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Universidade de São Paulo Escola de Comunicações e Artes Departamento de Biblioteconomia e Documentação Tatiana Gomes Câmara Indexação de fotografias: análise e representação de imagens São Paulo 2014 Tatiana Gomes Câmara Indexação de fotografias: análise e representação de imagens Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Biblioteconomia e Documentação da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, como parte dos requisitos para obtenção do grau de bacharel em Biblioteconomia. Orientadora: Profa. Dra. Nair Yumiko Kobashi São Paulo 2014 Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte. FICHA CATALOGRÁFICA Câmara, Tatiana Gomes Indexação de fotografias: análise e representação de imagens / Tatiana Gomes Câmara -- São Paulo, 2014. 66 p. : il. Trabalho de Conclusão de Curso – Departamento de Biblioteconomia e Documentação, Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo. Orientadora: Nair Yumiko Kobashi. Bibliografia. 1. Análise documentária 2. Indexação (Biblioteconomia) 3. Fotografia I. Kobashi, Nair Yumiko. II. Título. CDD – 020 FOLHA DE APROVAÇÃO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Biblioteconomia e Documentação da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, como parte dos requisitos para obtenção do grau de bacharel em Biblioteconomia. Aprovado em: __/__/____ Banca examinadora: ____________________________________________ Profa. Dra. Nair Yumiko Kobashi (Orientadora) Escola de Comunicações e Artes - USP ____________________________________________ Prof. Dr. Marivalde Moacir Francelin Escola de Comunicações e Artes - USP ____________________________________________ Profa. Dra. Giovana Deliberali Maiomone Escola de Comunicações e Artes - USP AGRADECIMENTOS Agradeço aos meus pais por todo o esforço, apoio, carinho e paciência na minha criação, educação, formação e na realização de minhas aspirações. Não estaria aqui hoje se não fosse por vocês. Agradeço ao meu noivo, Wesley, por todo o apoio que tem me dado ao longo dos 11 anos de convivência, e em especial em todo o caminho para minha graduação, além de me aguentar e me ajudar nos momentos de desespero e ansiedade. Sem a sua ajuda, eu não teria chegado tão longe. Agradeço à minha orientadora Nair pela orientação e apoio ao longo do curso e na realização de minha monografia. Assim como o professor Marivalde, que nos apoiou em todo o processo de realização da monografia. Agradeço aos meus colegas e amigos de curso, em especial a Amanda e o Rodrigo, pela amizade, companheirismo e brincadeiras que garantiram momentos divertidos e inesquecíveis ao longo desses 5 anos de graduação. RESUMO O presente trabalho é uma sistematização das propostas de indexação de fotografias presentes em livros e teses nacionais, e artigos de periódicos nacionais e internacionais. A análise da bibliografia teve como foco as particularidades da imagem fotográfica e suas implicações na indexação, destacando duas maneiras para a indexação de imagens: indexação baseada em conceitos e indexação baseada em conteúdo. Conclui-se que para realizar a indexação de fotografias, conhecimentos sobre a linguagem fotográfica se fazem necessários, assim como mostra-se frutífero combinar a indexação baseada em conceitos com a indexação baseada em conteúdos, para que a recuperação de informação contida em fotografias atenda melhor aos usuários. Palavras-chave: Análise documentária, Indexação de imagens, Indexação de fotografia. ABSTRACT This monograph is a systematization of the proposals for indexing photographs. The scope is to identify and analyze the proposals for indexing images, present in national books and thesis and also in articles published in national and international journals. The literature review was focused on the peculiarities of the photographic image and its implications on indexing, pointing out two ways for indexing images: concept-based image retrieval and content-based image retrieval. We conclude that in photography indexing is necessary to have some knowledge of photographic language to do the indexing and the importance to combine the concept-based indexing with the content-based indexing for the better retrieval of information contained in photographs to match users query. Keywords: Document analysis, Image indexing, Photography indexing. LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Fotografia superexposta ................................................................................ 16 Figura 2 – Fotografia subexposta ................................................................................... 17 Figura 3 – Fotografia balanceada ................................................................................... 17 Figura 4 – Objetiva-padrão ............................................................................................. 18 Figura 5 – Teleobjetiva ................................................................................................... 18 Figura 6 – Objetiva grande-angular ................................................................................ 19 Figura 7 – Foto fora de foco ........................................................................................... 20 Figura 8 – Foto focada .................................................................................................... 20 Figura 9 – Abertura grande ............................................................................................. 21 Figura 10 – Abertura média ............................................................................................ 22 Figura 11 – Abertura pequena ........................................................................................ 22 Figura 12 – Tempo de exposição baixa, velocidade do obturador alta .......................... 23 Figura 13 – Tempo de exposição alta, velocidade do obturador baixa .......................... 23 Figura 14 – Luz principal ............................................................................................... 24 Figura 15 – Luz de enchimento ...................................................................................... 25 Figura 16 – Luz lateral.................................................................................................... 25 Figura 17 – Luz de fundo ...............................................................................................26 Figura 18 – Contraluz ..................................................................................................... 26 Figura 19 – Grande plano geral ...................................................................................... 27 Figura 20 – Plano geral ................................................................................................... 28 Figura 21 – Plano de união ............................................................................................. 28 Figura 22 – Plano americano .......................................................................................... 29 Figura 23 – Meio plano .................................................................................................. 29 Figura 24 – Grande plano ............................................................................................... 30 Figura 25 – Superclose ................................................................................................... 30 Figura 26 – Plano detalhe ............................................................................................... 31 Figura 27 – Ângulo plongée ........................................................................................... 32 Figura 28 – Ângulo contraplongée ................................................................................. 32 Figura 29 – Em submersão ............................................................................................. 33 Figura 30 – Fotografia aérea ........................................................................................... 33 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Relação dos níveis temáticos e de análise ................................................... 38 Quadro 2 – Categorias de Shatford................................................................................. 43 Quadro 3 – Grade de análise de Smit ............................................................................. 45 Quadro 4 – Recursos técnicos e variáveis da fotografia ................................................. 47 Quadro 5 – Proposta de análise da imagem de Manini (2002) ....................................... 48 Quadro 6 – A imagem: níveis de significação ................................................................ 49 Quadro 7 – Análise das propostas de indexação baseada em conceitos ......................... 55 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 9 1.2 Metodologia ..................................................................................................................... 