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Behaviorismo Metodológico VS. Radical 1 Capítulo 5 Behaviorismo Metodológico VS. Behaviorismo Radical “Como filosofia de uma ciência do comportamento, o behaviorismo exige, provavelmente, a mais dramática mudança jamais proposta em nossa forma de pensar acerca do homem. Trata-se literalmente de virar pelo avesso a explicação do comportamento”. (Skinner, 2003, p. 210) 5.1. Objetivos deste capítulo Ao término deste capítulo, você deverá ser capaz de: a) Apresentar os conceitos do behaviorismo metodológico; b) Apresentar os conceitos do behaviorismo radical; c) Identificar as principais diferenças entre eles. 5.2. Introdução Nos capítulos anteriores e no primeiro volume do nosso livro, apresentamos os principais conceitos da Análise do Comportamento. No presente capítulo abordaremos os aspectos filosóficos que sustentam a Análise do Comportamento enquanto Ciência; a esta filosofia denominamos Behaviorismo. A seguir discorreremos sobre o surgimento do Behaviorismo de Watson – denominado Behaviorismo Metodológico e sobre o Behaviorismo Radical de Skinner. Serão discutidos os aspectos principais de cada um deles, salientando suas diferenças, bem como as principais críticas infundadas feitas ao Behaviorismo e à Análise do Comportamento. 5.3. O Behaviorismo Metodológico Como já mencionamos no Volume I (capítulo 3), em 1913, Watson publicou o artigo: “A Psicologia como um Behaviorista vê”. Neste trabalho, o autor expôs a insatisfação de alguns psicólogos com o método da introspecção, dizendo que este era extremamente dependente do indivíduo. Segundo o autor: “Se você não conseguir reproduzir meus dados (...) é porque sua introspecção não foi bem treinada. Ataca-se o Behaviorismo Metodológico VS. Radical 2 observador e não a situação experimental. Na física e na química atacam-se as condições experimentais. (...) Nessas ciências, uma técnica melhor fornecerá resultados passíveis de reprodução. Na psicologia é diferente. Se você não consegue observar de 3 a 9 estágios de clareza na atenção, é sua introspecção que é deficiente”. (1913, p. 163). Com o manifesto, o autor objetivava transformar a Psicologia em ciência do comportamento, deixando de ser uma ciência da consciência. De acordo com Baum (1999), a ciência do comportamento idealizada por Watson estudaria apenas o comportamento objetivamente observável, evitando a subjetividade da introspecção e analogias entre animal e humano. Figura 5.1 – J. Watson. “O Behaviorismo surgiu, no começo deste século, como uma proposta para a Psicologia, para tomar como seu objeto de estudo o comportamento, ele próprio, e não como indicador de alguma outra coisa, como indício da existência de alguma outra coisa, como indício da existência de um fenômeno que se expressaria pelo ou por meio do comportamento. Surgiu como reação às posições dominantes, de que a Psicologia deveria estudar a mente ou consciência dos homens. (...) o Behaviorismo surgiu em oposição ao Mentalismo e ao Introspeccionismo. Em fins do século passado a ciência de modo geral começou a colocar uma forte ênfase na obtenção de dados ditos objetivos, em medidas, em definições claras, em demonstração e experimentação”. (Matos, 1995, pp. 27 e 28) Segundo Matos (1995), a observação se tornou fundamental para o Behaviorismo proposto por Watson. O comportamento era definido como Behaviorismo Metodológico VS. Radical 3 aquilo que é observável pelo outro, ou seja, para ser considerado objeto de estudo do behaviorista, o comportamento deveria afetar os sentidos do outro. Assim, o behaviorismo metodológico diz que a mente existe, mas nega seu status científico quando afirma que não podemos estudá-la por ser inacessível. Fazendo uso do mesmo argumento, nega também o status científico dos pensamentos, emoções, sensações e outros eventos privados. A ciência do comportamento proposta por Watson estudaria, assim, apenas o comportamento objetivamente observável. Entretanto, os behavioristas não eram unânimes sobre o que poderiam considerar como “objetivo” ou qual era a definição de comportamento. Essa discordância entre eles resultou em diferentes posicionamentos de autores behavioristas pós-Watson. O mais conhecido deles é B.F. Skinner. (Baum, 1999). Figura 5.2 – Skinner Skinner (1995) define muito bem a questão do objeto de estudo do behaviorista metodológico e deixa claro sua discordância a respeito do assunto: “Behavioristas metodológicos, assim como positivistas lógicos, argumentam que a ciência deve restringir-se a eventos passíveis de serem observados por duas ou mais pessoas; a veracidade de um fato depende da concordância. O que se pode ver através da introspecção não se qualifica como tal. Existe um mundo interno de sentimentos e estados da mente, mas ele está fora do alcance de uma segunda pessoa e, portanto, da ciência. Certamente, essa não é uma posição satisfatória. Como