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palestra Flavia

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Palestra da professora Flávia Inês Schilling 
Faculdade de Educação - USP - 15/09/2011 
 
 “A violência nos esgota!” Foi assim que Schilling começou sua fala. Ela fala que quem 
estuda esta temática também vive esse esgotamento emocional. O que parece é que há bastante 
tempo essa discussão não avança e, aparentemente, não há como romper com essas formas de 
pensar a violência. Por isso, a pesquisadora tenta trabalhar de outra maneira: usa a escola justa. 
Talvez essa visão seja mais radical, mas ajuda a pensar um pouco diferente. Schilling acredita 
que as pessoas ficaram felizes em discutir esse tema na faculdade. Existe uma quantidade 
enorme de trabalhos e pesquisas acadêmicas sobre a questão da violência nas escolas, mas são 
pesquisas que pouco nos chegam. Em uma iniciação científica, de 2005, um pesquisador apontou 
políticas públicas para solucionar o problema da violência e pensou os modos usados pelos 
governantes para dar atenção a essa questão. Muitos anos se passaram e os problemas persistem 
– a pesquisa foi de Ana Paula Caloni de Menezes, intitulada “Violência em meio escolar: análise 
dos projetos públicos de parceria escola/comunidade como uma forma de prevenção da 
violência”, com orientação de Schilling. A conclusão de Menezes era que ela tinha analisado 
muita coisa e continuava absolutamente “perdida”. 
 A dificuldade começa, porque, embora o tema seja abordado, os próprios documentos 
não definem as práticas consideradas violentas. É uma impossibilidade de agir, por não saber o 
que se encaixa em violência. Perguntas como: O que é indisciplina? O que é violência?, são 
recorrentes. 
 Hoje o que está em questão é o bullying – que simboliza a violência na escola atual. 
Violência parece um termo que abrange novas práticas e que eram vistas como naturais. É uma 
construção social que dita aquilo que se encaixa ou não como um ato violento. Antes o menino 
“passava uma cantada” na menina e era considerado normal; hoje, uma cantada pode ser um 
assédio moral. Com a “palmada” acontece o mesmo, também se trata de um tema polêmico, 
sobre algo que um dia foi permitido. Que conjuntos de práticas cabem nesse termo violência? 
Para Schilling, parece um “cesto” onde as coisas são retiradas ou colocadas, dependendo das 
lutas sociais. Os apelidos também foram considerados uma brincadeira - falar coisas sobre o 
outro fazia parte das brincadeiras, principalmente do código masculino. Entretanto, começam a 
aparecer os especialistas que vão discutir e mudar a visão sobre o assunto. 
 Exemplos como as tiras “Calvin e Haroldo” mostram essas “violências”: um “valentão” 
correndo atrás do outro – mas isso não acaba em suicídio. Muitos exemplos estão no cinema e 
literatura. Houve uma geração da “Turma da Monica”; será que a Monica é vítima de bullying? 
Hoje, o Cebolinha estaria colocando suas piadas no orkut (na época ele colocava os desenhos e 
frases no muro). Será que a Monica não é a “valentona”, a que bate? Parece que a situação é 
mais complexa do que podemos ver. Não se parece com uma gangue? (a Turma da Monica 
disputa o poder da rua). Hoje, o Mauricio de Sousa não poderia publicar esses gibis, seria 
considerado um incitador da violência (o que seria altamente discriminatório). Um outro 
exemplo era o Clube do Bolinha – o menino gordo que era o herói do gibi. 
 As pessoas lidavam com esses assuntos, mas atualmente, tudo é diferente. Parece-nos que 
tudo está perdido. Sempre houve males, isso é histórico. Por muito tempo os males foram a fome 
e as pestes - as pessoas tinham vida breve e muito difícil (sem falar ao temor do inferno). Em 
cada época, sempre há medos. Mas agora parece um “medo ambiente”. Talvez a gente nunca 
tenha tido tanta segurança (quanto ao alimento e vacinas, por exemplo) e, mesmo assim, o medo 
se espalha com muita força – e a angústia da finitude nos faz produzir e fazer arte. 
 Violência é o que rompe com normalidade; mas, como definir o que é normal? O ideal é 
olhar mais de perto o que está acontecendo nas escolas. Um grupo que Schilling fazia parte 
trabalhou com três escolas públicas com queixas de violência. Eram queixas muito imprecisas. 
Trabalharam com a ideia de fazer um diagnóstico (mesmo sendo um termo clínico). O que havia 
era um mal estar nessas escolas. Os alunos se temiam, os professores se temiam e entre alunos e 
professores o mesmo acontecia. François Dubet diz que os alunos não estão dispostos a ocupar o 
lugar de alunos, mas neste caso, o mesmo acontecia em relação ao lugar dos professores e 
diretores. Com o diagnóstico podemos perceber as conexões que devem ser estabelecidas entre 
as pessoas - sozinho não há como solucionar. É preciso compreender com quem nos unimos para 
fazer determinadas ações - principalmente entre os adultos da escola, pois se o adulto não está 
forte, não há como encarar os problemas. 
 Perceber o que está acontecendo e saber diferenciar conflitos é fundamental. Algumas 
pessoas relatam a sensação de que a violência tomou conta do mundo, mas essa sensação não é 
verdade. As mortes no trânsito aumentaram, mas as mortes por homicídio diminuíram - as 
pessoas demonstram um medo maior do que o real. Precisamos ainda pensar que, algumas 
coisas, não devem ser problemas da escola, não há como esperar que a escola seja a solução para 
tudo. A escola deve formar para a democracia, prevenir o uso de drogas, orientar as crianças que 
sofrem de violência doméstica, por exemplo. Mas, se tudo for colocado para a escola, como ela 
dará conta? Devemos nos perguntar: O que a escola pode ou não pode, deve ou não deve fazer? 
O tráfico de drogas nos arredores da escola é questão de segurança pública - podemos discutir 
essa questão com os alunos, mas isso não compete à escola. Algumas pessoas querem a escola 
onipotente, mas a verdade é que ela é impotente em muitas situações. Para finalizar, uma 
provocação: uma escola justa poderia dar conta de tudo isso? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
* Palestra transcrita por Virginia Souza.

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