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Dagomir Marquezi Alma Digital (1997-2014) 17 anos de colunas sobre tecnologia, comportamento e cultura "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" para a revista Info "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" © deste livro: Dagomir Marquezi 2015 Todos os direitos reservados Livro produzido pela DMP – Dagomir Marquezi Produções São Paulo SP Brasil Revisão e edição de texto: Lidice Ba Capa, design e edição digital: Dagomir Marquezi Primeira edição: abril 2015 Colunas publicadas originalmente pela revista Info (Abril Comunicações) Contato com o autor: dagomirmarquezi@gmail.com "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Alma Digital Por Dagomir Marquezi "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Agradecimentos especiais a (por ordem alfabética): Barbara Maria Fernandes Carlos Machado Débora Fortes Gustavo Poloni Juliano Barreto Katia Militello Lidice Ba Paulo Nogueira Sandra Carvalho "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Alma Digital Índice Enter 1997 - 1999 Os que amam e os que odeiam Uma revolucao linguistica O bom menino tem auto-educação O apocalipse à espera de um bug Humano + Computador = Extra! Extra! O jornal está nas últimas Poderão os simuladores salvar o mundo? Um sumério escreve no barro do Tigre Correio eletrônico sentimental Ruídos, chiados e assobios em estéreo "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Olhos para enxergar o mundo inteiro “Penumbra quatro som praia surround sleep” A guerra dos browsers Um carrinho cheio da areia do tempo Slots para meu cérebro Pesadelo púrpura Sem medo de ser um nerd O laptop de Sigmund Freud Viva a reserva de mercado! Procura-se um extraterrestre Alguns cliques para mudar o mundo 2000 - 2002 Mil e um cuidados com um bebê de 333 MHz Montado na bala A vida em planilhas Um tempo para o tempo Universo analógico "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Boa viagem, HAL A web dos wikis Scanner humanos A arma do crime O apagão da minha vida Meu primeiro PDA Mechas querem ser amados As cavernas de Compucity Inferno.com 2003 - 2005 Minha vida num CD-ROM O que é M.I.L.F.? Atestados de óbito Um computador para dona Dirce Algorimos jornalistas Nossas vidas em linhas e colunas A onda Orkut arrasta todo mundo "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Toda a coleção dos Beatles O homem giga Braingate Agora eu também tenho um blog Socorro em Casa Ciranda do amor online Universidade do truco Acidente na via Dutra Milagre! Milagre! Somos todos astronautas 2006 - 2008 D.R. Online O fenômeno Smosh Teclados, mouses e outras velharias A internet como doença Europa sem fio Os filhotes de James Bond "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Minha segunda vida TV Nicho Cyberpedofilia A busca por outros caminhos Enviar? Salvar? Apagar? A cerca de segurança Consulta marcada para 2018 Revolução narrativa Universo Google Registro Total da Vida AEUTEM1CPI 2009 - 2011 Aventuras em Twitterland Vigiando o Querido Líder A máquina do conhecimento A torre de Babel está caindo Eu e Mr Rains "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Operação Baal Até seu Lineu tá na rede Um museu em cada casa Tragédia compartilhada Minha etiqueta no Facebook Sartre e a liberdade inútil Meu império cultural online 2012 - 2014 O insustentável desejo de ser curtido Lâmpada de Aladim A cultura desencarnou A terceira grande revolução industrial Um oceano de taras e fetiches Eu controlo o tráfego aéreo mundial À espera do BFS-Auto Drones para todos Enquanto isso, em 1785... "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Crimes futuros O último post Passagem no Hyperloop Shodan, o Google dark Editora Eu Mesmo Um rewind no tape O eterno 1962 Voando a mil PPM A era dos robôs A gente está se achando A civilização do selfie Navegando pelo streaming sem perdas O autor "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Dagomir Marquezi Alma Digital "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Enter Meu caso com a tecnologia é antigo. Talvez tenha nascido comigo. Ou foi influência do meu pai. Quando era uma criança no final dos anos 1950 eu admirava seu Decio desmontando pacientemente os aparelhos de casa para consertar. Ele gostava especialmente de rádios. Me ensinou a viajar pelo mundo sem sair de casa, ouvindo estações de ondas curtas. Meu pai gostaria de ter sido engenheiro eletrônico, mas sua origem humilde não permitiu. Herdei do seu Decio a paixão pelo rádio, pela TV e por qualquer tipo de aparelho que passasse na minha frente. Sempre fiquei hipnotizado por um bom design ou pelas sutilezas técnicas de um manual de funcionamento. Em matéria de música, por exemplo, fui iniciado pelo meu pai nos toca-discos 78RPM, acompanhei a evolução para o vinil, depois para o CD, para o DVD-audio e o streaming. Seu Decio se foi cedo, em 1990, no início da grande revolução digital. Minha paixão por computadores foi imediata, fatal e eterna. A história desse livro começa na verdade em 1986. Nessa época eu comprei um dos primeiros computadores pessoais produzidos no Brasil, o TK-85. Seu monitor era a TV da sala. Sua memória, um gravador cassete – que não funcionava. Não existia o conceito de softwares. O usuário tinha que digitar cada linha de comando em linguagem BASIC. Mesmo com tantas "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" dificuldades eu cheguei a programar no TK-85 modelos primitivos de um sintetizador de som e de um simulador de voo. Foi minha “alfabetização” na lógica de um computador. Em 1997, onze anos depois daquele TK-85, eu já tinha passado entusiasticamente por todos os estágios e upgrades da primeira fase da história do computador pessoal. Participei das experiências pioneiras de comunicação à distância via BBS. Experimentei cada evolução dos processadores e cada nova versão do Windows. Eu não “fui obrigado” (como quase todo mundo que eu conheço) a me adaptar aos novos tempos. Tive na verdade enorme prazer em fazer parte dessas mudanças. Em 1997 eu era um dos raros jornalistas brasileiros obcecados nesse assunto. E numa era sem redes sociais, meus diálogos remotos se davam por longos emails, escritos como cartas tradicionais. Foi por email que eu entrei em contato com um velho amigo dos tempos da Veja, Paulo Nogueira. Ele era então o diretor do grupo Exame, na editora Abril. Depois de uma intensa troca de mensagens, o Paulo tomou uma decisão ousada. Combinou com Sandra Carvalho (então diretora de redação da revista Info) para que eu assinasse uma coluna mensal. Eu?! Na Info?! Perto do pessoal que fazia a mais importante revista de tecnologia do Brasil, sempre fui um leigo. Mas a ideia do Paulo Nogueira era justamente essa: dar uma visão mais “humana” e reflexiva a uma revista técnica. Em abril a primeira coluna foi publicada. Pensei na época: “Logo a Sandra "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" vai me avisar que a experiência não deu certo”. E no entanto, quando escrevo estas linhas, minha coluna da Info completa seu 18º aniversário. A diretora Sandra Carvalho foi substituída por Débora Fortes, que deu lugar a Katia Militello. E de todas elas tudo o que eu recebi foi apoio total e liberdade. Tentei preservar nesta coletânea as colunas tal como foramescritas (e nem sempre como foram publicadas). Realizei correções de estilo e informação (com a ajuda fundamental de Lidice Ba). Nesta compilação, ao final de cada capítulo escrevi um texto intitulado “O Panorama em 2015”. Neles eu atualizo cada uma das colunas. Conto o que mudou ou não, onde eu acertei nas minhas previsões. E onde errei feio. É uma espécie de making of de cada coluna. Cortei também textos que considerei menos inspirados ou repetitivos. Este livro contém profecias, histórias de ascensões e quedas, reflexões, mudanças de comportamento e peças de ficção. Algumas colunas receberam elogios. Outras provocaram protestos. Foram 18 anos vertiginosos. Mesmo para cérebros eletrônicos como o meu. Dagomir Marquezi São Paulo 05 abril 2015 "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" 1997 - 1999 "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Os que amam e os que odeiam 1997 Imagine a seguinte situação: no mesmo centro de convenções marcam seus congressos o Clube dos Adoradores Fanáticos de Computadores (na ala A) e a Sociedade Internacional dos Que Odeiam a Informática (na ala B). Quem fosse para a ala A daria de cara com testemunhos admirados de usuários de chips absurdamente velozes, discos rígidos de centenas de gigabytes, modems mais rápidos que o pensamento, CD-ROMs de velocidade multiplicada por 64, circuitos de fibra óptica, monitores de cristal de titânio. Já os visitantes da ala B exibiriam com orgulho suas velhas máquinas de escrever. Lá estariam contadores altivos com seus lápis e borrachas, arquitetos de régua-T, secretárias com as mãos enegrecidas pelo papel carbono, caixas de banco com suas canetas Bic. Num certo momento, fatalmente ocorreria no corredor um encontro de alguém da ala A com alguém da ala B. Primeiro eles se olhariam com mútuo e profundo desprezo. Quem sabe depois eles não começariam a conversar? Como costuma acontecer, os dois lados sairiam ganhando com um diálogo. Os que adoram computadores iriam aprender que tem gente trabalhando duro, se esforçando muito, e "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" conseguindo resultados respeitáveis SEM computador. Métodos “tradicionais” não devem ser esquecidos, mas preservados. Uma civilização sábia não escolhe entre o computador e o ábaco. Fica com os dois. Já os que odeiam computadores poderiam aprender