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Tópico 08 Fisiologia Humana Sistema Digestório 1. Introdução Para estudar o sistema digestório, precisamos relembrar um pouco da sua constituição anatômica que se divide em trato gastrointestinal (TGI) e órgãos anexos. O TGI é constituído por órgãos ocos interligados que se comunicam com o meio ambiente e que recebem secreções de órgãos anexos. Os órgãos que constituem o TGI são: cavidade oral, faringe, esôfago, estômago, intestino delgado, intestino grosso e ânus. Já os órgãos anexos ao TGI são: glândulas salivares (parótida, submandibular e sublingual; lançam secreções na cavidade oral), o fígado (secreta bile para a vesícula biliar), o pâncreas e a vesícula biliar (lançam secreções no intestino delgado). Composição anatômica do Sistema gastrointestinal. Vale relembrar a constituição da parede do TGI, que se divide em mucosa (direcionada para o lúmen) e serosa (direcionada para o sangue). A mucosa é uma camada de células epiteliais (especializadas na absorção e secreção), presentes na lamina própria e na muscular da mucosa. Logo abaixo da mucosa, está a camada submucosa, formada basicamente por colágeno, glândulas, elastina e vasos sanguíneos. Entre a submucosa e a serosa estão duas camadas de músculo liso (circular e longitudinal) e dois plexos, o submucoso (plexo de Meissner, entre a submucosa e músculo circular) e o mioentérico (entre músculo circular e longitudinal). Estrutura da parede do trato gastrointestinal. As secreções dos órgãos anexos e as secreções produzidas pelo estômago e intestino delgado desempenham papel fundamental no processamento químico dos alimentos ingeridos que, auxiliado pela motilidade do TGI, facilita a fragmentação dos nutrientes e posterior absorção intestinal. Por fim, o TGI promove a excreção dos produtos adquiridos na alimentação que não foram absorvidos; esta excreção ocorre por meio da via anal. Uma das principais funções do sistema digestório é a digestão, que consiste em processamento dos macronutrientes ingeridos, reduzindo-os a micronutrientes, para que, assim, possam atravessar a parede do TGI (absorção intestinal). A digestão de macronutrientes como carboidratos, gorduras e proteínas ocorre por meio da hidrólise enzimática (quebra química), mediada por enzimas lançadas na luz do TGI, originando monossacarídeos, ácidos graxos e aminoácidos, respectivamente. O sistema circulatório participa ativamente em conjunto com o sistema gastrointestinal no processo de absorção e condução dos micronutrientes para o fígado e tecidos diversos, para que sejam utilizados na manutenção do equilíbrio energético do organismo. A absorção de quase todos os produtos hidrolisados, vitaminas, eletrólitos e água ocorre no intestino delgado, preferencialmente, no duodeno e jejuno (porção proximal: início do jejuno). Alguns nutrientes como sais biliares e vitamina B são absorvidos na porção final do intestino delgado, o íleo. Água e eletrólitos também podem ser absorvidos no cólon. O intestino delgado é a região do TGI com maior capacidade de absorção por apresentar estruturas como as vilosidades (vilos) e microvilosidades, que aumentam a superfície de absorção em, aproximadamente, 600 vezes. As vilosidades são projeções alongadas, com células absortivas e caliciformes de, aproximadamente, 1mm de comprimento, que se estendem por todo intestino delgado. Assumem forma semelhante a folha próximo ao duodeno e que altera sua conformação ao se aproximar do íleo, assumindo forma de dedo. As microvilosidades (borda em escova) são encontradas na superfície da membrana plasmática de células absortivas, aumentando a superfície de contato. 2. Motilidade Você já ouviu falar em motilidade gastrointestinal? Este termo se refere a contração e relaxamento das paredes e dos esfíncteres do trato gastrointestinal, com intuito de movimentar o alimento ao longo do trato gastrointestinal em respostas das contrações musculares, além de degradar o alimento e misturar com secreções do TGI. No esôfago, a motilidade funciona para impelir o bolo alimentar da faringe para o estômago. No estômago, a motilidade funciona para receber o bolo alimentar vindo do esôfago, promover a redução do bolo alimentar, misturar o bolo alimentar com as secreções gástricas e promover o esvaziamento gástrico. Já no intestino delgado, as principais funções estão relacionadas com a digestão e absorção de nutrientes, visto que a motilidade mistura também os alimentos e as secreções pancreáticas; além disso, conduz o quimo pelo intestino (aumentando a área de contato e contribuindo para absorção). No intestino grosso, ocorre condução do material não absorvido