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ARTIGO 2 Contribuições das Teorias Psicogenéticas

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Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. 
CONTRIBUIÇÕES DAS TEORIAS PSICOGENÉTICAS À CONSTRUÇÃO DO 
CONCEITO DE INFÂNCIA: IMPLICAÇÕES PEDAGÓGICAS 
CONTRIBUTION OF THE PSYCHOGENETIC THEORIES TO THE CHILDHOOD BUILING PROCESS: 
PEDAGOGICAL IMPLICATIONS 
Rita Melissa Lepre* 
Resumo 
O artigo tem como objetivo principal apresentar sumariamente as teorias psicogenéticas de Jean Piaget (1896-
1980), Lev S. Vygotsky (1896-1934) e Henri Wallon (1879-1962) focando suas influências na construção da 
concepção atual de infância e de criança. Por meio de um resgate histórico busca situar estas teorias 
psicogenéticas no desenvolvimento da Psicologia enquanto ciência independente. Pretende, ainda, refletir sobre 
as implicações de tais concepções ao ato pedagógico voltado à infância. Por fim, apresenta e discute a posição de 
Neil Postman (1999) em relação ao desaparecimento da infância e suas repercussões na prática docente. 
Palavras-chave: ação docente; criança; infância; teorias psicogenéticas. 
Abstract 
This paper aims to present the psychogenetic theories of Jean Piaget (1896-1980), Lev S. Vygotsky and Henri 
Wallon (1879-1962) focusing on their influence on the current childhood and children’s construction conception. 
By a historical rescue, it tries to find the following psychogenetic into the Psychology development as an 
independent science. It still intends to reflect on the implication of such conceptions in the pedagogical process 
focused on the childhood. Finally, it still presents and discusses the position of Neil Postman (1999) considering 
the disappearance of the childhood and its reflection on the teaching practice. 
Key words: teaching practice; children; childhood; psychogenetic theories. 
 
*
 Psicóloga, Mestre e Doutora em Educação/UNESP. Professora Assistente do Departamento de Educação - Faculdade de Ciências 
– Unesp (Bauru). 
CONTRIBUIÇÕES DAS TEORIAS 
PSICOGENÉTICAS À CONSTRUÇÃO DO 
CONCEITO DE INFÂNCIA: 
IMPLICAÇÕES PEDAGÓGICAS 
Chega mais perto e contempla as palavras. 
Cada uma tem mil faces secretas sob a face 
neutra e te pergunta, sem interesse pela 
resposta, pobre ou terrível, que lhe deres: 
trouxeste a chave? (DRUMMOND) 
A Psicologia surge como ciência no século XX. 
Uma visão abreviada de seu nascimento nos remete 
ao primeiro laboratório de psicofisiologia criado por 
Wilhem Wundt (1832-1920), na Universidade de 
Leipizig (Alemanha). No entanto, se essa foi a 
condição científica para que a Psicologia recebesse 
o status de ciência, tal feito não explicita questões 
muito mais amplas e decisivas à emergência dessa 
nova área do conhecimento. 
Segundo Figueiredo (1991) várias foram as pré-
condições sócio-culturais para o aparecimento da 
Psicologia como ciência no século XX. A primeira 
condição foi a construção de uma experiência da 
subjetividade privatizada na época moderna. Com o 
colapso da tradição medieval e feudal, seus valores 
normas e costumes coletivos passaram a ser 
questionados e o homem foi obrigado a recorrer à 
sua consciência individual e à reflexão pessoal para 
tomar decisões. Surge, dessa forma, o início de uma 
construção social, política e científica do ser 
humano enquanto indivíduo, possuidor de um 
psiquismo único, original e autônomo. 
A segunda condição foi o desenvolvimento do 
sistema mercantil. O modo de produção capitalista 
Contribuições das teorias psicogenéticas à construção do conceito de infância: implicações pedagógicas. 310 
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. 
promoveu intensas modificações nas relações 
sociais e econômicas. Nas sociedades tradicionais 
pré-capitalistas a produção era sempre diretamente 
social, pautada em vínculos estreitos e no 
comunitarismo. Segundo Figueiredo (1991), 
Além dos vínculos com os meios de 
produção e da interdependência 
comunitária, havia relações entre senhores 
e servos ou escravos que, se por um lado, 
continham um elemento de exploração de 
uns pelos outros, por outro lado 
estabeleciam obrigações de proteção, 
defesa e apoio dos fortes em relação aos 
fracos (p.24-25). 
Com a possibilidade do trabalho “livre”, 
desapareceram as relações feudais anteriores, 
marcadas pela solidariedade grupal e pelo sistema 
de exploração/proteção. A liberdade dada ao 
homem para que esse pudesse vender sua força de 
trabalho deixou, no entanto, o sujeito entregue à 
própria sorte. 
A terceira condição foi a crise dessa 
subjetividade privatizada. Quando o homem 
descobre que não é tão único e original e nem tão 
livre quanto acreditava, ele entra em crise. Essa 
crise representa o cenário ideal para o nascimento 
de uma Psicologia científica que busque 
compreender e explicar a experiência imediata e 
consciente. 
Inicialmente, um dos principais objetivos da 
Psicologia como ciência foram os projetos voltados 
para a previsão e controle científico do 
comportamento individual. Com uma concepção 
positivista, a recém ciência psicológica 
independente envolve-se com a “ortopedia 
científica”. 
Em todas estas questões se expressa o 
reconhecimento de que existe um sujeito 
individual e a esperança de que é possível 
padronizá-lo segundo uma disciplina, 
normatizá-lo, colocá-lo, enfim, a serviço 
da ordem social. Surge, deste modo, a 
demanda por uma psicologia aplicada, 
principalmente nos campos da educação e 
do trabalho (FIGUEIREDO, 1991, p. 31). 