que aquelas máquinas diabólicas são uma extensão de seu próprio potencial. E que ser contra o micro é sabotar sua própria capacidade de criar e produzir. Eu, que amo os computadores, preciso lembrar que existe uma vida lá fora. Nessa hora, olho com inveja o monitor brilhando na minha cara. E fico revoltado. Eu tenho que dormir. O computador, não. O Panorama em 2015: Em 1997 computadores não integravam obrigatoriamente a paisagem humana. Eram apenas uma opção exótica. Você conseguia viver perfeitamente sem um computador. Conta se pagava no banco. Comunicação era pelo telefone ou correio. A “computação” era um mundo novo cheio de promessas e dificuldades. Desde a primeira coluna eu procurei o caminho do meio entre o combate a posições extremistas e irracionais. Esse texto pioneiro tinha originalmente um trecho que descrevia a tecnologia de ponta da época: “o último MMX, o disco de 2 GB ou o modem de 56,6 Kbps”. MMX era o processador. E o disco rígido tinha a mesma capacidade de um pen-drive barato de agora, 2015. A gente chamava desktop de “micro”. "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Uma Revolucao Linguistica 1997 Leia o título de novo. Eu sei que ele está errado. Falta acento, falta trema, falta cedilha. Mas... você entendeu. A língua portuguesa já teve dias melhores. Sua presença geográfica está cada vez mais limitada: Portugal, Cabo Verde, Angola. A desagregação de Moçambique faz com que cada vez mais moçambicanos adotem o inglês da vizinha República Sul Africana. Timor, que fazia as honras da língua portuguesa na Ásia, foi destruído pela truculência indonésia. Ah, temos Macau, ainda. Mas se nem Hong Kong resistiu ao novo império chinês... A história da linguagem humana obedece a leis naturais e dinâmicas. O inglês tornou-se a língua planetária, entre outras coisas, porque é objetiva, simples e econômica. Já os nossos filhos passam alguns de seus mais produtivos anos escolares decorando uma língua que jamais falarão e que conjuga seus verbos em um zilhão de modos diferentes. O português é um mastodonte atolado em regras, fragilizado num ecossistema linguístico cada vez mais hostil. Eu tive o sinal de que o espanhol sobreviveria quando vi Arnold Schwarzenegger dizendo “Hasta la vista, baby” em O Exterminador do Futuro 2. Enquanto os franceses se negam a falar outra coisa que não seja o francês (ridículas leis impedem chamar um hambúrguer de hambúrguer), os hispânicos se misturam. E o espanhol fica mais forte com isso. "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" A BBC World exibiu uma reportagem curiosa sobre o nascimento de uma nova língua — o “spanglish”. Numa mesma frase os entrevistados passavam do inglês para o espanhol e vice-versa com toda a naturalidade. A língua, como o computador e o carro, deveria ser um instrumento a serviço do homem. E não um objeto de culto. A língua portuguesa precisa ser simplificada e modernizada. Essa mudança está nascendo — e o fórceps chama-se e-mail. Por razões técnicas, trocar mensagens por e-mail usando o português “correto” é arriscado. O software do outro lado pode reconhecer a floresta de acentos e sinais gráficos. Ou não. O “ã” que você envia pode chegar do outro lado como um símbolo gráfico completamente irreconhecível. Os “á”, “à”, “ê”, “ç”, “ü’’ podem virar “%”, “@”, “&”, “ ” ou “å”. A garantia para mandar uma mensagem compreensível é não arriscar. E simplesmente escrever sem qualquer acento. Como na língua inglesa, o significado da palavra será reconhecido no contexto da frase. Achar que alguém não vai entender que “revolucao” quer dizer “revolução” é chamar o leitor de estúpido. Ou estupido. O e-mail veio para ficar, e já está ajudando a tentar tirar a língua portuguesa da UTI. A própria lógica objetiva da informática está exigindo que brasileiros aprendam noções básicas de inglês. “Setup” será sempre uma palavra mais fácil de se dizer e usar do que “configuração”. Assim como “download” é mais simples e direta do que “importar arquivos "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" através da linha telefônica”. Estamos caminhando para o portunglish, uma mistura dinâmica de português com inglês, e nossa cultura só tem a ganhar com isso. Caminhamos também para um português mais objetivo, mais simples, mais adaptado aos novos tempos. Para os guardiões da tradição, é uma péssima notícia. Para o resto de nós, é motivo para uma party. O Panorama em 2015: Sim, naquele tempo a gente baixava arquivos pela linha telefônica. Resolvi ser polêmico logo na segunda coluna para firmar meu espaço. Marquei uma posição, embora parecesse nesse texto ser mais radical do que eu era de verdade. Quis provocar. Tratei de duas questões paralelas: a língua portuguesa e o e-mail, que ainda não tinha se firmado completamente. Com o tempo, aconteceu o contrário do que eu tinha imaginado: o mercado se globalizou e as empresas (como a Microsoft e a Google) passaram a adaptar seus softwares ao português e outras línguas. E aconteceu a virada. Esses softwares criados no exterior começaram a cuidar do bom funcionamento do português por meio de corretores. Absolutamente ninguém poderia imaginar isso em 1997. Se eu gosto da língua portuguesa? Claro que eu gosto! Como escritor e jornalista eu vivo dela. Por isso mesmo torço para que sobreviva num mundo cada vez dinâmico. "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******"O bom menino tem autoeducação 1997 “O bom menino não faz pipi na cama. O bom menino não faz malcriação. O bom menino vai sempre na escola E na escola aprende sempre a lição”. Sábias palavras do palhaço Carequinha. Carequinha? Quem tem menos de 40 provavelmente não imagina quem seja. Mas nos anos 1960 seu compacto-simples de O Bom Menino fez um sucesso imenso. E virou uma espécie de micro manual do bom comportamento para toda uma geração. Nos tempos do Carequinha, escola era um lugar onde você levava caderno, lápis, borracha, sentava numa cadeira e anotava o que a mestra dizia. Era lei. Tinha de ser decorado e repetido na prova. A participação do aluno se resumia a levantar a mão com um dedo esticado (que significava “quero fazer xixi”), ou dois dedos (“quero fazer cocô”). A professora deixava. Ou não. Ponto final. Para os anos 1950 estava mais do que bom. Daí vieram métodos mais modernos e participativos de ensino. O aluno passou a pesquisar mais, a frequentar mais bibliotecas e realizar mais estudos em campo. Alguns métodos mudaram, sim. Mas de uma maneira geral os estudantes hoje continuam a engolir regras idiotas, datas "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" estúpidas, tabelas infernais. Perguntei à diretora da escola do meu filho: por que o pobre coitado tem de gastar seus melhores anos decorando tanta coisa que ele provavelmente jamais vai usar? Resposta: a educação brasileira está voltada para o vestibular. É o que interessa. Eis que surge a dupla computador & internet. Essa combinação tem um poder infinito de informar e educar gente de qualquer idade. Um aluno equipado com um PC multimídia e um provedor de internet pode aprender numa única semana muito mais que num ano inteiro de aula na escola. A escola do futuro vai ter que mudar. As pessoas estudarão cada vez mais em casa, por conta própria. Vão usar o infinito poder de informação e pesquisa que é um computador conectado a um modem. A educação deveria se tornar cada vez menos formal e mais personalizada, de acordo com as necessidades de cada um. A autoeducação será uma tendência cada vez mais forte — e eficiente. Não existem duas pessoas iguais. Cada uma deve ter a chance de estudar o que quiser e de desenvolver todo seu potencial individual. Uma voltinha de alguns minutos por instrumentos de busca como o Yahoo ou o AltaVista pode equivaler a meses de visitas a bibliotecas e museus. Acabar com os livros? Nunca! Há um prazer especial em ler livros e revistas de papel que nenhum notebook substitui. No entanto, mais de que livros, precisamos de computadores. Computadores aos montes. Computadores em salas de aula, em "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" bibliotecas, jardins de infância, computadores em cada casa, apartamentos e favelas. O Panorama em 2015: Essa coluna é do tempo em que o Yahoo inaugurou o conceito de busca na internet e o AltaVista aparecia como seu poderoso desafiante. De novo, é preciso lembrar que em 1997 o computador era opcional. De lá para cá, a internet só melhorou seu potencial didático com instrumentos como a Wikipedia, os cursos à distância, os vídeos didáticos e as universidades abertas. Eu dedicaria outras colunas (geralmente indignadas) ao assunto falência da educação brasileira, que só piorou desde 1997. O Carequinha (George Savalla Gomes) faleceu no dia 5 de abril de 2006, em São Gonçalo RJ. Pediu para ser enterrado com sua maquiagem de palhaço. Mas não foi atendido. Esta é a letra completa de “O Bom Menino”: “O bom menino não faz pipi na cama / O bom menino não faz malcriação / O bom menino vai sempre à escola / E na escola aprende sempre a lição / O bom menino respeita os mais velhos / O bom menino não bate na irmãzinha / Papai do céu protege o bom menino / Que obedece sempre, sempre a mamãezinha / Por isso eu peço a todas as crianças / Muita atenção para o conselho que eu vou dar (FALADO) Olha aqui, Carequinha não é amigo de criança que passa de noite da sua cama pra cama da mamãe e também não é amigo de criança que rói unha, e chupa chupeta. Tá certo ou não tá? Táaaaaaa (Cantado) Eu obedeço sempre a mamãezinha / Então aceite os parabéns do Carequinha. (FALADO) Olha aqui. Carequinha só gosta de criança que respeita mamãe, papai, titia e vovó e seja amigo dos