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AULA 15 O FENÔMENO DA SOLIDIFICAÇÃO A Solidificação é um fenômeno universal de grande importância científica e tecnológica. A solidificação é uma transição de estado, de líquido para sólido; todas as transições são caracterizadas por mudanças bruscas nas propriedades dos materiais. Os átomos no estado líquido possuem muito mais mobilidade do que os átomos no estado sólido. O controle do tamanho e forma do grão, da homogeneidade e da integridade do material sólido pode ser feito, na solidificação, pelo controle das velocidades de nucleação e de crescimento de fases. O controle adequado da velocidade de solidificação é uma ferramenta tecnológica essencial para se melhorar e obter novas propriedades como, por exemplo, a purificação de materiais. A importância da solidificação é notável em metais e ligas metálicas, mas os seus princípios podem ser usados em qualquer material, como polímeros, vidros, biomateriais, etc. Um exemplo comum: a solidificação de um lingote metálico (um lingote de aço), é frequentemente utilizada para se descrever, em linhas gerais, o fenômeno. O lingotamento contínuo é um estágio muito importante na fabricação de aços, alumínio e cobre, entre outros metais, e produz placas e barras, que são, posteriormente, trabalhadas a frio ou a quente até sua forma final. SOLIDIFICAÇÃO DE METAIS Os grandes lingotes, que devem ser resfriados lentamente, requerem aditivos a fim de se induzir um aumento da taxa de nucleação (heterogênea), se se deseja a estrutura do metal com granulação fina. As primeiras partes do lingote de um metal puro a se solidificarem estão próximas das paredes do molde, que prontamente conduzem para fora o calor. Em seguida, é o topo do lingote que se solidifica. Consequentemente, o líquido restante ficará envolvido pelo sólido. Como a maioria dos líquidos puros (monocomponentes) se contrai na solidificação, a contração do líquido no centro do lingote leva à formação de vazios. Para que isso seja evitado, a prática comum é manter quente o topo do lingote, usualmente pela adição de compostos que se decompõem exotermicamente. À medida que o líquido se solidifica, o calor é liberado, pois a entalpia do sólido é muito menor que a do líquido. Este calor deve ser conduzido para fora, através das paredes do molde, sendo o fluxo de calor sempre perpendicular à superfície das paredes. O primeiro material a solidificar-se, junto à parede do molde, tem granulação fina e os grãos têm orientações cristalográficas aleatórias (ao acaso). Esta região é denominada zona coquilhada. O material do interior do lingote resfria-se mais lentamente e a solidificação ocorre em temperatura mais alta. Os grãos próximos à superfície crescem para dentro na direção contrária do fluxo de calor, que flui para fora. Os cristais se tornam maiores que os da zona coquilhada, e alongados, com os comprimentos maiores paralelos à direção do fluxo de calor (normais às paredes do molde). Esta região é denominada zona colunar. Os grãos colunares não são orientados aleatoriamente. Em geral, os cristais crescem mais rapidamente em certas direções. Quando um metal líquido é vazado num molde, a temperatura do líquido, a uma pequena distância das paredes, cai abaixo da temperatura de solidificação. É produzido um considerável super-resfriamento nessa região mais externa e a velocidade de nucleação heterogênea é relativamente grande. Desse modo, a taxa de nucleação de grãos é alta na zona coquilhada e os grãos crescem pouco com orientação qualquer. Já na zona colunar, a taxa de nucleação é pequena e predomina o crescimento dos cristais. Logo que a nucleação se inicia na zona coquilhada, a temperatura dessa região começa a subir novamente como resultado da liberação de calor latente de fusão. Quando isso ocorre, há a diminuição da temperatura à frente da interface entre zona coquilhada e líquido. Então, os cristais da zona coquilhada presentes na interface lançam ramos cristalinos para dentro do líquido super-resfriado, iniciando a formação da zona colunar. Algumas vezes os grãos colunares ramificam-se e estes ramos se ramificam de novo (ramificações secundárias), podendo surgir até mesmo ramificações terciárias a partir das secundárias. Os grãos resultantes são então chamados dendritas, termo derivado da palavra grega dendron, que significa "árvore”, pois o cristal ramificado resultante tem a aparência de um pinheiro. As Figuras seguintes apresentam uma representação esquemática do estágio inicial do crescimento dendrítico. Na solidificação de metais puros, os grãos colunares poderão crescer até o centro do molde. No caso de ligas metálicas, haverá a formação de grãos equiaxiais na