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APOSTILA DE LÍNGUA LATINA

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1 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
MATERIAL DIDÁTICO 
 
 
LÍNGUA LATINA 
 
 
 
U N I V E R S I DA D E
CANDIDO MENDES
 
CREDENCIADA JUNTO AO MEC PELA 
PORTARIA Nº 1.282 DO DIA 26/10/2010 
Impressão 
e 
Editoração 
 
0800 283 8380 
 
www.ucamprominas.com.br 
 
2 
 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 03 
 
UNIDADE 1 – GENEALOGIA DO LATIM ................................................................. 06 
 
UNIDADE 2 – A FORMAÇÃO DAS LÍNGUAS NEOLATINAS ................................. 12 
 
UNIDADE 3 – DO LATIM ARCAICO AO LATIM VULGAR ...................................... 28 
 
UNIDADE 4 – FONOLOGIA DO LATIM VULGAR ................................................... 37 
 
UNIDADE 5 – MORFOLOGIA DO LATIM VULGAR ................................................ 39 
 
UNIDADE 6 – SINTAXE DO LATIM VULGAR ........................................................ 43 
 
UNIDADE 7 – LÉXICO EM LATIM VULGAR ........................................................... 47 
 
UNIDADE 8 – AS MUDANÇAS LINGUISTICAS DO LATIM PARA O PORTUGUÊS51 
 
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 56 
 
3 
 
INTRODUÇÃO 
 
Última flor do Lácio, inculta e bela, 
És, a um tempo, esplendor e sepultura: 
Ouro nativo, que na ganga impura 
A bruta mina entre os cascalhos vela... 
(BILAC, 1977, p. 268) 
 
Nos versos acima, o poeta Olavo Bilac aborda nossa língua portuguesa, com 
o lirismo romântico característico do parnasianismo e faz uma análise ‘pra lá’ de 
verdadeira... Afinal de contas, no momento em que a Língua Portuguesa, última 
língua neolatina formada a partir do latim vulgar (falado na região do Lácio – hoje 
Itália) ascende e começa a se expandir, quer dizer que o latim vai caindo em desuso 
e ‘morre’. 
Também era verdade ser ainda uma língua sem lapidação em comparação 
com as outras línguas formada, por isso ‘ouro nativo (...), que a bruta mina entre os 
cascalhos vela’. 
Não! Não é sobre a Língua Portuguesa que trataremos neste módulo! Mas 
sim sobre a Língua Latina que nos debruçaremos. Debruçar no sentido de conhecer, 
analisar, refletir, enfim, apreciar! 
O Latim, língua dos romanos, do pensamento de Roma e de sua brilhante 
civilização pertence à grande família das línguas indo-europeias (MARTINS, 2006). 
Os primeiros registros documentados do Latim datam do século 7 a.C., 
falado no Lácio (Latium), região central da Itália, onde hoje encontra-se Roma, sua 
capital, no entanto, não era a única língua falada na península itálica, onde também 
se falava o osco, o umbro, o etrusco e também o grego. No entanto, o latim 
prevaleceu sobre as demais, ajudado pelas grandes conquistas militares dos 
romanos que daremos algumas pinceladas ao longo da apostila. 
4 
 
 
 
Os linguistas têm hoje boas razões para sustentar que um grande número 
de línguas da Europa e da Ásia proveem de uma mesma língua de origem, 
designada pelo termo indo-europeu. Com exceção do basco, todas as línguas 
oficiais dos países da Europa ocidental pertencem a quatro ramos da família indo-
europeia: o helênico (grego), o românico (português, italiano, francês, castelhano, 
entre outras), o germânico (inglês, alemão) e o céltico (irlandês, gaélico). Um quinto 
ramo, o eslavo, engloba diversas línguas atuais da Europa Oriental (MEDEIROS, 
2006). 
Pois bem, a genealogia do Latim; a formação das línguas latinas; do latim 
arcaico ao latim vulgar; fonologia, morfologia, sintaxe e léxico são alguns dos 
conteúdos que veremos. 
5 
 
Lembrem-se: 
 
Estudar a língua latina não é um fim em si mesmo. O estudo linguístico está 
intrinsecamente atado ao histórico-cultural. O objetivo é aprender a se servir 
de um instrumento que permite compreender textos de uma importância 
maior para a história de nossa civilização: por causa de sua qualidade 
intrínseca, e porque todos aqueles que os seguiram os imitam, os citam, os 
comentam e se inspiram sem cessar; é rever o passado, reavaliando o 
presente (CÂMARA JR, 1984; HAUY, 1989; ILARI, 2004). 
 
Duas observações se fazem importantes: 
Em primeiro lugar, sabemos que a escrita acadêmica tem como premissa 
ser científica, ou seja, baseada em normas e padrões da academia. Pedimos licença 
para fugir um pouco às regras com o objetivo de nos aproximarmos de vocês e para 
que os temas abordados cheguem de maneira clara e objetiva, mas não menos 
científicos. 
Em segundo lugar, deixamos claro que este módulo é uma compilação das 
ideias de vários autores, incluindo aqueles que consideramos clássicos, não se 
tratando, portanto, de uma redação original. 
Ao final do módulo, além da lista de referências básicas, encontram-se 
muitas outras que foram ora utilizadas, ora somente consultadas e que podem servir 
para sanar lacunas que por ventura surgirem ao longo dos estudos. 
6 
 
UNIDADE 1 – GENEALOGIA DO LATIM 
 
Didaticamente, podemos dividir o estudo do processo histórico de formação 
de uma língua em três períodos: 
 período Proto-histórico – séculos IX a XII – a língua era falada, mas não 
escrita; 
 período Arcaico – séculos XII a XV – começam a surgir os primeiros 
documentos escritos; 
 período Moderno – século XVI até nossos dias – abrange a era clássica, 
moderna, contemporânea. 
Concordamos com Luna Neto (2008), quando ressalta que falar do latim é 
trilhar por uma história, pela cultura de um povo que muito influenciou no surgimento 
das novas línguas, as neolatinas, tidas hoje como línguas modernas e que muito nos 
oferece em termos de conhecimentos étnicos, culturais e linguísticos e nos faz 
entender o estágio que nos encontramos na atualidade. 
O latim é uma língua de origem indo-europeia do grupo itálico, também 
chamado pelos filólogos alemães de indo-germânica. O indo-europeu é língua pré-
histórica, seu tronco linguístico pode ser percebido em diversas línguas europeias e 
com base nas semelhanças gramaticais e lexicais denotando uma raiz comum, 
concluiu-se que deu origem ao hitita, germânico, celta, itálico, albanês, grego, 
báltico, eslavo, armênio, tocário, das quais descende a maioria as línguas faladas na 
Europa e dos países colonizados pelos europeus, como também em algumas partes 
da Ásia e da Índia (NASCIMENTO, 2010). 
A família das línguas indo-europeias é composta de diversas línguas e 
dialetos, seja na Europa, seja na Ásia, seja no norte da Índia. 
Essa origem indo-europeia é chamada por Coutinho (1954, p. 42 apud LUNA 
NETO, 2008, p. 11) de “entroncamento etnolinguístico”. É como se fosse uma 
grande família étnica, composta por uma mesma raça branca, chamada também de 
ariana e linguística porque formada por outros dialetos dessa mesma origem como o 
grego, sânscrito e as línguas germânicas. 
7 
 
Vejamos as duas ilustrações abaixo: 
Árvore Genealógica das Línguas Indo-Europeias 
 
Fonte: Fischer (2010). 
 
 
 
8 
 
Acredita-se que o idioma original indo-europeu venha de cinco mil anos 
atrás, apenas falado é claro, portanto, sem material concreto ou documentos 
escritos que nos deem certezas. 
No entanto, a partir do estudo comparativo entre as várias línguas da família, 
os linguistas conseguem reconstruir vários elementos deste, como, por exemplo, 
raízes, radicais, desinências, entre outros. À essa língua reconstruída dão o nome 
de proto-indo-europeu. 
Não se sabe ao certo o local de origem dos falantes do indo-europeu, mas 
as teorias mais aceitas postulam que este seja em algum lugar da Estepe Pônticaao 
norte do Mar Negro, na Anatólia (atual Turquia) ou no Cáucaso, mais precisamente 
na atual Armênia. 
A partir de um destes locais, os falantes dessa língua teriam imigrado para 
as mais diferentes áreas da Europa e da Ásia. Os motivos dessa imigração são 
desconhecidos, assim como se conhece muito pouco sobre seus mores (costumes); 
o pouco que se sabe provém dos estudos de linguística comparativa e de religião 
comparada. 
Dentro da família indo-europeia, o latim pertence ao subgrupo itálico, e, 
dentro deste, às línguas latino-faliscas. Alguns linguistas propõem ainda um 
subgrupo anterior ao itálico, o ítalo-céltico (MEILLET, 1922 apud MARTINS, 2005). 
O Latim começou a adquirir forma literária apenas pelo início do século III 
a.C. e costuma-se dividir sua história nos seguintes períodos: 
1. Período arcaico (entre o século III e o início do século I a.C.), com Catão 
e, sobretudo, com os dois grandes escritores cômicos, Plauto e Terêncio. 
2. Período clássico (entre o início do século I a.C. e o inicio do Império), é 
um momento importante para a prosa e a poesia latina, com obras de Cícero, 
Virgílio, Tito, Horácio e Lívio. É artístico e diferente do latim falado até pela alta 
classe. Preservou-se graças às obras literárias e dele originaram os fenômenos 
gramaticais da língua latina. 
3. Período pós-clássico (a partir de nossa era) com Tito Lívio, Sêneca, 
Quinto Cúrcio, Plínio, o Velho, Quintiliano, Plínio, o Moco, Suetônio e outros. 
9 
 
4. Período cristão (a partir do século III de nossa era, aproximadamente), 
com Tertuliano, Santo Agostinho, São Jeronimo e outros. 
5. Período do neolatim ou latim científico (de XVII a XIX) deu origem as 
línguas neolatinas, as quais penetraram primeiro na linguagem popular, depois nas 
ciências e artes e na maioria das disciplinas que se libertam da filosofia. 
6. Cumpre ressalvar que ao lado da língua escrita ou literária existia uma 
língua falada, que nos é conhecida, sobretudo pelos textos não literários e pelas 
inscrições. Essa língua se transformava mais rapidamente que a outra. Foi ela que 
deu origem às línguas românicas — português, espanhol, catalão, provençal, francês, 
italiano, romeno (ROSÁRIO, 2011). 
O apogeu e a decadência do latim assim se explicam: 
 
Os latinos deste modo chamados por habitarem uma região da Itália, 
antigamente, chamada Lácio (em latim latium), onde fica a cidade de Roma, 
tinham como vizinhos territoriais os etruscos e os sabinos. Da união destes 
três povos (latinos, etruscos e sabinos) deu origem aos romanos, o povo 
que conquistou o mundo antigo pela arte da guerra (CARDOSO, 2004, p. 7). 
 
