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Psicologia Hospitalar

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REVISTA VIRTUAL DE
PSICOLOGIA HOSPITALAR
E DA SAÚDE
y
psicópio
©
PSICÓPIO
Editor
Susana Alamy
Ano 1 - Volume 1 - Número 1 - Janeiro a Junho-2005
Edição Semestral - Distribuição Gratuita
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. i 
PSICÓPIO – REVISTA VIRTUAL DE PSICOLOGIA HOSPITALAR E DA SAÚDE 
Revista Semestral – Distribuição Gratuita 
Ano I, Volume 1, Número 1, Janeiro a Junho-2005 
 
 
Editor: Susana Alamy 
Idealização e Realização; Capa , Editoração, Diagramação e Arte Final: Susana Alamy 
Revisão: Glenda Rose Gonçalves-Chaves 
WebMaster: Carlos Alexandre de Melo Pantaleão 
 
 
Conselho Editorial: 
Susana Alamy – psicoterapêuta, psicóloga clínica e hospitalar, professora de psicologia hospitalar e 
supervisora de estágios. CRPMG 6956 
Elisângela Lins – psicoterapêuta, psicóloga clínica e hospitalar, professora de psicologia do CESUR – Centro 
de Ensino Superior de Rondonópolis. CRPMT 1281-2 
 
 
Direitos Autorais 
Os direitos autorais dos artigos publicados pertencem ao Editor de Psicópio: Revista Virtual de Psicologia 
Hospitalar e da Saúde, Susana Alamy. Copyright © Susana Alamy. Todos os direitos reservados. Esta revista 
é protegida por leis de Direitos Autorais (copyright) e Tratados Internacionais. É permitida a sua duplicação 
ou a reprodução deste volume, em qualquer meio de comunicação, eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia 
ou impresso, desde que integralmente. A reprodução parcial poderá ser feita somente mediante a autorização 
expressa dos autores dos artigos e do editor da revista. 
 
 
Para citação da revista na bibliografia: 
ALAMY, Susana (Ed.). Psicópio – Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde, Belo Horizonte, a.1, 
v.1, n.1, jan.-jul. 2005. Disponível em: <http://geocities.yahoo.com.br/revistavirtualpsicopio>. Acesso em: 
(dia em números) (mês abreviado em letras minúsculas) (ano). 
 
 
Para citação de artigos da revista na bibliografia - modelo: 
(Sobrenome do autor em letras maiúsculas), (nome do autor com a 1ª. letra maiúscula e as demais 
minúsculas). (Nome do artigo em letras comuns). Psicópio – Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da 
Saúde, Belo Horizonte, a.1, v.1, n.1, jan.-jul. 2005. Disponível em: 
<http://geocities.yahoo.com.br/revistavirtualpsicopio>. Acesso em: (dia em números) (mês abreviado em 
letras minúsculas) (ano). 
 
 
Fale com o Editor 
E-mail: revistavirtualpsicopio@yahoo.com.br ou psicologiahospitalar@uol.com.br 
Correios: Av. Prudente de Morais, 290 sl. 810 
 Bairro Cidade Jardim 
 30380-000 Belo Horizonte / MG 
Telefone: (31) 9141-9106 
 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. ii 
PSICÓPIO – REVISTA VIRTUAL DE PSICOLOGIA HOSPITALAR E DA SAÚDE 
Revista Semestral – Distribuição Gratuita 
Ano I, Volume 1, Número 1, Janeiro a Junho-2005 
 
SUMÁRIO 
 
 
Editorial .............................................................................................................................................. iii 
 
Nota Introdutória ................................................................................................................................. iv 
 
História do Psicópio ............................................................................................................................. v 
 
O sujeito, o desamparo e o analista ....................................................................................................... 06 
Lucinda Moreira dos Santos Mendonça (Belo Horizonte/MG) 
 
Reflexões sobre a dor do paciente infantil oncológico’ ............................................................................ 10 
Lauren Beltrão Gomes (Florianópolis/SC) 
 
Diferenças entre o atendimento psicológico em meio hospitalar e em consultório ..................................... 14 
Vanina Ribeiro (Angola/África) 
 
A prática hospitalar – como é a atuação do psicólogo? ........................................................................... 17 
Susana Alamy (Belo Horizonte/MG) 
 
Uma experiência malograda de atendimento infantil .............................................................................. 18 
Priscila Said Saleme (Belo Horizonte/MG) 
 
Sentir na pele ....................................................................................................................................... 22 
Michele Costa e Silva (São Paulo/SP) 
 
A importância da psicologia para a humanização hospitalar .................................................................... 25 
Leida Mirian Hercolano Pinheiro (Cachoeiro do Itapemirim/ES) 
 
Psicólogo hospitalar: um espelho de reflexão ......................................................................................... 36 
Andréia Santiago Sobreira Santos (Cuiabá/MT) 
 
Estudo de caso 
Acompanhamento da mãe de um paciente de dois anos de idade com diagnóstico de asma ....................... 37 
Andréia Santiago Sobreira Santos (Cuiabá/MT) 
 
Depoimento de paciente 
Lugar de igualdade .............................................................................................................................. 39 
Gabriela Lima (Belo Horizonte/MG) 
 
Modelo de anamnese / protocolo 
Protocolo – doenças respiratórias / anamnese infantil .............................................................................. 40 
Susana Alamy (Belo Horizonte/MG) 
 
Links – Bibliotecas virtuais .................................................................................................................. 44 
 
Eventos ............................................................................................................................................... 45 
 
Normas para envio de artigos ................................................................................................................ 46 
 
 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. iii 
EDITORIAL 
 
 
Pretendemos com este espaço ampliar o diálogo entre professores e alunos, profissionais e leigos, no âmbito 
da psicologia hospitalar e da saúde. 
 
Temos a pretensão de alcançar um número significativo de contribuições através das produções científicas e 
dos relatos pessoais de pacientes e familiares, pois objetivamos que também seja um lugar de incentivo à 
escrita. 
 
Constitui-se nossa base editorial a comunicação ética e moral, hoje tão disvirtuada em sua condução, e o 
respeito às opiniões, mesmo que divergentes das nossas. 
 
Sejam bem-vindos!!! 
 
Susana Alamy 
Verão 2005 
 
 
 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. iv 
NOTA INTRODUTÓRIA 
 
 
Falar de psicologia hospitalar remete-me originariamente a pacientes e familiares e por isso não posso abster-
me de citar Tolstoi, in: Ana Karenina1: 
 
“Todas as famílias felizes se parecem entre si; 
as infelizes são infelizes cada uma à sua maneira.” 
 
E é dentro desse contexto que se posicionarão os psicólogos hospitalares, quando essa maneira própria de 
cada um lidar com o adoecimento e a internação hospitalar se interpuser à sua felicidade, sem caber ao 
psicólogo julgamentos de valores e escalas de gravidade da doença. Ao paciente cabe a avaliação do seu 
sofrimento e da significação da sua patologia e como os sentem merece o respeito e a solidariedade de todos. 
 
Entendo que a psicologia hospitalar vem funcionar como um catalizador do paciente consigo mesmo, no 
contexto específico do adoecimento, quando permite que o paciente e seus familiares encontrem uma 
maneira satisfatória de continuar a vida, mesmo diante do enfrentamento de percalços e encausos tão 
exaustivamente sofridos. 
 
Traz sua contribuição também aos profissionaisde saúde, vializando o espaço das emoções tão 
condicionadamente racionalizadas, permitindo assim um atuar mais autêntico e menos estressante. 
 
A razão de existir da Psicologia Hospitalar? Podemos responder simploriamente com Léo Buscaglia, in: A 
História de Uma Folha2: 
 
“- Uma razão para existir – respondeu Daniel. – Tornar as coisas mais 
agradáveis para os outros é uma razão para existir.” (...) 
 
E não me tomem tão simplista, pois é imperioso o estudo da psicopatologia, da sociologia, da antropologia e 
de tantas outras ciências, para que nos situemos e tenhamos o cabedal necessário e indispensável para o 
“pleno” exercício da nossa profissão, pois 
 
“- Tudo depende da habilidade e da prudência com que se fazem as coisas...” (Tolstoi, p. 84). 
 
 
O Editor 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
1 Tolstoi, Leão. Ana Karenina, p. 13. Obra Completa. José Aguilar, Rio de Janeiro, 1961. 
2 Buscaglia, Léo. A História de Uma Folha. Record, Rio de Janeiro – São Paulo, 2003. 
 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. v 
HISTÓRIA DO PSICÓPIO 
 
 
Psicópio é o nome da presente revista que vem, na realidade, mais uma vez, representar, por meio de um 
símbolo (e também de um significante), o que Susana Alamy buscou ao pensar no significado da psicologia 
hospitalar, constituindo em um logotipo que acompanha seus trabalhos e, agora, dá nome também a esta 
revista, cujo objetivo é difundir conhecimento e experiências profissionais no âmbito da psicologia hospitalar 
e da saúde. 
 
E por detrás deste símbolo está um uma história que demonstra a fusão de significantes, num almálgama 
que é capaz de espelhar o símbolo e fazer ressaltar o significado. O símbolo primeiramente foi criado por 
Susana Alamy e da inspiração de Maria Beatriz Machado Alamy1 surgiu o nome, proveniente da letra grega 
psi (y), que representa a psicologia e do estestocópio (aparelho com o qual se faz a ausculta dos pulmões, 
corações), símbolo vinculado à medicina. Essa junção conduziu a pensar justamente em psicologia, 
medicina, pacientes, doença, saúde, comportamentos e sentimentos, levando pois a esta unidade que 
representa a psicologia hospitalar. Afinal: psi mais (estetos)cópio:Psicópio. Instrumento do psicólogo capaz 
de ascultar a alma. 
 
Dessa maneira, é que o Psicópio, a partir do seu nascimento, já se figura como um logotipo capaz de 
exprimir a grandeza desse trabalho, que vem sendo executado ao longo de anos, com a mesma dedicação e 
afinco. Hoje , o mesmo torna-se nome também desta revista e, no esteio de sua trajetória, já se pode 
vislumbrar um caminho aberto para debates e crescimento profissional. 
 
