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1 DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E PRIVADO 28º CPR 2 Sumário 1.a. Desenvolvimento histórico do Direito Internacional. Terminologia. A sociedade internacional e suas características. Soberania e a atuação do Direito nas relações internacionais. Princípios que regem as relações internacionais do Brasil. ........... 4 1.b. Fontes do Direito Internacional Público. Costume Internacional. Princípios Gerais. Jurisprudência e Doutrina. Atos Unilaterais. Decisões de Organizações Internacionais. Jus Cogens. Obrigações erga omnes. Soft Law. ....................................... 6 1.c. Graves violações às Convenções de Genebra e crimes de guerra. Imprescritibilidade. Competência para processar e Investigação pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha. ............................................................................................................ 8 2.a. Direito Internacional Privado. Evolução histórica. Conflito de leis e espécies de normas. ...................................................... 10 2.b. Organização Internacional. Características. Evolução. Espécies e finalidades. Regime jurídico. Santa Sé. Prerrogativas e imunidades no Brasil. .................................................................................................................................................................... 11 2.c. Desaparecimento forçado como crime internacional. Crime de ius cogens. Normativa internacional. Imprescritibilidade. ........................................................................................................................................................................ 12 3.a. Espaços Globais Comuns. Princípios. Patrimônio Comum da Humanidade. Alto Mar. Fundos Marinhos. Antártica. Ártico. Espaço Sideral. .................................................................................................................................................................. 13 3.b. Direito tributário internacional. Conceito. O fenômeno da bitributação. Acordos de bitributação. ........................................... 14 3.c. Princípio uti possidetis. Descobrimento e ocupação como critérios de aquisição territorial. ................................................... 15 4.a. Estados. Autodeterminação dos Povos. Reconhecimento do Estado e Governo. Direitos e Deveres. Território: aquisição e perda. Faixa de Fronteira. Rios Internacionais e Regimes Fluviais. Domínio Aéreo. ..................................................................... 16 4.b. Tratados Internacionais. Reservas. Vícios de Consentimento. Entrada em vigor. Interpretação. Registro e Publicidade. Efeitos sobre Terceiros. Modalidades de Extinção. ....................................................................................................................... 18 4.c. Interpretação e aplicação do direito estrangeiro. Prova do Direito Estrangeiro. Ordem Pública e exceções à aplicação do direito estrangeiro .......................................................................................................................................................................... 20 5.a. Estrangeiros. Entrada, permanência e saída regular. Direitos do estrangeiro. Saída compulsória: deportação, expulsão. ....................................................................................................................................................................................... 21 5.b. Imunidades. Imunidade pessoal e real. Imunidade cognitiva e executória. Imunidade diplomática e imunidade consular. Imunidade de Estados. Imunidade de ex-chefes de Estado. Regime de tropas estacionadas por força de tratado. ...................................................................................................................................................................................................... 23 5.c. Uso da força no direito internacional: proibição (art. 2, para. 4, da Carta da ONU), direito de autodefesa ou de legítima defesa (art. 51 da Carta da ONU). Papel do Conselho de Segurança da ONU na garantia da paz e da segurança internacional. ................................................................................................................................................................................. 25 6.a. Nacionalidade. Originária. Derivada. Apatridia. Polipatria. Perda da nacionalidade. Estatuto da igualdade: portugueses. Nacionais de países do Mercado Comum do Sul (Mercosul) ........................................................................................................ 27 6.b. Soberania estatal. Conceito. Tipos: soberania interna e soberania externa. Princípio da igualdade soberana dos Estados. ........................................................................................................................................................................................ 28 6.c. Sucessão de Estados. Direitos e deveres. Tratados e patrimônio. ......................................................................................... 29 7.a. Tratados internacionais. Classificação. Terminologia. Negociação e competência negocial. Formas de expressão do consentimento. Conflito entre tratados e com as demais fontes .................................................................................................... 31 7.b. Asilo. Refúgio. Regime Jurídico. Princípio do non-refoulement. Papel dos órgãos internos. A proteção ao brasileiro no exterior. ......................................................................................................................................................................................... 32 7.c. Responsabilidade internacional do Estado. Obrigações primárias e obrigações secundárias. Atribuição de atos a Estados. Reparação: restituição, indenização e satisfação. Obrigação de interrupção de ato ilícito continuado. Obrigação de não-repetição de ato ilícito. Obrigação de perseguir ilícitos penais internacionais. .............................................................................................. 34 08.a. Solução pacífica de controvérsias: conceito, natureza e origem. Paradigma da Carta da ONU na solução pacífica de controvérsias: funções do Conselho de Segurança, da Assembleia-Geral, da Corte Internacional de Justiça. Arbitragem internacional e gestão diplomática. ............................................................................................................................................... 36 8.b. Crimes contra a humanidade ou de lesa humanidade: definição, natureza consuetudinária, imprescritibilidade. Elementos dos crimes contra a humanidade: ataque à população civil, extensão, sistematicidade, elemento político. .................................. 38 8.c. Processo de formação e incorporação dos tratados internacionais no Brasil. Hierarquia. Acordo Executivo. ....................... 39 9.a. Crimes internacionais: conceito e classificação. Dever de perseguir e pretensão punitiva da comunidade internacional. .... 41 9 b. Auxílio direto e juízo de mérito. Competência da Justiça Federal e atribuições do Ministério Público Federal. Distinção da cooperação policial. Meios de auxílio: videoconferência, quebra de sigilo, interceptação telefônica. Partilha de ativos (“asset sharing”). ....................................................................................................................................................................................... 42 9.c. Organização das Nações Unidas. Desenvolvimento e principais órgãos. Corte Internacional de Justiça. Organizações regionais das Américas. ................................................................................................................................................................ 43 10.a. Direito Internacional Penal e Direito Penal Internacional:divergências e convergências. Implementação direta e indireta do Direito Internacional Penal. .......................................................................................................................................... 47 10.b. Relação do Direito Internacional e o Direito Interno. Correntes doutrinárias. Como o Direito Interno vê o Direito Internacional. Como o Direito Internacional vê o Direito Interno. A Constituição brasileira e o Direito Internacional. .... 48 10.c - Conflitos internacionais e conflitos não-internacionais. Art. 3º comum às quatro Convenções de Genebra. Condições para a aplicação do Protocolo II de 1977. Convergências entre as garantias mínimas aplicáveis a conflitos não-internacionais e o regime de derrogações excepcionais do art. 27 da Convenção Americana de Direitos Humanos e do art. 4º do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos. .................................................................................................................................... 50 11.a. Tribunais internacionais ad hoc e tribunais mistos. Princípio da primazia da jurisdição penal internacional e suas mitigações. Dever de cooperar com os tribunais internacionais. ................................................................................................... 52 11.b. Desapropriação e seus reflexos no direito internacional. Proteção de nacionais desapropriados por Estado estrangeiro. Indenização devida. ..................................................................................................................................... 54 11.c. Responsabilidade não-penal de indivíduos no direito internacional por sua participação em graves violações de direitos humanos. ...................................................................................................................................................................................... 