seus "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" amiguinhos. E também que coma na hora certa, e durma na hora que a mamãe mandar. Tá certo ou não tá? Táaaaaaa (CANTADO) Eu obedeço sempre a mamãezinha / Então aceite os parabéns do Carequinha / Viva o bom menino! / Vivaaaaaa!” O apocalipse à espera de um bug 1997 Algum computador já te fez chorar? Não digo chorar de raiva, porque travou nos últimos 10 segundos de um download de 4 horas e meia. Não digo chorar de ódio, porque diz que seu drive A não existe, embora a luzinha do drive A esteja piscando bem na sua frente. Algum computador já te fez chorar de emoção e piedade? Eu quase cheguei lá quando assisti pela primeira vez 2001, uma Odisseia no Espaço. Num filme emocionalmente gelado, um dos raros momentos de humanidade ficou por conta de HAL 9000, o irresistível computador a bordo da nave Discovery. Quando Dave Bowman (último sobrevivente humano da Discovery) começa a desligar os circuitos de memória de HAL 9000, o que vemos e ouvimos é um astronauta agindo como uma máquina. E um computador implorando pela própria vida, como um ser humano. “Dave... pare... pare... você vai parar, Dave? Você vai parar, Dave? Eu estou com medo... Eu estou com medo, Dave... "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Dave...eu posso sentir... Eu posso sentir... Meu pensamento está indo embora... Não há dúvida sobre isso... Eu posso sentir... Eu estou com medo...” Foi difícil segurar as lágrimas quando HAL, num último momento de lucidez, começou a cantar a canção infantil “Daisy”. Mas 2001 não era um filme sentimental. Tratava, entre outras coisas, da crucial questão: um dia o computador dominará o homem? A rivalidade computador versus homem assumiu contornos dramáticos neste ano de 1997. Garry Kasparov foi derrotado pelo Deep Blue da IBM, numa competição histórica de xadrez acompanhada pelo mundo todo. O que me faz lembrar de outro computador astro de cinema: o WOPR, de Jogos de Guerra (“WarGames”, 1983). No filme, Matthew Broderick é um jovem hacker que acessa um supercomputador das Forças Armadas americanas especializado em simulação de guerra. Para o garoto, é um jogo. Para WOPR é a detonação real da guerra termonuclear contra os soviéticos. WarGames parece hoje ultrapassado com o fim da Guerra Fria. Rússia e Estados Unidos atualmente se dão bem. Mísseis estão sendo desmontados em ambos os lados. Podemos respirar aliviados, então? No dia 25 de janeiro de 1995, no interior de uma base de defesa da Federação Russa, tudo aparentemente está normal. De repente, um sinal no radar. O computador identifica um míssil invadindo o espaço aéreo russo. Aparentemente um Polaris foi "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" disparado de um submarino americano no Mar da Noruega. Alvo: Moscou. Tempo de impacto: 15 minutos. Imediatamente a base manda um sinal para o presidente Boris Yeltsin. Alerta total. Quinze minutos. Dedos nos gatilhos. Catorze. Treze. (O que você estava fazendo naquela quarta-feira, 25 de janeiro de 1995, o dia em que o mundo poderia ser devastado por uma guerra nuclear?) Sete minutos até Moscou... 6... 5... 4... Faltavam 3 minutos para a provável incineração da capital russa quando o “míssil americano” desapareceu do radar. Tratava-se na verdade de um inocente foguete norueguês realizando pesquisas sobre a aurora boreal. Os computadores russos Daquele dia de 1995 até agora o que aconteceu? Os russos continuam armados com 6.000 ogivas nucleares guardadas por militaresinsatisfeitos, operando computadores obsoletos e de manutenção cada vez mais precária. São computadores capazes de confundir um foguetinho de pesquisas com o poderoso Polaris. Velhos, lentos, tentando coordenar os dados e os comandos de 1.300 mísseis estratégicos. O Apocalipse à espera de um bug. “Dave... Eu estou com medo...” O Panorama em 2015: Nesse 25 de janeiro de 1995 quando o mundo quase acabou eu tirei o dia para passear com meu filho Icaro (então com 11 anos). Comemos uma pizza na padaria Real, no bairro do "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Sumaré, em São Paulo. Eu trabalhava na época como roteirista freelance para o SBT. Já tinha escrito em 1983 (numa parceria com Lu Gomes) um livro chamado Guerra Nuclear. Nessa época eu achava que o apocalipse seria apenas uma questão de tempo. Já em 1997 havia a tensão entre as potências, faltas de canais de comunicação, segredos demais. Essa situação melhorou com os anos e chegou a um nível de equilíbrio e segurança. E voltou a se deteriorar até chegar a 2015 com perigos muito reais – como a Coréia do Norte e o Irã. Humano + Computador = 1997 Você anda cansado? Sua memória está falhando? Não se entende mais com seus filhos? Sua vida sexual anda em baixa? Acabaram seus problemas! Com BRAINWARE© sua vida vai se modificar completamente, e para melhor! Com BRAINWARE© você vai conectar seu cérebro diretamente ao seu computador! E ainda receberá gratuitamente todos os cabos, plugues e até o implante de cabelo que vai disfarçar completamente sua conexão cerebral! BRAINWARE© custa muito menos do que você pode pagar, e nós aceitamos todas as formas de pagamento! Ligue agora mesmo para 1604 e compre seu BRAINWARE©. Satisfação garantida ou seu dinheiro de volta! Tenha seu cartão de crédito à mão quando falar com uma de nossas atendentes! "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" <><><> Um conector na base do seu cérebro, um cabo ligando seus centros nervosos a um computador, com adaptador para laptops. Parece uma utopia distante, mas não é. Os extremos tendem a se unir. Não é o homem CONTRA o computador, mas o homem SOMADO ao computador. Nós já estamos todos “plugados” de uma forma mais metafórica. É natural que este plugue se torne físico um dia. Temos dois exemplos de como isso aconteceu no chamado mundo animal. Exemplo 1: cientistas japoneses implantaram recentemente um chip diretamente ligado ao cérebro de uma barata. O inseto recebe impulsos aleatórios do chip que determinam se ele deve desviar seu caminho para a direita ou para a esquerda. A barata, tonta, mal consegue se equilibrar com aquele tijolinho metálico sobre sua cabeça. Exemplo 2: animais domésticos podem receber chips de identificação, implantados sob a pele. Por meio de injeção subcutânea, o animal tem registrado no chip seu nome, endereço, meios de contato com o dono, para o caso de se perder. Não vai demorar para que possa ser localizado por satélite. O primeiro exemplo é grotesco. Mas agora imagine que o tal chip colocado no cérebro de uma barata estivesse no de um ser "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" humano. E que este chip pudesse reconhecer e anular ataques epilépticos. Quanto ao exemplo do bebê, já pensou se cada criança recebesse sob a pele ao nascer um chip de identificação? Nenhuma forma de controle, só o registro de nome, origem, nome dos pais, tipo de sangue, etc. Pense o quanto isso seria útil em dramas envolvendo sequestros, acidentes, amnésia etc. O conflito homem x máquina talvez termine com um final feliz. Já ouviu falar do BRAINWARE©? O Panorama em 2015: Essa foi a primeira de uma longa série de textos em defesa da boa imagem dos computadores. Eles costumam ser mostrados como vilões (intencionais ou por acidente) em filmes e séries de TV. E eu sempre defendi que computadores devem ser tratados com o mesmo respeito com que tratamos nossos melhores amigos. Extra! Extra! O jornal está nas últimas 1997 Lá por 1965 eu ganhei minha primeira máquina de escrever. Era uma Remington compacta, verde-escura, redondinha como um fusca. Na mesma época, descobri (com ajuda do meu pai) o rádio de ondas curtas. Enquanto os meninos jogavam bola na rua, eu colocava uma folha de caderno em branco na Remington e transcrevia as notícias da BBC e da Rádio Moscou que só "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" seriam publicadas nos jornais do dia seguinte. Era um “radio escuta”, como se dizia na época. Eu brincava de jornalista internacional. Quando me tornei adulto e comecei a ganhar dinheiro, virei um consumidor compulsivo de bancas de revistas. Cheguei a assinar quatro jornais diários simultaneamente. Eles viraram três, dois, depois um. A assinatura do último acabou e eu quebrei uma rotina de 30 anos. Não me lambuzo mais de tinta. Não leio jornais — de papel — há meses. Na rede, a banca de jornais mais completa do mundo está aberta 24 horas na sua casa, praticamente de graça. O El-Ahrein, o Jerusalem Post, o Nairobi News, New York Times, Times de Londres, o Le Monde, o Anchorage Express, jornais chilenos, jornais da Costa Rica, do Irã, de Madagascar, das Ilhas Fiji, jornais de Sorocaba, Teresina, Curitiba, Belém do Pará e Rio Branco. Resumindo: o jornalão acabou. Vai continuar existindo por mais algum tempo, mas ficou obsoleto. O reinado dessa maçaroca de papel barato como base da informação diária está no fim. O primeiro jornal foi o britânico Daily Courant, nascido em 1702. Nesses quase 300 anos, ler jornal sempre significou estar bem informado. Mas a superação do papel não quer dizer o fim das redações, dos jornalistas, dos editores etc. Haverá uma migração muda e discreta em direção à nova mídia. Por que ler um jornal congelado no tempo se você encontra um noticiário "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" online que se modifica a cada segundo? As limitações técnicas de hoje estão para ser superadas. Um monitor portátil, outro à prova d’água, acesso mais rápido e barato via cabo, terminais públicos — caminhamos para tudo isso, e rapidamente. Valeu jornalão, aprendi muito com você. Obrigado pela sua fidelidade ao lado do meu troninho. Descanse em paz, ao lado do pergaminho e do rádio galena. O Panorama em 2015: “Galena” é um formato muito primitivo de rádio, símbolo de tecnologia obsoleta. O que eu previ em 1997 seria minha rotina 18 anos depois. Só estava apressado demais. Há no texto até uma sutil previsão dos futuros tablets – na referência ao “monitor portátil”. Meu problema maior como candidato a Nostradamus é o timing. Eu via a digitalização da imprensa como um fenômeno iminente. Neste ano de 2015 o Daily Courant faz 313 anos. E contra toda lógica, o papel resiste teimosamente. A leitura digital vai acabar prevalecendo, mas o processo enfrenta muito mais resistência do que eu poderia imaginar em 1997. A digitalização da imprensa não se tornaria apenas uma questão de preferência, mas de sua própria sobrevivência. Poderão os simuladores salvar o mundo? 