Glenda Rose Gonçalves-Chaves 
E-mail: glendarose@uol.com.br 
 
 
1 Bacharel em Letras Clássicas, musicista e folclorista. 
 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 6 
O SUJEITO, O DESAMPARO E O ANALISTA* 
Lucinda Moreira dos Santos Mendonça** 
 
 
A LAGOSTA 
 
Não somos diferentes de um crustáceo 
particularmente duro. A lagosta cresce formando e 
largando uma série de cascas duras, protetoras. Cada 
vez que ela se expande, de dentro para fora, a casca 
confinante tem de ser mudada. A lagosta fica exposta e 
vulnerável até que, com o tempo, um novo revestimento 
vem substituir o antigo. 
A cada passagem de um estágio de crescimento 
humano para outro, também temos de mudar uma 
estrutura de proteção. Ficamos expostos e vulneráveis, 
mas também efervescentes e embriônicos novamente, 
capazes de nos estendermos de modo antes ignorado. 
Essas mudanças de pele podem durar vários anos; 
entretanto, se sairmos, de cada uma dessas passagens, 
entramos num período mais prolongado e mais estável, 
no qual podemos esperar relativa tranqüilidade e uma 
sensação de reconquista de equilíbrio. 
Fonte: Passagens de Gail Sheehy 
Contribuição: Cecília Caram 
 
INTRODUÇÃO 
 
A internação hospitalar pode levar o sujeito a 
deparar-se com angústias que antes não eram 
percebidas e ele se vê incapacitado de administrá-
las. Este encontro com algo que o machuca, que o 
faz sofrer, é na verdade uma conseqüência do 
desamparo radical, ou seja, é algo que vem com o 
sujeito desde o seu nascimento, mas que só se dá 
conta dele quando algo lhe falta. O desamparo trás 
consigo vários sentimentos como os de: solidão, 
invalidez, raiva, tristeza etc. e com isso o paciente 
se vê necessitado do acolhimento e da ajuda do 
outro. 
 É comum que estes sentimentos apareçam após 
uma reflexão sobre vivências passadas, ainda não 
cicatrizadas ou não re-experimentadas. E é com o 
aparecimento destes que a necessidade de um 
acompanhamento profissional do paciente, e, 
muitas vezes também do seu acompanhante, torna-
se de extrema importância. 
É preciso que o paciente seja escutado, pois, 
normalmente, este é calado e quieto e, muitas 
vezes, a equipe que o atende não percebe o seu 
sofrimento e o vê como um ótimo paciente, pois 
não reclama das intervenções a submeter-se, dos 
exames que tem que fazer, enfim, não interroga 
sobre seu cotidiano no hospital ou até mesmo sobre 
sua doença. Mas para que fazer estas interrogações, 
se, na verdade, o que ele realmente precisa falar, ou 
melhor, ser escutado e se escutar, é sobre algo 
relacionado a sua vida antes de sua hospitalização. 
E de novo ele se sente desamparado, pois não há 
quem lhe dê ouvidos, quem o repare, dando-lhe, 
assim, amparo. 
A pessoa internada ou o seu acompanhante não 
é apenas um número de leito, uma doença (um 
CID) ou um mau prognóstico, é ser humano que 
deve ser escutado e amparado, ou seja, que 
necessita da intervenção de um terceiro. 
O analista pode e deve colocar-se no lugar deste 
Outro. Ele será capaz de escutar e, principalmente, 
de fazer com que o sujeito se escute e consiga 
refletir sobre seu desamparo radical, e, a partir daí, 
fortalecer-se para enfrentar seus problemas e suas 
angústias, dando-lhes reais significados. 
Aprendendo assim sobre si mesmo e conseguindo 
lidar melhor com situações que podem lhe causar 
angústias. 
 
O DESAMPARO RADICAL NA 
CONSTITUIÇÃO DO SER HUMANO 
 
O sujeito, ao nascer, necessita do amparo do 
outro, ele precisa que o outro cuide dele e quando 
isto não ocorre, não há como sobreviver. Por isso, 
pode-se dizer que o indivíduo é um ser faltante. O 
desamparo radical faz com que o sujeito busque 
incessantemente sua satisfação. Através desta 
busca, o sujeito conquistará pequenas satisfações 
que o constituirá como tal. 
Inic ialmente o objeto de satisfação do sujeito é 
oferecido pelo Outro, que interpretará, a seu modo, 
os sinais que o sujeito enviar-lhe. Será através deste 
terceiro que o sujeito começará a tornar-se humano, 
reconhecendo suas necessidades, seus desejos e 
suas demandas, deixando de ser objeto de 
satisfação do outro. 
 
“... A incapacidade em que a criança se encontra de 
satisfazer por si mesma a essas exigências orgânicas 
requer e justifica a presença de um outro. Como se dá 
esse cuidado da criança pelo outro? Uma primeira coisa 
que se deve observar é que essas manifestações 
corporais tomam imediatamente valor de signos para 
esse outro, uma vez que é ele que alivia e decide 
compreender que a criança está em estado de 
necessidade. Dito de outra forma, estas manifestações 
corporais só fazem sentido na medida em que o outro 
lhes atribui um sentido... não existe nenhuma 
intencionalidade da criança no sentido de mobilizar o 
estado de seu corpo em manifestações que teriam valor 
 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 7de mensagem destinada ao outro...”.1 
 
Esta incompletude do homem é que faz com que 
ele busque, sempre, objetos que possam realizar 
seus desejos. Mas, sabe-se que esta realização é 
impossível de ocorrer, pois, não há objetos reais 
que o satisfaça. Portanto, a primeira experiência de 
satisfação do sujeito, nunca mais será alcançada ou 
repetida. 
 
“... É graças à primeira associação produzida no 
psiquismo que o reinvestimento da imagem mnésica pela 
moção pulsional torna-se possível. O reinvestimento de 
uma tal imagem é um processo dinâmico, visto que, por 
outro lado, pode antecipar a satisfação de um modo 
alucinatório. Assim também, a essência do desejo deve 
ser procurada neste dinamismo. Ele tem por modelo a 
primeira experiência de satisfação e, para além desta 
experiência, permite orientar dinamicamente o sujeito 
na busca de um objeto suscetível de proporcionar esta 
satisfação”.2 
 
Sabe-se que o objeto do desejo, ou objeto a, 
segundo Lacan, é eternamente faltante, sendo este 
suscetível de ser preenchido por qualquer outro 
objeto durante a existência do sujeito. Por isso, os 
objetos a serem alcançados variam durante toda a 
vida e cada pessoa procurará um objeto diferente do 
da outra, o que prova a particularidade de cada um. 
Sabe-se que estes objetos não permitem a 
satisfação plena, pois são objetos da pulsão, mas 
eles já permitem uma pequena satisfação, fazendo 
com que o sujeito se contente com este pouco para 
garantir a sua sobrevivência. Não quer dizer que, ao 
se contentar com isto, o sujeito pare de procurar 
outros objetos, pelo contrário, ele inic iará mais uma 
busca, novamente. 
A falta em que o homem está inserido é a grande 
responsável pela inserção deste na linguagem. Esta 
aparecerá quando o outro já não for mais capaz de 
nomear as necessidades, as demandas e os desejos 
do sujeito. Mas, mesmo com a introdução da 
linguagem o sujeito não conseguirá nomear 
precisamente seus desejos e, por causa dessa falha 
da linguagem, o sujeito continuará sendo um ser da 
falta. 
 
“O surgimento do desejo fica, pois, suspenso à 
busca, ao re-encontro da primeira experiência de gozo. 
Mas já a partir da segunda experiência de satisfação, a 
criança, é tomada no assujeitamento do sentido, é 
intimidada a demandar para fazer ouvir seu desejo. É, 
portanto, conduzida a tentar significar o que deseja”.3 
 
1 DOR, 1992. cap. 20, p.144. 
2 DOR, 1992. cap. 20, p.141. 
3 DOR, 1992. cap. 20, p. 146. 
 
 O desamparo radical está presente durante toda 
a vida do sujeito, mas pelo fato de este estar sempre 
procurando objetos que o satisfaça e de contentar-se 
quando há uma pequena satisfação, faz com que o 
indivíduo trabalhe bem com suas faltas. Mas, 
quando o sujeito vive alguma experiência que o 
coloca em estado de choque, como por exemplo, a 
perda de um amor ou a perda da saúde, a presença 
do desamparo é sentida na forma de angústia, com 
a qual ele, provavelmente, não conseguirá lidar, e, 
mais uma vez ele se vê necessitado do auxilio do 
Outro. 
É, exatamente, neste momento em que o 
desamparo radical aparece, nesta forma tão visível, 
que a presença do analista se faz indispensável. 
 
O PAPEL DO ANALISTA FRENTE AO 
DESAMPARO 
 
Como já foi visto, quando o sujeito se vê frente 
a alguma situação que o desagrade profundamente, 
necessariamente, ele precisará de um Outro que ele 
julga ser capaz de resolver esta situação. E por isso 
o analista é chamado, pois é visto como alguém que 
detém a resolução imediata para angústia vivida 
neste momento. 
Quando o sujeito chega até ao analista, ele está 
atrás de um Outro que seja completo e, por causa 
disso, que seja capaz de lhe dar todas as respostas 
que procura, ou seja, que seja colocado no lugar do 
sujeito suposto saber. Inicialmente o analista deve 
aceitar este lugar para que ocorra a análise, pois é 
de extrema importância que o paciente esteja 
integrado com o seu tratamento e com o analista. A 
análise é uma construção que deve ser feita 
conjuntamente pelo paciente e pelo analista. O 
primeiro passo desta construção, é, exatamente, a 
transferência. 
 
“‘No começo da psicanálise é a transferência’, nos 
diz Lacan, e seu pivô é o sujeito suposto saber. O 
surgimento do sujeito sob transferência é o que dá sinal 
de entrada em análise, e esse sujeito é vinculado ao 
saber... A resolução de se buscar um analista está 
vinculada à hipótese de que há um saber em jogo no 
sintoma ou naquilo de que a pessoa quer se 
desvencilhar”.4 
 
O analista deve ter o enorme cuidado de não 
tomar para si esta posição de saber, pois ele nada 
sabe de seu paciente, e, ao colocar-se nesta posição, 
ele não deixará espaço para a falta, pois, estará 
respondendo às demandas do sujeito. 
 