55 12. a. Direito internacional humanitário. Ius in bello e ius ad bellum: convergências e divergências. Direito de Genebra e Direito da Haia. Princípio da distinção. Princípio da proteção. Princípio da necessidade militar. Princípio da proporcionalidade. ............ 56 3 12.b. Extradição. Entrega. Execução de SEntenças Cíveis e Criminais. Transferências de presos. ............................................. 58 12.c. Tortura como crime internacional. Definição do art. 1º da Convenção da ONU contra a Tortura de 1984 e definição do art. 2º da Convenção Interamericana contra a Tortura: convergências e divergências. ...................................................................... 61 13.a. Comitê Internacional da Cruz Vermelha. Natureza jurídica. Acordo de sede e imunidades. Finalidades e funções de acordo com as Convenções de Genebra de 1949 e com os Protocolos I e II de 1977. ............................................................................. 63 13.b. Indivíduo no Direito Internacional. Subjetividade jurídica controvertida. Responsabilidade individual penal derivada do Direito Internacional. ..................................................................................................................................................................... 65 13.c: Redes internacionais de cooperação judiciária e entre ministérios públicos. Cooperação formal e informal. A Iber-Rede. A Associação Ibero-Americana de Ministérios Públicos. A Reunião Especializada de Ministérios Públicos do Mercosul. ................ 67 14.a. Guerra contra o terror. Conceito de terrorismo. Atos de terror. “Combatentes ilegais”. Repressão internacional ao financiamento de atividades terroristas. ........................................................................................................................................ 69 14.b. Assistência Jurídica Mútua. Convenções Bilaterais e Multilaterais. ...................................................................................... 71 14.c: Tribunal Penal Internacional: jurisdição ratione personae, ratione loci e ratione temporis. Princípio da complementaridade. Poderes do Conselho de Segurança da ONU sobre a jurisdição do Tribunal Penal Internacional. ............................................... 72 15.a Cooperação Jurídica Internacional. Evolução e fundamentos. Via diplomática. Via Autoridade Central. Via do contato direto e cooperação internacional entre Ministérios Públicos. ................................................................................................................. 74 15. b Direito de autotutela: sanções, sanções “inteligentes”, contra-medidas e represálias. ......................................................... 76 15.c Responsabilidade internacional objetiva. Responsabilidade penal do Estado: conceito e controvérsias. Relação entre responsabilidade internacional do Estado e responsabilidade internacional penal do indivíduo. Julgar. ....................................... 77 16.a Dívidas estatais e garantia de credores no direito internacional. Doutrina Drago. Cláusula Calvo. Cláusula de estabilização. ...................................................................................................................................................................................................... 78 16.b Princípio da especialidade e dupla incriminação como condição de assistência jurídica em matéria penal. Exceção de crime político. .......................................................................................................................................................................................... 79 16.c Prisão preventiva para fins de deportação, expulsão e extradição. Competência e pressupostos. ....................................... 80 17.a. Limites à aplicação do direito estrangeiro no Brasil. Ordem pública. Moral e bons costumes. Garantias fundamentais. ..... 81 17.b. Princípios da fixação da Jurisdição internacional. Territorialidade e extraterritorialidade. ..................................................... 82 Jurisdição universal: conceito, limites e controvérsias. .................................................................................................................. 82 17.c. Repressão internacional ao trabalho e comércio escravo: histórico, base normativa e trabalho escravo contemporâneo. “Repressão internacional ao trabalho e comércio escravo: histórico, base normativa e trabalho escravo contemporâneo”: ......... 84 18.a. Direito Internacional do Meio Ambiente. Princípios. Poluição Atmosférica. Poluição Marinha. Recursos marinhos vivos. Biodiversidade, fauna e flora. ........................................................................................................................................................ 86 18.b. Carta rogatória: juízo delibatório, medidas cautelares com contraditório diferido, atos executórios e atos não-executórios. 89 18.c. Domínio marítimo. Mar Territorial. Zona Contígua. Plataforma. Continental. Zona Econômica Exclusiva. Ilhas costeiras e oceânicas. Navios e aeronaves no Direito Internacional. .............................................................................................................. 91 19.a Comunicabilidade do estado civil. Homologação de sentença de divórcio. ........................................................................... 93 19.b. Prestação de alimentos no estrangeiro. Convenção de Nova York de 1956. Atribuições do Ministério Público Federal como autoridade central. ......................................................................................................................................................................... 94 19.c Povos indígenas no Direito Internacional. A Convenção OIT 169 e a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas de 2007 .........................................................................................................................................................................95 20.a. Efeitos civis do sequestro de crianças. Competência da Justiça Federal. Atribuições do Ministério Público Federal e da Advocacia Geral da União. Autoridade Administrativa Central. ..................................................................................................... 97 20.b. Genocídio como crime internacional: conceito, natureza e incorporação no ordenamento jurídico brasileiro. Competência para seu processo e julgamento.................................................................................................................................................... 99 20.c: Direito da Integração Regional. Tipologia. Organização Internacional Supranacional. Mercado Comum do Sul. Evolução. Características. Estrutura. Principais atos institutivos. Relação com o Direito brasileiro. ............................................................ 100 4 1.a. Desenvolvimento histórico do Direito Internacional. Terminologia. A sociedade internacional e suas características. Soberania e a atuação do Direito nas relações internacionais. Princípios que regem as relações internacionais do Brasil. Principais obras consultadas: Santo Graal 27º; PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado, incluindo noções de Direitos Humanos e de Direito Comunitário, 4ª ed. Editora Jus Podivm; AMARAL JUNIOR, Alberto do. Curso de Direito Internacional Público. 3ª ed. Editora Atlas; SHAW, Malcolm N. Direito Internacional, 2010. Martins Editora. Desenvolvimento histórico do Direito Internacional: O Direito Internacional nasceu como ramo autônomo do Direito público na Europa do Século XVIII, com o Tratado de Westfalia (1648), que pôs fim à Guerra dos 30 anos. Hugo Grotius contribuiu para a sua autonomização. O DIP está dividido em basicamente duas fases: na Fase clássica (1648-1918), marcada pelo Direito à Guerra (Jus ad bellum) e à colonização, o DIP se preocupa basicamente com o estudo das relações entre os Estados; na Fase moderna ou contemporânea (a partir do fim da Segunda Guerra Mundial), o seu enfoque passa a ser a proteção internacional da pessoa humana – começam a aparecer limitações ao poder soberano dos Estados; o uso da força no cenário internacional passa a ser regulado; a colonização é vedada; e há exaltação do Direito de Guerra (Jus in bello – Direito de Haia) e do Direito Humanitário (Direito de Genebra). Ocorre a especialização do DIP em ramos (ambiental, trabalho, etc.), proliferam-se as Organizações Internacionais e o indivíduo passa a ser considerado sujeito de Direito Internacional. Terminologia: A terminologia “Direito Internacional” foi criada em 1780, por Jeremy Bentham, para distinguir o direito que cuida das relações entre os Estados do Direito Nacional e do Direito Municipal. A complementação “Direito Internacional Público” surgiu mais tarde na França, para diferenciar o DIP do DIPriv. Outros termos utilizados são “Direito das Gentes” ou “jus gentium” ou jus inter gentes. A Sociedade internacional e suas características: Sociedade internacional é o “conjunto de vínculos entre diversas pessoas e entidades interdependentes entre si, que coexistem por diversos motivos e que estabelecem relações que reclamam a devida disciplina” (PORTELA:2012, p. 44-45). A vontade (racional) é o elemento decisivo para a aproximação dos seus membros. As características da sociedade internacional são a universalidade (abrange no mundo inteiro, embora o nível de integração varie bastante), a heterogeneidade (os atores que a compõem apresentam mudanças significativas dos pontos de vista social, econômico, político, educacional, etc.), a descentralização (não há um governo central), a cooperação (corolário da descentralização, importa