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p162 Artigo Protecao em maquinas O dilema continua

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52 JUNHO/2005
PROTEÇÃO EM MÁQUINASPROTEÇÃO EM MÁQUINASARTIGOARTIGO
Prensas mecânicas com acionamento por engate de chaveta são extremamente
perigosas e por isso não podem ser mais fabricadas e nem comercializadas
O dilema continua
ão tenhamos receio ou escrúpu-
lo em chamar as prensas de
chaveta de máquinas mutiladei-
ras. Todas as máquinas são passí-
veis de produzir acidentes. Con-
tudo, as prensas de chaveta apresentam ris-
cos muito, muito maiores, centrados na sua
natureza, na sua estrutura construtiva atra-
sada.
Prensas de chaveta representam uma mo-
dalidade de prensa mecânica, proibida nos
países europeus e em muitos outros países,
há muitos anos. É proibido atualmente, no
estado de São Paulo, fabricar e comerciali-
zar prensa de chaveta, por força da Conven-
ção Coletiva das Indústrias Metalúrgicas,
assinada em 29 de novembro de 2002, vi-
gente a partir de 29 de janeiro de 2003, e
que teve renovação automática, em 29 de
janeiro de 2005. Pode-se afirmar também
que é proibido atualmente, no Brasil, fabri-
car e comercializar prensa de chaveta. Essa
proibição decorre da combinação da Norma
Técnica da ABNT, NBR-13930, com outras
disposições legais que permitem que, por
exemplo, o Ministério Público considere a
ilegalidade da sua fabricação e comerciali-
zação.
Entretanto, oportunamente e para dirimir
qualquer dúvida, o Ministério do Trabalho
e Emprego, por iniciativa do DSST e da
CTPP, preparou uma portaria proibindo
expressamente a fabricação e comercializa-
ção das prensas de chaveta, em qualquer
parte do território brasileiro.
Claramente para o estado de São Paulo, o
uso das prensas de chaveta (isto é, daquelas
que já estavam nas fábricas antes do adven-
to da proibição, dia 29 de janeiro de 2003)
está condicionado ao enclausuramento da
área de prensagem com barreiras mecânicas,
como mostram algumas fotos disponíveis
no site do Inpame (Instituto Nacional de
Prevenção de Acidentes em Máquinas e
Carlos Augusto Lopes
Engenheiro mecânico e de Segurança do
Trabalho
Presidente do Inpame
Marcilio Marchi Testa
Fabricante de máquinas
Diretor de Máquinas do Inpame
Josebel Rubin
Engenheiro mecânico e de Segurança do
Trabalho
Conselheiro e Fundador do Inpame
Os autores são membros do Comitê de
Certificação do Programa Brasileiro de
Certificação de Segurança em Máquinas e
Equipamentos (Selo conferido pelo Inpame)
N
Equipamentos) (www.inpame.org.br).
Mas afinal, o que é uma prensa de chave-
ta? Prensas mecânicas com acionamento
por engate de chaveta (o nome correto e
completo é esse) são extremamente perigo-
sas e produzem graves e freqüentes aciden-
tes, porque é impossível interromper o cur-
so do martelo, após o início do movimento.
Outro fator que agrava muito o risco é a
grande possibilidade de repetição involun-
tária do golpe, fenômeno chamado de repi-
que, que é a repetição da batida do martelo,
independente da vontade do operador e in-
dependente do acionamento da máquina
(seja ele pedal, comando bi-manual ou ou-
tro).
A contrapartida correta é a prensa mecâ-
nica freio-embreagem, que não permite ne-
nhum desses dois fenômenos acima. Tam-
bém são encontradas prensas com outros
sistemas de transmissão de movimentos (hi-
dráulicas ou pneumáticas).
PROIBIÇÃO
A convenção coletiva das indústrias me-
talúrgicas do estado de São Paulo proíbe a
fabricação, mas não estabelece prazo limite
para a proibição do uso. A limitação é que
seu usuário/proprietário não poderá passá-
la adiante (vender, emprestar, trocar, etc) de-
vendo sucatear a máquina, quando seu uso
ficar inviável ou anti-econômico.
