”? E a “contratransferência”? Marcia Tassinari Essa pergunta sempre aparece nas aulas e palestras. É como se os alunos buscassem a “tradução” dos conceitos da Psicanálise (mais estudada na graduação e mais conhecida na sociedade) para outras fundamentações teóricas. Freud, inicialmente, ficou atento à qualidade relacional cria- da entre ele e seus pacientes, entretanto, como o modelo criado por ele entendia o profissional como um expert ou especialis- ta e não como uma pessoa, não era possível falar de relaciona- mento de “pessoa a pessoa”. Transferência e contratransferência são conceitos (pertencem à teoria) e não fenômenos, portanto, não têm existência concreta fenomenal. Freud precisou criar um construto que desse conta do fenômeno da relação e as- sim hipotetizou que toda e qualquer reação do paciente para o analista estava no lugar de outra, no caso, das figuras parentais. Assim, o paciente transfere (positiva ou negativamente) senti- mentos, desejos e atitudes que vivenciou nas primeiras relações parentais. Mais tarde, Freud deu-se conta de que o fenômeno relacional era um fenômeno de mão dupla, isto é, o analista, eventualmente, tinha sentimentos, desejos e atitudes em relação a seu paciente que, na verdade, eram de outras relações, criando o conceito de contratransferência. Em um primeiro momento, Freud considerou a contratransferência inadequada, pois indi- cava um grau de imaturidade por parte do analista. Pois bem, e a Abordagem Centrada na Pessoa? Rogers criti- cava a postura formal e distante de Freud e focalizava realmente a importância do vínculo relacional entre cliente e terapeuta. Rogers propõe, ao contrário de Freud, uma relação profissional e pessoal, ressaltando a importância da consideração (carinho) pelo outro, sem avaliações, sem impor nenhuma condição. Outro aspecto presente na ACP e que tem causado tantas distorções refere-se à atitude de congruência do terapeuta. Esse terapeuta não usa máscaras nem artificialismo: ele não abdica de sua condição de pessoa inteira, em estado de acordo interno para promover um clima seguro e de confiança para que o cliente possa se entregar. Por outro lado, podemos ver que tanto os conceitos freudianos quanto as atitudes rogerianas apresentam interfaces, pois estão inseridos em uma relação e referem-se aos afetos que são construídos nessa relação. Assim, podemos entender certa confusão, mas precisamos localizar de onde eles partem. Marcos Alberto Durante toda minha vida profissional, estive distante da vida se js od so y e se ju nb io d 135 Pe rg un ta s e Re sp os ta s acadêmica por ter escolhido ser psicoterapeuta em tempo inte- gral, mas, mesmo assim, percebo que o tempo que as universi- dades têm dedicado a falar da Abordagem Centrada na Pessoa continua muito pequeno. Desde os tempos de minha passagem pela universidade, nos anos 80, já era assim. Felizmente, no meio da maioria de professores psicanalistas e comportamen- tais, tive a sorte de ter alguns professores humanistas, dentre eles um que utilizava essa abordagem como referência profissional. Foi com ajuda dele, o então professor Cláudio Bérgamo, que iniciei os meus estudos (principalmente fora da universidade) dentro dessa referência teórica. Infelizmente, por sermos minoria, temos menos profes- sores universitários atuando nas universidades, o que faz com que a nossa abordagem seja menos difundida. Os forman- dos saem da universidade com o referencial teórico da psica- nálise ou da psicologia comportamental, gerando novos pro- fessores dessas abordagens, tornando-se assim uma grande bola de neve. Escolhi fazer esse comentário para falar que, em fun- ção disto, saímos das universidades contaminados por essas outras abordagens e isto acaba por dificultar a compreensão do funcionamento da ACL, por ela ter um jeito totalmente oposto ao que nos habituamos a ver durante o nosso tempo de formação. Por diversas vezes, nos cursos que esporadicamente ministro, já me perguntaram o que é o equivalente a “transferência” em nossa abordagem. Perguntam-me a respeito do que é equivalen- te a vários conceitos psicanalíticos. Confesso que esse tipo de pergunta sempre me deixa surpreso e costumo dizer, em tom de brincadeira, embora esteja falando sério, que na ACP não há nada equivalente a esses termos e a essas posturas, pois, se fosse assim, essa abordagem não precisaria existir, pois estaria apenas dando outros nomes aos conceitos já existentes na psicanálise e por esse motivo uma abordagem “paralela” não seria necessária. Em um atendimento demonstrativo de Carl Rogers, intitu- lado Entrevista com Glória, de 1965, em determinado momen- to, há o seguinte diálogo: Cliente: Sim. O senhor sabe o que eu estava pensando agora? Eu — uma pessoa insignificante — agora de repente, estava conversando consigo, pensei, puxa, como posso conversar tão bem com o senhor, gostaria que o senhor me aprovasse e eu o respeito, e é o que sinto falta, meu pai nunca me falou como o senhor está me falando. Quero dizer, eu gostaria de dizer: “Puxa, gostaria de ter o senhor como pai.” Nem sei por que cheguei a pensar nisso. Terapeuta: Você até me parece filha minha. Muito amável. Mas você sente falta realmente é do fato de não ter conseguido ser franca com o seu próprio pai (ROGERS, 1986). Ao término desse atendimento, Rogers faz um breve relato da Abordagem Centrada na Pessoa para o público e faz o se- guinte comentário: Os psicanalistas de plantão talvez digam neste trecho que ali estaria um caso clássico de transferência e contratransferência, mas se apegar a isto é diminuir um momento tão íntimo e profundo que só eu e Glória sabemos o que significou. Pelo que entendo, a Abordagem Centrada na Pessoa não questiona se Freud estava certo ou errado em seus conceitos. Também não se questiona se existe ou não a transferência, a contratransferência ou qualquer outro mecanismo estudado pela psicanálise. A grande questão, a meu ver, é que eu me apegar a esses mecanismos não me auxilia em absolutamente nada na rela- ção de ajuda, pois, se estiver atento a esses mecanismos, provavel- mente ficarei desatento à relação e à interação com o cliente, que para mim é o que facilita o processo de crescimento da pessoa. Ficar preso a nomes ou a mecanismos me limita nessa relação s e j s o d s e y e s e j u n b i a d 137 Pe rg un ta s e Re sp os ta s e me impede de estar inteiro com a pessoa. Não me importa o nome ou o mecanismo, me importa a interação, o envolvimen- to, a capacidade em compreender essa pessoa a partir dela, a ca- pacidade de ser autêntico em minhas expressões e a capacidade de ter um acolhimento de forma incondicional. Ainda que Freud esteja certo e que exista uma relação de transferência no processo psicoterápico, a Abordagem Centrada na Pessoa lida com ela da mesma forma que lida com qualquer acontecimento, sentimento ou expressão da pessoa. Em outras palavras, não importa para a nossa abordagem se há ou não qual- quer um desses mecanismos por parte do cliente na relação. Isto não tem importância nenhuma para o processo da psicoterapia e da tentativa de facilitar condições para o seu crescimento. Rogers dedicou grande parte de um capítulo do livro Tera- pia centrada no cliente para falar desse assunto, na tentativa de dirimir qualquer dúvida a respeito do tema. Falando da transfe- rência, ele nos diz: O terapeuta lida com isso da mesma forma como lidaria com atitudes similares dirigidas a outras pessoas. Parafrascando e modificando a fra- se de Fenichel para adaptá-la a essa abordagem seria possível dizer: “A relação do terapeuta centrado no cliente à transferência é a mesma em relação a qualquer outra atitude do cliente: ele procura compreender e aceitar” (ROGERS, 1951). Em minha opinião, o importante é não perdermos o foco, o envolvimento com a pessoa. E se estivermos preocupados em en- tender mecanismos ou conceitos, de certo nos perderemos dessa pessoa com toda a sua riqueza de sentimentos e nos perderemos dela em meio às explicações, mesmo que bem intencionadas, que servirão muito mais para a satisfação do psicoterapeuta em se perceber e se manter como alguém com poderes de desvendar o “inconsciente” do outro, mantendo-se em uma posição de su- perioridade em relação à pessoa, do que para facilitar condições de ajuda a essa pessoa, e essa postura de observador em nada contribui para esse processo de crescimento. O que fazer quando percebo que meu cliente não está crescendo? Márcia Tassinari A avaliação do psicoterapeuta ideal deveria estar em sintonia com seu cliente, pois, em se tratando de uma relação igualitá- ria, O que um vivencia, o outro vivencia em alguma intensidade (nem sempre na mesma). Portanto, se tenho a sensação de que meu cliente não está crescendo, devo convidá-lo a avaliar essa minha sensação como hipótese a respeito dele. Nessa aborda- gem, é o cliente que sabe melhor dele. Marcos Alberto Antes de tudo, é importante ressaltar que uma das inúmeras e grandes diferenças da ACP para as demais abordagens psico- terápicas é que em nossa abordagem o psicoterapeuta não se enxerga como um ser superior na relação, ou seja, o óbvio é que é impossível eu ter certeza de forma tão clara a respeito de algo nessa pessoa, pois tenho convicção de que nessa relação de ajuda eu sou “apenas” um companheiro. Um companheiro ativo e atuante, mas ainda assim um companheiro que não tem poderes de saber da pessoa mais do que ela mesma. DÇ Carl Rogers escreveu inúmeras vezes que apenas a própria pessoa e ninguém mais, além dela, tem de fato a capacidade de saber o que está se passando nela, assim como as suas motiva- s e j s o d s a H e s e j u n b i o d 139 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 140 ções e intenções. Para expressar essa ideia, em um de seus livros, ele dá um exemplo a respeito de si mesmo: (...) apenas uma pessoa (pelo menos enquanto eu estiver vivo e talvez para sempre) pode saber que eu procedo com honestidade, com apli- cação, com franqueza e com rigor, ou se o que faço é falso, defensivo e fútil. E essa pessoa sou eu mesmo (ROGERS, 1961). Muitas vezes, ouvindo outros profissionais, sinto que temos a tendência de acreditar muito mais no nosso potencial de “per- ceber algo no outro” do que no de realmente crermos no poten- cial dessa pessoa. De todo modo, quando ouço uma pessoa genuinamente, tendo uma consideração incondicional positiva, empática, e sendo congruente, a tendência é que em muitas situações eu esteja tão concentrado e em sintonia com essa pessoa que eu posso acabar sentindo algo na fala, na expressão ou nas atitudes da sua vida sob um ângulo diferente do dela. Em minha opinião, se eu deixar de expressar essa percepção ou sentimento, serei omisso e trabalharei a favor do mito da não diretividade, expressão já discutida neste livro e que o próprio Rogers se desculpou por ter criado, embora não tenha a certeza de ter sido o seu autor. “Nunca consegui saber quem inventou a expressão não di- retiva. Se fui eu, peço desculpas, embora fosse descritiva, sem dúvida, de uma certa fase inicial. “ (ROGERS, 1975) Como já disse, através da psicoterapia, muitas vezes temos condições de, por estarmos vivendo a relação em sintonia com a pessoa de forma empática, termos algumas percepções do outro que ele ainda não tenha tido. Pode ser que ele não a tenha por não ter enxergado aquilo até aquele momento, ou por realmente aquilo não ter nada que ver com ele, mas sim comigo, com as minhas expectativas ou com a dificuldade de não interpretarmos a pessoa. Não me agrada nenhum tipo de expressão vinda do psicote- rapeuta como sendo uma verdade do outro. Não creio que te- mos poderes para isto e tenho a convicção de que a única pessoa a saber de fato a respeito de si é ela mesma. No entanto, estando em sintonia com a pessoa de forma em- pática, penso que seja um direito do outro saber o que está se passando em mim em todas as questões que tenham a ver com ela. Não me agrada dizer ao outro as minhas percepções como verdade, mas também não me agrada a possibilidade de guardar as percepções que eu tenha com relação à pessoa, pois me senti- ria desonesto e omisso se assim o fizesse. Algo que me serve e sempre me ajuda quando tenho alguma percepção ou sentimento com relação à pessoa que atendo é o di- reito de poder me expressar com o cuidado de deixar sempre cla- ro que é apenas uma percepção, e não uma verdade do outro. A esse respeito, Gendlin nos diz: O terapeuta pode ser mais ativo e, ao mesmo tempo, apresentar menos imposição e ameaça, se se exprimir — suas imaginações e sentimentos, os desejos e fatos que se revelam nele — desde que o faça clara e explici- tamente, como afirmações a respeito de si mesmo ou de acontecimen- tos que no momento se revelam em seu íntimo. Desta maneira ele se entrega mais abertamente, embora não se imponha a vivência do clien- te. Fala de si. Não impõe nem força coisa alguma no espaço vivencial do cliente; não confunde acontecimentos nele com acontecimentos no cliente (GENDLIN, 1967). Muitas vezes, quando isto acontece, acaba sendo algo facili- tador na pessoa, pois, de alguma forma, eu consegui através des- sa sintonia perceber algo que estava nela e que, por algum mo- tivo, ela ainda não percebia em si. Outras vezes, eu também fui capaz de expressar a minha percepção ou sentimento com relação a algo nessa pessoa e isto não fez nenhum sentido para ela. Nes- se caso, prefiro acreditar que a minha percepção tinha a ver com as s e j s o d s o H e s e j u n b i o d 141 P e r g u n t a s e R e s p o s t a s 142 minhas expectativas e não com ela. Tenho confiança no outro! De algum modo, aprendemos na universidade ou através de outras abordagens que temos sempre razão. Já ouvi colegas exclamarem: “Ele está negando esse conte- údo!” Ou: “Ainda não chegou o momento de ele perceber!” Já ouvi clientes dizerem que, se o psicoterapeuta falou, é porque deve ter razão, pois é um especialista! Não quero entrar aqui no mérito de a pessoa estar ou não negando algo. A grande questão para mim é que, mesmo que eu tenha razão e que ela ainda não esteja no momento de perceber tal coisa, se confio de fato no processo da pessoa, isto significa que é importante que eu tenha convicção de que, se isto de fato for importante em outro momento, ela o irá perceber no seu ritmo e da sua forma. Falar de uma percepção minha com relação à pessoa como sendo uma verdade dela não só não a ajuda, como também me torna prepotente. À esse respeito, Rogers nos fala, dando um exemplo do seu trabalho com grupos: Não aceito bem, como facilitador, uma pessoa que, com frequência, faz interpretações dos motivos ou causas do comportamento dos mem- bros do grupo. Se são inexatas, não ajudam em nada; se são profun- damente exatas, podem despertar uma defesa extrema ou, pior ainda, despir a pessoa das suas defesas, deixando-a vulnerável e, possivelmen- te, magoada como pessoa, especialmente depois das sessões de grupo terminarem. Afirmações como: “Tem de fato uma grande hostilidade latente” ou “Penso que está compensando-se da sua falta essencial de masculinidade” podem perturbar o indivíduo durante meses, causan- do-lhe grande falta de confiança na sua capacidade de compreender a si próprio (ROGERS, 1970). Como já mencionei, tenho confiança na pessoa e na sua ten- dência ao crescimento e isto me tranquiliza na relação terapêuti- ca, pois, como companheiro nesse processo, sinto-me à vontade para me expressar como alguém que está totalmente disposto a caminhar junto com essa pessoa que busca ajuda. Dessa forma, sinto-me à vontade para falar das minhas percepções, deixando claro que são minhas e que posso estar enganado e, a partir daí, ter a capacidade de continuar confiando nessa pessoa mesmo quando o que eu digo não causa nenhuma ressonância nela e ela não identifica a minha fala a seu respeito. É imprescindível, a meu ver, ter a confiança e a humildade em respeitar sempre a soberania da pessoa em seu processo. É possível usar alguma técnica no atendimento em ACP? Márcia Tassinari Se entendermos técnica na concepção grega de techné, ou seja, como arte ou artesanato, então a ACP seria uma técnica em si mesma. Entretanto, considerando a utilização atual de técnica como algo a ser aplicado no outro, com uma atitude de especia- lista, então a ACP não tem uma técnica. Na verdade, a técnica está sempre a serviço das atitudes promotoras de crescimento. Isto significa que o psicoterapeuta pode fazer qualquer coisa desde que atenda às condições necessárias e suficientes para a mudança terapêutica da personalidade. Cada um precisa desen- volver seu “jeito de ser” para promover um clima psicológico se- guro para o cliente ou grupo se abrir ou se entregar à descoberta de todas as suas possibilidades. Marcos Alberto Acho importante, antes de qualquer coisa, termos a compreen- se js od sa y 9 se ju nb io d 143 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 144 são do que entendo como técnica. É óbvio que, quando falamos dessa abordagem, nos referimos a um jeito de ser e a um con- junto de crenças que temos, de que, a partir de determinados princípios, poderemos proporcionar ajuda que pode vir a facili- tar as condições de crescimento ao cliente. À partir daí, penso que determinadas técnicas se contradi- zem com essa abordagem, pois se utilizo, por exemplo, uma interpretação, uma técnica de condicionamento ou outra qual- quer que roube da pessoa o seu direito a sentir-se e ser livre ou que a violente de modo que eu passe a mensagem para a pessoa que eu sei mais dela do que ela mesma, fica impossi- vel utilizá-las por uma questão filosófica de visão de mun- do e de visão de pessoa. Se eu creio de fato na importância da soberania da pessoa em se tratando do seu interesse em desenvolver-se e na capacidade da pessoa em se autodirigir, fica ilógico eu ter alguma postura que contradiga essa crença. Por ourro lado, quando falamos de algumas técnicas, como os exercícios psicológicos, embora exista grande resistência por parte de vários profissionais dessa abordagem, a meu ver, desde que bem fundamentadas, aplicadas de forma espontânea, e com alguns cuidados para que não sejam perdidos os princípios em que acreditamos, elas podem contribuir e complementar a rela- ção de ajuda, desde que isto faça sentido para o psicoterapeuta que a propõe e principalmente para o cliente, que é o maior interessado nesse processo. Meu objetivo é poder expressar a minha opinião a respeito desse segundo modelo de técnicas ou de “exercícios” e a possibi- lidade de sua utilização dentro da visão centrada na pessoa. Já citei anteriormente, no capítulo onde exponho a minha visão a respeito dos princípios da Abordagem Centrada na Pes- soa, mais precisamente nas considerações finais, alguns mitos que, de certa forma, a meu ver, têm prejudicado o desenvolvi- mento dessa abordagem. A partir da confusão que se faz com o mito da não diretivi- dade, criou-se outro mito, que é o da proibição de utilizarmos esse tipo de técnica. Gl A expressão não diretivo foi usada por Rogers no início da formulação dessa teoria e a sua intenção era dizer que quem conduzia o andamento da relação psicoterápica era o cliente, e não o psicoterapeuta, em função da nossa crença no pop cípio de tendência atualizante e que, sob enndições especiais, em um ambiente onde houvesse por parte do psicoterapeuta uma consideração empática, congruência e uma consideração incondicional positiva, em um clima favorável, a pessoa teria maiores condições de buscar novas alternativas para o seu de- senvolvimento, de forma que pudesse sentir-se mais saudável e em harmonia consigo mesmo e consequentemente com o seu meio. Essa expressão servia para designar que o “poder” na re- lação psicoterápica era do cliente, e não do psicoterapeuta, que, na relação, era “apenas” um companheiro que buscava facilitar esse contato da pessoa consigo mesma. Com o passar do tempo, a expressão não diretivo foi rece- bendo outra conotação por parte das pessoas que utilizavam a Abordagem Centrada na Pessoa como referência e acabou por se distorcer, dando a impressão de que o psicoterapeuta não podia intervir, sugerir ou propor nada para a pessoa. o Uma vez, em um Fórum Brasileiro da Abordagem Centra- da na Pessoa, um profissional apresentou um trabalho de bio- danca e, antes da apresentação, fez questão de ressaltar que aqui- lo nada tinha que ver com a ACP. Ão término da apresentação, abriu-se uma roda para que pudéssemos conversar e perguntei à pessoa o motivo pelo qual ela achava que aquela atividade não tinha nada que ver com a ACP. À pessoa não soube me responder. Uma sensação que tenho é