zona central, cujo crescimento é limitado por grãos vizinhos semelhantes, que foram nucleados aproximadamente ao mesmo tempo. As Figuras abaixo mostram uma animação do processo de solidificação de uma liga onde ocorre formação de grãos na zona central do molde. Segregação do Soluto Numa mistura líquido-sólido, é importante observar que o líquido e o sólido não têm a mesma composição. Considere o exemplo do diagrama hipotético da figura que mostra um trecho do diagrama de equilíbrio para a segregação do soluto na solidificação. A segregação do soluto deste tipo é também útil para purificação por um método semicontínuo chamado de solidificação direcional. Técnicas similares são conhecidas pelos nomes de fusão zonal e refino por zona. Por estas técnicas é possível purificar lingotes de metais e ligas até um nível de impurezas de algumas partes por bilhão (ppb). Evidentemente, é necessário que o metal ou a liga apresentem um diagrama de fases adequado para este método. Foi através desta técnica que se produziram os materiais semicondutores silício (Si) e germânio (Ge) utilizados nos primeiros transístores comerciais. A obtenção de semicondutores e metais ultrapuros em escala industrial possibilitou o surgimento da indústria de semicondutores e da chamada "era da informática" desde os anos sessenta do século XX. No caso de metais e ligas comuns, geralmente a solidificação longe do equilíbrio produz resultados inconvenientes, tais como porosidade, crescimento de grão colunar, zonado, que é usualmente de composição muito heterogênea. Para se obter estruturas de granulação fina, não colunares, podem ser utilizados nucleantes artificiais. A porosidade pode ser eliminada pela adição de ligas metálicas que produzem reações exotérmicas na parte superior do lingote. Um tratamento térmico do sólido em temperatura elevada homogeneizará a composição. Recristalização e Crescimento de Grão em Materiais Metálicos Policristalinos O fenômeno chamado de deformação plástica dos metais modifica a estrutura interna do metal ou liga metálica. Os cristais deformados plasticamente possuem mais energia que os não deformados, pois tiveram suas concentrações de deslocações (ou discordâncias), lacunas e outras imperfeições pontuais aumentadas. Denomina-se encruamento ao fenômeno pelo qual ocorre um aumento da dureza e da resistência mecânica de um material metálico dúctil, como resultado da deformação plástica. Como a deformação é efetuada numa temperatura que é uma pequena fração do valor da temperatura de fusão do material (Tfusão >>> Tdef. a frio ), fenômeno também é chamado de trabalho a frio. Para que a recristalização se realize é necessário a ativação térmica. Em primeiro lugar, um excesso de defeitos puntiformes que tenham sido gerados (usualmente lacunas), desaparece quandose atinge a concentração de equilíbrio. As lacunas desaparecem em baixas temperaturas. Em segundo lugar, em temperaturas mais altas as tensões internas são parcialmente aliviadas pelo rearranjo da estrutura de deslocações. Parte da energia interna de deformação, armazenada pelo trabalho a frio, é liberada em virtude do movimento das deslocações, resultado de um aumento da difusão atômica. As deslocações se movem de modo a cancelar seus campos de tensão de longo alcance. Este segundo processo, chamado recuperação, necessita de uma energia de ativação mais elevada que aquela requerida para a aniquilação de defeitos puntiformes e, portanto, só ocorre em temperaturas mais altas. Finalmente, em temperaturas ainda mais elevadas, a alta densidade de deslocações é fortemente reduzida pela nucleação e crescimento de novas fases do material. Este processo, chamado recristalização, elimina completamente os efeitos da deformação plástica. A Figura apresenta, de forma qualitativa, para uma liga metálica qualquer, um esquema que descreve a influência da temperatura de recristalização sobre os limites de resistência mecânica (tração e ductilidade). Como foi observado, a força motriz para a recristalização provém da energia armazenada durante o trabalho a frio. A temperatura de recristalização se aproxima de um valor constante (ou valor limite) em deformações mais elevadas. Denomina-se deformação crítica ao percentual de trabalho a frio abaixo do qual a recristalização não ocorre. O gráfico mostra a relação entre a temperatura de recristalização e o percentual de trabalho a frio. O crescimento de grão é o processo pelo qual o tamanho médio de grão aumenta continuamente durante o tratamento térmico. Os grãos livres de deformação continuarão a crescer, se o material é deixado a uma temperatura elevada. Este crescimento não precisa ser precedido por processos de recuperação e recristalização. A