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INTRODUÇÃO O estudo das proteínas tem importância fundamental na área da nutrição, uma vez que constitui um nutriente rele- vante para a síntese de proteínas funcionais e estruturais no organismo. As proteínas corporais estão constante e si- multaneamente sendo sintetizadas e degradadas, processo este denominado turnover protéico. O constante r turnover de proteínas fornece o pool de aminoácidos plasmáticos l que estão em constante equilíbrio com o mecanismo de síntese protéica. Além disso, os aminoácidos — que são os constituintes das proteínas — podem, isoladamente, atuar como precursores de ácidos nucléicos, hormônios e outras moléculas de importância fisiológica. No entanto, é necessário salientar que a função principal dos aminoácidos diz respeito ao mecanismo de síntese protéica. Os aminoácidos liberados em excesso oriundos da proteólise tecidual intensa são reutilizados e têm nume- rosos destinos. Além da síntese protéica já citada, que é a prioridade do organismo, a cadeia carbônica pode ser utilizada como fonte de energia ou convertida em glicose (gliconeogênese). Por outro lado, o grupo amino, que é tóxico para o organismo, é convertido em uréia no fígado e, posteriormente, eliminado na urina. No organismo não existe reserva de aminoácidos livres ou de proteínas, sendo que uma ingestão protéica superior às necessidades do organismo será metabolizada. Por outro lado, na deficiência protéica, em casos extremos de desnutrição protéica ou em estados catabólicos, o or- ganismo recorre a mecanismos adaptativos, os quais são regulados pela presença de nutrientes ou de hormônios — tanto anabólicos quanto catabólicos —, com a finalidade de preservar a massa protéica. Quando esse processo é muito intenso, ocorrem alterações bioquímicas, fisiológicas e morfológicas, especialmente nos grupos populacionais denominados vulneráveis, como crianças pré-escolares, gestantes, nutrizes e idosos. As recomendações de ingestão diária de proteínas indicam uma quantidade específica para a manutenção da saúde em indivíduos normais. Contudo, uma condição funda- mental para se garantir as necessidades de proteína de um organismo é que estejam satisfeitas as suas necessidades energéticas, uma vez que a deficiência calórica faz com que o organismo desvie as proteínas de suas funções plásticas ou reparadoras normais para a produção de energia. A necessidade de ingestão de proteínas e de aminoá- cidos depende das condições fisiológicas dos indivíduos. Por exemplo, em relação ao exercício físico, há maior necessidade de ingestão protéica na dieta, que é influen- ciada por alguns fatores, dentre os quais destacam-se a intensidade, a duração e o tipo de exercício; o conteúdo de glicogênio; o balanço energético; o gênero; a idade; e o tempo de treinamento. Neste capítulo serão abordados aspectos básicos e fun- damentais sobre o metabolismo protéico e de aminoácidos e seus respectivos mecanismos de controle. Também são enfocados aspectos metabólicos em situações fisiológicas especiais, tais como jejum, estados catabólicos, desnutri- ção protéica e exercício de força. Todos esses aspectos são discutidos com a finalidade de contribuir com infor- mações atualizadas do papel relevante de proteínas e de aminoácidos no organismo, visando, desse modo, propiciar uma melhor compreensão da atuação desses nutrientes no estado nutricional do indivíduo. C A P ÍT U L O Metabolismo de Proteínas 6 Julio Tirapegui • Marcelo Macedo Rogero DeAngelis06.indd 69DeAngelis06.indd 69 18/5/2007 10:13:2318/5/2007 10:13:23 70 Fisiologia da Nutrição Humana. Aspectos Básicos, Aplicados e Funcionais AMINOÁCIDOS O primeiro aminoácido a ser descoberto foi a asparagina, em 1806, e o último aminoácido foi a treonina, em 1938. Os aminoácidos apresentam nomes triviais ou comuns, em alguns casos derivados da fonte a partir da qual foram ini- cialmente isolados. A asparagina foi primeiramente isolada do aspargo; o glutamato do glúten de trigo; a tirosina do queijo (do grego tyros, que significa queijo); e a glicina, do grego glycos, que significa doce, devido ao seu sabor adocicado1. Aminoácidos são formados por carbono, hidrogênio, oxigênio, nitrogênio e, ocasionalmente, por enxofre; são as unidades estruturais básicas de todas as proteínas. Os aminoácidos que são incorporados nas proteínas de mamí- feros são α-aminoácidos, com exceção da prolina, que é um α-iminoácido. Um α-aminoácido consiste de um grupo amino, um grupo carboxila, um átomo de hidrogênio e um grupo R (cadeia lateral), sendo que todos estão ligados a um átomo de carbono, denominado carbono α. Embora existam muitos aminoácidos na natureza (> 300), apenas 20 estão presentes na composição das proteínas, sendo que cada aminoácido apresenta uma cadeia lateral diferente ligada ao átomo do carbono α. Os mesmos 20 L-α-aminoá- cidos ocorrem várias vezes nas proteínas, incluindo aquelas produzidas em bactérias, plantas e animais, sendo que para cada um desses aminoácidos existe ao menos um códon no código genético. Apesar da escolha desses 20 amino- ácidos ter ocorrido provavelmente ao acaso no curso da evolução, a versatilidade química que os mesmos fornecem é vital. Por exemplo, cinco dos 20 aminoácidos possuem cadeias laterais que podem apresentar uma determinada carga, enquanto os demais não são carregados, porém são reativos de uma maneira específica. Cabe ressaltar que as propriedades das cadeias laterais dos aminoácidos, quando agregadas, determinam as propriedades das proteínas constituídas por esses aminoácidos, e são a base de todas as funções diversas e complexas das proteínas1,2. Aminoácidos em soluções com pH neutro são predo- minantemente íons dipolares; apenas ocasionalmente são moléculas não ionizadas. Na forma dipolar de um aminoácido, o grupo amino está protonado (–NH3+) e o grupo carboxila está dissociado (–COO–). O estado de ionização de um aminoácido varia com o pH. Em solução ácida (por exemplo, pH = 1), o grupo carboxila está não ionizado (–COOH) e o grupo amino está ionizado (–NH3+). Em soluções alcalinas (por exemplo, pH = 11), o grupo carboxila está ionizado (–COO–) e o grupo amino está não ionizado (–NH2) (Fig. 6.1). Em proteínas, quase todos estes grupos carboxila e amino combinam-se por ligação peptí- dica e não estão disponíveis para reação química (exceto para a formação de pontes de hidrogênio). Desse modo, é a natureza das cadeias laterais que fundamentalmente determina o papel que um aminoácido desempenha em uma proteína3,4,5. Para representar seqüências de aminoácidos em proteí- nas, abreviações de uma e de três letras para aminoácidos têm sido estabelecidas. Cabe ressaltar que as abreviações de três letras do ácido aspártico (Asp) e do ácido glutâmico (Glu) não devem ser confundidas com aquelas referentes aos aminoácidos asparagina (Asn) e glutamina (Gln), respec- tivamente. A determinação experimental de aminoácidos presentes em uma proteína por procedimentos químicos não consegue facilmente diferenciar entre Asn e Asp, ou entre Gln e Glu, devido aos grupos amida presentes na Asn e na Gln serem hidrolisados e gerarem Asp e Glu, respecti- vamente. Os símbolos Asx para Asp ou Asn, e Glx para Glu ou Gln indicam esta ambigüidade. Um similar esquema é utilizado com abreviações com uma letra para Asp ou Asn, e Glu ou Gln (Tabela 6.1)4. FIG. 6.1 Estados de ionização de um aminoácido de acordo com o pH. NH3+ C COOHH R Forma predominante em pH = 1 NH3+ C COO–H R Forma predominante em pH = 7 NH2 C COO–H R Forma predominante em pH = 11 H+ H+ DeAngelis06.indd 70DeAngelis06.indd 70 18/5/2007 10:13:2418/5/2007 10:13:24 Metabolismo de Proteínas 71 Os aminoácidos cisteína, tirosina e prolina são sinteti- zados no organismo a partir dos aminoácidos metionina,fenilalanina e glutamato, respectivamente. O aminoácido arginina é designado como dispensável em humanos. Evidências sugerem que este aminoácido é sintetizado no organismo a partir do aminoácido glutamato. O grupo carboxila terminal do glutamato é inicialmente fosforilado e, em uma etapa subseqüente, é reduzido, o que gera glu- tamato γ-semialdeído e fosfato. Esta etapa é seguida por uma reação de transaminação, acarretando a formação de ornitina, que é convertida para arginina por meio das enzimas do ciclo da uréia1,3,6. A enzima glutamina sintetase catalisa a síntese dependen- te de ATP do aminoácido glutamina, a partir do glutamato e da amônia. Nessa reação, o ATP é convertido em ADP mais fosfato inorgânico (Pi). A enzima asparagina sintetase catali- sa a síntese dependente de ATP do aminoácido asparagina a partir do aspartato, utilizando a glutamina como fonte de grupo amino. Sendo assim, ao doar o grupo amino, a glu- tamina é convertida para glutamato. Nessa reação, o ATP é convertido em AMP mais pirofosfato inorgânico (PPi)8-10. Aminoácidos: Funções e Classificação Nutricional Além de participarem na síntese protéica e no metabolis- mo energético, quase todos os aminoácidos apresentam fun- ções específicas no organismo. O triptofano, por exemplo, é um precursor da vitamina niacina e do neurotransmissor serotonina; a metionina é o principal doador de grupos metílicos para a síntese de determinados compostos, tais como colina e carnitina. A metionina é também um precursor de cisteína e de outros compostos que contêm enxofre. A fenilalanina é precursora da tirosina, a qual é responsável pela formação de tiroxina e epinefrina. Arginina e citrulina estão envolvidas especificamente na síntese da uréia no fíga- do. A glicina, o mais simples dos aminoácidos, se combina com alguns tipos de compostos tóxicos, convertendo essas substâncias em