O nome Itália, surgiu no sec. VII a.C., estendendo-se pela península no sec. 
I a. C através da expansão político-militar, a pax romana, a qual impôs, além de 
outras coisas, a lógica de seu Direito e, sobretudo, os padrões da língua latina 
(CIVITA, 1972, p. 268). 
Vale lembrar que da inteligência e do talento político dos romanos nasceu o 
fruto que foi colhido por toda a humanidade: o Direito. Aquele Direito romano é uma 
das grandes fontes do Direito contemporâneo em todos os países e não apenas 
naqueles onde se faz sentir o efeito direto de sua cultura (NASCIMENTO, 2010). 
Após conquistarem todo o mundo antigo, os romanos submeteram a língua a 
todos os inimigos. Especializados na arte da guerra e não tendo mais contra quem 
guerrear, deixaram se trair pelas leviandades e pelos vícios que acompanhavam a 
opulência, vindo a ser derrotados pelos hunos pondo fim a uma etapa da história da 
humanidade. 
Com a queda do império Romano (476 d.C.), acaba a História Romana e um 
século depois, mais ou menos, termina também a História da Literatura Romana, 
10 
 
mas o latim continua ainda, por quase mil anos, sendo em toda a Idade Média a 
língua da civilização Ocidental, inspirando todas as obras primas das Literaturas 
Modernas, da Europa e da América (COMBA, 1991, p. 23). 
Falamos na introdução que os linguistas têm hoje boas razões para 
sustentar que um grande número de línguas da Europa e da Ásia provem de uma 
mesma língua de origem, designada pelo termo indo-europeu. Eles podem sustentar 
essa afirmativa uma vez que por volta do II milênio a.C. (veja mapa abaixo), o 
grande movimento migratório de leste para oeste dos povos que falavam línguas da 
família indo-europeia terminou. Eles atingiram seu habitat quase definitivo, passando 
a ter contato permanente com povos de origens diversas, que falavam línguas não 
indo-europeias. Um grupo importante, os celtas, instalou-se na Europa Central, na 
região correspondente às atuais Boêmia (República Tcheca) e Baviera (Alemanha) 
(NASCIMENTO, 2010). 
Algumas línguas da Europa no II milênio a.C. 
 
 
Obs: 
Povos de línguas indo-europeias: germanos, eslavos, celtas, úmbrios, latinos, oscos, dórios. 
Povos de origens diversas: íberos, aquitanos, lígures, etruscos, sículos. 
11 
 
Os celtas estavam situados de início no centro da Europa, mas entre o II e o 
I milênios a.C. foram ocupando várias outras regiões, até ocupar, no século III a.C., 
mais da metade do continente europeu. Os celtas são conhecidos, segundo as 
zonas que ocuparam, por diferentes denominações: celtíberos na Península Ibérica, 
gauleses na França, bretões na Grã-Bretanha, gálatas no centro da Turquia, entre 
outras. 
O período de expansão celta veio, entretanto, a sofrer uma reviravolta e, 
devido à pressão exterior, principalmente romana, o espaço ocupado por este povo 
encolheu. As línguas célticas, empurradas ao longo dos séculos até as extremidades 
ocidentais da Europa, subsistem ainda em regiões da Irlanda (o irlandês é inclusive 
uma das línguas oficiais do país), da Grã-Bretanha e da Bretanha francesa. 
Surpreendentemente, nenhuma língua céltica subsistiu na Península Ibérica, onde a 
implantação dos celtas ocorreu em tempos muito remotos (I milênio a.C.) e cuja 
língua se manteve na Galiza (região ao norte de Portugal, atualmente parte da 
Espanha) até o século VII d.C. (MEDEIROS, 2006). 
12 
 
UNIDADE 2 – A FORMAÇÃO DAS LÍNGUAS NEOLATINAS 
 
Ainda falando do indo-europeu, esta língua apresentava uma série de 
características que se encontram em geral nas línguas derivadas, e que se opõem 
aos outros grupos linguísticos, como o semítico (árabe, hebreu, aramaico, entre 
outros), o chinês, entre outros. Suas principais características são: 
 papel importante do sistema flexional (conjugação dos verbos, declinação em 
oito casos dos nomes e dos adjetivos, entre outros); 
 as desinências se encontram sempre no fim da palavra, nunca no início; 
 elas exercem muitas vezes várias funções simultaneamente (por exemplo: em 
português, -mos em estudamos indica a pessoa e o número); 
 o verbo muda de forma em função de seu sujeito, jamais em função de seus 
complementos; 
 os nomes têm um gênero; a oposição fundamental é entre o gênero animado 
(posteriormente separado entre masculino e feminino) e o gênero inanimado 
ou neutro; 
 a ordem das palavras tem pouca importância gramatical. 
 
Todos estes traços não subsistiram, tais quais em todas as línguas indo-
europeias, mas a presença da maioria dentre eles num estado antigo de uma língua 
permite ligá-la ao grupo indo-europeu. Estes traços estão fortemente presentes em 
latim. 
Não tendo permanecido da língua europeia nenhum documento escrito, o 
indo-europeu hoje não mais existe como língua, tanto que não se pode, até hoje, 
determinar a sede do povo indo-europeu. O certo é que eram nômades. Levados por 
seu espírito aventureiro e impelidos pela falta de lugar devido a numerosa 
população, dispersaram-se em busca de novas terras. 
Pelo ano 2000 a.C., um ramo do povo indo-europeupenetrou na Itália e 
fundiu-se com os povos que a habitavam. Originaram-se daí dois grupos de línguas: 
 o latino falisco (o latim e o falisco - muito semelhante ao latim); e, 
13 
 
 o óscio-úmbrico (óscio, úmbrico, sabélico, sabínico, volsco, entre outros). 
 
Sobretudo, a língua dos etruscos (povo de origem asiática, e de língua não 
pertencente à família indo-europeia) e a dos gregos exerceu grande influência sobre 
a formação dos diversos dialetos indo-europeus na Itália. Mais tarde, com a invasão 
dos celtas na região do Pó, novas influências atuarão sobre a evolução linguística. 
Quando Roma assumiu a hegemonia tanto social como política, o dialeto 
romano (o latim) conseguiu alcançar a importância de língua mundial. O latim é 
então a língua veicular da parte ocidental; o grego, da oriental. 
À extraordinária expansão política e militar está ligada ao desenvolvimento 
de uma cultura brilhante, inicialmente simples variedade local do helenismo, depois, 
pouco a pouco, sempre mais original. Esta cultura greco-romana, junto com o 
cristianismo, é a base do que se convencionou chamar a civilização ocidental 
(CÂMARA JR, 1984; HAUY, 1989; ILARI, 2004). 
 
2.1 Dialetação, substrato, superstrato, adstrato, empréstimo 
No final do primeiro milênio, a România apresentava-se fragmentada numa 
quantidade de dialetos de origem latina, sendo que alguns deles se transformaram 
com o tempo em línguas nacionais. Premidos pela necessidade de tornar sua fala 
mais exata ou mais expressiva, os falantes criam o tempo todo palavras e 
construções sintáticas novas com os materiais disponíveis em sua própria língua; 
mudanças fônicas surgem pelas tensões paradigmáticas que ocorrem no interior do 
sistema e pelas tensões sintagmáticas que ocorrem entre sons contíguos na fala; 
em menor grau, alterações de todo tipo podem resultar de fatores “externos”, isto é, 
do contato entre línguas diferentes. Vários fatores concorreram para a dialetação 
românica e o consequente aparecimento das línguas neolatinas: o tempo, a política 
de dominação dos romanos, a vastíssima extensão geográfica do Império e a sua 
fragmentação política e, principalmente, a ação do substrato e do superstrato. 
Mas o que vem mesmo a ser substrato, superstrato, adstrato? Estes são 
conceitos importantes para entendermos a variada formação das línguas latinas e 
neolatinas. 
14 
 
Substrato linguístico se reporta aos conjuntos dos falares diversos dos povos 
vencidos e conquistados, cuja língua se infiltrou na do povo vencedor (isto é, o 
dominador assimila certos traços da língua do conquistado). A absorção das línguas 
encontradas pelo latim nas regiões conquistadas se consumou através de situações 
mais ou menos persistentes de bilinguismo. E as línguas dos povos romanizados se 
mantiveram determinando tendências à dialetação do latim. 
Superstrato, por sua vez, é nome que se dá à língua de um povo 
conquistador, quando ele a abandona para adotar a língua do povo vencido. [...] O 
superstrato persiste no léxico da língua adotada, que se enriquece com termos 
referentes a traços específicos da cultura do povo conquistador (CÂMARA JR., 
1984). 
Os superstratos exercem influência menos significativa, limitando-se quase 
que apenas ao vocabulário. Depois da queda do Império, multiplicaram-se na 
România as invasões de territórios por povos vindos do leste. O Cristianismo era a 
religião preponderante em toda a România na época das invasões, e muitos dos 
povos invasores adotaram essa religião, instituições dos povos submetidos e a 
língua. 
Segundo Ilari (2004), a metáfora do substrato e superstrato evoca de algum 
modo a imagem de uma separação no tempo (primeiro os substratos, depois o latim, 
depois os superstratos) que não é linguisticamente correta. Nestas noções está 
embutida a noção de adstrato: as camadas não se superpõem, mas se 
interpenetram. 
Adstrato é então toda língua que vigora ao lado de outra, num território dado, 
e que nela interfere como manancial permanente de empréstimos (CÂMARA JR, 
1984). 
O grego transmitiu um grande número de palavras ao latim vulgar através do 
Cristianismo, que surgiu num ambiente judaico-helênico. O latim literário prestou 
grande contribuição à gramática e ao vocabulário dos romances. 
Por fim, temos os empréstimos que em linguística indica a transmissão de 
formas linguísticas (sobretudo léxicas) entre línguas em contato. A tendência normal 
dos empréstimos é serem absorvidos de maneira completa na nova língua depois de 
15 
 
uma fase mais ou menos longa em que sua origem estrangeira é sensível para os 
falantes. 
Após a queda do Império Romano, vários fatores de peso concorreram para 
que as influências dos substratos e superstratos agissem com maior força no sentido 
de modificar localmente o latim falado. Começou assim um processo de 
diversificação regional do latim vulgar, origem dos dialetos. Alguns desses dialetos 
transformaram-se em línguas nacionais como veremos adiante. 
 