Essa primeira Psicologia, pautada na 
perspectiva liberal construída no decorrer do 
desenvolvimento do capitalismo, caracterizou-se 
por pensar o homem a partir da idéia de natureza 
humana e de igualdade natural. Dessa forma, os 
fenômenos psicológicos eram pensados por meio de 
idéias naturalizadoras, sem grandes considerações 
ao meio social e cultural. Por ser natural, próprio do 
ser humano, o fenômeno psicológico era visto como 
inato. “Algo que lá está como possibilidade quando 
nascemos; algo que deverá ser fertilizado por afeto, 
estimulações adequadas e boas condições de vida, 
mas que lá está pronto para desabrochar” (BOCK, 
2002, p. 22). 
Assim como o fenômeno psicológico, questões 
referentes ao desenvolvimento e à aprendizagem 
humanos foram pensados, inicialmente, pela 
Psicologia, por meio dessa concepção inatista, por 
conseqüência, naturalizadora. Aliada aos interesses 
das elites, essa visão permitia à Psicologia, como 
ciência e profissão, determinar padrões de 
normalidade e saúde, transformando em anormal o 
diferente, o “fora do padrão dominante” (BOCK, 
2002). 
Para a Educação, a Psicologia pôde oferecer 
inicialmente conhecimentos sobre a natureza 
humana e os padrões evolutivos normais de 
desenvolvimento e aprendizagem, contribuindo para 
o planejamento e execução de programas de 
recuperação e assistência àqueles que se 
distanciavam dessa pretensa “normalidade”. 
Focada no indivíduo e no desenvolvimento 
natural de suas capacidades, a Psicologia aplicada à 
Educação buscava normatizar comportamentos e 
ações, culpabilizando aqueles que, por algum 
motivo, não se desenvolviam ou aprendiam dentro 
do esperado. Bock (2002) afirma que o positivismo 
contribuiu para a construção de uma Psicologia que 
não se envolvia com as tramas sociais, 
desconsiderando aspectos culturais e históricos. 
Se inicialmente a Psicologia precisou aderir aos 
princípios positivistas de objetividade científica 
para se firmar como ciência, com o 
desenvolvimento da sua história novas formas de se 
pensar o fenômeno psicológico, o desenvolvimento 
e a aprendizagem, entre outras questões, foram 
sendo possíveis. 
Entre os diversos projetos da psicologia 
científica como ciência, podemos citar as primeiras 
escolas psicológicas representadas pelo pioneirismo 
de Wundt (1832-1920), pelo funcionalismo de 
WilliamJames (1842-1910), pelo estruturalismo de 
Edward Titchner (1867-1927) e pelo 
associacionismo de Edward Thorndike (1874-
1949). Durante o século XX outras importantes 
teorias foram desenvolvidas pela psicologia 
científica como o Behaviorismo (Skinner), a Gestalt 
(Koffka e Kohler), a Psicanálise (Freud) e as teorias 
LEPRE 311 
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. 
psicogenéticas de Jean Piaget (1896-1980), Lev 
Semonovich Vygotsky (1896-1934) e Henri Wallon 
(1879-1962). 
Neste artigo focaremos as contribuições das 
teorias psicogenéticas à construção da concepção 
atual de infância e suas implicações educacionais e 
pedagógicas. As teorias de Piaget, Vygotsky e 
Wallon apresentam afinidades e divergências sobre 
determinados temas, mas comungam, ao nosso ver, 
de uma visão interacionista de desenvolvimento 
humano e aprendizagem. O interacionismo entende 
que o desenvolvimento e a aprendizagem humanos 
acontecem por meio da interação entre o indivíduo 
(questões internas) e o meio (dados externos) onde 
está inserido. Dessa forma, o ser humano é visto 
como um ser ativo que ao interagir com o mundo se 
desenvolve e aprende. A cultura e o momento 
histórico nos quais o sujeito está situado também 
influenciam o desenvolvimento das possibilidades 
cognoscentes. 
Essa concepção se opõe às visões inatista 
(racionalista) e ambientalista (empirista) no que se 
refere ao desenvolvimento e à aprendizagem 
humana. A visão inatista, representada pelo 
racionalismo, considera a razão e o pensamento 
(questões internas) como as únicas fontes do 
conhecimento por serem inatos. Baseia-se na 
hereditariedade, nos dons, na transmissão e acredita 
que a capacidade de conhecer é dada a priori, 
nascendo com o indivíduo e limitando suas 
possibilidades. Já a visão ambientalista, 
representada pelo empirismo, considera que os 
objetos (dados externos) e as experiências sensoriais 
são as únicas fontes do conhecimento. Baseia-se nos 
estímulos externos que imprimem no homem, 
considerado uma folha em branco, determinadas 
aprendizagens controladas. Em ambas as 
concepções o homem é visto como um ser passivo, 
seja pelo pré-formismo espontaneísta, seja pelo 
associacionismo mecanicista. 
O interacionismo, proposto inicialmente por 
Kant no século XVIII, busca acabar com a 
exacerbação do sujeito (racionalismo) ou do objeto 
(empirismo), propondo uma relação entre ambos. 
As teorias psicogenéticas enfocam essa relação 
homem ativo/mundo ativo nas suas pesquisas acerca 
da construção do conhecimento. 
