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1 Ubiali (1998, p. 19 24)

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I::J INTRODUÇÃO
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O ! Por dedicar-se exclusivamente ao trabalho agrícola:1m e pastoril, o vocabulário dos romanos era, no início,
E ~ restrito à vida simples, suficiente a exprimir seus afazeres,~".- '~ diários, de significação prática e concreta .
+"' i Mas nenhum povo pode manter-se isolado paramO sempre. O contato com outras civilizações é inevitável.Foi assim que, para preencher suas necessidades deC ~,
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comunicação, adotaram vários termos de origem etrusca~a
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" e grega, enriquecendo progressivamente seu restritoI
Q) " vocabulário inicial.
"r'""" :R Entre os mais importantes habitantes primitivos da. _.~
Q. -~ , Península Ibérica, vamos encontrar os iberos e os celtas,'.- F. povo este de origem germânica, que ali se estabeleceu-"CX) tc Q) • após o século V antes de Cristo. ~Estes dois povos'~
Q) •. • terminam-se fundindo, formando os chamados celtiberos.
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lCO - ',' Devido a certa semelhança entre os idiomas latinoo_..J i e celta, os celtiberos acabam aceitando a romanização:::JW c·" ,cg_mos costumes e língua de Roma."'O ::J •~
O r Com a soberania sobre os cartagineses, quer-s....
CO [- governavam a Península Ibérica em 197 a.C., os romanos..•.....• "C C f dominam este território, fazendo-o, parte do Império·C ~. "'O Romano. À procura das riquezas da região, estabelecem-O rC t se também gregos e fenícios que fundam um bom número,_ O k..•.....• ! de cidades ...•.....• _..J« . I A conquista da Grécia enriquece os romanos queC O se impregnam da filosofia, costumes e religião e, na.-O s...
f linguagem, de termos abstratos para exprimir oCf) ~m
Q.) C I pensamento grego. Com isso, apertelçoa-se a língua.Z O Ser espiritual que é, o homem sofre de irresistível.-- o , inclinação para expressar seus sentimentos íntimos e- .- I_..J "'C I« E 19((I l(1)::J tn
profundos, as belezas e a genialidade próprias do espírito
humano. A necessidade de expressão cultural e artística
atrai esse povo para os modelos gregos e se apercebe .
da necessidade de uma língua literárié!i~,i Assim
apareceram escritores e teóricos da ltnquaqem "que
poliram, ordenaram e adaptaram a língua primitiva e
pobre às necessidades literárias, estabelecendo normas
gramaticais e transformando o antigo idioma de
lavradores e pastores numa língua pura, rica e bela'" .
A língua latina torna-se, assim, senhora de uma literatura
invejável, espalhando-se por todos os povos conhecidos,
pela sua objetividade e mensagem cívica, humanística,
jurídica, etc. Torna-se língua universal, por isso mesmo
de emprego obrigatório do homem culto; de transmissão
dos conhecimentos da fala dos professores das
universidades e dos trabalhos científicos, como De
revolutionibus orbium coelestium, de Nicolau
Copérnico, para citar um só exemplo.
Deve-se levar em conta que as reqroes
conquistadas "eram habitadas por povos diferentes cada
um com sua língua própria". Enquanto o Império Romano
esteve unido, havia unidade lingüística pelo ensino do
latim nas escolas, pelo serviço militar obrigatório que
mantinha jovens de todo Império em contato direto. Ao
regressar às suas regiões de origem, falavam um latim
não dialetado. Com a queda do Império, fecham-se as
escolas, desfazem-se as relações com Roma, propiciando
a evolução dos dialetos, que se transformam em
romanços, e estes, com o passar do tempo, acabam numa
nova língua.
Romanço, de románice fabulare (falar à maneira
românica ), é a Iase-interrnediária "entre as últimas
manifestações do latim vulgar" (no português, segundo
Bourciez, entre o século séc. V ao século IX) "e as
primeiras manifestações de cada uma das línguas
neolatinas": (português, francês, italiano, espanhol e
outras.)
Desse modo temos:
Latim Clássico Línguas
Neolatina.s '
20
Apesar do pouco decurso de tempo, não se pode
escrever, hoje, como escreveram José de Alencar e
Castro Alves, por exemplo. Se a linguagem, a realidade,
estilo e outros aspectos, como vocabulário, são diferentes
dentro de um espaço de tempo bem 'recente ao ponto de
nos causar estranheza, imaginem-se as diferenças de
colonização realizadas em épocas e regiões tão diversas
e distantes. De fato, as várias conquistas efetuadas pelos
romanos deram-se num espaço aproximado de quatro
séculos e em regiões muito extensas.
Após o século V d.C, outros povos culturalmente
inferiores invadiram a Península, adotando a língua latina,
que já sofria processo de dialetação cada vez maior. E
como é que temos hoje uma porção de línguas neolatinas
com características diferentes, se provêm de uma única,
a latina?