no intestino delgado (fezes) para que seja excretado. Basicamente, os músculos lisos apresentam junções comunicantes (gap junctions) que permitem a comunicação rápida célula a célula, por meio de potenciais de ação. Após o estímulo recebido por uma célula, ocorre propagação para outras células, proporcionando uma contração muscular coordenada e uniforme. Um diferencial elétrico das células musculares lisas do TGI são as ondas lentas, que diferem do processo de contração normal, pois não são potenciais de ação, mas despolarização e repolarização oscilantes do potencial de membrana. Vale ressaltar que algumas regiões do trato gastrointestinal apresentam músculo estriado, além do músculo liso; isto ocorre principalmente na faringe, porção superior do esôfago e esfíncter anal externo. O tipo de contração depende do tipo de célula muscular, podendo ser circular ou longitudinal. Quando a célula estimulada é circular, ocorre diminuição do diâmetro do segmento, ou seja, ocorre um encurtamento de um anel de músculo liso. Já as células longitudinais, quando contraem, produzem encurtamento do músculo liso, diminuindo o comprimento do segmento. Os músculos lisos podem ter contrações fásicas ou tônicas, que variam na forma como ocorre a contração. Fásica é uma contração periódica seguida de relaxamento, enquanto a tônica é uma contração constante sem períodos regulares de relaxamento. Os tecidos envolvidos com a mistura e propulsão de alimentos, como esôfago, antro gástrico e intestino delgado, apresentam contrações fásicas. Os locais 12 Sugestão de leitura O livro de Fisiologia Gastrointestinal, escrito por Kim E. Barrett, é um estudo de Fisiologia focado no sistema gastrointestinal e associa com a anatomia para facilitar o entendimento. Você sabia? O nosso Sistema Digestório é composto por um tubo oco de cerca de 9m. de comprimento que vai da boca até o ânus e é dividido em segmentos especializados em diferentes etapas do processo de digestão e absorção dos alimentos, chamado de tubo digestório ou trato gastrointestinal. Contamos ainda com a ação dos órgãos anexos que auxiliam nesse processo trabalhando de maneira integrada: língua, dentes, fígado, pâncreas e vesícula biliar. de controle de fluxo como a porção superior do estômago, esôfago terminal, os esfíncteres ileocecal e o anal interno apresentam contrações tônicas. 3. Controle neuronal da função gastrointestinal O trato gastrointestinal dispõe de um sistema nervoso próprio, conhecido como sistema nervoso entérico; este sistema pode atuar do modo independente do sistema nervoso autônomo, todavia, estímulos simpáticos ou parassimpáticos podem inibir ou intensificar a função gastrointestinal. O sistema nervoso entérico estende-se desde o esôfago até o ânus, regulando movimentos e secreções de, praticamente, todo o trato gastrointestinal. Este sistema é composto pelo plexo mioentérico (plexo externo ou plexo de Auerbach) e plexo submucoso (plexo interno ou plexo de Meissner), localizados nas camadas musculares (longitudinais e circulares) e na submucosa, respectivamente. Estes plexos diferem em relação à ação desempenhada no sistema gastrointestinal, visto que o plexo mioentérico é responsável pelo controle de quase todos os movimentos gastrointestinais e o plexo submucoso controla a secreção gastrointestinal e o fluxosanguíneo. Controle neuronal do trato gastrointestinal. Em relação ao sistema nervoso autônomo, o parassimpático, por meio da acetilcolina, promove aumento da atividade de todo o sistema entérico, resultando a intensificação da atividade da maioria das funções gastrointestinais. Já o simpático inibe a atividade do trato gastrointestinal, por meio da ação da norepinefrina e epinefrina (em menor quantidade), a norepinefrina bloqueia diretamente a ação da musculatura lisa intestinal e também inibe os neurônios do sistema nervoso entérico. 4. Secreção salivar A secreção salivar é realizada principalmente pelas glândulas salivares maiores, que são as glândulas parótidas, submandibulares e sublinguais. Estas glândulas secretam eletrólitos e solutos que contribuem para 90% da composição da saliva. Glândulas salivares maiores. Em situação basal, onde não ocorre estímulo alimentar, as glândulas submandibulares e sublinguais produzem cerca de 70% do fluxo salivar, enquanto as glândulas parótidas respondem por 15 a 20%. No entanto, participam também da composição da saliva o fluido gengival, microrganismos, detritos celulares e fluidos secretados por glândulas menores. Em situações de fluxo salivar estimulado por alimento, as glândulas parótidas e submandibulares são responsáveis pela produção de, aproximadamente, 50% do