Por meio do pressuposto interacionista, a 
psicogenética pode ser definida como o estudo da 
origem e do desenvolvimento da mente e do 
conhecimento. Portanto, as teorias psicogenéticas 
coincidem em seu objeto de estudo: definir a 
maneira como se origina e se desenvolve o 
conhecimento no ser humano. Como vimos, os 
estudos de Jean Piaget (1896-1980), L.S. Vygotsky 
(1896-1934) e Henri Wallon (1879-1962) situam-se 
nesse grupo de teorias. Apesar de terem partido de 
questões diferentes, a partir de contextos diversos, 
os três pesquisadores compartilhavam de algumas 
preocupações: como se dá o conhecimento humano? 
Qual a sua origem? Como se desenvolve? Quais os 
seus determinantes? O que é importante no percurso 
do seu desenvolvimento? 
É importante lembrar que Piaget, Vygotsky e 
Wallon realizaram suas pesquisas no campo da 
Psicologia, mas que seus nomes foram difundidos, 
sobretudo, nos meios educacionais, haja vista a 
colaboração de seus estudos para a Educação. 
Discutir as contribuições dessas teorias foi o 
objetivo do livro Piaget, Vygotsky e Wallon, no qual 
Yves de LaTaille, Marta Kohl de Oliveira e Heloysa 
Dantas, professores da Universidade de São Paulo 
(USP), discutiram os fatores biológicos e sociais do 
desenvolvimento psicológico, assim como as 
questões da cognição e da afetividade nesses três 
autores. Nessa obra os professores pesquisadores 
explanaram os conceitos das teorias e discutiram 
suas possibilidades e limites num exercício de 
reflexão e respeito àquele que delas buscam se 
beneficiar seja ele um professor, um psicólogo ou 
outro profissional que se interesse pelo 
desenvolvimento humano. 
AS VICISSITUDES NA CONCEPÇÃO DE 
INFÂNCIA E CRIANÇA 
“A infância é um artefato social e histórico, e 
não uma simples entidade biológica.” 
(STEINBERG e KINCHELOE, 2001, p. 11). Essa 
afirmação nos possibilita refletir sobre a infância 
como uma fase da vida construída socialmente, 
assim como o é a adolescência. Acreditar que a 
infância seja um período natural do crescimento é o 
mesmo que tentar naturalizar um fenômeno 
psicológico, sem considerar influências sociais, 
culturais e históricas. “Na realidade, o que nos 
últimos anos do século XX foi rotulado como “uma 
infância tradicionalmente ocidental” tem apenas 
cerca de 150 anos.” (STEINBERG e 
KINCHELOE, 2001, p. 11). 
Segundo Áries (1981), até meados do século XI 
não havia lugar para a infância na sociedade 
ocidental. É comum notar, nas pinturas da época, 
que as crianças eram retratadas como adultos em 
miniatura. Não há nada nesses quadros que 
represente bem as crianças, a não ser o seu tamanho 
Contribuições das teorias psicogenéticas à construção do conceito de infância: implicações pedagógicas. 312 
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. 
diminuto. É somente por volta do século XIII que os 
sentimentos para com as crianças começam a surgir 
e a arte mostra alguns tipos de crianças um pouco 
mais próximas da realidade. No entanto, esses 
sentimentos eram muito relativos e expressos por 
certa afeição, mas não por uma consciência das 
particularidades infantis. Na sociedade medieval o 
sentimento de infância era inexistente, o que não 
significa dizer que as crianças eram negligenciadas, 
abandonadas ou desprezadas. A afeição pelas 
crianças estava presente, o que não existia era a 
consciência das particularidades infantis, ou seja, a 
idéia de que a criança é qualitativamente diferente 
do adulto. 
Assim, tão logo a criança não precisasse mais 
dos cuidados básicos de sua mãe para garantir-lhe a 
sobrevivência “ela ingressava na sociedade dos 
adultos e não se distinguia mais destes.” (ARIÉS, 
1981, p.156). Durante a Idade Média, as crianças 
participavam efetivamente do mundo adulto, 
ganhando conhecimentos profissionais e 
experiência de vida. “O conceito de criança como 
uma classificação específica de seres humanos que 
requerem um tratamento especial, diferente daquele 
aplicado ao adulto, ainda não havia desenvolvido 
na Idade Média” (STEINBERG e KINCHELOE, 
2001, p. 11). 
A partir do século XIV, contudo, surge uma 
nova concepção, a qual acreditava existir uma 
personalidade própria nas crianças. Essa tendência 
representou, com certeza, um grande avanço no 
entendimento da infância, refletido nas produções 
artísticas dos séculos XVI e XVII, nas quais as 
crianças passam a trajar vestimentas que as 
diferenciavam dos adultos. 
Surge, então, o primeiro sentimento da infância, 
caracterizado pela paparicação: as crianças eram 
vistas como seres graciosos e que podiam causar 
prazeres com seus atos ingênuos e doces. O 
sentimento de paparicação começou no século 
XVII, no entanto, a receber muitas críticas. 
Educadores e moralistas argumentavam que esse 
sentimento gerava crianças mal educadas, sem 
limites e com pouca preparação para viver em 
sociedade. Essas críticas levaram a construção de 
um novo sentimento em relação à criança: o de 
exasperação. Ele se caracterizava pelo interesse 
psicológico pela criança e por sua formação moral, 
condenando pais que tratavam seus filhos como 
“bonequinhos”, feitos para distração e brincadeiras. 
No entanto, se o primeiro surgiu no meio 
familiar, o segundo foi derivado das idéias de 
educadorese moralistas do século XVII, 
preocupados com a disciplina e a formação moral 
das crianças. Kant é um deles. Em Sobre a 
pedagogia (1996), ele afirma que a educação é o 
que retira o homem de sua condição de selvageria. 
