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1 DIREITO ECONÔMICO Sumário CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA BRASILEIRA. ORDEM CONSTITUCIONAL ECONÔMICA: PRINCÍPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONÔMICA. TIPOLOGIA DOS SISTEMAS ECONÔMICOS. .............................. 4 CONCEITO DE ORDEM ECONÔMICA .................................................................................................... 4 A CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA ........................................................................................................... 5 A CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA BRASILEIRA ........................................................................................ 6 PRINCÍPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONÔMICA ................................................................................ 9 Princípios explícitos ....................................................................................................................... 10 Princípios implícitos ...................................................................................................................... 21 SISTEMAS ECONÔMICOS (CAPITALISMO E SOCIALISMO) ............................................................................... 24 Introdução .................................................................................................................................... 24 ORDEM JURÍDICO-ECONÔMICA. ..................................................................................................... 26 INTRODUÇÃO: ....................................................................................................................................... 26 QUESTÕES DE CONCURSO .............................................................................................................. 28 CONCEITO. ORDEM ECONÔMICA E REGIME POLÍTICO. ................................................................... 35 CONCEITO ............................................................................................................................................ 35 ORDEM ECONÔMICA ............................................................................................................................. 35 REGIME POLÍTICO .................................................................................................................................. 36 ATUAÇÃO DO ESTADO NA ATIVIDADE ECONÔMICA ....................................................................... 37 ESTADO LIBERAL .................................................................................................................................... 38 ESTADO INTERVENCIONISTA ECONÔMICO ................................................................................................... 39 ESTADO INTERVENCIONISTA SOCIAL .......................................................................................................... 40 ESTADO INTERVENCIONISTA SOCIALISTA ..................................................................................................... 41 ESTADO REGULADOR .............................................................................................................................. 41 FORMAS DE ATUAÇÃO ...................................................................................................................... 42 INTERVENÇÃO DIRETA OU PARTICIPAÇÃO ................................................................................... 43 INTERVENÇÃO INDIRETA .............................................................................................................. 55 SUJEITOS ECONÔMICOS. ................................................................................................................ 58 INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO .................................................................. 60 INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. LIBERALISMO E INTERVENCIONISMO. ............................... 60 Atuação Estatal X Intervenção – No Domínio Econômico ............................................................. 60 MODALIDADES DE INTERVENÇÃO. INTERVENÇÃO NO DIREITO POSITIVO .......................................................... 62 Intervenção direta do Estado na ordem econômica ..................................................................... 63 2 Intervenção indireta do Estado na ordem econômica .................................................................. 68 Formas de intervenção segunda a classificação do Min. Eros Grau ............................................. 70 LEI ANTITRUSTE E DISCIPLINA JURÍDICA DA CONCORRÊNCIA EMPRESARIAL ................................... 72 HISTÓRICO DO DIREITO CONCORRENCIAL NO BRASIL .................................................................................... 73 ESTRUTURA DO SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA (SBDC) .................................................. 74 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL JUNTO AO CADE (ART. 20) .......................................................................... 75 SECRETARIA DE ACOMPANHAMENTO ECONÔMICO DO MINISTÉRIO DA FAZENDA SEAE ..................................... 75 FINALIDADES ........................................................................................................................................ 75 PRINCÍPIOS NA LEI 12.529/2011 ............................................................................................................ 75 INFRAÇÕES CONTRA A ORDEM ECONÔMICA E ABUSO DO PODER ECONÔMICO ................................................ 