que, muitas vezes, somos passivos € tentamos muito mais nos espelhar na forma como Carl Rogers se js od so y 9 se ju nb ie d 145 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 146 fazia do que assimilarmos suas propostas de maneira que, a partir delas, tenhamos a liberdade de as utilizarmos de forma que combine com o nosso próprio jeito de ser. Prezamos acima de tudo a liberdade, mas, paradoxalmente, nos engessamos na for- ma como Rogers fazia e o tratamos como um “deus”. Tenho convicção de que, se Rogers tivesse ao longo da vida se utilizado de algumas técnicas, elas teriam perdido a conotação de algo “errado” dentro dessa abordagem e seriam utilizadas de forma natural, Durante sua vida, em função de suas ideias inovadoras, Ro- gers foi muito criticado por opositores, mas percebeu que, mui- tas vezes, as pessoas que faziam mais mal a ele e à ACP eram os seus “fiéis” seguidores: No decurso das duas últimas décadas, habituei-me a ser constante- mente atacado, mas as reações às minhas ideias continuam a surpre- ender-me. Do meu ponto de vista, julgo que sempre propus as minhas ideias como hipóteses de trabalho, para serem aceitas ou rejeitadas pelo leitor ou pelo estudioso. No entanto, por diversas vezes e em diferen- tes lugares, psicólogos, terapeutas e pedagogos atacaram os meus pon- tos de vista com críticas cheias de violência e desprezo. O seu furor atenuou-se um pouco durante os últimos anos, mas renovou-se entre Os psiquiatras, pois alguns deles viam na minha maneira de trabalhar uma grande ameaça aos seus princípios mais queridos e mais firme- mente admitidos. E talvez as críticas tempestuosas encontrem um pa- ralelo no dano causado por alguns “discípulos”, sem sentido crítico e sem espírito inquisitivo, pessoas que adquiriram para si próprias algu- ma coisa de um novo ponto de vista e que partiram em guerra contra toda a gente utilizando correta ou incorretamente o meu trabalho e certas teorias minhas. Tive sempre dificuldades em saber quem me ti- nha feito um mal maior, se os meus “amigos”, se os meus adversários (ROGERS, 1961). A Abordagem Centrada na Pessoa não possui uma técnica, mas sim alguns princípios e uma proposta de postura, mas ao mesmo tempo não é contrária à utilização de técnicas, como os “exercícios de psicoterapia”, desde que haja alguns cuidados especiais, que façam com que os princípios básicos dessa abor- dagem não sejam feridos. O que há em nossa abordagem, a meu ver, é um cuidado para que a técnica não seja a prioridade da relação ou que ela não exista para satisfazer ao psicoterapeuta. Se existir algum tipo de técnica, a meu ver, ela jamais pode ser utilizada por imposi- ção do psicoterapeuta, mas pode ser sugerida caso o profissional a conheça e sinta de alguma forma que talvez essa sugestão seja útil a pessoa. A técnica pode ser utilizada desde que seja con- sentida pelo cliente e desde que o profissional busque seguir o ritmo dessa pessoa, e não o contrário, pois em um atendimento psicoterápico o cliente é a prioridade e é ele quem dá o caminho do processo. Em se tratando de técnica Rogers nos diz: Em minha opinião, nada do que acontece com verdadeira espontanci- dade pode ser considerado um “truque”. Por isso pode utilizar-se a re- presentação de papéis, o contato corporal, o psicodrama, os exercícios como o que descrevi e vários outros processos quando parecem expri- mir o que se está realmente sentindo na ocasião (ROGERS, 1970). Assim como Rogers, entendo que, se há uma proposta de forma espontânea, ela perde a conotação de técnica e, em con- trapartida, se sinto que de alguma forma uma proposta possa ajudar o cliente e me omito em apresentá-la em função da “não diretividade” eu estarei sendo técnico, pois me omitirei para cumprir determinado padrão. Não há uma verdade absoluta na Abordagem Centrada na Pessoa e desde que eu tenha em mim os princípios propostos por essa abordagem é imprescindível que eu respeite a minha espontaneidade e o meu jeito de ser. Muitas vezes, em nome dessa “não diretividade”, nos tornamos rígidos ou manipuladores. A imposição da falta de estrutura s e j s o d s a H 8 se ju nB is da 147 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 148 passa a ser uma grande estrutura e muitas vezes defendemos a ausência de técnica com tanto autoritarismo por acharmos que o uso de técnica é algo invasivo e autoritário. A meu ver, autoritário é sermos rígidos com relação a qualquer coisa, é nos impormos à pessoa, é acreditarmos que a nossa verdade publicações nos dizem a respeito da herança religio- sa de Rogers. Acredito mesmo que muito dessa realidade ajudou a determinar os rumos, as crenças e as pesquisas que Rogers buscou no trajeto de toda sua vida. Sua família Rogers nasceu no dia 8 de janeiro de 1902, em Oak Park, cidade dos arredores de Chicago. Morreu em 4 de fevereiro de 1987, em La Jolla, na Califórnia, em consequencia de uma fratura do fêmur (hetp://www.rogeriana.com/biografia.htm). Tinha deixa- do instruções de que não queria viver artificialmente ligado a máquinas e que estas deveriam ser desligadas após três dias. Seu pedido foi realizado. Foi o quarto de seis filhos, tinha quatro irmãos e uma irmá. Casou-se com Hellen Eliot, que conhecia desde a infância, mas se viu apaixonado por ela somente durante a viagem à Chi- na. Desse casamento, que durou até março de 1979, quando s i a b o W J2 D OP EP IA V A vi da de Ca rl Ro ge rs Hellen veio a falecer, nasceram dois filhos: David e Natalie. Quando tinha 12 anos, seu pai comprou uma fazenda, onde ele e sua família passaram a viver. Na sua visão, os motivos para essa mudança foram, em primeiro lugar, porque seu pai tinha progredido financeiramente e a propriedade rural seria, para O pai, um tipo de hobby e uma possibilidade de viver mais tran- quilamente. Em segundo e, na opinião de Rogers, o argumento mais forte, era que seus pais queriam viver num lugar distante da cidade para protegerem os filhos — alguns estavam na idade juvenil e outros chegando na adolescência — de serem contami- nados por aquilo que eles julgavam que seriam más influências. Da agricultura para a universidade Depois de cinco anos vivendo em contato com a agricultura e ainda isolado pela crença dos pais e da comunidade religiosa que sua família frequentava, Rogers, em 1919, decide estudar agro- nomia e muda-se para estudar na Universidade de Wisconsin. Contexto Religioso Rogers nasceu na cultura americana, onde prevalecia uma maio- ria de pessoas pertencente à fé cristá evangélica. Basta lembrar que até então todos os presidentes dos Estados Unidos eram cristãos. O primeiro presidente cristão católico foi John F. Ken- nedy, eleito em 8 de novembro de 1960. Cesar Roberto Avendafio Amador (1999), psicólogo mexi- cano, que escreveu um capítulo sobre Rogers no livro Psicologia e Religion: tensiones y tentaciones, relata em sua tese a herança religiosa de Rogers. Naqueles anos, dois líderes religiosos, mun- dialmente conhecidos, tinham grande influência em muitas universidades americanas e Wisconsin estava entre elas: Dwight L. Moody e John R. Mott. Tanto um como o outro acreditavam numa transformação mundial através do evangelho, que pode- ria ocorrer pela expansão do cristianismo. Eles tinham como meta influenciar o maior número de jovens para escolherem a formação pastoral como profissão. As reuniões que Rogers (1961, p. 7) adjetiva como “muito apaixonadas” por religião, na certa, tinha um deles como principal motivador ou quem sabe até como preletor. Rogers nunca declarou isto, mas penso que sua primeira mudança quanto a sua formação — deixar o curso de agronomia para estudar teologia — se deve ao ardor desses dois homens, talvez mais até por Mott, que, além de ganhador do Prêmio Nobel da Paz de 1946, foi o fundador da organização que realizou um congresso na China — Federação Mundial dos Estudantes Cristãos — em 1922. Rogers decide mudar de curso e transfere-se para o curso de história, entendendo que com essa formação teria mais preparo para iniciar, futuramente, seus estudos teológicos. Quando cursava o terceiro ano, entre 12 alunos interessa- dos para participar do Congresso Internacional, Rogers foi o escolhido para ir à China. Essa viagem, que durou seis meses, confirma não só as mudanças quanto a sua formação, mas, se- gundo ele mesmo relata (ROGERS,1961), acontece também uma ruptura definitiva com as posturas religiosas de seus pais. Penso ser importante destacar que a família de Rogers per- tencia ao grupo evangélico que defendia o que é denominado de calvinismo, onde uma das crenças é de que um indivíduo é escolhido por Deus e não tem como se livrar disto. Como resultado dessa escolha, onde não houve uma participação da pessoa, ela tem como responsabilidade buscar cada vez mais à santidade, isto é, viver separado das demais pessoas vistas como não participantes dessa escolha predeterminada. Muitos evangélicos, inclusive no Brasil, acreditam ser um povo separado e santo que não deve se misturar com as demais pessoas. Ainda existem famílias que se mudam para chácaras, s i a b o y J e D ep P p A vi da de Ca rl Ro ge rs cidades pequenas, condomínios afastados e fechados para cria- rem os filhos longe da contaminação da sociedade. Nos Estados Unidos, até os dias de hoje, muitos pais não mandam os fi- lhos para a escola e os alfabetizam em casa. há o relato de que pelo menos 30% dos pais que tomam essa decisão são cristãos evangélicos, que fazem esse tipo de separação para não corre- rem o risco da contaminação do possível mal que possa existir no ambiente escolar. Existem leis que aceitam e regulamentam essas decisões, facilitando dessa forma não só os que realmen- te convivem com dificuldades para frequentarem as escolas, mas também os que acreditam que dessa maneira os filhos permanecerão “santos” (Como funciona o homeschooling por Ka- therine Neer). Os pais de Carl se incluíam nesse tipo de crença e, quando ele tinha 12 anos, também se mudaram para uma região agríco- la para preservação da pureza dos filhos. No congresso da China, Rogers convive com cristãos e lí- deres, que não concordam com o calvinismo e que defendem a liberdade que uma pessoa tem de escolher ou não a fé cristã. São os arminianos, cujo fundador foi o holandês Jacobus Arminius (1560-1609), que acreditavam no livre arbítrio da pessoa e en- tendiam que o que os calvinistas acreditavam ser uma predesti- nação nada mais era do que a pré-ciência de Deus a respeito de como as pessoas O aceitariam ou não. O calvinismo tem seu maior número de adeptos entre os presbiterianos, com quem até então Rogers conviveu. Mas Mott era metodista e defendia ideias ecumênicas, postura bem dife- rente da crença fundamentalista dos pais de Rogers. Diante da declaração de Rogers (1961, p. 8): “Fui forçado a ampliar meu pensamento e admitir que pessoas sinceras e honestas podiam acreditar em doutrinas religiosas muito divergentes”, penso que posso concluir que certamente as aquisições adquiridas durante o congresso na convivência com cristãos de vários lugares do mundo e com uma ótica teológica diferente abalam mais ainda a orientação religiosa recebida até aquele momento e fortalecem Rogers na decisão de experimentar novos caminhos. São questionamentos difíceis. De um lado, tem sua história, sua família e suas crenças religiosas, do outro tem suas ideias, seu modo de ver, suas novas aquisições, enfim, tem sua auto- nomia sendo construída aos poucos. Talvez por isso a úlcera gastroduodenal que ele sofre desde adolescente tenha se acen- tuado nesse período. Rogers então se afasta por algum tempo de suas atividades. O tratamento desse tipo de enfermidade na época exigia repouso e uma dieta alimentar rígida, e quando não se curava dessa forma, submetia-se o paciente a cirurgia. Rogers aproveita esse tempo fazendo um curso de psicologia por correspondência, da Universidade de Wisconsin, e inicia seus contatos psicológicos, lendo textos de William James, que eram as leituras básicas do curso. Ele continua firme em seu propósito de ser pastor, mas deixa de lado para sempre a falta de liberdade para escolher, com a qual convivera até os 17 anos. Teologia Hoje eu sei que mudar dói; mas não mudar dói muito mais Oswaldo Montenegro! Nesse mesmo ano, 1924, é soberana. Afirma Maria Bowen: Penso que uma utilização sutil de poder interfere mais no processo de outras pessoas do que qualquer oferta direta de estrutura, exercícios, alternativas etc” (BOWEN, 1987). Particularmente, tenho me afastado cada vez mais desses tipos de exercícios em função de eu não ter mais sentido ne- cessidade de propô-los, embora não me sinta proibido de fazer alguma proposta, caso seja de forma espontânea e respeitando a soberania do cliente em aceitá-la ou não. Mesmo que eu fosse contra a aplicação de alguma dessas técnicas, o que não é o caso, penso que o máximo que eu poderia dizer é que elas não me servem. Jamais me sentiria no direito de dizer que elas não podem ou não devem ser apli- cadas na Abordagem Centrada na Pessoa, pois não sou o dono dessa abordagem. Nossa abordagem não tem dono e ao mes- mo tempo pertence a todos nós que cremos em seus princípios e nos utilizamos dela para o nosso desenvolvimento pessoal e profissional. Cabe a cada um de nós nos apropriarmos dela da forma que fizer sentido para nós, sem nos preocuparmos com o consenti- mento de uma terceira pessoa, ou do próprio Rogers, que passou a vida declinando do título de dono da ACP Se, ao utilizarmos alguma dessas técnica, precisássemos da aprovação dele, com certeza a teríamos. Neste capítulo mesmo, fiz questão de utili- zar uma das várias citações dele, falando a respeito do assunto. Rogers sempre procurou deixar claro que a sua visão pertencia a ele e que não eram verdades absolutas. Sempre nos convidou a pensarmos pelas nossas próprias cabeças. Cabe a nós nos apro- priarmos desse poder que, felizmente, não nos foi roubado! Esther Carrenho “(...) além da fala, existem outras atividades que podem facilitar a terapia” Natalie Rogers Ainda me lembro do dia em que, num grupo de psicólogos, alguém me perguntou: “Você tem formação em psicodrama?” “Sim”, respondi, já percebendo alguns olhos arregalados, expres- sando espanto por conta da minha afirmação. Confesso que, na minha ânsia de ser aceita pelo grupo, eu estava insegura naque- le momento. Fiquei perturbada e questionando a mim mesma aonde eu poderia estar cometendo algum erro. Alguns minutos depois, uma colega disparou um discurso criticando o uso de técnicas, alegando categoricamente que o uso das mesmas indi- cava que o profissional era invasivo e não tinha paciência nem estrutura para aguardar os movimentos da pessoa. Tudo isto me impactou muito e naquele momento eu não via como explicar e muito menos como defender o uso de al- gum recurso vindo do psicodrama. Mas por causa da experi- ência prática que já tinha em clínica, eu sabia que as vivências, quando usadas adequadamente, eram de grande ajuda para que o cliente alcançasse o que estava buscando. Sai dali refletindo sobre meu próprio trabalho e comecei a reler alguns dos livros de Rogers. O primeiro escolhido foi exatamente o último que ele escreveu — Um jeito de ser. E que alívio quando novamente estava diante de um homem de 75 anos declarando sua aber- tura para novas ideias e o reconhecimento da eficácia de outros trabalhos realizados por outros profissionais. Rogers não estava jogando fora o essencial das suas crenças em psicoterapia. Nem o essencial das suas experiências e afirmações. Mas estava reco- se js od se H e se ju nb ia d 149 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 150 nhecendo que outras formas de trabalho também promoviam ferramentas para as mudanças desejadas. Ele afirma: “Durante esses anos, creio que tenho estado mais aberto a novas ideias, Às que se afiguram mais importantes dizem respeito ao espaço interno =o reino dos poderes psicológicos e das habilidades psíquicas da pessoa humana. A meu ver, esta área constitui a nova fronteira do conheci- mento, o gume da descoberta. Há dez anos eu não faria esta afirmação. Mas as leituras, a experiência e os diálogos com pessoas que trabalham nesse campo mudaram a minha visão. Os seres humanos potencial- mente dispõem de uma gama enorme de poderes intuitivos... O biofe- edback — que veio nos mostrar que se permitirmos funcionar de modo mais relaxado, menos consciente, aprendemos a controlar, até certo ponto, a temperatura, os batimentos cardíacos e todo tipo de funções orgânicas (1983, p. 24)” Em seguida, ele cita as melhoras de muitos pacientes porta- dores de câncer quando submetidos às vivências de meditação e de fantasias que visualizam a superação da enfermidade. Pro- vavelmente, referindo-se ao trabalho de Lawrence LeShan, bem descrito no livro Câncer: um ponto de mutação. Uma coisa é certa: Nenhum ser humano é capaz de descobrir tudo por mais que viva. E não podemos desprezar todo o tra- balho de alguém que se empenhou, observou e pesquisou num território do qual não temos nenhuma experiência. Isto é, seja lá quem for, haverá sempre algo que podemos aprender e aprovei- tar para enriquecer nosso próprio trabalho e experiência. Meu interesse em psicodrama começou quando percebi, nas leituras dos livros de Victor Dias, um rico material que eu po- deria disponibilizar para aqueles que me procuravam, buscando entender e/ou sentir suas próprias realidades. Durante o curso, fui descobrindo que os recursos do psicodrama poderiam ser usados sem que os fundamentos da Abordagem Centrada na Pessoa fossem violentados. Eu poderia continuar acolhendo e aceitando; tendo empatia, fazendo um engate nos sentimentos vivenciados pela pessoa presente; conectando-me comigo e sendo transparente, ao mesmo tempo em que me conectava também com meus clientes. E ainda assim oferecer novos recursos para quem eu entendesse que poderia ajudar. E, no geral, ajuda! Penso que todo e qualquer recurso que possa em determi- nado momento cooperar para que a pessoa se conscientize de conteúdos ou situações até então bloqueados do seu conheci- mento são bem-vindos. Concordo com Rogers (1983, p. 127): “Focalizar ou adquirir plena consciência de alguma experiência até então negada acarreta mudanças psicológicas e fisiológicas na psicoterapia e resulta em mudanças comportamentais”. “Quero relatar o caso de uma mulher que foi abusada e violentada por vários anos na sua infância. Ela se via travada na vida, mesmo sendo uma engenheira de sucesso. Via-se perse- guida pelo fantasma do homem que abusara dela de forma tão cruel. Ela foi obrigada, sob ameaça até de perder a vida, a ficar de boca calada. Isto ficou enraizado dentro dela de tal forma que ela tinha o desejo de me relatar sua história e seus senti- mentos, mas a única coisa que saía era alguns gemidos e gru- nhidos lembrando uma criança assustada, escondida, mais pa- recendo um animal selvagem. Eu fui paciente e mantive minha escuta nos silêncios dela. Era claro que queria se expressar. E depois que ia embora, ela me escrevia, relatando tudo que que- ria dizer e não conseguia. Para ela, havia a crença de que, se falasse em voz alta, na minha presença, destrancaria a boca e sua fala fluiria, se libertando do pesadelo do passado. Eu tinha num canto da sala vários potes de massa de modelar que havia usado numa vivência num atendimento familiar. Senti vonta- de de oferecer para ela o recurso da massa, e o fiz. Ela aceitou s e j s o d s a H e s e j u n b i a d 151 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 152 e depois de alguns minutos foi até o canto pegou os potes e foi construindo bonecos que representavam ela, o abusador e sua mãe adotiva. E fez um tipo de teatro com os bone- cos contando, dessa forma, alguns episódios, que realmente foram libertadores para ela, dando início a um desbloqueio facilitador da sua comunicação pela fala. E era isto que ela buscava.” ) Quero citar aqui as afirmações de Natalie Rogers quando se refere ao uso de recursos usados na ajuda da expressão de conte- údos internos, que ela nomeou “Artes Expressivas”: Estas expressões também são parte de uma poderosa linguagem que se estabelece entre o cliente e o terapeuta. A arte se torna uma parte na- tural do processo terapêutico. Em outras situações, os clientes podem até querer começar com arte e, depois, ao ver sua própria criação, deci- dam falar de suas experiências. Utilizar as artes expressivas é uma forma muito eficaz para ajudar o cliente a identificar-se com seus sentimentos Com respeito ao clima de segurança da atmosfera centrada na pessoa, as pessoas que tendem a ser predominantemente ra- cionais