4 QUINET, 1991. cap. I, p. 30 
 
 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 8 
 
“Se o analista empresta sua pessoa para encarnar 
esse sujeito suposto saber, ele não deve de maneira 
alguma identificar-se com essa posição de saber que é 
um erro, uma equivocação... Sua posição, muito mais do 
que a posição de saber, é uma posição de ignorância, 
não a simples ignorância, mas a ignorância douta. Esse 
é um termo de Nicolau di Cusa (século XV) que é 
definido como ‘um saber mais elevado e que consiste em 
conhecer seus limites’. A ignorância douta é um convite 
não apenas à prudência, mas também a humildade; um 
convite a se precaver contra o que seria a posição de um 
saber absoluto: contra a posição do analista de aceitar 
a imputação de saber que o analisante lhe faz. O saber 
é, no entanto, pressuposto à função do analista”.5 
 
A demanda que o sujeito traz para a análise não 
deve ser pega exatamente como ele a coloca. O 
analista tem o dever de questioná-la para descobrir 
o que está por detrás dela. Inicialmente o sujeito 
quer desvencilhar-se do seu sintoma, mas, o coloca 
como algo externo a si mesmo e só com o tempo é 
que este conseguirá ver que ele é o próprio 
causador de seu sintoma. E isto só ocorrerá quando 
o sujeito perceber que o analista não detém todo o 
saber e que quem o detém é ele mesmo. 
A frustração é algo que deve estar presente na 
análise, pois, será através dela que o sujeito 
começará a lidar com o não ao seu gozo, e assim 
passar a conviver com as faltas, suas e dos outros, 
de uma melhor maneira. 
Frente ao desamparo radical, o analista deve ser 
capaz de acolher o sujeito, com toda a sua angústia 
e fazer com que este consiga falar livremente sobre 
aquilo que o incomoda, permitindo que o sujeito 
elabore seu sofrimento, mas que, mesmo sabendo 
trabalhar com aquele sofrimento, ele continuará 
sendo um ser da falta. 
 
O DESAMPARO, O ANALISTA E O 
PACIENTE NO HOSPITAL... 
 
 No hospital, a questão do desamparo radical 
está muito presente, pois é um lugar onde o sujeito 
se vê freqüentemente em situações que o “colocam 
em xeque”. É um lugar em que o sofrimento é 
iminente e a angústia aparece a todo instante. A 
presença do analista no hospital é de extrema 
importância por causa deste caráter de sofrimento 
que o hospital por si causa. 
No hospital, o sujeito se volta totalmente para si 
e esta retração pode levá-lo a re-experimentar 
vivências que lhe causem um certo incômodo, pois 
o colocará frente a sua falta, frente ao desamparo 
 
5 QUINET, 1991. cap. I, p. 31 
radical. 
Durante a minha experiência no Hospital da 
Baleia tive a oportunidade de presenciar este 
sofrimento em uma mãe que acompanhava seu filho 
de dois anos e que estava com câncer generalizado. 
Ela estava no hospital há mais ou menosum mês, e 
seu filho tinha um prognóstico muito sombrio. 
Atendi-a algumas vezes e ela sempre se mostrou 
aberta aos atendimentos, mas, normalmente, estes 
giravam em torno da doença e do prognóstico de 
seu filho. 
 
Atendimento feito no dia 02/09/2002 
- Estava atendendo a uma outra paciente, quando 
pr. se aproximou e disse que queria muito 
conversar comigo. Disse-lhe que, assim que 
acabasse aquele atendimento, eu iria atendê-la. 
- Terminei o atendimento e logo depois me 
aproximei do leito do filho de pr. e antes mesmo 
de perguntar-lhe algo ela me disse: 
- Ontem briguei por sua causa lá na oncologia. 
- Então lhe perguntei por quê? E ela me 
respondeu: 
- Estava com o meu filho lá na quimioterapia e 
tinha uma outra mãe também, então, chegou 
uma estagiária da psicologia oferecendo 
atendimento para esta mãe e ela não aceitou e 
falou que psicólogo só quer saber da vida da 
gente e que por isso não presta. Então eu lhe 
falei que não era nada disso, que eles não 
queriam saber da nossa vida, mas sim nos ajudar 
a resolver os nossos problemas. 
Antes mesmo de eu falar qualquer coisa pr. me 
perguntou: 
- Lu (era assim que ela me chamava) você vem 
aqui para escutar só os problemas relacionados 
ao hospital ou eu posso lhe contar outros 
problemas que eu estou passando? 
Disse-lhe que eu estava ali para escutar aquilo que 
ela quisesse me falar. Então ela começou: 
- Lu, estou pensando em me separar do meu 
marido. Ele não ajuda em nada com o nosso 
filho. Não quer saber de pagar as contas lá de 
casa e eu estou pensando em me separar dele, o 
que você acha? 
- Como é a relação de vocês? 
- Ela é boa, mas eu não sei se gosto dele, aliás, eu 
sei que eu gosto, mas não sei se eu amo. Aliás, 
eu acho que eu... 
- Você acha que você... 
- Eu acho que eu não sei amar (alguns segundos 
de silêncio). Lá em casa eu não aprendi isso. Fui 
abandonada pelo meu pai quando eu era muito 
nova, e, por causa disso, minha mãe teve que 
ficar muito tempo ausente trabalhando para nos 
 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 9 
sustentar, então eu não aprendi o que é amar. Eu 
amo minha mãe e meus irmãos, mas eu não faço 
nada para estar com eles, para conviver com 
eles. Para mim tanto faz se eu os encontro ou 
não. E foi assim também com o meu primeiro 
marido, eu não o amava, e não fiz nada para que 
o nosso relacionamento desse certo. E, para falar 
a verdade, eu não sei nem se eu deixo... 
- Você não sabe se você deixa... 
- Na verdade, eu acho que eu não deixo ninguém 
me amar, eu não sei deixar as pessoas me 
amarem. Sabe Lu, eu tenho medo de começar a 
amar alguém e depois ser abandonada de novo e 
por isso eu acabo não deixando ninguém me 
amar também, pois, assim, eu não sentirei que 
estou abandonando-as, quando deixá-las... Eu 
estou pensando numa coisa: eu acho que, muitas 
vezes, sou eu quem abandono as pessoas e não 
elas que me abandonam. Nossa, como eu falei 
hoje... você me fez pensar muita coisa. 
- Já que você pensou muita coisa, eu vou deixar 
você pensando mais um pouco e volto aqui 
quarta-feira. Tudo bem? 
- Tudo. Eu realmente tenho muita coisa para 
pensar e tomar alguma atitude. Até quarta então! 
 
Após este atendimento, seu filho teve alta. 
Encontrei-a um dia, no estacionamento do hospital, 
e disse-lhe que estaria a sua disposição para atendê-
la, para isso bastava me procurar. Ela não me 
procurou. 
Depois de um mês da alta o paciente teve que 
retornar ao hospital para tomar alguns 
medicamentos e pr. veio acompanhando-o. 
Aproximei-me dela e ela mostrou-se receptiva, 
mas, quando perguntei como estava, ela disse-me 
que não era para eu ficar brava, mas não queria 
mais ser atendida. Disse que não estava preparada 
para se conhecer melhor e que, se ela voltasse outra 
vez, então ela me chamaria. 
A falta na vida dessa paciente é algo constante e 
visível, o ser abandonada e o abandonar está 
sempre cercando-a, assim, com a apresentação 
desta entrevista tive como objetivo mostrar o 
desamparo radical desta acompanhante frente à 
situação de internação de seu filho, que fez com 
que ela refletisse sobre si mesma e sobre esse 
sofrimento que carrega desde sua infância. 
 
CONCLUSÃO 
 
Com a realização deste trabalho tive a 
oportunidade de aprofundar meus conhecimentos 
sobre a psicanálise e fazer uma junção desta com a 
minha prática no hospital. 
 Esta experiência foi muito rica, pois foi a minha 
primeira oportunidade de escrever sobre a 
psicanálise, conseguindo condensar a teoria e a 
prática no hospital. 
Conheci novos conceitos e aperfeiçoei-me em 
outros. Consegui alia r uma entrevista com o 
conceito de desamparo radical, que não conhecia e 
tive o maior prazer em estudá-lo, pois o ser humano 
só consegue constituir-se como tal sob a presença 
deste. 
Através deste trabalho cheguei a conclusão que 
o ser humano é um ser da falta e que esta, muitas 
vezes, não é percebida por ele, mas quando há algo 
que o coloque frente ao desamparo radical, além de 
o sujeito sentir-se angustiado, ele não consegue 
lidar com isso, e, necessariamente, precisará do 
auxílio de uma outra pessoa, de preferência um 
profissional da área psi. 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
1. CARAM, Cecília Andrés. Caderno de Contos. 
Belo Horizonte: projeto convivendo com arte. 
 
2. DOR, Joel. Introdução à leitura de Lacan. 3.ed. 
Porto Alegre: Artes Médicas, 1992. 203p. 
 
3. FRANÇA, Júnia Lessa. Manual para 
normalização de publicações técnico-ciêntificas. 
5.ed. Belo Horizonte: UFMG, 2001. 211p. 
 