as pessoas se sentem é freqüentemente tão importante quanto o que elas fazem. O behaviorismo radical nunca assumiu essa direção”. (p. 13). No tópico a seguir vamos discutir os principais aspectos do behaviorismo radical de Skinner. Como já discutido no capítulo 4, o mesmo surgiu com uma nova proposta para o estudo do comportamento, em que a Behaviorismo Metodológico VS. Radical 4 auto-observação, o auto-conhecimento ou sua utilidade não são negados; o que se questiona no behaviorismo radical é a natureza daquilo que se sente ou se observa e, assim, se conhece. “A posição pode ser assim exposta: o que é sentido ou introspectivamente observado não é nenhum mundo imaterial da consciência, da mente ou da vida mental, mas o próprio corpo do observador”. (Skinner, 2003, p. 19) 5.4. O Behaviorismo Radical Se discutimos, no item anterior, que o behaviorismo metodológico não nega a existência da mente, podemos afirmar que esta visão de homem continua a ser dualista. Já o behaviorismo radical nega a existência da mente enquanto iniciadora das ações (ou seja, você se comportou de determinada maneira porque quis, ou porque sentiu vontade) e passa a discutir a questão dos eventos privados enquanto comportamentos cuja diferenciação se dá pela questão da acessibilidade. Segundo Skinner (2003): “O behaviorismo radical restabelece um certo tipo de equilíbrio. Não insiste na verdade por consenso e pode, por isso, considerar os acontecimentos ocorridos no mundo privado dentro da pele. Não considera tais acontecimentos inobserváveis e não os descarta como subjetivos. Simplesmente questiona a natureza do objeto observado e a fidedignidade das observações”. (p. 19) O trecho acima deixa claro a posição do behaviorismo em não negar a existência dos sentimentos, sensações e idéias, mas sim questionar o papel que estes eventos desempenham na determinação da conduta humana. Por exemplo, quando eu escrevo, o outro que está ao meu lado pode descrever o meu comportamento e analisar as contingências em operação que mantém (ou não) a emissão da resposta. Já se eu estou pensando, o outro só terá acesso ao meu comportamento se eu emitir outro comportamento (no caso verbal); caso contrário ele não estará acessível ao Behaviorismo Metodológico VS. Radical 5 outro. Isso não significa que exista alguma propriedade diferenciada, mas que a diferença está na questão do acesso. Segundo Skinner (2003): “(o behaviorismo)simplesmente proporciona uma explicação alternativa dos mesmos fatos. Ele não reduz os sentimentos a estados corpóreos; simplesmente argumenta que os estados corporais são e sempre foram aquilo que é sentido. Ele não reduz os processos de pensamento ou comportamento; simplesmente analisa o comportamento previamente explicado pela invenção dos processos de pensamento”. (p. 204) Temos que deixar claro aqui que, quando falamos em Behaviorismo, não estamos nos referindo a uma ciência do comportamento. Isso significa que não podemos comparar o Behaviorismo às escolas da Psicologia, como a Psicanálise e a Gestalt, exatamente porque ele não é uma ciência; é a filosofia dessa ciência. E, enquanto filosofia da ciência, o behaviorismo radical rompe com o dualismo, adotando uma visão monista de homem para a Psicologia. “O behaviorismo radical pertence a uma tradição, em filosofia da ciência, que rejeita explicitamente as interpretações mecanicistas do fenômeno natural e se recusa a descrever o comportamento dos organismos, humanos e de outras espécies, através de princípios mecânicos. É somente histórica, em vez de filosófica, a sua relação com as outras tradições que compartilham o rótulo behaviorismo, e não se preocupa nem com as conexões S – R dos reflexos condicionados, como os sistemas de Pavlov e Watson, nem com as estruturas mediadoras entre o input ambiental e o output comportamental, como as psicologias de Tolman e Hull”. (Chiesa, 2006, p. 190) Abaixo, seguem as principais diferenças entre o Behaviorismo Metodológico e o Radical: Behaviorismo Metodológico VS. Radical 6 BEHAVIORISMO METODOLÓGICO BEHAVIORISMO RADICAL Pressupostos Filosóficos Pressupostos Filosóficos Estudar o comportamento por si mesmo. Mantém este pressuposto Opor-se ao mentalismo e ignorar fenômenos como da consciência Altera este pressuposto Estudar tanto o comportamento humano quanto o animal. Mantém este pressuposto Determinismo material. Mantém este pressuposto Pressupostos Metodológicos Pressupostos Metodológicos Experiência controlada Mantém este pressuposto Procedimento objetivo de coleta de dado. Mantém este pressuposto Teste de hipóteses com grupo de controle Altera este pressuposto Observação consensual Descarta este pressuposto Recorre ao Sistema Nervoso para explicar o comportamento. Descarta este pressuposto Figura 5.3. Diferenças entre o Behaviorismo Metodológico e o Behaviorismo Radical. Para finalizarmos, deixaremos abaixo 20 idéias comuns e equivocadas sobre