na ausência de subordinação entre os seus atores), a descentralização (não há um poder central) e caráter paritário (igualdade jurídica entre seus membros. A crítica é que não há igualdade de fato, o que acaba por influenciar as relações internacionais). Parte da doutrina defende ser a sociedade internacional interestatal (ou seja, é composta meramente por Estados), mas há críticas a esse entendimento a partir do reconhecimento das organizações internacionais como sujeitos de Direito Internacional e com a crescente participação direta das ONGs, dos indivíduos e de outros agentes no cenário internacional. Sociedade Internacional não se confunde com comunidade internacional � A COMUNIDADE fundamenta-se em vínculos espontâneos, de caráter subjetivo, envolvendo identidade e relações culturais, emocionais, históricos, sociais, religiosos, familiares etc. Caracteriza-se também pela ausência de dominação, pela cumplicidade e pela identificação entre seus membros, cuja convivência é harmônica. Segundo entendimento doutrinário que prevalece, ainda não há uma comunidade internacional, visto que o que une os Estados são os seus interesses, inexistindo laços espontâneos. Há, contudo, quem defenda a existência de uma comunidade internacional, à luz de problemas globais, que se referem a todos os seres humanos, como a segurança alimentar, o meio-ambiente, desastres naturais etc. Comunidade internacional Sociedade internacional Aproximação e vínculos espontâneos. Aproximação e vínculos intencionais. Aproximação por laços culturais, religiosos, linguísticos etc. Aproximação pela vontade. Identidade comum. Objetivos comuns. Ausência de dominação. Possibilidade de dominação. Cumplicidade entre os membros. Interesse. Soberania e a atuação do Direito nas relações internacionais: o conceito de soberania foi primeiramente desenvolvido pelo filósofo francês Jean Bodin. Classicamente, designa “o poder de declarar, em última instância, a validade do direito dentro de um certo território” (AMARAL JÚNIOR:2008 , p.99). Atualmente, entende-se soberania como o alcance de patamares de desenvolvimento econômico e social que garanta a um Estado a plena independência das suas decisões políticas, sem a necessidade de auxílios internacionais. Nesse sentido, soberania é um dos elementos constitutivos do Estado, possuindo um aspecto interno (supremacia dentro de um determinado território) e um aspecto internacional (igualdade formal entre os Estados na sociedade internacional e independência do ente estatal frente a outros). O Direito, seja o natural ou o positivo, atua nas relações internacionais como instrumento de respeito, cortesia, 5 cooperação, relação que sustentam a horizontalidade e a igualdade jurídica entre os Estados componentes da ordem internacional. Os “Estados precisam do Direito para buscar atingir certos objetivos, que vão desde o bem-estar econômico até a promoção de uma ideologia, passando pela segurança ou pela simples sobrevivência” (SHAW:2010, 38). Princípios que regem as relações internacionais do Brasil: estão previstos no art. 4º da CRFB/88, sendo eles: I. independência nacional; II. prevalência dos direitos humanos; III. autodeterminação dos povos; IV. não intervenção; V. igualdade entre os Estados; VI. defesa da paz; VII. solução pacífica dos conflitos; VIII. repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX. Cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; e X. concessão de asilo político. 6 1.b. Fontes do Direito Internacional Público. Costume Internacional. Princípios Gerais. Jurisprudência e Doutrina. Atos Unilaterais. Decisões de Organizações Internacionais. Jus Cogens. Obrigações erga omnes. Soft Law. Principais obras consultadas: Santo Graal 27º; PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado, incluindo noções de Direitos Humanos e de Direito Comunitário, 5ª ed. Editora Jus Podivm; AMARAL JUNIOR, Alberto do. Curso de Direito Internacional Público. 3ª ed. Editora Atlas; SHAW, MalcolmN. Direito Internacional, 2010. Editora Martins Editora; RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade Internacional por Violação de Direitos Humanos, 1ª ed. Editora Renovar, 2004. Fontes do DIP: Fontes do Direito são os motivos que levam ao aparecimento da norma jurídica, bem como os modos pelos quais ela se manifesta. Vejamos: Fontes materiais Fontes formais São os elementos que provocam o aparecimento das normas jurídicas. Ex.: II Guerra Mundial. São também os fundamentos sociológicos das normas internacionais, a sua base política, moral ou econômica. São o modo de revelação e exteriorização da norma jurídica. O art. 38 (1) do Estatuto da CIJ traz um rol exemplificativo das principais fontes formais do Direito Internacional. O referido diploma elencou: os tratados, os costumes e os princípios gerais do Direito como fontes, e fez referência à jurisprudência internacional e à doutrina como “meios auxiliares na determinação de direito”. Há quem classifique as 3 primeiras como fontes primárias, e as duas últimas como fontes secundárias do DIP. OBS 1: A doutrina majoritária entende que não há hierarquia entre as fontes do DIP. OBS 2: O Estatuto da CIJ estabelece que, não obstante as fontes elencadas, a solução para o conflito por se dar por ex aequo et Bono, ou seja, por equidade, se as partes assim concordarem. OBS 3: o Contrato internacional e a Lex mercatória são considerados fontes de direito internacional privado. Costume Internacional: resulta de uma prática geral aceita como sendo o direito. A parte que o invoca deve provar sua existência. Compõe-se de dois elementos: (a) a prática generalizada, uniforme, constate e reiterada de determinados atos na esfera das relações internacionais ou no âmbito interno, com reflexos externos (elemento material ou objetivo), que deve ser justa e estar de acordo com o Direito Internacional; e (b) a “opinio juris”, ou seja, a convicção da justiça e da obrigatoriedade jurídica dos atos praticados (elemento subjetivo). OBS 1: A generalidade não se confunde com a unanimidade, bastando que um grupo amplo e representativo reconheça a sua obrigatoriedade. Também não é sinônimo de universalidade, pois há costumes regionais e até mesmo empregados exclusivamente em relações bilaterais. OBS 2: existe a possibilidade de que um sujeito de DIP não reconheça expressamente um costume existente ou em gestação, traduzida pela figura do persistente objector. OBS 3: Parte da doutrina entende que o costume internacional é fonte convencional, pois decorre e aceitação tácita ao longo do tempo (voluntaristas). Outra parte entende que é fonte não-convencional, pois se deu com o desenvolvimento da sociedade internacional (objetivistas). OBS 4: O costume internacional vincula? Depende da teoria adotada. Partindo da premissa voluntarista, o costume valeria apenas entre aqueles entes que implicitamente concordassem com certa prática e aceitassem seu caráter jurídico. Por outro lado, o entendimento objetivista vê o costume como uma manifestação sociológica, que obriga erga omnes quanto mais difundido fosse, vinculando inclusive Estados que com ele não concordaram. Em todo caso existe a possibilidade de um sujeito de direito internacional não reconheça expressamente um costume, que é a figura do persistent objector. Formas de extinção do costume: O costume extingue-se pelo desuso (perda de um dos dois elementos acima descritos), pelo aparecimento de um novo costume que substitua outro anterior, ou por sua substituição por tratado internacional que incorpore as normas costumeiras (“Codificação do Direito Internacional”) OBS 1: O fenômeno da codificação do direito internacional � O costume vem sendo paulatinamente sendo substituído pelos tratados como fonte principal do direito internacional público, desde a Paz de Vestfália, pois os tratados oferecem maior estabilidade às relações, maior precisão de seu conteúdo (adota forma escrita), não cabe alegação que desconhece o tratado (pois o assinou) e é fácil constituir prova (o que pode ser complexo em relação ao costume). Por estas razões, os costumes vêm sendo integrados a textos de tratados, como é o caso da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas de 1961. Princípios Gerais: originários do direito interno dos Estados, ascenderam para o Direito Internacional. Foram previstos no art. 38 para preencher as lacunas do sistema e evitar o non liquet (função interpretativa). Os princípios gerais do direito são normas de caráter mais genérico e abstrato que incorporam os valores que fundamentam a maioria dos sistemas mundiais. Ex.: proteção da dignidade da pessoa humana, pacta sunt servanda; boa-fé, devido processo legal, res 7 judicata, boa fé, pacta sunt servanda, coisa julgada e direito adquirido. Princípios gerais do DIP: Dentre os princípios gerais do DIP, destacamos: a soberania nacional; a não-intervenção; a igualdade jurídica entre os Estados; a autodeterminação dos povos; a prevalência dos direitos humanos; a cooperação internacional; a solução pacífica de conflitos; a proibição de ameaça ou de uso da força; e o esgotamento dos recursos internos antes do recurso a tribunais internacionais. Jurisprudência e Doutrina: segundo o Estatuto da CIJ, são meios auxiliares na determinação do direito. A Jurisprudência é formada pelo conjunto de decisões reiteradas das Cortes Internacionais (CIJ, CIDH, TPI) em um mesmo sentido. A Doutrina, como fonte auxiliar, tem como principal função “contribuir para a interpretação e aplicação da norma internacional, bem como para a formulação de novos princípios e regras jurídicas” (PORTELA:2012, 82). Tem que ser de produzida por juristas internacionalistas, que publicam textos internacionalmente e que sejam mundialmente reconhecidos. Ex. Hugo Grotius. Atos Unilaterais: podem produzir