total. A saliva desempenha papel importante na saúde da cavidade oral, prevenindo infecções da mucosa e diminuindo a incidência de cáries dentárias. Tabela 1: Principais funções da saliva Função Característica Lubrificação A mucina (N-acetil-glicosamina), após hidratação, forma o muco que é responsável pela lubrificação do bolo alimentar, após o processo de mastigação. Gustação A solubilização dos alimentos estimula as papilas gustativas. Regulação da temperatura A saliva promove a diluição dos alimentos e, com isso, resfria ou aquece os alimentos conforme a temperatura corporal. Limpeza A saliva remove restos de alimentos que se alojam no dentes. Fonação A fonação é facilitada pelo umedecimento da cavidade oral. Ação tamponante É a capacidade que a saliva possui de neutralizar alimentos ácidos e ou bases presentes na cavidade bucal contribuindo para o pH bucal, que em média, varia entre 6,8 e 7,2. Ação bactericida A saliva secreta lisozima responsável pela lise das paredes de bactérias. Além de sulfocianeto (bactericida) e proteína ligadora de imunoglobulina A (atua contra vírus e bactérias). Ação bacteriostática Bactérias dependentes de ferro têm seu crescimento impedido pela lactoferrina (quelante de ferro) presente na saliva. Cicatrização Saliva possui fator de crescimento epidérmico que auxilia a cicatrização feridas ou lesões na mucosa oral. Ação antimicrobiana Efetuada por proteínas ricas em prolina, participa da manutenção da integridade dos dentes. O volume diário de saliva secretada diariamente pelas glândulas salivares é considerada alta, de aproximadamente 1,5 L, e tem como característica ser hipotônica em relação ao plasma. Secreção glandular As glândulas salivares possuem característica estrutural tubuloacinar, sendo a unidade secretora os acinos, que se agrupam formando lóbulos. As células acinares secretam a saliva primária, composta por proteínas e fluido isotônico ao plasma (rico em Na , HCO , Cl e K ), que é posteriormente conduzida para os ductos intercalares. A saliva primária chega até os ductos estriados que se unem formando os ductos intralobulares que, posteriormente, se juntam a outros lóbulos formando os ductos extralobulares. Os ductos extralobulares formam os ductos excretores principais que chegam na cavidade oral. Durante a passagem da saliva primária para os ductos estriados, ocorre mudança da composição salivar, devido à liberação de íons pelas membranas epiteliais. Ocorre, então, no ducto estriado, a saída de Na e Cl da saliva e o aumento da concentração de K e HCO fator importante para a manutenção do pH próximo a 8 e da característica hipotônica da saliva em relação ao plasma. A composição proteica pode variar de acordo com a glândula salivar. A glândula parótida secreta grande quantidade de α-amilase salivar (ptialina) e pouca quantidade de glicoproteína (mucina). A glândula sublingual secreta mais mucina, enquanto a glândula submandibular secreta de forma mista mucina e enzimas. Estrutura celular das glândulas salivares maiores. Aprendendo mais uma! Xerostomia é uma doença relacionada à malformação ou lesão dos nervos cranianos responsáveis pela inervação de glândulas salivares; com isso, ocorre ausência de saliva, deixando a “boca seca”. Em função da ausência de saliva, podem ocorrer lesões das mucosas orais e esofágicas, além de aumento de processos infecciosos pela ausência de anticorpos, substâncias bactericidas e bacteriostáticas. + 3– – + + – + 3 , – As principais enzimas liberadas pelas glândulas salivares são a α-amilase salivar (ptialina, produzida pelas células acinares) e lipase lingual (secretada pelas glândulas de von Ebner presentes na língua). O pH ótimo de funcionamento da α-amilase salivar é 7, podendo variar entre pH 4 e 11 (inativada em pH abaixo de 4) e a função principal desta enzima é a hidrólise da ligação α-[1-4]-glicosídica de carboidratos. Sua ação na boca é de curta duração, porém, continua agindo no estômago; com isso, é responsável por, aproximadamente, 75% da hidrólise de carboidratos da boca e estômago. A lipase lingual tem como função a hidrólise de triacilgliceróis em ácidos graxos livres e monoacilgliceróis. No estômago, existe a lipase gástrica que é homóloga à lipase lingual; ambas são consideradas lipases ácidas por serem ativas em pH abaixo de 4. No pâncreas, existe a lipase pancreática que difere das anteriores em relação ao mecanismo de ação e o pH de ativação que deve ser básico. Outra enzima de importância é a calicreína, liberada pelas células mesenquimatosas (envolvem as células acinares e os ductos), que tem como função a síntese de bradicinina e consequente vasodilatação e estimulação das