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LEITURA NA ESCOLA E FORMAÇÃO DE LEITORES

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Revista Eletrônica da Faculdade Metodista Granbery 
http://re.granbery.edu.br - ISSN 1981 0377 
Curso de Pedagogia - N. 4, JAN/JUN 2008 
 
 
LEITURA NA ESCOLA E FORMAÇÃO DE LEITORES 
 
 
Liliana Mendes* 
RESUMO 
Este artigo propõe uma reflexão sobre o ensino da leitura na escola. Partindo das 
concepções de alfabetização e de letramento que permeiam este ensino, considera as 
mudanças sócioculturais fatores determinantes das transformações nas práticas pedagógicas 
e nos objetivos de ensino. Compreendendo a prática de leitura na escola como uma prática 
social, tece argumentos em favor do trabalho com gêneros textuais como forma de conferir 
significado ao ensino da leitura na escola e defende o ponto de vista de que, para que a 
escola contribua efetivamente na formação de alunos leitores é preciso produzir, no seu 
interior, razões e condições para ler. Entendendo a língua escrita como uma forma de 
linguagem, argumenta em favor da concepção interacionista como referencial para o 
trabalho com leitura na escola visando à formação de alunos leitores. 
 
PALAVRAS-CHAVE: Leitura. Escrita. Alfabetização. Letramento. Ensino. 
 
ABSTRACT 
This article proposes a reflection on the teaching of reading in school. Beginning with the 
concepts of literacy and literary knowledge that permeate this study, it considers the socio-
cultural changes that are determining factors in the transforamtoin of pedagogical practices 
and teaching objectives. Understanding the practice of reading in schools as a social 
practice, it weaves arguments in favor of working with texts as a way to confer meaning to 
the teaching of reading in school. It also defends the point of view that, for schools to 
effectively contribute to the creation of readers, it is necessary to produce reasons and 
conditions to read. Understanding the written word as a form of language, it argues in favor 
of an interactionist concept as a reference for work with writing in schools, with a view 
towards forming students who read. 
 
KEY-WORDS: reading, writing, literacy, literary knowledge, teaching. 
 
* Mestre em Educação pela Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF; Pedagoga, professora do 
Curso de Pedagogia da Faculdade Metodista Granbery e responsável pela Coordenação de 
Dinamização e Extensão da Biblioteca Municipal Murilo Mendes. Email: 
lmendes@granbery.edu.br; lilimendes_br@yahoo.com.br 
 