compostos não tóxicos, que são excretados pela urina. É também usada na síntese do núcleo porfirínico da hemoglobina e constituinte de um dos ácidos biliares. A histidina é essencial para a síntese de histamina, composto que causa vasodilatação no sistema circulatório. Arginina, glicina e metionina se unem a um grupo fosfato para formar o fosfato de creatina, um importante reservatório de ligação fosfato de alta energia na célula. A glutamina é o aminoá- cido livre mais abundante no plasma e no tecido muscular, e é utilizada em altas taxas por células de divisão rápida, incluindo leucócitos e enterócitos, para fornecer energia e favorecer a biossíntese de nucleotídeos. Além disso, o ácido TABELA 6.1 Abreviações de Aminoácidos com Uma e Três Letras. Adaptado de DEVLIN 4 Abreviação Aminoácido Três letras Uma letra Alanina Ala A Arginina Arg R Asparagina Asn N Aspartato Asp D Asparagina ou Aspartato Asx B Cisteína Cys C Glicina Gly G Glutamina Gln Q Glutamato Glu E Glutamina ou Glutamato Glx Z Histidina His H Isoleucina Ile I Leucina Leu L Lisina Lys K Metionina Met M Fenilalanina Phe F Prolina Pro P Serina Ser S Treonina Thr T Triptofano Trp W Tirosina Tyr Y Valina Val V Biossíntese de Aminoácidos Dispensáveis Os aminoácidos dispensáveis podem ser sintetizados no organismo por vias que são compartilhadas, em parte, pelo catabolismo de aminoácidos. Glutamato, aspartato e alanina são sintetizados por meio de reações de transaminação. O aminoácido serina é sintetizado a partir de um intermediário da via glicolítica, o 3-fosfoglicerato, que é oxidado para 3-fosfoidroxipiruvato, por uma enzima que utiliza NAD. O 3-fosfoidroxipiruvato é então transaminado para gerar 3- fosfoserina que, por meio de uma fosfatase, é hidrolisado para produzir serina. A glicina é sintetizada a partir da serina pela ação da enzima serina hidroximetiltransferase3,6-8. DeAngelis06.indd 71DeAngelis06.indd 71 18/5/2007 10:13:2418/5/2007 10:13:24 72 Fisiologia da Nutrição Humana. Aspectos Básicos, Aplicados e Funcionais glutâmico é precursor do neurotransmissor denominado ácido gama-amino butírico (Fig. 6.2)6,11,12. Aminoácidos podem ser classificados nutricionalmente em dois grupos: indispensáveis (essenciais) e dispensáveis (não-essenciais). Os nove aminoácidos indispensáveis são aqueles cujos esqueletos de carbono não podem ser sintetizados pelo organismo, necessitando ser obti- dos pela dieta. Contudo, os diversos dados reportados recentemente sobre o metabolismo intermediário e as características nutricionais dos aminoácidos dispensáveis têm contribuído para uma discussão acerca da definição desses compostos13-17. Segundo Laidlaw e Kopple18, os aminoácidos dispensá- veis podem ser divididos em duas classes: verdadeiramente dispensáveis e condicionalmente indispensáveis (Tabela 6.2). Cinco aminoácidos (alanina, ácido aspártico, asparagina, ácido glutâmico e serina) são denominados dispensáveis, uma vez que esses podem ser sintetizados no organismo a partir de outros aminoácidos ou de outros metabólitos de complexos nitrogenados. Além disso, seis aminoácidos (arginina, cisteína, glutamina, glicina, prolina e tirosina) são considerados condicionalmente indispensáveis, uma vez que são sintetizados a partir de outros aminoácidos e/ou sua síntese é limitada sob condições fisiopatológicas especiais. FIG. 6.2 Formação de compostos fisiologicamente importantes derivados de aminoácidos. DeAngelis06.indd 72DeAngelis06.indd 72 18/5/2007 10:13:2518/5/2007 10:13:25 Metabolismo de Proteínas 73 Portanto, a designação aminoácido condicionalmente essen- cial caracteriza que em condições normais o organismo po- de sintetizar estes aminoácidos para alcançar a necessidade metabólica. De outra parte, em condições fisiológicas ou fisiopatológicas específicas ocorre a necessidade de inges- tão desses aminoácidos, necessidade esta que ainda não foi determinada com exatidão e que, presumivelmente, varie em grande extensão de acordo com a condição específica. Além disso, a designação condicionalmente indispensável indica, em princípio, que esses aminoácidos podem ser necessários na dieta, a menos que quantidades suficientes de seus precursores estejam disponíveis e/ou as atividades de enzimas envolvidas em vias metabólicas relevantes sejam suficientes para promover a síntese desses aminoácidos em uma taxa metabólica significativa19-23. peptídeo bradicinina é representado da seguinte maneira: Arg-Pro-Pro-Gly-Phe-Ser-Pro-Phe-Arg. A extremidade lateral direita da cadeia representa o terminal carboxila enquanto a extremidade esquerda representa o grupo amino terminal. A seqüência de aminoácidos de um determinado polipeptí- deo ou proteína pode apresentar variações, as quais são controladas geneticamente1,3,24. PROTEÍNAS No ser humano, as informações genéticas estão contidas na estrutura do DNA, que determina o tipo e a quantidade de proteínas sintetizadas em cada célula do organismo. Por sua vez, as proteínas são responsáveis pela síntese de todos os outros componentes celulares, enquanto o TABELA 6.2 Aminoácidos Indispensáveis, Dispensáveis e Condicionalmente Indispensáveis na Dieta Humana. (Modificado de Laidlaw e Kopple18) Indispensáveis Dispensáveis Condicionalmente Indispensáveisa Precursores de Condicionalmente Indispensáveis Histidina Alanina Arginina Glutamina/glutamato, aspartato Isoleucina Acido aspártico Cisteína Metionina, serina Leucina Asparagina Glutamina Ácido glutâmico, amônia Lisina Ácido glutâmico Glicina Serina, colina Metionina Serina Prolina Glutamato Fenilalanina Tirosina Fenilalanina Treonina Triptofano Valina aAminoácidos condicionalmente indispensáveis são definidos como aqueles que necessitam ser ingeridos por meio de uma fonte dietética quando a síntese endógena não alcança anecessidade metabólica. PEPTÍDEOS Dois aminoácidos unidos formam um dipeptídeo; a união de três aminoácidos resulta na formação de um tripeptí- deo e assim sucessivamente. Cada aminoácido em uma cadeia polipeptídica é denominado como um resíduo de aminoácido. Uma cadeia com até 100 aminoácidos unidos é denominada polipeptídeo, enquanto valores superiores caracterizam uma proteína9,24. A seqüência de aminoácidos de uma determinada proteína é representada por um arranjo seqüencial de abreviações de cada aminoácido. Por exemplo, o poli- material genético apenas codifica as proteínas com as suas respectivas seqüências de aminoácidos. DNA e RNA são cadeias de nucleotídeos muito similares quimicamente. Em contraste, proteínas são formadas por uma variedade de 20 aminoácidos diferentes, cada um com uma característica química própria. Esta variedade permite enorme versatili- dade nas propriedades químicas de diferentes proteínas, o que poderia explicar a escolha por proteínas — ao longo do processo evolutivo — ao invés de moléculas de RNA para catalisar a maioria das reações celulares2,25. Proteínas são as mais abundantes macromoléculas biológicas e representam o principal componente estrutural DeAngelis06.indd 73DeAngelis06.indd 73 18/5/2007 10:13:2918/5/2007 10:13:29 74 Fisiologia da Nutrição Humana. Aspectos Básicos, Aplicados e Funcionais e funcional de todas as células do organismo, sendo que aproximadamente metade do peso seco de uma célula corresponde à proteína. Além disso, no organismo humano, aproximadamente 18% da massa corporal está na forma de proteína. Apesar da enorme diversidade de enzimas e de outras proteínas no organismo, quase 50% do conteúdo protéico total do ser humano está presente em apenas quatro proteínas (miosina, actina, colágeno e hemoglobina). O colágeno, em particular, compreende aproximadamente 25% do total2,24. Estrutura Protéica Proteínas são moléculas complexas que apresentam estruturas primária, secundária, terciária e quaternária. A estrutura primária diz respeito ao tipo e seqüência de aminoácidos na molécula protéica, que é determinada geneticamente. A secundária é formada por associação de regiões próximas da cadeia polipeptídica e é mantida à custa das pontes de hidrogênio. Na terciária, a molécula protéica se arranja em estruturas globulares utilizando diversos tipos de ligações, como co-valentes, hidrofóbicas, iônicas, eletrostáticas e pontes de hidrogênio. Essas últimas são representadas pelas pontes de dissulfetos entre os resíduos de cisteína. Finalmente, a forma como diversas estruturas terciárias ou subunidades se associam é a chamada estru- tura quaternária26,27. Intracelularmente, a correta conformação de muitas pro- teínas é obtida apenas com o auxílio de um grupo diverso de proteínas, denominadas chaperonas, que não alteram o resultado final do processo de dobramento, mas previnem a agregação prévia de proteínas recém-sintetizadas, antes que assumam sua forma ativa final. Exemplos bem conhecidos incluem as proteínas de choque térmico, que são produzidas pelas células como resultado de um estresse térmico. Os exemplos clássicos são as proteínas da classe hsp-70 (Heat Shock Protein), assim nomeadas em função de uma proteína de 70 kD que aparece no citossol de células de mamíferos após um choque térmico (Fig. 6.3). As chaperonas também estão envolvidas na inserção de proteínas em membranas e no transporte de proteínas através de membranas. Além disso, a hidrólise de ATP é necessária durante o dobramento das proteínas pelas chaperonas. Um subgrupo de chape- ronas, conhecido como chaperoninas, também chamadas de hsp-60 por causa de seus pesos moleculares de 60 kD, são estruturas tubulares, com múltiplas subunidades, que participam do processo de dobramento de uma proteína. As chaperoninas formam um envoltório de subunidades de 60 kD em torno da proteína nascente, para protegê-la durante