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Filosofia
DIMENSÃO 
ÉTICO-POLÍTICA
J O R G E N U N E S B A R B O S A
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• CAPÍTULO 1 •
O filósofo não cria a moral; reflecte 
sobre a que já existe, critica-a, depura-a 
e sistematiza-a, mas não a inventa.
DIMENSÃO ÉTICO-POLÍTICA
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FILOSOFIA
A Dimensão Ético-Política.
	
 3 Março 2009
Intenção Ética e Norma Moral.
Ética e Moral.
“Os especialistas de filosofia moral não se entendem 
quanto à repartição do sentido entre os termos moral e 
ética. A etimologia é, a este propósito, inútil, na medida 
em que um dos termos vem do latim e outro do grego e 
os dois se referem, de uma maneira ou de outra, ao 
domínio comum dos costumes.” Paul Ricoeur.
O texto indica-nos que a etimologia dos termos moral e 
ética não é suficiente para clarificar as diferenças que 
existem entre eles. Moral provém do latim, enquanto 
ética provém do grego e tinham nas suas línguas de 
origem significados muito semelhantes. No entanto, na 
linguagem filosófica habitual, a moral distingue-se da 
ética como uma realidade se distingue do pensamento 
que sobre ela se exerce. Numa primeira aproximação, 
podemos, então, dizer que a ética é uma reflexão sobre a 
moral.
Assim sendo, a moral é um conjunto de princípios, 
normas, juízos e valores de carácter prescritivo que, 
vigentes numa dada sociedade, são interiorizados pelos 
seus membros, antes de qualquer reflexão sobre o seu 
significado e a sua importância. Por seu turno, a ética 
será a reflexão sobre essa esfera da conduta humana, 
tendo por finalidade encontrar o agir bem, a vida 
orientada pelo bem. Reflectindo sobre a conduta e o 
comportamento dos seres humanos, sob o prisma da 
bondade e da maldade, da justiça e da injustiça, a ética 
propõe-se encontrar o sentido moral da vida, com vista 
à sua realização.
Existe, por conseguinte, um primado da ética sobre a 
moral. A lei moral, a norma, será apenas um meio para 
se alcançar a verdadeira finalidade, isto é, uma vida 
moralmente realizada. 
A disciplina que reflecte sobre essa finalidade é, 
obviamente, a ética. Por isso, cabe à ética estudar os 
comportamentos e os diversos códigos morais, 
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analisando os problemas morais e proporcionando 
princípios e critérios que justifiquem estas ou aquelas 
normas.
Nesse sentido, a moral é objecto da ética ao nível da 
fundamentação, proporcionando à ética um conjunto de 
códigos e normas sobre os quais ela reflecte. Sendo uma 
reflexão teórica sobre a moral, a ética fornece a 
justificação e a validação da moral, influenciando assim 
os comportamentos e as atitudes. Ela analisa a 
natureza, a função e o valor dos juízos morais, 
ajudando-nos a fazer avaliações morais mais 
ponderadas, quer quanto ao comportamento alheio e ao 
papel das instituições, quer, sobretudo, quanto ao nosso 
comportamento e às nossas decisões.
“O filósofo não cria a moral; reflecte sobre a que já 
existe, critica-a, depura-a e sistematiza-a, mas não a 
inventa. O que faz é:
✓ Analisar a linguagem da moral.
✓ M o s t r a r o c a r á c t e r m o r a l d o h o m e m 
individualmente e em comunidade.
✓ Rever filosoficamente a moral histórica já criada 
e, especificamente, os problemas morais da 
actualidade.” (Paul Ricoeur)
Esta tarefa do filósofo revela-nos a importância da ética 
na nossa vida. Ela ajuda-nos a fazer avaliações morais 
mais justas, a fundamentar racionalmente as nossas 
decisões, a conhecermo-nos melhor e a aperfeiçoarmo-
nos, possibilitando-nos um maior discernimento em 
matéria de moral individual e no âmbito da moral 
pública. Em especial, recorremos à reflexão ética, 
quando se nos deparam dilemas morais. Dilemas 
morais são conflitos de valores, que decorrem da 
circunstância de esses valores se revestirem de idêntica 
importância.
Um exemplo simples permite perceber este problema. 
Suponhamos que um amigo nosso cometeu um roubo. 
Se nos inquirirem quanto ao crime, devemos denunciar 
o nosso amigo ou não? A verdade e a amizade são os 
dois valores que aqui estão em conflito.