e verbais têm a oportunidade de permitir que aflorem seus sentimentos de maneira benigna e construtiva. Por exemplo, quando o cliente perde um ente querido, a luta é tão dolorosa que não há palavras para expressá-la. No entanto, a cor, argila, uma colagem, o movimento e o som contribuem para expressar essa luta de maneira não verbal e é extremamen- te benéfico. O participante é capaz de liberar fisicamente parte dessa dor e, por sua vez, alcança um pouco de insight pessoal... Frequentemente, a raiva é profundamente reprimida. No en- tanto, ao utilizar o movimento e o som em uma sala terapêutica acolhedora e desprovida de ameaças, floresce a tristeza existente por detrás da raiva. Expressar a raiva através da cor e da forma tam- bém ajuda o clientea transformá-laem uma energia útil e criativa. “Outro caso de um empresário bem-sucedido no mun- do dos negócios, que prestava serviço para uma montadora de carros. Houve uma situação em que uma falha no serviço | prestado causou muitas dificuldades para a montadora. E o meu cliente se sentiu apavorado. Viu-se encolhido e assusta- do diante da sensação de ameaça que dominava seus pensa- mentos. Pedi a ele que me descrevesse como eram seus pen- samentos. Ele me relatou que eram frases acusadoras do tipo: “Viu, você é mesmo um fracassado!” “Tudo que você faz dá em nada” “Você é um incompetente!” Em seguida, usando os recursos do psicodrama, sugeri que fizéssemos um drama ali. Eu seria ele e ele seria os próprios pensamentos. Ele aceitou e repetiu as falas se dirigindo a mim, como que incorporando seus pensamentos. Ao mesmo tempo em que fazíamos o “dra- ma”, eu ia perguntando como ele estava e se tinha alguma per- cepção nova. Não tinha. Ele continuava apavorado diante do problema não resolvido na empresa. Mas para mim já estava claro que, de alguma forma, ele fora levado a crer que era um fracasso. E que, diante de alguma falha, normal em qualquer empresa, toda essa sensação de fracasso se apoderava dele, dei- xando-o imóvel e sem saída. Pedi então a permissão para que eu o dramatizasse, bem como seus pensamentos, enquanto ele observava. Ele concordou. Quando ele me viu fazendo o pa- pel dele, que tinha que resolver uma falha, e o papel dos seus pensamentos, que o acusavam de fracassado, percebeu de onde vinha o lado aniquilador. Lembrou que sua mãe era muito exigente com as notas na escola. Como ele não tinha tanto interesse em estudar nos padrões curriculares das escolas, tirava notas baixas e quase que diariamente se sentia fracassado e in- competente por não tirar notas altas. Daí para a frente, foi fácil perceber que sua mãe não estava na empresa e que ele não era mais a criança indefesa e desprotegida. Já era um adulto que poderia enfrentar a situação por pior que fosse o resultado. E s e j s o d s o y 9 s e j u n b i a d Pe rg un ta s e Re sp os ta s 154 enfrentou. Renegociou o contrato com a montadora e, junto com a sua equipe, refez o trabalho com resultados positivos.” Quando uma técnica ou recurso não condiz com os funda- mentos da ACP? Primeiro, quando é usado sem a permissão do cliente. Toda e qualquer vivência, técnica ou recurso deve ser explicado para a pessoa e é ela que deve concordar ou não com seu uso ou realização. Segundo, quando não se sabe o que fazer e se recorre à técni- ca para preencher o tempo. Terceiro, quando o cliente silencia e o profissional fica per- turbado com o silêncio e arruma algo a ser feito para aliviar sua perturbação. Quarto, quando se usam os recursos com a motivação de mostrar que sabemos e que somos portadores de vastos conhe- cimentos. Encerrando, quero reafirmar que o uso de qualquer recurso no contexto psicoterapêutico dentro dos princípios da Aborda- gem Centrada na Pessoa deve visar à oferta de ferramentas para que o cliente encontre o que está buscando. Podemos encaminhar um cliente para atendimento Psiquiátrico? Márcia Tassinari Se nosso cliente apresenta alguns dos sintomas descritos no CID (Catálogo Internacional de Doenças) e seu sofrimento está comprometendo suas relações interpessoais e/ou seu trabalho, q significa que necessita de acompanhamento de outros especia- listas para complementar o atendimento psicológico. Esther Carrenho Há três situações onde discuto com a pessoa a possibilidade de acompanhamento psiquiátrico. A primeira é quando percebo que ela apresenta um prejuízo no seu rendimento ou no desempenho de alguma função. É o caso de estudantes que diminuem a capacidade de aprendizado, de trabalhadores que baixam o rendimento na profissão, de do- nas de casas e mães que deixam de dar conta dos afazeres diários. Há ainda as situações em que o sono ou o apetite se alteram de tal forma — ou para mais, ou para menos — que prejudicam o corpo, trazendo danos físicos e no desempenho das responsabi- lidades cotidianas da pessoa. O organismo humano estressado não traz benefícios para ninguém. Se há um médico que pode avaliar e indicar um medicamento que possa trazer algum alívio para que a pessoa volte ao desempenho daquilo que ela entende que é da responsabilidade dela, então deve ser usado, claro. A segunda é quando percebo nos relatos da pessoa sinais de que ela possa cometer alguma violência contra alguém ou con- tra si mesma. Orlando, engenheiro, 35 anos, é um bom exemplo disto. Veja o relato dele: “Às vezes, sinto uma fúria dentro de mim. É como se um vulcão entrasse em erupção. Durante meus primei- ros anos de vida, fui obrigado a engolir toda a raiva que sentia, vendo meu pai chegar bêbado e bater em minha mãe. Uma das vezes, quanto tinha cinco anos, mordi meu pai, mas ele me deu uma surra. Eu era tão pequeno, mas ficou registrado na minha memória a raiva que senti naquele dia e eu pensava em todas se js od so y e se ju nb di od null Pe rg un ta s e Re sp os ta s 156 as possibilidades de destruir meu pai. E assim fui crescendo, De alguma forma, eu disfarçava todas as contrariedades que tinha e as guardava dentro de mim. Agora temo, de verdade, destruir alguém que de alguma forma consiga detonar tudo que está acumulado dentro de mim.” Orlando me procurara a pedido do psicólogo do departamento de Recursos Huma- nos da empresa. Ele era visto como um colaborador de grande potencial. Mas por duas vezes entrara numa discussão que não tinha nada a ver com ele. E numa das situações tinha agredido violentamente um dos homens, quase levando a vítima a óbi- to. No terceiro atendimento, perguntei para Orlando o que ele achava de um acompanhamento psiquiátrico enquanto juntos trabalhávamos todas as situações de raiva contida das quais ele quisesse falar. Ele respondeu: “Por favor, isto é o que mais quero. Se existe alguma orientação ou medicação que possa me ajudar no controle do meu comportamento enquanto eu lido | com essas sensações de fúria e destruição, agradeço.” ) Ainda um outro exemplo é o de Anne, psicóloga, 25 anos, que também veio de um ambiente de muita agressão física, verbal e também muito desamparo. Na menor contrariedade, Anne quebrava tudo que encontrava pela frente. Quando apon- tei para o tanto de situações onde ela não pudera expressar a raiva das injustiças que sofrera, ela respondeu: “É isto mesmo. Concordo. E quando isto é acionado em mim por coisas que eu quero e não acontecem, eu fico cega e saiu destruindo tudo. É como uma força que vem de dentro de mim e eu não consigo segurar” Anne concordou em ter o acompanhamento psiquiá- trico enquanto estava em psicoterapia. Aos poucos foi esvazian- do seu tanque emocional de explosivos e atualmente não usa nenhum tipo de medicação e dispensou o acompanhamento médico. À terceira situação é quando a pessoa acredita que deve pro- curar um psiquiatra. Um dos princípios mais importantes, ao meu ver, da ACP, é justamente o respeito pela pessoa e pelo o que ela entende ser necessário ou não para ela mesma. Então, nessas situações, conversamos sobre as razões que ela entende necessárias ao acompanhamento médico e respeito a decisão, seja qual for, tomada por ela. Qual é a fraqueza mais frequente dos profissionais da ACP? Esther Carrenho Não sei se eu diria que é exatamente uma fraqueza, mas acho que há algumas confusões que são frequentes entre os pratican- tes dos princípios que foram defendidos por Rogers. Maria Bowen já fala sobre isto no livro Quando fala o cora- ção. Ela observa que é possível que profissionais da psicologia escolham a orientação para trabalhar em psicoterapia de acordo com suas deficiências: A psicanálise atrai pessoas que estão mutiladas em seus sentimentos e são altamente intelectuais. (Elas adoram dar uma de detetive.) A abor- dagem junguiana permite às pessoas que estão com medo de lidar com a realidade externa penetrar mais e mais interiormente e lidar somente com o mundo criado por elas mesmas. Pessoas que têm gana de poder podem se sentir confortáveis com o modelo da Gestalt e os controla- dores podem optar por modificações de comportamento. Vejo o mo- delo “rogeriano” não diretivo de psicoterapia muitas vezes como uma mancira de encobrir a passividade e o medo de cometer erros, ou seja, tirando o corpo fora. (SANTOS, 1987, p. 120). se js od so y e se ju nb io d 157 P e r g u n t a s e R e s p o s t a s 158 Uma das atitudes mais positivas que vejo é quando nos torna- mos cientes de quais são nossas possíveis fraquezas ou confusões, como profissionais. Dessa forma, poderemos ser acolhedores para com nosso próprio jeito de ser e, se necessário, buscar um crescimento maior onde percebemos que possa existir alguma falha. Uma das deficiências que ainda percebo em mim é sobre a escuta. Demorei anos para perceber que em muitas situações a pessoa que estava comigo, ou num grupo onde era facilitadora, ainda estava falando e eu já estava preparando a resposta. Se eu me ocupo em preparar a resposta enquanto o outro fala, é óbvio que já deixei de escutá-lo profundamente. E por causa dessa deficiência, em muitas situações fui invasiva, dando antes do tempo adequado uma resposta que, felizmente, em geral, não era ouvida. O bom era que eu percebia que o que falei; às vezes, nem fazia sentido, porque eu não tinha tido paciência suficiente para esperar que a pessoa chegasse até o fim da sua fala. Aprendi muito, nesses muitos anos, como conselheira e psicoterapeuta, mas ainda percebo que tenho um longo caminho a percorrer na arte de ouvir profundamente o que o outro tem a dizer até que ele se esvazie totalmente do seu desejo de falar e, aí sim, posso dar minha resposta ou com alguma coisa que sei, ou que sinto, ou que percebo, ou algo da minha intuição, ou simplesmente posso também responder com o meu silêncio por não ter nada a expressar por palavras. Algumas confusões que tenho visto acontecer no meio ace- piano: a confusão entre democracia e desorganização. Em nome da democracia, é comum não se organizar, não informar e não providenciar o mínimo que um evento ou uma reunião necessi- ta. Outra confusão é entre não diretividade e cuidados para que o cliente tenha o melhor e desfrute de um clima acolhedor no local onde será atendido, enquanto mantém um vínculo psi- coterapêutico. Penso que é necessário cuidar do ambiente, do local, dos móveis, tendo em foco as pessoas que virão para o lo- q cal sem deixar de considerar a si mesmo. Confunde-se também ter uma atitude congruente com má educação, impulsividade e algumas vezes até grosseria. Acho que esta é uma confusão que não se faz muito com os clientes, mas acontece com fre- quência nos eventos de convivência entre colegas e outros pro- fissionais da relação de ajuda. Muitos são incapazes de conter, pelo menos por algum tempo, alguma ofensa ou algo feito ou dito por um outro, que incomoda. E reage derramando todo tipo de impropérios com a alegação de que está praticando a congruência. Isto pode ser uma transparência de como se lida com situações que incomodam, mas, honestamente, não acho que foi isto que Rogers quis dizer quando se referiu a congru- ência. As reações rápidas e impulsivas podem bem ser um sinal de que aquela pessoa não consegue receber algo, contatar seus sentimentos, refletir e depois decidir qual a melhor resposta para aquela situação. É claro que situações como esta dão a oportunidade para que cada um se avalie. Enquanto uns per- cebem como respondem numa situação de incômodo, outros podem se avaliar em como recebem respostas impulsivas sem reflexão. O que tenho observado é que, nas impulsividades, há possibilidade também de aprimoramento em como expressar o que percebemos em nós mesmos, isto é, em como praticar a congruência. Outra confusão que acredito existir é a crença de que o co- nhecimento teórico é menos importante que a aceitação para a interação psicoterapêutica; não se buscam cursos, treinos nem leituras, onde se adquire mais conhecimento. Para mim, isto se faz necessário e o conhecimento pode ser requerido pelo cliente. Nunca me esquecerei de um homem que, em deter- minado atendimento, me fez uma pergunta. Eu entendi que deveria respondê-la de acordo com os meus conhecimentos. No final do atendimento, senti um mal estar porque parecia que eu tinha dado uma aula. Comuniquei a ele meu incômo- s e j s o d s e y e s e j u n b i o d 159 P e r g u n t a s e R e s p o s t a s do. Ele respondeu: “Achei ótimo! Foi o melhor encontro que tivemos neste ano. Ajudou a esclarecer muita coisa dentro do meu processo.” Não tenho dificuldade nenhuma em responder “não se; quando não tenho resposta para alguma pergunta ou não sei o que fazer em determinada situação. O que aprendi nesse dia é que o meu conhecimento não deve mesmo ser uma plataforma na qual eu me coloco para me achar capaz de atender esta ou aquela pessoa. Mas quanto mais eu conheço, mais tenho para deixar à disposição do outro para que ele possa tirar proveito, caso queira e quando se fizer necessário. Outra situação é aquela em que se confunde falta de direção com não ser diretivo. Muitas pessoas apresentam dificuldades em determinar metas, alvos e propósitos e chamam isto de não diretividade. “Não ser diretivo não é não ter direção”, falou mui- to bem Mauro Amatuzzi no primeiro Fórum Paulista da Abor- dagem Centrada na Pessoa, realizado em Vinhedo em 2006. Há ainda a confusão entre liberdade e falta de compromisso. Ter liberdade de escolha não significa irresponsabilidade. Pode- se até escolher não fazer o que se comprometeu em fazer antes, ou o contrário. Mas não podemos deixar de assumir as conse- quências e os possíveis danos das nossas escolhas. E a vida en- sina que quem quiser receber alguma credibilidade em seu tra- balho e na forma de exercer a liberdade terá que fazê-lo com responsabilidade. A Abordagem Centrada na Pessoa indica uso da medicação? Esther Carrenho Esta é uma pergunta que revela uma das preocupações dos tem- pos modernos. Segundo dados de 1997, a indústria farmacêuti- ca só perde, em faturamento, para a indústria bélica (Site www. acupuntura.org.br, 2010). Muitas pesquisas são feitas. Nem to- das se transformam em medicamentos que serão aproveitados. Mas as que realmente dão certo ou que, pelo menos, se acredita que darão certo, e se transformam em medicamentos, são em números absurdos. Estamos num sistema capitalista de consu- mismo exagerado por muita gente e lucros desenfreados para uma minoria. À indústria farmacêutica está nessa minoria. Seria muito bom se todo e qualquer medicamento fosse feito com o intuito de ajudar a curar. Mas não é isto que observamos. Mui- tos medicamentos são fabricados exclusivamente para serem vendidos. Já relatei, no meu livro Depressão (Carrenho, 2007), uma reportagem da Folha de S. Paulo, alegando que a indústria cria doença para vender a cura. Às vezes, me ocorre que alguns profissionais da saúde, se pudessem, decretariam o uso de anti- depressivos nas caixas de água para uso da população. Isto sem contar que muitos comportamentos tidos como normais há menos de um século hoje são vistos como doentios e anormais. As crianças que na minha infância eram vistas como espertas e interessadas em saber tudo, hoje são vistas como hiperativas e são diagnosticadas como necessitadas de medicamentos. As que eram tidas como crianças mais sossegadas e reflexivas hoje são medicadas com estimulantes para se parecerem com a maioria. Por outro lado, quero reconhecer também que os remédios po- dem ser de grande ajuda quando usados adequadamente para promover a cura e ou aliviar o intenso sofrimento tanto do cor- po como da psique. Acredito que todos os profissionais que trabalham com o que chamamos de relação de ajuda, principalmente da área psicoló- gica, devam ter o conhecimento do esquema de consumismo e da manipulação que está por trás da produção de tantos medica- mentos. Esquemas estes que têm sido fortemente denunciados s e j s o d s e H 9 s e j u n b i e d 161 P e r g u n t a s e R e s p o s t a s 162 pela imprensa e por algumas pessoas, formadoras de opinião, que não temem nem mesmo perder a própria vida. Como psicoterapeutas, podemos ajudar uma pessoa a refle- tir, caso ela pergunte sobre medicação, se ela vê ou não como necessário o uso da medicação. Como acreditamos nos recur- sos internos da própria pessoa para caminhar na direção do seu próprio crescimento, cabe a nós promovermos condições já re- latadas em capítulos anteriores, para que ela faça sua escolha coerente com o que acredita e não porque o psicólogo disse isto ou aquilo. Atendo pessoas que escolheram tomar alguma medicação, para alívio da angústia, enquanto reviam situações doloridas das suas vidas que estavam no presente, interferindo no desempe- nho do seu potencial tanto no campo profissional como nos re- lacionamentos. Conheço outros que, ao experimentarem a me- dicação, sofreram tanto com os efeitos colaterais que preferiram ficar com o mal-estar da depressão, tendo consciência de que aspectos depressivos e tristes faziam parte da sua vida. E conhe- ço outros ainda que, ao entrarem profundamente no processo psicoterapéutico, optaram por uma medicação ansiolítica, que os relaxassem um pouco, ajudando-os a descansarem e a dormi- rem bem, para darem conta de tudo que tinham para fazer na vida. E conheço outros por fim que nunca quiseram medicação nenhuma e escolheram suportar o peso dos sofrimentos decor- rentes de perdas e fracassos e também sofrimentos decorrentes da aflição psicológica. Sempre que alguém me faz a pergunta: “Você acha que devo tomar remédio?”, respondo devolvendo a pergunta: “O que você acha?” E, surpreendentemente, todos sabem a resposta a respeito de si mesmos nessa questão. Às vezes, me perguntam: “Se você pudesse receitar algum medicamento, quando é que você indicaria?” Respondo contando a história do meu médico, clínico geral. Houve uma vez em que eu estava muito deprimida e chorando ininterruptamente, por causa de uma situação que interpretei como uma injustiça cometida contra mim. Tinha consulta marcada com esse médico. Quando ele viu meu es- tado, silenciou e esperou pacientemente que meu choro fosse cessado, pelo menos um pouco. Ouviu tudo o que eu quis falar naquele momento e amorosamente me perguntou: “Você está conseguindo trabalhar? Está conseguindo dormir e descansar o corpo? Está conseguindo se concentrar nos relatos dos seus pa- cientes?” Fui respondendo sim a todas essas questões. Aí ele per- guntou: “Você acha que precisa alguma medicação para ajudar um pouco nesse momento tão dolorido?” Respondi que não e ele respeitou minha escolha. Mas ficou bem claro que, se eu não estivesse dormindo, nem conseguindo trabalhar e quises- se, ele me receitaria alguma medicação de alívio. Entendo que há situações onde uma pessoa possa apresentar um alto grau de agressividade ou de sofrimento mental, a ponto de quem está por perto correr risco de sofrer prejuízos e por isso muitas vezes se torna necessário alguma medicação que limite essa pessoa, ajudando-a a não causar danos em outros e a controlar melhor sua agressividade ou possíveis confusões mentais. Mas penso que essas situações são exceções. Considerando-se quem atendo em psicoterapia, não sou contra nem a favor da medicação. Mas sou totalmente a favor de respeitar a pessoa. E contra qualquer compor- tamento ou atitude que controle ou manipule o outro. Para isto é preciso escutá-la e entendê-la, permitindo que ela mesma vá tomando sua decisão e mudando o que decidiu, se assim for necessário. se js od sa H 9 se ju nd io d 163 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 164 E importante que o psicoterapeuta faça terapia? Esther Carrenho É muito, mas muito importante mesmo que um psicoterapeu- ta cresça no conhecimento de si mesmo! Se esse crescimento ocorrer através da