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UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA DEPARTAMENTO DE BIOQUÍMCA E BIOLOGIA MOLECULAR BQI 103- BIOQUÍMICA I Princípios de Bioenergética Introdução Bioenergética é o estudo quantitativo das transformações de energia que ocorrem nos organismos vivos, bem como da natureza e função dos processos químicos nelas envolvidos. Introdução Propriedade fundamental dos seres vivos: aproveitar a energia de diversas fontes canalizando-as para o trabalho biológico. Como os organismos vivos fazem estas transformações? De onde vem a energia para os processos biológicos? Por que algumas reações são espontâneas e outras não? Biossistemas Formas e conversões observadas 1. Músculo Transformação de energia elétrica potencial em cinética e produção de trabalho mecânico tipo força X distância (FXD) 2. Coração Idem, trabalho do tipo pressão X variação de volume (PΔV), com ejeção de sangue: transporte. 3. Membrana Transporte de íons contra gradiente de energia osmótica pelo trabalho elétrico e mecânico 4. Ouvido a) Tímpano b) Cóclea Energia sonora, volume X variação de pressão (VΔP), em movimento. Deslocamento hidráulico em pulso elétrico. 5. Laringe Energia química em trabalho muscular e energia sonora (VΔP). 6. Escaravelho bombardeiro Trabalho (PΔV), por decomposição de H2O2, pela catalase. Lança torrões a distância. 7. Receptores mecânicos Transformam pressão em pulso elétrico, como na sensação do tato. 8. Receptores térmicos Transformam energia térmica em pulso elétrico. Percepção de calor. 9. Retina Transforma energia eletromagnética (luz), em pulso elétrico. 10. Folhas verdes Transformam energia eletromagnética (luz), em trabalho químico de síntese de moléculas o que equivale a um acúmulo de energia potencial. 11. Vaga-lumes, algas e bactérias Transformam energia química potencial em eletromagnética (luz). 12. Bactérias magnetos- táticas Percebem campos magnéticos orientadores (magnetossomas). 13. Pomba correio Transformam campos magnéticos terrestres em pulso elétrico, ligados a sua orientação. Conceitos básicos da termodinâmica Sistema: porção definida do espaço: • Aberto → trocas de energia e massa • Fechado → trocas de energia • Isolado → sem trocas Ambiente: tudo que está em volta do sistema Processo: toda transformação que ocorre no sistema e/ou no ambiente: • Isobárico → P constante • Isovolumétrico → V constante • Isotérmico → T constante Unidades Algumas constantes físicas e unidades utilizadas em termodinâmica: Constante de Faraday: F = 96,48 j/mol; Constante dos gases: R = 8,315 j/mol (0,0082 kj/mol); Energia (unidade de ΔG): joule (j) e caloria(cal) 1 caloria = energia para elevar a temp. de 1g de água de 14,5 a 15,5 ºC. 1 cal = 4,18 j Metabolismo basal adulto: 7.000kj/dia; Exercício físico: 4 a 6 vezes mais. Unidades Temperatura: escala absoluta em graus Kelvin •T(K) = 273 + temperatura ºC Volume: m3 ou litro (L) Massa: grama/quilograma e Mol Leis da termodinâmica Entalpia e Entropia Entalpia (H): energia na forma de calor – em uma reação química reflete os tipos e números de ligações Reação endotérmica → ( + ) o sistema ganha calor Reação exotérmica → ( - ) o sistema perde calor As transformações biológicas de energia seguem as leis da termodinâmica; Leis da termodinâmica Entalpia e Entropia Entropia (S): expressão quantitativa para a casualidade em um sistema ou energia que não realiza trabalho; 1ª Lei (conservação das energia): em todas as transformações a energia do universo permanece constante, embora possa mudar de forma. 