1997 Os animais matam com a lógica da sobrevivência. Os homens "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" matam e destroem por prazer, por esporte e por sadismo. Esse comportamento não tem explicação simples. São instintos destrutivos pulsando como um tumor. Alguns de nós controlam bem esses impulsos. Outros entram no carro e dão 150 quilômetros por hora até encontrar um muro. Ou um pedestre. Pois é aí que os simuladores podem salvar a humanidade. Simuladores e videogames permitem que esses instintos destrutivos possam ser satisfeitos sem consequências trágicas. Alguém já experimentou colocar um assassino compulsivo para jogar Doom? Como ele se sentiria após uma hora de sangue virtual se espalhando pela tela? Ninguém sabe. Ninguém experimentou.E se a cada um desses potenciais assassinos do volante fosse dada a obrigação de pilotar três horas diárias de games de corrida? Corra, corra, bata até enjoar. Trezentos quilômetros (virtuais) por hora, vai, corra mais, vai que dá, não deu. O carro voa em slow motion pelo céu do autódromo numa bola de fogo. Quer começar uma nova corrida? Clique em OK. Mas simuladores não foram feitos só para destruir. Há alguns construtivos, também. Refiro-me aos tamagoshi, os bichinhos virtuais que invadiram o mercado e viraram mania internacional. Tamagoshi são computadores extremamente simples, instalados em brinquedos fofinhos e equipados com um simulador de ser vivo. Por meio dele, multidões de crianças e adolescentes tiveram a oportunidade de cuidar de um ser que dependia deles. Uma geração inteira teve sua primeira sensação de maternidade/paternidade virtual. "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Simuladores permitem que cada um de nós realize experiências impossíveis de viver no mundo real. Infelizmente ninguém estuda direito essas possibilidades terapêuticas a fundo. Cada desajustado deste mundo poderia ter seu simulador sob encomenda. Terroristas em potencial explodiriam planetas inteiros sem machucar ninguém. Enquanto eles brincam, nós estamos a salvo. O Panorama em 2015: A onda dos tamagoshi se espalhava no final de 1997. Eu fui sincero ao demonstrar minhas dúvidas com essa teoria: saturar uma pessoa com seu próprio instinto agressivo pode ajudar a controlar seus impulsos destrutivos? Depois me toquei que estava inconscientemente me inspirando no repugnante “método Ludovico”, do livro (de Anthony Burgess) e filme (de Stanley Kubrick) Laranja Mecânica (“A Clockwork Orange”). Nele, o personagem Alex (Malcom McDowell) é obrigado a visualizar situações de violência até se enjoar delas. Hoje essas pesquisas são parte da rotina científica. Um sumério escreve no barro do Tigre 1997 De vez em quando dá uma tremenda preguiça de escrever, não dá? O cursor fica piscando na tela em branco por longos minutos e nos julgamos vítimas de um brutal esforço criativo. "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Na sua próxima crise de criatividade, desligue o computador. Na escuridão do seu monitor talvez você consiga ver a sombra de um sumério sujo de lama no vale da Mesopotâmia. No barro do rio Tigre, o homem de 5000 anos atrás grava imagens. Cada desenho que ele risca tem um significado, e esse é o princípio da linguagem. Assim se registrava a História em 3000 a.C. Dois mil anos depois os fenícios inventaram um sistema de comunicação baseado em sinais com sons próprios. Os gregos aprimoraram essa forma de linguagem. Os romanos abandonaram em parte os formões e os martelos. Passaram a escrever com uma palha molhada em tinta sobre um vegetal chamado papiro. Bem mais prático. Aí a Igreja Católica Romana decide registrar sua doutrina por escrito. No século 6 d.C. um teólogo espanhol dá um grande salto tecnológico e inventa... a pena de ganso (afiada na ponta). A pena permaneceu a forma básica de escrita por nada menos que 1.300 anos. O século 18 muda tudo. Além de uma revolução cultural, traz os meios para registrá-la: o papel, o lápis e os primeiros modelos de caneta com ponta de metal. De repente, num intervalo de apenas catorze anos, surgem duas invenções que mudam a história da escrita. A primeira é a caneta com depósito próprio de tinta - a caneta tinteiro. A outra grande mudança começa em 1829, quando é patenteada a primeira máquina mecânica de escrever de tipos móveis. Seu design vai se aperfeiçoando, até que em 1873 é lançada a "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" primeira Remington. É a base da moderna máquina datilográfica. Um grande salto para a humanidade. Em 1925 a IBM lança a primeira máquina de escrever elétrica. Um motor passa a poupar uma parte do esforço muscular humano — como mudar de linha, voltar ao início da página, tirar o papel do rolo etc. Nessas máquinas, qualquer correção resultava em tanta sujeira no papel que ficava bem mais simples jogar fora e começar tudo de novo numa folha em branco. Essa permanente possibilidade de desastre funcionava como um freio em qualquer processo criativo. Religue o seu computador. Lá está o cursor piscando no monitor em branco. Com o computador você escreve o que quer, apaga o que quer, produz várias versões do mesmo texto, corrige tudo automaticamente, insere ilustrações, muda a tipologia, imprime a laser ou envia para o outro lado do mundo em questão de minutos. Escrever virou uma grande moleza. Foi pensando no sumério chafurdando na lama da Mesopotâmia que eu resolvi tomar vergonha na cara e escrever esta coluna de uma vez. O Panorama em 2015: Comecei minha carreira com máquinas de escrever. Escrevi centenas de artigos e capítulos de novelas corrigindo erros com uma tintinha branca. Ou fazendo sanduíches de papel com papel carbono. É uma das razões para valorizar tanto o computador. Aliás, a revista The Economist publicou em janeiro de 2013 um "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" curioso artigo sobre o papel carbono. Ele sobrevive em algumas burocracias infernais - como na Rússia. Descobriram outra utilidade para ele: marcar o desenho na pele do cliente antes da tatuagem definitiva. Ah, sim, e os dentistas ainda usam carbono para demarcar locais na obturação que precisem de um lixamento. Correio eletrônico sentimental 1997 O correio eletrônico (em forma de e-mail e cc:Mail) junta as vantagens da palavra escrita às facilidades da palavra falada. Como se escrevesse uma carta, você é obrigado a elaborar melhor a sua lógica para transmitir o que quer. Seus sentimentos podem ficar mais claros. É claro que o e-mail reflete a personalidade de quem o escreve. Um imbecil vai ser um imbecil grunhindo numa caverna ou usando um celular digital. Mas o correio eletrônico permite a quem tem algo a dizer que se expresse com mais clareza e criatividade. Pela sua própria natureza, o correio eletrônico pode inspirar um relacionamento bastante íntimo entre duas pessoas. Seja entre amigos, amantes, parentes ou colegas de infância, o e-mail tem uma capacidade ainda não explicada de abrir o coração de seus usuários. E de unir pessoas com os mesmos interesses ao redor do mundo. "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Ficou mais prático achar a sua tribo. Goste de carros antigos ou de engenharia genética, está fácil encontrar gente interessada no que você gosta. Num desses fóruns (que reunia fãs de um antigo seriado de TV) conheci Nancy, moradora de Victoria, na costa canadense do Pacífico. A princípio, trocamos informações sobre o seriado em si. Logo entramos no terreno pessoal — dois quase antípodas, “conversando” por escrito todos os dias. Em uma semana e meia de mailing diário, Nancy já estava me contando alguns detalhes sobre sua vida conjugal em crise. Eu, por outro lado, comecei a desabafar com ela minhas apreensões meio paranoicas sobre os males da próstata — um papo mais que íntimo que costumo ter unicamente com meu urologista. Em duas semanas nasceu entre nós algo mais que simples curiosidade. A gente já sentia falta um do outro, se um de nós falhasse na correspondência. Nosso relacionamento não tinha a agressividade intrusiva de um telefone tocando durante o jantar. Nancy escrevia quando queria. Eu lia sua mensagem quando podia. E respondia quando dava. De repente sutis fantasias começaram a rondar minha troca de mails com Nancy. Um não conhecia a cara do outro. Inevitavelmente um rosto imaginário começa a se materializar. Aquela mulher vivendo a meio caminho do círculo Ártico estava, na época, mais próxima de mim do que qualquer vizinha. A amizade durou pouco — menos de um mês. Mas foi intensa, rápida e fulminante. "******ebookconverter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Porque via e-mail você não vê o corpo da pessoa, apenas sua mente. E, por trás da mente, revela-se aos poucos a sua alma. Alma digitada, formatada, transformada em Kbytes seguindo pela linha telefônica