psicoterapia ou através das próprias vivências, ou de qualquer outra maneira, não importa. O que importa é que haja no profissional uma abertura para um conhecimento cada vez maior de quem ele é. E penso que isto vale até o fim da vida. Rogers (1961, p. 73) afirma: Quanto mais o terapeuta souber ouvir e aceitar o que se passa em si mesmo, quanto mais ele for capaz de assumir a complexidade dos seus sentimentos, sem receio, maior será o grau de congruência”. Ouvir e aceitar o que se passa em si mesmo exige um cons- tante crescimento. À psicoterapia não é a única forma de cres- cimento, mas, por ser algo metódico e planejado, é possível que seja um dos meios mais eficientes e quem sabe até mais rápidos. Aqueles que não se esquivam de constantemente olhar para dentro de si sabem que isto faz parte de um processo muitas vezes dolorido e difícil. Rogers (1961, p. 17) também experi- mentou isto: e Ls . ” . E certo que a prática da terapia é algo que exige um desenvolvimento pessoal permanente por parte do terapeuta, o que as vezes é penoso, mesmo se, a longo prazo, provoca uma grande satisfação.” E um pouco mais à frente, no mesmo livro, Rogers (1961, p. 124-125), referindo-se ao processo de busca da realidade do eu de uma pessoa, diz: « 3 ! Essa exploração se torna mais perturbadora quando se veem envol- vidos em remover as falsas faces que não sabiam ser falsas faces (...). Remover uma máscara que se acreditava constituir parte de seu verda- deiro eu pode ser uma experiência profundamente perturbadora...” O crescimento, numa psicoterapia que valoriza a interação, é uma via de duas mãos. As descobertas podem acontecer tan- to na vida de quem busca ajuda como na vida do profissional. Penso que o profissional que for corajoso o suficiente para ver e rever cada situação que o mobiliza poderá aproveitar aquelas que apontam para comportamentos e atitudes que não são do seu agrado. Marcos Alberto Uma das muitas coisas que faz com que eu me sinta identificado na Abordagem Centrada na Pessoa é a ausência de regras. O que é imprescindível que exista nessa abordagem é a confiança na pessoa, pois caso isto não exista, mesmo que de forma bem in- tencionada, é provável que eu tenda a manipulá-la ou a direcio- ná-la para determinado caminho que tenha a ver com os meus valores e crenças, ou com determinados valores e crenças sociais. Olhando sob a perspectiva de não termos regras, seria uma grande incoerência a afirmação de que o psicólogo deve fazer psicoterapia. Estou convencido, por motivos óbvios, que psi- coterapia é algo importante para qualquer pessoa que tenha in- teresse em buscar possibilidades de se autoconhecer e que não haverá ajuda se a pessoa for obrigada a participar de um proces- so psicoterápico, pois, se a pessoa não estiver de fato presente, não haverá processo. Tenho medo das regras e me sinto incomodado quando ouço de profissionais de outras abordagens a respeito da obriga- toriedade do psicoterapeuta fazer psicoterapia. À única pessoa capaz de sentir a necessidade de fazer ou não é a própria pessoa. Se a pessoa se submeter a um atendimento psicoterápico por s e j s o d s o H e s e j u n b i o a 165 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 166 imposição de determinada abordagem, significará uma agres- são à pessoa, pois não estará havendo um movimento de forma legítima que venha de dentro pra fora, tão fundamental para o processo de crescimento. De toda forma, vejo como algo extremamente preocupante quando o psicoterapeuta não é alguém que tenha interesse em se autoconhecer, pois isto me traz a sensação de que será pouco provável que ele facilite condições de ajuda ao cliente por não estar aberto a si mesmo. Nesse sentido, vejo que a psicoterapia pode ser de grande ajuda para que o psicoterapeuta busque em si uma maturidade maior e uma liberdade maior para poder participar de forma mais inteira e ativa na facilitação do proces- so de crescimento do cliente. Nesse sentido, Maria Bowen faz o seguinte comentário: “Mesmo Rogers chega à desconfortável conclusão (eu não sei por que Rogers se sente desconfortável com isto) de que, quanto mais psicolo- gicamente maduro e integrado for o terapeuta, mais útil é a relação que ele provê” (BOWEN, 1987). Na relação de ajuda, a meu ver, só é possível que eu esteja de fato com o cliente se tiver a capacidade de me livrar dos meus princípios e valores pessoais. É fundamental que eu entenda que as minhas verdades servem apenas para mim, pois sem essa convicção é muito provável que eu não esteja verdadeiramente aberto ao campo experiencial do outro. Fica evidente que é muito fácil respeitar, acolher e aceitar o jeito de ser do outro quando ele tem valores que se assemelham aos meus. O difícil, em minha opinião, é termos essa mesma capacidade quando os valores da pessoa são opostos às minhas convicções. Durante a minha vida profissional, já ouvi muitas histórias de profissionais que dificultaram o crescimento da pessoa por acreditarem nas próprias verdades como sendo verdades uni- versais ou absolutas e que, a partir dessas “verdades”, tendem a “empurrar” a pessoa para determinada direção. Eu mesmo, em meus piores dias, já me peguei com esse desejo, muito bem in- tencionado, de direcionar a pessoa para determinado caminho que julguei, por algum motivo, que seria mais fácil para ela. Toda vez que me percebo fazendo isto, tenho verdadeiro cala- frio. Busco, ao longo de minha vida profissional e pessoal, cada vez mais me distanciar das “verdades absolutas”. Tenho convicção de que o processo de crescimento da pessoa diz respeito a ela e isto me alivia quando consigo desvincular as minhas “verdades” das verdades dela, pois dessa forma consigo ter o mesmo respeito pelo cliente, independente dos seus senti- mentos e escolhas. A esse respeito, Rogers nos diz: Na relação terapéutica, algumas das experiências subjetivas mais intensas são aquelas em que o cliente sente dentro de si mesmo o poder nítido da escolha. Ele é livre — para se tornar no que é ou para se esconder atrás de uma fachada; para progredir ou para retroceder; para seguir por caminhos que o destroem ou que destroem os outros, ou caminhos que o-enrique- cem; ele é literalmente livre para viver ou para morrer, tanto no sentido fisiológico como no sentido psicológico destes termos (ROGERS, 1961). Como poderei ter esse desprendimento se não estiver emo- cionalmente maduro para lidar com as diferenças e as consequ- ências dessa liberdade? Penso que o psicoterapeuta que se submete a um processo psicoterápico como cliente terá grandes condições de lidar com os seus valores e com a percepção de que estes, por mais que faça sentido a ele, não podem ser considerados como valores univer- sais e que o processo da outra pessoa pertence a ela em toda a sua singularidade. Através da psicoterapia, o psicoterapeuta cliente terá, provavelmente, maiores condições de compreender em si as suas limitações e dificuldades e em consequência terá maior possibilidade de respeitar o seu cliente em suas limitações e dif- se js od sa y e se ju nb ia d 167 d a N P I R A P O R A Le RO DEE I SS Pe rg un ta s e Re sp os ta s 168 culdades. A minha percepção é de que quanto mais eu tenho cla- ros os meus valores, menos eu tenho necessidade de querer que o outro se identifique com eles e, em consequência, terei maio- res condições de respeitar o ritmo e a individualidade do cliente, Quanto mais maduro o psicoterapeuta for, mais condições ele terá de ser autêntico com a pessoa, tendo a capacidade de estar genuinamente presente na relação, deixando de ser mero espec- tador do processo do cliente ou, ainda, terá maiores condições de deixar de lado as suas interpretações e julgamentos nessa relação. Para que exista uma ajuda real, é necessário que exista uma pessoa real, é necessário que o psicoterapeuta seja uma pessoa real, companheira ativa na relação psicoterápica. Isto significa que quanto maiso psicoterapeuta estiveremsintoniacomoseu próprio processo de crescimento, maiores serão suas condições de não ter medo de ser ele mesmo nessa relação, o que, a meu ver, em muito contribui para a facilitação no processo psicoterápico do cliente. Rogers contribui com essa questão, crendo que o psicotera- peuta maduro terá maiores condições de ser ele mesmo e que isto facilitaria maior profundidade e perspectiva de ajuda na re- lação psicoterápica: Nossa vivência reforçou e ampliou profundamente nosso ponto de vista de que a pessoa que é abertamente capaz de ser ela mesma naquele mo- mento, como é capaz de ser nos níveis mais profundos, é o terapeuta efi- ciente. Talvez nada mais tenha qualquer importância (ROGERS, 1967). Muitas vezes, nós profissionais que nos identificamos com a Abordagem Centrada na Pessoa, e que pregamos a liberdade, temos a tendência de acreditar que ser livre significa a possibili- dade de o outro caminhar na direção dos seus desejos de forma pura. À meu ver, quando falamos de liberdade, nos referimos à possibilidade de a pessoa se consultar de forma inteira e intensa para que tenha condições de decidir caminhar para qualquer ca- minho que julgue ser importante para si, levando em conta todos os ângulos de suas vivências e valores, e isto, em muitas situa- ções, pode movimentá-la a chegar a conclusões que talvez levem o psicoterapeuta a ter que lidar com as suas próprias frustrações, caso esteja esperando alguma determinada conduta do cliente. Novamente, aí, acredito que para nos protegermos desse ris- co temos que estar totalmente livres dos nossos valores na rela- ção psicoterápica. Para isto o psicoterapeuta busca condições de se autoconhecer através de psicoterapia ou de outra forma que entenda como ajuda a si é de fundamental importância para que, sentindo-se uma pessoa melhor, tenha condições de estar de forma mais visceral com o cliente. Existe a “alta”, segundo a ACP? Esther Carrenho Na ACT, não se vê como doente a pessoa que busca a ajuda psi- coterapéutica. É o contrário, entende-se que a pessoa que busca ajuda é justamente Pe rg un ta s e Re sp os ta s 174 de uma vez que ela podia silenciar o quando entendesse neces- | sário e que podia ir falando ou se expressando aos poucos, como quisesse e da forma que ela pudesse dar conta. Meu respeito e | meu caminhar junto no silêncio de Célia foi o que mais ajudou | para que aos poucos ela fosse se expressando. Atualmente, Cé- | lia já faz uso da fala em quase todo seu tempo em psicoterapia. / Há outro tipo de silêncio onde a pessoa já sabe da impor- tância de verbalizar algum fato ou conteúdo emocional, mas, mesmo lembrando do que deve ser dito, resolve não falar na- quele momento, porque não quer lidar com o dolorido daque- la situação. Não vejo isto como resistência, como é visto em outras abordagens, e penso que devemos deixar a pessoa livre para ela falar quando achar que deve. Em geral, a liberdade que se dá para que ela fale quando quiser facilita e abrevia o tempo para que ela se veja pronta para se expressar. Há ainda o silenciar porque a pessoa está refletindo, pensan- do e fazendo ligações dentro de si. São aquisições necessárias dentro do seu processo de busca e de crescimento. É um silên- cio muito mais produtivo do qualquer fala. Muitas falas tem o poder de exterminar as sementes de crescimento que nascem na direção da construção de uma identidade mais coerente, ligan- do o interior ao exterior da pessoa. Lembro-me de um homem que sempre que chegava na mi- nha sala, sentava e ficava uns 10 minutos em profundo silêncio. Sem que eu perguntasse, ele mesmo me dizia: “Estou pensando no que quero falar hoje.” Ou então dizia: “Estou escolhendo o que é mais importante para falar primeiro.” Quero deixar aqui mais uma situação que ocorreu durante um atendimento. (Uma jovem que vou chamar de Vivien, em determinado ' momento de um dos nossos encontros, parou de falar. Como eu estava profundamente em conexão com ela, perguntei, depois de mais ou menos dois minutos: “O que aconteceu, Vivien?” Ela continuou em silêncio. Como me pareceu que a razão tinha que ver com alguma coisa acontecida ali na minha sala, voltei a falar: “Quer me falar o que está passando na sua cabeça? Talvez eu possa ajudar.” Finalmente, ela respondeu: “Você não está me entendendo e fico com muita raiva quando não sou compreendida!” Nesse caso, foi um silêncio provocado | involuntariamente por minha postura, que ela sentiu como rejeição. Mas, na verdade, não havia incompreensão e mui- to menos rejeição da minha parte. Apenas eu ignorava que determinadas atitudes ou falas poderiam detonar nela sen- timentos hostis que bloqueavam a expressão. E a partir daí o diálogo surgiu novamente e pudemos fazer do episódio um encontro enriquecedor tanto para ela como para mim. Como se dá a supervisão em Psicoterapia na ACP? Esther Carrenho “A fecundidade sempre significa vida renovada, vida que se manifesta de maneiras novas, vigorosas e singulares: uma criança, um poema, uma canção, uma palavra amável, um abraço meigo, uma mão solicita ou um novo entendimento... Henri Nouwen* Quando se fala em “supervisão” em psicologia, vem a ideia de que um profissional mais velho e experiente vai analisar um caso e como esse caso é atendido por um profissional mais jo- * Nouwen, Henri JM. — Fontes de Vida — pág. 70 s e j s o d s s y 9 s e j u n b i o d 175 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 176 vem. Depois de analisado, o supervisor passa a ensinar como o supervisionado deve se conduzir no atendimento daquele caso. Na abordagem centrada na pessoa, não é esta a proposta da supervisão. Penso mesmo que o nome dessa interação entre os profissionais da psicologia que praticam os princípios da ACP deveria ter outro nome. Quem sabe poderia ser intervisão ou multivisão. Não sei qual nome seria melhor. Então, por serem mais conhecidas, usarei os termos supervisão, supervisor e su- pervisionado, mesmo não sendo as palavras que mais represen- tam esse tipo de trabalho. Nesse tipo de supervisão, não se tem a intenção de ensinar o psicoterapeuta. Na realidade, pode acontecer e acontece de fato também o aprendizado enquanto há a interação com o super- visor. Mas é um aprendizado de mão dupla. Já houve situações na minha experiência em grupos, onde eu dava a supervisão, em que aprendi muito. Acho que até mais do que o supervisionan- do. Na minha opinião, a proposta principal da supervisão em ACP é facilitar para que o profissional que busca ajuda se aceite e respeite integralmente sua percepção, sua intuição e seus pen- samentos decorrentes do encontro entre ele e o cliente. Parte-se da crença de que o profissional que atende alguém sabe melhor do que qualquer outro sobre o que acontece naquela interação. A supervisão deve oferecer-lhe ferramentas facilitadoras para que ele perceba o mais próximo possível da realidade, o que acontece na sua interação com o seu cliente. É fundamental que se respeite o jeito de ser, a individualida- de, as dificuldades e os limites de cada psicoterapeuta. E a deci- são do que deve mudar ou ser aceito é exclusivamente do super- visionado. Essa decisão deve ser coerente com a sua percepção, suas ideias, suas crenças e seus sentimentos, a tal ponto que, se necessário for, possa ser transparente quanto à própria ressonân- cia, para o cliente, decorrente do encontro psicoterapêutico. E esse mesmo tipo de interação deve acontecer entre o supervisor e o supervisionado. Isto significa que o relacionamento entre supervisor e supervisionado deve ser uma interação profunda de interesse genuíno, sinceridade e transparência. Na supervisão em ACP, não se deve buscar o conhecimento e a prática do supervisor. Mesmo reconhecendo que o que leva alguém a ser procurado para supervisão seja exatamente o que essa pessoa conhece e a aplicação desses conhecimentos na prá- tica. A busca principal deve ser um maior conhecimento sobre si mesmo. Esse autoconhecimento se concretizará na interação com o supervisor e com o grupo, caso a supervisão seja feita em grupo, e revelará o que falta e/ou o que deve ser deixado pelo profissional que busca a supervisão. O conhecimento teórico é necessário e também pode abrir a percepção do supervisionado no seu trabalho. Lembro-me de uma situação em que um homem veio para a psicoterapia porque estava impotente sexualmente. Num encontro com o meu supervisor, falei do quanto me sentia perdida em ajudar o homem a vencer sua própria impotência. Meu supervisor ouviu toda a história e fez um rápido comentário: “As vezes a impo- tência está na vida, mas se manifesta na relação sexual” Ao ou- vir isto, lembrei-me imediatamente do quanto aquele homem já tinha me falado de como se sentia fracassado no trabalho, e eu estava tão focada na queixa inicial que me tornei surda para o todo de sua fala. E naquele momento o conhecimento do super- visor foi o que mais facilitou para que eu percebesse onde estava falhando. Então, tudo que um supervisor ou um grupo possa conhecer pode ter muita serventia na supervisão se for usado como ferramenta facilitadora para que o próprio profissional perceba e encontre o que busca, no desejo de ser e dar o melhor de si num atendimento. Rogério Buys (1987) entende que o conhecimento teórico deve ser discutido para um entendimento imediato. Concordo. A supervisão não é um programa, mas pode ser um lugar onde s e j s o d s o y 9 s e j u n h i a d : Pe rg un ta s e Re sp os ta s 178 se discute algum aspecto da teoria e como isto se dá na prática, dependendo da necessidade, das dúvidas e dificuldades apresen- tadas pelos supervisionados. À supervisão em ACP tem dois focos: o psicoterapeuta e a pessoa em atendimento pelo psicoterapeuta, que já está presente na supervisão. E o único meio de o supervisor conhecer a pes- soa em questão é através do supervisionado. Quando temos um profundo interesse pela pessoa que busca a psicoterapia, inter- nalizamos essa pessoa, sem o comprometimento da nossa indi- vidualidade e identidade. No trabalho de supervisão, sugiro aos psicólogos que apresentem a pessoa internalizada. Alguns não se sentem muito à vontade para fazê-lo, mas a maioria represen- ta a pessoa, como se fosse ela. É surpreendente observar como o simples fato de o profissional “viver” por alguns minutos o cliente internalizado já esclarece tantas coisas para a compre- ensão do seu atendimento. Os sentimentos e a percepção do profissional depois dessa vivência são fundamentais para discus- são e esclarecimentos das possíveis dúvidas apresentadas por ele. Porém, acredito que também se chega aos mesmos resultados por caminhos diferentes do que relatei acima. Há quatro aspectos que são os mais comuns a serem esclare- cidos num trabalho de supervisão. O primeiro é a percepção de que, em algum momento, os conteúdos emocionais do psicote- rapeuta interferiram ou interferem na interação psicoterapêutica. À supervisão em psicoterapia não é psicoterapia do profissio- nal, mas, no contexto de supervisão, ela pode apontar conteúdos emocionais ainda não integrados à vida, interferindo na relação psicoterapéutica. E, nesses casos, o profissional pode escolher por uma entre duas opções. Interromper o vínculo terapêuti- co com o cliente ou tratar o que foi descoberto na sua terapia individual para que tenha condições de separar o que é da sua história, do cliente. O segundo é uma compreensão maior do sofrimento e/ou dificuldades do cliente, facilitando assim uma compreensão em- pática também mais abrangente. Essa descoberta pode ampliar os recursos internos do supervisionando para um acolhimento maior do seu cliente, proporcionando assim mais espaço na re- lação para o crescimento de quem busca ajuda. O terceiro é o discernimento de onde está a raiz da possível dificuldade que o cliente quer superar. A vantagem dessa desco- berta é que, uma vez apontada para o cliente, este possa refletir e confirmar o quanto a descoberta do psicoterapeuta está rela- cionada, ou não, com a dificuldade dele. E, finalmente, a dificuldade que o supervisionado está tendo em aceitar a si mesmo nas suas percepções, sentimentos, conhe- cimento e intuições em relação ao atendimento apresentado. Esta, é ao meu ver, a dificuldade mais comum e é também a que mais se repete. Penso que ela está relacionada com o grau de aceitação e confiança que o profissional tem de si mesmo. E muitas vezes é necessária uma autoavaliação sobre sua história de vida, que também deve ser feita na psicoterapia pessoal, para detectar de onde vem e destruir a dinâmica em desaprovar a si mesmo, desnecessariamente. Enfim, quero dizer que é imensamente prazeroso ver o aco- lhimento e as mudanças que