2.2 As línguas nacionais 
Ilari (2004) traça uma linha de raciocínio muito interessante e didática para 
explicar que, embora reconheçamos seis idiomas com status de língua nacional, 
esse conceito de “língua nacional” é vago; assim para dar à afirmativa um sentido 
mais exato, convém afastar alguns possíveis equívocos quanto à sua interpretação, 
que são baseadas em suas relações com a literatura, a política e a cultura. 
Quanto às seis línguas nacionais que reconhecemos hoje, na România elas 
tiveram base em dialetos de alcance originalmente regional. As circunstâncias que 
levaram à transformação desses dialetos em línguas nacionais são peculiares a 
cada caso. 
 
2.3 Relações das línguas neolatinas com a literatura, política e cultura 
Antes de tudo, seria um equívoco pensar que uma língua nacional seja pura 
e simplesmente um dialeto que desenvolveu uma literatura. A tendência para 
cometer este equívoco é naturalmente forte numa ciência criada por filólogos – que 
são por definição amantes das letras – e encontra uma aparente confirmação na 
elevação do dialeto florentino a língua nacional da Itália – geralmente explicada pela 
importância da obra de Dante, Boccaccio e Petrarca. 
O fato é que os dialetos não se elevam automaticamente à condição de 
língua nacional por terem produzido uma literatura de valor. Se fosse assim, a 
expressão “literatura dialetal” não faria muito sentido, e teríamos que considerar 
como língua nacional o provençal, pelos dois importantes surtos literários a que deu 
origem no século XI e no século passado. 
16 
 
Não é possível criar uma língua nacional por meio de algum escrito literário, 
como também parece impróprio definir ‘língua nacional’ com base apenas nas 
condições políticas ou jurídicas. É inimaginável um Estado ou governo cismar em 
adotar uma língua oficial por meio de disposições legais. 
O caso catalão é interessante, embora pareça não foge à regra. É 
precisamente a riqueza de publicações em todas as áreas de conhecimento que 
permite reconhecer o status de língua nacional ao catalão, muito embora a grande 
maioria dos falantes de catalão fale também castelhano. 
As razões para considerar um determinado idioma como língua nacional 
dizem respeito às funções que esse idioma desempenha na comunidade que o fala: 
uma língua nacional é um idioma que responde a todas as necessidades de uma 
sociedade. Essas necessidades variam conforme a época, alterando-se fortemente 
os pesos relativos do discurso técnico, estético, religioso, legal, entre outros. 
Considerando as sociedades do passado, seria provavelmente correto afirmar que o 
provençal foi uma língua nacional entre os séculos XI e XIII, época em queforneceu 
um padrão respeitado em toda a Europa para a produção de composições lírico-
poéticas, e serviu para a produção dos tipos de textos (ILARI, 2004). 
Evidentemente que nas sociedades modernas a necessidade de uma língua 
nacional que satisfaz são bem mais complexas: não se manifestam apenas no 
domínio da arte, mas referem-se também aos mais variados campos do 
conhecimento (científicos, filosóficos, religiosos, entre outros) e da atividade prática 
(técnica, burocracia, imprensa, direito, entre outras). 
Na formação das línguas nacionais, o contato com todas essas esferas da 
atividade humana se reflete antes de tudo na fixação de convenções ortográficas 
(dispor de uma escrita padronizada é condição necessária embora não suficiente 
para uma língua nacional); além disso, repercute fortemente na estrutura dos 
idiomas em questão, cujo léxico e cuja sintaxe tendem a enriquecer-se e estabilizar-
se. Fenômenos comuns são a codificação gramatical e a “defesa” contra as 
influências externas que passam a ser vistas como fator de corrupção (ILARI, 2004). 
17 
 
2.4 As línguas da Ibéria 
As três línguas da Ibéria são uma herança histórica da Reconquista, o 
movimento pelo qual as monarquias cristãs que se haviam constituído no norte da 
península depois da invasão árabe retomaram aos muçulmanos as regiões do 
centro e do sul. São elas: o português, o castelhano e o catalão. 
Os romanos chegaram à Península Ibérica no século III a.C., no ano 218, e 
iniciaram o longo período de conquistas de povos e regiões, que terminaria entre os 
séculos I a.C. e II d.C. 
Todos os povos conquistados da Península adotaram o latim como idioma, 
pois os romanos instituíam sua cultura, seus hábitos e sua língua em todas as 
regiões pelas quais passavam e estendiam seus domínios. 
Desde o século III a.C., o latim escrito com intenções artísticas, sob 
influência grega, vinha sendo apurado até atingir a perfeição da poesia de Horácio e 
Virgílio, por exemplo, no século I a.C., com o tempo, a separação entre essa língua 
literária, utilizada por uma elite influente, e o latim corrente, usado no dia-a-dia pelos 
outros grupos sociais, foi se intensificando. É dessa separação que obtemos os 
termos “latim clássico” ou “literário” e “latim vulgar”. E foi exatamente esse “latim 
vulgar” que foi levado pelos romanos para as regiões conquistadas, diversificando-
se com o tempo nas chamadas línguas românicas; como o português, por exemplo. 
Devido à vastidão geográfica do Império e da própria Península Ibérica, é 
seguro concluir que houve enorme dificuldade para “controlar” a língua latina entre 
seus falantes. O latim vulgar foi perdendo sua unidade ao longo dos anos, mesmo 
com a preocupação dos romanos com o ensino do latim clássico nos centros 
urbanos mais importantes. Nas regiões menores, como em vilas ou aldeias, por 
exemplo, a língua não possuía freios, e variava incontrolavelmente (TEYSSIER, 
2007). 
18 
 
Península Ibérica durante o Império Romano 
 
No ano de 1085, após a conquista de Toledo, Afonso VI de Castela confiou 
dois feudos localizados na faixa mais ocidental de seu reino a dois cavaleiros 
borgonheses que haviam colaborado na luta contra os árabes, junto com a mão de 
suas duas filhas Tareja e Urraca. A Henrique de Borgonha coube o Condado 
Portucalense (entre o Minho e o Mondego), e a Raimundo de Borgonha a Galiza (ao 
norte do Mondego). Ao passo que a Galiza acompanhou a sorte do reino de Castela, 
o Condado Portucalense foi reconhecido como reino independente já em 1143; 
Portugal teve assim sua própria “reconquista”, fixando praticamente o território 
português em seu limites atuais no período entre as origens e 1250 (conquista de 
Lisboa: 1147; conquista do Algarve: 1249). 
Durante todo o século XIII, floresceu em Portugal a poesia lírica, escrita 
numa língua muito próxima do galego e representada pelo gênero das cantigas, de 
inspiração provençal. O sucesso dessa poesia – e do galaico-português enquanto 
língua literária – foi por assim dizer internacional. Afonso X de Castela, monarca e 
19 
 
protetor das letras, escreveu em português grande parte de sua produção lírica, 
conformando-se aparentemente a uma opinião corrente segundo a qual, das línguas 
ibéricas, o português era particularmente apropriado para a expressão dos 
sentimentos ao passo que o castelhano deveria ser preferido para a épica e a 
história. 
Contemporâneo do afirmar-se do galaico-português como língua da poesia 
trovadoresca é o estabelecimento de uma norma galaico-portuguesa para a redação 
de documentos notariais, que começa no fim do século XII (ILARI, 2004). 
Entretanto, essa norma galaico-portuguesa dos primeiros séculos não 
estava destinada a vingar: um efeito da reconquista portuguesa foi o de deslocar 
para o sul a capital e a Corte, cujas sedes foram sucessivamente o Porto, Coimbra e 
Sintra-Lisboa. Pela influência que esse centro político exercia sobre os hábitos 
Iinguísticos, o português culto, que na origem apresentava fortíssimas semelhanças 
com o galego, foi-se amoldando à fala culta da região que se situa entre as cidades 
de Coimbra, sede da antiga capital, e da mais antiga e célebre universidade, e de 
Lisboa, a capital atual. 
Esse deslocamento “geográfico” da variedade adotada com norma soma-se 
aos efeitos de três séculos de evolução, à experiência acumulada na elaboração de 
uma prosa hagiográfica, doutrinária e histórica, às influências do Humanismo e da 
Renascença, para explicar as grandes diferenças que todo estudante de literatura 
portuguesa percebe entre a linguagem dos primeiros textos literários e os modelos 
do período clássico. 
Esse novo padrão literário consolidou-se e estabilizou-se no período 
quinhentista, em particular com as obras “renascentistas” de Luis de Camões, que 
permaneceram durante séculos como um fator de imobilidade do padrão português 
culto. A riqueza da literatura portuguesa quinhentista e seiscentista foi também um 
fator determinante para garantir a independência do português em face da influência 
castelhana, particularmente no período em que Portugal esteve sujeito politicamente 
à Espanha (1580-1640). 
Quanto ao Castelhano, no centro da Ibéria, a Reconquista começou pela 
iniciativa das monarquias de Leão e Castela. Logo, os dois reinos formaram um 
único Estado que atuou ainda mais agressivamente na guerra aos árabes. Depois 
20 
 