o Behaviorismo Radical ou a Ciência do Comportamento que são apresentadas no início da obra de Skinner “Sobre o Behaviorismo”. Esperamos que elas sirvam de estímulo para que você se interesse cada vez mais pelo Behaviorismo Radical e pela Análise do Comportamento, procurando ler mais sobre o assunto e, com isso, seja capaz de rebatê-las. 1. O behaviorismo ignora a consciência, os sentimentos e os estados mentais; 2. Negligencia os dons inatos e argumenta que todo comportamento é adquirido durante a vida do indivíduo; 3. Apresenta o comportamento simplesmente como um conjunto de respostas a estímulos, descrevendo a pessoa como autômato, um robô, um fantoche ou uma máquina; 4. Não tenta explicar os processos cognitivos; Behaviorismo Metodológico VS. Radical 7 5. Não considera as intenções ou os propósitos; 6. Não consegue explicar as realizações criativas - na arte, por exemplo, ou na música, na literatura, na ciência ou na matemática; 7. Não atribui qualquer papel ao eu ou à consciência do eu; 8. É necessariamente superficial e não consegue lidar com as profundezas da mente ou da personalidade; 9. Limita-se à previsão e ao controle do comportamento e não apreende o ser, ou a natureza essencial do homem; 10.Trabalha com animais, particularmente com ratos brancos, mas não com pessoas, e sua visão do comportamento humano atêm- se por isso, àqueles traços que os seres humanos e os animais têm em comum; 11. Seus resultados, obtidos nas condições controladas de um laboratório, não podem ser reproduzidos na vida diária, e aquilo que ele tem a dizer acerca do comportamento humano no mundo mais amplo torna-se, por isso, uma metaciência não-comprovada; 12. Ele é super simplista e ingênuo e seus fatos são os triviais ou já bem conhecidos; 13. Cultua os métodos da ciência mas não é científico; limita-se a emular as ciências; 14. Suas realizações tecnológicas poderiam ter sido obtidas pelo uso do senso comum; 15. Se suas alegações são válidas, devem aplicar-se ao próprio cientista behaviorista e, assim sendo, este diz apenas aquilo que foi condicionado a dizer e que não pode ser verdadeiro; 16. Desumaniza o homem; é redutor e destrói o homem enquanto homem; 17. Só se interessa pelos princípios gerais e por isso negligencia a unicidade do individual; 18. É necessariamente antidemocrático porque a relação entre experimentador e o sujeito é de manipulação e seus resultados podem, por essa razão, ser usados pelos ditadores e não pelos homens de boa vontade; Behaviorismo Metodológico VS. Radical 8 19. Encara as idéias abstratas, tais como moralidade ou justiça, como ficções; 20. É indiferente ao calor e à riqueza da vida humana, e é incompatível com a criação e o gozo da arte, da música, da literatura e com o amor ao próximo. 5.5. Tópicos abordados no capítulo Abaixo, segue um quadro-resumo com principais tópicos abordados no capítulo. Nosso objetivo é que você consiga ao olhar o quadro, conceituar e exemplificar cada um dos conceitos. Bom trabalho! Tópicos abordados no capítulo Introdução Análise do Comportamento Behaviorismo Metodológico Behaviorismo Radical Behaviorismo Metodológico J. Watson Estudo do comportamento objetivamente observável Negação do status científico da mente Behaviorismo Radical B. F. Skinner Negação da mente enquanto iniciadora das ações Considera sentimentos e eventos privados Figura 5.4 - Tópicos abordados no capítulo. Behaviorismo Metodológico VS. Radical 9 ROTEIRO DE ESTUDO Estudo dirigido 1. Defina Behaviorismo Metodológico apresentando seus pressupostos principais. 2. Defina Behaviorismo Radical apresentando seus pressupostos principais. 3. Diferencie Behaviorismo Metodológico e Behaviorismo Radical. 4. A partir dos conceitos fundamentais da Análise do Comportamento já estudados, rebata a crítica 2 apresentada no capítulo. Bibliografia Consultada BAUM, W.M. Compreender o Behaviorismo – Ciência, Comportamento e Cultura. Porto Alegre: ArtMed, 1999. CHIESA, M. Behaviorismo Radical: A Filosofia e a Ciência. Brasília: Ed. Celeiro, 2006. RANGÉ, B. (org). Psicoterapia Comportamental e Cognitiva: Pesquisa, Prática, Aplicações e Problemas. Campinas: Editorial Psy, 1995. SKINNER, B.F. Questões Recentes na Análise Comportamental. Campinas: Papirus, 2ª edição, 1995. ________. Sobre o behaviorismo. São Paulo: Cultrix, 2003. WATSON, J. B. Psychology as the behaviorist views it. Psychological Review, 20, 158-177, 1913. Bibliografia Complementar CATANIA, A. C. Aprendizagem: comportamento, linguagem e cognição. Porto Alegre: Artmed, 1999. MOREIRA, M. B.; MEDEIROS, C.A. Princípios Básicos de Análise do Comportamento. Porto Alegre: ArtMed, 2007. Behaviorismo MetodológicoVS. Radical 10 SCHULTZ, D. P.; SCHULTZ, S. E. História da psicologia moderna. São Paulo: Thomson Pioneira, 2004. SKINNER, B.F. Ciência e comportamento humano. 10.ed. São Paulo: Martins Fontes 2000.
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