glândulas salivares. Controle autonômico da salivação A secreção salivar é regulada por inervação eferente exercida pelo sistema nervoso autônomo (SNA) parassimpático e simpático, cujos neurotransmissores pós- ganglionares principais são acetilcolina e noradrenalina, respectivamente. O sistema nervoso autonômico parassimpático (SNAP), por meio da acetilcolina (ACh), se liga a receptores muscarínicos presentes na membrana das células acinares, promovendo aumento nos níveis de cálcio (Ca ) citosólico (via do Inositol trifosfato – IP ; e Diacilglicerol – DAG) e ativação de proteinoquinase C (PKC). O aumento de Ca citosólico e ativação de PKC promovem a liberação de proteínas acinares, aumento do fluxo salivar e efeito trófico das glândulas salivares (crescimento). Outro ponto importante da estimulação parassimpática é o aumento do fluxo sanguíneo das glândulas, que promove aumento da atividade metabólica. Já o sistema nervoso autonômico simpático (SNAS), por meio da noradrenalina, pode interagir com receptores α ou β . Noradrenalina, ao se ligar em receptor α eleva os níveis de Ca (via do IP ), potencializando os efeitos parassimpáticos. Noradrenalina, ao estimular receptores β promove secreção enzimática, por estimular a contração das células musculares epiteliais (mioepiteliais). No entanto, devido à ação vasoconstritora da noradrenalina, ocorre em uma etapa posterior à diminuição da secreção salivar. 5. Secreção gástrica O estômago é uma região capaz de acomodar, aproximadamente, 1500mL de alimento que, após processamento com suco gástrico, transforma-se em quimo. Em relação às regiões de secreção, o estômago se divide em: cardia (primeira porção do estômago e contém somente glândula secretora de muco), região oxíntica (localiza-se no corpo do estômago, maior área e corresponde a 80% da área total, possui células parietais e células principais) e região antropilórica (apenas células endócrinas,G e D, que produzem gastrina e somatostatina, respectivamente). A quantidade de suco gástrico secretada diariamente pelo estômago é 1 a 2L. O estômago tem algumas funções principais, dentre elas, destacam-se as funções secretórias (ácido clorídrico, enzimas, muco), hormonais (hormônios reguladores da secreção gástrica) e motoras (armazenamento, mistura e trituração), de grande importância para o processo de digestão. No entanto, indivíduos gastrectomizados são capazes de sobreviver. 2+ 3 2+ 1 1 1 , 2+ 3 1, Você sabia? Em situações de estresse, medo, excitação e ansiedade, ocorre aumento da estimulação simpática, que promove em uma segunda fase, a diminuição da secreção salivar, tornando a saliva viscosa (rica em muco) e dando a sensação de “boca seca”. (a) regiões secretoras; (b) estrutura da parede gástrica; (c) glândula gástrica; (d) diferentes tipos celulares das glândulas. A função secretória do estômago depende de diversas células e glândulas que, além de secretarem muco na superfície do estômago, secretam ácido clorídrico (HCl), pepsinogênio e fator intrínseco. Dois tipos de glândulas tubulares estão presentes no estômago, as glândulas oxínticas (glândulas gástricas, formadoras de ácido) e as glândulas pilóricas (secretam muco na região pilórica para proteger o estômago do ácido gástrico). Secreções das glândulas Oxínticas A glândula oxíntica é composta, predominantemente, por 3 tipos de células: células mucosas (secretam muco), células pépticas ou principais (secretam pepsinogênio) e células parietais ou oxínticas (secretam HCl e fator intrínseco). Mecanismo de secreção de ácido clorídrico As células parietais, ao receberem estímulo nervoso ou hormonal, ativam receptores presentes na superfície celular (receptores de histamina, gastrina e acetilcolina), que promovem a secreção de HCl, cujo pH é na ordem de 0,8 (extremamente ácido). Porém, o HCl não é formado no interior das células parietais, pois a ação do ácido promoveria lise celular. Portanto, ao receber o estímulo, as células parietais estimulam a bomba de hidrogênio-potássio-ATPase (H -K -ATPase), que elimina H para a luz do canalículo e, ao mesmo tempo, transporta K para dentro da célula parietal. O H eliminado se associa com o Cl previamente liberado pela célula parietal, formando o HCl nos vilos dos canalículos e é, então, conduzido até a extremidade secretora. Mecanismo de secreção de HCl pelas células parietais gástricas. + + + + + – Mecanismo químico para formação do ácido clorídrico: 1. A água presente nas células parietais se dissocia no citoplasma em H e OH, processo catabolizado pela H -K -ATPase. 