num fluxo pessoal e inconfundível. O Panorama em 2015: No final de 1997 o e-mail ainda não era o método padrão de comunicação que se tornaria com o tempo. O CC:mail foi uma forma mais primitiva de correio eletrônico baseada em linguagem DOS. Nessa curta amizade com Nancy estava a semente do que aconteceria no futuro próximo: o fenômeno das redes sociais. Ruídos, chiados e assobios em estéreo 1998 Final de campeonato. Seu time está em campo. No carro, você acompanha o jogo pela sua emissora AM favorita com o coração aos saltos. O locutor se esgoela. “...a bola é dividida no meio de campo, o atacante encontra a defesa adversaria desguarnecida e vai sair o gol! Não pode bobear! Olha aí o sensacional ataque do ffffsffsfxxxzzzzzzzz...” Você fica sem saber de quem foi o ataque, já que um ônibus parou ao lado do seu carro, e a AM sumiu do ar. Longos segundos de suspense. O ônibus se afasta e a voz do locutor retorna: "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" “...goooooooooooooollllllll... Mas que golaço! Gol que define o campeonato! Beleza pura! Assim é que eu gosto! Tudo começou numa confusão no meio do campo, que gerou um contra-ataque fulminante culminando nessa pintura de gol do time do xxxxxxxxxxxxxxffxfzzz...” Você acaba de entrar num túnel. Numa época em que a TV apresenta uma grande inovação tecnológica por semana, o rádio parece ter puxado o freio de mão lá atrás. É basicamente o mesmo há décadas. Ouvir rádio AM numa cidade como São Paulo está — perdão, leitores — um saco. Você é obrigado a passear com o radinho dentro da sua própria casa, procurando uma recepção aceitável. Vira o receptor de um lado para o outro, encosta na janela. E tudo o que sai dele são ruídos, chiados e assobios. Algumas FMs ainda pegam bem. Mas a maioria delas é apenas outra coleção de ruídos, chiados e assobios. Só que em estéreo. O rádio morreu, então? Não. Mas depender das velhas AM/FM tem cada vez menos sentido. Usando uma tecnologia chamada RealAudio, emissoras de rádio estão mudando sua história e transmitindo seus sinais pela internet. Uma das maiores mudanças está acontecendo em termos geográficos. Emissoras FM transmitem basicamente para as cidades de origem. Emissoras AM alcançam regiões de 200 a 300 quilômetros, com qualidade precária de som. "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Na internet não existem distâncias. Você pode estar em Cuiabá ouvindo uma FM alternativa italiana como se morasse em Milão. Já o brasileiro em viagem por Marrocos ou pelo Pacífico Sul pode captar a AM de Recife ou Porto Alegre. Estabelece-se uma espécie de teoria da relatividade geográfica. Você está aqui como se estivesse lá, e lá como se estivesse aqui. PS — Quanto ao campeão do jogo, não poderia ser outro senão o glorioso ffffzzzszxxxxxxxz... O Panorama em 2015: Dezoito anos depois desse texto, NADA mudou no rádio brasileiro. Uma possibilidade de grande avanço de qualidade poderia vir com a digitalização. Foi criada uma comissão para estabelecer o padrão digital do rádio brasileiro, o que já seria um enorme avanço. A comissão discutiu, testou 3 sistemas (americano, europeu e japonês), foi desfeita. E não se tocou mais no assunto. Permanecemos nos mesmíssimos chiados e assobios da AM e da FM. Para compensar essa imobilidade nacional, o rádio se estabeleceu de vez na internet. Meu receptor básico hoje é um aplicativo chamado TuneIn. Com ele, posso cozinhar meu almoço em São Paulo ouvindo a Jazz Radio 96.4 de Monte Carlo, Mônaco. Olhos para enxergar o mundo inteiro 1998 Em verdade vos digo: estes olhos que a terra há de comer (se "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" não me cremarem) veem coisas que outros mortais não veem. Esses olhos injetados de sangue hoje viajam pelo mundo sem que eu saia do lugar. E assim se faz. São 16h32 em Auckland, e um grande cargueiro está sendo rebocado em Davenport. Ao fundo, a grande torre de TV parece ter sido espetada na maior cidade da Nova Zelândia por civilizações intergalácticas. Mas agora são 19h35 e meus olhos pouco enxergam do Vale Sorrento de San Diego, Califórnia. Duas luzes vermelhas piscam no escuro das montanhas. E na quinta piscada meus olhos se ofuscam com o sol que acabou de nascer em Vaalimaa, Finlândia. À minha frente, uma frota de caminhões mistura seus faróis altos ao clarão do sol. Seus motoristas esperam a vistoria dos guardas da fronteira. Atrás dos caminhões está a Finlândia. À frente, a fronteira da Rússia. O primeiro caminhão acelera e avança para o território russo, mas meus olhos já não o veem. Pois se o sol está nascendo no mar Báltico, está se pondo no Havaí. E eu me delicio com as cores que se refletem nas ondas que quebram na areia de O’ahu. Gaivotas flutuam ao vento, e ao vento flutua meu olhar. Que agora descobre que o dia ainda não nasceu em Berna, na Suíça. As luzes permanecem acesas no Café BIT, mas a banca de jornais ainda não abriu as portas. Um casal agora está saindo do Café e ... o que esse homem está fazendo com a mulher?! "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Nunca pude saber, pois em seguida meus olhos observaram as nuvens que cobrem o Monte Fuji, no Japão. Enquanto o cume está obscurecido, o sol do Pacífico ilumina os veios de neve que correm pelo seu sopé. Agora o monte sagrado dos japoneses já não preenche o meu olhar. São 09h50 na base australiana de Dawson, e eu testemunho o verão no continente antártico. Guindastes, chaminés, embarcações e cinco homens encapotados encostados a um container suam ao “calor” de zero grau. Não é preciso ser nenhum místico iluminado para percorrer tantos lugares tão distantes quase ao mesmo tempo. Seus olhos precisam apenas de um computador conectado com a internet. Centenas, milhares de camerazinhas estão espalhadas pelo mundo, à nossa disposição. O que significa isso tudo? Uma espécie de Big Brother ao contrário. Crescemos na suposição de que um dia câmeras de TV iriam controlar cada aspecto de nossas vidas para um governo totalitário. Pelo contrário: de dentro de casa você observa o mundo. Existem câmeras em Kobe, Japão (para o caso de um novo terremoto), câmeras em restaurantes italianos, câmeras em estacionamentos no Vale do Silício. E um dia quem estiver na internet terá uma câmera no alto de seu monitor ou apontada para seu próprio quintal. E em verdade vos digo: nesse dia, meus olhos serão seus olhos e ninguém terá mais nada a esconder. E assim será. O Panorama em 2015: "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Nessa coluna eu lancei um conceito que repetiria e atualizaria nos anos seguintes: o do “big brother ao contrário”. Nunca mais deixaria de ficar espantado de poder observar o mundo sem sair a cadeira. A princípio de webcams fixas. A partir de 2012, de nossos celulares, com transmissão direta. A ideia de um estado totalitário dá cada vez mais lugar a uma sociedade capaz de se fiscalizar. Nos anos seguintes, graças às câmeras de segurança um número crescente de criminosos passou a ser flagrado e punido. Hoje parece absurdo que em 1998 que a frase “um dia quem estiver na internet terá uma câmera no alto de seu monitor” fosse apenas uma tentativa de profecia. “Penumbra quatro som praia surround sleep” 1998 Sete horas da manhã. Os malditos alto-falantes ao redor da minha cama tocam um heavy metal de rachar a parede. Já pedi ao RUAC que me desperte às quintas com música renascentista italiana. Não adiantou. Mas não posso negar que muita coisa melhorou em minha vida desde que instalei um RUAC standardno meu apartamento. Apesar da margem de erro se negar a baixar dos 8%. É muita coisa. Assim, quando você dá uma ordem do tipo “despertar 7 horas Renascença Itália”, pode ser surpreendido por um Iron Maiden. Dou a ordem “musica off monitores individuais todos”. "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" O monitor 1 mostra o tempo lá fora. O monitor 2 exibe o resumo da CNN. No monitor 3 ginastas sorridentes se exibem em minúsculos biquínis ao sol da Califórnia. O monitor 4 desfila todos os gols do dia anterior. O monitor 5 lista as opções de menu para o breakfast. No monitor 6 está a lista de músicas arquivadas para pronta audição. Os 3 Patetas se esmurram no monitor 7. O monitor 8 mostra as opções de voo para Vancouver no próximo sábado. “Monitor 3 metade monitor 35 metade. Conectar Huang-Chu 300 segundos.” O cronômetro começa a piscar seus grandes números em contagem regressiva (299... 