o processo de dobramento1,3. Todas essas atividades podem auxiliar na funcionalidade de uma proteína; contudo, a falha no dobramento correto de uma proteína geralmente acarreta em rápida degradação da proteína em questão, e o acúmulo de proteínas com FIG. 6.3 Chaperonas (HSP 70 = proteínas de choque térmico de 70 kD). (Fonte: Nelson e Cox1.) DeAngelis06.indd 74DeAngelis06.indd 74 18/5/2007 10:13:2918/5/2007 10:13:29 Metabolismo de Proteínas 75 conformações errôneas pode resultar em agregação de proteínas e em doenças graves28. Desnaturação Protéica Umas das características específicas das proteínas é a resposta para calor, álcool e outros tratamentos que afetam as suas estruturas quaternárias, terciárias e secundárias. Esta resposta característica é denominada desnaturação. A desnaturação resulta do desdobramento de uma molé- cula protéica, o que promove a clivagem das pontes de hidrogênio e das associações entre os grupos funcionais; como resultado, a estrutura tridimensional é perdida. A desnaturação afeta diversas propriedades da molécula de proteína, dentre as quais destacam-se: i. alteração da forma física; ii. diminuição da solubilidade em água; iii. possível perda da reatividade com outras proteínas24. Quando desnaturadas, as proteínas perdem a suas fun- ções biológicas, sendo que o calor promove a desnaturação da maioria das proteínas. Grande parte das proteínas pre- sentes nos alimentos são desnaturadas a 60°C. Um exemplo de desnaturação protéica é a coagulação da clara de ovo quando aquecida. A desnaturação, a menos que extrema, não afeta a composição de aminoácidos de uma proteína e, de fato, pode tornar esses aminoácidos mais disponíveis para o organismo, uma vez que o aquecimento provoca o desdobramento ou “desnovelamento” da proteína, o que aumenta a exposição da cadeia polipeptídica para a ação das enzimas proteolíticas digestivas. Por esse motivo, mui- tas proteínas aquecidas apresentam maior valor biológico em relação às mesmas proteínas quando consumidas sem tratamento térmico prévio. O processo de desnaturação moderado pode ser revertido — fenômeno denominado renaturação —, ou seja, a proteína renaturada adquire sua forma e sua atividade originais24. Classificação das Proteínas As proteínas, devido à sua complexidade estrutural, são difíceis de serem rigorosamente classificadas. Podem ser agrupadas em: simples, quando por hidrólise fornecem apenas aminoácidos; e conjugadas, quando dão origem a outros compostos além dos aminoácidos. As proteínas conjugadas são combinações de uma molécula não protéica unida a uma molécula protéica. Entre as primeiras pode-se citar como exemplo: albuminas, globulinas, glutelinas, pro- laminas, entre outras. Em relação às conjugadas, têm-se as nucleoproteínas, encontradas nos ácidos ribonucléico (RNA) e desoxirribonucléico (DNA); as mucoproteínas e as glico- proteínas, que combinam a proteína com polissacarídeos complexos, tais como a mucina, encontrada nas secreções gástricas, e a albumina (clara do ovo); as lipoproteínas, encontradas no plasma, que se unem com lipídios, triglia- cilgliceróis, colesterol e fosfolipídios. Têm-se ainda como proteínas conjugadas as fosfoproteínas, formadas pela ligação éster entre o ácido fosfórico e as proteínas (como, por exemplo, na caseína do leite); e as metaloproteínas, tais como a ferritina e a hemosiderina, que apresentam metais unidos às suas estruturas6,26,27. As proteínas também podem ser divididas em fibrosas e globulares. As fibrosas incluem a queratina, que é a proteína do cabelo e das unhas; a fibrina do sangue; a miosina do músculo; e o colágeno, principal componente do tecido conjuntivo. As proteínas globulares são solúveis e facilmen- te desnaturadas, sendo encontradas principalmente nos fluidos orgânicos e nos tecidos. As proteínas globulares de interesse em nutrição são as caseínasdo leite, a albumina no ovo e as albuminas e globulinas no sangue, no plasma e na hemoglobina, bem como as globulinas de leguminosas, como as do feijão e da soja9,11,26,27. As proteínas também podem ser classificadas de acor- do com o seu valor nutricional. As proteínas que contêm aminoácidos indispensáveis nas proporções necessárias ao organismo são denominadas proteínas completas, as quais são principalmente as de origem animal (ovos, leite e derivados, carnes, pescados). Proteínas que apresentam deficiência em um ou mais aminoácidos indispensáveis são denominadas proteínas incompletas ou desbalanceadas. Essas proteínas são geralmente de origem vegetal, apesar de algumas proteínas animais serem também incompletas. A proteína do tecido conectivo denominada colágeno, a partir da qual é preparada a gelatina, tem deficiência do aminoácido triptofano; zeína, a proteína do milho, é baixa em lisina e triptofano. Quando a seleção de alimentos é limitada e há uma escassez de alimentos ricos em proteínas de alto valor bio- lógico, as proteínas de origem vegetal incompletas podem ser combinadas de tal modo que todos os aminoácidos indispensáveis sejam fornecidos. Por exemplo, proteínas de cereais (arroz) combinadas com aquelas presentes nas leguminosas (feijão) podem estar na mesma refeição para que todos os aminoácidos indispensáveis sejam ingeridos. Quando essas proteínas são combinadas e consumidas em quantidades suficientes, as necessidades individuais de aminoácidos são atendidas. Esta combinação de proteínas incompletas deve ser consumida dentro de um período de tempo relativamente curto (< 4 horas) para a obtenção das quantidades apropriadas e necessárias de aminoácidos. O máximo benefício é alcançado quando a combinação de proteínas é consumida ao mesmo tempo24,27. DeAngelis06.indd 75DeAngelis06.indd 75 18/5/2007 10:13:3418/5/2007 10:13:34 76 Fisiologia da Nutrição Humana. Aspectos Básicos, Aplicados e Funcionais Funções das Proteínas Além do sistema de classificação de proteínas descrito, as proteínas podem ser classificadas bioquimicamente, de acordo com as suas funções. As proteínas desempenham funções vitais em praticamente todos os processos bio- lógicos. A relevância e o escopo das funcionalidades das proteínas podem ser exemplificados como segue4,7,25,28: 1. Catálise enzimática: praticamente todas as reações químicas em sistemas biológicos são catalisadas por macromoléculas denominadas enzimas. Algumas des- sas reações, como hidratação do dióxido de carbono, são relativamente simples. Contudo, outras reações, como a replicação de um cromossomo completo, são altamente complexas. Enzimas exibem um enorme poder catalítico. Geralmente aumentam as taxas de reações ao menos em um milhão de vezes. Além disso, as reações químicas in vivo raramente ocorrem em taxas perceptíveis na ausência de enzimas. Cabe destacar que praticamente todas as enzimas conhecidas são proteínas. Desse modo, as proteínas são fundamentais na determinação do padrão de transformações químicas em sistemas biológicos. 2. Transporte e estoque: muitas pequenas moléculas e íons são transportados por proteínas específicas. Por exemplo, hemoglobina transporta oxigênio em eritrócitos, enquanto a mioglobina transporta oxigênio no tecido muscular. O ferro é transportado no sangue pela proteína transferrina e é estocado no fígado na forma de um complexo com outra proteína denominada ferritina. 3. Contração muscular: as proteínas são o principal com- ponente do tecido muscular. A contração muscular é re- alizada por meio do movimento de deslizamento de dois tipos de filamentos de proteínas (actina e miosina). 4. Proteção imunológica: anticorpos são proteínas alta- mente específicas que reconhecem e ligam-se com antígenos, como vírus e bactérias. 5. Geração e transmissão do impulso nervoso: a resposta da célula nervosa para um estímulo específico é mediada por proteínas denominadas receptores, que podem ser estimulados por moléculas pequenas e específicas, como acetilcolina, que atua na transmissão do impulso nervoso nas sinapses. 6. Regulação hormonal: muitos hormônios são proteínas ou peptídeos. Dentre os hormônios protéicos incluem- se a insulina, o hormônio do crescimento, a prolactina, o hormônio luteinizante, o hormônio folículo estimulan- te e a tireotropina. Muitos hormônios polipeptídicos apresentam baixo peso molecular (< 5.000) e são designados como peptídeos. Importantes hormônios peptídicos incluem adrenocorticotrópico, antidiurético, glucagon e calcitonina. 7. Expressão gênica: proteínas controlam e regulam a transcrição e a tradução gênicas. Esse fato ocorre por meio de histonas — que estão intimamente associadas ao DNA —, ou por meio de fatores de repressão ou de fatores que aumentam a transcrição gênica, ou também por proteínas que formam parte das partículas de RNA heteronuclear e dos ribossomos. 