um supervisionado faz de si e em si mesmo, na interação com o supervisor! Que é mais importante para o bom desempenho do psicoterapeuta da ACP? Marcos Alberto Quando estou no meu melhor, como facilitador de grupo ou terapeu- se js od so y e se ju nb io d 179 P e r g u n t a s e R e s p o s t a s 180 ta, descubro outra característica. Percebo que quando estou mais perto de meu selfíntimo, intuitivo, quando de alguma forma estou em con- tato com o desconhecido em mim, quando talvez esteja no relaciona- mento em um estado de consciência ligeiramente alterado, então, tudo o que faço parece estar repleto de cura. Minha simples presença, então é libertadora e benéfica. Não há nada que eu possa fazer para forçar essa experiência, mas quando consigo relaxar e ficar perto do meu cer- ne transcendental, então talvez eu me comporte de modo estranho e impulsivo no relacionamento, modo que não posso justificar racional- mente, e que não tem nada a ver com meus processos de pensamentos. Mas estas condutas estranhas vêm a ser certas, de algum modo. Nesses momentos parece que o meu espírito interior alcançou e tocou o espí- rito interior do outro. Nosso relacionamento transcende a si próprio e se torna parte de alguma coisa maior. Energias de cura e crescimento estão presentes (ROGERS, 1987). Fica muito difícil, depois da citação acima, falar a respeito desse tema, pois, a meu ver, essa citação é quase completa e traduz integralmente o que vejo ser de total importância para um bom desempenho do psicoterapeuta a partir dos princípios da ACP. Quero, no entanto complementar que, a meu ver, para que eu esteja com um funcionamento ótimo na relação psicoterá- pica, é imprescindível que eu me norteie pelos princípios dessa abordagem. O grande desafio, em minha opinião, é me nortear nesses princípios sem me utilizar deles como técnica, ou seja, incorpo- rando-os ao meu jeito de ser e em minha vida, de modo que eu esteja presente. Não quero pensar nesses princípios. Quero ser esses princípios! Se prestar atenção neles, abandonarei o meu jeito de ser, se estiver preocupado em ter empatia, em ser congruente e em ter uma capacidade de aceitar a pessoa de forma incondicional, estarei me distanciando da minha espontaneidade e não estarei inteiro na relação. Estar com o outro é acreditar na capacidade da pessoa em se autodirigir. É ter confiança de forma integral em sua capa- cidade. Para estar com o outro é importante que eu tenha essa mesma confiança em mim e em saber que o fato de eu ser eu mesmo nessa relação contribuirá para o desenvolvimento dessa relação e consequentemente possibilitará maiores condições de ajuda à pessoa. Ter os princípios facilitadores dessa abordagem sendo eu mesmo talvez seja o grande desafio do psicoterapeuta na relação de ajuda para aprimorar o meu desempenho e ter maiores chan- ces de facilitar condições para que a pessoa tenha no ambiente psicoterápico um clima favorável ao seu crescimento, lembran- do que a visão de crescimento é sempre algo muito pessoal e relativo. É ter a capacidade de transcender o pensamento e o conhecimento. Sei por experiência própria que não é fácil sermos nós mesmos na relação psicoterápica. Sermos genuínos significa assumirmos a nossa responsabilidade nessa relação e vejo que é muito mais fácil nos apoiarmos em algo que esteja fora da gente para podermos responsabilizar caso algo não dé certo. É muito mais fácil, por exemplo, optarmos em fazer do jeito que acreditamos que Rogers faria. É muito mais cômodo ten- tarmos imitar Rogers, sendo um “rogeriano”. Teremos a quem culpar caso algo de errado na relação. Como já mencionei em outras ocasiões, este era um dos pavores de Carl Rogers. Em um de seus livros, Irmão Hen- rique Justo conta uma situação que presenciou a respeito do tema: Assisti no Rio de Janeiro, em 1977, a um diálogo entre Rogers e uma psicóloga: Ela: Eu também sou rogeriana. se js od se ky a s e j u n b i a d 181 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 182 Ele: Não é possível! Somente há um rogeriano no mundo: esse sou eu Você tem que ser você. Se achar úteis colocações minhas, deverá assi- milá-las do seu modo (JUSTO, 2002). Isto vai ao encontro do que entendo ser Abordagem Centra- da na Pessoa: a possibilidade de desfrutarmos a nossa liberdade em sermos nós mesmos a partir de alguns princípios que fazem sentido em minha vida e consequentemente na relação de ajuda. Não quero desempenhar um papel. Quero ser eu mesmo, crendo que isto facilite de alguma forma no outro a possibilida- de de ele ser ele mesmo também, para que, a partir daí, exista um encontro que enriqueça a ambos e propicie condições para que a pessoa se desenvolva nesse processo. Como a ACP trata as doenças mentais? Marcos Alberto Eu não gostaria de ser mal-compreendido. Não tenho uma visão inge- nuamente otimista da natureza humana. Tenho perfeita consciência do fato de que, pela necessidade de se defender dos seus terrores íntimos, o indivíduo pode vir a comportar-se de uma maneira incrivelmente feroz, horrorosamente destrutiva, imatura, regressiva, antissocial, pre- judicial. Mas não deixa de ser verdade que o trabalho que levo a cabo com indivíduos desse gênero, a pesquisa e a descoberta das tendências que estão oriundas muito positivamente neles todos, e em todos nós, ao mais profundo nível, constituem um dos aspectos mais animadores e revigorantes da minha experiência (ROGERS, 1961). Desde os primeiros anos das nossas vidas, aprendemos a ro- tular as coisas e as pessoas e do mesmo jeito aprendemos a con- viver de forma passiva aos rótulos que sofremos. Deixamos de ser pessoas e viramos um rótulo! Em minha época de estudante universitário, lamentavelmen- te, aprendi a maior parte do tempo a rotular as pessoas. Rotular sentimentos, sofrimentos, alegrias, ansiedades e euforias. Apren- di que determinados sentimentos podem existir desde que estes tenham um prazo de validade. Sentimentos que persistem além desse prazo são rotulados imediatamente. O que são doenças mentais senão um rótulo? A Abordagem Centrada na Pessoa propõe que quebremos os estigmas para que possamos ir além e em direção a pessoa que sofre e que por algum motivo foi rotulada em seus sentimentos ou atitudes. Nossa abordagem ousa acreditar no potencial da pessoa mesmo quando ninguém mais acredita. Para compreender como se cuida das pessoas com doenças mentais, penso que seja de fundamental importância entender que a nossa abordagem enxerga todas as pessoas dignas de con- fiança e que estas estão a todo o momento tentando encontrar melhores saídas para si, sabendo que, muitas vezes, essas saídas, para aquelas pessoas ditas saudáveis, não têm nenhuma impor- tância ou nenhum significado, mas se tivermos a real capaci- dade de termos uma consideração empática, levando em conta o contexto da pessoa, talvez seja mais fácil compreender o seu movimento e a sua tentativa em encontrar as suas saídas. Falando das pessoas estigmatizadas e da busca em encontrar melhores saídas Rogers comenta: As condições em que se desenvolvem essas pessoas tem sido tão desfavoráveis que suas vidas quase sempre parecem anormais, distorcidas, pouco humanas. E, no entanto, pode-se confiar que a tendência realizadora está presente nessas pessoas. À chave para en- tender seu comportamento é a luta em que se empenham para cres- s e j s o d s e y e s e j u n b i o d 183 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 184 cer e ser, utilizando-se recursos que acreditam ser os disponíveis. Para as pessoas saudáveis, os resultados podem parecer bizarros e inúteis, mas são uma tentativa desesperada da vida para existir. Esta tendência construtiva e poderosa é o alicerce da Abordagem Centrada na Pessoa (ROGERS, 1983). A meu ver, nossa abordagem busca ajudar a pessoa estig- matizada como “doente mental”, da mesma forma como lida com qualquer outra pessoa que busca ajuda, ou seja, tendo uma compreensão empática, sendo congruente, tendo uma conside- ração incondicional positiva e crendo sobretudo, no princípio de tendência atualizante, pois essa pessoa, assim como qualquer outra, é única em seus sentimentos e sofrimentos e mesmo que eu não consiga compreender o seu movimento, tenho a convic- ção de que ele tem algum sentido para ela. Descobri, através da minha experiência, que todas as pesso- as são dignas de confiança e que todas querem encontrar uma saída melhor. Tive inúmeras oportunidades de atender pessoas estigmatizadas, que, ao sentirem no ambiente psicoterápico a liberdade de serem elas mesmas sem rótulos, tiveram a possibi- lidade de restaurarem as suas vidas. Aprendi também, através da minha experiência, que as pessoas que vivem sob o estigma de “doente mental”, muitas vezes, nada mais são do que pessoas oprimidas em uma rede de relações opressoras complexas. Já vi pessoas “enlouquecerem” para terem coragem de desafiar, terem a possibilidade de fa- lar aquilo que estava engasgado, para conviverem com os pró- prios medos, receberem afeto, serem enxergadas ou para serem aceitas. Penso que ingenuamente e muitas vezes de forma bem in- tencionada, deixamos de olhar o outro como uma pessoa e prio- rizamos o estigma. Dessa forma, esquecemos o sofrimento e os sentimentos, que é o que de fato importa. Infelizmente, não se conversa com o “doente mental” a não ser que seja para que haja uma investigação no seu quadro para a criação de novos rótulos. Novamente, Rogers emite a sua opinião de como estar com a pessoa: Penso num homem com quem passei muitas horas, grande parte delas em silêncio. Houve longos períodos em que não tive jeito de saber se o relacionamento tinha ou não algum sentido para ele. O paciente não se comunicava, estava aparentemente indiferente, retraído, inca- paz de se exprimir. Lembro de uma hora em que se sentiu completa- mente inútil, desesperado, com impulsos para o suicídio. Queria fugir, acabar consigo, pois murmurava com desespero flagrante: “Não me importa” Respondi: “Sei que você não se importa consigo, não se importa de todo, mas só quero que você saiba que eu me importo.”. E então, depois de uma longa pausa, veio uma violenta torrente de soluços profundos, destruidores, arquejantes, que continuaram por quase meia hora. Ele observara o sentido de meu sentimento por ele (ROGERS, 1967). Vejo que é fácil para nós, psicoterapeutas, estarmos com uma pessoa que não possui algum tipo de rótulo. É muito fácil re- marmos a favor do senso comum. É simples não desafiarmos a visão acomodada do tratamento aos “doentes mentais”. A Abor- dagem Centrada na Pessoa, através de sua postura em acreditar no potencial humano, ainda quando ninguém mais crê, vem desafiar todo esse processo que, infelizmente, é tão bem sedi- mentado no campo da saúde mental. A minha opinião é que talvez esteja na hora de repensarmos o que significa esse termo e todas essas posturas aprendidas. A meu ver, a proposta centrada na pessoa no campo da “saú- de mental” é a de nos contrapormos às estruturas para tentar- mos facilitar condições para que essas pessoas possam voltar a existir de forma livre de ameaças e estigmas para, quem sabe, s e j s o d s o y é s e j u n b i o d 185 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 186 terem a oportunidade de se fortalecerem em busca de uma nova saída. Dê exemplos de como se pratica a congruência. Marcos Alberto Como já foi dito, a congruência é um dos princípios que acredi- tamos ser facilitador na relação de ajuda dentro dessa visão. A meu ver, congruência é uma capacidade imprescindível do psicoterapeuta na relação de ajuda, em ser autêntico com a pessoa em suas percepções e sentimentos. São sentimentos que de alguma forma persistem no psicoterapeuta durante essa rela- ção e que de alguma forma interferem para que ele esteja inteiro nesse processo. A esse respeito, Eugene Gendlin, grande colaborador de Ro- gers e criador da Filosofia do Implícito, nos fala: Seria errado dizer que exprimo tudo o que ocorre em mim, pois milha- res de coisas estão ocorrendo em mim a todo o momento, e não podem nem ser formuladas nem expressas separadamente. Além disso, não deixo escapar impulsivamente a primeira coisa que passa pela minha cabeça. Vivo interiormente alguns momentos, e assim descubro em mim uma resposta ao cliente, ou ao que aconteceu entre nós ou ao nosso silêncio (GENDLIN, 1967). É importante que nessa expressão eu deixe claro que este é um sentimento meu com relação àquele momento e que esse sentimento não é uma verdade do cliente. Quando es- tou atendendo uma pessoa, costumo e gosto de deixar claro, quando digo algo que se passa em mim, que esta é uma sen- sação, percepção ou visão minha e que talvez nada tenha que ver com a pessoa. Tenho necessidade de exprimir esses meus sentimentos ou percepções, deixando sempre claro que ele tem o direito óbvio de fazer o que quiser com essa minha manifestação. Gosto de ter esse cuidado, pois, infelizmente, há um grande mito dentro da psicologia e da psicoterapia, de que, se o psico- terapeuta falou, é porque é algo preciso, ainda que o cliente não esteja percebendo naquele momento. Não tenho a menor dificuldade em abandonar o que disse e em retomar o caminho do cliente, caso o que eu tenha dito não tenha nenhum sentido para ele. O grande “problema” em sermos autênticos na relação de ajuda é que, ao fazermos isto, estamos nos expondo e abrindo mão do poder que muitas vezes nos é outorgado pelo cliente ou pelo senso comum. Já ouvi clientes falarem: “Se você disse, é porque deve ser verdade...” Cada vez mais, tenho a intenção de abandonar as minhas verdades e estar conectado ao cliente na di- reção que ele está seguindo. Ao sermos congruentes, perdemos o controle, pois aquele sentimento, através da minha expressão, já não mais me pertence e estou vulnerável de alguma forma, pois o cliente poderá fazer uso dessa expressão da forma como quiser. Corro o risco de o cliente discordar de mim ou de ele se decepcionar comigo, mas também corro o risco de, através da minha expressão autêntica, facilitar algo no cliente e, com toda certeza, por meio da congruência, terei condições de me esvaziar dos sentimentos que me fazem refletir, me fazendo ficar distante da relação com a pessoa. Quando sou capaz de me expressar de forma autêntica, estou novamente pronto para continuar cami- nhando com ela, seja qual for a sua reação. Quero lembrar que a congruência não pode funcionar sozi- nha; é importante que ela caminhe com os demais princípios da Abordagem Centrada na Pessoa, pois se esses princípios esti- se js od se y e se ju nb io d 187 Pe rg un ta s e Re sp os ta s 188 verem integrados em mim, terei maiores condições de ser con- gruente de forma empática, ou seja, terei condições de expressar o que acontece em mim nessa relação de forma cuidadosa. Con- gruência não significa falar tudo aquilo que passa em minha cabeça. Também não significa falar algo de qualquer forma para o cliente, embora signifique ter a capacidade de manter uma relação genuína. Segundo Rogers: Ser genuíno significa revelar à outra pessoa “onde estamos” emocio- nalmente. Pode abranger confronto e a expressão pessoal e franca de sentimentos negativos e positivos. Portanto, a congruência é um as- pecto fundamental na vida em comum num clima de autenticidade (ROGERS, 1977). Agrada-me ser capaz de dizer exatamente aquilo que ocorre comigo na relação com o outro de forma clara, assumindo a minha responsabilidade pelo que disse e por qualquer consequ- ência que isto possa acarretar. Tenho a convicção de que é facilitador na relação o fato de eu dizer que estou aborrecido, ou com medo, ou apreensivo, caso esteja. Sei que posso dizer algo que percebo nele desde que isto não seja dito como uma verdade escondida da pessoa, e sim como uma percepção minha. Praticar essa congruência significa encontrar o seu próprio jeito de ser autêntico na relação, respeitando também os meus próprios limites, mas, ao mesmo tempo, arriscando enfrentar os próprios medos em fazer parte de uma relação verdadeira. Uma das poucas certezas que tenho é que viver é algo arriscado e eu quero ter a capacidade de correr o risco que a congruência me traz na relação psicoterápica, pois, através dessa postura, tenho a certeza de que poderei avançar junto com o cliente a um novo nível nessa relação e essa possibilida- de, de estar de forma inteira e verdadeira com o outro, é algo que sempre me enriquece. Nem ele, nem eu jamais seremos os mesmos! Que fazer quando um familiar liga para contar alguma coisa do meu cliente? Marcos Alberto Quero deixar claro que não estou falando em nome da Aborda- gem Centrada na Pessoa nem em nome de nenhuma conduta padrão ou correta. Estou falando em meu nome e o meu con- vite ao leitor é de que a minha visão possa servir apenas como possibilidade de reflexão, para que, ainda que discorde inteira- mente dessa posição, possa descobrir o seu jeito de lidar com essa situação que por vezes ocorre em ambiente terapêutico. Essa questão, a meu ver, embora possa parecer simples, é altamente complexa, pois quando falamos de psicoterapia, para mim, estamos falando do respeito incondicional ao cliente, ou seja, estou vinculado de corpo e alma a ele, nessa relação, e é com ele que quero caminhar nesse processo, mantendo essa re- lação totalmente protegida de qualquer interferência externa. Penso que uma boa questão a ser levantada tem a ver com qual é o objetivo de eu ter as informações dessa terceira pessoa, uma vez que tenho convicção na capacidade do cliente em bus- car melhores alternativas para si. Uma segunda e também importante questão é se seria uma atitude ética de minha parte, segundo os princípios da Abor- dagem Centrada na Pessoa, levar em conta algum tipo de in- terferência externa em uma relação onde eu estou totalmente vinculado ao cliente. s e j s o d s o W e s e j u n B i a d 189 Pe rg un ta s e Re sp os ta s Quero deixar claro que não vejo este como um tema simples e que sempre quando vivencio uma situação destas há em mim uma grande tensão. Acredito na possível boa intenção da família ou de outras pessoas que de algum modo procuram o psicoterapeuta para tentar contar algo a respeito do cliente. Compreendo que há uma preocupação por parte dela, de que talvez o cliente este- ja omitindo algum tipo de informação ou que esteja contando no ambiente psicoterápico apenas o que “convém” a ele e que, dessa forma, a intenção da terceira pessoa seria mostrar o “outro lado” da história. Tenho convicção do estrago que essas “boas intenções” podem causar. Já vi pessoas que se vêem em amplo processo de crescimen- to e de libertação, mas que de alguma forma, sob a perspectiva da família, está “piorando”, pois ela antes era uma pessoa dócil e passou a ser rebelde depois do início do processo psicoterápico. Quero dizer com isto que o processo de crescimento é algo muito pessoal e crescimento e “melhora” dependem sempre do ângulo de quem olha. Uma vez, atendi um rapaz que estava cursando o último ano de direito e que durante o processo psi- coterápico foi se dando conta de que nunca quis ser advogado e que estava fazendo esse curso em função da pressão do pai que tinha a mesma profissão e era um profissional bem-sucedido. Sentindo-se fortalecido internamente, o cliente resolveu trancar a sua matrícula do curso de direito e prestar vestibular para bio- logia, que era o que ele sempre sonhou cursar. Sob a perspectiva do cliente, ter coragem de romper com o curso escolhido pelo pai em benefício de sua própria escolha significava um grande avanço, enquanto para a sua família esse ato significava uma insanidade, ou seja, para a família essa pes- soa estava muito pior, pois havia se tornado um filho rebelde. Na minha visão, não me ajuda saber algo do cliente que não seja por ele mesmo e sinto que ainda que eu esteja bem in- rm m e a t tencionado, ao dar abertura para que uma terceira pessoa entre nessa relação, talvez ingenuamente eu passe a seguir os passos dela e não mais os passos do meu cliente. Alguns profissionais levantam a seguinte questão: e se o cliente estiver omitindo algo? Novamente, penso o quanto tudo sempre é relativo, inclusive em se tratando do que significa “estar omitindo algo”. A minha experiência me faz acreditar que a pessoa tende a se expressar do seu jeito, no seu ritmo e a partir do que é incômodo para ela. A minha visão é de que mesmo que essa “omissão” exista, terá um sentido para o cliente e eu quero saber respeitá-lo e compre- endê-lo também em suas “omissões”, em suas verdades e em seu ritmo. À minha visão é que, se eu me aproveitar de algo que não venha dele na Rogers muda para Nova Iorque