4. FREUD, Sigmund. Publicações pré-
psicanalíticas e esboços indtitos. 2.ed. Rio de 
Janeiro: Imago, 1987. 441p. 
 
5. QUINET, Antônio. As 4+1 Condições da 
Análise. 4.ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1991. 
125p. 
 
6. TENDLARZ, Silvia Elena. De que sofrem as 
crianças? Rio de Janeiro: Sete Letras, 1997. 
 
 
_________________________________________ 
* Trabalho apresentado no curso “A Intervenção 
Psicanalítica no Hospital Geral” como requisito para a 
finalização deste. Orientadora: Maria Helena Libório B. 
Melo. 
** Estagiária de Psicologia no Hospital da Baleia, 
Fundação Benjamim Guimarães – Belo Horizonte/MG, 
2002. 
E-mail: lumsm@superig.com.br 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 10 
REFLEXÕES SOBRE A DOR DO PACIENTE INFANTIL ONCOLÓGICO* 
Lauren Beltrão Gomes** 
 
 
Inerente à condição humana, a dor vem 
acompanhando todo o existir do homem. 
Tradicionalmente, foi apenas considerada em sua 
dimensão sensorial sendo os aspectos psicológicos 
estudados apenas no século XX. 
Em 1979, a Associação Internacional para o 
Estudo da Dor (IASP) propôs uma conceituação 
para dor que é usada até os dias de hoje: 
 
A dor é uma experiência desagradável, sensitiva e 
emocional, associada com lesão real ou potencial dos 
tecidos ou descrita em termos dessa lesão. (MERSKEY, 
apud LOBATO, 1992, p.165) 
 
Mesmo que a dor esteja ancorada em uma 
experiência sensorial real, a percepção desta 
sensação e a forma de expressão da dor variam 
conforme a cultura e conforme a personalidade do 
indivíduo. Sendo assim, possui um caráter 
subjetivo. 
Os fatores emocionais podem aumentar ou 
diminuir a experiência da dor. O medo, por 
exemplo, causa uma contração, tanto física quanto 
psíquica, que aumenta a sensação dolorosa. O 
sentir-se abandonado, isolado, ou não 
compreendido, também são fatores que aguçam a 
dor. Quando a dor se torna intolerável, desorganiza 
o aparelho psíquico, afetando a capacidade de 
desejar e atividade do pensamento. 
A dor é entendida como uma sensação de causas 
múltiplas, o que dificulta a precisão de sua origem. 
Segundo GUIMARÃES (1999),a dor possui 
determinadas características que contribuem para a 
sua particularidade: a localização, a qualidade, a 
intensidade, a freqüência, a natureza orgânica ou 
psicogênica (associada ao funcionamento ou 
momento psicológico da pessoa), etiologia e 
duração. Não existem medidas objetivas para 
mensurar a dor, que nos afirmem que uma dor deva 
doer mais do que a outra e não há relação direta 
entre o tamanho da lesão e a intensidade da dor. 
A função da dor no organismo é a de alertá-lo 
sobre algo que está sendo danoso a ele. Assim, a 
dor cumpre a função protetora sendo essencial para 
a sobrevivência. Sem ela, o ser humano não tomaria 
conhecimento dos processos patológicos aos quais 
o organismo está suscetível. No entanto, algumas 
dores são persistentes, tornando-se crônicas. Assim, 
a dor torna-se a própria patologia, um problema a 
resolver. 
As dores podem ser classificadas e 
categorizadas. A classificação mais amplamente 
usada é a que utiliza a duração da dor como 
referencial. Segundo GUIMARÃES (1999), essa 
classificação considera a dor ao longo de um 
continuum de duração e inclui dor aguda, crônica e 
recorrente. A aguda tem duração relativamente 
curta, de minutos a algumas semanas e decorre de 
lesões teciduais, processos inflamatórios ou 
moléstias. A dor crônica tem uma longa duração, 
podendo estender-se por meses ou anos. 
Geralmente é acompanhada de alguma doença ou 
está assoc iada a alguma lesão já tratada. A dor 
recorrente tem características dos dois tipos citados 
anteriormente. É aguda, por ocorrer em episódios 
de curta duração, mas também é crônica, pois se 
repete ao longo de muito tempo. 
Ao se pensar no que a dor expressa, SZASZ 
(apud LOBATO, 1992) coloca que a simbolização 
da dor se dá em três níveis: 
 
No primeiro ela constitui um sinal registrado pelo ego 
de que se acha em curso uma ameaça à integridade 
estrutural ou funcional do organismo. Num segundo 
nível, ao verificar-se que a experiência pode ser 
repartida, isto é, comunicada a outra pessoa, faz da dor 
um meio básico de pedir ajuda. Num terceiro e último 
plano, a dor não mais denota uma referencia ao corpo, 
mas pode, isso sim, expressar queixa, ataque, aviso de 
perda iminente do objeto. Neste último nível de 
simbolização, a dor pode ser ‘utilizada’ como forma de 
manipular os outros, ganhar o controle sobre eles, ou 
então, já um outro plano, como forma de aliviar a culpa 
por alguma falta real ou imaginária cometida 
anteriormente. (Lobato, 1992, p.166) 
 
A criança passa por experiências dolorosas 
desde o nascimento. Suas vivências, bem como a 
observação de pessoas em seu cotidiano, fazem 
com que ela aprenda a julgar a intensidade da 
sensação dolorosa. Assim, a percepção da dor pela 
criança envolve aprendizagem e discriminação e 
depende do seu nível de desenvolvimento. Além 
disso, o estado emocional da criança constitui-se 
um relevante influenciador quanto à percepção da 
dor (GUIMARÃES, 1999). 
MCGRAFTH (apud GUIMARÃES, 1999) 
relata que o recém nascido chora e movimenta-se 
bastante ao sentir dor. Aos dez meses, a criança, 
além de movimentar-se intensamente, passa a tocar 
no local dolorido e procura o acolhimento materno. 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 11 
De dois a seis anos, as crianças definem a dor em 
termos perceptivos, pois já percebem o mundo de 
forma concreta, embora dificilmente relacione a dor 
com sua possível enfermidade. Com quatro anos, 
busca fugir e evitar situações dolorosas e já possui a 
capacidade de verbalizar a rejeição pelas mesmas. 
É na faixa etária dos sete aos nove que a 
necessidade de alguns procedimentos dolorosos 
começa a ser compreendida, quando o conceito de 
dor pode ser entendido conforme seu estado 
emocional. O entendimento relacionado aos 
mecanismos fisiológicos da dor e da patologia só 
inic ia-se na adolescência. 
Alguns autores propõem a inclusão da dor do 
câncer como uma categoria diferente na 
classificação das dores com vista às especificidades 
desta doença. Dentre as dores advindas da 
neoplasia encontram-se a dor da punção lombar, da 
punção venosa, do mielograma, do desconforto 
durante e depois da quimioterapia, de ficar sem 
cabelos ou longe de casa e da família. LORDELLO 
(1999) fala da origem da dor no câncer: 
??Dor associada ao tumor, provocada por 
compressão nervosa, infiltração ou metástase; 
??Dor decorrente dos procedimentos terapêuticos 
antineoplásicos, como quimioterapia ou 
radioterapia e dor pós-cirurgia; 
??Dores não relacionadas ao câncer ou à terapia 
anticâncer, mas coincidentes com a patologia, como 
dor de cabeça ou ferimentos. 
Sobre as especificidades do câncer infantil, 
TORRES (1999) comenta: 
 
O câncer pediátrico requer um tratamento prolongado 
no tempo, que exige a utilização de procedimentos 
médicos altamente aversivos, os quais, em muitos casos, 
provocam sensações dolorosas mais perturbadoras do 
que a própria doença. Portanto, ao se falar de dor em 
oncologia pediátrica, é necessário distinguir entre a dor 
ocasionada pela enfermidade - originária da invasão do 
tumor - e aquela gerada pelo diagnóstico e tratamento - 
dor pós-cirúrgica, dor posterior à radioterapia, etc. 
(p.132). 
 
Ao que se refere a dor advinda da doença, sabe-
se que a invasão direta da medula óssea pelo tumor, 
por depósitos metastáticos ou por células 
leucêmicas é a causa mais comum de dor em 
crianças com câncer. Da mesma forma, alguns 
tumores podem ser inicialmente indolores, 
passando a doer com a progressão da doença. 
É importante ressaltar, todavia, que, diante da 
dor e de eventos estressantes, é bastante comum a 
regressão a níveis de desenvolvimento anteriores, 
fazendo com que a criança utilize mecanismos de 
defesa que possam auxiliá -la a controlar a 
ansiedade e a lidar com a dor. Este processo 
acontece freqüentemente com crianças portadoras 
de doenças crônicas como é o caso do câncer, que 
precisam submeter-se sistematicamente a 
procedimentos terapêuticos invasivos e dolorosos. 
Segundo GUIMARÃES (1999), 
 
...uma sessão de coleta de sangue para exames, por 
exemplo, provoca dor aguda de curta duração e tem 
pouca probabilidade de se tornar um evento estressor. 
Mas este mesmo procedimento repetido diariamente ou 
mais de uma vez ao dia, sem treino especial, pode se 
tornar muito traumático e estressante para a criança. 
(p.252). 
 
Segundo MCGRAFTH (apud GUIMARÃES, 
1999), durante procedimentos médicos 
desagradáveis como a aspirações de medula óssea, 
o receio do que está ocorrendo, gerado pelo fato de 
não se ter controle algum sobre a situação, pode 
exacerbar a percepção da dor. Utilizando os 
recursos lúdicos, a preparação psicológica para 
essas ocasiões procura desmistificar as fantasias 
dos pacientes acerca dos procedimentos, 
garantindo-lhes, além de conforto e segurança, um 
certo controle da situação que os possibilita 
assumirem uma postura mais ativa frente à dor 
lidando com ela de forma menos traumática. 
A utilização adequada da orientação 
antecipatória tem como efeitos principais reduzir a 
insegurança e a ansiedade derivadas do medo do 
desconhecido e facilitar a ativação de mecanismos 
adaptativos da personalidade. Compreender a 
criança para obter sua colaboração nos 
procedimentos é fundamental. Para tanto, é preciso 
que se mostre à criança, utilizando uma linguagem 
que seja entendida por ela, o que vai de fato 
acontecer respeitando-a e entendendo seus 
sentimentos. 
Portanto, faz-se importante que em todo 
processo de tratamento, a Psicologia possa atuar no 
sentido de acolher os sentimentos da criança que 
sente dor, respeitando-a em sua fase de 
desenvolvimento. Visto isso, percebe-se a 
relevância em se preparar o paciente infantil diante 
dos procedimentosdolorosos aos quais será 
submetido. 
 