54 JUNHO/2005
PROTEÇÃO EM MÁQUINASPROTEÇÃO EM MÁQUINASARTIGOARTIGO
Respondendo indagações muito freqüen-
tes, não existe, pelo menos até agora, nenhu-
ma lei que trate da fabricação ou do uso
específico das prensas de chaveta. Aqui, é
necessário realçar que além da Convenção
Coletiva do Estado de São Paulo, que é obri-
gatória para todos os segmentos signatários,
a simples aplicação da NR-12 já traz a obri-
gação de proteger adequadamente as pren-
sas de chaveta em operação.
A Nota Técnica 37/2004, publicada em
16 de dezembro de 2004 é uma importante
referência, especialmente porque é extensi-
va para todo o território nacional. Também
porque constitui uma base técnica interes-
sante para a criação de anexo à NR-12, que
trate da proteção em prensas e similares; e
finalmente por ser um documento bem ela-
borado que, no seu conjunto, apresenta
muitos avanços, mesmo quando compara-
dos ao PPRPS.
Entretanto, a Nota Técnica, a despeito da
sua oportunidade e das suas qualidades,
contém um grave erro técnico, em sua cláu-
sula sexta, exatamente referente à proteção
em prensas de chaveta. Esse erro que abor-
daremos mais abaixo constitui também, ao
nosso juízo, um retrocesso político, na me-
dida em que a proibição de novas chavetas
e o rigor com a proteção das antigas consti-
tuiu uma conquista especial do tripartismo
e especialmente dos Sindicatos dos Traba-
lhadores.
 
NÚMEROS IMPORTANTES
O número de prensas excêntricas de cha-
veta, no estado de São Paulo, em 1999 era
projetado em 29.000 unidades. Várias pes-
quisas apontaram para esse número, tornan-
do-o confiável. Estimamos uma redução,
projetada para final de 2004, não superior
a 20% (decorrente do sucateamento ou de
retrofiting).
Assim, o número atual de prensas e simi-
lares de chaveta em uso, em São Paulo deve
ser da ordem de 24.000 prensas.
Essas prensas estão adequadamente pro-
tegidas? Se considerarmos somente as pren-
sas e equipamentos similares de chaveta no
estado de São Paulo, estimamos que um
número não superior a 30% apresenta a área
de prensagem adequadamente protegida (a-
tendendo ao mesmo tempo o PPRPS, a NR-
12, a NBR 13.930 e as demais normas técni-
cas aplicáveis).
Importante lembrar que há uma porcenta-
gem expressiva de prensas que apresenta
proteção parcial em sua área de prensagem,
porque estão no curso de um programa de
implantação do PPRPS.
Esses números, tanto de proteção comple-
ta quanto de proteção parcial em curso, são
crescentes, em função dos processos de in-
formação e de educação, da aplicação da
convenção coletiva, da ação do Ministério
Público do Trabalho e dos Auditores Fiscais
do Trabalho.
Essa situação pode comportar uma leitura
positiva e outra menos otimista: a leitura
positiva é aquela que considera que o princi-
pal avanço ocorrido não é medido pelas
máquinas protegidas, mas sim pelo cresci-
mento da informação e pela consciência. É
difícil hoje, identificar uma empresa que
desconheça a necessidade da proteção ade-
quada em prensas e similares, ainda que ha-
ja muita dúvida e dificuldade na identifica-
ção nos recursos utilizados para proteção
adequada em prensas e similares.
A leitura menos otimista tem um funda-
mento justo: considera que o número de
acidentes com mutilação e perda de capa-
cidade de trabalho ainda é muito grande.
Combina com essa consideração o tempo
corrido, desde a implantação da primeira
convenção coletiva de prensas, que vigo-
rou só para o município de São Paulo desde
o início do ano de 1999. Considera também
que, antes disso, houve vários projetos de
proteção ao trabalho em prensas, coorde-
nados por órgão públicos e por sindicatos,
ou desenvolvidos em parcerias entre essas
partes. A conclusão dessa leitura menos oti-
mista é de que já poderíamos ter atingido
um estágio melhor, medido por um número
muito menor de mutilação de mãos e dedos
de cidadãos trabalhadores brasileiros.