importantes consequências jurídicas na seara internacional, independente da aceitação ou do envolvimento de outros entes estatais. Os atos unilaterais podem ser expressos ou tácitos. Exemplos: a) PROTESTO:Manifestação expressa de discordância quanto a uma determinada situação, destinada ao transgressor de norma internacional e voltada a evitar que a conduta objeto do protesto se transforme em outra; b) NOTIFICAÇÃO: Ato pelo qual um Estado leva oficialmente ao conhecimento de outro ente estatal fato ou situação que pode produzir efeitos jurídicos, dando-lhe “a necessária certeza da informação”; c) RENÚNCIA: É a desistência de um direito. A bem da segurança jurídica, deve ser sempre expressa, nunca tácita ou presumida; d) DENÚNCIA: Ato pelo qual o Estado se desvincula de um tratado; e) RECONHECIMENTO: Ato expresso ou tácito de constatação e admissão da existência de certa situação que acarrete consequências jurídicas. Ex.: reconhecimento de Estado e de governo; f) PROMESSA: Compromisso jurídico de adoção de certa conduta; g) RUPTURA DAS RELAÇÕES DIPLOMÁTICAS: Ato que suspende o diálogo oficial com um Estado nas relações internacionais. Decisões de Organizações Internacionais: Podem ser internas (aplicáveis apenas ao funcionamento da organização) ou externas (voltados a tutelar direitos e obrigações de outros sujeitos de Direito Internacional). Os organismos internacionais podem praticar os mesmos atos unilaterais que os Estados. Contudo, há decisões típicas de organizações internacionais, como os atos preparatórios da negociação de tratados, a convocação de reuniões internacionais, as recomendações e resoluções. As Resoluções podem ser cogentes (impositivas, pois vinculam os sujeitos de Direito Internacional. Ex.: resoluções do CSONU) ou facultativas (não possuem força jurídica, são cumpridas voluntariamente pelos Estados por força moral ou política – “Power of shame” - Ex.: Resoluções da ONU, OMS, OMC, OIT, etc.). OBS: As resoluções deverão ser executadas no Brasil por meio de Decreto presidencial. JusCogens: são normas aceites e reconhecidas pela comunidade internacional dos Estados no seu todo como norma cuja derrogação não é permitida e que só pode ser modificada por uma nova norma de direito internacional geral com a mesma natureza (art. 53 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados – CVDT). A norma de jus cogens tem efeito erga omnes e o poder de derrogar tratado anterior ao seu surgimento (leva à nulidade o preceito anterior apenas a partir de seu surgimento, não gerando efeitos retroativos nem afetando a validade do acordo quando a norma cogente ainda não existia, ou seja, efeitos ex nunc, não havendo retroatividade) (art. 64 da CVDT). Ou seja: caso ocorra conflito entre norma de tratado e preceito de jus cogens superveniente é nulo todo o tratado que, no momento da sua conclusão, seja incompatível com o jus cogens (art. 53 da CVDT). Crítica de Portella: não deve ser todo o tratado nulo, e sim apenas a norma que viole o jus cogens, pois seria desproporcional. Obrigações Erga Omnes: são aquelas que criam deveres a serem observados por toda a comunidade de Estados. Essas obrigações foram conceituadas, em obiter dictum na sentença do caso Barcelona Traction (CIJ, 1972), como aquelas em que “tendo em vista a importância dos direitos em causa, todos os Estados podem ser considerados como tendo um interesse jurídico em que esses direitos sejam protegidos”. A CIJ já entendeu, em parecer consultivo, que o dever de respeitar o direito à autodeterminação dos povos é uma obrigação erga omnes. Soft Law: Trata-se de nova modalidade normativa, de caráter mais flexível e de contornos ainda imprecisos, são regras cujo valor normativo seria limitado, seja porque os instrumentos que as contêm não seriam juridicamente obrigatórios, seja porque as disposições em causa, ainda que contidas num instrumento constringente, não criariam obrigações de direito positivo ou criariam obrigações pouco constringentes. A sanção pelo seu descumprimento é o embaraço internacional (Power of shame ou Power of embarrassment) e para serem cumpridas dependem da vontade dos Estados. Ex.: acordos de cavalheiros (gentlemen’s agreements), atas de reuniões internacionais, códigos de condutas, resoluções não-vinculantes de organismos internacionais (como a Declaração Universal dos Direitos Humanos). 8 Ponto 1.c. Graves violações às Convenções de Genebra e crimes de guerra. Imprescritibilidade. Competência para processar e Investigação pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha. Principais obras consultadas: Santo Graal 27º; PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado, incluindo noções de Direitos Humanos e de Direito Comunitário, 4ª ed. Editora Jus Podivm; AMARAL JUNIOR, Alberto do. Curso de Direito Internacional Público. 3ª ed. Editora Atlas; SHAW, Malcolm N. Direito Internacional, 2010. Editora Martins Editora; RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade Internacional por Violação de Direitos Humanos, 1ª ed. Editora Renovar, 2004. Graves violações às Convenções de Genebra: Crimes de guerra são atos ilícitos cometidos contra as normas do Direito de Guerra (Jus in bello - Direito de Haia) e do Direito Humanitário (Direito de Genebra) – que, juntos, formam um único sistema complexo: o Direito Humanitário Internacional – CIJ (SHAW, 2010). As leis de guerra foram sistematizadas nas Convenções sobre a Resolução Pacífica de Controvérsias Internacionais (Conferências de Haia) de 1899 e 1907, nas quais foram adotadas várias convenções que tratavam da guerra terrestre e marítima. Após, vieram as quatro Convenções de Genebra de 1949 (“Convenções da Cruz Vermelha”), todas promulgadas pelo Brasil pelo Decreto nº 42.121/1957: Convenção para a Melhoria da Sorte dos Feridos e Enfermos dos Exércitos em Campanha (I Convenção); Convenção para a Melhoria da Sorte dos Feridos, Enfermos e Náufragos das Forças Armadas no Mar (II Convenção); Convenção relativa ao Tratamento de Prisioneiros de Guerra (III Convenção); e Convenção relativa à Proteção dos Civis em Tempo de Guerra (IV Convenção). Em virtude do aumento do número de guerras revolucionárias de libertação nacional e civis após a Segunda Guerra mundial, as Convenções de Genebra foram atualizadas pelo Protocolo Adicional às Convenções de Genebra relativo à Proteção das Vítimas de Conflitos Armados Internacionais (Protocolo I) e Não-Internacionais (Protocolo II), ambos de 1977 e promulgados no Brasil pelo Decreto nº 849/1993. A III Convenção (prisioneiros de guerra) considera violações: mutilação física, experiência médica ou científica de qualquer natureza que não seja justificada pelo tratamento médico do prisioneiro referido e no seu interesse, atos de violência ou intimidação, insultos, exposição à curiosidade pública e medidas de represália (arts. 13 e 14). Prisioneiros de guerra, após capturados, devem ser levados a locais nos quais não estejam expostos a perigos das zonas de combate, nem devem ser usados para tornar áreas imunes a operações militares (art. 23). O conceito de civil, para fins de proteção pela IV Convenção, é dado por exclusão (basicamente, é qualquer indivíduo não-combatente – art. 50 do Protocolo I/1977). Em caso de dúvida, qualquer pessoa deve ser considerada civil. População e bens civis não podem ser alvo de ataque, sendo proibidos atos ou ameaças com objetivo de disseminar terror, ataques indiscriminados (atingem tanto objetivos militares quanto civis - arts. 51 e 57 do Protocolo I). O direito das partes de escolher os meios de guerra não é ilimitado (art. 22, Conferência de Haia/1907), sendo proibido o uso de armas, projéteis ou materiais destinados a causar sofrimento desnecessário (art. 23). As violações e os crimes de guerra podem ocorrer em conflitos armados internos (o art. 3º, comum a todas as quatro Convenções de Genebra, fornece, para os conflitos armados não-internacionais no território de uma das partes, garantias mínimas para proteção dos que não tomaram parte nas hostilidades, bem como enfermos e feridos). Com o Protocolo II/1977, o citado artigo passou a ser aplicado a todos os conflitos armados não-internacionais no território de Estado-parte entre suas forças armadas e forças armadas dissidentes/grupos armados organizados (SHAW: 2010). Crimes de guerra: o art. 6º do Acordo de Londres/1945 (que criou o Tribunal de Nuremberg) tipificou crimes de guerra, assim como o art. 3º do Estatuto do Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia (Resolução CSONU nº 827). Segundo Bassiouni, os crimes de guerra consistem em categoria que envolve 71 instrumentos relevantes datados de 1854-1998, muitos dos quais corporificam, codificam ou evidenciam o direito internacional costumeiro – cuja regulação de conflitos armados também se aplica. A maioria de tais instrumentos foi delineada com clareza e especificidade suficientes, o que evidencia suas características penais. Bassiouni menciona que as quatro Convenções de Genebra de 1949 e seus dois Protocolos adicionais são as codificações mais abrangentes e com as características penais mais específicas e aponta que se trata de jus cogens. Atualmente, os crimes de guerra se encontram definidos no art. 8º do Estatuto de Roma (Tribunal Penal Internacional). Integra a definição de tais crimes a circunstância especial de serem parte integrante de um plano ou de uma política ou de uma prática em larga escala (art. 8.1). Imprescritibilidade: Nem o Estatuto de Nuremberg/Tóquio, nem a Convenção sobre o Genocídio de 1948, nem as quatro Convenções de Genebra/1949 a preveem expressamente. Apesar disso, o Tribunal da Ex-Iugoslávia (Caso Furundzija) afirmou que “a natureza imperativa da proibição da tortura produz a imprescritibilidade desta infração, acrescentando que os crimes de competência da