77 CONCORRÊNCIA ILÍCITA E DESLEAL ............................................................................................................ 81 DISCIPLINA JURÍDICA DA CONCORRÊNCIA EMPRESARIAL ................................................................................ 84 PENALIDADES ....................................................................................................................................... 88 ATOS DE CONCENTRAÇÃO E ESTRUTURA DE MERCADOS ................................................................................ 88 REPRESSÃO DO PODER ECONÔMICO PELO ESTADO ....................................................................................... 91 PAPEL DO PODER JUDICIÁRIO ................................................................................................................... 92 DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA ....................................................................................... 93 PROCESSO ADMINISTRATIVO NO SBDC (PRINCIPAIS MODIFICAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI Nº 12.529/2011) .... 93 MEDIDA PREVENTIVA ............................................................................................................................. 95 ACORDOS EM CONTROLE DE CONCENTRAÇÕES ............................................................................................ 95 ACORDO DE LENIÊNCIA (OU DELAÇÃO PREMIADA) ....................................................................................... 95 COMPROMISSO DE CESSAÇÃO .................................................................................................................. 96 CONFLITOS ENTRE AUTORIDADES CONCORRENCIAIS E REGULADORAS .............................................................. 97 EXEMPLOS PRÁTICOS .............................................................................................................................. 97 SÚMULAS DO CADE .............................................................................................................................. 97 DEFESA COMERCIAL ..................................................................................................................... 104 A LIVRE FIXAÇÃO DE PREÇOS E O ART. 20 DA LEI 12.529/2011 ................................................................. 108 PRÁTICAS DESLEAIS DE COMÉRCIO: DUMPING ...........................................................................................111 MEDIDAS DE SALVAGUARDA .................................................................................................................. 114 A INVESTIGAÇÃO ................................................................................................................................. 115 PONTO 7: MERCOSUL. GATT. OMC. INSTRUMENTOS DE DEFESA COMERCIAL. .............................. 116 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................... 116 Fases do processo de integração econômica .............................................................................. 117 O GATT (GENERAL AGREEMENT ON TARIFFS AND TRADE OU ACORDO GERAL SOBRE TARIFAS E COMÉRCIO) ...... 118 Princípios .................................................................................................................................... 118 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO - OMC ...................................................................................... 119 Objetivos da OMC ....................................................................................................................... 119 Funções ....................................................................................................................................... 119 Processo de adesão .................................................................................................................... 120 3 Estrutura ..................................................................................................................................... 120 Órgão de solução de controvérsias ............................................................................................. 121 MERCOSUL ...................................................................................................................................... 122 Princípios do Tratado de Assunção ............................................................................................. 123 Órgãos do MERCOSUL ................................................................................................................ 124 Sistema de solução de controvérsias .......................................................................................... 129 Reclamações de particulares ...................................................................................................... 134 Solução de controvérsias e OMC ................................................................................................ 135 Defesa comercial no MERCOSUL ................................................................................................ 135 Defesa comercial no MERCOSUL ................................................................................................ 139 INFRAÇÕES AO COMÉRCIO EXTERIOR. INSTRUMENTOS DE DEFESA COMERCIAL ............................................... 139 Subsídios ..................................................................................................................................... 139 Medidas compensatórias ............................................................................................................ 140 Dumping ..................................................................................................................................... 