A familiaridade com a situação potencialmente dolorosa 
pela compreensão do procedimento, previsão dos 
acontecimentos e relativo controle da situação são 
facilitadores que reduzem a ansiedade com que a 
criança antecipa a experiência e minimiza sua 
percepção de dor. (GUIMARÃES, 1999, p.256). 
 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 12 
É importante que os familiares estejam 
suficientemente preparados para enfrentar a dor do 
filho. Os sentimentos demonstrados por eles em 
relação à doença e ao tratamento são sentidos pela 
criança e exercerão grande influência na maneira 
como ela vai lidar com a realidade da sua doença. 
Segundo BERGMANN e ANNA FREUD 
(1978), havia uma crença de que não se devia falar 
às crianças dos procedimentos dolorosos ou 
cirúrgicos a que seriam submetidas, pois isto iria 
excitar suas expectativas receosas, assim como 
também não falar depois de acontecido para que a 
criança esquecesse mais facilmente. 
Entretanto, hoje se sabe que este tipo de atitude 
pode ser profundamente prejudicial e traumático 
para o desenvolvimento da criança, pois esta não 
tem ainda bem estabelecidos os limites entre 
realidade/fantasia e os seus medos arcaicos e suas 
ansiedades primitivas juntam-se com os perigos 
reais e ocultam os verdadeiros fatos, onde os 
procedimentos são vistos como ataques, castigos e 
ameaça de castração. 
É natural e até mesmo esperado a vivência 
conflituosa desta situação vivida pela criança. Mas 
tal conflito pode ser amenizado por informações 
dadas dentro de um ambiente que permita o 
continente de todas as ansiedades e medos 
decorrentes da dor/tratamento. A criança sente-se 
reconfortada, segura, menos confusa e mais 
saudável enquanto vivência do seu 
desenvolvimento emocional e cognitivo quando lhe 
é fornecido um quadro de realidade dos 
acontecimentos que vive, tão honesto e completo 
conforme ela possa compreender. Suas fantasias, 
ansiedades e medos não são negados, mas sim 
acolhidos e aproximados da realidade. 
REDD (apud LORDELLO, 1999) coloca que, 
atualmente, o tratamento da dor do câncer tem sido 
feito segundo uma abordagem biopsicossocial, 
onde os programas desenvolvidos nos hospitais 
sugerem intervenções multifacetadas para o 
controle e manejo da dor. A Organização Mundial 
de Saúde tem estabelecido, como prioridade no 
atendimento a pacientes oncológicos, o alívio da 
dor. Os pacientes oncológicos devem ser tratados 
com fármacos analgésicos e orientação psicológica 
para o manejo adequado da dor, objetivando 
capacitar a criança e a família para entender o que 
está acontecendo e minimizar a dor. 
A criança costuma ser vista pelo adulto com um 
ser frágil, que desperta comportamentos protetores 
e agressivos. Tentado fugir das próprias emoções, o 
adulto busca meios de diminuir ou de manter sob 
controle as manifestações emocionais intensas das 
crianças, por meio da minimização ou da negação 
dos fatores e/ou dos efeitos desencadeantes da 
reação de forma a conduzí-la para o ideal adulto, 
principalmente o masculino: o de uma pessoa capaz 
de controlar os afetos e as manifestações dolorosas. 
Pode-se exemplificar esta conduta por afirmações 
tão corriqueiras do adulto frente às reclamações da 
criança como “não vai doer nada” ou “você já é um 
homenzinho, não pode ter medo”. 
Tais dificuldades em lidar com as manifestações 
infantis da dor são sentidas pelos profissionais da 
área da saúde em geral. O cotidiano de tais 
profissionais é permeado pela preocupação com 
possíveis danos orgânicos secundários à sedação e 
analgesia e pela concepção de que as crianças não 
percebem nem registram os estímulos dolorosos na 
mesma intensidade que os adultos. 
A experiência da dor, além de possuir caráter 
único, complexo e subjetivo é sempre expressa, 
comunicada. As dificuldades do adulto de 
interpretar sinais infantis são ampliadas se a 
fluência verbal da criança for muito pequena. O 
profissional de saúde se vê obrigado a deduzir a 
presença, a duração e a intensidade da dor na 
criança sendo pertinente aqui nos referirmos ao 
perigo da dessensibilização desses profissionais 
diante do sofrimento do paciente. 
Entendendo dessa forma, a dor passa a ser 
assunto para diversos profissionais. Portanto, o 
atendimento a pacientes que sentem dor deve ser 
feito por uma equipe multiprofissional. Da mesma 
forma, inúmeras técnicas vêm sendo desenvolvidas 
para minimizar a dor, incluindo aqui não apenas 
recursos analgésicos. Assim, 
 
...há dores de origem psicológica para as quais os 
medicamentos não surtem efeito; a dor pode tornar-se 
refratária a medicação, ou o organismo pode 
desenvolver tolerância e requerer doses gradualmente 
maiores e mais fortes de analgésicos agressivos como 
morfina ou codeína; o organismo pode apresentar 
reações clínicas adversas decorrentes de efeitos 
secundários da droga; ou a medicação pode ser ineficaz 
para aliviar certos tipos de dor como ‘dor fantasma’ em 
membros amputados. (GUIMARÃES, 1999, P.28). 
 
Entretanto, cabe lembrar que grande parte dos 
profissionais da saúde não está preparada para lidar 
com a dor de seus pacientes. Dessa forma, ocorrem 
avaliações inadequadas dos quadros de dor e de 
suas conseqüências. Pode-se subestimar o 
sofrimento das crianças, acreditar que a dor é 
necessária para elucidar alguns diagnósticos ou 
submedicar o paciente infantil com analgésicos, 
temendo viciá -lo. É assim que, inúmeras vezes, não 
há um controle satisfatório da dor. 
 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 13 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
BERGMANN, T.; FREUD, A. A criança, a doença 
e o hospital. Lisboa – Portugal: Moraes, 1978. 
 
GUIMARÃES, S. S. Introdução ao Estudo da Dor. 
In: CARVALHO, M. M. M. J. de. (Org.) Dor: um 
estudo multidisciplinar. São Paulo: Summus, 1999. 
 
LOBATO, O. O problema da dor. In: MELLO 
FILHO, J. Psicossomática hoje. Porto Alegre: 
Artes Médicas, 1992. 
 
LORDELLO, S. R. M. O Profissional de Saúde e a 
Percepção do Câncer Infantil. In: CARVALHO, M. 
M. M. J. de. (Org.) Dor: um estudo 
multidisciplinar. São Paulo: Summus, 1999. 
 
TORRES, W. da C. A Criança diante da Morte: 
desafios. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1999. 
 
LORDELLO, S. R. M. O Profissional de Saúde e a 
Percepção do Câncer Infantil. In: CARVALHO, M. 
M. M. J. de. (Org.) Dor: um estudo 
multidisciplinar. São Paulo: Summus, 1999. 
 
 
_________________________________________ 
* Parte do trabalho de conclusão de curso (estágio em 
psicologia clínica). Orientadora: Jadete Rodrigues 
Gonçalves 
** Psicóloga. CRPSC 04747 
E-mail: laurenbeltrao@yahoo.com.br 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 14 
DIFERENÇAS ENTRE O ATENDIMENTO PSICOLÓGICO 
EM MEIO HOSPITALAR E EM CONSULTÓRIO* 
Vanina Ribeiro** 
 
 
Nas duas situações, em meio hospitalar e em 
consultório, o psicólogo tem como objectivo 
escutar os sentimentos, as emoções, isto é, o estado 
interior do sujeito que está diante de si e que desta 
forma busca alívio para o seu sofrimento. O que as 
caracteriza, portanto, não é o seu objectivo, mas o 
objecto, ou seja, aquilo que as leva a actuar. Isto, 
partindo do reducionismo de que, em consultório 
não são abordadas, pelo menos, com frequência, as 
questões relativas ao processo de adoecer. 
Desta forma, “a psicologia hospitalar intervém 
na forma do paciente conceber e vivenciar os 
problemas gerados pela patolo gia orgânica, pela 
hospitalização, pelos tratamentose pela 
reabilitação.” (Alamy, p.15) 
Poderemos, então, concluir que o que as 
diferencia é a forma como actuam, uma vez que 
agem em contextos diferenciados. 
Assim, relativamente, as diferenças na actuação 
do psicólogo num contexto hospitalar e num 
contexto de consultório basear-nos-emos em três 
eixos, por nós definidos: o do sujeito, o do setting e 
o da iminência da morte. 
 
PRIMEIRO EIXO 
 
Neste eixo, abordaremos aqueles que nos 
parecem ser os principais aspectos que caracterizam 
os sujeitos e, desta forma, os assuntos abordados 
nos diferentes contextos. 
No meio hospitalar estamos diante de um 
indivíduo que se encontra despojado do seu meio 
familiar, que tem que se adaptar a uma nova rotina 
diária que lhe é imposta (horário de refeições, de 
estar com os familiares...); que passa, muitas vezes, 
a ser um número de cama ou um indivíduo com tal 
órgão comprometido; e, ao qual não é dada 
alternativa face as intervenções a que é sujeito (até 
porque estas são, supostamente, para o seu bem). 
Estamos, deste modo, perante um sujeito que para 
além de ter que lidar com as alterações físicas da 
doença, também, tem que lidar com as que resultam 
da inserção num meio diferente e, em que a sua 
identidade pessoal parece ser anulada, ignorando-se 
os seus direitos e as suas necessidades. 
Assim, o internamento provoca uma ruptura na 
trajectória do indivíduo (impede-o de trabalhar, de 
se divertir, tira-o do convívio familiar e dos amigos, 
isola-o) e, cabe ao psicólogo trabalhar as fantasias, 
os medos, as dúvidas que daí emergem, bem como 
dar assistência aos familiares do paciente, que 
participam do seu adoecer e do seu 
restabelecimento. Uma vez que, as reacções 
psicológicas podem interferir directamente na 
recuperação do sujeito. 
Em consultório, atendemos à compreensão dos 
conflitos (com o mundo, com os outros, consigo 
próprio) de cada sujeito, que de acordo com a 
escola psicanalítica resultam de traumas ocorridos 
ao longo do seu desenvolvimento. Não temos, deste 
modo, presentes, questões orgânicas e uma ameaça 
clara à continuidade da existência, tal como 
acontece na psicologia hospitalar. 
 