“O homem tem necessidades de cuidados e de 
formação. A formação compreende a disciplina e a 
instrução.” (KANT, 1996, p. 14). Segundo esse 
autor, a disciplina é necessária, pois transforma a 
animalidade em humanidade. Uma das funções da 
educação, nesse caso, é disciplinar: restringir no 
homem suas vontades individuais e impulsos 
egoísticos. Essa educação deveria começar em casa 
e continuar na escola. 
Esse novo sentimento mostrava o crescente 
interesse pelas crianças, reconhecendo nelas 
particularidades outrora negligenciadas, e 
preocupando-se com sua formação. Essa nova 
concepção é também interiorizada pelas famílias 
que passam a se preocupar com a educação de seus 
filhos. 
Resgatando as idéias que expusemos até aqui, 
podemos dizer que da ausência de um sentimento 
ligado à infância, surge o de paparicação que deriva 
para o de formação moral. A figura do preceptor é 
substituída pela do professor. Surge, então, a escola 
como instituição, preocupada com a formação 
intelectual e moral das crianças. 
Teorias como as de Montaigne, Locke e 
Rousseau surgem a partir dessa nova concepção de 
infância, cada uma trazendo suas particularidades, é 
claro. 
Explica Ghiraldelli (1996), 
[...] o século XVIII, em que um novo 
sentimento dos adultos em relação às 
crianças já caracteriza a presença social da 
noção de infância, o que proporciona o 
advento de uma pedagogia que advoga 
uma disciplina autônoma, e não mais 
heterônoma. Se Locke trabalha com o 
objetivo de estabelecer as condições da 
liberdade dos homens, Montaigne, antes 
dele, quer que os adultos façam da criança 
um homem – o que já significa considerar 
que ela não é um “adulto em miniatura” – e 
Rousseau, depois dele, quer que os adultos 
deixem a criança ser criança, de modo que 
a infância aconteça, pois ela é o que há de 
melhor nos homens (GHIRALDELLI, 
1996, p. 15). 
Enfim, a infância estava diferenciada. As 
crianças passaram a ser vistas como seres 
peculiares, portadoras de uma personalidade própria 
LEPRE 313 
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. 
e de um pensamento e inteligência qualitativamente 
diferente dos adultos. 
No entanto, é com o advento das teorias 
psicogenéticas, no século XX, que essas idéias 
ganham força. A partir de Piaget, Vygotsky e 
Wallon o olhar para a criança não foi mais o 
mesmo. Essa passou a ser vista como 
qualitativamente diferente do adulto, com 
características próprias nos campos da cognição, 
afetividade e moralidade. Enfim, um ser integral, 
ativo e interativo. Vejamos como cada um desses 
autores contribuiu para a construção dessa 
concepção de criança e, conseqüentemente, de 
infância e quais as implicações pedagógicas de suas 
teorias psicogenéticas. 
A EPISTEMOLOGIA GENÉTICA DE JEAN 
PIAGET 
Jean Piaget (1896-1980), epistemólogo suíço, 
descobre por meio de suas investigações que a 
criança tem uma lógica própria, diferente da do 
adulto, e que há um caminho psicogenético a ser 
seguido na sua evolução. É Piaget, ainda, que 
inicialmente divulga o chamado princípio da 
atividade2, concebendo a criança como um ser 
ativo, construtora do seu próprio saber, onde a ação 
é regida pela necessidade e pelo interesse. 
Como ressalta Vasconcelos (1996), 
Piaget difundiu a idéia de que o processo 
que leva a criança a conhecer o mundo é 
um processo de criação ativa, em que toda 
a aprendizagem se dá a partir da ação do 
sujeito sobre os objetos. Um sujeito 
intelectualmente ativo, que constrói seu 
conhecimento sobre a ação, não é um 
sujeito que tem apenas uma atividade 
observável, mas um sujeito que compara, 
exclui, categoriza, coopera, formula 
hipóteses e as reorganiza, também em ação 
interiorizada (VASCONCELOS, 1996, p. 
21). 
A teoria de Piaget é a matriz do Construtivismo, 
linha teórica proposta pelo Ministério da Educação 
 
2
 O russo Alexei Nikolaievich Leontiev (1904-1979), um dos 
colaboradores mais próximos de Vygotsky, também 
desenvolveu uma teoria da atividade. Numa visão sócio-
histórica, Leontiev define as atividades humanas como 
formas de relação do homem com o mundo, dirigidas por 
motivos e por fins a serem alcançados. A estrutura da 
atividade humana é analisada em três níveis de 
funcionamento: a atividade propriamente dita, as ações e as 
operações. 
e Cultura (MEC) para o planejamento, execução e 
avaliação das atividades pedagógicas nas escolas 
brasileiras. No entanto, é importante ressaltarmos 
que Piaget não teve uma preocupação 
eminentemente pedagógica e sim epistemológica, 
ou seja, esse autor teve como centro de suas 
investigações o sujeito epistêmico. Dessa forma, 
não propôs um método de ensino ou elaborou 
materiais pedagógicos, mas ofereceu à Educação 
esclarecimentos sobre o modo peculiar de raciocinar 
que as crianças apresentam em diferentes estádios 
da vida. 
“Normalmente, Piaget pouco falava em 
“construtivismo”, prefereindo a expressão “auto-
regulação” que, segundo ele, é o fenômeno que 
explica a novidade (construção de novas estruturas 
e de novos esquemas).” (LIMA, 1997, p. 104). No 
entanto, embora o termo construtivismo não seja 
freqüente nos textos piagetianos, esse autor chega a 
declarar-se como adepto desse tipo de explicação 
epistemológica que ultrapassa o apriorismo e o 
empirismo. 