Existem inúmeras situações na nossa vida que nos 
colocam perante estes conflitos: a eutanásia, o aborto, a 
fecundação in vitro, a poluição ambiental, etc., 
representam outras tantas situações que nos colocam 
perante a necessidade de reflexão ética, sublinhando a 
sua importância, não só na esfera individual, como 
também no domínio público.
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Intenção Ética e Norma Moral.
Sendo objecto de estudo teórico por parte da ética, as 
normas morais servem de guias de acção, embora não 
sejam absolutas e estejam sempre sujeitas a posterior 
revisão. Se as normas conduzem a impasses práticos, 
então é preciso recorrer à intenção ética para as aplicar 
ou, até, reformular.
Mas qual é a diferença entre intenção e norma?
“As minhas intenções são inclinações conscientemente 
aceites e assumidas por mim. (...) A intenção é sempre 
intenção de realizar algo, é sempre activa, implica uma 
certa tensão, tendo em vista a realização de uma acção 
(...). Quando tencionamos realizar algo, pomo-nos 
n u m a c e r t a t e n s ã o p a r a e x e c u t a r o q u e 
tencionamos.” (Paul Ricoeur)
Se a intenção é conscientemente aceite e assumida por 
mim, então isso significa que ela é o fundamento 
interior da acção. Mas nem toda a intenção pode ser 
satisfeita; ela confronta-se com os costumes e com as 
normas exteriores, nem sempre coincidentes com a 
interioridade.
Assim, a intenção é avaliada pela norma.
A norma será o padrão de medida, servindo de modelo 
de comportamento a nível social. Uma vez que o 
indivíduo vive sempre inserido numa sociedade, a qual 
se rege por códigos de conduta institucionalizados que 
servem de padrão ou medida de avaliação das acções 
praticadas pelos diversos membros, a intenção ética 
confronta-se necessariamente com o contexto moral 
próprio dessa cultura.
Assim sendo, enquanto a intenção representa o lado 
pessoa l e ín t imo da acção , as normas são 
institucionalizadas, suprapessoais, encontrando-se fora 
do indivíduo, embora este as interiorize.
Enquanto a intenção é da responsabilidade do sujeito 
da acção, remetendo para a sua autonomia, a norma 
impõe-se a partir do exterior, remetendo para a 
heteronomia. Enquanto a intenção é conscientemente 
assumida, as normas integram-se em códigos, servindo 
de modelos de avaliação das acções e tendo subjacentes 
a si um conjunto de valores socialmente legitimados.
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Em conclusão, importa sublinhar que as normas 
obrigam, porque expressam valores em que a sociedade 
acredita e o indivíduo também, desde que já tenha 
passado pelo processo de socialização e integrado esses 
valores. É por isso que, em parte, as alternativas morais 
individuais já se encontram canonizadas, havendo uma 
coincidência dos códigos externos com a nossa 
autodeterminação. Mas nem todas as normas são 
universais. Os dilemas morais servem de exemplo disso 
mesmo. Além disso, poderão existir certas normas 
sociais que será sensato questionar, sobretudo se 
puserem em causa a dignidade da pessoa humana.
 
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• CAPÍTULO 2 •
A opinião que cada um tem de si mesmo 
reflecte a opinião dos outros sobre si, ou, para 
sermos mais rigorosos, reflecte a maneira como 
cada indivíduo imagina que os outros o 
avaliam.
A DIMENSÃO PESSOAL E SOCIAL DA ÉTICA – O SI MESMO, O OUTRO E AS 
INSTITUIÇÕES
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A Dimensão Pessoal e Social da Ética – o si 
mesmo, o outro e as instituições.
Ser Humano – ser de interacção.
O ser humano constrói a sua identidade pessoal através 
da interacção social. É um ser relacional. Segundo Paul 
Ricoeur, a ética distribui-se por três pólos em 
interacção:
➡ O pólo-eu
➡ O pólo-tu
➡ O pólo-ele.
Este último refere-se às instituições. Sendo assim, a
felicidade individual constrói-se na relação com os 
outros, através de instituições justas. Uma vida 
realizada e feliz é o fim último da acção moral. Mas, 
para além destas três dimensões, não podemos esquecer 
a Natureza, enquanto morada na qual decorre a 
existências humana.
A ética e a moral não teriam, portanto, qualquer sentido 
se o ser humano não fosse um ser natural e se não 
vivesse em comunidade.
Cada sociedade possui uma série de normas, acerca dos 
comportamento desejáveis e indesejáveis, que os 
indivíduos devem ou não realizar. Além disso, a moral 
também não teria sentido, se não houvesse da parte do 
indivíduo, integrado na sociedade, o desejo de uma vida 
melhor e mais perfeita. Este desejo articula-se com a 
auto-estima, que conduz ao reconhecimento da 
reciprocidade.