2ª Lei (Entropia): a entropia do universo sempre aumenta em todos os processos naturais. “ Em um sistema isolado a energia disponível para o trabalho decresce em todo processo real” Leis da termodinâmica A primeira lei da termodinâmica (a) A oxidação da glicose C6H12O6 + 6 O2 6 CO2 + 6 H2O 7 moléculas 12 moléculas O2 (um gás) GLicose (um sólido) CO2 (um gás) H2O (um líquido) Energia livre de Gibbs (G) “Energia capaz de realizar trabalho àT e P constantes” Sitemas Biológicos: T e P constantes ΔG = ΔH – TΔS Em um processo natural, se: ΔG < 0, será espontâneo ΔG > 0, não será espontâneo ΔG = 0, estará em equilíbrio Coordenada da reação (a) Exemplo mecânico (b) Exemplo químico E n e rg ia l iv re , G Endergônica Exergônica Trabalho realizado para elevar objeto Perda da energia potencial da posição Reação 2 Reação 1 Reação 3 Glicose + Pi Glicose 6-fosfato Glicose + ATP Glicose 6-fosfato + ADP Variação de energia livre da reação ΔG = Gprodutos – G reagentes Seja a reação reversível: A + B C + D A variação de energia livre é uma expressão da força que impulsiona o sistema para o equilíbrio e é dada pela equação: • ΔG = a variação de energia livre em quaisquer condições; • ΔG° = a variação de energia em condições padrões (pré-fixadas [R] e [P] = 1M, T = 298K e P = 1atm); • R = constante dos gases; • T = temperatura absoluta (K); • [ ] = concentração molar. ΔG = ΔG° + R.T.ln [C].[D] [A].[B] Eq. 1 Variação de energia livre da reação ΔG depende das concentrações de reagentes e produtos e de ΔG° Enquanto o sistema atinge o equilíbrio, ΔG = 0 e a Eq. 1, se torna: 0 = ΔG° + R.T.ln [C]eq.[D]eq [A]eq.[B]eq ΔG° = - R.T.ln [C]eq.[D]eq [A]eq.[B]eq Eq. 2 Variação de energia livre da reação A variação de energia livre padrão está diretamente relacionada com a constante de equilíbrio; A relação entre as concentrações de reagentes e produtos no equilíbrio definem a constante de equilíbrio Keq; ΔG° = - R.T.ln Keq Eq. 4 Keq = [C]eq.[D]eq [A]eq.[B]eq Eq. 3 Substituindo na Eq. 2: ΔG° é uma expressão matemática alternativa da constante de equilíbrio. Condições padrão utilizadas em bioquímica (ΔG’°) As condições padrão ([R] = 1M) não são adequadas para descrever as reações celulares, principalmente, aquelas envolvendo H+; Assim foi definida ΔG’° (delta G linha zero ) em condições próximas àquelas da célula: pH = 7 e meio aquoso diluído de forma que os valores de [H+] e [H2O] estão incluídos em ΔG’°. Então a Eq. 1 em bioquímica se torna: ΔG = ΔG’° + R.T.ln [C].[D] [A].[B] Eq. 5 Exemplo para diferenciar ΔG e ΔG’° Hidrólise do ATP: ATP + H2O ADP + Pi Nas condições padrões (bioquímica): pH = 7,0; T = 25°C; [ATP] = [ADP] = [Pi] = 1M ΔG’º = - 30,5 kj/mol (ΔG’º = variação padrão de energia livre é uma constante física de cada reação) Nas condições celulares (neurônios de rato): pH = 7,0; T = 25°C; [ATP] = 2,59x10-3 M; [ADP] = 0,73x10-3 M; [Pi] = 2,72x10 -3 M ΔG = - 48,3 kj/mol (ΔG = variação real de energia livre → aplicação da Eq. 5) Ribose Adenina As definições termodinâmicas de equilíbrio e velocidade das reações S P K’eq = [P] [S] G = energia livre de Gibbs ΔG = Gprodutos - Greagentes ΔG’° = - R.T.ln K’eq R = constante dos gases (0,082 kj/mol); T = temperatura absoluta (298K) ... ... K´eq ΔG´° (kJ/mol) 10-6 34,2 10-5 28,5 10-4 22,8 10-3 17,1 10-2 11,4 10-1 5,7 1 0,0 101 -5,7 102 -11,4 103 -17,1 Relação entre K’eq e ΔG’° • ΔG’° positivo = reação não favorável • ΔG’° igual a zero = reação no equilíbrio; • ΔG’° negativo = reação favorável, mas não significa que ocorrerá com velocidade rápidaAcoplamento de reações e aditividade de variação de energia livre • As variações de energia livre padrão são aditivas; • Uma reação com ΔG positivo é possível acoplando-se outra reação com ΔG negativo. ATP + H2O (1) ADP + Pi ΔG’º = + 30,5 kj/mol Esta reação não acontece espontaneamente no sentido de formação de ATP. • Exemplos: fosforilação do ADP na glicólise: Acoplamento de reações e aditividade de variação de energia livre Piruvato + Pi (2) PEP + H2O ΔG’º = - 62,0 kj/mol Reação espontânea (3) Reação acoplada – formação de ATP na glicólise: ATP + Piruvato ADP + PEP ΔG’º = - 31,5 kj/mol - 62,0 + 30,5 Acoplamento de reações e aditividade de variação de energia livre As variações de energia livre padrão são aditivas: B (1) A ΔG’º1 D (2) C ΔG’º2 B + D (2) A + C ΔG’º1 + ΔG’º2 Glicose-6-P + H2O Glicose + Pi ADP + Pi ATP + H2O ΔG’º = 13,8 kj/mol ΔG’º = -30,5 kj/mol ATP + glicose ADP + Glicose-6-P ΔG’º = -16,7 