Corte não são prescritíveis” (estende o campo de aplicação da imprescritibilidade às violações graves das Convençõesde Genebra de 1949, à infração das leis e costumes da guerra, ao genocídio e aos crimes contra a humanidade). Apesar de a Assembleia Geral da ONU ter elaborado a Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes Contra a Humanidade (Convenção de Nova York, 1968), esta não obteve muitas ratificações, sendo criticada pela aplicação aos crimes cometidos antes de sua entrada em vigor (art. 1º); por outro lado, a Convenção Europeia sobre a Imprescritibilidade (Estrasburgo, 1974), que não previa a sua retroatividade, também só foi ratificada pelos Países Baixos/Romênia – o que evidencia a então falta de consenso sobre o tema. 9 O Estatuto de Roma (TPI) adotou a imprescritibilidade expressa, geral e definitiva (ação penal e penas – art. 29/duas vertentes: obrigação de fazer com que tais crimes sejam imprescritíveis no âmbito interno dos Estados ou que os crimes são imprescritíveis perante o TPI apenas). Parte da doutrina considera que tal Estatuto tem efeito apenas declaratório de regra costumeira prévia; outros acreditam que a baixa adesão à Convenção demonstra a falta de consistência costumeira (ausência de opinio juris); parte da doutrina entende, ainda, que o art. 29 reflete o estado do direito internacional costumeiro ou configura norma costumeira em formação. A favor da imprescritibilidade: Relatório do XV Encontro Nacional de Procuradoras e Procuradores dos Direitos do Cidadão, 2009: “Como se tratam de crimes jus cogens, a prescritibilidade desses crimes pela inação do Estado não é admitida pelo direito costumeiro internacional. O Brasil não firmou a Convenção da ONU sobre crimes imprescritíveis, mas esta tem efeito declaratório e não constitutivo, expressa um consenso”. Sobre o tema, Debate sobre a imprescritibilidade da tortura/ desaparecimento forçado, que se aplicam ao tema: “Marcelo Miller – PRDC/ RJ –(...) O primeiro ponto diz respeito à existência de um costume de imprescritibilidade com base na Convenção das Nações Unidas, que até a década de 30 tinha poucos Estados partes, não se podendo falar assim de prática reiterada. Falar de um conteúdo declaratório da Convenção é também uma dificuldade, porque a convenção estabelece apenas um dever de se criar imprescritibilidades e não as declara. E esse costume de imprescritibilidade seria oponível perante a ordem internacional e não interna. Também quando o TPI fala nos crimes mais graves de violação aos direitos humanos exigem uma tipificação além da prevista no Estatuto de Roma. Eugênio Aragão – Compreendo suas ponderações. O assunto não é fechado. Entendo que o Tratado de Roma para obrigar os Estados a legislarem antes declaram a imprescritibilidade desses crimes”. Competência para processar: A jurisdição do TPI limita-se a crimes cometidos após 1º/07/2002, atuando de forma complementar aos sistemas nacionais. Também é possível a jurisdição universal por parte dos Estados. Lembrar que o exercício da jurisdição penal internacional pelos Estados é, em regra, livre, cabendo ao Estado que se opõe comprovar o impedimento: CIJ, Caso Lótus (Império Turco x França); e Caso Bélgica x Congo. A competência do TPI está restrita aos crimes de guerra previstos no tratado que o criou (nullum crimen sine lege). Não basta subsunção formal ao art. 8º do Estatuto de Roma, mas também lesão efetiva à comunidade internacional (art. 17.1.d). Restringe-se aos crimes ocorridos no território de Estado-parte ou réu nacional de Estado-parte (iniciativa do Procurador/Estado-parte) Para os crimes anteriores houve a criação de Tribunais “ad hoc” (Iugoslávia, Ruanda, Tóquio) – que, por definição, julgam crimes anteriores à sua constituição. Não há limitações territoriais quando a iniciativa é do Conselho de Segurança da ONU (ex.: Líbia). Investigação pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha: O Comitê é competente para cuidar da assistência à pessoa nos conflitos armados/catástrofes/tragédias, naturais ou não. É competente também para velar pela aplicação do Direito Humanitário por parte dos Estados, para o que tem poderes inclusive para investigá-los ou para servir de intermediário entre entes estatais em tratativas que envolvam matéria humanitária (PORTELA, 2009). A competência investigativa pode ser extraída do artigo 4º do Estatuto do CICV: "1. O papel do CICV será: c) empreender as tarefas determinadas pela Convenção de Genebra, trabalhar pelo cumprimento correto do Direito Internacional Humanitário em casos de conflitos armados e tomar conhecimento de quaisquer queixas baseadas em supostos casos de desrespeito deste direito; 2. Na qualidade de instituição neutra, independente e de intermediação, o CICV pode promover qualquer iniciativa humanitária que tenha relação com o seu papel, e pode examinar qualquer problema que necessite de análise por uma instituição deste tipo". 10 2.a. Direito Internacional Privado. Evolução histórica. Conflito de leis e espécies de normas. Embora consagrada, a expressão “direito internacional privado” costuma ser criticada, pois o ramo jurídico a que se refere integraria o direito interno e abrangeria, p. ex., questões processuais, alheias ao direito privado. De fato, o objeto do direito internacional privado inclui: (1) conflito de leis interespacial ou interpessoal (possibilidade de aplicação simultânea de mais de um sistema jurídico para regular determinada situação —para Dolinger (1997, p. 23), podem colidir até mesmo sistemas pessoais diversos, como os baseados em etnias—); (2) conflito de jurisdições; (3) cooperação jurídica internacional, incluindo o reconhecimento de sentenças estrangeiras. Na França, diversamente do que ocorre nos EUA, parte da doutrina inclui no DIPRI: (1) nacionalidade, i.e., caracterização dos nacionais do Estado; (2) condição jurídica do estrangeiro no País; por outro lado, exclui-se o que “não corresponde ao direito privado”, como, p. ex., extradição. Atualmente, a exemplo de Valladão, a doutrina brasileira tende a congregar a opção americana e a francesa, com algumas variações. Sécs. XII e ss.: comércio entre cidades do norte da Itália e entre províncias francesas cria situações de conflito de leis no espaço. 1849: a consolidação científica do DIPRI dá-se em 1849, em obra de Savigny, que propõe encontrar a sede da relação jurídica para determinar se aplicável a lei nacional ou estrangeira: “Abandonando o unilateralismo, a idéia que o legislador só poderia criar normas que se aplicassem em seu território e a seus nacionais, Savigny pregava a igualdade entre direitos e uma comunidade de direito entre as nações, a permitir o bilateralismo, isto é, a aplicação em pé de igualdade da lei nacional ou da lei estrangeira” (MARQUES, 2008, p. 335). Na América Latina, busca-se de modo pioneiro a codificação do DIPRI, a exemplo do Código Bustamante. Posteriormente, as cortes norte-americanas criticam a indiferença com o resultado material na solução do conflito de leis no método europeu e, nos anos 60, passam a considerar o resultado material na escolha da norma a ser aplicada especialmente em matéria contratual e de responsabilidade civil (busca da justiça substancial no caso concreto – Caso Babcock/1963: troca da regra de conexão clássica “lex loci delicti” pela flexível “proper law of the tort”). Na Europa, atualmente, a evolução do DIPRI, propulsionada pelas normas comunitárias, levou ao pluralismo de métodos (recurso a regras materiais de DIPRI e regras alternativas) e flexibilização das normas de conflito (cláusulas de exceção e adoção de princípios como o da proximidade). A evolução recente do DIPRI na América Latina, foi provocada pela OEA (CIDIPs), iniciativas do Mercosul e reformas legislativas em alguns países. No Brasil, o DIPRI tradicional está incorporado à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, e a evolução faz-se sentir especialmente nos tratados. Atualmente, as espéciesde normas de DIPRI não se limitam a princípios (tal qual a ordem pública) e regras de conexão clássicas (ou rígidas). Para alcançar resultados materialmente equitativos, hoje o DIPRI conta também com: (1) normas materiais: regulam a conduta, solucionando diretamente o caso; (2) normas narrativas: sem regular conduta, ditam diretrizes e fins, para a interpretação de outras normas (soft law); normas alternativas, como, p. ex., a aplicação da lei favorável ao consumidor; normas flexíveis: permitem ao juiz ou partes valorar elementos do caso concreto, para determinar a lei aplicável, p. ex. aplicando o princípio da proximidade. PALAVRAS-CHAVE: Direito internacional privado. Conflito de leis interespacial (Dolinger: ou interpessoal). Valladão alarga objeto do DIPRI. Comércio local na Itália e França (XII ...). Savigny 1849. Código Bustamante (AL). Princípios e regras de conexão clássicas (relativa indiferença com o resultado material). Babcock/1963. Pluralismo de métodos. Normas materiais, narrativas, alternativas e flexíveis. 