 2 
 A leitura e a escrita são marcas inexoráveis das sociedades contemporâneas. Mesmo 
naquelas em que a palavra escrita não é considerada um bem cultural a ser apropriado - por 
meio da escolarização ou por outras vias - o impacto da escrita e a necessidade de leitura se 
fazem presentes, ainda que em menor grau. 
Historicamente, a importância atribuída à escrita e à leitura está relacionada, no 
Ocidente, com os avanços tecnológicos que se fizeram possíveis a partir da Revolução 
Industrial na primeira metade do século dezenove. Esses avanços ampliaram as possibilidades 
de comunicação e permitiram a difusão do uso da escrita em larga escala. Além disso, naquele 
contexto, a escrita deixava de ser apenas um instrumento de preservação de informações e 
tornava-se um importante meio de acumulação e de transmissão do conhecimento (cf. 
CARVALHO, 1996), uma vez que a ênfase na racionalidade científica, característica do 
pensamento moderno, passava a atribuir-lhe o estatuto de veículo do saber científico (cf. 
SIGNORINI, 1995). 
A figura do leitor se transformaria perante aquela nova realidade. O surgimento 
da imprensa informativa ou burguesa permitia a difusão de um modo de ler superficial, 
extensivo, em contraposição à leitura intensiva, comentada e memorizada, que não se 
encaixava mais na sociedade que emergia nesse período - "uma sociedade em que a 
superinformação impressa e áudio visual exigiria outros modos de ler, ouvir e ver” 
(VINÃO, 1999, p. 67) e em que haveria mais "ledores do que leitores" (SALINAS apud 
VINÃO, 1999, p. 67). 
Também a leitura escolar, entendida como modalidade institucionalizada de 
leitura, sofreria mudanças significativas naquele contexto. A partir da diversificação de 
textos circulantes na sociedade, ampliavam-se os objetivos e usos escolares da leitura: a 
leitura em voz alta, intensiva, compartilhada, que até então era a leitura por excelência, 
seria gradativamente convertida em leitura mental ou silenciosa, considerada a mais 
adequada para o estudo e, portanto, o objetivo final da aprendizagem da leitura (cf. 
VINÃO, 1999). 
A partir das transformações ocorridas na nova sociedade que emergia, ser 
alfabetizado deixaria de ser condição suficiente para se tornar leitor. Isso porque a noção de 
alfabetização difundida a partir da Revolução Francesa, quando surge a educação pública, 
universal e gratuita, sob a responsabilidade do Estado, como conseqüência da necessidade de se 
 3 
alfabetizar as massas e disseminar a ideologia burguesa, passa a referir-se ao domínio de uma 
técnica de decifração que precede à leitura. Trata-se de um processo que se baseia na lógica de 
que para aprender a ler e escrever é necessário, antes, passar por uma etapa de reconhecimento 
dos caracteres da escrita, tendo por finalidade garantir o domínio do instrumental por meio do 
qual se pode acessar textos - o alfabeto - buscando da forma mais exata possível a 
correspondência grafo-fonêmica (cf BARBOSA, 1992). 
Ao restringir a aprendizagem da leitura à aquisição de uma técnica e ao centrar o 
seu ensino no desenvolvimento da habilidade de atribuir valores sonoros aos sinais 
gráficos, a escola acaba por disseminar uma concepção de leitura que corresponde a 
transformar os caracteres da escrita em sons – a decodificação – e uma concepção de escrita 
que corresponde a transformar os sons da fala em sinais gráficos – a codificação - 
abandonando ou deixando em segundo plano a leitura e escrita de textos e dissociando, 
assim, o domínio das relações grafo-fonêmicas – a alfabetização – do domínio das 
habilidades de ler e escrever textos. 
Esse conjunto de fatores faz aparecer um novo tipo de analfabetismo, que se 
caracterizava, e ainda se caracteriza, não pelo não saber ler, mas pelo bem saber ler e não 
ler (SALINAS apud VINÃO, 1999). 
SALINAS (apud VINÃO, 1999), ainda nos anos 1940, acusava a educação de 
gerar esse não-leitor alfabetizado. O neoanalfabeto, "criatura da educação moderna", 
segundo o autor, é aquele que somente faz uso da leitura no que é indispensável, nas suas 
atividades rotineiras – o neoanalfabeto total ou funcional- ou aquele que reduz o âmbito de 
sua leitura a temas de interesse profissional ou à leitura de textos de periódicos - o 
neoanalfabeto parcial. 
O surgimento da figura do neoanalfabeto, gerada no ventre das transformações 
dos usos sociais e escolares da leitura e das formas de ler, coincide com o aparecimento dos 
meios eletrônicos de comunicação e se acentua, a partir dos anos 60, com a televisão (cf. 
VINÃO, 1999) e as novas tecnologias de informação. A sociedade moderna passa, então, a 
requerer habilidades que vão além da capacidade de decodificar o código escrito. Assim, a 
diversidade de linguagens e códigos a ler reflete-se na escolarização, obrigando o repensar 
do conceito de alfabetização, de leitura e de escrita (VINÃO, 1999, p. 74). A partir de tais 
demandas, surge então o termo letramento, que amplia ou vai além do termo alfabetismo 
 4 
(cf. SOARES, 1998). 
Segundo SOARES (1998), a origem do termo letramento está ligada à 
necessidade de se definir o estado ou qualidade daquele que utiliza a leitura e a escrita 
como uma prática social. Necessidade que se tornou real há pouco tempo no Brasil. Embora 
o termo letramento tenha surgido na Grã-Bretanha em fins do século XIX, só recentemente 
o estado de quem sabe ler e escrever passou a ser ponto de preocupação. Antes, a realidade 
social só nos permitiapreocupar com o estado de quem não sabia ler e escrever. 
O letramento envolve o ler e o escrever nas dimensões individual e social. 
Do ponto de vista da sua dimensão individual, o letramento refere-se às condições 
que o sujeito adquiriu para operar cognitivamente sobre o texto escrito, a partir do 
desenvolvimento de habilidades de leitura. Estas estendem-se da habilidade de traduzir em 
sons sílabas sem sentido a habilidades cognitivas e metacognitivas, aplicadas a diferentes 
tipos de materiais (SOARES, 1998). 
Já a dimensão social do letramento é levada em conta a partir do pressuposto de 
que letramento se refere não só à capacidade de traduzir o escrito em unidades sonoras ou as 
habilidades e conhecimentos de leitura e escrita, em determinado contexto, mas também a 
relação que se estabelece entre essas habilidades e conhecimentos e as necessidades, os 
valores e as práticas sociais. Nas palavras de SOARES (1998), "letramento não é pura e 
simplesmente um conjunto de habilidades individuais; é o conjunto de práticas sociais 
ligadas à leitura e à escrita em que os indivíduos se envolvem em seu contexto social". (p. 
72). 
Existem, todavia, como destacam SOARES (1998) e KLEIMAN (1995), pontos 
de vista ideologicamente conflitantes em relação à natureza da dimensão social do 
letramento. 
Numa tendência progressista ou liberal, o letramento está relacionado aos usos 
empíricos da escrita e da leitura, que são consideradas habilidades necessárias a um indivíduo 
para que ele “funcione” adequadamente (grifo nosso) nas situações em que tais habilidades 
sejam exigidas. Essa noção de letramento enfatiza a natureza pragmática das práticas de 
leitura e escrita e coaduna-se com os pressupostos contidos nas propostas de alfabetização 
funcional que foram disseminadas nas escolas a partir dos anos 1950 (cf. BARBOSA, 1992). 
Nessa perspectiva, o indivíduo letrado seria aquele que se utiliza da leitura e da escrita na sua 
 5 
vida diária. Subjacente a tal conceito está a crença de que o uso adequado dessas habilidades, 
por si só, irá trazer, como conseqüência, uma condição cognitiva mais favorável ao 
indivíduo, além de lhe permitir uma maior mobilidade social e uma melhor condição 
econômica (cf. SOARES, 1998; KLEIMAN, 1995). 
A essa tendência, que Street (apud KLEIMAN, 1995) chamou de modelo 
autônomo de letramento, contrapõe-se o “modelo ideológico”. 
Segundo STREET (1995), as práticas de letramento envolvem aspectos não só 
culturais, mas políticos e ideológicos. Nessa perspectiva, o letramento 
 