2. O H é bombeado para fora da célula parietal em direção aos canalículos, por meio da H -K -ATPase, que faz a troca de H (intracelular) pelo K (extracelular). Este processo é importante, pois, além de eliminar H , faz com que o OH fique livre para se transformar em HCO (catalisada pela anidrase carbônica). A formação de HCO contribui para a entrada de Cl na célula parietal, ocorre a troca do HCO (intracelular) pelo Cl (extracelular), aumentando a concentração de Cl na célula parietal, que será secretado por canais de cloreto nos canalículos e se associará ao H . 3. Com o aumento da concentração de HCl nos canalículos, a água passa por osmose, para tentar manter a homeostasia. Com isso, a secreção dos + + + + + + + + + – 3 – 3 – – 3 – – – + Secreção e ativação de pepsinogênio As células principais e mucosas secretam diferentes tipos de pepsinogênio, que desempenham as mesmas funções. O pepsinogênio (peso molecular de 42500) não exerce ação digestiva, mas, ao entrar em contato com o pH ácido do estômago (HCl), é clivado em pepsina ativa (peso molecular de 35000). A ação a pepsina é a clivagem de proteínas (ação proteolítica) e esta enzima tem melhor atividade em pH entre 1,8 e 3,5, sendo inativada em pH superior a 5. Secreção de fator intrínseco As células parietais do estômago secretam, além do ácido clorídrico, uma substância glicoproteica essencial para absorção de vitamina B , que ocorre no íleo. O fator intrínseco é liberado em resposta aos mesmos estímulos que desencadeiam a secreção de HCl pelas células parietais e é a única função gástrica essencial para a vida humana. Secreções das glândulas pilóricas Estruturalmente, as glândulas pilóricas são semelhantes às glândulas oxínticas, porém, praticamente, não apresentam células pépticas e parietais. No entanto, apresentam grande quantidade de células mucosas, semelhantes às células mucosas das glândulas oxínticas. Estas células secretam, preferencialmente, muco, responsável pela lubrificação e proteção da parede gástrica contra a ação de enzimas gástricas. Outra substância secretada pelas glândulas pilóricas é a gastrina, hormônio que desempenha papel crucial no controle da secreção gástrica. Este hormônio é secretado pelas células G (antro gástrico) após estímulos específicos, como a distensão do estômago, presença de peptídeos e aminoácidos no estômago e a estimulação do nervo vago. Gastrina é secretada direto na circulação sistêmica (mecanismo endócrino) e retorna ao estômago para atuar nos receptores B de colecistocinina (CCK tem afinidade por gastrina e CCK) presentes nas células parietais, que estimulam a H -K -ATPase. A função principal deste hormônio é estimular a secreção de HCl pelas células parietais. Existem outros fatores que também estimulam a secreção de HCl pelas células parietais e que podem interagir para potencializar a liberação de HCl. Os principais fatores que estimulam a secreção de HCl pelas células parietais são: acetilcolina (ACh), histamina, gastrina, somatostatina e prostaglandinas. Além disso, alguns fatores podem inibir a secreção de HCl, por meio do bloqueio de fatores que estimulam a secreção. A atropina (bloqueia receptores de ACh), a cimetidina (bloqueia ação da histamina) e o omeprazol (bloqueia a ação da H -K -ATPase ) são exemplos de fatores que inibem a ação secretória das células parietais, mas atuam por mecanismos diferentes. Substâncias que estimulam e inibem a secreção de HCl pelas células parietais gástricas. canalículos é constituída por água (concentração de 150 mEq/L), HCl (15 mEq/L) e uma pequena quantidade de Na .+ 12 B, + + + + Você sabia? Existe uma síndrome chamada Zollinger-Ellison, que está relacionada com a secreção aumentada de gastrina, causada por um tumor (gastrinoma). Esta síndrome causa diversos efeitos, como aumento da secreção de H , hipertrofia da mucosa gástrica e ulceras duodenais. Além disso, a secreção aumentada de HCl faz com que ocorra a inativação da lipase pancreática, responsável pelo catabolismo de gorduras, prejudicando a absorção de lipídios e ocasionando esteatorreia (lipídios excretados nas fezes). + 6. Secreção pancreática O pâncreas localiza-se sob o estômago e é uma glândula secretora composta, responsável pela secreção de enzimas digestivas pancreáticas, bicarbonato de sódio (responsável por neutralizar a acidez do quimo) e hormônios. As enzimas digestivas pancreáticas são secretadas pelos ácinos pancreáticos, o bicarbonato é secretado em grande volume pelos ductos pancreáticos (pequenos e maiores) e os hormônios são produzidos nas ilhotas de Langherans. As enzimas e o bicarbonato são conduzidos pelo ducto pancreático até a papila duodenal de Vater e esfíncter de Oddi (responsável pela regulação da liberação do suco pancreático para o duodeno), para