9 2 A FOTOGRAFIA COMO DOCUMENTO ...................................................................... 12 2.1 A imagem fotográfica ................................................................................................... 12 2.2 A forma da fotografia ................................................................................................... 15 2.3 O conteúdo informacional da fotografia ..................................................................... 34 3 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DA IMAGEM FOTOGRÁFICA ............................. 37 4 INDEXAÇÃO DE FOTOGRAFIAS .................................................................................. 42 4.1 Indexação baseada em conceitos ................................................................................. 42 4.2 Indexação baseada em conteúdo ................................................................................. 51 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 54 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 56 ANEXO A – Levantamento bibliográfico ............................................................................ 60 9 1 INTRODUÇÃO A fotografia se torna cada vez mais presente em nossa sociedade devido à facilidade proporcionada pelas tecnologias da informação para sua geração e disseminação. Por serem consideradas fontes de informação importantes, demandam organização e tratamento adequados para que seja possível sua recuperação e reutilização. Além de ser um meio de expressão cada vez mais consumido, está presente tanto no universo cultural quanto no universo científico. Para intermediar a exploração e acesso às coleções fotográficas, a área de Análise Documentária vem se dedicando ao desenvolvimento de métodos e técnicas para representar e recuperar conteúdos de imagens. Assim, o objetivo geral do presente trabalho foi identificar, analisar e comparar as propostas de indexação de imagens fotográficas publicadas na literatura da área da Ciência da Informação a fim de verificar se contemplam as características específicas da fotografia. Sendo identificadas duas maneiras na literatura para a indexação de imagens: indexação baseada em conceitos e indexação baseada em conteúdo. O objetivo geral desdobra-se nos seguintes objetivos específicos: Identificar as principais características da fotografia que influenciam na indexação; Identificar e analisar as principais dificuldades na análise de imagens; Verificar se as propostas para indexação de fotografias contemplam suas características específicas. O percurso da pesquisa está sistematizado em cinco capítulos. Após o capítulo de introdução, no segundo capítulo a fotografia é apresentada como um documento, com destaque para as suas características, sua forma e seu conteúdo. No terceiro capítulo são explicitadas as dificuldades e maneiras propostas para a análise de imagens, tanto imagens como um todo quanto especificamente da imagem fotográfica. No capítulo quatro verificamos as propostas existentes para a indexação de imagens na Ciência da Informação. Por fim, nas considerações finais são apresentadas as diferenças, as vantagens e as desvantagens das propostas analisadas. 1.2 Metodologia Tendo os objetivos acima em mente, o início da pesquisa se deu através da realização de uma revisão bibliográfica acerca do tema a ser estudado. O levantamento foi realizado na Base de Dados Referencial de Artigos de Periódicos em Ciência da Informação (BRAPCI), no 10 Catálogo Dedalus e na Library and Information Science Abstracts (LISA). Para o levantamento foram utilizadas as seguintes estratégias: busca com os termos ‘indexação’ e ‘imagem’, ‘indexação’ e ‘fotografia’, ‘representação’ e ‘imagem’, ‘representação’ e ‘fotografia’, e por fim apenas ‘fotografia’, na base de dados BRAPCI. Em seguida foi realizada uma nova busca no Catálogo Online Dedalus com os termos do Vocabulário Controlado da USP: ‘indexação (biblioteconomia)’ e ‘imagem’, ‘indexação (biblioteconomia)’ e ‘fotografia’, ‘documentação fotográfica’, ‘linguagem fotográfica’ e apenas ‘fotografia’ no campo assunto. Por fim, busca na base de dados LISA com os termos ‘indexing’ e ‘photography’, ‘indexing’ e ‘images’, restringindo ao período entre 2004 e 2014. Além disso, foi consultada a bibliografia citada nos artigos, livros e teses do levantamento, assim como as sugestões da orientadora. O levantamento bibliográfico na base BRAPCI e no Catálogo Online Dedalus foram realizados em agosto de 2013. Já o levantamento na base LISA foi realizado em julho de 2014. Os itens bibliográficos identificados nessas bases estão apresentados como anexo ao final desta monografia. A análise preliminar da literatura mostrou que a indexaçãode imagens requer conhecimentos sobre o que é chamado de documento fotográfico, sobre o que é importante considerar na análise de fotografias e, finalmente, sobre como indexá-las. Por fim, optou-se por abordar esses três aspectos, tendo sido selecionadas para análise e comparação de propostas de indexação as obras a seguir: CHEN, Hisin-liang; RASMUSSEN, Edie. Intellectual access to images. Library Trends, v. 48, n. 2, p. 291-302, 1999. CORDEIRO, Rosa Inês de Novais. Análise de imagens e filmes: alguns princípios para sua indexação e recuperação. Ponto de Acesso, v. 7, n. 1, 2013. EAKINS, John P. Towards intelligent image retrieval. Pattern Recognition, v. 35, n. 1, p. 3-14, 2002. LIU, Ying et al. A survey of content-based image retrieval with high-level semantics. Pattern Recognition, v. 40, n. 1, p. 262-282, 2007. MANINI, Miriam P. Análise documentária de fotografias: um referencial de leitura de imagens fotográficas para fins documentários. 2002. 226p. Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação) – Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002. MANINI, Miriam P. A fotografia como registro e como documento de arquivo. In: BARTALLO, Linete; MORENO, Nádina Aparecida (Orgs.). Gestão em Arquivologia: abordagens múltiplas. Londrina: Editora da Universidade Estadual de Londrina, 2008. p. 121-183. 11 MANINI, Miriam P. Imagem, memória e informação: um tripé para o documento fotográfico. Domínios da imagem, n. 8, 2011. MOREIRO GONZÁLEZ, José Antonio; ROBLEDANO ARILLO, Jesús. O conteúdo da imagem. Tradução de Leilah Santiago Bufrem. Curitiba: Editora UFPR, 2003. SHATFORD, Sara. Describing a picture: a thousand words are seldom cost effective. Cataloging & Classification Quarterly, v. 4, n. 4, p. 13‑30, 1984. SHATFORD, Sara. Analyzing the subject of a picture: a theoretical approach. Cataloging & Classification Quarterly, v. 6, n. 3, p. 39-62, 1986. SHATFORD LAYNE, Sara. Some issues in the indexing of images. Journal of the American Society for information Science (JASIS), v. 45, n. 8, p. 583-588,1994. SMIT, Johanna W. A análise da imagem: um primeiro plano. In: ______ (Org.). Análise documentária: a análise da síntese. Brasília: IBICT, 1987. p. 100-111. SMIT, Johanna W. A representação da imagem. Informare: Cadernos do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, v. 2, n. 2, p. 28-36, jul./dez., 1996. SMIT, Johanna W. Documentação audiovisual. In: BELLOTTO, H.L.; LIMA, Y.D.; SMIT, J. W. (coord.). Organização de arquivos. São Paulo: ECA/IEB, 2000, p.67-80. SMIT, Johanna W. Análise documentária de documentos fotográficos. In: Fabiano Couto Corrêa da Silva; Rodrigo de Sales. (Org.). Cenários da organização do conhecimento: linguagens documentárias em cena. Brasília: Thesaurus, 2011. p. 265- 286. SMIT, Johanna W. Apostila do curso: a análise da imagem fotográfica, sua indexação e recuperação. São Paulo: Associação de Arquivistas de São Paulo, 2013. A seguir, o primeiro capítulo dando início à revisão de literatura. 12 2 A FOTOGRAFIA COMO DOCUMENTO 2.1 A imagem fotográfica Na sociedade contemporânea, de acordo com Silva (2000), a imagem ocupa um lugar privilegiado, e a visualidade é reconhecida como um dos mais importantes recursos cognitivos. Para a autora, a imagem é uma representação, uma interpretação da realidade. Sua significação é considerada uma questão relacionada ao juízo de valor, à subjetividade, à interpretação. Silva (2000) afirma que a imagem é signo, componente da linguagem, e não apenas um testemunho cego ou uma simples reprodução de uma realidade. A fotografia é definida também como o registro em imagem de um instante num determinado momento e espaço, por meio de uma técnica de criação de imagens através da exposição luminosa de uma cena que se fixa em uma superfície sensível (DUBOIS, 1994; KOSSOY, 2001; RAMALHO, 2004; HEDGECOE, 2005; FRÓES, 2007). A palavra fotografia, de origem grega, significa escrever (grafia = escrita) com a luz (foto = luz), o que, de acordo com Lima (1988), a define como uma escrita. Já no idioma japonês, fotografia é definida pela expressão sha-shin, que significa “reflexo da realidade”, ou seja, é reconhecida como uma forma de expressão visual. Essa dualidade, já no nome, demonstra sua dupla condição de linguagem e forma de expressão visual (LIMA, 1988). A fotografia, de acordo com Fróes (2007), é caracterizada