8. Estrutural: dentre as proteínas que participam da fun- ção estrutural do organismo destacam-se o colágeno e a elastina, que formam a matriz de ossos e ligamentos, fornecendo força e elasticidade estrutural para os órgãos e o sistema vascular. Qualidade da Proteína A qualidade de uma proteína refere-se à sua capacidade de fornecer os aminoácidos necessários para o organismo. Alguns alimentos contêm altos teores de proteína, enquanto outros contêm baixos teores. O fato de um alimento espe- cífico ser uma fonte rica de proteínas não implica que seja suficiente para sustentar o crescimento ou a manutenção do organismo. A gelatina, por exemplo, é uma proteína que pode ser obtida pura e na forma de pó; contudo, a utiliza- ção de gelatina como alimento e única fonte de proteína não fornece os aminoácidos necessários ao organismo. Conseqüentemente, uma dieta baseada em gelatina como única fonte de proteína, excluindo outras fontes protéicas, não permite a manutenção da vida devido à gelatina ser uma proteína de baixa qualidade, uma vez que é deficiente no aminoácido triptofano6,17,29-33. A qualidade de uma proteína pode ser expressa de acordo com o escore químico, a razão de eficiência protéica (PER), o valor biológico (VB) e o saldo de utilização protéica (NPU). Esses parâmetros referem-se a diferentes testes utilizados para definir a qualidade de uma proteína. O escore químico refere-se somente a propriedade da proteína em questão, enquanto a PER, o VB e o NPU referem-se a relação entre a proteína da dieta e o consumidor. Os valores de PER, VB e NPU dependem das propriedades tanto da proteína em questão quanto da necessidade do indivíduo29,30,34,35. A determinação do valor do escore químico é dependente da comparação entre o conteúdo de aminoácidos indispen- sáveis presentes na ovalbumina (ovo), que é utilizada como proteína de referência, e da proteína do alimento em ques- tão. A ovalbumina é considerada ideal e nutricionalmente completa. O teste apresenta diversas etapas. As proteínas devem ser purificadas e hidrolisadas em aminoácidos, sendo DeAngelis06.indd 76DeAngelis06.indd 76 18/5/2007 10:13:3518/5/2007 10:13:35 Metabolismo de Proteínas 77 estes submetidos à análise por meio de um analisador de aminoácidos. Sendo assim, o conteúdo dos vários aminoá- cidos presentes nas duas proteínas é então comparado. O aminoácido na proteína teste que está presente na menor concentração, em uma base percentual, é denominado aminoácido limitante da proteína. O valor da porcentagem é o escore químico. Por exemplo, a quantidade de lisina presente na proteína da aveia é 51% daquela presente na proteína do ovo. Portanto, o escore químico da proteína da aveia é de 516,31,36. As condições para a determinação da PER devem ser padronizadas. Estudos para a determinação da PER exigem animais em fase de crescimento. Os animais utilizados de- vem ser recém-desmamados;a proteína é utilizada em uma concentração de 10% do peso seco da ração. A PER da proteína teste deve ser sempre comparada com aquela da ovolbumina, a qual deve ser utilizada na ração dos animais do grupo controle. O ganho de peso e o consumo de ração são verificados durante o período de três semanas. Por exemplo, a PER para a proteína do ovo (3,92) é aproxima- damente duas vezes aquela da proteína da soja (2,32). Cabe ressaltar que um dos problemas relativos à determinação da PER é a impossibilidade de distinguir entre o peso ganho como gordura e como massa magra 37-39. A PER é definida pela fórmula: PER = ganho de peso quantidade de proteína consumida O VB representa a fração de aminoácidos absorvidos pelo intestino que é retida no organismo. O VB de uma proteína é determinado pela medida da quantidade de nitrogênio consumido e aquele excretado. Inicialmente, as perdas obrigatórias de nitrogênio pela urina e fezes devem ser determinadas, o que necessita de um ensaio biológico envolvendo dietas isentas de nitrogênio. Posteriormente, é realizada a determinação da quantidade de nitrogênio uriná- rio e fecal com o consumo da proteína teste. As diferenças no nitrogênio excretado entre as duas condições dietéticas é expressa como o [∆ nitrogênio (N) fecal] e o [∆ N urinário], sendo que a letra maiúscula grega delta (∆) convencional- mente significa variação35,40. A fórmula do VB é: VB = N retido = [N ingerido] – [∆N fecal] – [∆N urinário] N absorvido [N ingerido] – [∆N fecal] O NPU visa avaliar a retenção de nitrogênio em relação à quantidade de nitrogênio consumida. Isto difere do BV, uma vez que verifica a quantidade de nitrogênio retida em relação àquela absorvida40. A fórmula do NPU é: NPU = N retido = [N ingerido] – [∆N fecal] – [∆N urinário] N consumido [N ingerido] É aceito que o valor nutricional de proteínas possa diferir substancialmente de acordo com a composição de aminoácidos (indispensáveis) e a digestibilidade. Por muitos anos ensaios biológicos, principalmente com ratos, foram os métodos de escolha para avaliar o valor nutricional de proteínas. Este valor foi expresso como PER, VB e NPU. Em 1989, a FAO/OMS41 concluiu que a qualidade da proteína poderia ser avaliada adequadamente por meio da avaliação do conteúdo do primeiro aminoácido indispensável limitante das proteínas a serem testadas, que é expresso como uma porcentagem do conteúdo do mesmo aminoácido em um modelo de referência de aminoácidos indispensáveis. Este modelo de referência foi baseado nas necessidades de ami- noácidos indispensáveis de crianças pré-escolares conforme publicado pela FAO/OMS (1985)42. Subseqüentemente, esta porcentagem é corrigida de acordo com a digestibilidade verdadeira da proteína-teste, conforme avaliação realizada por ensaio biológico realizado com ratos. Esse método de escore, conhecido como digestibilidade protéica corrigida pelo escore aminoacídico (do inglês, Protein Digestibility- Corrected Amino Acid Score [PDCAAS]) foi adotada como método preferencial para a avaliação do valor protéico na nutrição humana. Proteínas com valores da PDCAAS que excedem 100% não contribuem com benefícios adicionais em humanos e, desse modo, os valores são truncados em 100%38-40,43,44. A fórmula da PDCAAS é demonstrada abaixo: mg do AA limitante em 1 g da proteína teste PDCAAS(%) = × digestibilidade verdadeira (%) × 100 mg do mesmo AA em 1 g da proteína de referência AA = aminoácidos Em humanos, a digestibilidade aparente corresponde à diferença entre o nitrogênio ingerido (NI) e o nitrogênio fecal (NF), enquanto a digestibilidade verdadeira corresponde a NI – (NF – Nitrogênio Endógeno Metabólico [NEM]), onde NEM corresponde a perda obrigatória, a qual é da ordem de 20 mg de nitrogênio/kg/dia30,35,40. A Tabela 6.3 apresenta os valores para PER, digestibi- lidade fecal real, escore de aminoácidos e PDCAAS (não truncado) para algumas proteínas, enquanto a Tabela 6.4 apresenta todas as etapas envolvidas no cálculo da PDCAAS de uma proteína alimentar43. DeAngelis06.indd 77DeAngelis06.indd 77 18/5/2007 10:13:3518/5/2007 10:13:35 78 Fisiologia da Nutrição Humana. Aspectos Básicos, Aplicados e Funcionais Digestão de Proteínas A proteína ingerida diariamente — somada à proteína proveniente do intestino na forma de enzimas digestivas, células descamadas e mucinas — é quase completamente digerida e absorvida. Esse processo é muito eficiente e ga- rante o contínuo fornecimento de aminoácidos para o pool de aminoácidos corporal. Menos de 10% da proteína total que passa através do trato digestório aparecem nas fezes. Sendo assim, se a alimentação contribuir com cerca de 70 a 100 g de proteína e a proteína endógena contribuir com aproximadamente 100 g (variação entre 35 a 200 g), então é esperado que aproximadamente de 1 a 2 g de nitrogênio sejam encontrados nas fezes, o que equivale a cerca de 6 a 12 g de proteína24,45-48. O objetivo da digestão de proteínas é liberar aminoácidos, dipeptídeos e tripeptídeos a partir da proteína consumida na dieta. Com exceção de um período relativamente curto após o nascimento, o enterócito não consegue absorver proteí- nas intactas. Dentre as proteínas que o neonato consegue absorver, destacam-se as imunoglobulinas (leite materno), que fornecem a imunização passiva para o neonato. Poste- riormente a esse período, apenas aminoácidos, dipeptídeos e tripeptídeos são absorvidos pelos enterócitos46-49. As enzimas responsáveis pela digestão das proteínas da dieta são denominadas peptidases e são classificadas em duas categorias: i. endopeptidases, que atuam sobre ligações internas e liberam grandes fragmentos de peptídeos para a sub- seqüente ação de outras enzimas; ii. exopeptidases, que atuam sobre as extremidades da cadeia peptídica e liberam um aminoácido em cada reação. As exopeptidases são subdivididas de acordo com a posição que atuam, ou seja, aquelas que agem na extremi- dade carboxila (COOH) são denominadas carboxipeptidases, enquanto aquelas que atuam sobre a extremidade amino (NH2) são denominadas aminopeptidases. Inicialmente, as endopeptidases agem sobre a proteína intacta ingerida, enquanto as exopeptidases atuam no processo final da digestão24,46-49. Diferentemente da digestão de lipídios e carboidratos — que é iniciada na boca pela lipase lingual e amilase salivar, respectivamente — a digestão das proteínas inicia-se no es- tômago, onde o alimento é acidificado com o ácido clorídrico (HCl), o qual apresenta diversas funções, como morte de alguns organismos potencialmente patogênicos e desnatu- ração de proteínas, que permite que essas se tornem mais vulneráveis à ação da pepsina (endopeptidase). A enzima pepsina é liberada dentro da cavidade gástrica na forma de pepsinogênio (enzima inativa). No momento em que o alimen- to entra no estômago ocorre a estimulação da liberação de HCl pelas células parietais, e a conseqüente diminuição do pH intragástrico para cerca de 2, o que provoca a perda de 44 aminoácidos da estrutura do pepsinogênio. Uma vez que esses 44 aminoácidos atuam como um fragmento inibidor da pepsina, por meio da sua ligação ao sítio catalítico da enzima, a clivagem desse fragmento de 44 aminoácidos, além de propiciar a ativação da pepsina, também atua como um peptídeo sinalizador para a liberação de colecistocinina (CCK) no duodeno. A CCK estimula a liberação de enzimas digestivas tanto pelo pâncreas exócrino quanto pelas células da mucosa intestinal. A ativação da pepsina também pode TABELA 6.4 Cálculo para Obtenção da Digestibilidade Protéica Corrigida pelo Escore Aminoacídico (PDCAAS). (Adaptado de De Angelis40) 1. Analisar o conteúdo de nitrogênio (N) da amostra; 2. Calcular o conteúdo de proteína (N × 