liberação na porção duodenal do intestino. Porém, em situações em que não é necessária a liberação do suco pancreático no duodeno, é conduzido para o fígado pelo ducto hepático. Estrutura anatômica e conexões da glândula pancreática. Principais enzimas pancreáticas As enzimas pancreáticas são responsáveis pela digestão dos três principais grupos de alimentos: proteínas, carboidratos e gorduras. Para a digestão de proteínas, o pâncreas dispõe da tripsina (mais abundante), quimotripsina ecarboxipolipeptidase. A tripsina e quimotripsina promovem a clivagem de proteínas em peptídeos, enquanto a carboxipolipeptidase completa a digestão de proteínas, pois promove a clivagem de peptídeos até aminoácidos. Estas enzimas são secretadas em suas formas inativas tripsinogênio, quimotripsinogênio e procarboxipolipeptidase. Ao alcançarem o trato intestinal, a tripsinogênio é ativada pela enzima enterocinase em tripsina, que agora pode ativar quimotripsinogênio em quimotripsina e a procarboxipolipeptidase em carboxipolipeptidase. Além disso, o tripsinogênio pode ser ativado autocataliticamente pela tripsina. Para a digestão de carboidratos, a enzima responsável é a amilase pancreática que, por hidrólise, quebra amidos, glicogênio e outros carboidratos, formando, principalmente, di e trissacarídeos. Em relação à digestão de gorduras, o pâncreas dispõe de três enzimas: a lipase pancreática (gorduras neutras, formando ácidos graxos e monoglicerídeos), fosfolipase (cliva ácidos graxos dos fosfolipídios) e colesterol esterase (hidrolisa ésteres de colesterol). Regulação da secreção pancreática Existem três estímulos principais que regulam a secreção pancreática: a acetilcolina (neurotransmissor liberado pelo sistema parassimpático), colecistocinina (CCK, secretada pela mucosa duodenal e jejuno, em presença de alimentos) e secretina (secretada pela mucosa duodenal e jejuno, em presença de alimentos ácidos). Acetilcolina e colecistocinina são responsáveis por estimular as células acinares do pâncreas a produzir enzimas digestivas. A CCK tem como função principal promover a digestão e absorção de gorduras, por meio da secreção de enzimas pancreáticas e sais biliares. São cinco ações principais da CCK: contração da vesícula biliar (liberação da bile para promover emulsificação dos lipídios), secreção de enzimas pancreáticas (lipase pancreática, amilase pancreática e protease pancreática), secreção de bicarbonato pelo pâncreas, crescimento do pâncreas exócrino e da vesícula (efeito trófico), e inibição do esvaziamento gástrico (ação crítica para digestão e absorção). A secretina, secretada pelas células S do duodeno em resposta ao H e ácidos graxos no intestino delgado, estimula a secreção de solução aquosa e de bicarbonato pelo epitélio do ducto pancreático (neutralizam o H ). Esta secreção + + aquosa é responsável pela condução das enzimas digestivas para dentro do duodeno. A secretina tem outra função importante, que é a inibição de gastrina, impedindo sua ação sobre as células parietais (bloqueia a secreção de H e efeito trófico). Existe um peptídeo da família secretina-glucagon, secretado pelas células K das mucosas duodenal e jejunal, chamado peptídeo insulinotrópico dependente de glicose (GIP). Este peptídeo é liberado em resposta a todos os três tipos de nutriente (glicose, aminoácidos e ácidos graxos) e tem como principal ação a estimulação da secreção de insulina pelas células ß do pâncreas, além de inibir a secreção gástrica de H . 7. Secreção biliar A bile é uma substância secretada pelo fígado (de 600 a 1000mL/dia), composta por ácidos biliares que desempenham importante papel na digestão de gorduras. Os ácidos biliares promovem a emulsificação de gorduras, facilitando a ação das enzimas lipase pancreáticas e também contribuem para a absorção de produtos da digestão de gorduras pela membrana intestinal. Além disso, a bile promove a excreção de bilirrubina (produto da destruição de hemoglobina) e colesterol. O fígado secreta a bile por meio dos hepatócitos; inicialmente, a bile é composta por ácidos biliares, colesterol e compostos orgânicos. A bile secretada é conduzida para os septos interlobulares por meio dos canalículos biliares, que desembocam nos ductos biliares terminais que, por sua vez, aumentam seu calibre até alcançar o ducto hepático. A bile pode seguir para o ducto biliar comum e alcançar o duodeno ou seguir pelo ducto cístico, alcançando a vesícula biliar (armazenada por minutos ou horas). Neste percurso, as células epiteliais dos canalículos e ductos secretam bicarbonato e solução aquosa com íons sódio. Esta secreção de bicarbonato é estimulada pela secretina, com intuito