298...) Eu pulo da cama para dar uma lavada no rosto e algum trabalho ao sistema de reciclagem de dejetos. Ordeno “chuveiro 32 graus” mas o primeiro jato insiste em vir gelado. “Saco!” É apenas um desabafo, mas o RUAC entende como “Taco” e logo tenho um kit básico de comida mexicana fumegando numa bandeja flutuante. Quando eu digo “tira”, o RUAC começa a projetar um velho policial com Kirk Douglas no monitor 25. Finalmente um dos trasponders é liberado e via satélite entro em contato direto com Huang-Chu no canal B76. Eu só acordei às 7 da manhã porque em Hong Kong são 18 horas e precisamos conversar um pouco sobre os passos a serem tomados no dia seguinte. “Conexão tela inteira”. As garotas da Califórnia desaparecem. "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Meu sócio chinês ocupa o monitor tomando um chá. Trocamos algumas rápidas piadinhas introdutórias, e em seguida Huang me resume a situação no mercado asiático no final daquele dia. RUAC significa Remote Universal Audio Command, ou Comando Remoto Universal por Áudio. Você pode dar ordens faladas, e o computador central da casa realizará boa parte de suas tarefas cotidianas. Significa também que você pode trabalhar se comunicando com o resto do mundo sem sair da cama. Acerto detalhes da agenda do dia com meu associado chinês. Logo ele estará se preparando para dormir e eu, me levantando. Nos despedimos. Fico pensando se assisto a um noticiário, se faço um pouco de virtual trekking na esteira. Perdido em tantas dúvidas, volto a sentir aquele arrepio. Tento pensar no sentido da minha vida. Para pensar melhor, ordeno “penumbra quatro som praia volume 2 surround total sleep 30 minutos”. Logo o RUAC me bota para dormir novamente. O Panorama em 2015: A primeira das colunas no estilo ficção científica. O RUAC é um computador inspirado no gênio da lâmpada de Aladim. A realidade descrita na coluna tem um lado fascinante: a aceleração de nossos sentidos, a facilidade de realização de tarefas, o fim de certas rotinas inúteis. Por outro lado, a coluna traz uma realidade melancólica, fechada na individualidade e no artificialismo. Nesse suposto futuro é possível viver isolado "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" trancado num apartamento sem ver a luz do sol por tempo indefinido. O computador fornece tudo, até estímulo ao sexo. Conversar ao vivo com um sócio em Hong Kong se tornaria algo corriqueiro a partir de 2003 com o Skype. Em 2015 já temos uma espécie de projeto de “RUAC” em cada celular com serviços por voz. A guerra dos browsers 1998 Sabe como é: o computador do cunhado é sempre melhor que o nosso. E lá estava eu naquele domingão tentando disfarçar minha inveja com o super computador do meu cunhado Claudio, observando resignado seu novo e poderoso hardware. Foi quando observei um ícone diferente no desktop. Era um novo browser. Gentilmente, meu cunhado me passou o novo programa num único disquete embalado em elogios. Fiquei, é claro, desconfiado — o quão bom pode ser um navegador de 1.377 kB? Botei no diretório Temp, dei dois cliques. No dia seguinte a novidade já era meu browser-padrão. O nome do browser: NeoPlanet. Instala fácil. Importa os bookmarks do Microsoft da Microsoft. Em matéria de navegação, é uma lancha veloz e de fácil manobra. Consegue unir três características úteis: simplicidade, eficiência e beleza. Tem design leve, claro e agradável. Azulzinho, futurista, "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" amigável. Prático. O NeoPlanet adotou o sistema de canais como base de sua navegação em qualquer tipo de site. Ele oferece uma série de 25 canais pré-programados, de News a Games, de Kids a Fashion, cada um deles com dezenas de opções. Só com eles, já se pode viajar, e muito. Mas é facílimo criar e editar novos canais e destinações. Para que, por exemplo, no canal News você tenha uma seção de publicações brasileiras, basta arrastar alguns ícones. Não estou fazendo propaganda do NeoPlanet. Estou fazendo propaganda do livre mercado. Para cada mil devotos do ódio que passam seus dias amaldiçoando Bill Gates existe um punhado de caras determinado a criar produtos melhores que os da Microsoft. É o caso dos que criaram este NeoPlanet, um browser muito mais avançado e satisfatório que os criados pelos gigantes da Microsoft e da Netscape. O NeoPlanet foi criado pela Bigfoot International, de New York, uma empresa especializada em programas de comunicação em rede. O browser ainda é pouquíssimo conhecido. Mas tem potencial para incomodar ambos os líderes. Chega por fora, come pelas beiradas. Embalados pelo NeoPlanet, novos browsers devem estar sendo criados neste momento, um melhor que o outro. O Panorama em 2015: Incrível o NeoPlanet caber num disquetinho de 1,4 Mb – o padrão de mobilidade da época. E a conexão de 28.8 kbpm? Dá "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" para ter uma ideia? Logo depois de escrever essa coluna, o promissor NeoPlanet sumiu. Surgiram outras alternativas como o Opera e o Safari. O MS Explorer nunca mais se acertou. O Firefox provocou impacto, mas se perdeu ao oferecer serviços demais. Em 2015 o mercado está dominado pelo Google Chrome, que é simples e muito prático. Afinal, o browser deve ser apenas uma mídia e não a atração principal. Um carrinho cheio de areia do tempo 1998 É perto do meio-dia e o sol bate forte sobre a praia do Gonzaga, em Santos. O chapeuzinho de palha não consegue proteger os olhos franzidos do menino sentado na esteira. Por trás do garotinho estão os braços todo-poderosos de seu pai, já calvo antes dos 30. A bela e jovem mãe faz uma careta pedindo pressa ao fotógrafo. O garotinho de 3 anos sou eu. A imagem foi registrada em 1956 ou 1957. Talvez tenha sido minha primeira incursão a uma praia. O lugar está vazio, só tem um vendedor de raspadinha de groselha ao fundo. A areia do Gonzaga está suja: bitucas de cigarro, embalagens de Ki-Bamba, garrafas vazias de Cerejinha. Aos meus pés, um carrinho de mão volta à minha memória como se nunca tivesse saído. Meu Rosebud. Meu tesouro afetivo. Até outro dia tudo isso era apenas uma fotinho preto-e-branco "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" amassada e descorada por quatro décadas de desgaste. Passei a imagem pelo scanner e por um equalizador gráfico. O resultado agora ocupa minha tela de 17 polegadas com todos em seus preciosos detalhes. Tratar fotos agora está ao alcance até de um leigo como eu. Basta um scanner de 150 dólares e meia dúzia de cliques no mouse. Recuperei cenas da infância de meus avós e do crescimento do meu filho. Ao transformar velhas fotos em sinais binários, elas podem ser copiadas com fidelidade, processadas, recicladas, modificadas e otimizadas. Lembro-me então do ditador soviético Joseph Stalin. O bigodão tinha dois métodos para eliminar inimigos. Para acabar fisicamentecom eles, bastava um tiro na nuca ou umas férias forçadas na Sibéria. Para expulsar seus dissidentes da História, os funcionários do Kremlin realizavam grosseiros retoques a pincel nas fotos em que apareciam. O que faria o velho Stalin com um CorelDraw ou um Photoshop nos dias de hoje? Poderia não só apagar um inimigo de uma foto, como também incluir um novo amigo numa foto do passado. O que seria de sua polícia secreta equipada com redes de computadores? Como seriam seus espiões munidos com laptops e câmeras digitais? O que me leva a pensar que hoje, fim do século 20, computadores são inimigos de ditaduras. Não é coincidência o fato de que as últimas tiranias da face da terra sejam nulidades tecnológicas. Nem é por acaso que a internet seja considerada "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" uma das principais razões para que o regime tirânico do Irã hoje trema nas bases. Naquele dia de sol em Santos, eu nem imaginava quem era Stalin, que tinha morrido dois dias antes do meu nascimento. Apenas tentava me defender do sol e localizar a voz que dizia “olha o passarinho!”. Minha cara enrugada foi captada por uma lente e provocou reações químicas numa película. Que um dia sofreu um banho de ácidos e se transformou numa imagem desbotada num papel. Hoje meu pai já partiu para um upgrade espiritual. Minha mãe, por mais que tente, não entende como aquela foto amassada ficou tão nítida no computador. Graças à era digital aquele momento na praia de Santos virou um porto seguro da minha memória. Posso até sentir o cheiro da maresia e a textura áspera do carrinho cheio de areia úmida a meus pés. O Panorama em 2015: Uma das colunas mais sentimentais. Até hoje fico espantado com o descaso provocado pelo poder dos scanners. Talvez seja meu instinto de historiador falando alto. Mas dou cada vez mais valor a essas máquinas de recuperação do passado. Que continuam baratas, acessíveis – e mal usadas. Melhoraram com o tempo, mas permaneceram tecnicamente limitadas. Eu não registraria nenhuma novidade de destaque nesse campo até o final de 2012. "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Slots para meu cérebro 1999 Não sei exatamente quantas horas passo por dia no computador. Só sei que se pudesse passaria mais. Como projeção de nosso universo mental, essa máquina é um prato cheio para confusão entre realidade e fantasia, entre mundo virtual e real etc. Os psicanalistas não estão preparados para isso. O fato é que estou lesado o suficiente para ter algumas ideias esquisitas. Gostaria de aproveitar certos recursos do meu computador na minha vida real. Se ele pode, por que eu não? Cinco exemplos: 1. Desfragmentador de estante Cada vez que vejo o Windows colocar meus arquivos em ordem, rapidinho, aqueles tijolinhos se encaixando à perfeição, eu olho com inveja para minhas estantes. Fitas cassete sem caixa. Controles remotos. Velhas fotos. Contas a pagar. Contas jamais pagas. Folhetos de pizzarias. O copo de vinho e sua mancha. O print do e-mail do Leonel. Eu preciso de um desfragmentador de estantes. Alguém ou algo que dê ordem ao caos em alguns minutos, informando passo a passo o grau de desfragmentação. 86%... 83%... 77%... 2. Memória expansível Esqueci de pagar o plano de saúde da minha mãe (de novo!). Esqueci de arranjar mais um orçamento para o conserto do carro. Esqueci o nome do cara da companhia de seguros que me "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" pediu esses orçamentos. Esqueci de comprar a ração da Mary. Esqueci de marcar exame no fisioterapeuta. Esqueci de escrever a coluna da Info. Esqueci de tomar remédio para a memória. Preciso de slots em meu cérebro, placas de expansão física de memória ROM urgente. Eu preciso! Preciso do que, mesmo? 3. Auto-Attachment De: DAGOMIR Para: PAULA Assunto: Camiseta “Paulinha, tudo bem? Como estão as coisas por aí em Milão? Preciso comprar uma camiseta da seleção italiana para o meu filho. Reserve uma mesa na sua cantina favorita. Sigo atachado. Beijos, D.” 4. VirusScan E se a gente pudesse acordar com prompt automático antivírus? “Seu sistema está com um vírus de laringite pronto a entrar em ação. Proceder a eliminação de vírus? OK? Confirma eliminação de vírus? OK? Não se esqueça de atualizar a lista de vírus detectáveis no centro de saúde mais próximo.” 