Segundo esse autor alguns fatores são 
fundamentais para o desenvolvimento das estruturas 
cognitivas, são eles: a maturação do Sistema 
Nervoso Central; a interação com objetos físicos 
(abstração empírica e abstração reflexiva); a 
interação social e a equilibração. Este último 
considerado o mais importante e central na obra 
piagetiana. A inteligência, para Piaget, que tem sua 
formação inicial em Biologia, é um mecanismo de 
busca de equilíbrio com o meio. Para tanto, o ser 
humano dispõe de mecanismos cognitivos para 
entender as situações de aprendizagem e construir o 
conhecimento. Esses mecanismos recebem o nome 
de assimilação e acomodação e são os responsáveis 
pela equilibração cognitiva. 
Ser inteligente é, com efeito, ser capaz de 
se construir esquemas de pensamento, com 
os quais poder-se-á chegar autonomamente 
a conhecimentos, a respostas certas, cujo 
valor cognitivo depende fundamentalmente 
dos esquemas que foram capazes de gerá-
los, por conta de uma subjetividade 
engajada na sua trajetória, que é uma 
aventura plena de desafios e de surpresas, a 
qual exige muita criatividade e arrojo 
(GROSSI, 1997, p.130). 
Piaget definiu quatro estágios do 
desenvolvimento cognitivo: o sensório-motor (0-2 
anos), o pré-operatório (2-7 anos), o operatório-
concreto (7-12 anos) e o operatório-formal (12 anos 
Contribuições das teorias psicogenéticas à construção do conceito de infância: implicações pedagógicas. 314 
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. 
em diante). Em cada estágio define a maneira que a 
criança raciocina e que busca resolver os desafios 
propostos pelo meio. Diferencia o pensamento 
infantil do pensamento adulto, atribuindo 
peculiaridades, não pensadas anteriormente, ao 
raciocínio das crianças. 
A teoria de Piaget encontra-se no grupo das 
teorias cognitivo-evolucionistas, tendo como base 
os seguintes pressupostos: 
a) o desenvolvimento inclui transformações 
básicas das estruturas cognitivas, que não podem ser 
explicadas por meio dos parâmetros da 
aprendizagem associacionista (reforço, repetição, 
punição, etc.), mas por parâmetros de totalidades 
organizativas ou sistemas de relações internas; 
b) o desenvolvimento das estruturascognitivas 
resulta de processos de interação entre o organismo 
e o meio em que a pessoa está inserida 
(interacionismo); 
c) as estruturas cognitivas são sempre estruturas 
de ação sobre objetos que evoluem de esquemas 
sensório-motores para esquemas simbólicos; 
d) o desenvolvimento das estruturas cognitivas 
leva a formas superiores de equilíbrio, o que 
otimiza a interação e a reciprocidade entre a ação do 
organismo sobre o objeto (ou situações) e a ação do 
objeto percebido sobre o organismo. 
Em resumo, o desenvolvimento humano, para 
Piaget, consiste em se alcançar o máximo de 
operacionalidade em suas atividades motoras, 
mentais, verbais e sociais e a aprendizagem está 
intimamente relacionada a tal operacionalidade. 
A PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA DE 
VYGOTSKY 
O russo Lev Semenovich Vygotsky (1896-
1934) teve sua formação inicial em Direito. No 
entanto, aprofundou seus estudos em história, 
filosofia e psicologia e seu interesse em 
compreender os problemas neurológicos como 
meios para desvendar o funcionamento do aparelho 
psíquico, o levou a formar-se, ainda, em Medicina. 
Vygotsky, em pareceria com Luria e Leontiev3, 
foi o fundador da Psicologia Sócio-histórica, que 
 
3
 Vygotsky, Luria e Leontiev faziam parte de um grupo de 
jovens intelectuais da Rússia pós-revolução que se auto-
intitulava Troika. “Baseados na crença da emergência de 
uma nova sociedade, seu objetivo mais amplo era a busca 
do “novo” (...) Mais especificamente, busacavam a 
construção de uma “nova psicologia”. (OLIVEIRA, 1993, 
p. 22) 
questionou os pressupostos da psicologia enquanto 
ciência natural (positivista) que entendia o 
fenômeno psicológico como a-histórico. Para esse 
autor o fenômeno psicológico não pertence à 
natureza humana e nem é pré-existente ao homem. 
“O fenômeno psicológico deve ser entendido como 
construção no nível individual do mundo simbólico 
que é social.” (BOCK, 2002, p. 22). Dessa forma, o 
fenômeno psicológico reflete a condição social, 
econômica e cultural em que vivem os homens. 
Os pilares básicos do pensamento 
Vygotskyano4 são os seguintes: - as funções 
psicológicas têm um suporte biológico, pois são 
produtos da atividade cerebral; - o funcionamento 
psicológico fundamenta-se nas relações sociais 
entre os indivíduos e o mundo exterior, que se 
desenvolvem num processo histórico e cultural, - a 
relação homem-mundo não é uma relação direta, 
mas mediada por sistemas simbólicos, sendo a 
linguagem o mais importante. 
Segundo Oliveira (1992), 
Falar da perspectiva de Vygotsky é falar da 
dimensão social do desenvolvimento 
humano. Interessado fundamentalmente no 
que chamamos de funções psicológicas 
superiores, e tendo produzido seus 
trabalhos dentro das concepções 
materialistas predominantes na União 
Soviética pós-revolução de 1917, 
Vygotsky tem como um de seus 
pressupostos básicos a idéia de que o ser 
humano constitui-se enquanto tal na sua 
relação com o outro social (p. 24). 