da retomada de Toledo (1085), o episódio mais marcante dessa guerra é a batalha 
de Las Navas de Tolosa (1212), que abriu o caminho para que fossem subjugados 
os reinos árabes de Córdoba (1236) e Sevilha (1248). Com estas conquistas, os 
árabes conservavam na Península Ibérica somente o Reino de Granada, que 
sobreviveu até o reinado de Fernando e Isabel, a Católica (1492). 
O movimento de reconquista teve o efeito de levar o castelhano – isto é, o 
dialeto de Castela, a Velha, a região em torno da antiga capital Burgos – não só para 
o sul, isto é, para os territórios retomados aos árabes, mas também para leste e 
oeste, isto é, para os territórios leonês e aragonês. 
É certo que no século XII o castelhano já devia ser o dialeto comumente 
falado numa vasta região do centro-norte da Espanha; e é precisamente no século 
XII que os estudiosos situam a formação de um padrão literário tipicamente 
castelhano. Datam desse século o Poema del Cid, alentado poema épico de 3735 
versos, com assonância mas sem métrica, a substituição do latim pelo castelhano 
nos autos notariais, e o início de uma literatura hagiográfica e dramática de fundo 
religioso (Auto de Ios Reyes Magos, Vida de San Millan, Vida de Santo Domingo de 
Silos). No século seguinte, duas iniciativas de caráter oficial contribuempara o 
estabelecimento de um padrão literário na prosa: a tradução do Forum Judicum, o 
código civil da época (1241) e a compilação da Crônica Geral, sob Afonso X (rei de 
1251 a 1284). 
O casamento de Isabel de Castela e Fernando de Aragão, levou à unificação 
de Aragão e Castela num único Estado fortemente centralizado. Esta unificação fez 
com que o castelhano – enriquecido, é verdade, por inúmeros elementos dos outros 
dialetos hispânicos – ocupasse espaços cada vez maiores do território anteriormente 
ocupado pelo aragonês e pelo catalão. Essas regiões são hoje bilíngues; o aragonês 
decaiu para a condição de dialeto, e apenas o catalão continua a desempenhar 
funções de língua nacional, ao lado do castelhano. 
As origens remotas do Estado em que se desenvolveu o catalão remontam à 
criação por Carlos Magno da Marca Hispânica, uma espécie de protetorado franco 
ou Estado-tampão destinado a bloquear possíveis invasões muçulmanas da França. 
A partir dos vários condados que constituíam inicialmente a Marca, desenvolveram-
se no século XI duas unidades políticas principais: o Reino de Aragão e o Ducado de 
Barcelona, que acabaram constituindo um único Estado a partir de 1137, ano em 
21 
 
que Ramón Berenguer IV, duque de Barcelona, desposou uma herdeira do trono 
aragonês. 
Entre os séculos XII e XV, esse Estado catalão-aragonês teve uma intensa 
atuação militar e comercial: não só atuou contra os árabes na reconquista de uma 
faixa litorânea que vai até Alicante (a retomada definitiva de Valência é de 1238), 
mas também se lançou à conquista das Baleares, da Córsega, da Sardenha e do 
Reino de Nápoles, além de interferir nas questões políticas do sul da França. 
Devido à grande influência da poesia provençal no século XII, os primeiros 
poetas da corte aragonesa expressaram-se em provençal; mas no século XIII, o 
catalão ganhou dignidade literária e passou por um rápido processo de 
estandardização, tendo-se tornado o veículo de uma rica literatura na qual cabe 
incluir não só a obra poética, científica e filosófica de Ramón Llull e a historiografia 
de Ramón Mountaner, mas também a fala jurídica das Cortes (o parlamento catalão) 
e o Llibre dei Consolat de Mar, o primeiro código marítimo da Europa. 
Nos séculos XIV e XV, a literatura catalã atingiu seu apogeu, mas, em 1479, 
o Reino Aragonês se fundiu com Castela, e os escritores dos séculos seguintes 
acabaram por adotar como norma literária o castelhano. 
Depois de uma importante retomada no período romântico (o escritor mais 
célebre é o poeta e religioso Jacinto Verdaguer) o catalão – que obviamente 
continuou existindo como língua falada – tem sido objeto de um paciente trabalho de 
estandardização por parte dos filólogos e tem sido utilizado como veículo de uma 
produção escrita voltada para os mais variados campos de atividade. 
Colocado sob suspeição pelo regime franquista, que via em seu uso o risco 
de um impulso autonomístico, o catalão recuperou hoje toda a sua vitalidade, 
mesmo que a absoluta maioria de seus falantes domine o castelhano (ILARI, 2004). 
 
2.5 As línguas da Gália 
As línguas da Gália são o provençal, o francês e o italiano. 
O provençal assumiu as funções de língua nacional no fim da Idade Média, 
perdendo-as em seguida ante o avanço do francês. Costuma-se associar a língua 
provençal à poesia trovadoresca, o que faz justiça à influência e originalidade desse 
gênero, mas os primeiros monumentos literários provençais (como aliás os primeiros 
22 
 
monumentos literários dos domínios da langue d’oil) são de caráter religioso: um 
fragmento do poema Boecis, biografia em versos do filósofo latino Boécio, que é 
representado como um herói cristão; e a Chanson de Sainte Foi d'Agen, uma 
alentada biografia da santa, que segundo a tradição teria sido martirizada sob 
Diocleciano, escrita em versos octossílabos. 
Os mais antigos poemas líricos conservados pertencem a um poeta de 
origem nobre: Guilherme de Poitiers, Duque de Aquitânia, que viveu entre 1071 e 
1127. Marcam o início de uma poesia de temática principalmente amorosa, cultivada 
nas cortes para acompanhar a música, na qual se distinguiram os poetas Marcabru 
e Cercamon, Jaufré Rudel, Bernard de Ventadour, Rimbaut d'Orange, Bertrand le 
Born (que além de poemas líricos escreveu poemas políticos, as sirventés). 
Originários de vários pontos do sul da França (desde o vale do Ródano até o 
estuário do Garona) esses poetas escreveram numa língua bastante uniforme, que 
evita os elementos específicos dos respectivos dialetos. Em pleno século XII, o 
provençal se havia em suma transformado numa espécie de koiné literária, que não 
tem base em um único dialeto ou variedade regional, a despeito de ser às vezes 
indicada pelos nomes de Limousin ou de ser identificada com o dialeto de Toulouse. 
Vários fatores de ordem social, política e até religiosa (desaparecimento da 
sociedade feudal, perseguições religiosas contra os albigenses, entre outros) 
fizeram com que as cortes provençais desaparecessem no fim da Idade Média, e 
com elas a rica vivência poética que haviam abrigado. Os Jogos Florais de Tolosa, 
um concurso poético criado em 1323 como uma tentativa de reviver o trovadorismo, 
Iogo tiveram que aceitar concorrentes que apresentavam composições em francês; 
pela primeira vez, em 1513, a violeta de ouro, prêmio do certame, foi atribuída a um 
poeta do norte, o que dá uma medida da penetração do francês como língua da 
poesia no sul da França, já no século XVI. 
Abandonado como koiné literária, o provençal continuou evidentemente a 
existir como um sistema de dialetos. 
Nem o talento literário de Mistral nem o esforço que fez por elaborar 
literariamente a variedade dialetal de sua região, conseguiram devolver ao provençal 
o antigo prestígio literário; quanto aos outros campos de atividade, já se havia 
praticamente consumado por completo no tempo de Mistral a adoção do francês 
23 
 
como língua da escola, da administração e da lei: um grande salto nesse sentido foi 
dado durante a Revolução Francesa, um período rico em debates e decisões sobre 
questões político-linguísticas: além das dificuldades práticas de traduzir a legislação 
para todos os dialetos, estes últimos foram vistos como um resquício da antiga 
ordem feudal e nobiliárquica, e, em última análise, como um obstáculo a ser 
removido no esforço de organização do país sob a nova ordem. 
O francês literário, que é hoje a língua nacional da França, da Bélgica 
(juntamente com o flamengo) e da Suíça (juntamente com o italiano e o alemão), 
teve suas origens no dialeto frâncico (francien) falado na origem na região 
parisiense, conhecida como Ile de France. O frâncico se impôs desde cedo numa 
grande área do norte da França, onde levou praticamente ao desaparecimento dos 
demais dialetos; e o avanço do francês comum está levando à dissolução dos 
dialetos occitanos. 
Durante o nono e décimo séculos, provavelmente consequência do Concílio 
de Tours, floresceu no norte da França uma literatura de inspiração religiosa, 
compondo-se principalmente de orações e vidas de santos. O que restou dessa 
literatura (Sequence de Sainte Eulalie, Vie de Saint Léger, Passion du Christ, 
Fragment de Valenciennes) não foi escrito em frâncico, mas em normando ou 
picardo; nota-se, entretanto, que os traços dialetais aparecem de algum modo 
atenuados, como se os autores estivessem em busca de uma koiné. No século 
seguinte, em obras que continuam essa vertente religiosa, como a Vie de Saint 
Alexis, e no primeiro poema épico do norte da França, a Chanson de Roland, a 
identificação com o frâncico é mais evidente; no final do século, a identificação da 
norma literária com o frâncico deviaser um fato consumado, a julgar pelas inúmeras 
declarações de autores que se gabam de ter tido o frâncico por língua materna, ou 
se desculpam em frâncico por ser originários de outras regiões. 
Assim, ao começar o século XIII, o frâncico havia-se transformado em norma 
literária para toda a França do norte; e essa norma, fielmente respeitada por todos 
os grandes escritores da época, viu nascer a prosa com Villehardouin, o cronista da 
quarta cruzada. 
A explicar o prestígio do frâncico contribuem vários fatores: a existência em 
Paris de uma corte foi apenas um deles, que convém não exagerar, sobretudo nas 
24 
 