e vai estudar teologia no “Union Theological Seminary”. Seu pai, Walter Rogers, lhe ofereceu ajuda financeira para que Rogers fi- ! Montenegro, Oswaldo - Mudar dói, não mudar dói muito — Álbum A Lista s i o b o H 2 9 OP Bp IA Y A vi da de Ca rl Ro ge rs 20 zesse o curso para pastor desde que fosse no “Princeton Semina- ry”, que era conservador e tinha a mesma rigidez teológica que Rogers estava abandonando. Ele recusa a ajuda e escolhe um se- minário com um bom reconhecimento acadêmico, mas também considerado muito liberal pelos fundamentalistas evangélicos. Nesse seminário, Rogers percebe a liberdade que começara a acreditar, mas que ainda não tinha experimentado na universi- dade. Ele se refere a esse tempo como um tempo muito especial em sua vida (ROGERS, 1961, p. 9): “conhecendo como co- nheço agora as universidades e as escolas superiores — sabendo a rigidez dos seus regulamentos —, fico verdadeiramente impres- sionado pela importante experiência que tive no Union.” Avendaio Amador (1999) refere-se a esse tempo de Rogers como um período em que ele encontrou sustentação para pros- seguir no caminho da busca da liberdade da expressão, na sua vida, iniciado com a ruptura com a religiosidade dos seus pais, além do contato com mestres que também defendiam a demo- cracia de pensamento: Nesse período, Rogers põe-se “em contato com grandes eruditos e mestres, em particular com o doutor A. C. McGiffert, que acreditava na liberdade de procurar e esforçar-se para encontrar a verdade, onde quer que esta nos leve” (ROGERS, 1961, p. 19). A herança do mestre soma-se ao sentido de liberdade que se respirava nas paredes do semi- nário, pois havia uma permanente disposição entre os estudantes para falar de qualquer tema, com qualquer membro do corpo estudantil, sem excluir os professores (BETHGE, 1970). O Union Theological Seminary foi o primeiro espaço de resolução para Rogers. Ali encontraria suas primeiras respostas para a ruptura com sua família, com sua tradição religiosa e com seus próprios projetos de vida e também suas ideias a respeito do homem teriam de sofrer uma severa metamorfose. Os seres humanos eram, segundo havia acreditado anos antes, objetos do amor de Deus e objeto de suas próprias preocupações, já que havia de trabalhar para aproximá-los da salvação que o cristia- nismo podia oferecer. No entanto, agora, a teologia liberal ofe- recia-lhe novas ferramentas para pensar em um homem capaz “de desenvolver seus potenciais, liberar-se das suas preocupações, encontrar-se em si mesmo e por si mesmo a liberdade e despo- jar-se dos obstáculos que lhe impediam desenvolver seus propó- sitos. No seminário, Rogers encontrou espaço para desenvolver suas próprias ideias e procurar suas próprias respostas. Para isso, desenvolveu, junto com alguns colegas, um grupo de reflexão para desenvolver suas próprias inquietudes e procurar encontrar suas próprias respostas, sem restringir-se a um programa... É no Union, que Rogers conhece as ideias de, e talvez até pessoalmente, John Dewey, educador de fama mundial que de- fendia a democracia nas instituições e na didática pedagógica. À possibilidade de ser livre para pensar e refletir encanta Rogers, que começa a vivenciar pela primeira vez a “não diretividade”, da qual ele será, depois de alguns anos, um grande e influente defensor. Nesse exercitar a liberdade que a teologia liberal lhe proporciona, Rogers conclui que não queria a profissão pasto- ral. Ele não queria ficar preso em nenhuma situação onde não pudesse discordar e, se necessário, mudar de ideia. E penso que ele estava consciente da realidade eclesiástica, onde, ainda hoje, há restrições para as divergências. Observem as palavras dele (1977, p. 20): “As minhas crenças já tinham sofrido tremendas alterações e possivel- mente continuariam a mudar. Tornava-se para mim terrível ter de pro- fessar um certo número de crenças para poder me manter na profissão. Eu queria encontrar um campo no qual pudesse estar seguro de que a minha liberdade de pensamento não sofreria restrições.” Rogers desiste de ser pastor, mas reconhece que, possivel- mente, para sempre se interessaria por questões relativas ao sen- s i o B o y NE S 9p Bp IA y 21 A vi da de Ca rl Ro ge rs 22 tido da vida e à possibilidade de se construir uma melhoria para o ser humano. Questões estas que também foram a base da sua educação cristá. Ele abandona a rigidez e a falta de liberdade das suas origens, mas não abandona a essência dessas mesmas cren- ças. E elas realmente vão permear toda a existência de Rogers. E agora? Nem agrônomo, nem pastor. Outra encruzilhada. Por sinal, encruzilhadas estão sempre presentes por vários anos na vida de Rogers. Psicologia Todo ser humano tem a chance de mudar a qualquer momento...” Viktor E. Frankl Enquanto estudava teologia, Rogers se interessou por cursos e palestras sobre psicologia e psiquiatria. Importante lembrar que a psicanálise, vindo da Europa, encantava o mundo e adentra- va cada vez mais nas escolas e universidades. Ele passa então a fazer mais cursos com um enfoque psicológico, mas agora no Teacher's College da Universidade de Columbia, uma institui- ção exatamente em frente ao Seminário, que ele acabara de dei- xar. Além dos cursos, começa também a trabalhar na educação com um dos professores, William H. Kilparrick, que Rogers admirava. Ao mesmo tempo em que começa seu trabalho de atendimento clínico prático com crianças sob a orientação de Leda Hollingwort, que Rogers considera uma pessoa sensível e prática. Deu-se muito bem e foi se sentindo cada vez mais atraído por esse trabalho. Sem dificuldades, passa a trabalhar na área de orientação psicopedagógica. Essas atividades foram despertando nele motivação e interesse pela psicologia clínica e, quase sem perceber, ele já estava percorrendo o caminho que lhe foi comum na vida — o envolvimento com atividades em que ele tinha um verdadeiro interesse. Pede e ganha uma bolsa como interno no Instituto para a Orientação da Criança. Essa organização estava se iniciando e não tinha uma direção ou referência muito rígida, deixando que os profissionais fossem livres para fazer o que entendiam que era o melhor. Rogers convive com dois profissionais de orientação freudiana e sente na pele as diferenças entre a psicanálise e “as perspectivas estatísticas rigorosas, científicas e friamente objeti- vas que prevaleciam no Teacher's College” (1961, p. 10). No- vamente, encontramos Rogers em um dilema. Dessa vez, não mais na escolha da profissão, mas na concepção dos conceitos e da prática na relação de ajuda. Diana Belém, em seu livro Carl Rogers: do diagnóstico à abordagem centrada na pessoa, refere-se a essa época como o tempo em que Rogers começa a vivenciar o conflito Filosofia X Ciência. Na comparação dos conceitos freudianos com os pressupostos behavioristas e também com o modelo positivista, Rogers percebe e se sente segundo ele mes- mo “em dois mundos completamente diferentes e nunca os dois iriam se encontrar” (ROGERS, 1961). Logo depois, Rogers procura um trabalho remunerado para dar continuidade ao seu doutorado e fica muito feliz quando é contratado, como psicólogo, para exercer um trabalho do seu interesse no Child Study Department da Associação para a Pro- teção à Infância em Rochester, Nova Iorque. Primeiro Emprego Nessa instituição, Rogers trabalha com crianças por 12 anos. Eram crianças, consideradas delinquentes e sem recursos, en- caminhadas pelos serviços sociais e pelos tribunais. Ele mesmo considera esse tempo de muita importância para as definições s i 9 6 0 H H E D 9P E P A y A vi da de Ca rl R o g e r s 24 que viria a fazer na escolha de como trabalhar na psicologia. relação de ajuda, além de isto não facilitar em nada o seu desenvolvimento, estarei ainda, de alguma forma, destruin- do a relação de confiança tão imprescindível na psicoterapia. Em minha opinião, isto tem que ver também com a postura ética dentro dos princípios dessa abordagem, pois me ocupando de informações vindas de fora talvez esteja contribuindo para a manutenção de uma relação “opressor/oprimido” ou indo a favor de determinados interesses que não guardam nenhuma relação com a pessoa que está buscando ajuda. Quando algum familiar me procura para contar algo a respeito do cliente, antes de ouvi-lo, costumo dizer que exatamente tudo aquilo que me for dito será comunicado à pessoa que atendo, pois a minha relação é com ela e não posso quebrar esse vínculo de confiança tão essencial em um atendimento psicoterápico. Procuro expressar isto de forma cuidadosa a essa terceira pes- soa, que, como já mencionei, na maioria das vezes, está bem intencionada, embora esteja olhando pela sua perspectiva. Cos- tumo perguntar para essa pessoa como ela se sentiria se fizesse psicoterapia com alguém que ouvisse uma terceira pessoa falan- do dela sem que ela soubesse. Vejo que esse pequeno exercício se js od sa y 9 se ju nb is d 191 de empatia normalmente faz a pessoa compreender que, apesar da boa intenção, ela esta sendo invasiva em uma relação que não pertence a ela. Independente de ouvir ou não essa terceira pessoa, sinto-me obrigado a compartilhar isto com o meu cliente, pois é dele o interesse por qualquer coisa que tenha a ver com a sua vida. Incentivo a terceira pessoa, que julga tão importante que eu a ouça, a pedir autorização para o cliente para que eu possa ouvi-la. Costumo confiar inteiramente no potencial do meu clien- te e creio que é a partir dessa confiança que tenho condições de buscar facilitar nessa relação uma possibilidade de ajuda. A partir desse pressuposto, a tentativa de “ajuda” vinda de fora, sem a autorização do cliente, causaria grande estrago na relação de confiança e esta, a meu ver, é algo fundamental na relação psicoterápica. Considerações Finais Esther Carrenho Espero que nestas páginas eu tenha conseguido passar um pouco do que acredito ser importante no atendimento em psicoterapia e/ou aconselhamento. Meu maior desejo é que você, leitor, acredite em si mesmo a tal ponto que todo e qualquer crescimento que você busque vise a ampliar sua com- preensão e aperfeiçoar seu potencial intrínseco, que é especial e único. É dessa forma que você poderá ajudar mais e mais as pessoas — sendo cada vez mais você mesmo. A herança de Rogers pode lhe acrescentar muito conhecimento; minhas experiências podem enriquecer sua prática; mas só o que você tem de único, num clima de acolhimento e transparência, po- derá mobilizar pessoas a mudanças para o encontro delas mes- mas. Por mais que você viva, apenas uma porcentagem mínima de pessoas estarão frente a frente com você numa interação de ajuda psicológica. Mas que todas aquelas que assim o fizerem possam sair da sua presença mobilizados para encontrar, cada vez mais, a própria unicidade. E todos que desenvolvem ao máximo o que tem de único experimentarão mais da plenitude da vida. Conheça a si mesmo, cada vez mais. Leia. Cresça. Ouse. E não tenha medo de ser você mesmo, na sua essência! 193 Marcia Tassinari Participar deste projeto foi um prazer, pois me permitiu orga- nizar algumas de minhas idéias que brotam aleatoriamente du- rante minhas atividades profissionais e também em momentos de caminhadas no calçadão do Leblon, na cidade do Rio de Ja- neiro. Olhar o mar, as montanhas, as pessoas, o céu, as nuvens, o vento, tudo me coloca em contato com a vida. Agredeço, por- tanto, à Esther pela oportunidade de colaborar neste livro. Espero que os temas aqui apresentados possam contribuir de maneira significativa para os estudantes e profissionais que se interessam por esta visão de ser humano, proposta pela Psicologia Humanista e ratificada pela Abordagem Centrada na Pessoa. O principal fundador da ACP, o psicólogo norte americano, Carl Rogers, apresentado no início deste volume, já faleceu há mais de duas décadas, entretanto suas idéias seminais continu- am atuais e norteadoras dos trabalhos com seres humanos. Com certeza, nós que tivemos a possibilidade de conhece-lo pessoal- mente e sermos treinados pelos seus principais associados (John Wood, Maureen Miller, Maria Bowen e Natalie Rogers), sen- timos a responsabilidade de transmitir este conhecimento da forma mais próxima às raízes humanistas. Por outro lado, também temos o compromisso de atuali- zar a teoria, experimentando novos contextos de aplicação da ACT, revisitando outros pontos de vista para melhor contrastar a abordagem e potencializá-la. Neste sentido, os trabalhos atuais nas comunidades e com as comunidades, nas instituições públicas e privadas, em contex- tos diversificados, com indivíduos, casais, famílias, pequenos e grandes grupos, desenvolvidos em solo brasileiro, nos permitem ratificar o SIM que Rogers permeou suas atividades: “Basica- mente, a expressão mais significativa que Rogers tinha a dizer, talvez tenha sido simplesmente, 'yes' — sim ao crescimento pes- soal, à verdadeira aprendizagem, ao comportamento construti- vo, aos relacionamentos nutritivos, ao pensamento honesto, à vida” (p. 276, Wood, 1994) Espero ter contribuído para elucidar algumas questões recor- rentes a quem se inicia na prática clínica, bem como levantar al- gumas possibilidades ainda não totalmente exploradas. O sabor de “quero mais” estimula a prosseguir. Neste sentido este livro pode servir como incentivador das questões que surgem com a prática centrada na pessoa. Responder à prática, quando esta não funciona como deveria, fortalece a teoria, posto que chama a atenção para suas fragilidades. É apenas neste momento que uma teoria pode avançar. O movimento teoria-prática-pesqui- sa-teoria-pesquisa-prática não tem fim. Marcos Alberto Procurei descrever um pouco da minha forma de compreender a Abordagem Centrada na Pessoa, assim como seus princípios, atitudes facilitadoras e a forma como ela lida com algumas si- tuações. A minha intenção neste livro não é a de convencer o leitor a respeito da importância dessa abordagem no campo da psicolo- gia, da psicoterapia, das demais relações de ajuda ou nas relações humanas. A minha intenção foi proporcionar-lhe a possibili- dade de conhecer essa abordagem a partir da minha visão para que ele possa refletir e criar a sua própria maneira de enxergar e decidir por si qual é a importância da ACP nesses campos, assim como em sua vida. Não me agrada a visão de uma Abordagem Centrada na Pessoa única, completa ou estática. Essa abordagem, em minha opinião, se contradiria se encontrasse uma verdade única ou res- posta absoluta para todas as questões. A Abordagem Centrada na Pessoa, em vinha visão, incita nas pessoas que se identificam com ela uma grande responsabilidade em recriarem a ACP para que ela continue evoluindo. Fica aqui o meu convite para que o leitor interessado nessa abordagem procure fazer a sua parte, buscando a partir desses princípios e das suas experiências e crenças pessoais colaborar para o crescimento e constante movimento da Abordagem Cen- trada na Pessoa. Os autores Esther Carrenho é teóloga, psicóloga clínica e facilitadora de grupos de psicoterapia e de supervisão. Fez parte do grupo fundador da Associação Paulista da Abordagem Centrada na Pessoa, da qual é membro. Ministra cursos e palestras sobre relacionamentos e crescimento pessoal e é autora dos livros Res- surreição Interior, Raiva: Seu bem, seu mal e Depressão - tem luz no fim do túnel. Nasceu em Marília, interior do Estado de São Paulo. Morou na zona rural e por causa disto interrompeu seus estudos quando ainda era criança. Só retornou ao colégio quando já tinha 14 anos. Cursou psicologia aos 45 anos e dedi- ca-se quase que tempo integral ao atendimento clínico. Pratica caminhadas e ama viajar. Como lazer gosta de ler e ver filmes, de preferência no cinema. É casada, tem dois filhos e 4 netos. Márcia Alves Tassinari, 58 anos, Psicóloga (CRP-05/1718), Graduação em Psicologia (PUC-RJ/1975), Mestrado em Psi- cologia (UFRJ/1999), Doutorado em Psicologia (UFRJ/2003), Sócia Fundadora do Centro de Psicologia da Pessoa - CPP, Rio de Janeiro, desde 1975, onde exerce as funções de psicotera- peuta de adultos, casal e família, plantonista psicológica, pro- fessora e supervisora do curso de formação de psicoterapeuta. 197 198 Professora universitária desde 1976 (Gama Filho, Universidade Santa Ursula, Insituto Brasileiro de Medicina de Reabilitacao, Universidade Estacio de Sa), Professora visitante de vários cur- sos de graduação e pós graduação no Brasil, autora de artigos e capitulos de livros. Marcos Alberto da Silva Pinto, graduado em psicologia desde 1989 é psicoterapeuta individual e de grupo e facilitador de Grupos de encontro desde 1990. Ministra cursos e palestras da Abordagem Centrada na Pessoa em várias cidades do Brasil. Or- ganizador de vários eventos da Abordagem Centrada na Pessoa e idealizador , colaborador e mantenedor do site especializado na Abordagem Centrada na Pessoa, www.encontroacp.psc.br que conta com a colaboração de diversos profissionais do Brasil e do exterior. Um dos fundadores da Associação Paulista da ACP sendo membro desde 2005. Presidente desta mesma associação em 2007 e 2008. São Paulino doente e beatlemaníaco, gosta nas horas vagas de jogar futebol, ouvir música, cantar e tocar violão, viajar, pas- sear, falar bobagem e brincar com o seu filho Vítor!” Sites e cursos indicados da ACP Site de Língua Portuguesa 199 Centro de Estudos e Encontro da Abordagem Centrada na Pessoa www.encontroacp.psc.br Rogeriana - Abordagem Centrada na Pessoa Wwww.rogeriana.com Associação paulista da Abordagem Centrada na Pessoa www.apacp.org.br Instituto de psicologia humanista www.institutodelphos.com.br/abordagem/index.htm Portal de Psicologia www.psicologado.com Centro de Psicologia Pessoa www.cpp-online.com.br Associação portuguesa de psicoterapia centrada na pessoa e counselling www.appcpc.com Sites internacionais Person Centered Counseling www.person-centered-counseling.com Carl Roger website http:/Awww.carlrogers.info/ Counselling resource http://counsellingresource.com/ Natalie Rogers http://www.nrogers.com/ PCET!I — About Self-mprovement http:/Avww.pceti.org/ 200 Cursos de ACP no Brasil 2010 1. Belém, PA Curso de Formação de Psicoterapia Centrada na Pessoa Informações: en.bezerra O gmail.com 2. Belo Horizonte, MG CPH - Centro de Psicologia Humanista Informações: http://www.cph.org.br (31) 3024-2280 e-mail: cphminas O gmail.com 8. Belo Horizonte, MG FUMEC - Curso de Pós-Graduação em Psicoterapia Humanista/Fenomenológico/Existencial Informações: (31) 3280.5000 www.fumec.br 4. Belo Horizonte, MG Instituto Humanista de Psicoterapia Informações: (31) 3293.8431 Www.institutohumanista.com.br 5. Brasília, DF CPHB - Centro de Psicologia Humanista de Brasília Informações: http://www.cphb.com.br (61) 3340 9004 e-mail: cphbO cphb.com.br 6. Brasília, DF IHP - Instituto Humanista de Psicologia Informações: http://ihpsic.blogspot.com (61)3327-1941 7. Campinas, SP: Curso de Formação em Psicologia Clínica Centrada na Pessoa Informações: (19) 3029 3520 ou (19) 3368 3520 veraBalves.com.br 8. Florianópolis, SC: Espaço Viver Formação em psicoterapia na ACP e Formação em Ludoterapia na ACP Informações: (48) 3244 9764 e (48) 8428 2871 http://www.eviver.com.br 9. Fortaleza, CE: APHETO - Laboratório de Psicopatologia e Psicoterapia Humanista Crítica Informações: (85) 9983-8739 virginia moreira O hms.harvard.edu 10. Fortaleza, CE: CearACP - Confraria de Estudos Avançados de C. Rogers e da ACP Informações: (85)9624-3231 ou cearacp O gmail.com andre. feitosa O msn.com 11. João Pessoa, PB grupos de formação em Clinica na ACP para psicólogos e concluintes de psicologia Informações: Sonia Gusmão - soniagusmao O hs24.com.br 12. Londrina, PR: UNIFIL - Instituto Filadélfia de Londrina - Especialização em Psicologia Humanista com Ênfase na Abordagem Centrada na Pessoa Informações: http://www.unifil.br/posgraduacao2009/nucleolll/22.html 201 202 13. Maceió, AL EKSISTÊNCIA - Escola Experimental de Psicologia e Psicoterapia Fenomenológico Existencial Informações: e-mail: ahl.fonseca O gmail.com http://sites.google.com/site/eksistenciaescola/eksistencia 14. Niterói RJ CPHN - Centro de Psicologia Humanista de Niterói Informações: lenise O urbi.com.br 15. Novo Hamburgo, RS FEEVALE CENTRO UNIVERSITÁRIO Curso de Especialização em Psicologia - Abordagem Centrada na Pessoa Informações: http://Awww.educaedu-brasil.com/especializacao-em- psicologia--abordagem-centrada-na-pessoa-pos-graduacao-16129.htm 16. Porto Alegre, RS Delphos Instituto de Psicologia Humanista Curso de Especializção Clínica em Psicoterapia Centrada na Pessoa Informações: http://www.institutodelphos.com.br 17. Porto Alegre, RS SER E EXISTIR — Curso de Formação em Psicoterapias Humanístico-Existencial-Fenomenológico Informações: http://www.sereexistir. com 18. Recife, PE Instituto Carl Rogers Informações: www.carlrogers.org.br (81) 4101-5593 ou (81) 9734-4148 email: instituto O carlrogers.org.br 19. Rio de Janeiro, RJ CPP - Centro de Psicologia da Pessoa — Curso de Formação de Psicoterapeuta Centrado na Pessoa. Informações: 21 2558-1387 ou www.cpp-online.com.br 20. Salvador, BA Diabasis Informações: emanuelpereira O oi.com.br (71) 8832-3190 http://www. institutodiabasis.com.br/ 21. São Miguel D'Oeste, SC UNOESC - Universidade do Oeste de Santa Catarina — Curso de pós-graduação em psicologia clínica e humanista Informações: http:/Awww.unoesc.edu.br/cursos/especializacao/psicolo gia%20cl%C3%ADnica%20e%20humanista/sao-miguel-do-oeste 22. São Paulo, SP ENCONTRO ACP informações: Marcos Pinto (11) 5579-9975 e-mail: marcos Qencontroacp.psc.br 203 23. Teresina, PI Centro de Formação e Aperfeiçoamento Profissional do Piauí CFAPi - Curso de Especialização na ACP Informações: (86)8813-6685 24. Vitoria, ES ARETÉ - Instituto Brasileiro de Psicologia Centrada na Pessoa - Curso de Pós Graduação Lato Sensu: Psicoterapia na Abordagem Centrada na Pessoa e na Existencial- Fenomenológica Informações:(27) 3239-1089 arete O aretepsicologia.com.br www.aretepsicologia.com.br Bibliografia ALVES, Rubem. Tempus fugit. São Paulo: Paulus, 1990. 