5. Disc Cleanup Com tanta coisa para me preocupar, por que não consigo me livrar desse refrão do último CD do James Brown?! “You got that funk on ah roll...” Um limpador de memória colocaria as coisas momentaneamente inúteis que grudam na cabeça num "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" diretório reaproveitável. O refrão do James Brown, um monólogo do Patolino, aquela morena esguia do boliche, as regras oficiais do futebol de botão... Tudo isso seria suspenso para que a nossa cabeça funcionasse exclusivamente no mundo das coisas práticas e urgentes. Quando a parte mais chata da vida desse um tempo, seria só recuperar os arquivos desejados. “You got that funk on ah roll”. O Panorama em 2015: 1-Desfragmentador de estante: ainda seria útil, mas com tantos serviços digitais online e on demand, minhas estantes estão cada vez mais vazias de CDs, DVDs, BluRays e livros de papel. 2-Memória expansível: eu quero! 3-Auto-attachment: também quero! 4-VirusScan: estamos nos aproximando disso no mundo real. 5-Disc CleanUp: cada vez mais necessário. 6 - Minha mãe Dirce faleceu. 7 - Nossa cachorrinha Mary também. 8 - Paula foi uma colega de redação na editora Abril. Pesadelo púrpura 1999 Eu estava sonhando quando escrevi isso, me desculpe se parece um plágio. Mas hoje quando acordei parecia o dia do Juízo Final. O céu estava todo púrpura e tinha gente correndo para todo lado tentando fugir da destruição. 23:59 do dia 31 de dezembro de 1999. Os champanhes, as uvas, as lentilhas, as crianças correndo, os fogos. Meia-noite. "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Blecaute nas maiores concentrações humanas do planeta. A luz não volta em meia hora. Nem em uma hora. Nem em um dia. Nem em um mês. Centrais telefônicas, idem. Aeroportos. Hospitais. Prisões. Emissoras de TV. Computadores das centrais elétricas acham que acabaram de entrar no ano de 1900. Você pensa em descer os 27 andares do seu prédio a pé, com a lanterna. Mas a quitanda da esquina jamais se abrirá aos clientes de novo. Nem precisa abrir: seus cheques viraram papel pintado. O bug feriu de morte o sistema financeiro. O peru vai se estragar em breve, assim como tudo o que é perecível, pois sem eletricidade a geladeira não funciona. Você tem alguns enlatados em casa que talvez durem uma semaninha. A água do filtro, as cervejas e os refrigerantes talvez resistam um pouco mais. Lá embaixo, os primeiros bandos de vândalos já atacam os infelizes apanhados na rua. Você ouve à distância as sirenes de viaturas que vagueiam pelas ruas escuras tentando assustar os marginais - que serão nossos futuros novos governantes. Não adianta discar para o 190. Não adianta escrever para os jornais denunciando que ninguém atendeu no 190. Os jornais não mais chegarão às bancas. Nada de bom acontece? O sistema do Pentágono funcionou à perfeição (ufa!). Mas o alívio dura pouco: os capengas computadores da defesa russa também acreditam que estamos no réveillon de 1900. E entram automaticamente em estado de alerta máximo, redefinindo seus alvos de forma aleatória ao "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" redor do mundo. Como o Artista-e-Quem-Sabe-Profeta-Antigamente-Conhecido- Como-Prince, eu estava sonhando quando escrevi isto, e me desculpe se peguei pesado demais... Torço para que nada de pior aconteça. Rezo por outra chance — que não merecemos. Dizem que a festa de 2000-zero-zero vai acabar — ups! — já acabou.Então eu vou festejar, pois conseguimos chegar a 1999. Se você não quer entrar na festa, nem se preocupe em bater na minha porta. A vida é uma festa, e festas não foram feitas para durar. O Panorama em 2015: O que seria da literatura apocalíptica se não fosse a paranoia? Pelo menos o bug do milênio tinha alguma base científica. Pior foi a crença do calendário interrompido dos maias. Essa coluna ficou parecendo um dos filmes (ruins) do diretor Roland Emmerich, tipo 2012. O primeiro parágrafo (e o último) são traduções livres da musica 1999, do Prince. Sem medo de ser nerd 1999 NERD: “Estudante superaplicado; pessoa dedicada obsessivamente a uma atividade não-social” (Random House Historical Dictionary of American Slang) "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" “Pessoa insípida, maçante, tediosa, estudioso, geralmente do sexo masculino” (NTC’s Dictionary of American Slang). Se existe uma característica que eu não admito em seres humanos é o preconceito. De nenhum tipo. Eu não rio de piada de preto, de judeu, de árabe, de branco. Piada de loira, pra mim, se enquadra na lei antirracismo. Por isso me incomoda ouvir por aí frases do tipo “leitor da Info é tudo nerd”. Sugere que os leitores dessa revista são todos branquelos, usam lentes fundo de garrafa, vestem camisa de mangas curtas abotoadas no colarinho, espetam uma dúzia de canetas no bolso, são garotões chatos, entediantes, bobos e não ganham mulheres. As quais, segundo esse mesmo preconceito, não lêem a Info. Nerds existem e aos montes, assim como há playboys, peruas, mauricinhos, bad boys, marombeiros e tantos outros agrupamentos humanos reunidos em expressões perigosamente simplistas. No meio dessas classificações, a palavra nerd não é das mais hostilizadas. Considerados inofensivos, os nerds são vistos por outras tribos com uma certa condescendência. São meio gênios, meio trouxas, e quando vão ao banheiro leem manuais de placas-mãe. Quase dois anos de coluna na Info me fizeram jogar esse preconceito onde ele merece ser jogado: no lixo. A fauna que lê essa revista é variada e rica. Claro que tem uma boa parcela de leitores mais atenta aos aspectos técnicos da computação — e isso não os transforma em nerds. Melhor ainda: e daí se forem "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" autênticos nerds? Qual o problema? E então me lembro de um fascinante homem chamado Timothy Leary, que trocou uma promissora carreira acadêmica pelo terreno desconhecido do LSD. Perguntaram a Leary se achava que durante os anos 90 o ácido lisérgico ainda deveria ser distribuído a quem quisesse explorar novos territórios da própria consciência. O psicólogo respondeu que não era mais preciso, pois o LSD já tinha um substituto: o computador. O Panorama em 2015: Nerds foram promovidos a cargos mais dignos na cultura pop. Símbolo disso é o enorme sucesso da série de TV The Big Bang Theory. Outro aspecto que evoluiu foi o florescimento cada vez maior de mulheres “nerds”, orgulhosas da própria nerdice. Em 2014 os nerds foram os heróis de uma novela das sete na rede Globo, G3r4ção Br4s1l. O laptop de Sigmund Freud 1999 Não consigo convencer minha terapeuta de que existe uma conspiração real contra minha pessoa. Conspiração tão vasta que envolve a própria terapeuta - sem que ela saiba. Mas já consegui provar para ela que quem não tem um computador ligado à internet virou uma ilha. Ela resistiu um tempo, mas depois descobriu que não há "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" paciente ou colega que já não esteja navegando. Exemplos não faltam. Uma de suas pacientes, figura inteligente e bonita, cheia de vida, arranjou um pretendente num chat. E agora ele quer encontrar a mocinha ao vivo. Ela adoraria, mas há um detalhe nessa love story: a mocinha declarou ao interessado que está “um pouco acima do peso”. Na verdade, passou dos 120 quilos. E agora? Ninguém previu uma situação dessas. Hoje em dia boa parte de nossa psique vagueia nessa teia sem fim do cyberspace. O mundo mudou, nós mudamos, e nossos terapeutas precisam se preparar para esse novo mundo. Afinal, computadores e psicoterapias parecem ter sido feitos um para o outro. A revista Veja publicou uma reportagem sobre os “psicólogos online”. Como sempre, os corporativistas e conservadores reagiram com uma mistura conhecida: medo e inveja. Se agarram aos dogmas de Sigmund Freud e falam em nome dele. Freud não pode se defender, pois não tinha um laptop no consultório. E sua Viena dos anos 1920 ainda não estava ligada à internet. Como supor de que forma ele reagiria a algo que não conheceu? Na história dos computadores existiu inclusive uma terapeuta virtual chamada “Eliza”. Isso ainda no final dos anos 60! Na verdade tratava-se de um “simulador de psicólogo”, um programa desenvolvido no Massachusetts Institute of Technology pelo professor Joseph Weizenbaum. Eliza basicamente pedia ao paciente que falasse o que viesse à cabeça. E devolvia algumas palavras para o “humano” refletir. "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Aparentemente, seguia as regras de livre associação do freudianismo ortodoxo. Se o usuário digitasse a palavra “pai”, Eliza devolveria uma “fale-me mais sobre seu pai”. Foi considerado um programa que comprovava na prática o quanto é fácil uma máquina fingir que é inteligente. Dos tempos de Eliza, em 1966, para cá, tudo mudou. Especialmente pela presença da internet. Novos caminhos podem ser tentados com mais imaginação e menos preconceito. Qualquer profissional de qualquer área deveria encarar o computador como um instrumento, e não como um possível rival. Quanto antes se tocar disso, melhor para todos nós. Quanto à conspiração (na qual minha terapeuta ainda não acredita), tudo o que posso dizer por enquanto, é que envolve o serviço secreto do Vaticano, a alta direção da empresa Nike, enviados do planeta Ion, membros do governo mineiro e, é claro, Bill Gates. O Panorama em 2015: Ninguém que