origens, já que a monarquia de Paris tinha jurisdição sobre um território limitado, 
subdividido num grande número de condados e ducados praticamente autônomos. 
Convém considerar nesse primeiro momento o papel político e religioso 
desempenhado pela Abadia de Saint Denys, que avalizou a criação da monarquia 
parisiense e funcionou como centro de pesquisa religiosa no espírito do Concílio de 
Tours, e a influência da Universidade de Paris, criada no século XI e logo 
transformada em ponto de encontro de estudantes de procedência linguística vária. 
A partir do século XIII, já não faz sentido encarar o frâncico como um dialeto: 
deu-se sua conversão em língua nacional e veículo de uma rica literatura cujos 
mentores serão frequentemente originários de outras áreas dialetais. 
O grande contraste entre a língua dos textos franceses do século XIII e os 
do século passado e atual – um contraste que seria ainda maior se 
considerássemos a expressão falada ao invés da escrita – não é geográfico, mas de 
ordem evolutiva: deve-se ao fato de que o francês, que já no século XIII era uma das 
variedades que mais se haviam diferenciado do latim vulgar, continuou evoluindo 
foneticamente, em particular em sistema vocálico (foram eliminados na fala inúmeros 
ditongos que deviam dar ao francês daquela época uma sonoridade parecida com a 
do inglês atual) passou por uma rigorosa sistematização na morfologia e sintaxe. 
O italiano literário, por sua vez, desenvolveu-se a partir do florentino entre os 
séculos XIII e XIV; nesse período, a Itália encontrava-se dividida numa série de 
pequenos Estados autônomos, frequentemente em luta entre si; entre 1220 e 1250, 
no reinado de Frederico II de Hohenstaufen, o Reino de Sicília viu surgir uma poesia 
palaciana de inspiração provençal, escrita em siciliano (é a essa época e a esse 
ambiente que pertenceu Jacopo da Lentino, o criador do soneto). 
A iniciativa de escrever poesia lírica na língua vulgar foi imediatamente 
imitada em Bolonha e em diferentes cidades da Toscana. 
Em Florença, a experiência de escrever poesia lírica em vulgar coube ao 
grupo dos poetas conhecidos como “poeti dei dolce stil nuovo”, ao qual Dante 
Alighieri pertenceu nos primeiros anos de sua atuação como poeta e crítico. 
A obra de Dante Alighieri, frequentemente apontado como “o pai da língua 
italiana”, contribuiu decisivamente para que o florentino fosse adotado no século XIV 
como a língua da poesia lírica, ganhando terreno sobre o latim, e frustrando as 
25 
 
outras tentativas de dar feições literárias a variedades locais da língua vulgar; Nisso, 
foi importante o papel desempenhado pelos estudos teóricos de Dante sobre estilo, 
língua e poesia (Vila nuova, Convivia e De vulgari eloquentia) mas foi ainda mais 
decisivo o prestígio alcançado pela Divina comédia, que já era enorme na geração 
seguinte a Dante, graças inclusive à “propaganda” de humanistas que foram 
simultaneamente grandes escritores vernáculos como Boccaccio e Petrarca. 
Assim, no final do século XIV, o domínio do florentino era absoluto na poesia 
lírica; o prestígio da poesia lírica escrita em fiorentino permitia que ele rivalizasse 
com as outras línguas de dignidade literária: o latim escolar, que continuava 
presente na prosa doutrinária e nas atividades ligadas ao estudo, ao direito e à 
administração, o provençal, veículo de uma lírica ainda em voga e o francês, que 
tinha ganho forte penetração no norte da Itália como língua da poesia épica. 
Durante o século XIV, o florentino foi substituindo o latim em outros gêneros 
literários (seu domínio na prosa está ligado à literatura mística do século XIV de que 
são representantes Santa Catarina e São Bernardino de Sena) e pragmáticos: por 
exemplo, foi muito rápida sua adoção como língua dos contatos diplomáticos e 
comerciais entre os Estados, um processo para o qual contribuiu o grande prestígio 
econômico de Florença no final da Idade Média: lembre-se que Florença foi nessa 
época o principal centro bancário da Europa, e que o florim, graças à sua 
estabilidade, manteve por alguns séculos o papel (hoje reservado ao dólar, ao marco 
e ao iene) de moeda do comércio internacional. 
Na sua expansão pelas várias capitais da Itália, o florentino encontrava 
geralmente uma língua literária que era o resultado da estilização do dialeto local; e 
a consequência habitual do contato era que os autores locais aproximassem cada 
vez mais seu “vulgar ilustre” do florentino. Esta tendência é bem visível nos textos de 
que nos restam cópias escalonadas ao longo de vários anos ou redações 
sucessivas: um caso é o poema Arcadia de Jacopo Sannazaro, conhecido dos 
estudantes brasileiros por ter inspirado o movimento do Arcadismo: esse poema 
teve duas versões, publicadas a distância de uma década no final do século XV: na 
segunda, o autor, Jacopo Sannazaro, reescreve em bom toscano as passagens que 
poderiam denunciar sua origem napolitana. 
No geral, a penetração do toscano deu-se primeiro na poesia do que nos 
demais gêneros literários, e primeiro na literatura do que na vida corrente; e foi mais 
26 
 
rápida na planície do Pó (Veneza teve um grande papel nisso com suas tipografias 
que imprimiam em florentino a despeito de haver uma língua local com boa tradição 
literária) e no centro da Itália do que no alto vale do Pó; no sul, o episódio de 
Sannazaro é um bom sintoma do predomínio do toscano em Nápoles, principal 
centro cultural de uma região que não teve cidades tão autônomas como o centro e 
o norte. 
No século XVI, quando o predomínio do toscano como padrão literário e 
língua nacional era um fato consumado, vários intelectuais envolveram-se numa 
acirrada polêmica (que ficaria conhecida como “questione della lingua”) a respeito da 
variedade linguística a ser tomada como norma. O debate opôs num primeiro 
momento três posições: a arcaizante, que recomendava uma língua literária buscada 
no exemplo de Dante, Boccaccio e Petrarca, a eclética, que defendia a língua falada 
nas cortes, mais aberta a influências de todo tipo, e a toscanizante, que via no 
toscano ou no florentino da época o modelo a ser seguido. 
Mais tarde, discute-se se a língua da literatura deve admitir traços que 
pertencem exclusivamente ao florentino, ou deve basear-se numa espécie de 
toscano comum; discute-se também se essa língua literária pode legitimamente ser 
chamada de italiana. Ainda hoje, os ecos desse debate vêm à tona quando se quer 
localizar na fala desta ou daquela cidade modelos da língua italiana a ser tomada 
como norma, e em rigor as principais posições dos intelectuais quinhentistas 
continuam fazendo algum sentido até hoje: historicamente, a importância de Dante, 
Boccacci e Petrarca foi fundamental para dar ao florentino uma absoluta primazia 
entre os vulgares. Mas na sua transformação em língua nacional o florentino 
incorporou termos de outras regiões e de outras línguas, inclusive por influência da 
fala das cortes; por outro lado, o italiano comum evita imitar o florentino nos traços 
específicos da pronúncia e do vocabulário (vistos agora comodialetais), o que o 
aproxima de outras variedades mais arcaizantes de toscano, por exemplo, a que se 
fala na cidade de Sena (ILARI, 2004). 
 
2.6 O romeno 
Os primeiros textos em romeno remontam à Renascença, mais 
precisamente ao período da Reforma, e são traduções de textos sagrados; nesse 
27 
 
período, com a imprensa, chegou à Romênia o alfabeto latino, que foi usado 
juntamente com o alfabeto corrente entre os clérigos e letrados da região, o cirílico. 
Mas para a definição de um padrão literário e nacional, será preciso esperar até o 
século XVII, período em que foi completada a tradução da Bíblia em Bucareste. 
A partir daí e, principalmente depois que as duas regiões da Valáquia e 
Moldávia, formaram um único reino em 1859, o prestígio da língua de Bucareste (o 
valáquio) se impôs como padrão de língua nacional. 
Junto com a consciência de que o romeno era uma língua latina – uma 
verdade mais difícil de reconhecer enquanto prevaleceu o uso do alfabeto cirílico – 
os escritores romenos tomaram consciência de que sua língua não havia usufruído 
da influência do latim literário, que nas outras línguas românicas foi bastante 
enriquecedora em todas as áreas de sua estrutura e particularmente no léxico. Para 
compensar essas deficiências, no século passado, voltaram-se para as demais 
línguas românicas, criando-se duas correntes principais: uma que preconizava a 
imitação do francês, então língua românica de maior prestígio internacional; outra, 
que favorecia a imitação do italiano, a língua românica mais próxima. 
Como língua nacional, o romeno é hoje falado em toda a República Romena 
(ao passo que tem o status de dialeto nas áreas do megleno-romeno, do istro-
romeno e do macedo-romeno); uma variedade linguística muito próxima do romeno 
é falada na República Socialista da Moldávia, que ocupa o território a leste do rio 
Prut, e pertence à União Soviética desde a Segunda Guerra Mundial. 
Apresentada às vezes como “mais uma” língua românica, a fala dessa 
região nada mais é do que uma variedade de romeno, cuja distinção atende a 
critérios políticos e não linguísticos (ILARI, 2004). 
28 
 
UNIDADE 3 – DO LATIM ARCAICO AO LATIM VULGAR 
 
O latim clássico e o latim vulgar são duas modalidades da mesma língua, 
sendo a primeira literária e a segunda popular, receberam dos romanos as 
respectivas denominações: sermo urbanus e sermo vulgaris. 
Coutinho (1976, p. 29-30 apud QUEDNAU, 1999) as define da seguinte 
forma: 
Diz-se latim clássico a língua escrita, cuja imagem está perfeitamente 
configurada nas obras dos escritores latinos. Caracteriza-se pelo apuro do 
vocabulário, pela correção gramatical, pela elegância do estilo, numa 
palavra, por aquilo que Cicero chamava, com propriedade, a urbanitas. Era 
uma língua artificial, rígida, imota. Por isso mesmo que não refletia a vida 
trepidante e mudável do povo, pode permanecer, por tanto tempo, mais ou 
menos estável. 
 
