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RESENHA CRÍTICA SOBRE MEDITAÇÕES SOBRE FILOSOFIA PRIMEIRA

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MEDITAÇÕES SOBRE FILOSOFIA PRIMEIRA�
Ana Paula Santos Huoya�
	Considerado o pai da filosofia moderna, René descartes foi um filósofo que atuou em diversas áreas do conhecimento, como a física, matemática, geometria entre outras. Nascido na França é umas das figuras responsáveis pela Revolução Cientifica, sobretudo pelo trabalho na filosofia e é considerado um dos pensadores mais importantes da história do pensamento ocidental, influenciando filósofos de gerações posteriores. Sua principal obra, Discurso sobre o método (1637), é tida como um dos pilares da filosofia moderna e sua bibliografia abriga os títulos Meditações Sobre Filosofia Primeira, O Mundo ou Tratado da Luz entre outras. 
	A obra aqui resenhada é Meditações sobre filosofia primeira. Esta obra, escrita originalmente em latim, todo o projeto cartesiano que fundará a racionalidade. Descartes a dividiu em seis meditações de forma que os argumentos levantados em cada meditação se ligassem. Essas meditações rompem com o paradigma aristotélico de construção da verdade para fundar a filosofia moderna, que inspira o método científico atual. 
	A primeira meditação, como todas adiante, é precedida por uma sinopse. Nesta, então, ele antecede que tratará das “causas por que podemos duvidar de todas as coisas, principalmente materiais, ao menos enquanto os fundamentos das ciências não forem diversos dos que temos até agora” (DESCARTES, 2004, p. 19). O autor inicia o percurso da dúvida através da afirmação de que é necessário construir algo sólido e perene para as ciências. Ele então faz isso através do ceticismo metodológico, o qual Silva (2005) descreve como a radicalização da dúvida com pretensão de encontrar a evidência absoluta, negando todo o conhecimento previamente conhecido. Alcançada a maturidade em retiro solitário, o filósofo pôde derrubar suas crenças antigas, mostrando que são dubitáveis. Afinal, elas foram apreendidas pelos sentidos e, por o terem enganado uma vez, deve-se duvidar deles. É então que se desenvolve a dúvida natural, conhecida pelos estudiosos como “O argumento do sonho”, o qual trata da indistinguibilidade entre sono e vigília. Dessa forma, ele recusa todo o fundamento sensível do conhecimento. Se no sonho certas representações não fazem parte da realidade e se não se pode distingui-lo da vigília, o caráter sensível da representação o põe tudo aquilo apreendido pela percepção em dúvida. 
	Ainda na primeira meditação Descartes não conseguiu, com o argumento do sonho somente, por em dúvida o conhecimentos matemáticos, ou seja, as ciências exatas. É nesse sentido que ele constrói a dúvida metafísica, nomeada de “O argumento do Gênio maligno”. Estas representações, segundo Silva (2005), “não fazem parte do fundamento sensível do conhecimento”. Afinal, elas são concebidas no entendimento e não na percepção. Ainda assim, esses elementos devem ser submetidos à dúvida ainda que artificial. Assim, Descartes supõe, inicialmente, um Deus que pode ter criado ele para enganá-lo ou não, por exemplo, toda vez que adiciona um a dois. Isso ocorre, pois dentro de um princípio da causalidade - o efeito é sempre menor ou igual do que sua causa – o sujeito é imperfeito como já provado pelo fato de duvidar e, logo, Deus pode ser qualquer coisa. No mais, o sujeito pode ser fruto do acaso, o que o tornaria mais imperfeito ainda. 
Ademais, sabe-se que essa dúvida poderia negar também o conhecimento sensível. Entretanto, o argumento do sonho também é necessário para as duas próximas meditações já que, primeiramente, ele cinde com sujeito e objeto, mostrando que não há critério objetivo que distinga a realidade das ideias que são formadas pelos sentidos. Depois, com esse argumento, é introduzida uma gradação onde se expõem as formas inferiores de pensar, chegando naquelas com maior realidade objetiva, que é um grau de perfeição, partindo da percepção para o entendimento. 