pela incidência da luz em um determinado suporte visando à obtenção de uma imagem. Fróes (2007) destaca os quatro elementos básicos requeridos pela fotografia: “a luz, o referencial (o assunto) que a reflete e/ou emite, o aparato que conduz os raios luminosos e o suporte que registra os efeitos desses” (FRÓES, 2007, p. 109). Já Kossoy (2001) aponta três elementos essenciais para a fotografia: o assunto, o fotógrafo e a tecnologia, sendo estes seus elementos constitutivos. Ambos destacam a importância de um assunto e do aparelho fotográfico. Porém, sem o fotógrafo para manusear o aparelho fotográfico e escolher o assunto não há fotografia. Para Dubois (1994), o momento da tomada caracteriza a gênese automática da fotografia, é o seu modo constitutivo e o que a faz ser como é. Importante ressaltar que a imagem fotográfica é fruto de um processo, no qual o fotógrafo escolhe o aparelho utilizado, o assunto a ser fotografado, as configurações técnicas do aparelho e como se dará a tomada, ou seja, as operações constitutivas do ato de fotografar (enquadramento, foco, etc). Em seguida, ocorre a tomada, o momento em que a luz incide sobre o suporte e registra a imagem escolhida pelo fotógrafo. Realiza-se, em seguida, a revelação e a pós-produção, nas quais as 13 escolhas se repetem (formato, papel, trucagens, retoques, etc). E por fim, faz-se a distribuição em todos os tipos de redes e circuitos. Dubois (1994) ainda traça um percurso histórico das principais posições defendidas pelos críticos e teóricos da fotografia ao longo da história, que vai da verossimilhança ao índice. Em linhas gerais, o autor articula o percurso em três tempos: 1) a fotografia como espelho do real (o discurso da mimese). De início, a fotografia é percebida como uma imitação do real. Esse efeito ligado à imagem fotográfica foi atribuído devido à semelhança existente entre a foto e seu referente. 2) a fotografia como transformação do real (o discurso do código e da desconstrução). Esta concepção surge como uma reação contra a ilusão do espelho fotográfico, no sentido de demonstrar que a fotografia não é uma imitação neutra, mas um instrumento de transposição e até de transformação do real e que sofre modificações culturais, assim como a linguagem. 3) a fotografia como traço de um real (o discurso do índice e da referência). Há algo de singular na fotografia, que a diferencia dos outros modos de representação; ainda subsiste na imagem fotográfica um sentimento de realidade, apesar da consciência de todos os códigos que a envolvem e que se combinam para sua elaboração. Assim, a fotografia remete inevitavelmente ao seu referente. Desta maneira, o assunto da fotografia, destacado por Fróes (2007) e Kossoy (2001) como um dos principais elementos da fotografia, “[...] constitui o referente da imagem, aquilo ao qual ela (a imagem) remete, sem se confundir com este objeto” (SMIT, 2013, p. 4). Barthes (1984 apud BOCCATO; FUJITA, 2006) afirma que o referente da fotografia está sempre com ela. Em suma, o referente adere à imagem, considerando que a fotografia é a representação por projeção. Guran (1999) destaca que, por mais próxima que a fotografia esteja do real,ela não é o real em si, mas sim sua representação. Dubois (1994) também destaca que a fotografia, antes de qualquer consideração, é, em primeiro lugar, da ordem da impressão, da marca, ou seja, possui um traço do real. O autor ainda ressalta que [...] o princípio da ‘gênese automática’, que fundamenta o estatuto da fotografia como impressão, em que seria o ‘real’ que viria por conta própria assinalar-se na placa sensível, esse princípio deve ser claramente delimitado e colocado em seu nível correto, ou seja, como um simples momento (mesmo que central) no conjunto do processo fotográfico (DUBOIS, 1994, p. 85). Isso acontece pois, como afirma Kossoy (2001), a fotografia é um processo, um ciclo que se completa no momento em que o objeto tem sua imagem marcada na bidimensão do 14 material sensível num preciso e definido espaço e tempo. Dentro desse processo podem ocorrer manipulações tanto antes (finalidade, intenção, concepção), quanto durante (elaboração técnica e criativa) ou após (usos e aplicações) (KOSSOY, 2007). Independente de qual seja o assunto representado na fotografia, nela também estará representada a visão de mundo do fotógrafo, por ser um processo de criação do fotógrafo, afirma Kossoy (2001, 2007). Isso faz com que a fotografia seja um testemunho segundo um filtro cultural, sendo sempre construída e plena de códigos. Questão destacada também por Flusser (2002), que afirma que o que se vê ao contemplar as imagens técnicas não é o mundo propriamente dito, mas determinados conceitos relativos ao mundo, sendo que o fotógrafo escolhe, dentre as categorias disponíveis, as que lhe parecem mais convenientes, trabalhando o aparelho fotográfico em função da intenção do fotógrafo. Dubois (1994) ressalta que é fundamental em toda a reflexão sobre um meio de expressão, como a fotografia, colocar a questão da relação específica existente entre o referente externo e a mensagem produzida por esse meio, sendo que “[...] não é possível pensar a fotografia fora de sua inscrição referencial e de eficácia pragmática.” (DUBOIS, 1994, p. 65). A fotografia possui sua própria linguagem, sendo que para Lima (1988), não existe uma linguagem fotográfica universal e a interpretação varia de acordo com as experiências e vivências de cada pessoa. Ainda para o autor, há dois tipos de usuários da linguagem fotográfica: o emissor, que utiliza a fotografia como forma de expressão e comunicação; e o receptor, que utiliza a imagem produzida para ler e interpretar o fato, acontecimento ou a obra que está diante de seus olhos. “O emissor se utiliza de uma linguagem fotográfica para se exprimir e o receptor faz uma leitura e uma interpretação da imagem produzida pela fotografia” (LIMA, 1988, p. 14). Guran (1999) acrescenta que a fotografia “constitui uma técnica de representação da realidade que, pelo seu rigor e particularismo, se expressa através de uma linguagem própria e inconfundível” (GURAN, 1999, p. 15), sendo para o autor uma linguagem eminentemente sensorial e sensitiva. Na representação fotográfica, para Kossoy (2007), existem duas realidades: a primeira realidade é o próprio objeto fotografado, o referente, e a segunda realidade é a própria imagem fotográfica, resultado do registro da primeira realidade. A segunda realidade é sujeita a diferentes interpretações, conforme a visão dos receptores. Caráter também destacado por Schaeffer (1996) quando afirma que “[...] a imagem fotográfica, longe de ser um estatuto estável, é fundamentalmente variável e múltipla” (SCHAEFFER, 1996, p. 10), sendo considerada pelo autor como essencialmente um signo de recepção. Assim, a fotografia por si 15 só apenas mostra algo, mas não significa algo, pois a atribuição de um significado depende sempre da interpretação de um receptor. Lima (1988) destaca que para a comunicação através da fotografia deve-se saber ‘ler’ uma imagem, conhecer os elementos que compõem a imagem e pertencer ou reconhecer o meio sócio-cultural em que a imagem foi produzida. Para isso, é importante conhecer o contexto histórico que envolve aquela imagem fotográfica, pois é através desses conhecimentos prévios que se interpreta o fato registrado na fotografia. Ainda, é importante conhecer a escrita icônica, cujos elementos interferem na leitura de uma imagem. De acordo com o autor, “os signos icônicos funcionam em dois níveis: o descritivo e o sugestivo. O descritivo seria a leitura e o sugestivo a interpretação” (LIMA, 1988, p. 23). 2.2 A forma da fotografia A forma da fotografia é a maneira que a imagem está representada, o ‘como’ o objeto está representado na imagem. Essa forma fotográfica é caracterizada de acordo com as técnicas utilizadas pelo fotógrafo antes, durante e após a tomada. Os códigos fotográficos, de acordo com Moreiro González e Robledano Arillo (2003), são os mecanismos técnicos utilizados pelo fotógrafo e que através desses códigos é possível obter “dados sobre o formato da imagem, sua disposição, a ótica utilizada, o tipo de objetiva, filtros e revelações, velocidade de obturação, tipo de luz, cores utilizadas, ângulo de tomada, etc.” (MOREIRO GONZÁLEZ; ROBLEDANO ARILLO, 2003, p. 26). Os autores salientam ainda que algumas características técnicas marcam expressivamente o conteúdo da imagem, sendo que cada vez mais relaciona-se “[...] a utilização de códigos espaciais fotográficos com a produção de significados conotados” (MOREIRO GONZÁLEZ; ROBLEDANO ARILLO, 2003, p. 40). Kossoy (2007) também ressalta a interferência dos recursos plásticos, que são os elementos de expressão empregados, com o objetivo de introduzir diferentes efeitos estéticos na fotografia, provocando nos receptores um determinado impacto ou impressão que ultrapassa o conteúdo, podendo dramatizar a mensagem e reforçar ou criar estereótipos contribuindo para a construção de uma outra realidade. Enquadramento, plano da objetiva, foco (profundidade de