De facto, o si só de reconhece a si mesmo na vivência 
com e para os outros. A auto-estima dará lugar à 
solicitude, quando o outro aparece diminuído na sua 
capacidade de agir. A solicitude permite reduzir as 
desigualdades na relação com os outros.
Mas esta relação é, na maior parte das vezes, mediada 
pelas instituições. São as instituições que permitem a 
aplicação da justiça, por forma a garantirem a 
igualdade, mas respeitando as diferenças.
Do Si Mesmo à Consciência Moral.
A expressão si mesmo designa o conceito ou a imagem 
que o indivíduo tem de si mesmo, isto é, a percepção 
que cada indivíduo tem a respeito de si próprio. A 
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construção desta representação é complexa e vai 
evoluindo ao longo do tempo.
Em última análise, a ideia que cada um tem de si 
mesmo é equivalente ao auto-conceito e à consciência 
de si como pessoa com identidade própria. Esta 
representação é constituída por duas dimensões:
➡ A auto-imagem.
➡ A auto-estima.
Enquanto a auto-imagem se refere ao modo como a 
pessoa se vê a si própria, ao nível das suas 
características corporais, psicológicas e relacionais, a 
auto-estima diz respeito ao valor que a pessoa atribui a 
si própria.
Por outro lado, a opinião que cada um tem de si mesmo 
reflecte a opinião dos outros sobre si, ou, para sermos 
mais rigorosos, reflecte a maneira como cada indivíduo 
imagina que os outros o avaliam.
O si mesmo vai-se organizando e estruturando em 
função das experiências. O sujeito interpreta estas 
experiências, a partir da sua própria consciência.
O que é, então, a consciência? É o conhecimento mais 
ou menos claro e imediato daquilo que se passa em nós; 
é a intuição dos nossos pensamentos, sentimentos e 
estados psíquicos. Ora, a consciência possui a 
capacidade de se desdobrar, ou seja, ela é consciência 
das coisas exteriores e também é consciência de si.
Assim, a consciência moral é uma espécie de juiz 
interior, que ordena o que deve o não deve ser feito, 
tendo em conta a realização do bem e o impedimento do 
mal. Ela aparece como uma força crítica relativamente à 
acção.
Mas consciência moral não se forma de uma vez por 
todas. Ela é fruto de uma lenta evolução. Esta evolução 
depende do desenvolvimento cognitivo, das relações 
sociais que o indivíduo estabelece e do meio 
sociocultural onde vive.
De um modo geral, podemos dizer que a consciência 
moral evolui da heteronomia para a autonomia, ou seja, 
começamos por interiorizar as normas e obedecemos-
lhes por medo de castigo – heteronomia -, e esta 
situação evolui para um patamar mais elevado, ao qual 
nem todos chegam, que consiste em nos auto-
determinarmos em função de princípios e valores 
morais justificados de forma racional – autonomia.
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Para além de tudo o mais, a consciência moral é uma 
presença intermitente, porque só intervém quando 
temos de enfrentar problemas e conflitos de natureza 
moral.
Liberdade.
Sendo dotados de consciência moral, podemos optar 
livremente. 
Tendo consciência das consequências dos nossos actos, 
podemos ser responsabilizados por eles.
Em que consiste, então, a liberdade moral?
A experiência mostra-nos que alguns dos nossos actos 
escapam ao domínio da razão, sendo provocados por 
forças e causas que não somo capazes de controlar. 
Além disso, existem acções involuntárias que só 
dificilmente poderemos fazer depender da nossa 
liberdade.
Ainda assim, não deixamos de nos considerar livres.
Sentimo-nos detentores de uma liberdade interior, que 
escapa a qualquer coacção externa. Isto significa que 
podemos respeitar ou infringir as normas morais, 
podemos cumprir ou não o nosso dever, escolher o Bem 
ou optar pelo Mal. Destas escolhas, obteremos ou a 
satisfação do dever cumprido ou o remorso do seu 
incumprimento.
Mas a liberdade moral pode também ser encarada a um 
outro nível.
Com efeito, ao assumir a responsabilidade por uma 
determinada acção, estou também a assumir a 
autonomia e o poder para dar a mim próprio uma lei 
moral.
Deste modo, sou um legislador moral e detenho uma 
autonomia e independência em relação às leis da 
natureza.
Sendo assim, serei livre, por uma lado, enquanto 
manifesto a minha independência relativamente aos 
desejos naturais e às inclinações egoístas, e, por outro 
lado, enquanto desenvolvo uma atitude de submissão às 
lei morais que dou a mim próprio.