11 2.b. Organização Internacional. Características. Evolução. Espécies e finalidades. Regime jurídico. Santa Sé. Prerrogativas e imunidades no Brasil. Item 1. Organização Internacional: entidades compostas por Estados por tratado multilateral (“Carta”) de caráter especial (natureza convencional e institucional), c/ aparelho institucional permanente (órgãos/agentes; em geral: órgão plenário/órgão executivo/secretariado) e personalidade jurídica própria de direito internacional (derivada= porque origina-se dos Estados) p/ cooperação internacional em temas de interesse comum. A personalidade jurídica ou está no ato constitutivo ou é inferida dos poderes/objetivos da organização e sua prática (vide “caso Reparação por ferimentos recebidos a serviço das N. Unidas”- CIJ: ONU tem direito à reparação pela morte de seu mediador (Folke Bernadotte) em Jerusalém/1948 e tem personalidade jurídica internacional objetiva (vale também perante Estados não membros) porque era indispensável p/ atingir seus objetivos/princípios. Não se confundem c/ ONG´s: entes privados c/ personalidade jurídica de direito interno que eventualmente atuam no âmbito internacional. (PORTELA). Item 2. Características: multilateralidade (mín. 3 membros); permanência (prazo indeterminado); institucionalização (órgãos/agentes próprios); voluntariedade da associação; poder normativo (interno: suas atividades; externo: p/ demais suj. de DIP); princípio majoritário (Mercosul é por consenso); controle (competência p/ supervisionar cumprimento de tratados/normas de seu âmbito); competência impositiva (impor suas decisões/ aplicar sanções). Item 3. Evolução: surgimento com evolução do Estado moderno e de uma ordem internacional que demandava cooperação internacional que a diplomacia não satisfazia. Surgiram as conferências internacionais: reuniões p/ tratar de problemas entre Estados. Após Congresso de Viena/1815: conferências internacionais regulares que ensejaram surgimento de “instituições internacionais” (SHAW). Séc. XIX: desenvolvimento de instituições internacionais não governamentais privadas (Comitê Internacional Cruz Vermelha/Associação de Direito Internacional) e também organizações internacionais públicas. Conceitos introduzidos por elas (encontros regulares/ secretariados permanentes/ decisão por maioria/ voto ponderado/ contribuição financeira proporcional) formam as bases das organizações internacionais do séc. XX: grande inovação é a abrangência global (ONU). Item 4. Espécies e finalidades: (REZEK):Quanto ao alcance: universal (maior número de Estados sem restrições geográfica/cultural/etc; ONU/Agências Especializadas da ONU como OIT/UNESCO) e regional (Estados com vínculo geográfico/cultural/histórico; Ex:OEA/Liga dos Estados Árabes-LEA/Mercosul); Quanto ao domínio temático: vocação política (principalmente paz e segurança – ONU/OEA) e vocação específica (fim econômico/financeiro/cultural/técnico. Ex: Agências Especializadas da ONU/FMI/OMS) (PORTELA):Quanto à natureza dos poderes exercidos: intergovernamentais (relação de coordenação com os membros; decisões por maioria/consenso) e supranacional (relação de subordinação: decisões imediatamente executáveis nos Estados) Item 5. Regime jurídico: como são criadas por tratados e estes devem ser interpretados/aplicados por meio do DIP, este é, em regra, o direito aplicável às organizações internacionais. A regulamentação interna da organização rege relações de trabalho/criação de órgãos/serviços administrativos. Se não há previsão, o DIP aplica-se subsidiariamente. O direito interno dos Estados rege: aquisição/arrendamento de terras, contratos de equipamentos/serviços, responsabilidade civil danos causados pela organização ou contra ela (SHAW). Item 6. Santa Sé: Cúpula governativa da Igreja Católica, não é Estado (embora tenha território/pop./governo; não preenche o critério teleológico= fins do Estado e não possui dimensão pessoal= nacionais); não é organização internacional e sim caso único de personalidade internacional anômala (REZEK). Atual configuração: Acordos de Latrão (1929): concordata+tratado político+convenção financeira (+ reconhecimento de propriedade de imóveis dispersos/plena soberania nos 44 hectares da colina vaticana = Estado da Cidade do Vaticano). Celebra concordatas: compromissos sobre as relações da Igreja c/ Estado. Item 7. Prerrogativas e imunidades no Brasil: As imunidades das organizações internacionais estão fundadas na necessidade para o efetivo exercício de suas funções (preservar independência). Prerrogativas e imunidades de representantes também é abordada em acordos sobre sedes entre as organizações e os Estados (em regra: imunidade de jurisdição interna/ inviolabilidade de prédios e arquivos/privilégios fiscais e monetários/liberdade de comunicação). Não existem regras generalizadas e sim acordos específicos. A ONU e suas Agências Especializas tem ampla imunidade prevista em sua Carta e Convenções Gerais de 1947(SHAW). No Brasil: STF (RE 578543/MT): cassou decisão do TST que não reconheceu imunidade da ONU/PNUD em reclamação trabalhista (a relativização da imunidade de jurisdição dos Estados estrangeiros é baseada na igualdade soberana e reciprocidade, distinguindo-se atos de império/gestão c/ base em norma costumeira internacional e não se aplica às organizações internacionais porque não têm as mesmas características daqueles). Sua imunidade tem fundamento em tratados (vontade dos Estados). Segundo REZEK, é possível que isso mude por coerência e face a interesses sociais relevantes para situação análoga a dos Estados. Obs: parecer consultivo da CIJ Imunidade ao processo legal (reconheceu imunidade de Cumaraswamy, Relatoria Especial da Comissão de Direitos Humanos da ONU sobre independência de juízes e advogados na Malásia em relação a palavras pronunciadas em entrevista publicada em jornal e que a Malásia tinha obrigação de informar seus tribunais sobre a decisão do Secretário Geral da ONU nesse sentido – SHAW). 12 2.c. Desaparecimento forçado como crime internacional. Crime de ius cogens. Normativa internacional. Imprescritibilidade. Desde a década de 80 a ONU se debruça sobre o tema do desaparecimento forçado, no entanto, foi apenas em 2006 que a Assembleia Geral aprovou a Convenção para Proteção de Pessoas Contra o Desaparecimento Forçado definindo-o como crime contra a humanidade. Na Convenção, os Estados comprometem-se a incluir o crime no código penal e garantir mecanismos para aplicação da lei nos seus territórios. O art. 7° do Estatuto do TPI também criminaliza a prática do desaparecimento forçado como crime contra a humanidade, sendo que sua competência está circunscrita aos ataques generalizados/ou em grande escala contra população civil, que tenha como autores não apenaso Estado, mas também organizações políticas e motivações políticas. Salienta-se que a categoria de crimes contra a humanidade surgiu ainda na década de 50, com o Tribunal de Nuremberg, sendo reafirmada no Estatuto de Roma. A normatividade internacional conta também com a Convenção Interamericana contra o Desaparecimento Forçado, que entrou em vigor em 1996, sendo considerada precursora na normativa internacional sobre o tema (HEINTZE, 2009:56). O crime de desaparecimento forçado é crime de lesa-humanidade e como tal abarcado pela Convenção sobre a Imprescritibilidade de Crimes de Guerra e Crimes contra a Humanidade de 1968, que foi assinada pelo Brasil, o q u a l , no entanto, não a ratificou, o que não impede sua aplicação a todos os Estados, conforme relembrou ex-presidente da Corte, A.A. Cançado Trindade, em seu voto separado no Caso Almonacid: que a configuração dos crimes contra a humanidade é uma manifestação mais da consciência jurídica universal, de sua pronta reação aos crimes que afetam a humanidade como um todo. Destacou que com o passar do tempo, as normas que vieram a definir os “crimes contra a humanidade” emanaram, originalmente, do Direito Internacional consuetudinário, e desenvolveram-se, conceitualmente, mais tarde, no âmbito do Direito Internacional Humanitário, e, mais recentemente no domínio do jus cogens, do direito imperativo (Almonacid, parágrafo 28). Esse entendimento foi um dos fundamentos para condenação do Brasil, Caso Gomes Lund e outros(Guerrilha do Araguaia) VS. Brasil, pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. Crimes contra a humanidade são reconhecidos como normas de ius cogens (conforme esposado no entendimento da Corte Interamericana), que é a norma aceita pela comunidade internacional de Estados que não permite nenhuma derrogação. Também chamada de norma peremptória ou cogente (Aragão, 2009:360). Dessas afirmações decorre a conclusão de imprescritibilidade do crime de desaparecimento forçado: 1) regras de ius cogens não estão sujeitas à prescrição, além, como já dito, 2) da natureza de crime contra a humanidade, também não prescritíveis. Ademais, a jurisprudência Internacional, inclusive da Corte Interamericana, também alude à natureza permanente do crime de desaparecimento forçado, que embora não seja em si um fator de imprescritibilidade, impede a contagem do prazo prescricional, enquanto desaparecida a pessoa, impedindo a alegação da prescrição do crime pelo Estado infrator. Palavras-Chave: Desaparecimento forçado- Crimes contra Humanidade – ius cogens – imprescritibilidade. 13 3.a. Espaços Globais Comuns. Princípios. Patrimônio Comum da Humanidade. Alto Mar. Fundos Marinhos. Antártica. Ártico. Espaço Sideral. 1. ESPAÇOS GLOBAIS COMUNS: Também conhecidos como “patrimônio comum da humanidade” (res communnis, diferente de res nullius), constituem territórios sobre os quais inexiste soberania de qualquer Estado ou cuja utilização suscite especial interesse de mais de Estado soberano, ainda quando sujeito à determinada soberania. Todos podem explorar os espaços comuns. Seus princípios são 1) impossibilidade de apropriação nacional; 2) liberdade de acesso pesquisa e exploração; e 3 ) não-militarização. Atualmente, tais áreas são somente o mar, o espaço aéreo, as zonas polares, o espaço extra-atmosférico (PORTELA, 588). OBS.: Existem áreas que, embora pareçam de grande importância para a humanidade, não são consideradas domínio público internacional. São elas a Amazônia, o Saara e a Sibéria. 