205 AMADOR, C. R. Avendafio. Psicologia y religion: tensiones y tentaciones. Buenos Aires: Kairos Ediciones, 1999. AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual de diagnóstico e estatística de distúrbios mentais. (4a. Ediçãoed.). São Paulo: Artmed, 2000. BACELLAR, Anita (org). A psicologia humanista na prática: reflexões sobre a abordagem centrada na pessoa. Florianópolis: Ed. Unisul, 2009. BELÉM, Diana Carl Rogers: do diagnóstico à Abordagem Centrada na Pessoa. Recife: Edições Bagaço, 2000. BELLAK, Leopold, SMALL, Leonard. Psicoterapia de Emergência e Psicoterapia Breve. Porto Alegre: Artes Médicas, 1980. BOWEN, Maria C. V. B. 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Anos mais tarde, quando escreveu contando a experiência em Rochester, ele relatou que desde o começo, principiava também a formação das suas próprias opiniões decorrentes das experiências frustrantes que ia tendo. As desilusões eram em relação à forma e à metodologia usada e o pouco ou nada de resultados obtidos com as pessoas com as quais o trabalho era feito. A falta de eficácia observada leva Rogers também a desilu- dir-se consigo mesmo, acreditando que poderia haver algo que ele não aprendera adequadamente. Essa desilusão chegou ao ponto de ele duvidar se deveria mesmo ser um psicólogo. Por um tempo, direciona seu trabalho para atividades ligadas a as- sistência social enquanto participa de conferências na Associa- ção America de Psicologia (AAP), de cunho behaviorista, base- adas nas experiências de aprendizagem dos ratos, realizadas em laboratórios. Como a universidade não reconhece seu trabalho como psi- cólogo, continua com o foco na dinâmica das crianças-proble- mas e passa a lecionar no departamento de Sociologia. Com o passar de alguns anos, Rogers, percebeu essas mu- danças como uma obstinação positiva que o impulsiona a não desistir e a traçar o seu próprio caminho, independente de seus colegas e de grupos que estavam em evidência na época. Retoma suas atividades como psicólogo clínico na Associação America- na para Psicologia Aplicada. Seu trabalho no campo sociológico ganha espaço e autorida- de. É criado o Rochester Guidance Center e Rogers é escolhi- do para ocupar o cargo de diretor. Nessa época, conhece Otto Rank, cuja prática psicoterapêutica o impressionou muito. Como resultado de todo esse trabalho, Rogers publica seu primeiro livro: 7he clinical treatment of the problem child. E por causa desse livro, que Rogers escreve com muito sacrifício, seu trabalho é difundido e ele é convidado pela Universidade de Ohio para fazer parte do quadro de professores. Quando ele já estava deixando Rochester, o Instituto de Psicologia da universidade reconhece sua autoridade e o aceita como psicólogo. Em Rochester, Rogers começa a enfrentar conflitos, agora no campo profissional. Assim que ele começa a se destacar, alguns psiquiatras começam a questionar seu trabalho e suas ideias. Mas nessa situação, Rogers viu que esses conflitos estavam rela- cionados a área administrativa e não tinha nada que ver com o seu modo de praticar a psicologia. Universidade Estadual de Ohio Rogers aceita o convite da Universidade de Ohio e se muda para Columbus. Fica cinco anos como professor dessa universidade, onde amplia e consolida suas ideias a respeito de psicoterapia. Em dezembro de 1940, é convidado como conferencista em Minnesota. João Hipólito, médico psiquiatra português, resu- me a conferência de Rogers em quatro tópicos sobre a psicotera- pia. Primeiro, ele declara que um trabalho eficaz de psicoterapia não se concentra na solução de um problema específico, mas tenta ajudar a pessoa a construir recursos que possam ajudá-la não só naquele problema, mas também nos demais que por- ventura venha a enfrentar. Em segundo lugar, o enfoque está nos aspectos emocionais, isto é, nos sentimentos da pessoa e em todo o envolvimento emocional com a situação, e não nos as- s i o B o H L2 9 Op ep ia y A vi da de Ca rl Ro ge rs 26 pectos intelectuais e racionais. E em terceiro, o mais importante a ser resolvido deveria ser a situação presente, e não o passado da pessoa. E por último, a qualidade da interação com a pessoa é mais importante do que a função como psicoterapeuta e já é em si uma experiência de crescimento. A explanação dessa nova abordagem em psicoterapia gerou nos presentes muita oposição e questionamentos. Ele descobre então que aquilo que ele mais acreditava que funcionava em decorrência das suas vivências — Rogers já tinha 38 anos, dois cursos universitários, experiência no magistério e o título em doutorado — era também o que trazia tanto desconforto e era ameaçador para outros profissionais da área. Ele já tinha con- quistado muito crédito na psicologia, com a explanação das suas descobertas, mas tendo a psicanálise praticada pelos psiquiatras, de um lado, e a psicologia comportamental americana sendo abraçada por boa parte dos psicólogos americanos, de outro, Rogers se tornou o alvo das críticas. E novamente ele entra em crise. Em suas palavras: “E a situação de me encontrar no centro das críticas, dos argumentos a favor e contra, desorientou-me e me fez duvidar e questionar a mim mesmo” (ROGERS, 1961). Mas sua obstinação se fez presente novamente e não deixou suas ideias morrerem. Ele acreditava que tinha algo a dizer e redigiu o manuscrito, relatando o que ele acreditava que deveria ser uma psicoterapia eficaz, que se tornou um dos capítulos do seu segundo livro, Couseling and psychoterapy, que foi publicado em 1942. A conferência de Minnesota teve um efeito tão marcante na vida de Rogers que mais tarde ele declara o dia 11 de dezembro de 1940 como o dia em que nasceu o movimento dos novos conceitos em psicoterapia, dando origem ao que receberia mais tarde o nome de Terapia Centrada na Pessoa. Em Ohio, Rogers convive com um grupo de discípulos, en- tre eles, Virginia Axline e Eugene Gendlin, que são bem co- nhecidos de muitos brasileiros. Virginia porque continuou nos trilhos deixados por Rogers e Gendlin porque busca novos ca- minhos, mas tendo como base as pilastras da Abordagem Cen- trada na Pessoa. Rogers fica mais quatro anos em Ohio, mas no meio do ano de 1944 recebe e aceita o convite da Universida- de de Chicago para lecionar psicologia e formar um centro de aconselhamento. Universidade de Chicago Nessa universidade, Rogers ficou por 12 anos e foi o período fértil para o estabelecimento das raízes das suas crenças e das inovações no trabalho psicoterapêutico. Foi o período de muita pesquisa e produção científica, elaboração de teorias e publica- ção de mais livros. Além disso, ele colocou em prática na sala de aula a hipótese de que o professor pode ser um facilitador da aprendizagem, oferecendo recursos para que o aluno adquira o conhecimento através das suas vivências. Criou grupos peque- nos de alunos e estabeleceu um clima de liberdade que desper- tava o interesse dos alunos para suas aulas. Era muito procurado pelos mestrandos e doutorandos e orientou muitas teses. O reconhecimento do trabalho de Rogers ia aumentando cada vez mais. Porém, nos anos entre 1949 e 1951, Rogers entra em profundo sofrimento depois de experimentar muitas dif- culdades no atendimento de uma mulher diagnosticada como esquizofrênica. Entrou em depressão e ficou sem condições para exercer suas atividades profissionais. Foi um período muito di- fícil. Chegou mesmo a pensar em parar de clinicar, porque se via tão perturbado quanto as pessoas que o procuravam. Tirou férias por três meses e procurou ajuda psicoterapêutica com um dos seus discípulos, Ollie Bown, experimentando ele mesmo a eficácia do modelo em que acreditava. Anos depois, se refe- s i o b o y N E S Sp PP IA y 27 A vi da de Ca rl Ro ge rs 28 riu a essa experiência como um tempo de crescimento pessoal, na compreensão e na sensibilidade tanto de si mesmo como de outros. O sofrimento foi também uma oportunidade que lhe proporcionou aquisições que lhe serviriam para toda a vida. Em 1956, foi eleito presidente da American Academy of Psychoterapists e ficou no cargo por dois anos. Uma contribui- ção que os psicólogos clínicos devem a Rogers é a sua luta para que a psicoterapia fosse praticada pelos psicólogos. Até então, o que era feito era o trabalho psicanalítico praticado pelos profis- sionais formados em medicina, principalmente em psiquiatria. Quando Rogers estava em Ohio, ele desenvolveu cursos que tiveram muita procura para formação de terapeutas. Ele foi o primeiro profissional a oferecer formação prática em psicotera- pia. Observe o que diz La Puente (1978, p. 42): “disse Rogers orgulhoso (...) fomos os primeiros a dar formação prática aos estudantes de psicoterapia”. Essa iniciativa com certeza levantou muita oposição da classe médica. Principalmente porque Rogers não tinha formação como médico. E ele mesmo relata que foi visto como um tipo de impostor, como alguém que praticava a medicina sem estar qualificado para isto. Penso que ele teve que lidar por toda sua vida com esse tipo de crítica. Principalmente com a acusação de que era “o autor de uma espécie de terapia muito superficial e perigosa” (ROGERS, 1961, p.27). Até os dias de hoje, ainda encontramos profissionais da psi- cologia e da medicina que levantam esse tipo de acusação con- tra os profissionais que usam a Abordagem Centrada na Pessoa como referência em seus atendimentos. No tempo de Rogers, entendo que a crítica era feita por profissionais que se sentiam ameaçados pela possibilidade de perderem muitas pessoas que buscavam tratamento. Nos dias de hoje, o que percebo é que muitas críticas vêm daqueles que conhecem apenas superficial- mente o embasamento da Abordagem Centrada na Pessoa. De volta a Wisconsin “onde está a sabedoria que perdemos com o saber”? TS. Eliot? As críticas que Rogers recebia não mais afetavam a eficácia e o reconhecimento do seu trabalho em Chicago e ele publicou mais um livro: Terapia centrada no cliente. Foi eleito em 1956 presidente da Academia Americana de Psicoterapeutas e rece- beu o prêmio Distinguished Scientific Contribution Awards da Associação Americana de Psicologia. Esse prêmio destacava o desenvolvimento do método original para descrever e analisar o processo terapêutico. Após receber convites para palestras, como professor convi- dado, de várias universidades, Analmente é convidado para inte- grar o quadro acadêmico da Universidade de Wisconsin. Rogers exige dar cursos tanto no departamento de Psicologia como no de Psiquiatria, requer liberdade para treinar psicólogos e psi- quiatras e exige ainda a possibilidade de exercer seu trabalho clínico tanto com pessoas diagnosticadas como psicóticas, como com aquelas consideradas normais. À universidade concede to- das essas exigências e no meio do ano de 1957 ele se muda para Madison, ficando sete anos nessa universidade. Ele e sua equipe formada ali trabalham intensamente com os processos psicoterapêuticos dos portadores de esquizofrenia. Como resultado desse trabalho, ele publica, em 1967, o livro À relação terapêntica e seu impacto: um estudo de psicoterapia com esquizofrênicos. Esse trabalho teve a cooperação de Eugene Gen- dlin, Donald Kiesler e Charles Truax. Em Wisconsin, trabalhou por um semestre no Departamen- to de Educação, onde desenvolveu um trabalho de ensino cen- 2Elior, TS. — Poesia — página 175 s i e B o H L E D Op e p i y 29 A vi da de Ca rl Ro ge rs 30 trado no aluno. E como era de se esperar, teve a oposição do Departamento de Psicologia, que não aceitava a liberdade dada ao aluno quanto aos métodos de ensino. La Jolla, Califórnia “Sou o senhor do meu destino; sou o capitão da minha alma” William Ernest Henley? No verão de 1963, encerra suas atividades na vida acadêmica, estabelece residência em La Jolla, na Califórnia. Lá, envolve-se novamente com o Western Behavioral Sciences Institute, uma fundação que tinha como objetivo tornar-se um centro de pes- quisas e estudos humanistas, no qual Rogers já tinha cooperado na sua organização. Depois de algum tempo, demitiu-se deste centro, juntou-se a outros profissionais e formou o Center for Studies of the Person. Nesse centro, muitos workshops nas áreas pedagógicas e psicológicas foram planejados e realizados. Além do Centro, Rogers recebia e aceitava convites para pa- lestras em instituições educacionais e também psicológicas. Isto, mais os grupos que realizava, fizeram seu nome conhecido não só nos Estados Unidos, mas também em vários lugares do mun- do, como Europa e Ásia. Finalmente, em 1977, fez sua primeira viagem ao Brasil. Permaneceu residindo em La Jolla até seu falecimento em 1987. “Trecho do poema que Mandela lia enquanto estava na prisão. Linha do Tempo A linha do tempo a seguir é baseada na ideia de Alessandre Pe- drassolli, ampliado com mais dados (BIOGRAFIA DE CARL ROGERS): Em 8 de janeiro, nasce Carl Ransom Rogers, em Oak Park, 1902 | Iinois, EUA. Sua família muda-se para uma fazenda nos arredores de 1914 | Chicago. 1919 | Ingressa na Universidade de Wisconsin para cursar Agronomia 1921 | Muda do curso de Agronomia para o curso de História. Viaja para a China para participar do Word Student Christian 1922 Federation Conference. 1924 Gradua-se em História. Casa-se com Helen, muda-se para New York e começa a cursar Teologia no Union Theological Seminary 1925 Muda-se para Vermont, onde faz um estágio com a função de pastor. Transfere-se para o Teacher's College da Universidade de 1926 | Columbia. Deixa a carreira religiosa e começa a trabalhar com crianças sob a orientação de Leta Hollingworth. 1927 | Gradua-se em Masters of Arts. Antes de terminar o doutorado, começa a trabalhar no Child Study Departamento of the Society of the Prevention of Cruelty to Children, de Rochester. Recebe o titulo de PhD em psicologia clínica pela Universidade de Columbia. 1928 Passa a dirigir o centro em que trabalhava e no ano seguinte 1929 | é nomeado diretor, onde fica por 12 anos trabalhando com crianças. Começa a lecionar no Teacher's College da Universidade 1935 | Rochester, mas não é reconhecido pelo departamento de Psicologia. O reconhecimento só veio vários anos depois. Publica seu primeiro livro, O tratamento clínico da criança- 1939 | problema, no qual relata o que tem de mais importante nas sua experiências até esse momento. s i o b o y L e 9 ep e p a y 31 o 5, Aceita o convite para lecionar na Universidade Estadual de | Primeira vinda ao Brasil, onde realiza workshop na Aldeia de o Ohio e se muda para Columbus. Em dezembro desse ano, 1977 | Arcozelo, em Pati de Alferes, no Rio de Janeiro. Volta ao Brasil E 1940 exatamente no dia 11, expõe suas ideias numa conferência na no ano seguinte. Ss Universidade de Minnesota e é fortemente confrontado. Rogers pi passa a considerar essa data como O dia em que nasceu a 1979 | Morre Hellen, sua esposa. o Psicoterapia Centrada no Cliente. . . . . s 1980 Publica A way of being, que é um relato do sofrimento que : 1942 | Publica seu segundo livro: Counseling and psychoterapy. Rogers experimenta após o falecimento de Hellen. 1943 | Eleito presidente da American Psychological Association. 1985 | Última viagem ao Brasil. Convidado pela Universidade de Chicago para ensinar Fratura o fêmur numa queda, é operado e entra em coma. Mas 1945 | Psicologia e formar um centro de aconselhamento. Fica nessa segundo orientação deixada por Rogers, as máquinas que o universidade por 12 anos. 1987 mantinham vivo artificialmente são desligadas no terceiro dia e 1956 Eleito presidente, por dois anos, da American Psychological pi Convention. 32 Muda-se para Madison e aceita lecionar em várias 1957 | Universidades: UCLA, Harvard, Berkley e Wisconsin. Nessa | Livros de Carl Rogers última, permanece por sete anos. | Contribui para a fundação do Western Behavioral Sciences [ The clinical treatment of the problem child (O tratamento 1958 Institute (WBSI), em La Jolla, na Califórnia, que tinha como 1939 clínico da criança-problema) objetivo ser um centro de pesquisa tendo como referência o — — + > 1 A = humanismo. 1942 Counseling and psychotherapy (Psicoterapia e consulta * psicológica) | Publica o livro Tornar-se pessoa e faz uma longa viagem pelo 195 | Client-centeres therapy (Terapia centrada no cliente) 1961 | Japão. O livro é traduzido para o japonês. Eleito membro do RE conselho da American Academy of Arts and Sciences. 1961 | On becoming a person (Tornar-se pessoa) o Carl Rogers on encounter groups (Grupos de encontro) Recebe o Certificate for Outstanding Research da American 1967 Person to person (De pessoa para | pessoa) 1962 Personnel and Guidance Association. Recebe também o prêmio 1 M a th mar Ooh a Ed O de Distinguished Contribution to the Science and Profession of 1968 an and the science for man (O homem e a ciência do Clinical Psychology. O jhomem) Ain mo E , ] Becoming partners: marriage and its alternatives (Novas 1963 | No final desse ano, encerra a vida acadêmica e se muda para a 1972 formas do amor o casamento e suas alternativas). Califórnia, onde permanece até sua morte. me - To ICI LI IL ET É 1975 Psicoterapia e relações humanas 1984 Volta a contribuir com o WBSI como conselheiro “Membro | Freedom to learn (Liberdade para aprender) mesidente;: 1977 | Car! Rogers on personal power (Sobre o poder pessoal) Publica os livros: The therapeutic relations and its impact: a | Entrevista concedida a revista Veja: “Por um homem melho” 1967 study of psychotherapy with schizofrenics e On encounter 1980 A pessoa como centro groups. Demite-se do WBSI. Junta-se a mais 25 profissionais e A way of being (Um jeito de ser) forma o Center for Studies of the Person (CSP). 