O Outro e a Responsabilidade.
Agindo livremente, somo responsáveis pelas nossas 
acções. E o que é a responsabilidade? 
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Em termos do Direito Civil, a responsabilidade é a 
obrigação de reparar o mal feito a alguém. Em termos 
de Direito Penal, exprime a situação daquele que pode 
ser punido por um delito ou por um crime.
Na filosofia e na moral, a responsabilidade é a 
consciência de se ser autor de determinado acto ou 
objecto. É facto de o indivíduo ter de responder pelos 
seus actos, assumindo-os e reconhecendo-se autor 
deles.
A quem pedir responsabilidades?
À pessoa, naturalmente, porque é livre e capaz de 
discernir o bem do mal. Ainda assim, podemos admitir 
a existência de uma partilha de responsabilidades por 
parte de várias pessoas envolvidas numa acção comum. 
É o que alguns autores designam de responsabilidade 
solidária.
Perante quem somos responsáveis?
Desde logo, somos responsáveis perante nós mesmos e 
perante a nossa consciência.
Cada um dos nossos actos contribui para a construção 
de nós próprios. Por outro lado, esses actos definem a 
nossa relação com os outros. Por isso, somos também 
responsáveis perante o outro.
Mas quem é o outro?
Em muitos discursos filosóficos contemporâneos, o ser 
humano passou a ser definido essencialmente como 
relação. Ao primado do indivíduo, sobrepõe-se o 
primado da relação, do encontro, da comunicação, da 
recirpocidade.
➡ O sermos-uns-com-os-outros é um dado 
primário da existência humana. O outro é 
imprescindível à constituição do eu. O outro é o 
meu semelhante, sendo, ao mesmo tempo, 
diferente de mim. Na minha relação com ele, 
posso encará-lo sob três aspectos:
➡ Como concorrente. – o outro é aquele com 
quem nada tenho a ver, aquele que disputa o 
meu lugar e contra quem tenho de competir, 
numa relação de conflito, por vezes até de 
aniquilação. (escusado será dizer que, a este 
nível, não existe preocupação ética).
➡ Como elemento de um contrato. – certas 
teorias sociopolíticas consideram que os 
indivíduos são mónadas que estabelecem 
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contratos entre si, uma vez que não podem 
sobreviver uns sem os outros. A relação com o 
outro é apenas acidental e estratégica, 
reduzindo-se a um pacto de não agressão, uma 
forma de assegurar a defesa de interesses 
distintos e antagónicos.
➡ Como um tu-como-eu. – quando o outro for 
visto como um outro eu, a quem se concede a 
dignidade de pessoa. Só assim estaremos diante 
dessa dimensão ética de sermos uns-com-os-
outros. Nas experiências do acolhimento, do 
amor, da amizade é que se descobre
autenticamente essa dimensão, reconhecendo-
se o outro como um valor absoluto, com 
dignidade própria.
Reconhecendo no outro essa dignidade, sou capaz de 
ver nele uma identidade distinta, um universo de 
significações diferentes do meu, exigindo da minha 
parte uma atitude ética.
O outro possui direitos e perante ele devo assumir os 
meus deveres.
Temos uma responsabilidade actual perante o outro que 
vive sob o nosso encargo e perante a sociedade, de cujos 
benefícios usufruímos. Além disso, somos responsáveis 
para com as gerações futuras. A nossa acção de hoje não 
deve comprometer a sobrevivência humana no futuro.
A relação intersubjectiva (relação eu-tu) passa 
sobretudo pelo diálogo, num contexto social, 
caracterizado pela existência de instituições.
Instituições, perante as quais temos uma dívida 
cultural.
E o que são instituições, afinal?
São conjuntos de convenções ou regras constitutivas, 
que definem e determinam posições e relações numa 
área determinada de modo convencional. Ou seja. As 
instituições estabelecem, através de regras, os papéis e 
os estatutos de cada indivíduo, impondo limites e 
obrigações.
Desde a família às instituições educativas, económicas, 
políticas, culturais, religiosas, o objectivo destas 
diferentes esferas consiste em regular e pautar as 
relações interpessoais. Por isso, na vida em sociedade, o 
agir individual encontra-se mais ou menos 
institucionalizado, o que significa que existem regras de 
comportamento que definem o que é aceitável ou 
reprovável.
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É neste contexto que podemos falar de consciência 
cívica. Inseparável da consciência moral, ela refere-se à 
convivência social.
A consciência cívica é, portanto, o que nos permite 
compreender as regras e normas institucionais, mas 
também pôr essas regras em causa, em função da nossa 
consciência moral.
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