2. ALTO MAR: É a parte do mar sobre a qual não incide o poder soberano de qualquer Estado, tendo eles, no entanto, alguns deveres, tais como o de prestar assistência, impedir e punir o transporte de escravos, combater a pirataria e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes. Princípios: liberdade de navegação e sobrevoo, colocação de cabos e dutos submarinos, construção de ilhas artificiais e instalações congêneres e pesquisa. Jurisdição: a preservação da ordem se dá pelo conceito de nacionalidade do navio e a consequente jurisdição do país de registro sobre a embarcação em alto mar (princípio da exclusividade de jurisdição; caso Lotus). Nacionalidade das embarcações: a nacionalidade deve ser única, não pode ser de conveniência, mas sim efetiva (ligação genuína). O navio deve sempre navegar com a bandeira do Estado de registro hasteada. 3. FUNDOS MARINHOS: Compreendem as áreas subaquáticas, o leito e o subsolo das águas internacionais, que não pertencem a nenhum Estado. São também conhecidos como “Área” na Convenção de Montego Bay (1982). Princípios: a área e seus recursos são insuscetíveis de apropriação, mas os minerais eventualmente extraídos são alienáveis; a exploração deve necessariamente reverter em prol da humanidade em geral (benefícios distribuídos equitativamente) pela Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos. 1) Estágio inicial (regime de Estados em reciprocidade): os Estados começaram a promulgar leis internas para estabelecer uma estrutura provisória de pesquisa e exploração da área, normalmente com uma política fundada em reciprocidade, i.e., reconhecimento mútuo de licenças de exploração e de regimes tributários. 2) Estágio atual (acordo de 1994 sobre a Implementação dos Dispositivos da Convenção de 1982 sobre o Direito do Mar Referente ao Leito Oceânico): iniciativa da ONU para evitar conflito de regimes estabelecidos autonomamente pelos Estados. 4. ANTÁRTIDA: Junto com o Ártico, é uma das duas zonas polares do mundo. Trata-se de um continente coberto de gelo, que foi regulado pelo Tratado da Antártica (1959) fulcrado em 4 pontos nodais: suspensão de reivindicações territoriais, não-militarização, preservação ambiental e liberdade de pesquisa científica. Princípios: interesse de toda a humanidade no uso pacífico da Antártida e relevância das pesquisas científicas para todos. 5. ÁRTICO: Ao contrário da Antártica, o Ártico não é uma massa de terra, mas meramente uma região formada pelo congelamento das águas, daí porque seu regime se confunde enormemente com os regimes territorial países próximos e de alto mar (v. caso Groelândia Oriental, para aprofundar sobre regime de ocupação do Ártico). Não conta com regramento específico. 6. ESPAÇO SIDERAL: Noção que ganhou espaço após a corrida espacial, informada pelos princípios da cooperação e do pacifismo relativo (a Lua só pode ser usada para fins pacíficos; no entanto, sua órbita comporta o uso de material militar, vedado, entretanto, o uso de armas nucleares e quaisquer artefatos de destruição em massa). 14 3.b. Direito tributário internacional. Conceito. O fenômeno da bitributação. Acordos de bitributação. 1. Conceito de Direito Tributário Internacional. “[…] normas editadas em nome do Direito Internacional Tributário são aquelas produzidas mediante acordos de vontades de distintos Estados soberanos, através de órgãos e procedimentos por eles em conjunto estipulados para tanto. Poderíamos dizer, com segurança, que as principais normas que integram tal ramo didaticamente autônomo do direito são os tratados internacionais em matéria tributária. […] Por outro lado, as normas do Direito Tributário Internacional são normas internas, dotadas daquilo que cursivamente se denomina elemento de estraneidade” (BASSANEZE, 2003, p. 436). 2. O fenômeno da bitributação. Consiste na dupla imposição de tributos sobre as transações comerciais, decorrente da intensificação e da dinâmica do comércio exterior. Nas palavras de Heleno Tôrres, a bitributação internacional significa o “fenômeno por meio do qual um único fato implica obrigações semelhantes impostas por mais de um Estado soberano, imputando, ao mesmo contribuinte, impostos análogos”. A bitributação internacional cria obstáculosàs transações comerciais internacionais, prejudicando a competitividade do Estado. Em razão disso, é importante que o Brasil implemente uma política fiscal no sentido de limitar o exercício de sua competência tributária. Vale a pena trazer à baila o entendimento do doutrinador Eduardo Sabagg, quando aborda a relação entre o direito tributário e o direito internacional público, nos seguintes termos: “há forte laço comunicante entre as searas jurídicas em destaque, uma vez imprescindível o devido tratamento a ser dado aos tratados e convenções internacionais, com o fito de inibir a bitributação internacional, ao lado da inafastável necessidade de sistematização dos impostos aduaneiros, perante suas implicações no plano econômico interno.”(SABAGG, 2012, p. 54). 3. Acordos de bitributação. Os acordos de bitributação são os instrumentos de que se valem os Estados para evitar ou mitigar os efeitos da bitributação por meio de concessões mútuas. No Brasil, há inúmeras Convenções para evitar a bitributação da renda e evitar a evasão, em que é acordado critério uniforme para que a tributação se dê apenas em um dos países, ou seja, só no de residência ou só no de percepção da renda. Para tanto é que foi firmada a Convenção Brasil-Chile para evitar a dupla tributação, promulgada pelo Decreto 4.852/03 e a Convenção Brasil-África do Sul, promulgada através do Decreto 5.922/06, dentre muitas outras. Observação: Segundo Leandro Palsen, o Brasil não é membro da Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OCDE), mas adota, ao menos parcialmente, muitos dos seus Modelos de Convênio, inclusive relativos à dupla tributação da renda. 15 3.c. Princípio uti possidetis. Descobrimento e ocupação como critérios de aquisição territorial. 1. Princípio do uti possidetis: decorre da expressão uti possidetis, ita possideatis, que significa “quem possui de fato, deve possuir de direito”. Tradicionalmente, implica reconhecer que as terras ocupadas por um povo, a ele pertencem. Foi esse sentido que orientou sua aplicação pelo Tratado de Madri (1750), celebrado entre Portugal e Espanha para substituir o Tratado de Tordesilhas. Neste exemplo histórico, definiu-se que as terras habitadas por portugueses eram terras portuguesas, garantindo a Portugal a maior parte do que hoje constitui o território brasileiro. De origem latino-americana, este princípio contempla duas variantes, que foram suscitadas no âmbito do processo de descolonização da América Latina: a uti possidetis iuris e a uti possidetis facto. A primeira informa que as fronteiras dos países são aquelas originalmente definidas nos tratados e acordos firmados pelas antigas metrópoles. Pela segunda variante, devem ser consideradas a posse de fato para a definição dos limites territoriais, sendo frequentemente designado pela CIJ como “efetividades”, que significa a consideração do efetivo exercício da soberania sobre determinado território. Aplicação moderna: Corte Internacional de Justiça – Caso Burkina Faso e Mali (1986). Uti possidetis é um princípio geral, conectado logicamente com o fenômeno da obtenção de independência, onde que ele ocorra. Seu propósito é impedir que a independência e estabilidade de novos Estados sejam ameaçadas por lutas fatricidas provocadas pela mudança de fronteiras após a retirada do poder que administrava o local (colonizadores). Corte Internacional de Justiça – Caso Noruega vs Dinamarca (1932). A necessidade de ocupação efetiva do território tornou-se um costume internacional e, neste caso, a Dinamarca, que possuía e exercia soberania sobre toda a ilha da Groelândia, teve reconhecida a incorporação do território, independente de, ao longo dos anos, os cidadãos noruegueses terem levado a cabo uma série de atividades na ilha. Assim, a declaração de ocupação promulgada pelo governo Norueguês, em julho de 1931, e quaisquer outras medidas tomadas nesse sentido, foram uma violação à situação jurídica existente à época e, dessa forma, ilegais e inválidas. Corte Internacional de Justiça – Caso da península de Bakassi e a área do Lago Chad (Camarões vs. Nigéria, intervenção da Guiné Equatorial). A Corte afirmou que, no que tange aos limites territoriais, atua seguindo certos princípios: 1) dá primazia aos tratados anteriores (interpreta-os até deles extrair delimitação clara e completa); 2) effectivités (atos de soberania e consolidação histórica) alegadas pela Nigéria não prevalece sobre o título de Camarões; 3) valorização do uti possidetis iuris favorecendo Camarões. Corte Permanente de Arbitragem – Caso EUA vs Holanda (1928). A efetividade da ocupação do critério da decisão no caso das Ilhas de Palmas para a Holanda. 2. Descobrimento e ocupação como critérios de aquisição territorial: O território é a base física ou o âmbito espacial do Estado, onde ele se impõe para exercer, com exclusividade, a sua soberania. No passado era comum que os Estados que faziam parte das potências navais adquirissem território por descoberta, seguida da ocupação efetiva (com o exercício contínuo ou a demonstração efetiva de soberania) ou presumida. A descoberta tinha por objeto a terra desabitada (terra nullius – ‘terra de ninguém’) ou habitada por povos que não seguiam o modelo de organização estatal e que não estavam sob o poder de nenhuma soberania. Outro modo de aquisição de território no passado, embora não tão frequente, foi a terra derelicta, ou seja, a terra abandonada por seu antigo descobridor, cujo estatuto jurídico equivalia ao da terra nullius. A partir da ocupação da terra desabitada ou abandonada, novos territórios eram adquiridos por contiguidade, ou seja, pelo avanço da ocupação para terras adjacentes até que se encontrasse outra soberania. Depois de descoberto, o Estado se instalava nesse território, a fim de manter a efetividade da posse, conservando o seu domínio. Assim, pode-se dizer que as condições necessárias para que a ocupação seja considerada legítima, são as seguintes: a) ser o território res nullius; b) ter sido a sua posse tomada para o Estado e em nome dele; c) ser real e efetiva a posse exercida pelo Estado sobre o território res nullius; e d) ser a ocupação formalmente notificada aos demais membros da sociedade internacional. Daí se entender que a descoberta faz nascer para o Estado-descobridor um título condicionado, oponível aos outros Estados enquanto não contestado pela presunção juris tantum de veracidade (e da efetividade por um período razoável) dos atos ocupatórios. 