Como sabemos, havia duas modalidades de uma
mesma língua, a latina:
1. uma, denominada de clássica ou sermo urbanus ,
a língua das pessoas cultas: escrita, empregada pelos4 GULART, Audemaro Taranto; SILVA, Oscar Vieira da, Estudo dirigido de gramática
histórica e teoria literária. São Paulo:Editora do Brasil, v.1, [19--]
21
Luisa
Realce
Luisa
Realce
poetas e demais escritores prosadores, dentre os quais
juristas, teatrólogos, que primavam pela escolha do
vocabulário, pelo rigor da correção gramatical e elegância
de estilo. ,__.,.,.__ ,
2. outra, oriunda das múltiplas variaçõês da fala
empregada pelo povo simples, inculto, cuja preocupação
única era a comunicação diária, pouco se interessando,
portanto, com regras e normas da gramática, com a ordem
inversa da frase e com a tendência sintética empregada
pelos usuários da norma culta, o latim clássico. 5
Eram já denunciados desvios de linguagem da
norma culta latina em:
1- inscrições oficiais, inscrições em paredes (cf.,
ruínas de Pompéia); 2- comédias de Plauto; Satiricon,
imputado a Petrônio (séc.11Id.C.); o Asno de Ouro de
Apuleio (séc.1Id. C.); 3-Mulomedicina Chironis, tratado
de veterinária; 4- De architectura, interessante obra do
arquiteto Vitrúvio (séc.IV d.C.); 5- escritos de pessoas
pouco cultas como em Peregrinatio ad loca sancta da
freira espanhola Etéria (séc.IVou V d.C.); 6- Defixionum
tabellae, fórmulas de encantamento ou maldição,
redigidas por elemento de cultura rudimentar. 7- coletânea
de erros gramaticais, colegidos, corrigidos e condenados,
denominados Appendix Probi (Apêndice à gramática de
Probo, séc. 111ou IV d.C).
Esta modalidade de linguagem popular fora levada
às mais diversas regiões conquistadas, tendo por falantes
os legionários romanos, os comerciantes e demais
pessoas simples, encontrando lá povos com tipos e
hábitos lingüísticos próprios, não podendo, por essa
razão, conservar unidade perfeita.
Em quase quatro séculos, as conquistas romanas
tiveram espaço diferenciado, com dificuldades próprias
de assimilação dos hábltos lingüísticos do conquistador.
As tendências de transformações do latim para o
português, por exemplo, "obedeceram a leis constantes
e invariáveis durante certa época, e em certas regiões,
mas variáveis de uma época para outra e de região para
outra"6
A assimilação e aceitação romana se deram também
em vista do tipo de benefícios proporcionados pelo
colonizador. Assim se expressa a equipe de Jânio
Quadros: "Após a conquista, vários fatores influencia-
ram as populações nativas em busca da romanização,
podendo-se destacar entre elas:
1.O grande número de estradas de rodagemque permitia
o constante intercâmbio com a metrópole (Roma).
2. O serviço militar obrigatório a todos os jovens das
províncias conquistadas. Tais jovens ao regressar
aos seus lares, levavam consigo os usos, costumes
e passavam a utilizar a língua empregada, quando
da prestação de tal serviço.
3. O direito de cidadania romana a todos os cidadãos
das províncias romanas ....
4. Todavia o mais importante dos fatores surgiria com
a expansão do cristianismo, pregado pelos padres
através de um latim acessível a todas as camadas
sociais."?
E continua a mesma equipe: "Essa romanização
realizou-se de maneira tão surpreendente e uniforme que
já Estrabão (Século I da EraCristã) relatava: "os
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6 SILVEIRA, Sousa da. Lições de Português. 6.ed. melh. Rio de Janeiro: Livros de
Portugal, 1960, p.21.
? QUADROS, Jânio et aI. Curso prático da língua portuguesa e sua literatura,
v.1.(Gramática histórica). São Paulo: Formar, 1966, p.55.
5 Asim, são conhecidas: a fala empregada pelo povo na comunicação diária (sermo
quotidianus), o linguajar do povo do campo (sermo rusticus), a linguagem dos soldados
(sermo castrensis), etc.
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turdetanos, e mormente os ribeirinhos do Bétis, adotaram
todos os costumes romanos, e até nem se lembram da
própria l~ngua".8
Como sabemos, o português veio do tc;t~!I1através
de três vias: <S","
a) popular, sofrendo as transformações de modo
integral, efetuada nos primórdios da língua,
formando o léxico primitivo, originário do latim
vulgar.
b) semi-erudita ou semi-popular, em que parte se
transforma ou cai e parte se conserva como no latim
clássico. Com outras palavras: na formação semi-
erudita, as palavras sofrem transformações
parciais. Ex.: felicitate > felicidade (só houve
alteração nas 2 consoantes surdas (t) que
passaram a sonoras (d».
c) erudita que tomou palavras vindas diretamente do
latim, sem sofrerem alteração, apenas recebendo
roupagem portuguesa em seu final, para acomodar-
se ao espírito da língua. Entraram no idioma
através dos escritores que as buscaram nas obras
clássicas ou no dicionário. Assim:
luna > lua> lua
lunático
vita > vida
vital
(via popular)
(via erudita)
(via popular)
(via erudita)
8 Idem, ibidem. A citação fiel, retirada de Carolina Michaelis de Vasconcelos é, na
verdade: "os Turdetanos .... , e mormente os ribeirinhos do Betis (Gualdaquivir) havi-
am adaptado de todos os costumes romanos, e até nem já se lembravam da própria
Iíngua"(Lições de filologia portuguesa. Edição da Revista de Portugal, Série A,
1913? ,p.9).
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