SEGUNDO EIXO 
 
Faremos referência às diferenças existentes ao 
nível do setting, entre as duas situações de 
atendimento psicológico. 
Em consultório, temos um espaço físico 
constituído por uma sala estruturada de modo 
singular e neutro onde decorrerão as sessões entre o 
sujeito e o psicólogo. Há dias, horários, bem como 
um tempo de duração definidos, para as sessões. 
Não se prevendo, desta maneira, quaisquer 
interrupções. O tempo durante o qual durará o 
tratamento está dependente das situações em si, 
sendo definido pela resolução da problemática. E, 
outro aspecto a realçar é o facto de ser o sujeito a ir 
ao encontro do psicólogo. É ele que, de alguma 
forma, reconhece a sua necessidade e procura 
ajuda. 
No hospital, o sujeito é encaminhado pelo 
médico e/ou é o psicólogo que se dirige às 
enfermarias e aborda os pacientes detectando, deste 
modo, aqueles que precisam de apoio psicológico. 
Assim, na grande maioria das vezes, o atendimento 
ocorre na enfermaria (por falta de um espaço mais 
privado), onde estão outros doentes (que com 
frequência se mostram curiosos), e onde as 
interrupções, pelos mais variados motivos, como 
por exemplo, por parte do pessoal de enfermagem, 
dos médicos e até dos familiares, são frequentes. 
“Outra particularidade decorrente da internação 
em enfermaria é que sempre há a presença de 
enfermeiros, auxiliares de enfermagem, faxineiras, 
visitas, médicos, fisioterapêutas e outros; sendo 
que alguns são discretos e não interferem no 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 15 
atendimento. No entanto, existe uma curiosidade a 
respeito do que o psicólogo faz e, muitas vezes, 
podemos perceber que funcionários, ou mesmo 
visitas, ficam rondando o leito do paciente que está 
sendo atendido, gerando constrangimento e 
fazendo-o se calar. Neste caso o que podemos fazer 
é pedir que se retirem ou esperar que terminem o 
trabalho que não pode ser deixado para depois ou 
que estão executando à nossa volta” (Alamy, p.62). 
Não devemos esquecer a própria condição física 
do sujeito, por exemplo, pode estar com dores, 
sonolento devido à medicação, entubado, nas 
crianças, o soro pode estar colocado na mão direita 
e, sendo elas destras, não conseguem fazer 
desenhos, etc. São todos estes aspectos que vão 
ditar os dias, os horários e o tempo de duração de 
cada atendimento. 
O processo de tratamento está, ainda, 
condicionado ao tempo de internamento. O que 
levanta em nós outro cuidado, o de fechar o assunto 
na respectiva sessão não deixando emergir angústia 
a ser trabalhada no próximo encontro. Ou seja, ao 
contrário do que acontece em consultório, aqui 
procuramos resolver na sessão o aspecto que está a 
ser abordado, pois não há certeza quanto ao tempo 
que teremos para “trabalhar” com o paciente as 
suas questões e, na maioria das vezes, não sabemos 
se o encontraremos no dia do nosso retorno 
(Alamy, 2003). 
Também, em meio hospitalar, a nossa 
abordagem deverá ser mais diversificada, pois 
deparamo-nos com doentes diversificados, quanto 
às limitações que lhes são impostas pela doença. E, 
é importante fazermo-nos valer dos mais variados 
métodos (por exemplo, cartões com figuras), para 
comunicarmos com pacientes que estão 
impossibilitados de fazê-lo verbalmente. O 
conhecimento de técnicas de relaxamento, também 
ocupa um lugar particular, pois é, mais uma forma 
de ajudar-mos a minimizar o sofrimento do 
paciente. 
 
TERCEIRO EIXO 
 
Neste último eixo, abordaremos a diferença nos 
atendimentos, quanto à presença da morte. 
Em consultório, a questão da morte não é tão 
iminente como o é em contexto hospitalar. “Toda a 
doença é uma ameaça à vida e, com isso, é um 
aceno para a morte, ou até um primeiro ou um 
último passo em direcção à morte” (Boss apud 
Campos, 1995, p.42). Sendo a morte “a mais certa 
de todas possibilidades do ser humano” (Boss apud 
Campos, 1995, p.42). “Nascemos com a certeza de 
que vamos morrer um dia, mas a morte é temida e 
vista como um tabu, como algo que nem deve ser 
comentado” (Campos, p.64). Para além disso, 
também existe em nós o sentimentos de que ela só 
existe para os outros e nas outras famílias, sendo 
nós e a nossa família salvaguardados dessa 
realidade. Só com a morte do meu pai é que a 
morte passou a ser real para mim e tomei clara 
consciência da minha finitude e daqueles que amo. 
“Na morte, o que nos assusta, não é simplesmente 
a perda, mas a irreversibilidade de tal perda” 
(Alamy, p.153). 
“No nosso inconsciente, a morte nunca é 
possível quando de trata de nós mesmo. É 
inconcebível para o inconsciente imaginar um fim 
real para a nossa vida na terra e, se a vida tiver um 
fim, este será sempre atribuído a uma intervenção 
maligna fora do nosso alcance. Portanto, a morte 
em si está ligada a um acontecimento medonho, a 
algo que em si clama por recompensa ou castigo” 
(Kübler-Ross, p.6). 
Desta forma, acabamos, todos, por sentir 
necessidade de fugir a essa situação; até que, sem 
escolha, tenhamos que encará-la. Kübler-Ross 
(2002), considera que “deveríamos criar o hábito 
de pensar na morte e no morrer, de vez em quando, 
antes que tenhamos de nos defrontar com eles na 
vida.” (p.33) Pois, só encarando a morte com 
serenidade é que poderemos ajudar os nossos 
pacientes e os seus familiares a lidarem com esse 
facto. (Kübler-Ross, 2002) 
“Aqueles que tiverem a força e o amor para 
ficar ao lado de um paciente moribundo, com o 
silêncio que vai além das palavra, saberão que tal 
momento não é assustador nem doloroso, mas um 
cessar em paz do funcionamento do corpo” 
(Kübler-Ross,p.282). Trata -se de um momento em 
que a nossa presença física, emocional e espiritual 
valem só por si (Kübler-Ross, 2002). 
 
CONCLUSÃO 
 
“O psicólogo tem uma atuação dentro do 
hospital, como um profissional da saúde, 
envolvendo o indivíduo e as áreas social e da saúde 
pública, buscando sempre o bem estar individual e 
social, utilizando também informações das áreas de 
Medicina, Enfermagem, Serviço Social, Nutrição e 
outras áreas afins” (Campos, p.14). Criando, deste 
modo, “condições para que o paciente consiga 
reflectir sobre o significado do seu adoecer” 
(Campos, p.60). 
Como elemento integrante de uma equipa 
multidisciplinar, deve “intervir nas situações 
relacionadas à complexidade dos fatores psíquicos 
que emergem durante o processo de tratamento da 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 16 
doença e da internação hospitalar” (Alamy, p.19). 
Dando oportunidade para que o paciente expresse 
as suas emoções, quer através da palavra, da 
dramatização, do desenho ou da mímica (Alamy, 
2003). Assim, torna-se indispensável “ouvir o 
apelo e sentir a angústia, para então poder 
responder com a ação adequada.” (Campos, p.61). 
E, deste modo, contribuir “efectivamente no 
processo de sua plena reintegração física, 
psicológica e socia .” (Campos, p.61). 
Portanto, no meio hospitalar, o psicólogo, acaba 
por ter um papel muito mais activo, que vai, muitas 
vezes, além do apoio psicológico que é prestado em 
consultór io. Somos, muitas vezes um dos poucos 
que de entre o corpo clínico, olha para o sujeito 
como um todo, como uma “pessoa” e não como 
uma “doença”, que fazemos companhia e, que 
estamos humana e “espiritualmente” presentes. 
Pois, há momentos em que não só as palavras são 
importantes, mas sim a presença real e 
partic ipativa. A exemplo relatarei uma experiência 
com um paciente em fase terminal de sua doença, 
que estando dispenéico e com o corpo de 
enfermagem à sua volta, estendia a mão, 
procurando quem o confortasse naquele momento 
angustiante : - Dei-lhe a minha mão e assim 
ermanecemos por longo tempo. Muitas vezes me 
perguntou se já estava de saída. Só me retirei 
quando chegaram as filhas, que foram chamadas a 
seu pedido. Mais tarde regressei à enfermaria e 
verifiquei que o Sr. tinha recuperado da crise e se 
encontrava mais tranquilo. Também, foi dada 
assistência psicológica às filhas. 
Desta forma, o psicólogo, contribui em grande 
medida para o processo de humanização do hospital 
e da saúde, permitindo que se veja o paciente como 
um todo, como uma unidade integrada, nos seus 
aspectos físico, psíquico e sócio-económico. Torna-
se, assim, indispensável a “familiarização com os 
fundamentos da sociologia e da antropologia 
cultural, do uso e significado de estatísticas 
médicas e da investigação científica de problemas 
médicos. Deve entender o significado dos 
princípios e técnicas de administração aplicados à 
saúde, ao bem estar da comunidade, havendo 
necessidade de conhecer a patologia, inclusive” 
(Campos p.65). 
Portanto, o psicólogo, atuando no hospital, 
busca a promoção, a prevenção, a recuperação do 
bem-estar do paciente, no seu todo, o que implica 
que os aspectos físicos e sociais são considerados 
em interação contínua na composição do psiquismo 
desse mesmo paciente (Campos, p.83). 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
Alamy, S. (2003). Ensaios de Psicologia: a ausculta 
da alma. Ed. Autor: Belo Horizonte. 
 
Campos, T. C. P. (1995). Psicologia Hospitalar: a 
actuação do psicólogo em hospitais. EPU: São 
Paulo. 
 
Kübler-Ross, E. (2002). Sobre a Morte e o Morrer: 
o que os doentes terminais têm para ensinar a 
médicos, enfermeiros, religiosos e aos seus próprios 
parentes. Martins Fontes: São Paulo. 
 