Chama-se latim vulgar, o latim falado pelas classes inferiores da sociedade 
romana inicialmente e depois de todo o Império Romano. Nestas classes estava 
compreendida a imensa multidão das pessoas incultas que eram de todo 
indiferentes às criações do espírito, que não tinham preocupações artísticas ou 
literárias, que encaravam a vida pelo lado prático, objetivamente. 
Alguns autores contestam essa definição de latim vulgar, afirmando que 
essa modalidade da língua expressa a fala cotidiana dos romanos de maneira geral, 
e não só das classes inferiores. Nesse sentido, Silva Neto (1957, p. 46 apud 
QUEDNAU, 1999) opõe ao latim clássico uma língua coletiva, falada, provida de 
meios de expressão que nem sempre eram julgados dignos de ascender às páginas 
da literatura. Essa língua falada era multimoda e complexa, não obedecia às normas 
rigorosas por que se pautava ou devia pautar, a língua escrita. 
Com efeito, o latim vulgar, mesmo aquele falado pelas classes sociais mais 
cultas, era profundamente diferente do latim clássico, uma língua cultivada, artística, 
em que foram compostas as grandes obras que marcaram os momentos mais 
importantes da prosa e da poesia latina: as obras de Cícero, Virgílio, Horácio, Tito 
Lívio e muitas outras figuras importantes. Cardoso (2004) afirma que o latim clássico 
se preservou graças à conservação dessas inúmeras obras gramaticais do idioma. 
 
29 
 
3.1 Latim arcaico 
A mais antiga inscrição latina, data de aproximadamente 600 a.C., e é, na 
verdade, um latim dialetal, o prenestino: “MANIOS MED FHEFHAKED NVMASIOI” = 
“Manius me fecit Numerio” “Manios me fez para Numério” (MARTINS, 2006). 
Trata-se de uma inscrição em uma fivela de ouro, encontrada em Preneste 
(hoje em dia Palestrina), por isso o nome “fíbula prenestina”. 
As características dialetais e arcaicas que estão presentes nessa frase são: 
a conservação do ditongo oi, observada em numasioi, um dativo (depois, o i final cai, 
e a desinência de dativo passa a o), a conservação do s intervocálico, que no latim 
muitas vezes sofre rotacismo (como no caso de flos, floris; honos, honoris), e a 
reduplicação do pretérito perfeito fhefhaked, além da desinência secundária em d. 
No latim arcaico era feced, forma atestada em uma inscrição, chamada de “vaso de 
Duenos”, depois esta forma evoluiu para fecit. Fhefhaked, como se disse, é uma 
forma dialetal do pretérito perfeito com redobramento. É interessante notar ainda, 
nesta inscrição, a posição medial do verbo, que contrasta com a posição mais 
normal de ser encontrada no latim clássico, que é no fim da frase. 
Uma parte notável das tendências do latim vulgar, além de já estarem 
presentes no latim arcaico, resulta da estrutura do indo-europeu e se verificam em 
quase todas as línguas europeias. São exemplos comprovados pela epigrafia latina 
que o ē e ō eram pronunciados como e fechado e o fechado, respectivamente, pois 
o ō longo aparece frequentemente representado por u e o ē longo por i. O umbro 
apresenta apócope do –m final e o osco-umbro apresenta a partícula de reforço dos 
demonstrativos –ce, idêntica ao latim. 
Havia, pois, na origem, “falares latinos”, sendo o latim de Roma um deles. 
Além do prenestino, outro importante é o falisco, falado em Falérios (Falerii). Estes 
dois dialetos apresentam características mais arcaicas ainda do que se aponta para 
o chamado latim arcaico. Como documentação do latim arcaico, há pouquíssimos 
textos, apenas alguns outros escritos epigráficos, como os epitáfios dos Cipiões, do 
V ou IV séc. a.C. (MARTINS, 2006). 
 
30 
 
3.2 Latim clássico, culto ou literário 
A língua latina, tal como a conhecemos, polida e aperfeiçoada pelos grandes 
escritores do período “áureo”, não saiu assim do indo-europeu. O latim que 
chamamos de “clássico” ou “literário” é fruto de prolongado amadurecimento e 
elaboração, e representa o momento de seu maior esplendor. Este momento foi 
precedido de vários estágios perfeitamente demarcados, e a ele se seguiriam outros 
estágios subsequentes, que iriam culminar na formação das línguas românicas 
modernas (MARTINS, 2006). 
Com o advento da literatura latina, a partir do século III a.C., o latim escrito 
vai paulatinamente ganhando maior rigor formal até atingir o máximo de sua 
estética, na época de Cícero e César. Nesse “aperfeiçoamento”, é evidente a 
influência helênica, que se faz através dos gramáticos e dos escritores. Iniciava-se, 
assim, o fenômeno que iria conter a expansão natural da língua falada, pela ação 
dos gramáticos, da literatura e da classe culta. 
“Latim clássico” é a norma literária, altamente estilizada, que compreende o 
período que vai de 81 a.C. a 14 d.C., seus principais representantes são Cícero, 
César e Salústio, na prosa e, no verso,Virgílio, Horácio, Ovídio, Lucrécio e Catulo. É 
uma estilização do sermo urbanus ou usualis, língua coloquial das classes cultas, 
com o qual convivia. 
Os escritores do período clássico haviam percebido que existiam variantes 
da língua latina e caracterizaram-nas adjetivando a palavra sermo que significa 
“linguagem”, “conversação”. Com efeito, há três fatores envolvidos nas variantes que 
uma língua pode apresentar: a variação social, correspondente à estratificação 
social, a geográfica, correspondente às diferenças geográficas, e as diferenças 
relativas ao grau de formalidade da situação de fala. 
A língua literária continuou no sermo ecclesiasticus (a partir do séc. V d.C.) e 
também no sermo profanus, com os tratados de medicina, filosofia, ciência, entre 
outros, durante toda a Idade Média e até mesmo já na Idade Moderna. Pode-se 
dizer que até hoje vive. É a língua do Vaticano e de toda a documentação da Igreja 
Católica, além de ser empregada na botânica e de ser adstrato permanente das 
línguas românicas e até de línguas não-românicas, como o inglês. O sermo 
classicus fixou-se como uma língua escrita (o latim clássico que estudamos), porém, 
31 
 
o latim culto falado (sermo urbanus), a partir do qual obteve sua origem, extinguiu-
se, com a ruína da classe social que o sustentava (MARTINS, 2006). 
Quanto ao Latim culto falado, o sermu urbanus era a língua falada pelas 
classes altas de Roma, certamente correto do ponto de vista gramatical, mas sem os 
refinamentos estilísticos da norma literária, como os longos períodos de 
subordinação e de termos disjuntos. Como língua falada desapareceu entre os 
séculos V e VI, no mais tardar no séc. VI, devido ao aniquilamento das cidades e da 
vida cultural que elas apresentavam, juntamente, é claro, com a classe social que a 
mantinha. Este período coincide com a queda do Império Romano do Ocidente (476 
d.C., séc. V) e a onda de invasões bárbaras (destacando-se os longobardos na 
Itália, em 568 d.C.), na Europa, no séc. VI. 
Do ponto de vista gramatical, o sermo urbanus é uma língua correta e não 
apresenta os “erros” do latim vulgar; mas tampouco apresenta o exagero de 
refinamentos estilísticos da prosa e poesia artísticas. Cícero, ele mesmo, nos fala da 
diferença de formalidade no emprego do latim em uma carta que escreveu ao seu 
amigo Paetus (Ad Fam.,IX,21): 
Quid tibi ego in epistulis uideor? Nonne plebeio sermone agere tecum ... 
Epistolas uero cotidianis verbis texere solemus. “Que pareço eu a ti nas cartas? Não 
pareço tratar contigo na língua do povo... de fato, costumamos tecer as cartas com 
as palavras do dia a dia”. 
Desde as primeiras manifestações da língua latina, tem-se notícia da 
coexistência de uma variedade culta falada e de outra variedade também falada, 
mas pelas classes populares (plebeias). Mais tarde, enquanto a língua literária 
depurava os elementos alheios ao dialeto de Roma, a língua corrente exprimia o 
contato de outros dialetos itálicos. A fala rústica e vulgar era um instrumento através 
do qual se entendiam romanos, faliscos, prenestinos, oscos e umbros. 
A língua da sociedade elegante (o sermo quotidianus ou sermo urbanus ou 
usualis ou consuetudinarius, o uso comum da classe culta) e a das classes baixas 
(sermo plebeius) não constituíam compartimentos estanques. Segundo Martins 
(2006), a literatura sobre o assunto é unânime em afirmar que muitas características 
da língua popular apareciam no uso corrente das classes mais altas. Não é apenas 
Cícero que se refere à diferença no grau de formalidade entre os seus discursos e 
32 
 
tratados filosóficos, e suas cartas, Quintiliano, um século depois de Cícero, reflete 
sobre a diferença que há entre a norma do latim (grammatice loqui) e o uso real 
deste na comunicação (latine loqui). Seguindo os passos de Cícero, Quintiliano diz 
que o bom latim é o da cidade de Roma (urbanitas) e não a língua do campo 
(rusticitas). 
 