1983 Em busca de vida o Desenvolve em colaboração com seu filho David o Human Quando fala o coração — Antonio Monteiro dos Santos traduz 1971 | Dimension Project, para utilização dos grupos de encontro na 1985 dois textos de Rogers que são editados em parceria com área médica. | Monteiro e Maria Constança Villas-Boas Bowen. si oB bo H N E S 9p e p a y A vi da de Ca rl Ro ge rs 34 Influência de Carl Rogers na minha vida Por que você escolheu essa abordagem para trabalhar como psicote- rapeuta? Esta é uma pergunta que os estudantes sempre fazem quando me procuram para seus trabalhos de pesquisa e entrevis- ta. Na primeira vez que perguntaram, fiquei surpresa e tive que organizar, de improviso, de forma didática, as razões pelas quais minha opção tinha sido a Abordagem Centrada na Pessoa. Com o passar do tempo, as razões da minha escolha foram ficando cada vez mais claras e consolidadas. Meu primeiro contato com os escritos de Rogers deu-se quando eu cursava a faculdade de Teologia. Um dos meus pro- fessores, americano, destacava-se entre os demais, nas matérias que cursei sobre aconselhamento. Ele defendia a escuta amoro- sa, o acolhimento e a autenticidade. Encontrou em Carl Rogers, que se fazia cada vez mais conhecido nos Estados Unidos, res- paldo para o que acreditava. Traduziu um texto de Rogers, do inglês para português, que trazia as características de um bom psicoterapeuta ou conselheiro e distribuiu entre os alunos. Lembro-me que, ao ler o texto, me encantei com a proposta e decidi que faria de tudo para desenvolver aquelas qualidades no exercício do meu trabalho de aconselhamento e também na minha vida. Anos mais tarde, quando resolvi cursar Psicologia, eu conhecia muito da psicanálise, mas o que tinha impactado minha vida e promovido mudanças nas pessoas com as quais eu trabalhava eram os princípios da Abordagem Centrada na Pessoa. Estudei com afinco todas as outras orientações em Psi- cologia, ministradas na faculdade, mas a escolha feita no curso de Teologia se fortaleceu e prevaleceu como se fosse minha linha mestra. Então, aqui estão as razões da minha escolha. Em primeiro lugar, porque sou cristá praticante e identifico na ACP muitas características das mesmas atitudes que Cristo teve com os seus interlocutores quando procurado. Ou mesmo quando ele toma- va a iniciativa de aproximação. Segundo, porque é uma abor- dagem que permite proximidade com os que buscam ajuda, e acredito que isto coopera para o crescimento tanto do terapeuta como da pessoa que busca ajuda. Terceiro, porque considera que é mais importante a escuta amorosa e a aceitação da pessoa que busca ajuda do que a interpretação dos conteúdos, do com- portamento e das atitudes dela. Quarto, porque valida e leva em conta os sentimentos e até a intuição do profissional sem con- dená-lo por sentir ou intuir. Quinto, porque Carl Rogers nunca pretendeu que se seguisse seu jeito de ser como terapeuta. Ele defendeu princípios que acredito sejam necessários para todo e qualquer relacionamento que tivermos, profundos ou não, du- radouros ou rápidos. São princípios para a vida. O que indica que qualquer profissional, mesmo fora do mundo da psicologia, pode colocá-los em prática. Além disto, tenho uma admiração especial pela forma como Rogers viveu sua vida. Jovem, ainda, ele teve que fazer vários enfrentamentos e assumir um posicionamento que gerou oposi- ção. Teve a coragem de enfrentar a família, o mundo religioso, a medicina, que naquela época entendia que só o médico poderia exercer as funções de psicoterapeuta e o mundo da Psicologia. Era uma época em que a psicanálise influenciava o mundo, vin- do da Europa, de onde era Sigmund Freud. O behaviorismo, tido como Psicologia do Comportamento, que teve origem com o Russo Ivan Pavlov (1849-1936), mas ganhou terreno fértil em solo americano, primeiro por John Broadus Watson e em seguida pelos experimentos de Burrhus Frederic Skinner (1953), também se enraizava nos Estados Unidos. Rogers não se intimidou e com seu jeito manso, mas firme, não arredou pé e defendeu corajosamente suas descobertas e crenças, confron- tando, indiretamente, tanto a análise da mente como o condi- cionamento do comportamento. s i o b o H U2 9 ep ep ia y A vi da de Ca rl Ro ge rs 36 E é essa mesma coragem que marca também suas escolhas de vida. Ele ousa mudar tão logo percebe que o caminho percor- rido não tem mais nada que ver com suas ideias e jeito de ser. Assim sai do curso de Agronomia para Teologia e da Teologia para a Psicologia. Da mesma forma que começa trabalhando com a orientação psicanalítica, mas muda e é o maior colabora- dor para fincar as raízes da orientação humanista. Também o admiro porque foi um homem que leu e estudou muito. Ele não achava que o conhecimento era o recurso princi- pal para o processo de mudança de uma pessoa, mas talvez pen- sasse assim justamente porque conhecia muito e podia esvaziar- se do seu conhecimento para receber e acolher uma pessoa. E em seguida podia deixar todo seu conhecimento disponível, caso este viesse cooperar para as mudanças de quem o procurava. Por último, Rogers viveu o que acreditava. Ainda me lembro da palestra da Ana Gracinda na Primeira Jornada Paulista em Campinas, quando ela relata sua experiência numa conferência de Rogers. Ela estava mal fisicamente e com dores, e no meio de 800 pessoas Rogers percebeu que ela sofria. Durante o interva- lo, foi procurá-la para tentar ajudá-la, mostrando total interesse por ela. A ACP no Brasil Márcia Tassinari 37 Sem dúvida, podemos perceber novo movimento de expansão da ACP em relação às regiões brasileiras, às academias, às publicações e às ofertas de cursos de formação e/ou especialização. Parece-nos que a sociedade está mais receptiva à visão do ser humano como digno de confiança, ainda que alguns empreendimentos humanos pareçam ir na direção contrária. Fiquei me perguntando qual seria a finalidade de um artigo so- bre a História da ACP no Brasil como parte de um livro dirigido principalmente aos potenciais praticantes (a palavra praticantes adotada neste texto engloba profissionais e estudantes de diver- sos campos — Psicologia, Educação, Sociologia, Antropologia, Medicina, Enfermagem, Adminsitração etc. — que norteiam seu trabalho e sua reflexões pela Abordagem Centrada na Pessoa). Lembrei-me então do conselho de Kierkeggard (filósofo dina- marquês considerado o pai do Existencialismo): “A vida só pode ser compreendida olhando-se para trás; mas só pode ser vivida olhando-se para a frente” A intenção de olhar para o passado confirma a necessidade de entendermos os processos de transformações realizados pelo conhecimento acumulado daqueles que nos antecederam, possi- bilitando abrir novas perspectivas de mudanças e de atualização. Portanto, o olhar não será nostálgico ou de mera reverência ao passado e aos “desbravadores” ou sequer direcionado para expli- cações determinísticas, mas de apropriação do percurso da ACP no Brasil, olhando para frente, como nos ensinou Kierkegaard. Pretende-se também aprender com os acertos e equívocos daqueles que nos antecederam. Parece-me que, dessa perspec- tiva, podemos preservar a essência da ACP plantada em solo |I Se Jg OU J O Y V 39 A AC P no Br as il 40 brasileiro a partir de 1945, conhecer como esse gérmen tem florescido em terra estrangeira e acrescentar outras sementes, que possam criar uma abordagem centrada na pessoa brasileira. Pensamos assim estar também contribuindo para a formação de novos praticantes da ACP. Estive coordenando uma pesquisa (de 1990-1997) sobre a História da ACP no Brasil, que resultou em apresentações em congressos nacionais e internacionais, (VII encontro, 1994; VIII encontro, 1996) além de duas publicações (Gobbi, Missel, Holanda, 1997; Tassinari, M & Portela, Y, 1999) que evidencia- ram farto material escrito, ainda que pouco publicado no Brasil, especialmente quando comparado aos colegas de outros países sul-americanos. Além da escassez de material publicado, cons- tatava-se a pouca penetração acedêmica da ACP no Brasil. Mais de duas décadas desde o início do projeto (1990-2010), ainda sentimos falta de mais publicações. Por outro lado, é evidente a ampliação da ACP no Brasil, envolvendo cada vez mais profis- sionais de todas as regiões, em empreendimentos humanos di- versificados, desde a psicoterapia individual (com todas as faixas etárias) aos trabalhos com pequenos e grandes grupos, com o ensino, com o atendimento de famílias e casais e, recentemente, com o pronto atendimento nos Serviços de Plantão Psicológico. Ressalto a maior expansão nas academias, com professores ofe- recendo disciplinas de graduação e de-pós graduação, além de estágios supervisionados, norteados pela ACP. Naquela época, percebi uma lacuna nos textos acerca de como a ACP chegou ao Brasil. Anteriormente, os trabalhos so- bre os Encontros Latino-Americanos da ACP (em parceria com Jaime Doxsey) já apontaram para essa fragilidade “aparente”, isto é, poucas publicações, entretanto reflexões interessantes, eram esboçadas, expressando a fertilidade e potencialidade da comunidade brasileira da ACD. A pesquisa mencionada foi realizada a partir do levanta- mento bibliográfico existente nas instituições e núcleos, além dos depoimentos de profissionais envolvidos há muito tempo com a Abordagem Centrada na Pessoa (ACP). Com todo esse material, foi possível construir um mapeamento contendo as informações sobre as associações de profissionais (núcleos), os eventos profissionais e vivenciais, o material apresentado em eventos e publicado e os cursos de formação. Trabalhando com esse material bruto, hipotetizamos quatro momentos, os quais ainda consideramos norteadores do percurso da ACP no Brasil, apresentados nas seções seguintes. De 1945 a 1976: Pré-História Caracteriza-se pela inexpressiva quantidade de eventos e pu- blicações e também pela presença de profissionais trabalhando de forma isolada, principalmente nos estados do Rio de Janei- ro, São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Pernambuco (estados onde encontramos os “desbravadores”, profissionais que introduziram o pensamento de Rogers, especialmente nas academias). De 1977 a 1986: Fertilização Seu marco dá-se com a vinda de Carl Ramson Rogers e sua equipe (John Keith Wood, Maureen Miller, Maria Constança Villas-Boas Bowen e Jack Bowen) ao Brasil em 1977 e 1978. Observa-se nesse período o entrosamento dos profissionais in- teressados por essa abordagem, a organização de vários eventos, assim como a criação de núcleos de profissionais. A presença de Rogers e sua equipe entre nós em 1977 e 1978 e a vinda regu- lar de John Wood e Maureen Miller (para cursos de formação) entre 1978 e 1984 foram fatores que propiciaram o fortaleci- mento da comunidade brasileira, estimulando o pensamento sistematizado sobre a ACP. Interessante ressaltar que os eventos de 1977 e 1978 foram [I SB 1g OU dO V Y 4 1 A A C P no Br as il 42 também uma espécie de laboratório experimental para Rogers e sua equipe que, pela primeira vez, realizaram ciclos de 400 a 800 pessoas nos três pólos principais da ACP naquela época: Recife, São Paulo e Rio de Janeiro, todos organizados por Edu- ardo Bandeira que, por seu jeito arrojado, conseguiu convencer Rogers a vir ao Brasil. O material mais detalhado dos ciclos pode ser lido nos livros: À pessoa como centro (1977), Um jeito de ser (1983) e Em busca de vida (1983). Não podemos deixar de mencionar a presença de Eduardo Bandeira em diversas cidades brasileiras no período que ante- cedeu a vinda de Rogers ao Brasil. Desde 1974, Bandeira, após ter visitado o Center for Studies of the Person (La Jolla, USA), passou a divulgar filmes que exibiam entrevistas de demonstra- ção de psicoterapia realizadas por Rogers, os quais foram legen- dados em Português e apresentados em universidades e clínicas de Psicologia. Essa iniciativa preparou o terreno para difusão da abordagem e para que o trabalho de Rogers pudesse ser bem acolhido no Brasil. Além dos ciclos, foi realizado na Aldeia de Arcozelo o pri- meiro workshop de grande grupo, com a participação de cerca de 250 pessoas (de todo o Brasil), que conviveram por duas se- manas, sem nenhuma agenda preestabelecida. No ano seguinte, a experiência foi repetida. J. Wood e M. Miller realizaram atividades de treinamento e workshops em diversas cidades brasileiras, de 1977 a 1984, “reciclando o conhecimento” da comunidade nacional, influen- ciando-a. Rachel Rosemberg, pioneira em São Paulo, juntamente com Oswaldo Barros Santos, organizaram, nessa épca, outras ativi- dades em São Paulo, através da USP (Serviço de Aconselha- mento Psicológico do Instituto de Psicologia), destacando-se a realização de um grupo de encontro na TV Cultura. O próprio Eduardo Bandeira em recente correspondência eletrônica para a rede brasileira da ACP, em 04/01/2010 (LIS- TA ACPBRASIL) nos conta: Esse grupo foi realizado a convite do Julio Lerner, um dos diretores da TV Cultura e grande amigo da Raquel Rosemberg. Foi feito meio de improviso e o próprio Carl não gostou muito. (...) Foi uma proposta de demonstração com um tempo muito reduzido, um grupo pequeno de pessoas muito próximas e tudo feito sem preparação. Interessante ressaltar que, enquanto acontecia o grupo de encontro ao vivo na TV Cultura, Eduardo Bandeira não pode participar, pois foi convocado para prestar esclarecimentos ao Delegado de Ordem Política e Social (DOPS), sobre o que pre- tendíamos com aquela reunião que mobilizou centenas de pes- soas. Aos que não se lembram era a época da ditadura militar e o grande adversário era o comunismo, e eles ficavam muito preocupados com qualquer debate público com total liberdade de expressão, como foram esses grandes grupos, por sinal os primeiros que se fizeram na ACP em todo o mundo. Eduardo complementa: Correu bem, pois consegui mostrar ao delegado, inclusive com livros do Carl que levei comigo, que a nossa abordagem visa à democracia, não tendo nenhum compromisso com qualquer sistema totalitário sen- do de direita ou de esquerda. De 1987 a 1989: Declínio Caracteriza-se por um período de luto com o falecimento de Carl Rogers (EUA, 04/02/1987) e Rachel Rosenberg (São Paulo, junho de 1987) e pela mudança de orientação teórica de precursores expressivos (Teresa Dourado, de Recife, e Tereza Cristina Carreteiro, do Rio de Janeiro) ou mesmo a saída do meio acadêmico (Lúcio Campos, de Recife). Nota-se principalmente a região Sudeste muito abalada por II SB Ig OU dO V V 43 A AC P no Br as il 44 essas perdas, fato evidenciado por poucas realizações de eventos vivenciais e pela extinção de alguns núcleos. Ocorre também uma diminuição significativa na publicação de artigos, livros e teses. No final desse período, já se observa uma leve ascensão das atividades, através da formação de núcleos em estados até então pouco ativos como Ceará, Paraíba e Alagoas. Parece que a comunidade centrada necessitou de tempo para superar essas perdas e encontrar sua própria energia para for- talecer e expandir seu trabalho. Entendemos que a influência da popularidade de outras orientações terapêuticas (psicanálises e terapias corporais) no meio acadêmico pode ter contribuído também para esse declínio. De 90 em diante: Ascensão/Renascimento Caracteriza-se por um aumento significativo de formação de núcleos, muitos deles formados por ex-alunos dos profissionais da fase da fertilização, de oferta de eventos vivenciais, de even- tos profissionais (mais do que em todas as décadas anteriores) e da produção escrita, como os trabalhos apresentados nos even- tos, artigos publicados, sendo poucos livros escritos e editados no Brasil e somente três boletins veiculados nessa fase. Comentários Gerais sobre a Pesquisa A pesquisa daquela época permitiu obter informações sobre 23 núcleos da ACP, criados desde 1970. Estes são formados por grupos de profissionais interessados no aprofundamento, divulgação e aplicações da abordagem. A maioria deles foi instituída com caráter de associação sem finalidade lucra- tiva ou como agrupamento infomal. Outros núcleos forma- lizaram suas atividades através da constituição de uma socie- dade civil. Alguns criaram seus próprios boletins informativos com publicações de artigos, depoimentos, entrevistas e agenda de eventos. O Estado de São Paulo foi o primeiro a introduzir cursos e práticas na ACP, na Universidade de São Paulo (USP), sob a coordenação de Oswaldo de Barros Santos, que posteriormente, com sua ex-aluna Rachel Rosenberg, criou o Serviço de Acon- selhamento Psicológico na USP, desde 1963. Outros profissio- nais continuaram esse Serviço de Aconselhamento, propiciando oportunidade de treinamento e prática aos estudantes de gradu- ação e pós-graduação. Após a vinda de Carl Rogers ao Brasil, em 1977, Rachel Rosenberg e colegas fundaram no Instituto Sedes Sapientiae o Centro de Desenvolvimento da Pessoa que, até o ano de 1987, promoveu uma série de eventos, workshops de grande grupos, supervisão e grupos de estudos, incentivando, principalmente, os profissionais desse estado a difundir a ACP. Foi também ini- ciativa deste centro a instalação do Plantão Psicológico aberto à comunidade no Instituto Sedes Sapientiae, coordenado por Raquel Wrona Rosenthal, constituído como curso e Serviço de atendimento gratuito, onde os alunos atuavam sob supervisão, como plantonistas. Em 1992, a necessidade de um programa de formação mais estruturado e que pudesse oferecer prática supervisionada aos alunos recém-formados levou à implantação, em São Paulo, no mesmo Instituto, do primeiro curso de Especialização de Psicoterapeutas na Abordagem Centrada na Pessoa, através da conjugação do trabalho de Raquel Rosenthal e Sebaldo Bartz, contando com a participação de vários outros profissionais do estado. Também foram encontrados em outras cidades do Estado de São Paulo trabalhos significativos em nível de formação e pós-graduação em instituições universitárias, tais como: Uni- versidade de São Paulo-Ribeirão Preto, Pontifícia Universidade- Se Jg OU JO V V A AC P no Br as il 46 Católica em Campinas, Faculdade São Marcos e Universidade de Franca. No Rio de Janeiro, a Universidade Santa Úrsula ofereceu, de 1987 a 1995, uma disciplina específica e eletiva sobre a Teoria de Rogers. Oferecia também estágio supervisionado na aborda- gem a seus alunos de Graduação. Também a Universidade Gama Filho ofereceu, em dois momentos, cursos de Especialização em Psicoterapia Centrada na Pessoa, nos anos de 1987 e 1990. No Rio Grande do Sul, a abordagem tem encontrado espaço dentro e fora das universidades. Os profissionais que fundaram o Centro de Estudos da Pessoa em Porto Alegre, que funcio- nou na década de 70 como instituição particular, voltaram- se mais para a formação acadêmica, inaugurando o Curso de Especialização em Psicologia Humanista, com duas opções: Rogers e Victor Frankl, na PUC. Desde 1996, a PUC-RS abriu um curso de Mestrado em Psicologia Social e da Persona- lidade, oferecendo Psicologia Humanista com uma das possibi- lidades. Em Canoas, a Faculdade La Salle também oferece um curso de Especialização em Psicoeducação/Reeducação Clíni- ca na Abordagem Centrada na Pessoa, coordenado por Irmão Henrique Justo. Na Universidade Federal do Pará, Francisco Bordin ofere- ceu em 1988 um curso de Especialização na Abordagem, tendo contado com a participação de uma equipe interestadual de do- centes. No nível da graduação, os alunos também têm oportu- nidade de fazer estágio com a orientação teórica da Terapia Cen- trada no Cliente/Pessoa, além de poderem participar de cursos de formação coordenados por Bordin em consultório. No Nordeste, na década de 60, quando as faculdades de Psicologia de Recife ofereciam disciplinas obrigatórias na gra- duação, relacionadas à abordagem, vários cursos de formação de terapeutas foram realizados, todos por iniciativa de Lúcio Campos, Maria Auxiliadora Moura e Maria Ayres. As ativida- des de supervisão e estudo teórico foram levadas a outras cida- des nordestinas, que ainda não tinham o curso de Psicologia, e formou-se um núcleo considerável de profissionais praticando a abordagem. Teresa Dourado, então aluna de graduação, des- tacou-se como continuadora do trabalho de Lúcio Campos e criou um espaço aglutinador dos profissionais recifenses. No final da década de 80, observamos o “renascimento” da abordagem no Nordeste, através da conjugação dos esforços de Carmem Barreto, Iaraci Advíncula, Carolina Dubeux e Afonso Lisboa da Fonseca, oferecendo cursos de formação de psicote- rapeutas e estágio supervisionado nas faculdades de Recife e em seus consultórios particulares. Em 1994, foi implantado o Pri- meiro Curso de Especialização em Psicologia Existencial-Feno- menológica Centrada na Pessoa, na UNICAP/Recife, sendo este o primeiro curso acadêmico da ACP no nordeste. Essa iniciativa de Carmem Barreto, docente de Graduação da UNICAP e co- ordenadora do programa, possibilitou que outros profissionais do Nordeste colaborassem com seus conhecimentos e práticas, permitindo uma reciclagem. Esse curso também contava com a colaboração de profissionais de outros estados. Nesse mesmo ano, foi realizado o VII Encontro Latino-Americano da ACP, em Maragogi, Alagoas. Algumas instituições ou núcleos de profissionais têm merecido destaque por seu empenho em divulgar a abordagem, oferecendo psicologia Humanista humanista em diferentes contextos. Londrina: UNIFIL, 2009. CARRENHO, Esther. Depressão. São Paulo: Carrenho, 2007. EVANS, Richard |. Carl Rogers: o homem e suas ideias. São Paulo: Martins Fontes, 1979. FONSECA, A. H.L. De Oaxtepec ao Nordeste da América do Sul: o encontro latino americano da ACP. 1994, manuscrito. FRICK, Willard B. Psicologia humanista: entrevista com Maslow, Murphy e Rogers. Rio de Janeiro: Zahar, 1975. GENDLIN, Eugene T. Comunicação subverbal e expressividade do terapeuta: Tendências da terapia centralizada no cliente com esquizofrênicos. In: ROGERS, Carl R.; STEVENS, B. De pessoa para pessoa: o problema de ser humano. São Paulo: Pioneira, 1967. GOBBI, S., MISSEL, S., JUSTO, H., & HOLANDA, A. F. (Orgs.). 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