	Já na Segunda meditação, o autor separa corpo de alma, demonstrando a imortalidade da alma em detrimento do corpo. Assim, trata da natureza da mente humana, prosseguindo no descobrimento através da negação para encontrar algo certo e inabalável. Se ele nega corpo, figura, extensão, movimento e lugar, só sobra de verdadeiro o “eu” que, por duvidar de todas essas coisas tem certeza de que pensa. Funda-se nesse momento o ponto de partida do conhecimento que é o cogito. Por esse fundamento, o sujeito tem acesso imediato ao seu pensamento. Isso não ocorre, porém, com as entidades corporais, às quais a coisa pensante (res cogito) tem acesso mediato. Afinal, as entidades corporais são imortais - já que são apreendidas pelos sentidos - ao contrário da alma, que é a coisa pensante:
Eu, eu sou, eu, eu existo, isto é certo. Mas por quanto tempo? Ora, enquanto penso, pois talvez pudesse ocorrer também que, se eu já não tivesse nenhum pensamento, deixasse totalmente de ser. Agora, não admito nada que não seja necessariamente verdadeiro: sou, portanto, precisamente, só coisa pensante, isto é, mente ou ânimo ou intelecto ou razão, vocábulos cuja significação eu antes ignorava. Sou, porém, uma coisa verdadeira e verdadeiramente existente. Mas qual coisa? Já disse: coisa pensante. (DESCARTES, 2004, p.49)
	Em seguida, o autor discorre sobre o fato do “eu” não poder ser aquilo que se figura na imaginação, pois esta é parte limitada do pensamento, ou seja, uma das formas de pensar menos perfeita. Afinal, a imaginação contempla imagens corporais, ou seja, acidentais ou contingentes que não são características essenciais. Sucede que a imaginação, apesar de figurar entidades corporais, ela faz parte das formas de pensar assim como a percepção, vontade e entendimento. Para exemplificar a distinção das entidades corporais ou acidentais das substanciais ou essenciais e as formas de pensar atribuídas para cada entidade, Descartes explora o exemplo de uma cera. Ele inicia descrevendo as características da cera no seu total, como sua figura, tamanho, cor, textura, som e cheiro. Entretanto, quando posta ao fogo, a cera perde as características acidentais, as quais se apreendem pelos sentidos, se configurando em imagens sensoriais. O que sobra da cera são as características pertencentes a ela (substanciais) que é a extensão, concebida pelo entendimento. São essas características que permitem dizer que o que ali remanesce é a cera. É fundada, então, a coisa extensa (res extensa) que é percebida pelo intelecto e se diferencia da coisa pensante.
	É na terceira meditação, então, que se fecha o ciclo de pensamento que envolve corpo, alma e Deus. Ele, nesta, é provado como verdadeiramente existente, o que pode parecer a priori uma prova desnecessária por Deus estar ligado à fé. Porém, a chamada prova ontológica da existência de Deus vem provar, racionalmente, o próprio ordenamento do mundo. Descartes, assim inicia a busca pelo fundamento objetivo do conhecimento, uma garantia externa ao eu pensante. Este só tornou claro e evidente os modos de pensar: o filósofo precisou ir além do cogito para achar a causa de tudo externo ao sujeito, atribuindo um grau de realidade objetiva para o liame representação/representado. 	 
	A saída do cogito está na aceitação de que há ideias infinitas que o sujeito não pode conceber na mente já que, pelo princípio da causalidade já citado, ele é um ser finito e só pode conceber substâncias finitas, substâncias ou acidentes. Somente Deus, portanto, que é uma substância infinita. Em suma, se existe a ideia de infinito no sujeito e ele é uma substância finita, há de haver uma causa também infinita (perfeita) para esta ideia. A substância infinita, ou seja, mais perfeita só pode ser Deus. Esta é a ideia mais clara que pode ser concebida pelo sujeito: a existência de Deus, que é, inclusive, bom. Afinal, sua bondade é atributo da perfeição. Por fim Deus será aquele ente com maior grau de realidade objetiva. Ela se distingue da realidade para o senso comum , pois esta é apreendida pelos sentidos , através da inclinação natural que é o impulso provocado pelo senso comum.Em contrapartida, aquela é a existência, na mente, de um objeto do entendimento, alcançada pela luz natural, que é a racionalidade. Assim, com a existência de Deus, o sujeito pode alcançar ideias com maior grau de realidade objetiva, podendo estar certo de pelo menos uma coisa: sua existência. É Deus, então, o fundamento objetivo para o conhecimento.