3.3 Latim vulgar 
 
“Latim vulgar” era o latim essencialmente falado pela grande massa popular 
menos favorecida e quase que inteiramente analfabeta do Império Romano. Foi 
propositalmente ignorada pelos gramáticos e escritores romanos, pois era 
considerada indigna de consideração. 
Distinguia-se do latim culto falado (e por extensão do latim clássico ou 
literário) em todos os aspectos gramaticais. Era mais simples em todos os níveis, 
mais expressivo, mais concreto e mais permeável a elementos estrangeiros. 
Continuou se transformando ao longo dos séculos até que em mais ou menos 600 
d.C. já constituía os primeiros “romances” (ou seja, as primeiras manifestações das 
línguas românicas, muito próximas ainda do latim vulgar) e depois, a partir do séc. 
IX, as línguas românicas (MARTINS, 2006). 
Sabe-se que as características gerais básicas do latim vulgar já se 
apresentavam desde o fim da época republicana ou desde o começo do período 
imperial, isto é, desde o século I a.C. ou no máximo desde o século I d.C. Mas é 
muito comum datarem-se dos séculos III ou IV da era cristã numerosas inovações 
atestadas pelo conjunto das línguas românicas. 
O latim vulgar é, na verdade, um latim popular que existiu em todas as 
épocas da língua latina. Este latim pertencia a uma população que era muito pouco 
ou nada escolarizada e que, portanto, não poderia ter sido influenciada pelos 
modelos literários e pela escola. O latim vulgar não sucede ao clássico; teve origem 
nos meios plebeus de Roma e cercanias, sendo essencialmente, como afirma 
Maurer Jr. (1959, p. 5 apud MARTINS, 2006), “o latim falado pela plebe romana, 
embora muito de seus característicos se infiltrassem no seio da classe média e até 
das classes mais altas, sobretudo na época imperial”. 
33 
 
Uma vez que se trata de uma variedade de formas, que se ligam ao latim 
falado (mas não exclusivamente), não se pode considerar que existam realmente 
textos em latim vulgar. Quase nenhum texto, que contenha vulgarismos, é 
intencionalmente vulgar, à exceção da Cena Trimalchionis, de Petrônio, e dos 
comediógrafos, principalmente Plauto, que colocam personagens do povo falando. O 
mero fato de ser escrito envolve o uso de certas convenções, e mesmo no caso de 
escritores simples, sem muita pretensão literária, há pelo menos a convenção 
ortográfica que eles tentam seguir. 
Meillet (1948, p. 239 apud MARTINS, 2006) fala sobre o latim vulgar como 
um conjunto de tendências que se manifestavam diferentemente conforme o maior 
ou menor grau de educação dos que o falavam, e segundo o tempo e os lugares 
onde era falado. Porém, é surpreendente que apesar da variabilidade cronológica, 
social e geográfica, o latim vulgar possuía uma homogeneidade suficientemente 
extensa para que fosse entendido em seu vasto território. Havia uma unidade no 
latim vulgar, que fazia dele uma espécie de koiné latina. Quintiliano (Inst. Orat. 1, 5, 
29) observou que a norma latina era relativamente simples, porque em latim não 
havia dialetos, o que não acontecia com o grego. 
O latim vulgar tinha, desde a época de Plauto, e ainda mais, a partir de 
Cícero, peculiaridades gerais suficientes para dar-lhe um aspecto mais ou menos 
definido em oposição ao sermo urbanus e ao sermo litterarius. Segundo Maurer Jr. 
(1962 apud MARTINS, 2006), essas diferenças vinham de três fatores principais: 
 o primeiro fator era por que o latim vulgar representava a língua do povo 
comum, da plebe romana, enquanto o latim clássico era um produto da 
sociedade aristocrática. A enorme oposição social entre essas duas classes 
se refletia na língua e que era capaz de explicar as diferenças no vocabulário 
e na sintaxe; 
 o segundo é que o latim clássico, apesar de ter-se originado em um latim vivoe falado, é, em geral, mais conservador e arcaizante do que o latim vulgar; 
 o terceiro fator se deve ao fato de o latim vulgar ser fruto de uma população 
heterogênea, que empregava mal a língua latina, corrompendo-a. Sem 
esquecer que a criação da literatura é obra de estrangeiros, basta citar Lívio 
Andronico, Ênio, Plauto, Terêncio. O próprio Cícero afirma que o falar da 
34 
 
cidade, em seu tempo, era diferente do século anterior, no qual ainda se 
ouvia o bom latim, embora já assinale a existência de uma linguagem 
corrompida em muitas famílias do século II a.C. Ele atribui a deturpação do 
latim à invasão de estrangeiros que falavam mal a língua (BRUTUS, 210, 213, 
258). 
Para tornar a comparação entre o latim vulgar e o latim culto – sermo 
urbanus – ou até mesmo o literário – mais próxima à nossa realidade, podemos 
pensar no português falado pelas populações de um âmbito social limitado do ponto 
de vista de escolarização, que apresenta, ao lado de uma simplificação na 
gramática, restos de uma linguagem arcaica, já abandonados na língua culta. A 
mesma impressão que temos ao ouvir um português não adequado em comparação 
com a norma culta, teria um romano escolarizado ouvindo o latim vulgar, 
acostumado a uma língua ricamente flexionada e elegante. 
Diferenças entre o sermo plebeius e o sermo urbanus estão presentes na 
pronúncia, no vocabulário, na sintaxe, e na morfologia. A distância que separava o 
latim vulgar do latim culto era a princípio pequena, mas já podia ser vista a partir do 
séc. IV a.C. O vocabulário era, em boa parte o mesmo, sobretudo o que servia para 
o uso da vida cotidiana: coisas, animais, plantas, entre outros. O latim vulgar nunca 
se isolou completamente da língua literária, pois sempre houve um convívio 
constante entre todas as classes, através do teatro, às vezes pela escola e, mais 
tarde, pela Igreja. Portanto, existiu sempre uma contribuição limitada, porém 
contínua, da língua clássica para a popular. Vestígios fonéticos, morfológicos, 
sintáticos e ainda de um vocabulário semelhante à língua clássica também ocorrem 
nas línguas românicas. Trata-se de sobrevivências de uma época em que o latim 
vulgar ainda conhecia essas formas, perdidas depois na maior parte do território. Por 
exemplo, o sardo conserva melhor as vogais do latim clássico. 
Cremos ser evidente que entre os séculos I a.C. e I d.C. conviveram três 
variedades do latim: o sermo classicus ou literarius, o sermo urbanus e o sermo 
plebeius. 
São características das variedades “clássica” e “vulgar” do latim: 
a) Do ponto de vista gramatical, o latim clássico é: 
35 
 
I - Uma língua sintética, isto é, possui terminações próprias (desinências), 
que, no fim da palavra, indicam a função sintática. Essas palavras que possuem 
flexão são os nomes (substantivos, adjetivos e pronomes) e os verbos. Em latim, a 
frase Intelligenti pauca traduz-se em português por ‘Ao que sabe compreender, 
pouca coisa basta’. Este é um bom exemplo do que significa ser uma língua 
sintética, por oposição a uma língua analítica como o português. 
II – A língua latina é uma língua concisa porque exprime somente as 
palavras essenciais. Inclui-se no caráter conciso da língua latina o fato de não haver 
artigos (definido e indefinido) e de poder omitir palavras em contextos sintáticos que 
línguas como o português e o francês não permitem. 
III – É uma língua de ordem livre, em decorrência do sistema de casos 
morfológicos que permitem recuperar as funções semânticas e gramaticais dos 
substantivos (nomes). Estas são as características gerais básicas do latim, ou seja, 
a ordem livre dos elementos na frase, e a riqueza morfológica dos nomes e dos 
verbos que configuram o caráter sintético da língua. 
A maior parte das gramáticas latinas dedica-se à morfologia, apresentando 
as declinações dos nomes e a conjugação dos verbos (o sistema de concordância 
nominal e verbal), como sendo a própria gramática latina. Quanto à sintaxe, pouco 
se encontra nessas gramáticas, mas destacam-se as seguintes peculiaridades 
(sintáticas) da língua latina: o acusativo com infinitivo, as diversas funções do 
ablativo, inclusive a oração subordinada em ablativo, o chamado “ablativo absoluto” 
e o emprego das formas nominais do verbo. 
Quanto ao latim vulgar, do ponto de vista gramatical, ele é: 
I - Analítico na construção da sentença, pois, devido à progressiva perda dos 
casos, começa a exprimir as funções gramaticais por meio de preposições 
(complementos indiretos e circunstâncias) e pela ordem das palavras (sujeito e 
objeto). 
II - A frase popular faz um uso mais extensivo dos pronomes pessoais (1ª e 
2ª pessoas), possessivos, demonstrativos, e inova com os artigos definido e 
indefinido, e com o pronome pessoal de 3ª pessoa. 
III - A disposição das palavras se “simplifica” e se fixa, em oposição ao latim 
literário no qual a ordem obedece em larga escala às preocupações de estilo. A 
36 
 
grande liberdade de colocação no uso clássico devia constituir a parte da língua em 
que a preocupação estilística e o exemplo dos modelos gregos mais profundamente 
modificaram a sua evolução espontânea (MAURER JR, 1959 apud MARTINS, 
2006). 
A língua “vulgar”, como um todo, apresenta as seguintes características 
inovadoras que se distanciam dos textos literários clássicos: 
(i) a substituição do accusatiuum cum infinitiuo por construções formadas por 
conjunções e pronomes relativos; 
(ii) a inflação no uso dos pronomes pessoais de 1ª e 2ª pessoas; 
(iii) a inflação no uso dos diminutivos; 
(iv) o emprego dos demonstrativos ille e ipse, às vezes com o sentido 
próximo ao de artigo definido das línguas românicas; 
(v) a confusão no emprego dos casos; 
(vi) o aumento de frequência das preposições; 
(vii) a confusão nas declinações; 
(viii) as mudanças de gênero; 
(ix) o emprego da ordem da frase (Suj./Verbo/Compl.); 
(x) o uso de expressões tipicamente coloquiais (MARTINS, 2006). 
37 
 