força motriz para o crescimento dos grãos é a redução da área superficial total do grão. Quando os grãos crescem em tamanho e decrescem em número, a área do contorno de grão diminui e, assim, a energia de superfície decresce. A Figura apresenta uma representação esquemática do crescimento de grão por movimentação atômica através do contorno. Grãos com pequeno número de lados tendem a desaparecer enquanto grão com seis (hexágonos) ou mais número de lados tendem a crescer absorvendo os menores. DISCUSSÃO SOBRE AS OPERAÇÕES DE CONFORMAÇÃO As operações de conformação consistem naquelas onde a forma de uma peça metálica é alterada mediante deformação plástica. Obviamente, a deformação deve ser induzida por uma força ou tensão externa, cuja magnitude deve exceder o limite de escoamento do material. A maioria dos materiais metálicos é suscetível a esses procedimentos, sendo pelo menos moderadamente dúcteis e capazes de sofrer alguma deformação permanente sem trincar ou fraturar. Quando a deformação é obtida a uma temperatura acima daquela na qual a recristalização ocorre, o processo é conhecido por trabalho a quente; de outro modo, o processo é conhecido por trabalho a frio. No caso das operações de trabalho a quente são possíveis grandes deformações, que podem ser repetidas sucessivamente, pois o metal permanece mole e dúctil. Ainda, as exigências em relação à energia de deformação são menores do que as energias para o trabalho a frio. Contudo, alguns metais experimentam alguma oxidação da sua superfície, o que resulta em perda do material e em um deficiente acabamento final da superfície. O trabalho a frio produz um aumento na resistência com uma consequente redução na ductilidade, uma vez que o metal 'encrua'. De qualquer forma, vamos neste momento oportuno, fazer algumas considerações. As vantagens em relação ao trabalho a quente são uma melhor qualidade do acabamento superficial, melhores propriedades mecânicas e uma maior variedade dessas, bem como um controle dimensional mais preciso da peça acabada. Ocasionalmente, a deformação total é obtida mediante uma série de etapas onde a peça é submetida sucessivamente a pequenas magnitudes de trabalho a frio, sendo então submetida a um processo de tratamento térmico; entretanto, esse é um procedimento caro e inconveniente. Vejamos agora algumas técnicas de conformação. O "recozimento" é um tratamento térmico comparável, onde a dureza de uma microestrutura mecanicamente deformada é reduzida em altas temperaturas. A compreensão dos detalhes desse desenvolvimento microestrutural fica mais bem compreendidos quando exploramos quatro termos: trabalho a frio, recuperação, recristalização e crescimento de grão. TRABALHO A FRIO Como discutido, trabalho a frio significa deformar mecanicamente um metal em temperaturas relativamente baixas. Esse conceito relaciona o movimento de discordâncias com a deformação mecânica. A quantidade de trabalho a frio é definida com relação `a redução na área da seção transversal da liga por processos como laminação e estiramento. Veja na figura abaixo essa demonstração. Observe nessas ilustrações esquemáticas que a redução na área, causada pela operação de trabalho a frio, está associada à orientação preferencial dos grãos. A porcentagem de trabalho a frio é dada por onde A0 é a área da seção transversal original e Af é a área da seção transversal final após o trabalho a frio. A dureza e resistência das ligas são aumentadas com o aumento da % TF, um processo chamado de endurecimento por encruamento. O mecanismo para esse endurecimento é a resistência à deformação plástica causada pela alta densidade de discordâncias produzidas no trabalho a frio (lembre-se das discordâncias estudadas). A densidade das discordâncias pode ser expressa como o comprimento das linhas de discordância por unidade de volume (por exemplo, m/m3 ou unidades líquidas de m-2). Acesse nesse o link para acompanhar uma interessante representação esquemática do tamanho de grão recristalizado em função do encruamento prévio: http://cienciadosmateriais.org/index.php?acao=exibir&cap=12 Entenda, caro(a) aluno(a), que uma liga recozida pode ter uma densidade de discordâncias tão baixa quanto 1010 m-2, com uma dureza correspondentemente baixa. Uma liga altamente trabalhada a frio pode ter uma densidade de discordâncias tão alta quanto 1016 m-2, com uma dureza (e resistência) significativamente mais alta. Uma microestrutura trabalhada a frio aparece na figura. Os grãos severamente distorcidos são bastante instáveis. Levando a microestrutura a temperaturas mais altas, onde está disponível uma mobilidade atômica suficiente, o material pode ser amolecido, e uma nova microestrutura pode surgir. Exemplos