kj/mol + Relações entre K’eq, ΔG’º e a direção das reações químicas sob condições padrão Quando a K’eq é: ΔG’º é: Iniciando os componentes 1 mol/L, a reação: > 1,0 Negativo Procede para a direita = 1,0 Zero Está no equilíbrio < 1,0 Positivo Procede no reverso Relações entre K’eq, ΔG’º e a direção das reações químicas sob condições padrão Exemplo de cálculo: Reação catalisada pela fosfoglicomutase a 25 °C e pH 7,0: Glicose-6-fosfato Glicose-1-fosfato Inicial: [S] = [P] = 20mM No equilíbrio: [Gli-1-P] = 1mM e [Gli-6-P] = 19mM Calcular K’eq e ΔG’º ΔG’° = - R.T.ln K’eq Dados: R = 8,315j/mol e T = 298K As bases químicas da grande variação de energia livre associada com a Hidrólise do ATP Adenina Adenina Adenina Hidrólise provoca diminuição de repulsão entre as cargas Estabilização por ressonância Ionização A participação do ATP em uma reação (a) Reação escrita em um passo (b) Reação real em dois passos Glutamil-fosfato ligado à enzima Glutamato Glutamina O fluxo dos grupos fosfatos através do ATP Composto s de alta energia Composto s de baixa energia Fosfoenolpiruvato Fosfocreatina 1,3 Bifosfoglicerato Glicose-6- Glicerol Adenina Creatina Δ G ’° d e h id ró li s e ( k J /m o l) Nutrientes estocados Alimentos ingeridos Fótons solares Vias de reações catabólicas (exergonicas) Outros traba- lhos celulares Biomoléculas complexas Trabalho mecânico Trabalho osmótico Vias de reações anabólicas (endergônicas) Produtos simples, percursores Reações biológicas de oxi-redução A variação de energia livre é diretamente proporcional à diferença de potencial de redução das espécies reagentes e ao número de elétrons transferidos; ΔG = - n.F.ΔE ΔG’º = - n.F.ΔE’0 para quaisquer condições para condições padrões • n = n° de elétrons transferidos • F = constante de Faraday (96,44kj/mol.V) • E = potencial de redução • Δ = Ereceptor - Edoador Relação entre E e E0 (equação de Nernst) E = E’0 + R.T.ln [receptor de elétrons] nF [doador de elétrons] Reações biológicas de oxi-redução Célula de referência de força eletromotiva conhecida: eletrodo de H no qual o H2 gasoso à pressão de 101,3kPa é equilibrado ao eletrodo com H+ 1M Célula referência teste contendo concentrações 1M das espécies reduzida e oxidada do par redox sob análise (pressão padrão) Ponte salina (solução de KCl) Aparelho para medir força eletromotriz (fem) Medida do potencial de redução padrão (E’°) de um par redox: Reações biológicas de oxi-redução Os potenciais de redução padrão podem ser utilizados para calcular a variação de energia livre Principais transportadores de elétrons (reduzido) Adenina (oxidado) No NADP este grupo hidroxila esta esterificado com fosfato Principais transportadores de elétrons Semiquinona Totalmente reduzida Flavina Adenina Dinucleotídio (FAD) e Flavina Mononucleotídio (FMN) Algumas Enzimas (flavoproteínas) que empregam coenzimas da flavina Enzima Flavina nucleotídio Acil-CoA graxo desidrogenase FAD Diidrolipoil desidrogenase FAD Succinato desidrogenase FAD Glicerol 3-fosfato desidrogenase FAD NADH desidrogenase FMN Glicolato desidrogenase FMN Principais transportadores de elétrons SABATINA PRINCÍPIOS DE BIOENERGÉTICA: INDIVIDUAL – ENTREGAR 1) O estudo da energética das reações celulares é geralmente desenvolvido sob condições-padrão, a pH 7,0. Por que? 2) Diferenciar G, G0 e G0l. Citar as condições-padrão definidas para as reações não-celulares e para as reações celulares. 3) O potencial de redução padrão, E0 l, de um par redox é definido para a reação de meia-célula: agente oxidante + n elétrons agente redutor Dados os valores de E0’ para os pares conjugados redox NAD +/NADH (–0,32 V) e piruvato/lactato (–0,19 V): a) Qual desses pares conjugados tem maior tendência a perder elétrons ? Explicar. b) Qual é o agente oxidante mais forte ? Explicar. c) Para a reação: Piruvato + NADH + H+ lactato + NAD+ em que as concentrações iniciais de reagentes e produtos é de 1 M, a pH 7, em qual direção a reação se processará ? d) Calcular o G0’ a 250C e a constante de equilíbrio.