	Na quarta meditação, o filósofo discorre sobre a distinção entre o verdadeiro e o falso. Inicialmente, ele conclui como algo evidente e claro a existência de Deus e do sujeito. Desse Deus, ele precisa contemplar a objetividade do conhecimento que funda as ciências. Primeiro, ele se pergunta o porquê de Deus ter o feito errar já que ele sabe que Deus pode o enganar, mas não quer. O erro ocorre, no exercício da faculdade de julgar, que foi posta no sujeito por Deus. Porém, se Deus é a causa do julgamento, por que o sujeito erraria ao fazê-lo? O filósofo, no entanto, não consegue responder essa pergunta pela investigação de Deus, pois ele tem fins impenetráveis. Sucede que o sujeito é culpado pelo próprio erro, já que é dotado de uma vontade que é maior do que o entendimento. Entretanto, a faculdade de querer, como todas as outras postas por Deus nele, não é a que lhe faz errar:
Pelo exposto, percebo que, considerada em si, a força de querer que recebi de Deus não é a causa dos meus erros, pois é amplíssima e, em seu gênero, perfeita. E a força de entender não o é também, pois, o que quer que entenda, entendo sem dúvida retamente, já que esse entendimento eu o tenho de Deus e não é possível que nisso eu erre. De onde, então nascem meus erros? Unicamente de que, com a vontade se manifesta mais ampla do que o intelecto, não a contenho dentro dos mesmos limites e as estendo também a coisas que não entendo. E, por ser indiferente a essas coisas, a vontade desvia-se facilmente do verdadeiro e do bom, e é assim que erro e peco. (DESCARTES, 2004, p.121)
Respondida a causa do erro, Descartes precisa declarar qual a vantagem em errar. Para tanto, ele cria aquilo que Ramos� chama de princípio da diversidade:
Entretanto, há ainda outro problema que Descartes deve responder, pois a não culpabilidade divina para com nossos erros ainda não explica porque erramos: Deus poderia ter-nos criado livres sem que nunca errássemos, mas nos criou errando. Neste sentido é que dissemos que o filósofo deve explicar em que medida é mais vantajoso falhar do que não falhar. E, para solucionar tal problema, Descartes introduz o princípio da diversidade. Ao investigarmos a perfeição das obras de Deus não devemos tomar cada criatura separadamente, ao contrário, o que deve ser levado em consideração é o conjunto da obra. Sendo assim, aquilo que antes, analisado sozinho, parecia imperfeito, torna-se perfeito dentro da natureza e da ordem do Universo21. Além do mais, parece ser, de fato, uma maior perfeição, em relação ao todo, o fato de algumas de suas partes serem defeituosas do que se fossem todas semelhantes. Ou seja, a diversidade existente no Universo é, portanto, a expressão da melhor configuração das criaturas em sua totalidade. Dessa forma, o erro, analisado deste ponto de vista global é apenas mais um elemento deste todo e que, por isso, pode ser visto como algo vantajoso. (RAMOS, p.8)
	É nessa meditação que parece, portanto, Descartes usar um Deus que é fictício. Pois, apesar de conhecê-lo clara e distintamente, o filósofo se contradiz quando fala sobre os fins inatingíveis de Deus ou a ideia de infinito inconcebível pelo sujeito. Se o sujeito não atinge e prova essas ideias com precisão, tem-se que ele não conhece Deus clara e distintamente. Portanto, ele acaba fugindo da racionalidade da prova da existência de Deus para remeter a um argumento de fé. Nesse sentido, seu conceito de realidade (Deus) fica comprometido.
	Outra crítica que se faz não só a Descartes, mas também a todos aqueles que trouxeram a ciência como resolução para todas as coisas, em patamar de verdade absoluta. Merleau-Ponty (2004), nesse sentido, destaca o total abandono da percepção por aqueles que as negaram completamente, sem negar a importância da negação:
Foi bom que se tenha esperado tudo dela numa época em que ainda não existia. Porem, a questão que o pensamento moderno coloca em relação a ciência não se destina a contestar sua existência ou a fechar-lhe qualquer domínio. Trata-se de saber se a ciência oferece ou oferecerá uma representação do mundo que seja completa, que se baste, que se feche de alguma maneira sobre si mesma, de tal forma que não tenhamos mais nenhuma questão válida a colocar além dela. Não se trata de negar ou de limitar a ciência; trata-se de saber se ela tem o direito de negar ou de excluir como ilusórias todas as pesquisas que não procedam como ela por medições, comparações e que não sejam concluídas por leis, como as da física clássica, vinculando determinadas consequências a determinadas condições. (MERLEAU-PONTY, 2004).
O momento em que se precisou da ciência foi o Iluminista em que se acreditava que ela sanaria todas as dúvidas do mundo. Ocorre que, a percepção está deixada a esmo. Somente a arte, a poesia e a filosofia resgatará a percepção. Não que ela negue o valor da ciência, mas que elas ampliem o espaço de visão do ser humano sobre as coisas. 
REFERÊNCIAS
SILVA, Franklin Leopoldo e. Descartes: metafísica da modernidade. 2ª ed. São Paulo: Moderna, 2005.
RAMOS, Renata. Erro e Verdade na Quarta Meditação de Descartes. Disponível em: < http://seminarioppglm.files.wordpress.com/2009/04/ramos-r-erro-e-verdade-na-quarta-meditacao-de-descartes.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2014.
MERLEAU-PONTY, Maurice, Conversas (1948). São Paulo: Editora Martins Fontes, 2004.
� DESCARTES, René. Meditações sobre filosofia primeira. (pp. 19 – 129). Tradução: Fausto Castilho. Campinas: Ed. Unicamp, 2004.
� Graduanda em Direito na Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia.
� RAMOS, Renata. Erro e Verdade na Quarta Meditação de Descartes.

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