campo), cor, tonalidade, contraste, brilho, posição do objeto, regras dos terços para enquadramento, linhas, perspectivas, tipo e intensidade da luz, horizontalidade ou verticalidade, uso de objetivas adequadas, etc. são elementos que, de acordo com Rodrigues (2007), constituem a 16 composição da imagem fotográfica e conferem sentidos e significados para a fotografia. Joly (2009) também destaca que todas as escolhas e manipulações são a prova de que fotografia é construída, assim como sua significação. Ou seja, seu sentido, é construído de maneira convencional e cultural. A composição fotográfica tem como finalidade dispor dos elementos plásticos percebidos através do visor para conferir significado a uma cena. É resultado da harmonização de diversos fatores de ordem técnica e de conteúdo, constituindo, na essência, o pleno exercício da linguagem fotográfica (GURAN, 1999, p. 25). A luz é um fator importante para a fotografia, e a quantidade necessária para registrar a imagem é chamada de exposição; a câmera regula por quanto tempo a imagem fica exposta à luz, a quantidade de luz que atinge o sensor digital ou o filme, através da abertura e velocidade do obturador (HEDGECOE, 2005). Fotos com grande quantidade de luz são chamadas de superexpostas, com pouca quantidade de luz, de subexposta, e com a quantidade ideal de luz, de balanceada (REGINA, 2013). Figura 1 – Fotografia superexposta Fonte: REGINA, 2013. 17 Figura 2 – Fotografia subexposta Fonte: REGINA, 2013. Figura 3 – Fotografia balanceada Fonte: REGINA, 2013. As objetivas captam e conduzem a luz para o plano em que está o filme ou o sensor digital(RAMALHO, 2004). Seu principal objetivo é controlar a parte da imagem que aparecerá perfeitamente nítida, mas também influenciam a perspectiva e os tamanhos relativos dos objetos, de acordo com a distância focal, tendo efeito também na profundidade de campo. De acordo com seu ângulo de visão, as objetivas se dividem em três principais categorias. As objetivas-padrão produzem imagens semelhantes às que o olho humano vê, enquanto as teleobjetivas têm um ângulo de visão fechado e uma distância focal longa; já as grande-angulares tem um ângulo de visão mais aberto (HEDGECOE, 2005). As objetivas- padrão dão à fotografia uma intimidade de simples observação natural. Já as teleobjetivas têm 18 como função possibilitar fotografar à distância. Ela tende a aproximar os planos uns dos outros, achatando-os, mas destacando com clareza o plano que estiver focado e diluindo os demais planos (foco seletivo). Por fim, as objetivas grande-angulares aproximam o primeiro plano, aumentando-o, além de afastar os planos seguintes (GURAN, 1999). Figura 4 – Objetiva-padrão Fonte: TecMundo 1 Figura 5 – Teleobjetiva Fonte: TecMundo 2 1 Disponível em: <http://www.tecmundo.com.br/camera-digital/2299-objetivas-para-fotografia-digital.htm>. 2 Disponível em: <http://www.tecmundo.com.br/camera-digital/2299-objetivas-para-fotografia-digital.htm>. 19 Figura 6 – Objetiva grande-angular Fonte: Dicas de fotografia 3 O foco, por sua vez, define a nitidez e a visibilidade de uma imagem fotográfica, sendo que a objetiva pode focalizar com precisão somente a uma distância de cada vez. Na prática, porém, há uma quantidade de distâncias em torno do plano de foco em que a imagem aparece razoavelmente nítida (HEDGECOE, 2005). A nitidez definida pelo foco pode estar presente em toda a imagem, quando todos os planos estão em foco, ou abranger apenas um ou alguns planos, destacando-os dos demais. O foco seletivo serve para destacar o essencial da imagem (GURAN, 1999). 3 Disponível em: <http://www.dicasdefotografia.com.br/como-escolher-sua-lente>. 20 Figura 7 – Foto fora de foco Fonte: REGINA, 2013. Figura 8 – Foto focada Fonte: REGINA, 2013 Profundidade de campo é a zona à frente e atrás do assunto da fotografia que oferecem nitidez à imagem, ou seja, é o espaço nítido que circunda o objeto focado na imagem (RAMALHO, 2004). A profundidade de campo não é constante, varia de acordo com os valores da abertura do diafragma, a distância focalizada e a distância focal real da objetiva (HEDGECOE, 2005). A quantidade de luz que chega ao sensor ou filme é regulada pelo diafragma da lente (o buraco através do qual passa a luz) e da velocidade de obturação (o tempo durante o qual 21 esse buraco fica aberto, também chamado de tempo de abertura do obturador). Ambos, junto com o foco, constituem-se em instrumentos importantes da linguagem fotográfica, já que através deles é possível definir o conteúdo da mensagem (GURAN, 1999). Quanto maior a abertura do diafragma, mais luz entra; quanto menor a abertura, menos luz entra (REGINA, 2013). O tamanho da abertura afeta diretamente a zona de nitidez da fotografia ou sua profundidade de campo (RAMALHO, 2004). Aberturas grandes são essenciais em situações de baixas luzes e desfocam o plano de fundo. Aberturas médias tendem a produzir fotos com alta resolução. Aberturas pequenas são essenciais em situações de muita luminosidade e colocam a fotografia no todo em foco, aumentando a profundidade de campo (HEDGECOE, 2005). Figura 9 – Abertura grande Fonte: RADFAHRER, 2014. 22 Figura 10 – Abertura média Fonte: RADFAHRER, 2014. Figura 11 – Abertura pequena Fonte: RADFAHRER, 2014. O tempo de exposição e o tempo de abertura do obturador determinam a quantidade de luz que chega ao sensor digital ou ao filme. Quanto maior o tempo de exposição, mais luz entrará; quanto menor o tempo de exposição, menos luz entrará. Além de definir a quantidade de luz que entrará, o tempo de exposição também cria efeitos; por exemplo, tempo de 23 exposição baixo – com alta velocidade – congela o movimento, enquanto tempo de exposição longo somado à baixa velocidade pode dar a sensação de movimento (REGINA, 2013). Figura 12 – Tempo de exposição baixa, velocidade do obturador alta Fonte: RADFAHRER, 2014. Figura 13 – Tempo de exposição alta, velocidade do obturador baixa Fonte: RADFAHRER, 2014. 24 A iluminação de uma fotografia está ligada à composição, sendo que iluminação se refere à maneira como o assunto fotografado recebe a luz. A intensidade, o tipo e a direção da luz são fatores determinantes do resultado final da fotografia, sendo que a luz é o que dá o clima (atmosfera) da foto. Se a luz vem de cima, achata e tira a impressão de volume; se a luz vem de baixo, causa uma sensação estranha por se tratar de uma iluminação diferente da que estamos acostumados. Na iluminação contraluz, a luz fica atrás do assunto criando um contorno, favorecendo a sutileza e o mistério. A luz lateral dá volume e ressalta formas, destacando o relevo das massas e a textura das superfícies. Com a fonte principal de luz atrás do fotógrafo, a imagem ficará francamente iluminada e com uma leitura visual mais fácil e direta (RAMALHO, 2004; GURAN, 1999). A luz principal ilumina e destaca o assunto, além de criar dramaticidade; a luz de enchimento é usada para suavizar sombras e atribuir texturas ao assunto, enquanto uma luz de fundo ilumina o fundo com outra luz e separa o primeiro do segundo plano (RADFAHRER, 2014; RAMALHO, 2004). Em relação ao tipo, ela pode ser direta (dura) ou difusa. A luz direta marca mais fortemente as linhas e as massas, aumenta a impressão de volume da imagem e gera mais sombras. Já a luz difusa é mais suave, mesmo quando é muito intensa, e ilumina de maneira mais uniforme, criando sombras menos profundas (GURAN, 1999). Figura 14 – Luz principal Fonte: estmsk.t 4 4 Disponível em: <http://estmsk.tumblr.com/post/23283251409/kiss-me-on-the-lips>. 25 Figura 15 – Luz de enchimento Fonte: RADFAHRER, 2014. Figura 16 – Luz lateral Fonte: RADFAHRER, 2014. 26 Figura 17 – Luz de fundo Fonte: Flickr 5 Figura 18 – Contraluz Fonte: RADFAHRER, 2014 O ângulo de visão e o eixo de tomada da fotografia também influenciam o resultado final, assim como o enquadramento, que é a organização de todos os elementos geométricos que formam a realidade plástica, e o recorte resultante do ponto de observação do 5 Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/126708426@N03/15266583449>. 27 fotógrafo (GURAN, 1999). Para Moreiro González e Robledano Arillo (2003), o enquadramento também demonstra a situação do objeto no espaço, marcando a amplitude do espaço das figuras que estão representadas na imagem e determinam os tipos de plano, que podem ser: grande plano geral: apresenta grandes cenários; plano geral: o personagem deve apresentar três quartos ou mais da altura da moldura, mas sempre deve haver algum espaço; plano de união: mostra o corpo inteiro sem nenhum espaço; planoamericano (ou três quartos): o marco inferior situa-se na altura dos joelhos do personagem; meio plano: marco inferior do quadro que pode cortar desde a cintura até o peito; grande plano: mostra ombros e cabeça; plano detalhe (close): mostra apenas um detalhe do personagem. A nomenclatura pode mudar. Radfahrer (2014), por exemplo, utiliza plano médio em vez de meio plano, primeiro plano ou close-up ao invés de grande plano e acrescenta o superclose, que mostra a cabeça da pessoa dominando praticamente toda a tela. Figura 19 – Grande plano geral Fonte: RADFAHRER, 2014. 