NOTA TÉCNICA
Repetindo o caráter positivo e os impor-
tantes avanços trazidos pela Nota Técnica
37/2004, que devem ser valorizados e sau-
dados, relembramos o que chamamos acima
de grave erro técnico (e conseqüente retro-
cesso político): a cláusula sexta estabelece
que (aqui, combinamos o texto do caput
com a letra a dessa mesma cláusula sexta):
Asprensas mecânicas excêntricas de enga-
te por chaveta devem ser ... a-) enclausu-
radas, com proteções fixas, e, havendo ne-
cessidade de troca freqüente de ferramen-
tas (destaque nosso), com proteções mó-
veis dotadas de intertravamento com blo-
queio, por meio de chave de segurança, de
modo a permitir a abertura somente após a
parada total dos movimentos de risco.
Primeiramente, o texto enseja a interpre-
tação ambígua, com a expressão “troca fre-
qüente”. Trata-se, sem dúvida, de uma frase
de conotação não objetiva que não define
um limite claro, permitindo diversas inter-
pretações e contendas.
Mais grave: É impossível, em uma pren-
sa de chaveta, com as características expli-
cadas no início do texto garantir um funcio-
namento como o descrito e a total parada
do martelo, em 100% das atuações, por um
recurso que iria liberar a porta monitorando
o movimento do volante. Este é um tema
para debate mais detalhado, que estaremos
retomando.
A conseqüência mais conhecida do tra-
balho em máquinas, pensando a seguran-
ça e saúde do trabalhador, é o acidente
de trabalho mutilador, responsável, por-
tanto, por dano grave e irreversível e por
decorrente perda da capacidade de traba-
lho.
Essa justa preocupação centrada nos
acidentes mutiladores acaba por relegar
muitos aspectos importantes, causadores
de danos igualmente graves, freqüente-
mente desprezados ou minimizados e que
devem compor um bom programa de pre-
venção de riscos.
Assim, é fundamental pensar o espec-
tro das doenças ocupacionais típicas das
relações de trabalho em máquinas. Mes-
mo para os casos em que são doenças fre-
qüentes em outras atividades produtivas,
é necessário considerar suas peculiari-
dades, por decorrência do trabalho em
máquinas.
O trabalho repetitivo e monótono, a fa-
diga, as condições e os recursos anti-er-
gonômicos, o ruído, ambientes de traba-
lho insalubres, relações com chefias e su-
pervisões, problemas pessoais e vários ou-
tros fatores produzem ou contribuem
para produzir doenças ocupacionais, no
trabalho em máquinas e equipamentos.
Ao contrário dos acidentes mutiladores
Doenças laborais em máquinas?
Acidentes com equipamentos lembram logo a perda
de membros, mas adoecimentos também preocupam
cujo aspecto trágico é de revelação ime-
diata, as doenças do trabalho em máqui-
nas somente manifestam suas conseqüên-
cias mais graves, depois de um longo pe-
ríodo de exposição. Assim, eventuais per-
das auditivas ou manifestações de LER/
DORT, somente serão percebidas, na con-
dição de doenças e, muitas vezes, no está-
gio de dano irreversível e de perda de
capacidade de trabalho, muito depois do
início da exposição.
Conseqüência muito previsível, as do-
enças do trabalho, à medida que seus efei-
tos avançam no corpo (e na mente) do
trabalhador, fazem com que ele fique mais
exposto aos acidentes, inclusive às ocor-
rências com mutilação. Importante lem-
brar que o trabalho em máquinas envol-
ve uma série de esforços repetitivos, ca-
pazes de produzir manifestações de LER/
DORT, e de contribuir com o aparecimen-
to de fadiga e monotonia.
Assim, reiteramos: a preocupação em
proteger adequadamente o trabalhador
deve contemplar uma ação focada na
detecção e no mapeamento dos riscos de
doenças laborais, ao mesmo tempo em que
deve ser capaz de apontar soluções de
curto e de médio prazo, conforme sejam
os riscos e as dificuldades de implanta-
ção.

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