de neutralizar a acidez que chega ao duodeno, oriunda do estômago. A bile armazenada na vesícula biliar é liberada para o duodeno, principalmente pela ação da enzima colecistocinina (CCK), que promove a contração rítmica da parede vesicular e relaxamento do esfíncter de Oddi. O principal estímulo para liberação da CCK no sangue pela mucosa duodenal é a presença de alimentos gordurosos no duodeno, que esvazia completamente em, aproximadamente, uma hora. 8. Digestão e absorção As principais macromoléculas adquiridas na alimentação e utilizadas como fonte energética são as proteínas, carboidratos e gorduras. Para serem utilizadas pelo organismo, precisam ser absorvidas, mas, como a mucosa gastrointestinal não absorve estas macromoléculas, elas precisam sofrer um processo de digestão em micromoléculas. Basicamente, o processo de digestão destas macromoléculas consiste em hidrólise mediada por enzimas específicas, que promovem a reintrodução de íon hidrogênio e hidroxila (provenientes da água) nas micromoléculas, rompendo, assim, as ligações que constituem as macromoléculas. No caso dos carboidratos, as enzimas hidrolisam as ligações glicosídicas entre os polissacarídeos e dissacarídeos, quebrando-os em monossacarídeos. Nas proteínas, ocorre a hidrólise das ligações peptídicas entre os aminoácidos que constituem as proteínas (forma dipeptídeos e tripeptídeos); este processo é mediado por enzimas proteolíticas. Já em relação às gorduras, ocorre hidrólise de triglicerídeos (são necessárias três moléculas de água, sendo uma para cada ácido graxo) em glicerol e três moléculas de ácidos graxos. Digestão e absorção de carboidratos A digestão do amido se inicia na boca pela ação da enzima α-amilase salivar, secretada pelas glândulas paróticas, que é hidrolisada em dissacarídeo maltose, porém, devido ao curto tempo de permanência na boca, apenas 5% do amido será hidrolisado. No estômago, a hidrólise mediada pela α-amilase continua (30 a 40% do amido hidrolisado) até que a sua atividade enzimática seja bloqueada pela acidez das secreções gástricas. O quimo transferido do estômago para o duodeno se mistura com + + Aprendendo mais uma! A bile é secretada continuamente pelos hepatócitos e a maior parte é armazenada na vesícula biliar antes de ser secretada no duodeno. No entanto, a capacidade de armazenamento é limitada a, aproximadamente, 50 mL; para conseguir armazenar uma maior quantidade de secreção biliar a mucosa biliar absorve a água, sódio e eletrólitos. Com isso, é possível concentrar a bile em até 20 vezes. a secreção pancreática, contendo α-amilase pancreática. O suco pancreático promove a hidrólise dos carboidratos em, aproximadamente, 15 a 30 minutos após se misturar com quimo. Quase todos os carboidratos são convertidos em maltose ou polímeros de glicose, que serão clivados em monômeros por enzimas presentes nos enterócitos. As principais enzimas dos enterócitos são lactase, sacarase, maltase e α-dextrinase, que atuam respectivamente sobre lactose, sacarose, maltose e α-dextrinas. Digestão dos carboidratos no intestino delgado. Após o processo de digestão dos carboidratos em monossacarídeos (maior parte glicose), ocorre a absorção, sendo que quase todos os monossacarídeos são absorvidos por transporte ativo na membrana intestinal. No caso da glicose e galactose, é necessário um mecanismo de cotransporte de sódio, ou seja, uma proteína transportadora presente na membrana intestinal transporta sódio e glicose (ou galactose), ao mesmo tempo para o interior das células epiteliais. Em relação aos outros monossacarídeos, como a frutose, o transporte ocorre por difusão facilitada, independente do sódio. Digestão e absorção de proteínas A digestão de proteínas se inicia no estômago pela ação da pepsina(ativa em pH 2,0 e 3,0 e inativa em pH 5,0), que promove a hidrólise de 10 a 20% das proteínas ingeridas. Grande parte das proteínas que chegam ao intestino delgado é hidrolisado no jejuno e duodeno, por ação das enzimas presentes no suco pancreático (tripsina, quimotripsina, carboxipolipeptidase e proelastase). A tripsina e quimotripsina promovem a hidrólise de proteínas em polipeptídeos pequenos, que, posteriormente, sofrem ação da carboxipolipeptidase, que libera aminoácidos da porção carboxila. A proelastase é ativada em elastase, que promove a digestão de fibras de elastina (constituinte da carne). Nos enterócitos, células que revestem as vilosidades intestinais, ocorre a liberação de peptidases (aminopolipeptidase e dipeptidases) que promovem a hidrólise das proteínas remanescentes. Os aminoácidos, dipeptídeos e tripeptídeos são facilmente transportados pela membrana microvilar