28 Figura 20 – Plano geral Fonte: RADFAHRER, 2014. Figura 21 – Plano de união Fonte: Academichic 6 6 Disponível em: <http://www.academichic.com/2010/11/01/1-november-2010-such-great-lengths/>. 29 Figura 22 – Plano americano Fonte: Chictopia 7 Figura 23 – Meio plano Fonte: Weheartit 8 7 Disponível em: <http://www.chictopia.com/photo/show/788954-street+and+everyday+love-zara-blazer>. 8 Disponível em: <http://weheartit.com/entry/31889890>. 30 Figura 24 – Grande plano Fonte: ShortHairstyles 9 Figura 25 – Superclose Fonte: BrideSparkle 10 9 Disponível em: <http://www.shorthairstylesnew.net/short-hair-2014/>. 10 Disponível em: <http://bridesparkle.com/blog/steps-on-how-to-achieve-a-smokey-eye-wedding-makeup- look/>. 31 Figura 26 – Plano detalhe Fonte: Hair-sublime 11 Moreiro González e Robledano Arillo (2003) ainda explicitam o ângulo da visão e o eixo de tomada da foto como sendo: ângulo médio; ângulo plongée (ou picado); ângulo contraplongée (ou contrapicado); em submersão; fotografia aérea (vertical ou oblíqua); fotografia espacial. 11 Disponível em: <http://hair-sublime.com/2013/06/06/ideas-for-prom-makeup-makeup-geek/>. 32 Figura 27 – Ângulo plongée Fonte: Flickr 12 Figura 28 – Ângulo contraplongée Fonte: Livres pensadores 13 12 Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/48348541@N05/5147206223/>. 13 Disponível em: <http://livrepensamente.blogspot.com.br/2011/08/como-tirar-uma-boa-fotografia-parte- 01.html>. 33 Figura 29 – Em submersão Créditos: Leonardo Aversa. Fonte: Blog Roger Lerina 14 Figura 30 – Fotografia aérea Fonte: HBB Hostel Brasil 15 Por fim, Moreiro González e Robledano Arillo (2003) evidenciam as possibilidades da posição do objeto no espaço, podendo ser em vista frontal, vista de costas, 14 Disponível em: <http://wp.clicrbs.com.br/blogerlerina/2013/06/06/ana-carolina-ate-debaixo- dagua/?topo=13,1,1,,,13>. 15 Disponível em: <http://hbbhostel.com.br/destaque-home/sao-paulo/>. 34 vista de perfil e vista de três quartos (tanto dianteiro quanto traseiro). Arrematando, Smit (2013) ainda cita a vista geral e vista parcial. Todos esses códigos técnicos influenciam o resultado final da fotografia, e consequentemente influenciam a maneira como o objeto está representado e o seu significado. 2.3 O conteúdo informacional da fotografia A fotografia, pela multiplicidade de funções sígnicas da própria da imagem, possui grande importância na transmissão da cultura e da história; são, ainda, documentos que constituem fontes primordiais de diferentes vertentes de investigação (KOSSOY, 2007). Por ser polissêmica, possibilita diferentes usos “[...] que podem ir da mera ilustração de textos, passar pela importância como fonte de informação para diversas áreas do conhecimento” (SILVA, 2000, p. 169). A fotografia, de acordo com Lima (1988), possui sua própria linguagem, que se caracteriza pelo “[...] uso de todos os recursos visuais de que dispõe a fotografia como forma de expressão, como técnica e como documento” (LIMA, 1988, p. 24). No conteúdo da fotografia, uma única imagem reúne diversos elementos icônicos que fornecem informações. Esses elementos encontram-se formal e culturalmente codificados, sendo que tais codificações são inerentes à representação fotográfica, à sua estética particular (KOSSOY, 2007). Por registrar um momento, a fotografia é uma importante fonte de informação e de memória. Lissovsky (1983 apud LIMA, 1988) afirma que A explicação espacial da cultura, da política, das relações sociais pode ser percebida [pela imagem]. E isso é uma coisa que a fotografia capta mais e melhor do que qualquer outra fonte de informação. Dessa forma as informações que podem sair de uma fotografia são ilimitadas. (LISSOVSKY, 1983 apud LIMA, 1988, p. 17-18) Shatford (1984) também destaca a importância da fotografia como fonte de informação, afirmando que as imagens possuem seu valor a sua própria maneira, e às vezes podem ser vistas como a melhor, ou mesmo como a única fonte de certos tipos de informação. Para Manini (2002, p. 35), “[...] documento é a concretização de toda informação registrada [...] passível de transmitir conhecimento; é o testemunho da realização da atividade humana”. Dentro desse contexto, para Boccato e Fujita (2006), a fotografia é um documento e possui um valor representativo, ou seja, transmite uma informação registrada em um suporte (seja físico ou digital). 35 Kossoy (2001) destaca a importância do conhecimento histórico através da fotografia afirmando que elas podem fornecer informações visuais para a melhor compreensão do passado em seus múltiplos aspectos; o autor afirma que uma única imagem contém em si diversas informações sobre um determinado momento passado, sintetizando no documento um fragmento do real visível. Kossoy (2007) infere ainda que em qualquer imagem existem informações sobre o tema principal (o assunto) e de seu entorno, tratando-se de informações explícitas e implícitas. Joly (2009) também aponta que as imagens – referindo-se a imagens no geral – são instrumentos de conhecimento por fornecerem informações sobre os objetos, os lugares ou as pessoas, servindo também para ver o próprio mundo e interpretá-lo. A fotografia sendo utilizada como fonte de informação é uma possibilidade de investigação e descoberta que promete dar frutos na medida em que se tenta sistematizar as informações nela contida. Assim, as fotografias representarão sempre um meio de informação e conhecimento, contendo sempre seu valor documental, iconográfico. Por fornecerem informações iconográficas sobre o dado real, são importantes para a pesquisa e interpretação nas ciências humanas, exatas e biológicas. Deve-se sempre lembrar que as informações contidas na imagem fotográfica não podem ser levadas a efeito apenas como fenômeno ‘ilustrativo’ isolado do contexto sócio-político e cultural (KOSSOY, 2001, 2007). Torna-se importante também ressaltar que, de acordo com Kossoy (2007), o acesso ao dado real, através da imagem fotográfica, é um acesso à segunda realidade, à realidade do documento, da representação elaborada, o qual preserva as formas recortadas no espaço e paralisadas no tempo. As fotografias carregam em si informações sobre determinados fatos e sobre a mentalidade de uma época, complementando as informações transmitidas pelas fontes escritas, alémde enriquecerem o conhecimento com novos dados que não foram mencionados pela historiografia tradicional. A partir das fotografias é possível ter um conhecimento mais preciso e amplo de outras realidades que antes eram transmitidas unicamente pela tradição escrita, verbal e pictórica (KOSSOY, 2001, 2007). A fotografia possui uma informação extraquadro que pode ser desdobrada em dois conjuntos informacionais. São informações sobre o contexto de produção da imagem e à informação lateral, termo cunhado por Schaeffer. A informação lateral é aquela informação que rodeia a imagem sem estar dentro dela, mas que fornece a informação necessária para entender seu significado. Ou seja, para entender o que uma imagem mostra é preciso ter acesso a outras informações externas a esta, podendo tais informações estarem veiculadas na 36 legenda, por um texto que acompanha a imagem, por anotações na própria fotografia ou pelo conhecimento prévio da pessoa que analisa a imagem (SMIT, 2013). Costa (2005) destaca quatro níveis de informações que podem ser percebidas através da imagem fotográfica: informações técnicas: informações que permitem distinguir uma foto colorida de outra em branco e preto. Quanto mais se conhece a respeito do processo fotográfico, mais dados técnicos podem ser obtidos; informações visuais: dizem respeito à configuração da imagem, ou seja, como ela foi concebida e os critérios estéticos utilizados. Nesse conjunto de dados está a identificação do fotógrafo e a maneira como ele organizou os elementos plásticos da imagem; informações textuais: obtidas do assunto tratado e da forma como é tratado; informações contextuais: informações que dizem respeito ao que se sabe sobre as razões e intenções do fotógrafo ao criar a fotografia. A cultura imagética da sociedade é tão carregada, que sozinha promove um movimento de leitura e de interpretação dos seus conteúdos, de acordo com Costa (2005). Assim, a autora destaca destaca que o ser humano possui a competência para a leitura de imagens, sendo essa competência responsável por transformar as imagens em unidades coerentes e com sentido. Para tanto, nesse processo são utilizados o olhar, a capacidade de comparação e de fazer analogias além de desenvolver a memória visual. 