O conceito de mediação é central no 
pensamento vygotskyano. A linguagem humana é 
considerada o sistema simbólico (formada por 
signos) fundamental na mediação entre o sujeito e o 
objeto de conhecimento. Outro grupo de 
mediadores, citado por Vygotsky, são os 
instrumentos, que são elementos externos ao sujeito 
e visam mudanças na natureza. 
A relação entre pensamento e linguagem 
também ocupa lugar de destaque nos estudos desse 
autor. Para Vygotsky existe uma fase pré-linguística 
do pensamento (inteligência prática) e uma fase pré-
intelectual da linguagem (linguagem ainda não tem 
a função de signo) antes do pensamento e da 
 
4
 Optamos por utilizar o termo pensamento vygotskyano ao 
invés de teoria vygotskyana pois “sua produção escrita não 
chega a constituir um sistema explicativo completo, 
articulado, do qual pudéssemos extrais uma “teoria 
vygotskyana” bem estruturada. (OLIVEIRA, 1993, p. 21) 
LEPRE 315 
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. 
linguagem se associarem. Por volta dos dois anos de 
idade, o percurso do pensamento encontra-se com o 
da linguagem construindo-se, por meio das 
interações sociais, o pensamento verbal e a 
linguagem racional. Nesse momento, Vygotsky 
afirma que ocorre a transformação do ser biológico 
no ser sócio-histórico. 
No que diz respeito às relações entre 
aprendizado e desenvolvimento, podemos afirmar 
que o pensamento vygotskyano é o que oferece 
mais dados e possibilidades para uma intervenção 
pedagógica. O conceito de zona de 
desenvolvimento proximal oferece à pedagogia 
subsídios para pensar o papel do professor e de 
colegas mais experientes como mediadores no 
desenvolvimento das crianças. A zona de 
desenvolvimento proximal (ZDP) é formada pela 
distância entre o nível de desenvolvimento real, 
definido por aquilo que o sujeito já consegue fazer 
sem a ajuda de ninguém, e o nível de 
desenvolvimento potencial, definido pela 
capacidade de desempenhar tarefas com a ajuda de 
um membro mais experiente da cultura. 
Ao intervir na ZDP, o professor auxilia o aluno, 
por meio de novas aprendizagens, a trazer aquilo 
que estava no nível potencial para o nível real. 
A implicação dessa concepção de 
Vygotsky para o ensino escolar é imediata. 
Se o aprendizado impulsiona o 
desenvolvimento, então a escola tem um 
papel essencial na construção do ser 
psicológico adulto dos indivíduos que 
vivem em sociedades escolarizadas 
(OLIVEIRA, 1993, p. 61). 
Dessa forma, o desenvolvimento na perspectiva 
sócio-histórica é entendido como algo que se torna 
possível porque “o homem está imerso em uma 
sociedade na qual atividades instrumentais e 
relações sociais direcionam o desenvolvimento 
humano” (BOCK, 2002, p. 30). A cultura torna-se 
parte da natureza humana e o homem se desenvolve 
à sua própria imagem e semelhança. No que se 
refere à conceituação de infância, Vygotsky afirma 
que é um período culturalmente construído e que a 
construção de conceitos científicos pela criança, 
depende de um trabalho intencional do professor 
e/ou de outros membros mais maduros da cultura na 
Zona de Desenvolvimento Proximal. 
A PSICOGENÉTICA DE HENRI WALLON 
O francês Henri Wallon (1879-1962) tem a sua 
psicogenética marcada pela filosofia e pela 
medicina, daí os grandes questionamentos 
filosóficos acerca da psicologia na corrente do 
pensamento ocidental e a preocupação constante em 
reafirmar a base orgânica das funções psíquicas. 
Esse autor buscou elaborar uma teoria do 
desenvolvimento cognitivo que estivesse centrada 
na psicogênese da pessoa completa. 
Ao definir a inteligência, Wallon a concebe 
como genética e organicamente social, ou seja, o ser 
humano tem a sua estrutura orgânica intimamente 
ligada aos fatores sociais e culturais para se 
atualizar. Nas crianças, no entanto, o pensamento 
está inicialmente submetido às questões 
fisiológicas. “Os limites da criança são de origem 
fisiológica, enquanto que, em cada época, os do 
adulto dependem das condições históricas e 
culturais” (WALLON, 1989, p. XI). 
Buscando compreender o psiquismo 
humano, Wallon volta sua atenção para a 
criança, pois através dela é possível ter 
acesso à gênese dos processos psíquicos. 
De uma perspectiva abrangente e global, 
investiga a criança nos vários campos de 
sua atividade e nos vários momentos de 
sua evolução psíquica. Enfoca o 
desenvolvimento em seus domínios 
afetivo, cognitivo e motor, procurando 
mostrar quais são, nas diferentes etapas, os 
vínculos entre cada campo e suas 
implicações com o todo representado pela 
personalidade (Galvão, 1995, p. 11). 
Movimento, emoção, inteligência e 
personalidade foram os grandes temas pesquisados 
por Wallon. “Mas o grande eixoé a questão da 
motricidade; os outros surgem porque Wallon não 
consegue dissocia-lo do conjunto do funcionamento 
da pessoa” (DANTAS, 1992, p. 37). Segundo 
Wallon, o desenvolvimento da inteligência vai do 
ato motor ao ato mental, por meio de processos de 
internalização ativa da criança, que é concebida 
como um ser inicialmente fisiológico que com as 
interferências do social e da cultura passará a ter seu 
desenvolvimento biológico e psíquico intimamente 
ligado à interação com o meio. 