de operações de trabalho a frio: (a) laminação a frio de uma barra ou chapa e (b) estiramento a frio de um fio. RECUPERAÇÃO O estágio mais sutil do recozimento é a recuperação. Nela não ocorre qualquer mudança microestrutural visível. A mobilidade atômica, porém, é suficiente para diminuir a concentração de defeitos pontuais dentro dos grãos e, em alguns casos, permitir que as discordâncias se movam para posições de energia mais baixa. Esse processo gera uma diminuição modesta na dureza e pode ocorrer em temperaturas logo abaixo daquelas necessárias para produzir mudanças microestruturais significativas. Embora o efeito estrutural da recuperação (principalmente o número reduzido de defeitos pontuais) produza um efeito modesto no comportamento mecânico, a condutividade elétrica aumenta significativamente. RECRISTALIZAÇÃO O resultado microestruturalda exposição a temperaturas onde a mobilidade atômica é suficiente para afetar as propriedades mecânicas é chamado de recristalização (a) (b) e ilustrado drasticamente na figura a. Novos grãos equiaxiais3, livres de tensão, nucleiam em regiões de alta tensão na microestrutura trabalhada a frio, figura b. Esses grãos, então, crescem juntos até constituírem a microestrutura inteira, como mostrado em c e d. Como a etapa de nucleação ocorre para estabilizar o sistema, não é surpresa que a concentração de novos núcleos de grãos aumente com o grau de trabalho a frio.A diminuição na dureza devido ao recozimento é substancial. Finalmente, a regra prática citada no início desta discussão da recristalização efetivamente define a temperatura de recristalização. Para determinada composição da liga, a temperatura precisa de recristalização dependerá ligeiramente da porcentagem do trabalho a frio. Valores mais altos de % TF correspondem a graus mais altos de endurecimento por encruamento e temperaturas de recristalização mais baixas; ou seja, menor fornecimento de energia térmica é exigido para iniciar a reforma da microestrutura. CRESCIMENTO DE GRÃO A microestrutura desenvolvida durante a recristalização ocorre espontaneamente. Isso pode ser visto na figura d. A microestrutura recristalizada, porém, contém uma grande concentração de contornos de grão. Observamos frequentemente, que a redução dessas interfaces de alta energia é um método para maior estabilização de um sistema. O engrossamento das microestruturas recozidas pelo crescimento de grão é um exemplo desse tipo. A figura e ilustra o crescimento de grão, que não é diferente da união de bolhas de sabão, um processo controlado de modo similar pela redução da área superficial. (a) (b) (c) (d) (e) (a) bronze trabalhado a frio (deformado por roletes, de modo que a área da seção transversal da peça foi reduzida em um terço; (b) aparecimento de novos grãos, após 3 s a 580 ºC; (c) muito mais grãos novos surgem, após 4 s a 580 ºC; (d) ocorrência da recristalização completa, após 8 s a 580 ºC; (e) ocorrência de substancial crescimento de grão, após 1 h a 580 ºC. Todas as micrografias possuem uma ampliação de 75X. Acesse ao link para visualizar simulações da etapa de crescimento de grão: http://cienciadosmateriais.org/index.php?acao=exibir&cap=21 Observe agora a figura abaixo. Ela mostra que o estágio de crescimento de grão produz pouco amolecimento adicional da liga. Este efeito está associado predominantemente à recristalização. Ilustração esquemática do efeito da temperatura de recozimento sobre a resistência e a ductilidade de uma liga de bronze. Veja um exemplo que aborda a associação de algumas propriedades mecânicas com o trabalho a frio de ligas metálicas. Exemplo 1: Uma barra de latão 70 Cu-30 Zn recozido (10 mm de diâmetro) é estirada a frio através de uma matriz com um diâmetro de 8 mm. Observando a figura 12.14 que apresenta a variação das propriedades mecânicas de duas ligas de latão com o grau de trabalho a frio, determine qual é (a) o limite de resistência à tração, e (b) a ductilidade da barra resultante? Variação das propriedades mecânicas de duas ligas de latão com o grau de trabalho a frio. Solução: Os resultados estão disponíveis na figura, uma vez que a porcentagem do trabalho a frio é determinada. Essa porcentagem é dada por para determinado histórico de processamento, Pela figura, vemos que: (a) limite de resistência à tração = 520 MPa, e (b) ductilidade (alongamento) - 9% Para fechar, caro(a) aluno(a), é importante que você acompanhe uma interessante simulação que relaciona as propriedades mecânicas, o tamanho de grão e a microestrutura para uma liga metálica durante a recristalização. Acesse o link: http://cienciadosmateriais.org/index.php?acao=exibir&cap=21
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