37 3 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DA IMAGEM FOTOGRÁFICA As imagens cumprem uma determinada função e possuem um determinado conteúdo de acordo com Panofsky (1976). Esse conteúdo deve estar inserido em um contexto de produção e de recepção, tornando-se necessário que a imagem seja sempre contextualizada. Para a correta análise e descrição de obras de arte, o autor propõe três níveis de análise e descrição de obras de arte renascentistas, mas que devido a amplitude de sua teoria, podem ser aplicados em qualquer tipo de material iconográfico. Segundo Panofsky (1976, p. 50-53), há três níveis de temas possíveis de serem apreendidos através da imagem: I. Tema primário ou natural, que é subdividido em fatual e expressional. É apreendido pela identificação das formas puras da imagem. II. Tema secundário ou convencional. É apreendido pela percepção, quando ligamos os motivos artísticos e as combinações de motivos artísticos (composições) com assuntos e conceitos manifestados em imagens. III. Significado intrínseco ou conteúdo. É apreendido pela determinação dos valores ‘simbólicos’, que são os elementos da imagem como manifestações de princípios básicos e gerais. Iconografia é definida por Panofsky (1976) como a descrição e a classificação das imagens, coletando e classificando as características da imagem, fornecendo então as bases necessárias para interpretações subsequentes. Por outro lado, define a iconologia como um método de interpretação que advém da síntese, como uma iconografia que se torna interpretativa, salientando que a análise adequada das imagens é a condição essencial para a interpretação iconológica precisa. De tal forma, são propostos os seguintes níveis de análise da imagem: 1. Nível pré-iconográfico: descrição do que há na obra, suas formas, seus motivos, seus objetos e as ações representados na imagem. 2. Nível iconográfico: identificação das personagens da obra, dos temas, do assunto da imagem. 3. Nível iconológico: interpretação dos significados, dos símbolos e do conteúdo presentes na imagem, ou seja, seu significado intrínseco. No quadro a seguir, Panofsky relaciona os níveis temáticos (objeto da interpretação) com os níveis de análise (ato da interpretação): 38 Quadro 1 – Relação dos níveis temáticos e de análise. Fonte: PANOFSKY, 1976, p. 64. Panofsky (1976) ainda destaca a inter-relação que os três níveis de análise possuem, tendo cada um dos níveis suma importância para a interpretação do próximo nível. Sendo assim, para que seja possível a interpretação no nível iconológico, é necessária a identificação e análise realizada no nível iconográfico, que também necessita da descrição realizada no nível pré-iconográfico. De tal modo, a teoria de Panofsky (1976) fornece as bases necessárias para interpretações das imagens, através da coleta, da análise e da classificação de seu conteúdo. A imagem é, por definição, polissêmica, sendo capaz de gerar diversas interpretações e transmitir um grande número de informações (SMIT, 1987; JOLY, 2009). Schaeffer (1996) destaca que a imagem fotográfica é o acionamento de um código icônico e que apenas o conhecimento desse código torna possível a sua recepção. A imagem fotográfica é colocada como índice por Dubois (1994) por ser uma representação por contiguidade física do signo com seu referente, e destaca que “[...] a imagem indiciária é dotada de um valor todo singular ou particular, pois é determinado unicamente por seu referente e só por este: traço de um real” (DUBOIS, 1994, p. 45). Assim, o autor reafirma a imagem fotográfica como signo indiciário de Peirce por ser afetado por seu objeto e por manter com ele uma relação de conexão física, diferenciando-se dos ícones e dos símbolos. Por fim, o autor conclui que dentro da lógica do índice é possível distinguir sentido e existência na fotografia, sendo que a foto-índice afirma a existência do que ela representa, 39 mas nada diz sobre o sentido dessa representação. Característica também destacada por Schaeffer (1996) quando afirma que Deve-se distinguir entre a recepção da imagem como índice, portanto, como signo referencial, e a realização da identificação referencial. Toda imagem fotográfica é recebida como imagem indicial: quanto a saber se conseguirei ‘descobrir’ de que exatamente ela é o índice, é uma questão que já não se refere à lógica semiótica, mas unicamente à minha capacidade de fazê-la funcionar de maneira mais ou menos satisfatória. (SCHAEFFER, 1996, p. 44- 45) Joly (2009) destaca que a imagem é um instrumento de comunicação que se assemelha ou se confunde com o que representa. Assim, coloca a imagem na categoria das representações. E se a imagem é percebida como representação, isso quer dizer que a imagem é percebida como signo. A autora destaca ainda que a particularidade essencial do signo é estar presente para designar ou significar algo que está ausente. Para a autora A teoria semiótica permite-nos captar não apenas a complexidade, mas também a força da comunicação pela imagem, apontando-nos essa circulação da imagem entre semelhança, traço e convenção, isto é, entre ícone, índice e símbolo. (JOLY, 2009, p. 40) De acordo com a teoria semiótica de Peirce, Joly destaca que o signo pode ser um ato de comunicação quando destinado intencionalmentea um indivíduo que fornece informações, quando se sabe como decifrá-lo. Ainda de acordo com Peirce (1978 apud JOLY, 2009), os signos possuem uma estrutura comum, mesmo sendo múltiplos e variados, o que implica numa dinâmica tripolar que vincula o significante ao referente e ao significado. Peirce (1978 apud JOLY, 2009) distingue três tipos principais de signos de acordo com tipo de relação que existe entre o significante e o referente, sendo: Ícone: classe de signos cujo significante mantém uma relação de analogia com o que representa. Índice: classe de signos que mantêm uma relação causal de contiguidade física com o que representam. Símbolo: classe de signos que mantêm uma relação de convenção com seu referente. Diferentemente de Dubois (1994), Joly (2009) afirma que a imagem reúne as características dos ícones que mantêm uma relação de analogia qualitativa entre o significante e o referente; elas retomam as qualidades formais do seu referente que permitem reconhecê- los. Reconhecer uma imagem é diferente de interpretá-la de acordo com Joly (2009);a autora afirma que reconhecer o motivo da imagem não significa que esteja compreendendo a 40 mensagem na qual o motivo pode ter uma significação bem particular. Portanto, reconhecer motivos nas mensagens visuais e interpretá-los se caracteriza como duas operações mentais complementares. Mas vale lembrar que, ainda de acordo com a autora, o próprio reconhecimento do motivo exige um certo aprendizado. Schaeffer (1996, p. 46) afirma também que “[...] interpretar corretamente um signo fotográfico não é procurar seu significado, é primordialmente reconhecer o objeto ou o estado de fato que ele apresenta”. Para Joly (2009) interpretar e analisar uma mensagem não significa tentar encontrar uma mensagem preexistente, mas sim em compreender o que essa mensagem provoca de significações aqui e agora, além de se tentar separar o que é pessoal do que é coletivo. Para a autora, o analista deve se colocar deliberadamente do lado da recepção, mas sem ignorar o histórico dessa mensagem (tanto de seu surgimento quanto de sua recepção). Não existe um método absoluto para análise de imagens, mas opções a serem feitas ou inventadas em função de objetivos afirma Joly (2009). Assim, para a realização da análise de imagens é importante que se defina o objetivo da análise para que então possa se determinar as ferramentas que serão utilizadas, e que determinarão o objeto de análise e suas conclusões. Sem essa definição, a análise não se justifica. Na análise de imagens, é importante destacar que a imagem é de fato uma linguagem, uma linguagem específica e heterogênea que possui signos particulares, e que através desses signos propõe uma representação escolhida e orientada. É preciso compreender seu funcionamento, “[...] distinguir as principais ferramentas dessa linguagem e o que sua ausência ou sua presença significam” (JOLY, 2009, p. 48), relativizando sua própria interpretação. Joly (2009) destaca a importância do estudo da função comunicativa e do contexto de surgimento da imagem para sua análise. A função comunicativa da mensagem é determinante para a compreensão de seu conteúdo, e torna-se de suma importância a capacidade distinguir a função explícita da função implícita da imagem. Já seu contexto de surgimento se estende aos diversos movimentos da obra, desde o momento de sua produção até o momento de sua recepção. A autora conclui, então, que Considerando a imagem como uma mensagem visual compreendida entre expressão e comunicação, a conduta analítica deve, de fato, levar em conta a função dessa mensagem, seu horizonte de expectativa e seus diversos tipos de contexto. Desse modo, terá definido o contexto no qual relativizar suas ferramentas intrínsecas e irá se apegar a distingui-las entre si. Como a imagem, a análise assumirá seu lugar entre expressão e comunicação (JOLY, 2009, p. 68). 