é essencialmente um conjunto de práticas socialmente construídas que 
envolvem a leitura e a escrita, geradas por processos sociais mais amplos, 
e responsáveis por reforçar ou questionar valores, tradições e formas de 
distribuição de poder presentes nos contextos sociais (SOARES, 1998, p. 
74 - 5). 
 
Nessa tendência, o letramento está relacionado com as concepções de leitura e 
de escrita e com as formas como as práticas de leitura e escrita se dão em determinados 
contextos sociais. Assim, a leitura como prática social "depende das instituições sociais que 
propõem e exigem estas práticas" (SOARES, 1998, p. 74), inclusive a escola1. 
Tal concepção de letramento tem ligação com a noção de alfabetização tomada 
por Freire (1991), para quem a leitura e a escrita relacionam-se dialeticamente com a 
realidade, uma vez que, na prática democrática e crítica, a leitura do mundo e a leitura da 
palavra estão dinamicamente juntas e a importância do ato de ler está no potencial 
transformador da leitura, que seria, em última análise, a possibilidade de reescrever o 
mundo e transformá-lo pela nossa prática consciente. 
Se tomarmos como referência sua dimensão social e tendo como perspectiva o 
modelo ideológico de letramento, só podemos considerar positivas as conseqüências do 
ensino da leitura e da escrita na medida em que estas constituam instrumentos para tomada 
de consciência e superação da realidade social. 
Historicamente, a escola vem se constituindo como a principal agência de 
letramento (cf. KLEIMAN, 1995). Portanto, podemos entender a leitura na escola como 
uma prática social que se constrói nas práticas pedagógicas e que está fundamentada nas 
 