6,25 ou um fator de conversão específicoda AOAC); 3. Analisar o perfil de aminoácidos indispensáveis (AI); 4. Determinar o escore aminoácídico (EA) (não corrigido): EA = mg do AI em 1 g da proteína teste ÷ mg de AI em 1 g da proteína de referência Referência de perfil de AI de uma proteína = FAO/OMS (1985) recomendação para crianças pré-escolares (2-5 anos de idade) 5. Analisar a digestibilidade (D) 6. Calcular o PDCAAS = menor EA não corrigido × D TABELA 6.3 Razão de Eficiência Protéica (PER), Digestibilidade Verdadeira, Escore Aminoacídico (AAS) e Digestibilidade Protéica Corrigida pelo Escore Aminoacídico (PDCAAS) Proteína PER Digestibilidade AAS PDCAAS Ovo 3,8 98 121 118 Leite de vaca 3,1 95 127 121 Carne de vaca 2,7 98 94 92 Soja 2,1 95 96 91 Trigo 1,5 91 47 42 DeAngelis06.indd 78DeAngelis06.indd 78 18/5/2007 10:13:3618/5/2007 10:13:36 Metabolismo de Proteínas 79 ocorrer por meio do processo denominado autocatálise, que ocorre quando a pepsina atua sobre o pepsinogênio, ativando-o24,45-49. Uma das importantes características da digestão pela pepsina reside na sua capacidade de digerir o colágeno, um albuminóide que é pouco afetado por outras enzimas digestivas. O colágeno é um importante constituinte do tecido conjuntivo intercelular das carnes. Para que as en- zimas digestivas do trato digestório penetrem nas carnes e possam digerir as proteínas celulares é necessário que as fibras de colágeno sejam inicialmente digeridas. Por conseguinte, nas pessoas com deficiência de atividade péptica no estômago, as carnes ingeridas não sofrem tanto a ação das enzimas digestivas e, conseqüentemente, podem ser mal digeridas. Contudo, cabe ressaltar que a ação da pepsina é responsável por cerca de 10% a 20% da digestão total das proteínas. A atividade da pepsina termina quando o conteúdo gástrico se mistura com o suco pancreático alcalino no intestino delgado26,50. O quimo no intestino estimula a liberação de secretina e CCK, que acarretam na secreção de bicarbonato e de enzi- mas pelo pâncreas, respectivamente. No suco pancreático verifica-se a presença de proteases pancreáticas, que são secretadas dentro do duodeno como precursores inativos (zimogênios). O tripsinogênio, que não apresenta atividade proteolítica, é ativado pela enteropeptidase, uma enzima localizada na membrana apical de enterócitos da região duodenal. A atividade da enteropeptidase é estimulada pelo tripsinogênio, enquanto a sua liberação da membrana apical dos enterócitos é provocada pelos sais biliares. A enteropeptidase ativa o tripsinogênio por meio da liberação de um hexapeptídeo a partir do N-terminal dessa molécula. Posteriormente, a tripsina, além de atuar sobre as proteínas alimentares, também ativa outras pré-proteases liberadas pelo pâncreas exócrino, ou seja, a tripsina atua sobre o quimiotripsinogênio, liberando a quimiotripsina; sobre a pró- elastase, liberando a elastase; e sobre a pró-carboxipeptida- se, liberando a carboxipeptidase. Tripsina e quimiotripsina clivam as moléculas de proteínas em pequenos peptídeos; a seguir, a carboxipeptidase cliva os aminoácidos das extremidades carboxila dos polipeptídeos. Não obstante, posteriormente à ativação das proteases pancreáticas no intestino, estas sofrem rápida inativação devido ao processo de autodigestão, sendo a tripsina a enzima primariamente responsável por essa inativação24,45,46,47,48,49. Os produtos finais da digestão de proteínas da dieta no lúmen intestinal não são exclusivamente aminoácidos livres, mas uma mistura de aminoácidos livres (40%) e pequenos peptídeos (60%), os quais consistem principalmente de 2 a 8 resíduos de aminoácidos. Esses peptídeos são, posterior- mente, hidrolisados por enzimas (aminopeptidases, dipeptidil aminopeptidase e dipeptidase) presentes na superfície luminal, o que acarreta na liberação de aminoácidos livres, dipeptídeos e tripeptídeos47,49. Absorção Intestinal de Aminoácidos, Dipeptídeos e Tripeptídeos Até o início da década de 1950, os produtos da digestão de proteínas foram simplesmente aceitos como aminoá cidos livres, para os quais foram designados diversos mecanis- mos de transporte. Porém, a partir de estudos de digestão protéica em intestino delgado de humanos, concluiu-se que os principais produtos da digestão de proteínas no lúmen intestinal não são aminoácidos, mas dipeptídeos e tripep- tídeos. Subseqüentemente, estudos de absorção de ami- noácidos, de dipeptídeos e de tripeptídeos demonstraram que o transporte de pequenos peptídeos intactos ocorria no intestino delgado. Doses orais de glicina nas formas de glicina, glicil-glicina e glicil-glicil-glicina apresentaram mais rápida absorção nas formas de dipeptídeo e de tripeptídeo quando comparadas à absorção do aminoácido livre. Estu- dos de perfusão jejunal em humanos demonstraram que a competição entre aminoácidos livres durante o processo de captação foi evitada ou reduzida quando os mesmos aminoácidos estiveram na forma de dipeptídeos, sendo que em muitos estudos verificou-se aumento da absorção de aminoácidos a partir de soluções de dipeptídeos quan- do comparadas a soluções contendo aminoácidos livres de equivalente composição. A existência de mecanismos distintos de transporte para aminoácidos e dipeptídeos foi observada em patologias associadas a defeitos no transpor- te de aminoácidos (cistinúria e doença de Hartnup), devido aos aminoácidos afetados serem pouco absorvidos quando estavam na forma livre, mas de absorção normal quando estavam presentes na forma de pequenos peptídeos. Desse modo, foi sugerida a existência de um sistema de transporte exclusivo para a absorção de dipeptídeos e tripeptídeos. Esta hipótese foi validada em estudos realizados em ani- mais experimentais e humanos, por meio da clonagem do transportador de oligopeptídeos intestinal51-58. Estudos moleculares e fisiológicos têm demonstrado que o transportador de oligopeptídeos intestinal, o qual foi designado PepT-1, está presente na membrana apical (ou luminal) de enterócitos, sendo ausente na membrana basolateral dessas células. Cabe ressaltar que o PepT-1 é um transportador exclusivo de dipeptídeos e tripeptídeos, que são os principais produtos da digestão de proteínas no lúmen intestinal.51,52,59-67 Diferentemente de outros transportadores, o PepT-1 apresenta enorme extensão de substratos, que inclui 400 DeAngelis06.indd 79DeAngelis06.indd 79 18/5/2007 10:13:3718/5/2007 10:13:37 80 Fisiologia da Nutrição Humana. Aspectos Básicos, Aplicados e Funcionais dipeptídeos e 8.000 tripeptídeos, que podem ser produzidos a partir da digestão das proteínas da dieta. Além disso, o PepT-1 apresenta uma característica singular, que se refere a sua dependência pelo gradiente de prótons no momento da absorção dos oligopeptídeos pelo enterócito, enquanto outros transportadores comumente dependem de um gra- diente de sódio. De fato, o PepT-1 é um co-transportador de peptídeos e de íons H+, pertencendo a uma família de transportadores de oligopeptídeos encontrada em todas as espécies, desde bactérias a humanos52,61,68-70. Os processos celulares envolvidos no transporte de dipeptídeos e tripeptídeos através das células epiteliais intestinais incluem as seguintes características (Fig. 6.4): i. um trocador Na+/H+ localizado na membrana luminal, que mantém o pH intracelular alcalino; ii. presença da enzima Na+/K+ ATPase localizada na membrana basolateral, que mantém o potencial de membrana negativo no interior celular; iii. diversas peptidases citoplasmáticas, que previnem o acúmulo dos peptídeos absorvidos. Estas enzimas convertem a maioria dos dipeptídeos e tripeptídeos para aminoácidos, que são utilizados pelos enteróci- tos ou são liberados dentro da circulação portal por meio de transportadores de aminoácidospresentes na membrana basolateral dessas células. Os dipeptídeos e tripeptídeos que escapam da hidrólise pelas peptidases citoplasmáticas são transportados através da membra- na basolateral para dentro da circulação portal por meio de um transportador de oligopeptídeos, o qual difere caracteristicamente do PepT-151,67. A utilização de duas forças motrizes, gradiente de Na+ e gradiente de H+, para a absorção ativa de aminoácidos e dipeptídeos, respectivamente, é vantajosa para o organis- mo por manter uma nutrição protéica adequada, devido à ausência de competição entre aminoácidos e dipeptídeos pela origem de energia e por permitir que estes processos absortivos ocorram paralelamente54. Em relação à absorção de aminoácidos na membrana luminal, verifica-se que alguns aminoácidos são absorvidos por meio de mecanismos mediados por carreadores em um FIG. 6.4 Transportador de dipeptídeos e tripeptídeos intestinal (PepT-1). (Modificado de YANG et al.67.) DeAngelis06.indd 80DeAngelis06.indd 80 18/5/2007 10:13:3718/5/2007 10:13:37 Metabolismo de Proteínas 81 processo sódio (Na+) dependente. A transferência do Na+ para o compartimento extracelular caracteriza-se, dessa forma, como um transporte ativo secundário. Outros ami- noácidos e alguns daqueles absorvidos por transporte ativo podem também ser absorvidos por difusão facilitada, que não necessita de Na+. Certos aminoácidos competem entre si, durante a absorção, pelos transportadores presentes na membrana luminal54,71. Dentro do intestino delgado existem variações regionais das capacidades absortivas de aminoácidos, dipeptídeos e tripeptídeos. A capacidade absortiva de dipeptídeos e tripeptídeos é maior no intestino delgado proximal em relação ao intestino delgado distal. Aliado a este fato observa-se que peptidases citosólicas, que atuam sobre dipeptídeos e tripeptídeos, apresentam mais alta atividade no segmento proximal do