UNIDADE 4 – FONOLOGIA DO LATIM VULGAR 
 
A fonologia também chamada fonêmica ou fonemática, é o estudo dos sons 
significativos da linguagem, ou seja, dos fonemas. Distingue-se da fonética, ciência 
que trata dos sons da voz humana, independentemente de seu significado. Nesta, o 
som é considerado do ponto de vista físico (articulatório), enquanto naquela 
interessa o elemento psicológico. O método fonético é o das ciências naturais, 
enquanto a fonologia se rege pelo sistema gramatical da língua, pelo que só ela, 
conforme a escola de Praga, seria realmente ciência linguística (MIAZZI, 1980). 
Em relação à acentuação e vocalismo, mais especificamente sobre as 
vogais do latim vulgar depois da perda da duração vale saber: 
a) Perda da duração das vogais – o latim clássico apresentava cinco vogais 
(a, e, i, o, u), sendo que cada uma podia ser pronunciada com duração longa ou 
breve; a duração possibilitava distinguir palavras e morfemas gramaticais. No latim 
vulgar, às diferenças de duração foram-se associando diferenças de abertura que 
acabaram suplantando as primeiras. 
b) Alterações na natureza do acento – paralelamente à perda da quantidade, 
desapareceu em latim vulgar o acento tonal do latim literário que foi suplantado pelo 
acento “tônico”, ou seja, o acento de intensidade, tal como o conhecem hoje as 
línguas românicas. 
c) A posição do acento da palavra era determinada em latim culto pela 
quantidade da penúltima sílaba: as palavras do latim clássico são paroxítonas 
quando a penúltima sílaba é longa e proparoxítonas quando a penúltima sílaba é 
breve. 
d) O acento de intensidade do latim vulgar recai normalmente na mesma 
sílaba que era portadora do acento tonal do latim culto.e) Posição átona e posição tônica – com o desenvolvimento de intensidade 
modifica-se a qualidade tônica ou átona das próprias vogais: os fonemas vocálicos 
reduzem-se; há uma tendência de as vogais átonas caírem ou contraírem-se. 
f) As métricas românicas: tonicidade e rima – com a perda da quantidade 
vocálica, desaparece obviamente a possibilidade de uma poesia baseada na 
38 
 
duração das sílabas, como foi a poesia do latim literário. A métrica românica 
recorrerá então a uma contagem de sílabas que se faz até a última sílaba tônica, e a 
uma distribuição estratégica dos acentos tônicos no verso. A rima aparece 
inicialmente nos cânticos cristãos como um recurso mnemônico. 
g) Os ditongos – os quatro ditongos do latim clássico (ae, au, oe, eu) 
reduzem-se a uma única vogal no latim vulgar, e novos ditongos aparecem pela 
queda de consoantes intervocálicas, ou pela vocalização de consoantes. 
Ex: latim clássico: cælu latim vulgar: cƐlu 
h) Os hiatos – os numerosos hiatos do latim clássico correspondem 
geralmente a uma única vogal em latim vulgar. 
i) As consoantes – o sistema consonantal do latim clássico compunha-se de 
17 consoantes, incluídas as duas semivogais j e w e a aspirada h. A partir desse 
sistema consonantal o latim vulgar introduz com o tempo alterações que resultam 
num sistema que explora mais amplamente o trecho anterior da cavidade bucal, 
prenunciando a grande variedade de consoantes anteriores que entrarão em 
contraste fonológico nas línguas românicas. 
Lembre-se que as expressões “período latino” e “período românico” referem-
se, respectivamente, até o final do Império, quando a România ainda se conservava 
unida, e a partir da queda do Império Romano, no século V d.C., com o consequente 
desmembramento da România numa série de domínios linguísticos mais ou menos 
estanques (ILARI, 2004). 
39 
 
UNIDADE 5 – MORFOLOGIA DO LATIM VULGAR 
 
Morfologia (em linguística) e em sua definição mais simples significa o 
estudo da estrutura, da formação e da classificação das palavras. 
No caso do latim clássico, uma característica notável era a riqueza de sua 
morfologia nominal, caracterizada pela presença de declinações, pela existência de 
três gêneros gramaticais (masculino, feminino e neutro) e pela formação de 
comparativos e superlativos sintéticos para os adjetivos. 
Houve perda das declinações (que são cinco paradigmas de desinências 
nominais relativas às funções sintáticas dos nomes na oração). O que distinguia as 
cinco declinações presentes no latim clássico era a vogal final do tema. 
No estudo da gramática latina na escola tínhamos sempre como exemplo as 
palavras: 
 rosa, rosae; agrícola, agricolae; 
 dominus, domini; templum, templi; 
 dux, ducis; cor, cordis; 
 lacus, lacus; cornu, cornus; 
 dies, diei. 
Em cada um desses paradigmas, os substantivos e os adjetivos latinos 
dispunham de terminações chamadas “casos”, especialmente apropriadas para 
indicar a função que desempenhavam na frase. Os casos do latim clássico eram 
seis: 
a) o nominativo, que identificava o sujeito das orações com verbo em forma 
finita; 
b) o genitivo, caso do nome dependente de outro nome; 
c) o dativo, que identificava o objeto indireto, ou mais exatamente o indivíduo 
beneficiado (prejudicado) pela ação descrita no predicado; 
d) o acusativo, caso do objeto direto, do lugar tomado como ponto final de 
um movimento e do tempo encarado como duração; 
40 
 
e) o vocativo; e, 
f) o ablativo, caso da maioria dos adjuntos adverbiais (meio, causa, 
instrumento, entre outrs), do lugar em que se desenrola uma ação, e do lugar de 
onde parte um movimento. 
Graças ao recurso dos casos, era possível marcar as principais funções 
sintáticas na frase latina sem recorrer à ordem das palavras e sem lançar mão de 
preposições. 
O latim vulgar simplificou radicalmente tais traços morfológicos: 
 praticamente desapareceram a 4ª e 5ª declinações, cujos vocábulos foram 
incorporados às três primeiras; 
 perderam-se as oposições casuais; confundiram-se certos casos: o 
nominativo com o vocativo; o acusativo com o ablativo; o genitivo com o 
dativo. Como resultado dessas três fusões, o latim vulgar utilizou um sistema 
de casos em que se opunham o nominativo, o acusativo e um terceiro caso 
composto por aquilo que restava dos antigos genitivo e dativo; 
 reinterpretação dos paradigmas de declinação como expressão do gênero, 
tendeu-se para interpretar como femininos os substantivos da 1ª declinação, e 
como masculinos, os da 2ª. Os substantivos da 3ª declinação passaram a 
femininos ou masculinos; 
 desaparecimento do neutro – os substantivos neutros acabaram geralmente 
absorvidos pelos masculinos da mesma declinação; 
 o grau dos adjetivos – abandono dos processos de formação sintéticos (altus, 
altior, altissimus) e substituição por perífrases com magis ou plus para o 
comparativo e multum para o superlativo. 
Na classe dos pronomes, inovou-se criando um pronome de terceira pessoa 
com base no demonstrativo ille. A declinação dessa classe de palavras compõe-se 
de nominativo, dativo e acusativo. 
Dos pronomes relativos, a língua vulgar conservou o principal, qui, que 
identificou-se com o interrogativo quis. 
41 
 
A partir dos demonstrativos, desenvolve-se a classe dos artigos definidos, 
que era desconhecida do latim clássico. 
Quanto à morfologia do verbo, em confronto com o latim literário, a 
morfologia verbal do latim vulgar apresenta importantes inovações. As principais 
são: 
 as vozes derivadas do tema do perfeito, que indicavam ação acabada em 
latim literário, foram reinterpretadas como indicando passado; 
 alguns verbos mudaram de conjugação; algumas dessas mudanças 
prevaleceram apenas em determinadas regiões da România; 
 com exceção da primeira, as conjugações tradicionais chegaram a uma 
espécie de petrificação, deixando de formar-se nelas verbos novos; essa 
situação foi parcialmente compensada pela criação de uma nova conjugação, 
baseada na forma de um conjunto de verbos que em latim literário tinham 
sentido incoativo. Muitos verbos foram criados por meio de sufixos. Os sufixos 
-esco e -isco, que formavam verbos incoativos a partir de nome (tipo tabesco, 
“ficar podre” a partir de tabes, “podridão”), forneceram o paradigma para a 
criação de um contingente extremamente numeroso de verbos novos; 
 perdeu-se a passiva sintética, compensada por uma passiva analítica 
baseada principalmente no verbo sum; 
 desapareceram os verbos depoentes, assimilados aos ativos da mesma 
conjugação; 
 desapareceram vários tempos do indicativo, subjuntivo e imperativo, e várias 
formas nominais. 
Sobre o indicativo: 
 dos seis tempos que compunham o indicativo em latim clássico, apenas o 
presente, o imperfeito e o perfeito sobreviveram em todas as línguas 
românicas; 
 do futuro restam apenas alguns vestígios insignificantes, porque o futuro 
sintético foi suplantado por perífrases baseadas em habeo ou volo 
(expressando compromisso, obrigação, e variando em pessoa e número) + o 
infinitivo; 
42 
 
 desapareceu também o futuro perfeito e o mais-que-perfeito (excetuando a 
Ibéria). 
Quanto ao subjuntivo: 
 dos tempos do subjuntivo, conservou-se o presente e desapareceu o perfeito; 
 o imperfeito e o mais-que-perfeito se confundiram; prevaleceu por toda parte, 
excetuando a Sardenha, a forma do mais-que-perfeito (se eu soubesse). 
 
No imperativo, as formas do futuro eram de pouco uso mesmo na língua 
literária, e a língua vulgar não as conheceu. 
Os tempos do perfectum foram reinterpretados! 
A distinção entre infectum e perfectum, no latim clássico, apontava para

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