1
 A respeito do modelo ideológico e o modelo autônomo de letramento, ver também Kleiman (1995). 
 6 
mais diversas concepções de linguagem, de leitura e de ensino-aprendizagem. Assim sendo, 
a formação do leitor (ou do não-leitor) por meio da escolarização relaciona-se, 
fundamentalmente, a dois aspectos intrínsecos: as concepções e práticas de leitura - que 
permeiam as finalidades e objetivos da leitura na escola - e as concepções de letramento 
escolar. 
De acordo com Kleiman (1995), as práticas de leitura na escola sustentam-se a 
partir do “modelo autônomo” de letramento. Uma vez que a esse modelo de letramento 
escolar está intrínseca a crença de que a leitura é uma prática social associada à 
possibilidade de progresso e de mobilidade social, a leitura na escola volta-se para a 
funcionalidade, ou seja, o desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita equipando os 
aprendizes para lidar com situações concretas do cotidiano. Assim, a leitura na escola 
considerada como prática social assume um caráter de arma2 e fica reduzida a instrumento 
para as classes populares ascenderem socialmente, inserirem-se no mercado de trabalho, 
tornarem-se cidadãos (cf. KRAMER, 1993). Desta forma, suas leituras ficarão limitadas a 
tais situações. 
A leitura na escola deveria também "equipar" os alunos com a capacidade de se 
formarem por meio dela, constituindo-se como um meio para que estes possam relacionar-
se íntima e subjetivamente com a realidade, no sentido de transformá-la. Assim 
compreendida, a leitura na escola se revestiria do caráter de sonho3 - que não se contrapõe, 
mas complementa a finalidade da leitura escolar como arma e garantiria então ao aluno, o 
status de verdadeiro leitor. 
Ao assumir como finalidade da leitura escolar a leitura arma, o que tem sido 
constatado é que a escola acaba por afastar o aluno dos significados da escrita (e da leitura) 
como arma e sonho, porque enfatiza a escrita e a leitura "de palavras nuas", mantendo o 
cotidiano da leitura distante da leitura e da escrita com sentido e significado (cf. KRAMER, 
1993). 
Assim agindo, a escola, que a princípio seria responsável pela formação dos 
sujeitos letrados, paradoxalmente vem sendo apontada como a responsável por formar 
sujeitos letrados não-leitores, ou como quer Salinas (apud VINÃO, 1999), neoanalfabetos. 
 