intestino delgado, local onde a capacidade absortiva desses peptídeos é muita elevada. Por outro lado, a capacidade absortiva de aminoácidos é maior no intestino delgado distal do que no intestino delgado proximal51,54,56. Na membrana basolateral dos enterócitos verifica-se a presença de sistemas de transportes de aminoácidos, que são responsáveis pela saída de aminoácidos para a corrente sangüínea. Ao menos cinco sistemas de transporte de aminoácidos na membrana basolateral foram identificados, sendo dois dependentes de sódio (Na+) e três independen- tes de Na+. Os mecanismos independentes de Na+ são responsáveis pelo transporte de aminoácidos da célula para a circulação sangüínea, caracterizando a absorção transcelular de aminoácidos a partir do lúmen intestinal, enquanto que os sistemas dependentes de Na+ apresentam um papel relevante no fornecimento de aminoácidos para as células intestinais47,54,71. Em síntese, dentre os mecanismos de absorção de aminoácidos e de dipeptídeos e tripeptídeos provindos da dieta, destacam-se45,51,58,72,73: i. aminoácidos livres liberados pela digestão no trato diges- tório ou na membrana luminal são absorvidos via sistemas de transporte específicos para aminoácidos livres; ii. hidrólise de oligopeptídeos na membrana luminal com subseqüente liberação de aminoácidos livres, que são transportados por diferentes sistemas específicos de transporte de aminoácidos. Dipeptídeos e tripeptídeos que permanecem após a digestão por peptidases lu- minais e ligados à membrana luminal, ou seja, que não foram clivados em aminoácidos livres por hidrolases de peptídeos presentes nesta membrana, podem ser absorvidos íntegros pelo intestino delgado, sendo cliva- dos por peptidases intracitoplasmáticas (dipeptidases e tripeptidases) de enterócitos. Peptidases localizadas no citosol de enterócitos são capazes de hidrolisar somente dipeptídeos e tripeptídeos; iii. peptídeos com quatro ou mais aminoácidos necessitam ser hidrolisados pela membrana luminal previamente ao processo de absorção de seus produtos hidrolisados. Cabe ressaltar que estudos em animais e humanos têm demonstrado que a oferta por via oral, a partir de uma mistura de aminoácidos livres, difere em relação à mistura de dipeptídeos de composição aminoacídica equivalente55,65,66,74-78. Algumas razões são apresentadas a seguir: a. absorção mais rápida de aminoácidos quando fornecidos na forma de dipeptídeos do que na forma livre; b. maior aparecimento de aminoácidos no sangue após absorção de dipeptídeos do que a partir de aminoácidos livres; c. ausência de competição entre a absorção de aminoácidos livres e de dipeptídeos; d. conservação de energia metabólica no transporte de aminoácidos na forma de dipeptídeos em relação à forma monomérica; e. relativa manutenção do transporte de dipeptídeos comparado ao transporte de aminoácidos em diversas situações, tais como jejum, desnutrição protéico-calórica, deficiência de vitaminas e doenças intestinais; f. vantagens físico-químicas pela substituição de aminoáci- dos instáveis e pouco solúveis em solução por dipeptí- deos altamente estáveis e solúveis em solução; g. dipeptídeos estimulam seu próprio transporte por meio da indução da expressão de PepT-1. REGULAÇÃO HORMONAL DA CONCENTRAÇÃO DE AMINOÁCIDOS PLASMÁTICOS Muitos dos hormônios sintetizados no organismo regulam a concentração de aminoácidos no plasma. Alguns dos efeitos produzidos são sumarizados na Tabela 6.5. A discussão sobre as ações hormonais pode ser simplificada pela divisão dos mesmos em duas categorias: os hormônios anabólicos e os hormônios catabólicos. Os hormônios anabólicos, como o hormônio do crescimento, tendem a promover a incorpo- ração de aminoácidos plasmáticos na proteína muscular. A insulina pode ser incluída nesse grupo, embora sua ação pareça ser mediada principalmente por meio da inibição da proteólise muscular preferivelmente do que pela promoção do aumento da captação. De fato, um dos efeitos principais da glicose da dieta é a liberação da insulina, a qual, por sua vez, inibe a degradação protéica muscular79-82. DeAngelis06.indd 81DeAngelis06.indd 81 18/5/2007 10:13:3918/5/2007 10:13:39 82 Fisiologia da Nutrição Humana. Aspectos Básicos, Aplicados e Funcionais Os hormônios catabólicos, particularmente os hormônios esteróides catabólicos, como o cortisol, atuam antagonica- mente em relação aos anabólicos. A liberação desses hor- mônios causa a degradação da proteína muscular, aumento da oxidação de aminoácidos no tecido muscular e liberação de aminoácidos para o plasma. O glucagon exerce um papel relevante por estimular a síntese das enzimas hepáticas que atuam no catabolismo de aminoácidos79,81. Portanto, a concentração de aminoácidos no plasma é dependente em grande parte do balanço preciso entre esses dois grupos de hormônios — anabólicos e catabólicos — e do controle da liberação dos mesmos. METABOLISMO PROTÉICO No organismo não há reserva de proteína ou de aminoá- cidos livres, sendo que qualquer quantidade acima das necessidades para a síntese protéica celular e para a de compostos não-protéicos nitrogenados é metabolizada. No entanto, na célula, existe um pool metabólico de aminoácidos em estado de equilíbrio dinâmico que pode ser utilizado quando for necessário. O contínuo estado de síntese e degradação de proteínas, fenômeno denominado turnover protéico, é necessário para manter esse r pool metabólico e a capacidade de satisfazer a demanda de aminoácidos nas várias células e tecidos do organismo, quando essas são estimuladas a sintetizar novas proteínas para uma determinada função (Fig. 6.5)83,84. O conceito de turnover protéico surgiu inicialmente ar partir dos trabalhos de SCHOENHEIMER, nos Estados Uni- dos da América na década de 1940. Por meio da avaliação das taxas de incorporação de aminoácidos marcadoscom isótopos estáveis (15N) em proteínas e de perda de 15N a partir da proteína, SCHOENHEIMER demonstrou que todas as proteínas corporais estavam em constante estado de fluxo, sendo constantemente sintetizadas e degradadas. Esse pesquisador foi o primeiro a sugerir que existe um pool de aminoácidos nas células, em equilíbrio dinâmicol com os aminoácidos formados a partir da degradação da proteína corporal e com aqueles obtidos a partir da dieta, e que as perdas a partir desse pool ocorriam quando nenhum l aminoácido era ingerido79. O turnover protéico é elevado na infância e diminui com r a idade (Tabela 6.6). Além disso, o turnover difere entre osr tecidos: o músculo esquelético, que responde por aproxi- madamente 50% do conteúdo de proteína corporal, é res- ponsável apenas por cerca de 25% do turnover, enquanto o fígado e o intestino, que respondem por menos de 10% do conteúdo protéico do organismo, contribuem com 50% do turnover. O turnover protéico também difere dentro dosr tecidos e igualmente dentro das células26,27. TABELA 6.5 Regulação Hormonal da Concentração de Aminoácidos Plasmáticos. (Adaptado de GILLHAM et al.79) Tecido Afetado Hormônio Fígado Músculo Outros INSULINA Estimula a captação de Estimula a síntese protéica, inibe a 1. Facilita a transferência de glutamato a aminoácidos e a síntese protéica proteólise e promove a captação de partir dos eritrócitos para o músculo aminoácidos no estado alimentado 2. Ativa a desidrogenase de α-cetoácidos de cadeia ramificada no tecido adiposo GLUCAGON Estimula a proteólise e inibe a — Estimula a oxidação de ACR no coração no síntese protéica estado pós-absortivo ADRENALINA — Diminui a síntese protéica e a Estimula a oxidação de ACR no coração concentração plasmática de ACR. Aumenta a oxidação de ACR e a liberação de alanina e glutamina CORTISOL Promove a síntese de glutamina Promove a proteólise e inibe a síntese — no estado de jejum. Induz enzimas protéica. Inibe a captação de relacionadas ao catabolismo de aminoácidos. Promove o efl uxo de aminoácidos, como tirosina glutamina aminotransferase DeAngelis06.indd 82DeAngelis06.indd 82 18/5/2007 10:13:4018/5/2007 10:13:40 Metabolismo de Proteínas 83 Geralmente, o padrão do turnover protéico pode ser estudado em três diferentes grupos (Fig. 6.6)79: • Grupo A: proteínas que são rapidamente sintetizadas; apresentam um tempo de vida limitado e, posteriormente, são rapidamente degradadas. Exemplo dessas proteínas é a hemoglobina, que é normalmente estável durante os 120 dias de vida de um eritrócito humano; • Grupo B: proteínas que são rapidamente sintetizadas e degradadas. Exemplos dessas proteínas são as enzimas, as quais regulam as vias metabólicas. Tais enzimas são geralmente encontradas em baixa concentração nas cé- lulas; sua concentração varia rapidamente em resposta tanto ao aumento quanto à diminuição das taxas de síntese e de degradação protéicas; • Grupo C: as proteínas desse grupo apresentam uma taxa de turnover muito lenta e uma meia-vida muito longa. O r colágeno é um exemplo de proteína desse grupo. Aproximadamente 300 g de proteína são sintetizados e degradados diariamente em um indivíduos adulto, con- tudo, esta quantidade representa apenas um valor médio, porquanto a meia-vida das proteínas endógenas apresenta uma enorme variação. Esse valor é aproximadamente 210 g maior do que o saldo de ingestão, 90 g, e esta diferença enfatiza a grande contribuição realizada pelo turnover protéi-r co corporal para o pool de aminoácidos livres. Os conceitosl de um pool de aminoácidos e de um estado dinâmico de l proteínas corporais reforçam o papel relevante que a síntese e a degradação protéicas exercem, em diferentes tecidos, na regulação da natureza e da concentração de vários ami- noácidos no sangue. Os aminoácidos ingeridos contribuem para esse pool