“Construindo-se mutuamente, sujeito e objeto, 
afetividade e inteligência, alternam-se na 
preponderância do consumo da energia 
psicogenética” (DANTAS, 1992, p. 42). A partir 
dessa constatação, Wallon define fases da 
inteligência nas quais há predominância ora de 
Contribuições das teorias psicogenéticas à construção do conceito de infância: implicações pedagógicas. 316 
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. 
fatores afetivos/emocionais, ora de fatores 
cognitivos. O desenvolvimento infantil é 
descontínuo e marcado por contradições e conflitos, 
gerados pela maturação fisiológica e pelas 
condições ambientais, o que gera alterações 
qualitativas no comportamento da criança. 
Um dos pontos em que as psicogenéticas de 
Wallon e de Piaget se confrontam é justamente esse: 
o modo como ocorre o processo de 
desenvolvimento. Para Piaget, que pretendia a 
gênese da inteligência, o desenvolvimento é um 
processo contínuo, sem retrocessos, em que 
estruturas anteriores servem de base para 
construções posteriores. Para Wallon, que pretendia 
a gênese da pessoa completa, o desenvolvimento é 
um processo descontínuo, não linear, e a passagem 
de um estágio para o outro é marcada por crises que 
afetam a conduta da criança. Essas crises, ora têm 
predominância de fatores afetivos, ora de fatores 
cognitivos. 
Wallon propõe cinco estágios no 
desenvolvimento do ser humano: 
• O impulsivo-emocional (1o. ano), com 
predominância dos aspectos afetivos, em que o bebê 
apresentará sua primeiras reações à pessoas, às quais são 
consideradas mediadoras da sua relação com o mundo 
físico. É um estágio de construção do sujeito, onde o 
trabalho cognitivo está latente e indiferenciado da 
atividade afetiva. Conflito de natureza endógena. 
• O sensório-motor e projetivo (até por volta do 3o. 
ano), em que surge a inteligência prática e que a criança 
poderá dedicar-se à construção da realidade. Por meio da 
aquisição da marcha, a criança ganha maior autonomia 
para explorar objetos físicos e espaços. Também nesse 
estágio ocorre o desenvolvimento da linguagem, 
possibilitado pela construção da função simbólica que, 
inicialmente, projeta-se em atos, por isso a denominação 
de projetiva. Predominância funcional cognitiva. Conflito 
de natureza exógena. 
• O personalismo (dos 3 aos 6 anos), que se refere à 
formação da personalidade. Neste estágio desenvolve-se 
a consciência de si mesmo, mediante as interações 
sociais com os outros. Exploração de si mesmo. Início 
do emprego do pronome Eu. Predominância afetiva. 
Conflito de natureza endógena. 
• O categorial (dos 6 aos 11 anos), no qual a 
diferenciação da personalidade, conquistada no estágio 
anterior, possibilita grandes progressos intelectuais. 
Cresce o interesse pelo conhecimento. Construção das 
capacidades de seriação, classificação e categorização. 
Predominância das relações cognitivas. Os sentimentos 
são elaborados no plano mental. Conflito de natureza 
exógena. 
• O da puberdade e adolescência (a partir dos 11 
anos), que é um estágio fecundo em conflitos. Retomada 
do conflito eu-outro, próprio do personalismo, agora 
desencadeado pela crise pubertária. Exploração de si 
mesmo com uma identidade autônoma, mediante 
atividades de confronto, auto-afirmação e 
questionamentos. Predominância afetiva. Conflito de 
natureza endógena. 
Apesar da proposição de estágios de 
desenvolvimento, Wallon afirma que há extrema 
dependência e estreita relação entre eles e que a 
criança é um ser integral. Para esse autor, estudar a 
criança, além de trazer compreensões sobre o 
psiquismo humano, contribui de forma significativa 
para a Educação. Ao contrário de Piaget, a 
preocupação pedagógica é presença forte na 
psicologia de Wallon. 
 O DESAPARECIMENTO DA INFÂNCIA? 
IMPLICAÇÕES PEDAGÓGICAS 
As teorias psicogenéticas de Piaget, Vygotsky e 
Wallon são interacionistas. Isso quer dizer que 
consideram a ação do meio e suas peculiaridades no 
desenvolvimento e na aprendizagem humana, 
pressupondo trocas ativas entre o organismo e o 
ambiente. Portanto, pensar o desenvolvimento e a 
aprendizagem humana nesse início de século XXI, 
sob a ótica desses três autores, solicita levarmos em 
conta as evoluções (ou involuções?) culturais e 
socias presentes na contemporaneidade. 
Como vimos anteriormente, a infância é um 
constructo social que recebeu diferentes sentidos ao 
longo da história social dos seres humanos. “Assim, 
a infância é uma criação da sociedade sujeita a 
mudar sempre que surgem transformações sociais 
mais amplas.” (STEINBERG e KINCHELOE, 
2001, p. 12). 
Neil Postman (1999) afirma em seu livro O 
desaparecimento da infância que o conceito de 
infância como uma fase de construções peculiares, 
em que a criança é vista como um ser 
qualitativamente diferente do adulto, está em fase 
de extinção. Segundo o autor, o avanço das novas 
tecnologias de comunicação vem redefinindo as 
relações entre adultos e crianças ao longo da 
história. A grande massa de informações 
disponíveis eletronicamente para adultos e crianças, 
indefinidamente, seria a responsável, segundo esse 
autor, pela destruição das fronteiras que demarcam 
essas duas fases da vida. 