41 A leitura da fotografia é bidimensional e prospectiva e se dá de acordo com os componentes existentes dentro da imagem afirma Lima (1988). O autor afirma ainda que a leitura de uma foto se decompõe em três fases: a percepção, a identificação e a interpretação. Sendo que a percepção é ótica, no qual os olhos percebem as formas e as tonalidades sem as identificar; já a identificação é uma ação às vezes ótica, às vezes mental, na qual o leitor identifica os componentes da imagem e registra mentalmente o seu conteúdo; por fim, a interpretação se dá de maneira puramente mental, sendo nessa fase que se manifesta o caráter polissêmico da fotografia, pois cada um interpreta a imagem à sua maneira, de acordo com a sua idade, o seu sexo, a sua profissão e a sua ideologia. Kossoy (2001) também destaca a possibilidade de diferentes interpretações de uma imagem varia em função do repertório cultural, da situação socioeconômica, dos preconceitos e da ideologia do receptor. Ao se observar uma fotografia, Kossoy (2001) destaca que é importante lembrar que a compreensão do real será influenciada por uma ou várias interpretações anteriores, conforme a interpretação primeira do fotógrafo, que optou por um aspecto determinado. Além disso, diversas manipulações e interpretações ocorrem ao longo da vida de uma fotografia. O autor explica que a fotografia reúne informações implícitas e explícitas sobre sua própria gênese e história enquanto documento e sobre um fragmento da realidade passada. Assim, para sua análise, o autor destaca que é preciso que haja a reconstituição do processo que gerou a fotografia, determinando seus elementos constitutivos e suas coordenadas de situação, e a determinação dos elementos icônicos que compõem o registro visual, o conteúdo da representação. A análise tem o objetivo de reunir o maior número de dados seguros para a determinação do assunto, do fotógrafo e da tecnologia utilizada para dar origem a uma fotografia num determinado espaço e tempo. Tal levantamento se dá através da análise técnica (análise do conjunto de informações de ordem técnica que caracterizam a configuração material do documento) e da análise iconográfica (análise do conjunto de informações visuais que compõem o conteúdo do documento). Assim, essas fontes fotográficas, submetidas a um exame técnico-iconográfico e interpretativo, proporcionam a recuperação das informações. 42 4 INDEXAÇÃO DE FOTOGRAFIAS O objeto imagético é, ao mesmo tempo, registro documental e obra de criação artística, de acordo com Silva (2000), sendo importante que o objeto seja considerado em toda sua extensão, ou seja, como objeto, como obra de criação artística e na sua expressão. Para tanto, um processo importante para a organização da informação é a indexação, que é a operação de representação documentária com a finalidade de recuperação da informação. Silva (2000) ainda destaca que “o processo de indexação produz referências aos documentos que intenta representar” (SILVA, 2000, p. 158). O documento fotográfico pode compor o acervo de um arquivo, de uma biblioteca, de um museu, de um centro de memória, de documentação ou de informação. Portanto, é importante que seja devidamente tratado e organizado para potencializar seu uso (SMIT, 2011). Chen e Rasmussen (1999) destacam duas maneiras para a realização da indexação de imagens: indexação baseada em conteúdo e indexação baseada em conceitos. Na indexação baseada em conteúdo, é feita uma análise automática da imagem extraindo suas características intrínsecas, como cor, textura e forma. Já na indexação baseada em conceitos, uma análise do assunto da imagem é feita por um ser humano que lhe atribuí descritores textuais que podemvariar do descritivo até o abstrato. 4.1 Indexação baseada em conceitos Na indexação baseada em conceitos é realizada uma análise do assunto da imagem para então atribuir-lhe descritores textuais, que podem utilizar vocabulários controlados, linguagem natural ou as próprias legendas das imagens (CHEN; RASMUSSEN, 1999). A preocupação de indexadores, de acordo com Shatford (1986), é com o significado do material iconográfico, sendo necessário tentar determinar o significado passado contido na imagem, e o relacionamento entre esse significado e as palavras usadas em sua descrição. Sempre lembrando que uma mesma imagem pode conter vários tipos de informações e atender a diferentes necessidades informacionais. Shatford (1986) utiliza a teoria de iconografia e iconologia de Panofsky, em especial os níveis de análise. Como visto no capítulo 2, o primeiro nível de significado de Panofsky é o pré-iconográfico e é chamado por Shatford (1986) de descrição genérica, e neste nível é que se descreve os objetos e as ações representados na imagem, possuindo um significado fatual 43 (o ‘de’ da imagem) e um expressional (o ‘sobre’ da imagem). O primeiro sendo relativamente objetivo, enquanto o segundo sendo relativamente subjetivo. Já o segundo nível de significado de Panofsky é a iconografia. De acordo com Shatford (1986) esse nível exige um certo conhecimento de uma determinada cultura. O conhecimento requerido para a análise iconográfica é construído no conhecimento prático/real e há a identificação de objetos específicos. Também é possível identificar o significado fatual (o ‘de’) e expressional (o ‘sobre’) da imagem. Nesse nível é necessário entender não apenas a iconografia de imagens individuais, mas também a sintaxe da imagem, a iconografia criada pelos relacionamentos das imagens entre si. Por fim, Shatford (1986) explica que o nível final de significado de Panofsky é o iconológico, que é o nível da interpretação da imagem. A autora destaca que esse nível de significado não pode ser indexado com qualquer grau de consistência, e que a interpretação deve ser deixada para o usuário. No nível pré-iconográfico, o aspecto ‘de’ é uma descrição geral de objetos e eventos, enquanto no nível iconográfico ele é específico, com o nome desses objetos e eventos, explica Shatford (1986). No nível pré-iconográfico, o aspecto ‘sobre’ descreve a disposição da imagem, enquanto no nível iconográfico ele especifica a identificação de seres míticos, de significados simbólicos e conceitos abstratos que são comunicados pela imagem. Os significados de uma imagem podem ser definidos incialmente como contendo as respostas para as perguntas ‘Quem?’, ‘O quê?’ e ‘Quando?’, sendo que cada uma dessas perguntas básicas podem ser subdivididas nos aspectos baseados no ‘de’ específico, ‘de’ genérico e o ‘sobre’ (SHATFORD, 1986). O quadro abaixo apresenta a esquematização da categorização feita por Shatford para a análise da imagem: Quadro 2 – Categorias de Shatford Facetas DE específico DE genérico SOBRE QUEM: Animado e inanimado, objetos e seres concretos Pessoas, animais, objetos específicos Tipos de pessoas, animais, objetos Seres mitológicos, abstrações simbólicas de objetos ou seres O QUE: Ações, eventos, emoções Eventos específicos Ações, condições Emoções, abstrações manifestadas por ações ou eventos ONDE: Localização, lugar Lugares específicos Tipos de lugares Lugares simbólicos, abstrações manifestadas por lugares QUANDO: Tempo linear ou cíclico Tempo linear: datas e períodos Tempo cíclico: estações, momento do dia Emoções ou abstrações simbolizadas ou manifestadas pelo tempo Fonte: Tradução e adaptação pela autora do original de Shatford (1986), p. 49. 44 Por fim, Shatford (1986) destaca que a categorização dos assuntos de uma imagem em diferentes facetas e aspectos não indica necessariamente que uma imagem terá assuntos presentes em todas as facetas. As categorias são estabelecidas e as questões feitas para prevenir que determinados assuntos sejam negligenciados, sendo possível deixar facetas em branco. Em artigo posterior, Shatford Layne (1994) destaca que a indexação de imagens deve fornecer acesso às imagens com base em seus atributos, além de fornecer acesso a grupos de imagens úteis, não simples acesso a imagens individuais. Para isso, a autora destaca os seguintes atributos: Atributos biográficos: dizem respeito à biografia da imagem, ou seja, quando foi criada, por quem foi criada, onde ela se encontra agora, quanto custa, etc. Atributos de assunto: tratam do conteúdo da imagem e para defini-lo é preciso utilizar a proposta de categorias anterior. Atributos exemplificadores: imagens podem exemplificar algo, podendo ser de um formato específico, como uma fotografia ou um pôster. Atributos relacionais: imagens podem estar relacionadas, ou associadas, a outras imagens, trabalhos textuais ou objetos. Assim, é interessante indicar a existência e a natureza desses relacionamentos. A imagem é, ao mesmo tempo, específica e genérica, portanto sua representação deve contemplar estes dois aspectos de acordo com Smit (1987). Para a análise correta de uma imagem, as condições de produção e as condições de consumo devem ser levadas em consideração. Assim como os detalhes técnicos que se referem à produção da fotografia, os aspectos supracitados também devem ser mencionados na análise, pois alteram o significado e a maneira como é vista uma fotografia. Smit (1996) destaca também a necessidade de se entender a essência da fotografia para que se possa analisá-la, buscando enxergar aquilo que a caracteriza, as razões pelas quais foi produzida e as condições nas quais será utilizada. Assim, é importante compreender a imagem fotográfica