e para o l turnover protéico, mas adicionam r apenas uma proporção do total de aminoácidos envolvidos no turnover protéico corporal diárior 10,26,27,80,85-90. Dentre as principais variáveis que afetam o turnover protéico no organismo humano diariamente destacam- se80-82,85-88,91: a. alimentação e as subseqüentes alterações na disponibilida- de de aminoácidos na circulação sangüínea (Tabela 6.7); b. concentração de hormônios anabólicos (especialmente a insulina) e de hormônios catabólicos (especialmente glucagon e cortisol); c. exercício físico. FIG. 6.5 Troca entre os pools de proteína corporal e de aminoácidos livres (Modificado de Lemon85). TABELA 6.6 Síntese Protéica Corporal em Humanos em Diferentes Estágios de Vida. (Adaptado de NRC22) Estágio de vida Síntese protéica (g/kg/dia) Recém-nascido (pré-termo) 17,4 Criança 6,9 Adulto 3,0 Idoso 1,9 DeAngelis06.indd 83DeAngelis06.indd 83 18/5/2007 10:13:4118/5/2007 10:13:41 84 Fisiologia da Nutrição Humana. Aspectos Básicos, Aplicados e Funcionais FIG. 6.6 Diferentes padrões do turnover protéico. (Adaptado de GILLHAM et al.r 79) TABELA 6.7 Taxas de Turnover de Proteínas Corporais e o Efeito da Ingestão Protéica sobre o r Turnover Protéico.r (Adaptado de Gillham et al.79.) Meia-vida (dias) de Total de Proteínas corporais Proteínas séricas/plasmáticas Rato 17 6 a 7 Humanos 158 10 a 20 Efeito da Dieta (ratos) Dieta Meia-vida das proteínas do plasma (dias) Isenta de proteína 17 25% de proteína 5 65% de proteína 2,9 Os tecidos mais ativos do organismo, responsáveis pelo turnover protéico, são: plasma, mucosa intestinal, pâncre-r as, fígado e rins. Por outro lado, o tecido muscular, pele e cérebro são os menos ativos. A velocidade do turnover protéico depende da função da proteína e do tipo do tecido ou órgão. A taxa média diária do adulto, de proteína renova- da, é da ordem de 3% do total protéico do organismo. Na pele, perdem-se e renovam-se 5 g de proteínas por dia; no sangue, 25 g; no trato intestinal, cerca de 70 g; e no tecido muscular, ao redor de 75 g/dia27. DeAngelis06.indd 84DeAngelis06.indd 84 18/5/2007 10:13:4318/5/2007 10:13:43 Metabolismo de Proteínas 85 Metabolismo Protéico no Tecido Hepático As funções mais relevantes do fígado no metabolismo protéico, de modo sucinto, são: i. formação das proteínas plasmáticas; ii. formação de uréia para a remoção da amônia dos líqui- dos corporais; iii. desaminação dos aminoácidos; iv. interconversões entre os diferentes aminoácidos, bem como entre os aminoácidos e outros compostos importantes para os processos metabólicos do orga- nismo2,4,6,11,22. Após a absorção intestinal, os aminoácidos são trans- portados diretamente ao fígado por meio do sistema porta. Esse tecido exerce um papel importante como modulador da concentração de aminoácidos plasmáticos e regulador do catabolismo de aminoácidos indispensáveis, com exceção dos aminoácidos de cadeia ramificada, que são degradados principalmente pelo músculo esquelético. No fígado, parte dos aminoácidos é usada na síntese de proteínas que são secretadas (por exemplo, albumina e fibrina) e na síntese de proteínas de vida média mais curta (como enzimas, necessárias ao catabolismo dos aminoácidos que ficam na própria célula hepática) (Fig. 6.7)9,10,26,50. Praticamente todas as proteínas plasmáticas, com ex- ceção de parte das gamaglobulinas, são formadas pelas células hepáticas. Essa síntese é responsável por cerca de 90% de todas as proteínas plasmáticas. As gamaglobulinas FIG. 6.7 Participação do fígado no metabolismo protéico. DeAngelis06.indd 85DeAngelis06.indd 85 18/5/2007 10:13:4418/5/2007 10:13:44 86 Fisiologia da Nutrição Humana. Aspectos Básicos, Aplicados e Funcionais restantes são anticorpos formados principalmentepor plas- mócitos no tecido linfático do organismo. O fígado tem a capacidade de sintetizar as proteínas plasmáticas em uma velocidade de cerca de 30 g/dia9,10,26,50,79. O fígado apresenta uma taxa elevada de turnover de r enzimas que regulam a homeostasia de substratos ener- géticos, permitindo que a regulação ocorra rapidamente em resposta à alimentação e ao jejum de curta duração. Sendo assim, alterações na quantidade dessas enzimas hepáticas representam um fator relevante no controle de suas atividades e, por essa razão, uma taxa alta de turnover é essencial quando o tecido deve ser responsivo às altera- ções das necessidades metabólicas4,7,26. Balanço Nitrogenado O balanço nitrogenado representa a diferença entre a quantidade de nitrogênio consumida por dia e a quantidade de nitrogênio excretada por dia. Esta definição pode ser expressa pela fórmula: Balanço Nitrogenado = (gramas de nitrogênio ingerido – gramas de nitrogênio perdido) Balanço Nitrogenado A razão média proteína:nitrogênio, de acordo com o peso, é de 6,25 para a proteína ingerida habitualmente na dieta. Esse número é utilizado como um fator de conversão para expressar a quantidade de proteína da dieta, ou seja, o consumo de 1 g de nitrogênio na forma de proteína equivale ao consumo de 6,25 g de proteínas26. Cabe ressaltar que a avaliação do balanço nitrogenado não pode ser determinada pela análise da coleta de alimentos e de excreções durante 1 dia. Devido à variabilidade biológica intrínseca de experimentos envolvendo animais e humanos, amostras devem ser coletadas durante diversos dias. Um indivíduo adulto ingerindo uma dieta adequada e balanceada está geralmente em balanço nitrogenado, ou seja, um estado onde a quantidade de nitrogênio ingerida diariamente está equilibrada com a quantidade excretada, o que resulta em um saldo zero em relação à alteração da quantidade de nitrogênio corporal. No estado alimentado, o nitrogênio excretado é proveniente principalmente do turno- ver normal ou do excesso de proteína ingerida. Sob algumas r condições o organismo está ou em balanço negativo ou em balanço positivo de nitrogênio. Na condição de balanço nitrogenado negativo, mais nitrogênio é excretado do que ingerido. Este fato pode ser observado durante o jejum ou em determinadas doenças. Durante o jejum, as cadeias de carbono dos aminoácidos derivados das proteínas são necessárias para a gliconeogênese; e a amônia liberada a partir dos aminoácidos é excretada principalmente como uréia e não é reincorporada em proteínas. O balanço nitroge- nado positivo ocorre em crianças em fase de crescimento, que estão aumentando sua massa corporal e incorporando mais aminoácidos em proteínas do que os degradando. Cisteína e arginina são essenciais em crianças, todavia não são essenciais em adultos, uma vez que são sintetizados a partir da metionina e ornitina, respectivamente. Estes ami- noácidos estão prontamente disponíveis em adultos, porém são limitados em crianças devido à elevada utilização de todos os aminoácidos durante essa fase da vida. O balanço nitrogenado positivo também ocorre na gravidez e durante a realimentação após jejum10,16,22,26,41. Em adição a quantidade de proteína da dieta, diversos outros fatores devem ser considerados, como a quantida- de de aminoácidos indispensáveis presentes na dieta em relação ao balanço nitrogenado. Uma vez que aminoácidos indispensáveis não podem ser sintetizados pelo organismo, se apenas um dos aminoácidos indispensáveis não é ingeri- do ou a quantidade ingerida é insuficiente, o organismo não pode sintetizar proteínas novas para repor proteínas perdi- das decorrente do turnover protéico normal e, conseqüen-r temente, verifica-se a ocorrência de balanço nitrogenado negativo, uma vez que proteínas corporais são degradadas para fornecerem o aminoácido indispensável deficiente, ao mesmo tempo em que os demais aminoácidos liberados são metabolizados. Outro fator que determina a necessidade protéica é a ingestão de lipídios e carboidratos. Se esses nutrientes estão presentes em quantidades insuficientes, uma parte da proteína da dieta será utilizada para a produ- ção de energia e, desse modo, torna-se indisponível para a síntese e reparação tecidual. Se, nesse caso, ocorre um aumento da ingestão de carboidratos e lipídios, verifica-se uma menor necessidade de proteínas na dieta. Este fato é referido como efeito poupador de proteínas, sendo que os carboidratos são mais eficientes do que lipídios quanto a esse efeito, uma vez que carboidratos podem ser utilizados como fonte de energia por quase todos os tecidos do orga- nismo, o que não ocorre com os lipídios6,13,41,92. Síntese Protéica O processo por meio do qual as proteínas são sinteti- zadas fornece a base para a compreensão das diferenças genéticas. E também a base para a compreensão de como as propriedades próprias de cada tipo celular são mantidas, uma vez que as características que diferenciam as células são geralmente conferidas pelas proteínas celulares2-4. A seqüência de aminoácidos de uma proteína em parti- cular é geneticamente controlada. Este controle é exercido por meio de um polinucleotídeo, o ácido desoxirribonucléico DeAngelis06.indd 86DeAngelis06.indd 86 18/5/2007 10:13:4718/5/2007 10:13:47 Metabolismo de Proteínas 87 (DNA). O DNA é composto de quatro bases nitrogenadas: adenina, guanina, timina e citosina, as quais são condensa- das para formar a cadeia de DNA. A seqüência de bases no DNA é única para cada proteína que é sintetizada no organismo. Sendo assim, a seqüência de aminoácidos de cada proteína sintetizada no organismo é determinada a partir de uma região da molécula de DNA, denominada gene, que consiste de milhares de bases1-4. As moléculas de ácido ribonucléico (RNA) apresentam diferentes funções na transferência da informação celular. A maioria do RNA celular é ribossomal (rRNA). Ribossomos são grandes complexos de proteínas e