2
 As concepções de leitura como arma e sonho foram desenvolvidas por Kramer (1993) para designar, 
respectivamente, as funções instrumental e formadora da leitura. 
3
 Remete à nota anterior. 
 7 
Isso porque, tal como afirma Kleiman (1995), as práticas de letramento na escola, via de 
regra, ignoram o letramento-prática social e privilegiam o letramento-prática individual: o 
processo de aquisição dos códigos. A interação verbal, permeada pela utilização da leitura e 
da escrita como meio para se comunicar com o outro e com o mundo, é alijada das práticas 
de leitura escolar. Os textos são destituídos de seu sentido original, que é determinado 
justamente pela necessidade de interação verbal e as práticas de leitura escolar acabam por 
transformar todo gênero de texto em texto escolar, ou "didático". Desta forma, a leitura na 
escola fica reduzida a uma série de atividades para o desenvolvimento das habilidades de 
decodificação e de compreensão de textos dados, em situações artificiais de comunicação. 
E sua finalidade fica limitada ao plano da funcionalidade, ou seja, à prática de leitura 
voltada estritamente para as situações cotidianas ou profissionais, quando não mais 
estritamentevoltada para a aprendizagem escolar. 
Mesmo que na escola outros gêneros e outros portadores de texto se façam 
presentes, a forma como tem se dado a leitura é sempre invariável. Não se consideram 
outras dimensões da leitura possíveis num mesmo texto, nem as possibilidades de 
diferentes leituras para diferentes textos. Tal como constata Micarello (1998), na escola 
cada texto é trabalhado como um elemento isolado, sem que haja uma ligação com outros 
textos, sejam eles escolares ou vivenciais. Segundo a autora, na sala de aula verificam-se 
práticas de leitura e escrita que possuem como característica principal a produção de um 
sentido escolar para o ato de ler e escrever. Livros de histórias, jornais, livros didáticos - 
todos são trabalhados como “instrumentos” para ensinar a ler e escrever, desconsiderando-
se o caráter interativo de cada leitor-escritor. Esse é um modelo de letramento escolar que 
visa ao domínio de um texto abstrato, completamente desvinculado das práticas discursivas 
presentes no contexto social, do qual a escola é parte integrante, ainda que tal texto seja 
retirado do cotidiano. 
Tais práticas estão pautadas em concepções que consideram a linguagem, ora 
como expressão do pensamento, ora como meio objetivo para a comunicação e ignoram por 
completo as interações verbais nas práticas discursivas (cf. KLEIMAN, 1995). Nelas, a 
língua é vista ou como um conjunto de normas - em que o ensino da leitura e da escrita irá 
enfatizar a correção gramatical e ortográfica, em prejuízo da construção do significado - ou 
como um instrumento facilitador da expressão - e então há distorções como a rejeição a 
 8 
regras imprescindíveis à compreensão, o que compromete, da mesma forma, a construção 
do significado. Ao enfatizar um ou outro pólo, a escola nega ao aluno a possibilidade de 
penetrar na corrente da comunicação verbal por intermédio da linguagem escrita. Logo, a 
palavra deixa de constituir o território social dos interlocutores, seja no diálogo entre as 
crianças, seja em obras literárias e outras produções escritas (cf. KRAMER, 1993, p. 83). 
Tendo em vista as considerações anteriores, podemos afirmar que a questão da 
formação do leitor passa pelo resgate dos sentidos dos textos lidos na escola através, não só 
do acesso à leitura e à escrita como habilidades individuais, mas principalmente pelo acesso 
às práticas sociais de leitura propriamente ditas. Sendo assim, acreditamos, tal como 
Foucambert (1994), que o problema central da questão da formação do leitor está 
propriamente no processo de alfabetização4, mas no acesso à leitura e que o 
(neo)analfabetismo não é conseqüência da falta de acesso ao domínio das técnicas de 
transformar um texto escrito num texto oral, pelo processo de decodificação do código 
escrito. Embora tais habilidades sejam fundamentais à apropriação da leitura e da escrita 
como prática social, acreditamos, como o referido autor, que o problema do 
(neo)analfabetismo esteja no acesso à leitura, ou ainda, na falta de motivos para ler, seja no 
ambiente escolar ou fora dele. 
Segundo o mesmo autor, a desigualdade na utilização da leitura é o ponto de 
estrangulamento da vida democrática, uma vez que não há possibilidade de democracia sem 
que isso passe, necessariamente, pela democratização das práticas sociais de leitura e escrita, 
a partir dos usos e funções que tais práticas assumem para determinado grupo. 
Por democratização da lecto-escrita como prática social compreende-se a 
possibilidade de entender a escrita como “a linguagem para os olhos e não para os ouvidos” 
(FOUCAMBERT, 1994, p.25), numa visão oposta aos comportamentos alfabéticos. Trata-
se, portanto, de garantir a aprendizagem da leitura a partir da educação escolarizada, 
democratizando o status de verdadeiro leitor. Nesse sentido, a escola além de alfabetizar 
pode “dirigir a maneira de ser leitor.” (FOUCAMBERT, 1994, p. 23). 
Partindo desses pressupostos, entendemos que a leitura na escola deve orientar-
se pelo conceito de leiturização, formulado por Foucambert (1993; 1994; 1997), que 
 