para o citosol dos enterócitos. No citosol, existem peptidases especificas que, em poucos minutos, digerem praticamente todos os dipeptídeos e tripeptídeos em aminoácidos, que serão transportados para o sangue. Você sabia? O colágeno é uma proteína albuminoide que participa da constituição do tecido conjuntivo das carnes, que sofre pouca ação enzimática. A pepsina é uma enzima capaz de promover a quebra das ligações peptídicas do colágeno. Portanto, pessoas que têm deficiência de pepsina nos sucos gástricos apresentam dificuldade na digestão de carnes. Digestão das proteínas no estômago (A) e no intestino delgado (B). Após o processo de digestão das proteínas em dipeptídeos, tripeptídeos e aminoácidos livres, ocorre a absorção na membrana luminal das células intestinais, que se assemelha muito ao processo de absorção de glicose. Existem proteínas transportadoras específicas no epitélio das microvilosidades (foram encontradas, pelo menos, cinco tipos diferentes), responsáveis pela absorção de peptídeos e aminoácidos e este processo requer a ligação do sódio (cotransporte). No entanto, alguns aminoácidos não são transportados por cotransporte, com sódio, e sim por difusão facilitada, semelhante à frutose. Digestão e absorção de gorduras Apesar de uma pequena porção de triglicerídeos ser digerida no estômago (menor que 10%) por ação da lipase lingual, a maior parte ocorre no intestino delgado. Inicialmente, o suco gástrico promove a emulsificação da gordura e este processo continua no intestino por ação dos sais biliares presentes na bile (lecitina, um dos mais importantes no processo de emulsificação), facilitando a fragmentação dos glóbulos de gordura. Este processo é importante, pois as enzimas lipases, por serem hidrossolúveis, somente atuam na superfície dos glóbulos de gordura; sendo assim, a fragmentação e diminuição do diâmetro dos glóbulos contribui para a digestão de gorduras. A principal enzima na digestão de triglicerídeos, em ácidos graxos livre e 2- monoglicerídeos, é a lipase pancreática que, em menos de um minuto, é capaz de hidrolisar todos os triglicerídeos. O colesterol também ingerido na dieta na forma de ésteres de colesterol é composto por colesterol livre e uma molécula de ácido graxo. Assim como os fosfolipídios que também contêm ácidos graxos, são digeridos por lipases pancreáticas (hidrolase de éster de colesterol e fosfolipase A ), que liberam os ácidos graxos. Digestão dos lipídios no intestino delgado. Após o processo de digestão das gorduras em monoglicerídeos e ácidos graxos livres, estes produtos se ligam às micelas de sais biliares e são carreados pelas microvilosidades intestinais. Com isso, os monoglicerídeos e ácidos graxos livres se difundem pelas membranas das células epiteliais (são lipossolúveis) e são captados pelo retículo endoplasmático e usados para produção de triglicerídeos. 2 Assista ao vídeo abaixo, que mostra o processo de digestão. 9. Conclusão Neste tópico, observamos a importância do sistema digestivo, em relação ao processo de fragmentação de macromoléculas, mediado por componentes das secreções deste sistema, que contribui para o processo de digestão dos metabólitos. Foi possível compreender as estruturas responsáveis pelas secreções e a constituição de cada secreção, com destaque para a secreção salivar, gástrica, intestinal, pancreática e biliar. Vimos o processo de digestão de macromoléculas, como as proteínas, carboidratos e gorduras, além de absorção dos metabolitos resultantes do processo de digestão. O conhecimento adquirido neste tópico irá permitir que você possa explorar, de forma mais embasada, tecnicamente falando, esses elementos relacionados às secreções do sistema digestivo, o processo de digestão e de absorção. Além disso, poderá entender e procurar mais informações referentes ao tema, o que será de grande utilidade para o exercício profissional, visto que cumprem papel de grande importância para o bom funcionamento de todos os seres vivos. 10. Referências AIRES, M.M. Fisiologia. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 2008. COSTANZO, L.S. Fisiologia. 2 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. HALL, J. E; GUYTON, A. C. Guyton & Hall tratado de fisiologia médica. 13. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2017. YouTube. (2015, Março, 26). Naked Science em Português. Sistema Digestório Fantástico. 3min40. Disponível em: Parabéns, esta aula foi concluída! https://www.youtube.com/watch?v=StqZI9pMq0U https://www.youtube.com/watch?v=StqZI9pMq0U Mínimo de caracteres: 0/150 O que achou do conteúdo estudado? Péssimo Ruim Normal Bom Excelente Deixe aqui seu comentário Enviar