RNA, que podem realizar o processo de tradução. O RNA mensageiro (mRNA) serve como molde para a síntese de proteínas e transmite a informação a partir do DNA para o ribossomo. O RNA de transferência (tRNA) transporta aminoácidos específicos, a partir do pool intracelular de aminoácidos livres, para os l ribossomos. Cabe ressaltar que a síntese protéica é de- pendente da simultânea presença de todos os aminoácidos necessários para a síntese de uma determinada proteína e do fornecimento de energia. Se há uma insuficiência em qualquer um desses fatores, as etapas da biossíntese de proteínas não ocorrem de maneira normal24,93. Transcrição A síntese de mRNA a partir do DNA no núcleo celular é denominada transcrição. O mRNA é utilizado para carrear a informação a partir do DNA dos cromossomos para a superfície dos ribossomos, que estão presentes no citosol. O RNA, particularmente o mRNA, é uma molécula muito me- nor e significativamente menos estável em comparação ao DNA, ou seja, o RNA apresenta uma meia-vida muito curta (minutos a horas) comparada àquela do DNA nuclear (anos). Devido à meia-vida curta do RNA, as bases que o compõem devem ser continuamente ressintetizadas7,9. Tradução O processo de tradução representa a síntese da proteína, a qual ocorre no citosol e necessita de ribossomos, mRNA, tRNA e vários fatores protéicos. O ribossomo é o local onde ocorre a síntese de proteínas. O mRNA e o tRNA, que se ligam ao ribossomo durante o curso da síntese protéica, são responsáveis pela ordenação correta dos aminoácidos na proteína nascente3. Um códon — uma série de três bases adjacentes umas às outras na seqüência — especifica um determinado aminoácido, sendo que vários códons podem especificar o mesmo aminoácido. Dentre os 64 códons possíveis, verifica- se que 61 codificam aminoácidos e os três restantes são sinaisde terminação1,2. Antes que um aminoácido possa ser incorporado na cadeia protéica nascente, o mesmo deve ser ativado. Uma ligação covalente é formada entre o aminoácido e o tRNA, o que forma um aminoacil-tRNA. A formação da cadeia po- lipeptídica ocorre em três etapas: iniciação, alongamento e terminação. Na etapa de iniciação, o primeiro aminoacil-tRNA liga-se ao ribossomo e ao mRNA. O segundo aminoacil-tR- NA forma um complexo com o ribossomo e com o mRNA. O sítio de ligação do segundo aminoacil-tRNA é próximo ao do primeiro aminoacil-tRNA e uma ligação peptídica forma-se entre os aminoácidos (alongamento da cadeia). O processo de alongamento da cadeia envolve a translo- cação do ribossomo ao longo do mRNA até que a cadeia polipeptídica esteja completa. Finalmente ocorre a etapa de terminação da síntese protéica, sendo os códons UAA, UAG e UGA sinais de terminação. Esses códons não são reconhecidos por nenhum tRNA, mas são reconhecidos por proteínas denominadas fatores de liberação, que bloqueiam a ligação de um novo aminoacil-tRNA como também afetam a atividade da peptidiltransferase – enzima que catalisa cada ligação peptídica –, de modo que a ligação entre o terminal carboxílico do peptídeo e o tRNA seja hidrolisada4,7,25. No processo de tradução é comum que vários ribos- somos estejam ligados ao mesmo mRNA, formando um complexo denominado polissomos. Cada ribossomo em um polissomo tem um polipeptídio em um estágio diferente da tradução, o qual depende da posição do ribossomo à medida que esse se move ao longo do mRNA e traduz a mensagem genética. Além disso, quimicamente, a polimerização dos aminoácidos em proteínas é uma reação de desidratação entre dois aminoácidos (Fig. 6.8)3,25,94. Após a tradução, algumas proteínas emergem a partir do ribossomo prontas para o seu funcionamento, enquanto outras sofrem uma variedade de modificações pós-traducio- nais. Estas alterações podem resultar em: i. conversão para uma forma funcional; ii. direcionamento para um compartimento subcelular específico; iii. secreção a partir da célula; iv. alteração na atividade ou estabilidade. A informação que determina o destino pós-traducional de uma proteína reside na sua estrutura94. A partir do ponto de vista nutricional e metabólico, é relevante reconhecer que a síntese protéica é um processo contínuo realizado nas células do organismo. Em estado de equilíbrio, ou seja, quando não há um saldo de aumento ou de diminuição de proteína corporal, verifica-se que a síntese DeAngelis06.indd 87DeAngelis06.indd 87 18/5/2007 10:13:4818/5/2007 10:13:48 88 Fisiologia da Nutrição Humana. Aspectos Básicos, Aplicados e Funcionais protéica é balanceada por igual quantidade de degradação protéica. A ingestão inadequada de proteínas, tanto em die- tas hipoprotéicas quanto em dietas com ausência ou baixa concentração de um ou mais aminoácidos indispensáveis (denominados nesta situação de aminoácidos limitantes), tem como principal conseqüência a alteração do balanço protéico, uma vez que a taxa de síntese de algumas pro- teínas corporais diminui enquanto a degradação protéica continua, o que propicia o fornecimento desses aminoácidos a partir de proteína endógena95. Regulação Hormonal da Síntese Protéica Tanto a síntese quanto a degradação de proteínas são controladas por hormônios. O hormônio de crescimento es- timula a síntese protéica, aumentando assim a concentração de proteína nos tecidos. No período de intenso crescimento em crianças, o hormônio de crescimento é regulado pelo IGF-1, que é sintetizado por vários órgãos, especialmente pelo fígado. A insulina também estimula a síntese protéica, acelerando o transporte de aminoácidos através da membra- na celular, sendo que a ausência de insulina diminui a síntese protéica. A testosterona é outro hormônio que estimula a síntese protéica durante o período de crescimento. Os glu- cocorticóides estimulam a degradação protéica muscular fornecendo substrato para a gliconeogênese e cetogêneses. A tiroxina, indiretamente, afeta o metabolismo protéico, aumentando a sua velocidade em todas as células e, assim, conseqüentemente, a velocidade das reações anabólicas e catabólicas das proteínas. Em doses fisiológicas, e com adequada ingestão energética e de aminoácidos, a tiroxina aumenta a síntese protéica. No entanto, em situações de deficiência energética ou em grandes doses não fisiológicas, a tiroxina tem um efeito contrário, ou seja, catabólico, no metabolismo protéico27,96,97. Catabolismo Protéico Diferentes Vias de Catabolismo Protéico Células morrem sob uma base regular e programada, denominada apoptose, e seus componentes moleculares são metabolizados. Proteínas individuais também sofrem turnover regular sob condições normais. A meia-vida der uma proteína pode ser ≤ 1 hora, tais como ornitina des- carboxilase, fosfoquinase C e insulina; ou ser de diversos meses, tais como hemoglobina e histonas, ou ser equiva- lente à vida do organismo, como os cristalinos oculares. Contudo, a maioria das proteínas sofre turnover a cadar poucos dias98. A heterogeneidade no turnover de diferentes proteínas,r igualmente na mesma célula, sugere que o processo é seletivo. Proteínas são degradadas intracelularmente por vários sistemas, incluindo a via dependente de ubiquitina, macroautofagia e microautofagia. Quando uma proteína sofre algum tipo de lesão (alteração), essa é “marcada” FIG. 6.8 Ligação peptídica com perda de uma molécula de água. DeAngelis06.indd 88DeAngelis06.indd 88 18/5/2007 10:13:4818/5/2007 10:13:48 Metabolismo de Proteínas 89 pela proteína ubiquitina (76 aminoácidos), em uma reação enzimática dependente de ATP. A molécula de ubiquitina serve como um “marcador” que direciona a proteína alte- rada para ser hidrolisada pelo proteossoma, que é uma partícula em forma cilíndrica presente no interior celular (Fig. 6.9). Em mamíferos, o proteossoma consiste de 28 polipeptídios e apresenta um peso molecular de 2.000.000. As proteínas dessa partícula constituem aproximadamente 1% do total das proteínas celulares. O proteossoma é utilizado na degradação de proteínas, resultando na for- mação de pequenos peptídeos. Além disso, é essencial na degradação de proteínas sinalizadoras, tais como fatores de transcrição, que, em algumas circunstâncias, necessi- tam estar presentes na célula por períodos limitados de tempo6,98-100. Na superfície citossólica do retículo endoplasmático verifica-se a ocorrência da ligação da molécula de ubiquitina a uma proteína alterada. Posteriormente, a proteína ligada a ubiquitina é reconhecida e desdobrada por proteínas es- peciais presentes na “entrada” (em inglês gate = “portão”) do proteossomo. A proteína desdobrada no interior do proteossomo sofre a ação de uma variedade de proteases, que catalisam a degradação da proteína “marcada” para peptídeos de 7 a 10 aminoácidos. Cinco tipos de proteases estão presentes no proteossomo de mamíferos. Durante o jejum, a via dependente de ubiquitina é ativada, estimu- lando a degradação de proteínas e auxiliando no aumento da neoglicogênese6,79. Contudo, a adição de ubiquitina para proteínas de mem- brana (como aquelas presentes na membrana plasmática) também “marca” essas proteínas para a proteólise. Porém, nessa situação, a molécula de ubiquitina serve para direcio- nar a proteína para a via endolisossomal e a degradação ocorre nos lisossomos. Em relação à degradação de proteínas citoplasmáticas, esta não é realizada de maneira indiscriminada. Proteínas cujos aminoácidos localizados na posição NH2-terminal são metionina, serina, treonina, alanina, valina, cistina, prolina ou glicina, são resistentes à proteólise, enquanto proteínas que apresentam outros aminoácidos na posição NH2-terminal podem ser desesta- FIG. 6.9 A molécula de
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