As evidências podem ser notadas pela 
homogeneização de hábitos infantis e adultos no 
LEPRE 317 
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. 
que se refere às vestimentas, linguagem, 
alimentação, profissionalização e, principalmente, o 
acesso a informações que antes eram restritas aos 
adultos. As conseqüências de tal indiferenciação 
apontam para uma erotização precoce e até para o 
aumento de crimes cometidos por crianças. 
A televisão, para o autor, é um dos principais 
mecanismos que vêm diluindo a fronteira entre o 
que é ser adulto e o que é ser criança. O acesso à 
informação televisiva é simples, pois só requer 
algumas aptidões como ouvir e enxergar e o 
entendimento da fala, que é adquirido pelas crianças 
já no primeiro ano de vida. E o que poderíamos 
pensar sobre a internet? A rede mundial de 
computadores trocando informações entre 
internautas de seis, sete anos? O acesso também é 
simples, desde que a leitura e um mínimo de 
conhecimentos eletrônicos que fazem parte da vida 
das crianças desde a mais tenra idade permitam. 
Considerados os aspectos sociais 
contemporâneos e suas influências na construção de 
um novo entendimento de infância, vejamos como 
as psicogenéticas expostas neste trabalho, que 
contribuíram para a construção da imagem de 
infância como uma etapa no ciclo de vida e de 
criança como um ser ativo e qualitativamente 
diferente do adulto, implicaram numa forma 
peculiar de se entender algumas questões 
educacionais. 
Segundo Galvão (1995), 
Ao fornecer informações e explicações 
acerca das características da atividade da 
criança nas várias fases de seu 
desenvolvimento, a psicologia genética 
constitui-se numa valiosa ferramenta para a 
educação. Possibilita uma maior adequação 
dos objetivos e métodos pedagógicos às 
possibilidades e necessidades infantis, 
favorecendo uma prática de melhor 
qualidade, tanto em seus resultados como 
em seu processo (p.97). 
As transformações do pensamento e da 
inteligência infantil sincrética, pré-formal e pré-
conceitual para um pensamento e inteligência adulto 
conceituale formal estão presentes nas três 
propostas. As implicações educacionais e 
pedagógicas são imediatas, pois ao compreender 
como a criança pensa, o professor pode planejar 
como trabalhar para que o conhecimento seja 
compartilhado e construído pelos alunos. 
A metodologia adotada pelo professor deverá 
proporcionar situações de ensino que sejam 
coerentes com o desenvolvimento da inteligência do 
aluno e não com a idade cronológica dos 
indivíduos. 
O trabalho em equipes é um recurso 
metodológico que recebe atenção especial do 
construtivismo e das teorias psicogenéticas. Em 
1935, Piaget escreveu o artigo “Observações 
psicológicas sobre o trabalho em grupo”, no qual 
aponta as vantagens do trabalho em equipes na 
escola e afirma que este método está fundado nos 
mecanismos essenciais da psicologia da criança. 
Segundo esse autor, 
É, portanto, possível, a título de conclusão, 
sublinhar as vantagens do trabalho em 
grupo do ponto de vista da própria 
formação do pensamento. Todos nossos 
colaboradores concordam em ver nessa 
técnica uma fonte de iniciativa. Quase 
todos admitem igualmente (...) que o grupo 
desenvolve a independência intelectual de 
seus membros. Os frutos específicos do 
método são, pois, o espírito experimental, 
por um lado, e, por outro, a objetividade e 
o progresso do raciocínio (PIAGET, 1998, 
p. 150). 
Uma outra implicação educacional-pedagógica 
das teorias psicogenéticas que ora apresentamos é a 
questão do movimento do pensamento e suas 
repercussões na organização do trabalho do 
professor. Os três autores que abordamos nesse 
artigo têm como suporte filosófico a dialética (seja 
ela apresentada nos moldes Kantianos ou 
Marxistas), ou seja, consideram o movimento do 
pensamento dialético, passando da ação para a 
conceituação, na construção de conhecimentos. 
Reconhecer tal afirmação significa considerar que 
as atividades realizadas em sala de aula devem 
partir da própria atividade do aluno, da interação 
com o objeto de aprendizagem para posteriormente 
poder se concretizar no nível da reflexão 
metacognitiva, ou seja, da conceituação. 
Para finalizar, pensamos que as teorias 
psicogenéticas de Piaget, Vygotsky e Wallon 
contribuíram de forma decisiva para a construção da 
conceituação de infância como uma etapa específica 
do ciclo de vida e de criança como um ser ativo e 
integral, dotado de uma forma peculiar de 
raciocinar, qualitativamente diferente do adulto. 
Quanto às possibilidades apresentadas por 
Postman, preferimos o equilíbrio do meio termo: a 
Contribuições das teorias psicogenéticas à construção do conceito de infância: implicações pedagógicas. 318 
Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. 
infância não está desaparecendo, mas sim se 
transformando. Ora, o mundo está se transformando, a 
vida transforma-se cotidianamente, o planeta 
transforma-se, os homens transformam e são 
transformados. Tais mudanças e transformações, nem 
sempre positivas, representam o próprio movimento 
do estar vivo e, ao nosso ver, a complexidade desses 
processos não pode ser explicada pela adoção de 
uma tecnofobia, posição insinuada pelo autor. 
A Psicologia é, sem dúvida, uma ciência que 
apresenta grandes possibilidades de pensar e 
significar tais transformações, incluindo, àquelas 
pertinentes à Educação! 
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Recebido: 01/11/2007 
Aceito: 01/03/2008 
Endereço para correspondência: Rua Oliciar de Oliveira Guimarães 11-61 - Jardim América – Bauru – SP - melissa@fc.unesp.br

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