16 Ponto 4.a. Estados. Autodeterminação dos Povos. Reconhecimento do Estado e Governo. Direitos e Deveres. Território: aquisição e perda. Faixa de Fronteira. Rios Internacionais e Regimes Fluviais. Domínio Aéreo. Legislação básica: Convenção dos Direitos e Deveres dos Estados de 1933 (Montevidéu); art. 1º, cap. 1 da Carta da ONU; art. 1º, do PIDCP e PIDESC; art. 15 da DUDH; art. 1º da Lei 6.634/79; Convenção de Varsóvia de 1929 (Decreto 20.704/31); Convenção de Chicago de 1944 (Decreto 21.713/46); Convenção de Montreal de 1999 (Decreto 5910/06); arts. 31 a 33, 48 a 51 da CV sobre Direitos dos Tratados de 1969; Convenção de Viena de 1986; art. 337 do CPC; arts. 5º, 14 e 16 da LINDB. Estados. Noções Gerais: Estado pode ser definido como um agrupamento humano, estabelecido permanentemente num território determinado e sob um governo independente (Accioly, 2002, p.83). Estado não se confunde com o conceito de nação ou povo (grupos sociais unidos por afinidades culturais, históricas, étnicas e religiosas), já que as nações podem estar espalhadas por vários Estados, e o território de um ente estatal específico pode conter diversas nações. Elementos Constitutivos: Para a Convenção dos Direitos e Deveres dos Estados (art. 1), o Estado, como pessoa de direito internacional,possui os seguintes requisitos: população permanente, território determinado, governo soberano e capacidade de firmar relações com os demais Estados. Para alguns (SHAW, p. 199), essas disposições não são exaustivas ou imutáveis, de modo que outros fatores podem ser relevantes, dentre eles os aspectos relativos à autodeterminação dos povos e o reconhecimento dos Estados na seara internacional. Autodeterminação dos povos. Noções Gerais: O conceito de autodeterminação dos povos está intimamente relacionado à noção de povo (elemento humano constitutivo do Estado) e de soberania (elemento governo constitutivo do Estado). No tocante ao conceito de povo, muitos autores diferenciam os termos “povo” e “população”: ideia de “povo” está ligada ao conjunto de pessoas naturais, vinculadas juridicamente a um ente estatal por meio da nacionalidade (Portela, 2014, p.175), enquanto que “população” se refere a todas as pessoas presentes no território do Estado, num determinado momento, inclusive estrangeiros e apátridas (Bonavides, ciência política, p.68). Já a soberania pode ser compreendida, no âmbito interno, como o poder que tem supremacia sobre as pessoas, bens e relações jurídicas dentro de um dado território; no âmbito internacional, como a independência do ente estatal em relação à outros Estados, tendo como um de seus corolários o princípio da não-intervenção nos assuntos internos de outros Estados. Aqui, alguns autores lembram a possibilidade de um ente estatal ser aceito como independente, mesmo quando algumas funções de governo são colocadas nas mãos de um organismo externo, a exemplo do que ocorreu com a Bósnia e Herzegovina no Acordo de Paz de Dayton de 1955 (SHAW, p. 203). Através de tais conceitos, tem-se que a autodeterminação dos povos é o princípio que garante à todo povo de um país o direito de se autogovernar, tomar suas escolhas sem intervenção externa, o direito à Soberania (de um povo determinar seu próprio status político). Seria o direito que o povo de determinado país tem de escolher como será legitimado o direito interno sem influência de qualquer outro país. A CIJ, ao manifestar-se sobre o caso de Timor Leste, entendeu que a autodeterminação dos povos tem caráter erga omnes. Reconhecimento do estado e governo. Conceito: trata-se de instituto ligado à capacidade de um ente estatal manter vínculos com outros Estados e organismos internacionais, inserindo-se na dinâmica das relações internacionais. I- Reconhecimento de Estado: é um ato unilateral pelo qual um ente estatal constata o aparecimento de um novo Estado e admite as consequências jurídicas desse fato (ex: estabelecimento de relações jurídicas). Características: a) Ato declaratório (maioria doutrinária): apenas atesta o surgimento do novo estado, de modo que o Estado que “reconhece” apenas aceita a personalidade do “reconhecido” (não o constitui, não é seu elemento essencial, não define a existência do próprio ente, como defendido pela corrente minoritária). Art. 3 da Convenção de Montevidéu (a existência política de um Estado é independente do seu reconhecimento pelos demais); b) Ato discricionário (fundado em razões de interesse nacional); c) Não obrigatório (não é um dever do Estado que o concede nem um direito do Estado que o requer); d) Incondicionado (apesar de se exigir o respeito às normas jus cogens pelo novo Estado); e) Retroativo (gera efeitos a partir do instante em que se forma o Estado); f) Irrevogável; g) Expresso ou tácito; h) Pode ser concedido sem qualquer solicitação; i) Pode ser individual (feito só por um Estado) ou coletivo (concedido a um grupo de Estados). Efeitos: o Estado reconhecido pode celebrar tratados, participar de organizações internacionais, manter relações diplomáticas, utilizar de mecanismos judiciais internos no Estado que o reconhece e a ter direito de propriedade sobre os bens existentes no território do Estado que o reconhece. II- Reconhecimento de Governo: é o ato pelo qual um Estado admite um novo governo de outro Estado como representante deste nas relações internacionais. Aplica-se apenas aos governantes cuja investidura resulte de rupturas da ordem constitucional anterior (ex: golpes de Estado). O reconhecimento de Governo não altera o reconhecimento de Estado anterior. Características: unilateral, discricionário, não obrigatório, irrevogável e incondicionado. Duas doutrinas principais � Doutrina Tobar (Equador, 1907): só deve ser concedido o reconhecimento de governo quando este último contar com o apoio popular (adotada pelos EUA); Doutrina Estrada (México, 1930): o não reconhecimento ou o reconhecimento expresso de um novo governo é uma intervenção indevida em assuntos internos de outros entes estatais (caso o Estado esteja insatisfeito com o novo governo de outro Estado, deve apenas romper relações diplomáticas com ele). Direitos e deveres. Consagrados em costumes e normas escritas (Convenção de Montevidéu). Direitos: Convenção consagra os direitos de o Estado: existir independentemente de reconhecimento; ainda que não reconhecidos, a defesa de sua integridade, conservação, prosperidade e independência; de legislar sobre seus interesses, administrar seus serviços e determinar a jurisdição/competência de seus tribunais; Direito à conservação: território do Estado é inviolável, não podendo se objeto de ocupação militar ou de qualquer medida de força temporária ou permanente (salvo: legítima defesa ou ação internacional voltada a manter ou restaurar a paz e a segurança internacional). Direito à soberania: confere tanto direito à liberdade (possibilidade de determinar autonomamente seus rumos) como de exercer jurisdição sobre todas as pessoas que se encontrem em seus territórios. Deveres: proteger igualmente nacionais e estrangeiros (embora estes não possam exigir direitos diferentes ou mais extensos que dos nacionais); não intervirem em assuntos da soberania de outros estados; busca de solução de controvérsias entre si de forma pacífica; e dever de não reconhecer aquisições territoriais ou quaisquer outras vantagens obtidas pela força ou coação. 17 Territórios. É o espaço físico dentro do qual o Estado exerce seu poder soberano. Composição: solo, águas interiores e fronteiriças (até o limite com o ente estatal vizinho). Estado exerce jurisdição: sobre o subsolo abaixo da área que ocupa, o espaço aéreo acima de suas fronteiras, mar territorial, plataforma continental e ZEE. Não fazem parte do território: embaixadas e consulados no exterior; embarcações e aeronaves militares (em qualquer lugar); embarcações e aeronaves civis (águas e espaço aéreo internacionais). Elemento que integra o conceito de Estado é território (e não território estável). Logo, a qualidade de ente estatal não é afetada quando parte de seu território não está sobre o controle do governo (guerras civis, invasão estrangeira e disputa de fronteiras). Formas de Aquisição: no passado, descoberta, posse, ocupação da terra desabitada, conquista militar de áreas pertencentes a outros Estados (método atualmente considerado ilícito, sendo vedadas guerras de conquista e ações militares para anexações de territórios); no presente, negociações internacionais, cessão, adjudicação (decisão tomada por mecanismo internacional de solução de controvérsia), acessão (forças da natureza, como aluvião ou avulsão), a título gratuito ou oneroso. Perda do território: com a aquisição por outros Estados. Faixa de fronteira. A zona de fronteira é constitucionalmente definida como a faixa de até 150km de largura, ao longo das fronteiras terrestres, considerada fundamental para defesa do território nacional (art. 20, § 2º). Conceito: trata-se de limite físico do território e do exercício de poder do Estado; são normalmente estabelecidas por tratados (embora possa ser provenientes de arbitragem ou mediação). Podem ser naturais (resultantes de acidentes geográficos, como rios e cordilheiras)
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