eu saiba tentou levar a sério uma sessão de terapia tipo chat, com câmera. Por que não tentar? Vejo por exemplo que o CVV – que já salvou tanta gente do suicídio – atende por chat em horários limitados. Mas a resistência às novidades tecnológicas nesses territórios acadêmicos costuma ser mais forte que o normal. Viva a reserva de mercado! "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" 1999 Todos nós que usamos e gostamos de computadores temos muito a agradecer aos governantes deste país. Em 1984 eles fecharam o Brasil numa reserva de mercado de informática. Muitos se opuseram a essa medida na época, mas depois acabaram reconhecendo: foi a decisão certa! A lei de reserva de informática possibilitou a implantação de empresas genuinamente brasileiras logo no nascedouro de uma indústria que não para de crescer no mundo. O fato de o Brasil possuir hoje domínio global na área de computação se deve a uma política inteligente e ousada, baseada antes de tudo no nacionalismo. Os países que optaram por mercados livres — como os Estados Unidos e outros na Europa e Ásia — saíram perdendo. Só o Brasil triunfou, graças à Lei de Reserva do Mercado. Sem falsos patriotismos, podemos dizer que o planeta segue os protocolos e inventos saídos de nossas universidades e institutos avançados de pesquisa. Estamos sempre à frente — e o mundo morre de inveja disso. Palavras de um executivo japonês: “Vocês têm as mais belas mulheres, inventaram a caipirinha e o samba, e ainda dominam o mercado mundial de computadores. O que mais vocês querem?!” Todos os grandes avanços da informática começaram em território brasileiro. Os computadores, aliás, eram máquinas complicadas de operar até que o goiano Guilherme Portaes criou o S.O.B. (Sistema Operacional Brasileiro). Anos depois, o sistema evoluiu para o Janelas,mais gráfico e amigável com o "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" usuário. Uma série de novos conceitos vieram com o sistema Janelas. O preá, por exemplo. Até então todos os comandos eram digitados. O preá facilitou as coisas com o conceito de “rolar até a flecha atingir o alvo na tela e então pressionar o botão esquerdo”. As acusações de que Guilherme Portaes esteja monopolizando a indústria mundial de discos-flexíveis-contendo-programação- de-computador foram consideradas injustas na sede da empresa em Fortaleza (CE). “Não somos monopolistas”, declarou Portaes à rede noticiosa NTC. “Somos apenas os melhores”. Acredita-se que as vendas do sistema operacional Janelas 2000 deverão bater todos os recordes anteriores. Portaes aproveitou para anunciar seu novo computador-portátil- para-ser-apoiado-no-colo, o Tabajara-6000, e um novo modelo de computador-para-o-tampo-da-mesa, o Apinagés-500. Que a rival Jabuticaba afirma ser uma reles cópia de seu modelo Macaxeira, mais conhecido no exterior como Mac. A empresa comandada pelo senhor Portaes (a Minúsculamacia) já está anunciando para o próximo mês a mais nova versão do paginador de RedeInterrelacionada, ou RedeInter. A versão 8,1 do paginador “Explorador da RedeInter” conta com as facilidades da linguagem gráfica Pororoca e recursos de programação Catiripapo. A Minúsculamacia está ainda com planos de lançar uma nova série de jogos-eletrônicos-para-computadores-pessoais durante "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" a próxima Festa do Divino, em Petrolina. Entre os jogos, um simulador de carro de boi e a nova versão eletrônica do Banco Estatal Imobiliário. O Panorama em 2015: Um exercício em realidade alternativa. Tudo o que eu fiz foi imaginar que a estupidez histórica conhecida como Reserva de Mercado de Informática tivesse dado certo. Os nomes dos produtos e empresas são obviamente traduções toscas dos originais. Microsoft, por exemplo, virou Minusculamacia, Bill Gates se transformou em Guilherme Portaes e assim por diante. Escrevi isso como uma visão irônica de uma forma de pensar que achei que estivesse a caminho da insignificância. Por ironia, em 2015 a mentalidade estatista e nacionalizante que criou a política da Reserva de Mercado de Informática continua praticamente a única forma de pensamento permitida. Eu gostaria de ver o Brasil na vanguarda da tecnologia e inovação, sendo exemplo para o mundo. Capacidade para isso existe. É uma tarefa para as novas gerações, desde que rompam com essa prisão com o passado. Procura-se um extraterrestre 1999 Ninguém — nem o mais genial dos escritores de ficção científica, nem o mais lúcido dos profetas — poderia imaginar que um dia um cara normal como eu estaria procurando ETs "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" dentro de casa. Você já deve ter ouvido falar no SETI (sigla de Search for Extra Terrestrial Intelligence). Ou Procura por Inteligência Extraterrestre, que usa como base de funcionamento um programa chamado Boinc. O universo está cheio de sinais de rádio, ecos de explosões cósmicas, ruídos perdidos no tempo, tudo caótico e enigmático. Cabe ao SETI descobrir alguma lógica nessa barulheira. Essa lógica seria o sinal de inteligência e ordem no meio do caos. Quem assistiu ao filme Contato sabe como é. Jodie Foster passa semanas, meses, anos em observatórios astronômicos analisando esses ecos do infinito. Até que um dia ela descobre um sinal claramente inteligente e muda a História. Fora da ficção, o SETI enfrenta um problema grave. Seus computadores mal conseguem dar conta do monstruoso volume de informação que registra. Ou seja: a mensagem dos ETs pode já ter sido captada pelas gigantescas antenas parabólicas a serviço do SETI, mas ainda não foi analisada e compreendida. Pressionado pelo permanente aperto de verbas, o SETI encontrou uma saída: contar com uma mãozinha dos leigos. Se você também quer procurar ETs em casa (ou no escritório), inscreva-se no programa. Basta fazer um download de um programa com pouco mais de 700 KB. Este programa entra em contato com a sede do SETI e baixa no seu computador um único segundo de registros de ondas de rádio captados pelo observatório de Arecibo, em Porto Rico (o mesmo do filme "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" Contato). O meu primeiro segundo foi o registrado em 07:05:47 UTC do dia 8 de janeiro de 1999. Os sinais captados nesse único segundo, um volume de informação equivalente a 300 KB, chegaram no meu computador e o programa passou a analisar cada pequena fatia desses sons. Não ouvi nada. Os sinais sonoros são transmitidos em forma de gráficos, que servem como screen saver para seu monitor. Ninguém precisa interferir. É a sua CPU que fica analisando esses dados nos momentos de inatividade. Vários dados técnicos são projetados, na maioria indecifráveis (“Frequency Resolution: 0.288023, Dopples Drift Rate: -9,9968”). Os gráficos são hipnotizantes em sua repetição. A análise do primeiro bloco levou quase 50 horas. As conclusões foram remetidas de volta ao SETI pela internet. Eu recebi o segundo bloco de sinais (registrados no mesmo dia, às 06:43:04 UTC). Se num desses blocos de dados analisados houver algum sinal de inteligência extraterrestre, serei avisado por e-mail. Procurar ETs em casa é tarefa para trouxas? Então há muitos de nós espalhados pelo mundo. Em apenas uma semana de atividade, meio milhão de computadores estava conectado ao SETI, analisando dados que de outra forma não conseguiriam ser processados. Quem sabe amanhã super-redes de computadores voluntários possam ajudar a descobrir a cura para a Aids ou a sobrevivência de espécimes em extinção? "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" O Panorama em 2015: O SETI passou por várias crises de continuidade. Mas ainda funciona no mesmo endereço. Nunca captou qualquer sinal de vida extraterrestre, que eu saiba. A esperança da frase final se concretizou. O programa desenvolvido para o projeto SETI (chamado BOINC) hoje usa o mesmo princípio de computação coletiva para outras finalidades que exigem análise em rede. Como a monitoração do clima, a coordenação de redes humanitárias, previsão de terremotos, cura da malária, etc. Alguns cliques para mudar o mundo 1999 Outro dia li no UOL um manifesto assinado pela cantora Rita Lee pedindo o fim dos rodeios. Imediatamente mandei meu apoio, porque sou contra qualquer tipo de espetáculo humano que implique em sofrimento para qualquer animal. Não tenho nada contra as pessoas que gostam de se reunir em festas country. Mas esse business não deveria depender do uso de animais. Para bancar o animal bravio, touros mansos têm suas virilhas apertadas por cordas e seus testículos comprimidos. Conclusão: eles pulam daquele jeito por causa da dor. Rodeios podem substituir animais de verdade por touros mecânicos. Assim como circos definitivamente podem dispensar tigres, ursos e chimpanzés para continuarem "******ebook converter DEMO - www.ebook-converter.com*******" populares. O mais famoso circo do mundo, o Cirque du Soleil, sempre trabalhou sem animais. Como Rita Lee, abomino touradas e farras do boi, animais em circo, rinhas de galo, luta entre pitbulls. Talvez por isso fui o segundo leitor a entrar no fórum contra o rodeio, que não parou de crescer. Apenas uma minoria foi contra o manifesto. O resto (uns 90%) apoiou, de um jeito ou de outro. Alguns até radicalizaram (tipo “os touros deviam montar nos peões”), mas a grande maioria queria apenas fazer alguma coisa para evitar o sofrimento dos animais. Como Rita, vim ao mundo entre outras coisas para defender o direito dos (outros) animais. No fim dos anos 80 ganhei uma coluna ecológica no jornal O Estado de São Paulo. Escrevi sobre a caça das baleias no litoral
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