enquanto informação a ser tratada e recuperada para sua análise. Por fim, Smit (2011) acrescenta que o foco da análise está no que se pode ver na imagem – independentemente da intenção do fotógrafo – naquilo que pode ser percebido pelo usuário que a observa. As principais dificuldades para a indexação de documentos imagéticos, de acordo com Smit (1987), são decorrentes da ‘tradução’ de um código icônico para um código verbal, e acarretam em todos os problemas que qualquer tradução pode sofrer durante seu processo, 45 como perda de precisão, seleção de informação, possibilidade de erro, etc. Além da dificuldade da separação entre denotação (o que a fotografia mostra) e conotação (o que a pessoa vê), sendo que muitas vezes a própria legenda ou contexto já desviam a análise para a conotação. O conceito de fotografia-índice utilizado por Dubois (1994), para Smit (1996), é útil para a documentação, pois preserva a polissemia da imagem e assegura a existência de um documento. Há possibilidade, portanto, de assimilar a imagem fotográfica a um documento que representa ‘algo’ (um ou mais objetos representando conceitos etc.). Do ponto de vista documentário, deve-se tratar este documento integrando-se os dois componentes da imagem fotográfica, ou seja, o próprio documento e o objeto enfocado (o referente). (SMIT, 1996, p. 30) Partindo da proposta de análise de Shatford (1986), Smit (1996) afirma que toda imagem deve ser representada tanto ao nível pré-iconográfico (‘de’ genérico) quanto iconográfico (‘de’ específico), pois o usuário pode procurá-la a partir de qualquer um desses aspectos. Ainda, a determinação do ‘sobre’ da imagem é mais subjetiva e está relacionada à sua temática. Ginette Bléry (1976 apud SMIT, 1996) desenvolveu uma proposta de representação doconteúdo de imagens com as perguntas ‘Quem?’ (objeto enfocado), ‘Onde?’ (espaço), ‘Quando?’ (tempo), ‘Como?’ (técnica) e ‘O quê?’ (ação). Para determinar que nenhum detalhe importante tenha sido esquecido na descrição de uma imagem, Smit (1987) afirma que tais questões devem ser respondidas, e para saber até onde ir e quando parar, a autora afirma que se deve descrever o 1º plano da imagem, citando o 2º plano apenas quando ele modificar a leitura do 1º. Quadro 3 – Grade de análise de Smit Categoria DE Sobre Genérico Específico Quem? Quando? Onde? Como/O que? Fonte: SMIT, 2000, p. 76 46 A ‘informação lateral’ de Schaeffer se faz importante para a análise da imagem, afirma Smit (2011, 2013). São disponíveis através da legenda, de anotações acompanhadas da imagem, de informações recolhidas com pessoas que podem identificar o que a imagem mostra ou do conhecimento prévio do analista. Smit (2011) ainda afirma que “[...] uma fotografia é um documento que retrata algo, de determinada maneira” (SMIT, 2011, p. 267). Essa ‘determinada maneira’ é denominada pela autora como a ‘expressão fotográfica’, sendo que Smit (2011) destaca que os dados da expressão fotográfica ajudam a refinar a busca, pois os descritores da expressão fotográfica informam o quanto pode ser visto de personagens e do ambiente no qual eles se encontram. Para a descrição da imagem, Smit (2011) sugere a criação de quatro listas controladas de termos com o objetivo de padronizar a linguagem a ser utilizada na indexação e garantir uma tradução consistente do código icônico para os termos da linguagem documentária. Essas listas seriam divididas em: 1. Termos concretos: para indicar o que a imagem mostra de forma genérica. 2. Termos abstratos: usados para designar o ‘sobre’ da imagem. 3. Nomes próprios de pessoas, lugares ou eventos e data cronológica: para a descrição específica. 4. Termos que designam detalhes da expressão fotográfica: que sejam pertinentes de acordo com o tipo de fotografia e ao público-alvo do serviço. Partindo das propostas de Shatford e Smit, Manini (2011) ressalta a importância da contextualização histórica e da associação entre a técnica da fotografia à sua expressão, evidenciando que para a Ciência da Informação são importantes o significado e o contexto da imagem fotográfica. A associação entre técnica fotográfica e a sua expressão é denominado pela autora como ‘dimensão expressiva’, que é [...] a parte da imagem fotográfica dada pela técnica: é a aparência física por meio da qual a fotografia expressa seu conteúdo informacional, é a extensão significativa da fotografia manifesta pela forma como a imagem se apresenta, revelada pela técnica. (MANINI, 2008, p. 149). O profissional da informação que trabalha com fotografias deve possuir conhecimentos básicos de processamentos fotográficos históricos e das técnicas e linguagem fotográficas, para que o tratamento documental e a análise documentária das imagens não sejam prejudicados (MANINI, 2008). Tais conhecimentos seriam importantes para a análise da dimensão expressiva, segundo a autora, pois esta pode influenciar a escolha de uma fotografia por justamente destacar a forma como a mensagem da imagem foi construída para transmitir 47 seu conteúdo informacional. Assim, Manini (2002) propõe um quadro com os recursos técnicos que podem ser utilizados e as variáveis que podem ser obtidas a partir da adaptação, que complementa o quadro proposto por Smit (1997 apud MANINI, 2002). Porém, a autora destaca que o quadro não é exaustivo nem completo, estando aberto às transformações tecnológicas, assim como sempre poderá haver sugestões para a alteração de suas colunas. Quadro 4 – Recursos técnicos e variáveis da fotografia RECURSOS TÉCNICOS VARIÁVEIS Efeitos Especiais - fotomontagem - estroboscopia - alto-contraste - trucagens - esfumação - etc. Ótica - utilização de objetivas (fish-eye, lente normal, grande- angular, teleobjetiva, etc.) - utilização de filtros (infravermelho, ultravioleta, etc.) - etc. Tempo de Exposição - instantâneo - pose - longa exposição - etc. Luminosidade - luz diurna - luz noturna - contraluz - luz artificial - etc. Enquadramento - enquadramento do objeto fotografado (vista parcial, vista geral, etc.) - enquadramento de seres vivos (plano geral, médio, americano, close, detalhe) - etc. Posição de Câmera - câmara alta - câmara baixa - vista aérea - vista submarina - vista subterrânea - microfotografia eletrônica - distância focal (fotógrafo/objeto) - etc. Composição - retrato - paisagem - natureza morta - etc. Profundidade de Campo - com profundidade: todos os campos fotográficos nítidos (diafragma mais fechado) - sem profundidade: o campo de fundo sem nitidez (diafragma mais aberto) Fonte: MANINI, 2002, p. 91-92. 48 Por fim, a autora propõe um quadro, reproduzido a seguir, para a análise da imagem incorporando a dimensão expressiva da fotografia. Quadro 5 – Proposta de análise da imagem de Manini (2002) Conteúdo Informacional Dimensão Expressiva DE SOBRE Categoria Genérico Específico Quem/O Que Onde Quando Como Fonte: (MANINI, 2002, p. 105) Moreiro Gonzalez e Robledano Arillo (2003), que também se utilizam da teoria de Panofsky, destacam a importância da existência de sistemas de recuperação de imagens complexos e eficazes por causa do crescimento de fundos de imagens e que demandam uma análise documentária completa e com alto grau de qualidade, sendo necessárias técnicas documentárias cuja intervenção garante o aproveitamento da informação. Os autores destacam que o conteúdo das imagens apresenta significação em diferentes níveis e momentos. Assim, eles destacam diferentes níveis de análise, esquematizados no quadro a seguir: 49 Quadro 6 – A imagem: níveis de significação Fonte: MOREIRO GONZALEZ; ROBLEDANO ARILLO, 2003, p. 15. Moreiro González e Robledano Arillo (2005) ainda apresentam duas possíveis leituras de uma imagem: a leitura do que se vê e a leitura do que se interpreta. A primeira se enquadra com as funções Identificadora e Descritiva do quadro, e a segunda com a função Interpretativa. A importância de ter os Dados de controle da imagem também é contemplada pelos autores, que pontuam como equivalentes aos Atributos Biográficos de Shatford Layne (1994) o controle de entrada das imagens, o controle do processo de análise, a localização topográfica da imagem, as permissões e possibilidades de uso, o controle da circulação e do uso das imagens do fundo, etc. A leitura do que se vê também são apresentadas como as características temáticas da imagem, representando as aparências, é a descrição da imagem. Para Moreiro González e Robledano Arillo (2005), a imagem transmite informação refletindo objetos, e isso faz com que seu tratamento seja diferente em relação ao texto. Assim, as imagens possuem três níveis de significação: o que é evidente (nível pré-iconográfico de Panofsky), o que é contextual (nível iconográfico de Panofsky) e o que é intrínseca e simbolicamente explicativo (nível 50 iconológico de Panofsky). Reiteram que a leitura deve destacar o que há no primeiro plano, descrevendo somente o segundo plano quando ele alterar a leitura do primeiro. Por fim, os autores também afirmam que a análise deve responder às questões: Quem?, Como?,
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