 
_________________________________________ 
* Este texto, resulta de um processo de reflexão, acerca 
das diferenças que envolvem o atendimento psicológico 
em meio hospitalar e em consultório, por mim exercidos. 
** Psicóloga Clínica – Angola/África - Formada em 
Portugal/Lisboa, pelo Instituto Superior de Psicologia 
Aplicada (ISPA). Professora de Psicologia no Instituto 
Superior Privado de Angola. 
E-mail: vaninaribeiro@portugaulmail.pt 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 17 
A PRÁTICA HOSPITALAR – COMO É A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO?* 
Susana Alamy** 
 
 
Para falarmos da atuação do psicólogo 
hospitalar é necessário conhecermos alguns 
conceitos de psicologia hospitalar. Então podemos 
conceituá-la como “o ramo da psicologia destinado 
ao atendimento de pacientes portadores de alguma 
alteração orgânica/física, que seja responsável pelo 
desequilíbrio em uma das instâncias bio-psico-
social” (Alamy, 1991)1, bem como “uma psicologia 
dirigida a pacientes internados em hospitais gerais, 
sem deixar de se estender aos ambulatórios e 
consultórios, com sua atenção voltada para as 
questões emergenciais advindas da doença e/ou 
hospitalização, do processo do adoecer e do 
sofrimento causado por estas, visando o minimizar 
da dor emocional do paciente e da sua família” 
(Alamy, 1998)2. 
Temos, então, a atuação do psicólogo no 
hospital considerando o ambiente psicológico, onde 
o mesmo deve observar os doentes, seus familiares, 
a atuação das pessoas naquele lugar, informando-se 
do diagnóstico médico, do prognóstico e 
propedêutica, grau de risco de vida, previsão do 
tempo de internação e cuidados especiais 
requeridos naquele caso, para, então, planejar seu 
atendimento psicológico e suas técnicas auxiliares, 
pois, na maioria das vezes, não será o paciente a 
chegar no psicólogo, mas o inverso. Para 
exemplificar podemos imaginar o atendimento de 
um paciente com insuficiência renal crônica e 
compará-lo com o atendimento de um paciente 
oncológico. Seria possível atendê-los da mesma 
maneira? Claro que não, pois são patologias 
diferentes, com estigmas diferentes e conseqüências 
diferentes na vida do paciente. Cada patologia leva 
a uma repercussão única em cada paciente e em 
cada família considerando suas peculiaridades 
anteriormente existentes. 
A atuação do psicólogo hospitalar inclui, além 
dos seus atendimentos dos pacientes, a burocracia 
da feitura dos relatórios dos atendimentos, uma vez 
que somente a partir dos mesmos é possível que se 
obtenha um feed-back do seu trabalho. Os relatórios 
devem obedecer à ética, sendo absolutamente 
sigilosos, técnicos e diferentes do que se poderia 
escrever em um prontuário médico. 
Sua atuação é dirigida para os problemas 
psicoafetivos oriundos da doença e/ou da 
 
1 ALAMY, Susana. Ensaios de Psicologia Hospitalar - a 
ausculta da alma. Belo Horizonte: [s.n.], 2003. p. 18. 
2 Ibidem. p. 19. 
hospitalização, compreendendo a natureza do 
sujeito doente, seus desejos, esperanças, medos, 
aptidões, dificuldades e limitações, seja através da 
observação ou da linguagem verbal e não-verbal. 
A prática hospitalar impõe-nos alguns cuidados 
que são fundamentais para um bom atendimento, 
sendo importante que não confundamos a 
psicologia hospitalar com a psicologia clínica; 
portanto, não podemos fazer clínica dentro do 
hospital. Na psicologia hospitalar estaremos 
lidando com o tempo de internação do paciente, 
bem como com sua patologia orgânica e seus 
efeitos iatrogênicos, com questões de ordem 
prática, como dificuldades do paciente e da família 
em relação ao sustento da casa, ausência do 
trabalho e outros, fatores que não poderão ser 
desconsiderados na prática hospitalar. 
A atuação do psicólogo hospitalar objetiva dar 
oportunidade para que o doente expresse suas 
emoções, descubraa melhor maneira de lidar com 
as limitações impostas pela doença/hospitalização, 
dê significado à sua doença dentro do seu contexto 
de vida e trabalhe suas questões emergenciais, onde 
os objetivos principais são o reconhecimento do 
paciente enquanto um todo provido de emoções e 
sentimentos que interferem em seu comportamento, 
ajudando-o a tratar/minimizar, o sofrimento 
provocado pela doença e/ou hospitalização. 
 
 
_________________________________________ 
* Resumo da aula ministrada no I Encontro de 
Psicologia da UFSJ (Universidade Federal de São João 
Del Rei), 28/11/2003. 
** Psicoterapeuta, psicóloga habilitada em psicologia 
clínica, especialista em psicologia hospitalar, professora 
de psicologia hospitalar e supervisora de estágios, autora 
do livro “Ensaios de Psicologia Hospitalar” (2003). 
CRPMG 6956. 
Home page: 
http://geocities.yahoo.com.br/psicologiahospitalar 
E-mail da autora: susanaalamy@uol.com.br 
 
 
 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 18 
UMA EXPERIÊNCIA MALOGRADA DE ATENDIMENTO INFANTIL 
 Priscila Said Saleme* 
 
 
I - INTRODUÇÃO 
 
Tendo em vista as inúmeras publicações de 
casos de atendimentos bem-sucedidos, gostaria de, 
por meio deste, registrar a existência daqueles que 
se encontram em seu extremo oposto. Estes deslizes 
são pouco relatados na literatura, apesar de sua 
grande importância, pois tais experiências mal 
sucedidas não apenas antecedem as demais, como 
servem de condição fundamental para a sua 
ocorrência já que, inevitavelmente, os erros 
consistem de partes do acerto. “Se o erro faz parte 
do processo, se pode ser analisado de diferentes 
ângulos, então não se trata de negá-lo ou justificá-lo 
de maneira complacente, nem de evitá-lo por meio 
de punições, mas de problematizá-lo (grifo meu), 
transformando-o em uma situação de 
aprendizagem. O importante é sabermos a serviço 
do que está a correção e qual o seu sentido...” 
(Macedo, 1994, p.75). 
Nesse sentido, gostaria de aproveitar o registro 
de meus dois primeiros casos de atendimento 
infantil e transformá-los num breve artigo no qual 
pretendo expor minhas angústias e frustrações 
sentidas diante de contextos nos quais teoricamente 
verificaríamos a presença de erros. No entanto, se 
pudermos avaliar tal conteúdo sob uma perspectiva 
construtivista, verificaremos a importância de tais 
publicações enquanto registros da construção de um 
processo pessoal do terapeuta. Afinal, Amatuzzi 
(2000, p.122) bem esclareceu a importância do 
processo pessoal do terapeuta , “O que faz um 
terapeuta? Ele proporciona oportunidade para que 
restabeleçamos o contato perdido com nosso centro 
pessoal. Mas ele só pode fazer isso a partir de seu 
próprio centro pessoal. O que nos abre 
profundamente é uma relação verdadeira, de centro 
a centro, de coração aberto a coração que vai se 
abrindo (...). O verdadeiro terapeuta é uma pessoa 
treinada para isso, mesmo em situações onde essa 
relação, assim tão pessoal, fica difícil”. 
A dificuldade em aceitar nossos erros ou 
incapacidades de escuta torna-se uma justificativa 
plausível para compreendermos tamanha escassez 
de seus relatos, sobretudo por profissionais. Falar 
da importância da verdadeira escuta do paciente, 
sob o âmbito teórico, é algo extremamente distinto 
de sua execução, já que, na prática, o processo de 
aprendizado parece sofrer um retrocesso. Tudo o 
que fora aprendido formalmente é aparentemente 
esquecido. E é nesse momento de encontro com a 
realidade sob uma nova óptica, que o psicólogo 
depara-se com seus limites humanos. Ciente dessa 
inevitabilidade de dificuldades que perdurarão ao 
longo da prática de todos os profissionais 
psicólogos, portanto, que me proponho a registrar 
minhas dificuldades iniciais, ou melhor, o momento 
inicial da construção de minha identidade 
prof issional. Digo dificuldades iniciais por estar 
ciente de que a cada contato com um paciente, 
novos desafios haverão de surgir. 
Com essa finalidade, pois, serão relatados dois 
atendimentos realizados por mim durante um 
estágio feito em um hospital infantil quando eu 
ainda cursava o sexto período de psicologia. Ambos 
consistem de bons exemplos em que a escuta torna-
se impossível quando a ansiedade encontra-se 
presente. Fato comum, sobretudo, em atendimentos 
infantis. Nestes, além das próprias dificuldades que 
toda situação de escuta em si oferece, é exigido do 
psicólogo uma habilidade de decodificação de 
várias outras linguagens além da fala. Dentre elas 
podemos citar os desenhos, brincadeiras, gestos, 
olhares, além de uma, em especial, o silêncio. 
Diferentemente dos demais atendimentos, na 
clínica infantil é necessária uma postura mais ativa 
do profissional. Por meio dessa, é possível que haja 
uma maior interação com o paciente de modo a 
facilitar sua expressão. Assim, dificuldades de 
interação com crianças podem inviabilizar a escuta 
do que é dito por nossos pequenos pacientes. Esse 
talvez tenha sido o meu caso. 
 
2 - REGISTROS 
 
CASO 1 
 
O seguinte caso trata-se de meu primeiro 
atendimento. Além da alta ansiedade, foi meu 
primeiro contato com um paciente. Minha grande 
inibição diante de crianças consistiu no principal 
elemento da trama que será brevemente relatada. 
Devo frisar que o relatório original foi conservado. 
Dessa forma, poderemos observar equívocos não 
apenas em minha atuação, como também em minha 
própria avaliação dos fatos naquele momento. 
 