4
 Entendido como apropriação do sistema alfabético de escrita, que se refere à compreensão das relações 
grafo-fonêmicas. 
 9 
podemos tomar como uma nova forma de definir, não o estado ou condição (grifo nosso) de 
quem sabe ler ou escrever - idéia a que nos remete o termo letramento - mas o processo 
(grifo nosso) de aquisição das habilidades sociais de leitura e escrita. Tal conceito 
ultrapassa o conceito usual de alfabetização, entendido como o processo de apropriação do 
código escrito. A leiturização seria o trabalho com a leitura e a escrita enquanto produção 
de sentidos, que evolui da ênfase na aquisição do código para a ênfase na sua utilização 
pelos indivíduos (cf. MICARELLO, 2000). Portanto, leiturizar (ao invés de alfabetizar) 
consiste em fazer os alunos entrarem em contato com sua realidade a partir de um trabalho 
que relacione vários tipos ou gêneros de texto, que constituem, na verdade, diferentes 
formas de retratar a realidade por meio da linguagem. Logo, tal processo compreende uma 
gama infinita de possibilidades de práticas de leitura na escola, uma vez que se expandem 
cada vez mais os gêneros de textos a serem lidos, em função da multiplicidade das 
tecnologias de linguagem e na medida em que a cada um desses gêneros de texto 
corresponderiam múltiplas formas de ler, ou seja, de atribuir-lhes sentido. 
O descortinamento da realidade a partir da leitura de textos diversos é o que 
oferece sentido à prática de leitura escolar, pois a partir do trabalho com tais textos é que é 
trazida para a escola a possibilidade de uso concreto, real, não artificial e não só escolar das 
habilidades de leitura e escrita, como forma de nos comunicarmos. 
Como diz Foucambert (1993), as pessoas só lêem ou escrevem quando estão 
diretamente ligadas a algum acontecimento em que necessitem utilizar a linguagem escrita, 
em que não seja possível expressarem-se por meio de outras linguagens. 
 
A idéia geral é a de que não há interesse pela leitura enquanto não 
se compreender para que serve o trabalho com a realidade feito 
pela linguagem escrita, enquanto não se descobrir o poder dessa 
linguagem de dar sentido às coisas (FOUCAMBERT, 1994, p. 26). 
 
Assim, para construir uma prática de leitura na escola que realmente abarque 
todas as dimensões possíveis da leitura como prática social, é preciso assumir uma outra 
concepção de leitura, que traga de volta a palavra como constitutiva do pensamento e da 
subjetividade. Uma concepção de leitura que tenha como fundamento uma concepção de 
linguagem que privilegie as interações verbais e que, por sua vez, possa refletir-se na 
prática pedagógica por meio de uma proposta de leitura escolar que inclua toda a gama de 
 10
textos circulantes na sociedade, mas que amplie a leitura de tais textos para além do 
objetivo escolar. 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
 
BARBOSA, José Juvêncio. Alfabetização e leitura. São Paulo: Cortez, 1992 
 
FOUCAMBERT, Jean. A criança, o professor e a leitura. Porto Alegre: artes Médicas, 
1997. 
 
______. A leitura em questão. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. 
 
______. Mais que alfabetizar, agora é necessário “leiturizar”. Rio de Janeiro: 1993. 
Entrevista concedida à revista Nova Escola: Fundação Victor Civita, v. 8, n. 64, mar, 1993. 
 
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo: 
Cortez, 1991. 
 
KLEIMAN, Angela. Modelos de letramento e as práticas de alfabetização na escola. In: Os 
significados do letramento. Campinas: Mercado das Letras, 1995. p. 15-61. 
 
______. Oficinas de leitura: teoria e prática. Campinas: Pontes/Unicamp, 1993. 
 
KRAMER, Sonia. Por entre as pedras: arma e sonho na escola. São Paulo: Ática, 1993.MICARELLO, Hilda A . L. da Silva. O professor alfabetizador e a formação do sujeito 
leitor: discursos na prática e práticas discursivas. Juiz de Fora, 2000. Dissertação (Mestrado 
em Educação) – UFJF. 
 
SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 
1998. 
VINÃO, A. Leer e escribir (siglos XIX – XX). Educação em Revista. Belo Horizonte: n. 
29, p. 61-82, jun, 1999.

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