Segundo o relatório da enfermeira, a paciente 
de quatro anos e oito meses de idade, chegou às 21 
horas do dia 29 de janeiro de 2003 em companhia 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 19 
da mãe e da tia. No entanto, por motivos 
desconhecidos, apenas a segunda permaneceria 
com a criança. Dois dados foram considerados 
relevantes na papeleta médica além do 
diagnóstico: o fato de a garota encontrar-se 
chorosa e em soroterapia. Quanto à patologia 
apresentada, assim como a maioria das crianças 
daquele andar, aquela tinha pneumonia. Minutos 
depois de chegar à enfermaria, observei que uma 
garota chorava desesperadamente. Tratava-se do 
momento em que a enfermeira deveria aplicar a 
injeção no cateter. Logo, nada doeria. A menina, 
no entanto, gritava e esperneava muito. Apesar de 
meu receio em atender crianças pequenas, diante 
da situação de urgência, vi-me obrigada a fazer 
alguma coisa. Apresentei-me ao pai da criança e 
ofereci meu caderno e caneta à pequena. Esta logo 
se prontificou a desenhar. 
A princípio Joaquina começou a desenhar um 
retângulo com uma bola. Nesta, esboçou um rosto 
feliz. Pensei que se tratava do desejo de ir embora 
do hospital, no entanto, uma intervenção do pai 
desviou o assunto. Indaguei-lhe acerca do desenho 
e ela respondeu-me que se tratava de uma porta. 
Questionei a localização da porta e o pai interviu: 
“É da escolinha, filha?”. Ela pensou um pouco e 
concordou. Depois desenhou um X sobre a porta. 
No momento não pensei na possibilidade de a 
garota estar discordando do pai e somente 
perguntei se ela não queria mais voltar lá. 
Respondeu-me negativamente. A partir daí, o pai 
enfatizou algumas vezes que a tiraria da escola já 
que a garota demonstrava não gostar de lá. A 
menina não respondia. Desenhou quatro bolinhas 
e afirmou que não era mais uma porta, mas uma 
janela. Posteriormente, algumas alças foram 
acrescentadas. Indaguei-lhe sobre o que o desenho 
havia se transformado. Sacolas, respondeu. Após 
pedir-lhe para contá-las e reforçá-la por tê-lo feito 
corretamente, questionei sua finalidade. “Para ir 
trabalhar” (sic). O pai demonstrou-se surpreso e 
somente nesse momento percebi que ele estava me 
atrapalhando; induzia constantemente as respostasda garota. Após alguns instantes, sugeri que ele 
passeasse um pouco enquanto eu ficava com 
Joaquina. Esta afirmou que trabalhava na 
escolinha. Custava a desenvolver o assunto e, com 
muita dificuldade, me olhava nos olhos. Por 
instantes suspeitei que havia algo de errado por lá. 
Circulou seu desenho e desenhou uma bolinha na 
parte inferior do papel. Em seguida, fez o mesmo 
na superior. “O sol faz xixi e cocô” (sic). Igual a 
quem?, indaguei. “Igual ao sol, uai” (sic). Depois 
fez um X em cada buraco. 
Após a saída do pai, acomodei-me na cadeira 
em que ele se encontrava e a garota iniciou um 
novo desenho. Olhou para a televisão e começou a 
copiá-la. Em seguida, um armário foi feito por 
baixo dela. Averigüei se havia uma 
correspondência com o aparelho do hospital. 
Indaguei acerca da origem da televisão. 
Respondeu-me que era de sua casa e que, abaixo 
dela, havia um guarda-roupa. Posteriormente, fez 
um retângulo com dois quadradinhos. Disse-me 
que eram duas televisões e traçou uma reta 
ligando-as à anterior. Mais uma vez circulou o 
desenho e acrescentou-lhe um chão. Achei 
pertinente (agora ciente de que se tratava apenas 
de meu desejo) perguntar-lhe sobre o chão. Uma 
resposta mais pertinente ainda foi-me devolvida: 
“O chão é para andar, ué!”. Confesso que a cada 
desenho procurava por oportunidades para que a 
criança falasse algo e não me dava conta de que 
ela já estava me dizendo muito e eu não estava 
conseguindo escutá-la. Ela não me pareceu 
incomodada com isso, ao contrário. Acredito que 
sentiu que eu realmente estava interessada em seus 
desenhos e lhe dando atenção. Tal aspecto pode ser 
considerado relevante para o fortalecimento do 
vínculo estabelecido, o que poderá ser confirmado 
posteriormente. 
O guarda-roupas e a televisão transformaram-
se num avião. “Um avião que leva a gente até o 
céu” (sic). A garota fez uma analogia entre este 
veículo e o carro que lhe trouxera ao hospital. 
Quando repeti o que ela me havia dito, corrigiu -me 
afirmando que viera de ambulância e não de carro. 
Posteriormente mencionou a injeção tomada no 
momento de sua chegada. “ Doeu muito” (sic). 
Aproveitei a oportunidade para retomar o assunto 
da injeção na sonda. Procurei mostrar-lhe que 
nada doeria espetando-lhe a pele com a unha e 
depois tocando o cateter. “Viu? Aqui (pele) você 
sente meu dedo, mas aqui (cateter), não” (sic). 
Demonstrei com a caneta posteriormente. A garota 
aparentou compreender a diferença, mas continuou 
ansiosa. Mudou de assunto mais uma vez pedindo-
me que desenhasse uma sombrinha sobre a T.V. “É 
para proteger da chuva”, disse. Pediu -me para 
também desenhar a chuva. 
Na terceira folha, vários elementos foram 
introduzidos. A criança começou a falar da nuvem. 
Pediu-me para desenhá-la novamente. Disse-me 
que esta nos deixa no escuro. Depois acrescentou 
um sol. Por cima deste, uma enorme boca. Disse 
ser uma boca má, do BOCUDO. Indaguei quem 
seria o dono da boca. Afirmou ser do sol. Contou-
me uma história sobre o bicho-papão. Este viera à 
noite, quando seu pai não estava presente e 
colocou uma espada em seu peito. “Aí eu peguei a 
Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde. Belo Horizonte, Jan-Jun 2005, Ano 1, Vol. 1, n.1. 20 
espada dele e esfaqueei ele” (sic). Falou-me de seu 
desejo em dar à mãe e irmã uma faca para se 
protegerem do bicho. Assim como ela própria 
pretende adquirir uma. Quando indagada sobre 
onde o pai estaria, afirmou que também lhe daria 
uma faca para se proteger do “bocudo” (bicho de 
boca grande). Olhos grandes que, segundo ela, 
pertenciam ao bicho-papão. Acrescentou um 
penico abaixo do sol. Explicou-me que era para ele 
fazer xixi. Em seguida, desenhou um vaso e o 
suporte para o penico. Voltou a fazer referência ao 
ser assustador por meio de olhos grandes que, 
segundo ela, pertenciam ao bicho-papão. Mais 
uma vez citou a história das facas. Entretanto, 50 
minutos já haviam se passado e eu já estava 
esgotada. Fechei o caderno, encerrando o 
atendimento. 
 
CASO 2 
 
O segundo caso, assim como no anterior, trata-
se de uma paciente de quatro anos e oito meses de 
idade. No entanto, a garota parecia estar bem. 
Como procedimento de rotina, passei pelo leito de 
modo a averiguar a veracidade daquela boa 
aparência. Visto assim, apresentei-me à avó da 
criança que logo me informou o desejo da neta. 
“Ela quer voltar para casa agora” (sic). Voltei-me, 
portanto, à pequena procurando compreender 
melhor o que se passava. Esta, sorridente e 
comunicativa, logo começou a conversar. Todavia, 
não conseguia compreendê-la. Ela apresentava 
alguma dificuldade para pronunciar as palavras, 
parecia ter a língua presa. Por várias vezes lhe pedi 
que repetisse suas frases, o que me fez sentir ainda 
mais desconfortável. Diante disso, sugeri que 
desenhássemos. 
 Ela preferiu desenhar em seu caderno. Em 
várias páginas esboçou figuras diferentes. No 
entanto, não conseguia identificar nem as formas, 
tampouco suas explicações. À medida que o tempo 
passava, ficava mais ansiosa e escutava menos 
ainda a garota. Em um dado momento, a ponta de 
seu lápis quebrou. Era um dos poucos que ainda 
escrevia. Sua avó perguntou-lhe do apontador e a 
garota disse que aquele havia sumido e ela ia “levar 
couro”. Em seguida, completou que gostava de 
levar couro. Muito assustada com aquela frase, 
procurei confirmar se havia ouvido direito. A 
garota indicou que sim e logo mudou de assunto. 
Ao longo do atendimento continuou a trazer outros 
conteúdos que não mais me recordo. Não obstante a 
minha dificuldade em apreender o conteúdo que ela 
trazia, fixei-me no fato de ela gostar de levar couro. 
O que determinou o total fracasso de meu 
atendimento. Num dado momento, a garota 
apresentou-se ansiosa pela espera do pai que lhe 
visitaria naquela tarde. Retomando o fato inicial do 
atendimento, apontei a contradição de seu discurso: 
“Mas se você quer tanto ver o seu pai que vai 
chegar daqui a pouco, por que falou que queria 
tanto ir embora?” A garota não respondeu. Sugeri 
que ela desenhasse em meu caderno. Começou 
desenhando alguns círculos. Pedi que me contasse o 
que estava fazendo. Disse que era o “bola 7”. Na 
seqüência delineou um tronco e esboçou um rosto. 
Deduzi que se tratava de uma pessoa gorda. Falou, 
então, de um amiguinho na escola. Voltando ao 
desenho, rabiscou sua parte direita que 
correspondia ao membro direito da pessoa. 
Imediatamente fiz uma infeliz intervenção: “Você 
se arranha, Carolina?”. Ela olhou-me concordando. 
Perguntei-lhe a razão e ela me disse que gostava. 
Lamentavelmente, é perceptível a presença de uma 
resposta induzida nesse caso, dado o caráter da 
pergunta. Continuou dizendo outras coisas que tive 
muita dificuldade de compreender. Pareceu-me que 
ela também arranhava as outras pessoas. 
Insisti em continuar o atendimento, mesmo não 
compreendendo quase nada. Até que seu pai 
chegou. Quis ficar por algum tempo de modo a 
esclarecer o que a garota relatara. Observei que ele 
portava uma aliança e que se referia à mãe da 
garota enquanto sua esposa. Preocupei-me em 
esclarecer isso de modo a compreender a dinâmica 
familiar da paciente. Ademais, atentei-me ao 
comportamento de ambos que expressaram uma 
grande alegria naquele reencontro. Num dado 
momento, após escutar o pai, perguntei se ela 
gostava também de arranhar o pai. Este se 
demonstrou surpreso e perguntou se ela tinha 
inventado aquilo. Movimentei a cabeça indicando 
que sim. Somente naquele momento consegui 
admitir que o atendimento nem sequer havia 
começado. Percebi que não havia lhe escutado em 
nenhum momento. Meu desejo estava 
constantemente presente, o que pode ser 
confirmado pela necessidade em compreender a 
lógica do que estava sendo relatado. 
 
3 - CONCLUSÃO 
 
Um equívoco central presente em qualquer

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