140 PONTO 8: DIREITO DO CONSUMIDOR. ELEMENTOS INTEGRANTES DA RELAÇÃO JURÍDICA DE CONSUMO. SUJEITOS: CONCEITOS DE CONSUMIDOR E DE FORNECEDOR. OBJETOS: CONCEITO DE PRODUTO E DE SERVIÇO. VÍNCULO: CONCEITO DE OFERTA E DE MERCADO DE CONSUMO. .......... 145 HISTÓRICO ......................................................................................................................................... 145 DIREITO CONSTITUCIONAL DO CONSUMIDOR ........................................................................................... 145 ELEMENTOS INTEGRANTES DA RELAÇÃO JURÍDICA DE CONSUMO .................................................................. 146 A) SUJEITOS: CONSUMIDOR E FORNECEDOR; ............................................................................ 146 B) OBJETOS: PRODUTO E SERVIÇO; ........................................................................................... 146 C) VÍNCULO: OFERTA E MERCADO DE CONSUMO. .................................................................... 146 CONCEITO DE CONSUMIDOR .................................................................................................................. 146 CONCEITO DE CONSUMIDOR EQUIPARADO ............................................................................................... 150 CONCEITO DE FORNECEDOR ................................................................................................................... 150 OBJETOS DA RELAÇÃO JURÍDICA DE CONSUMO .......................................................................................... 151 Conceito de produto ................................................................................................................... 151 CONCEITO DE SERVIÇO .......................................................................................................................... 152 VÍNCULO DA RELAÇÃO JURÍDICA DE CONSUMO: CONCEITOS DE OFERTA E DE MERCADO DE CONSUMO ................ 152 PONTO 9: AS PRINCIPAIS ATIVIDADES EMPRESARIAIS E SUA RELAÇÃO COM O REGIME JURÍDICO DAS RELAÇÕES DE CONSUMO ...................................................................................................... 153 SERVIÇO PÚBLICO E RELAÇÃO JURÍDICA DE CONSUMO ................................................................................ 154 ATIVIDADE BANCÁRIA ........................................................................................................................... 156 ATIVIDADE SECURITÁRIA ....................................................................................................................... 157 ATIVIDADE IMOBILIÁRIA ........................................................................................................................ 157 CONSÓRCIOS ...................................................................................................................................... 158 4 CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA BRASILEIRA. ORDEM CONSTITUCIONAL ECONÔMICA: PRINCÍPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONÔMICA. TIPOLOGIA DOS SISTEMAS ECONÔMICOS. CONCEITO DE ORDEM ECONÔMICA Por ordem econômica entende-se o tratamento jurídico disciplinado pela Constituição para a condução da vida econômica da Nação, conforme Leonardo Vizeu Figueiredo. Para Eros Roberto Grau há duplo sentido na expressão “ordem econômica”: a) visão subjetiva (ser), como conjunto de relações econômicas; b) visão objetiva (dever-ser), como conjunto de normas jurídicas disciplinadoras dessas relações. Ainda o mesmo autor, analisando especificamente a Constituição de 1988, define que existem duas vertentes conceituais: a) ampla, consistente na regulação jurídica da intervenção do Estado na Economia; b) estrita, consistente na regulação jurídica do ciclo econômico (produção, circulação e consumo). Em síntese: A Ordem Econômica consiste no conjunto de normas constitucionais que definem os objetivos de um modelo para a economia e as modalidades de intervenção do Estado nessa área. No art. 170 da Constituição Federal, encontra-se estabelecido um conjunto de princípios constitucionais de como a ordem econômica deve se pautar: Art. 170 da CF/88 “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I – Soberania nacional; II – Propriedade privada; III – função social da propriedade; IV– Livre concorrência; V – Defesa do consumidor; VI – Defesa do meio ambiente; VII – redução das desigualdades regionais e sociais; VIII – busca do pleno emprego; IX – Tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas, sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no país”. Ordem Econômica Conjunto de Normas Constitucionais Definidora dos objetivos Econômicos E das modalidades de Intervenção Estatal na Economia 5 Já no “caput” do art. 170, destaca-se que a ordem econômica possui dois fundamentos: valorização do trabalho humano e da livre iniciativa, com a finalidade de assegurar a todos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social. A CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA A utilização da expressão “Constituição Econômica” fez-se presente a partir da 1ª Grande Guerra Mundial, principalmente com a promulgação das Constituições do México (1917) e a de Weimar (1919). Entretanto, foi após a crise do capitalismo em 1929 e com o fim da 2ª Grande Guerra Mundial que as “Constituições Econômicas” realmente se concretizaram e se desenvolveram. Inicialmente, antes de conceituar a expressão “Constituição Econômica”, ressaltam-se as lições do Professor WASHINGTON PELUSO ALBINO DE SOUZA acerca da necessidade de tratá- la como “espécie” do “gênero” Constituição “tout court”. O grande Professor português VITAL MOREIRA define Constituição Econômica como: “O conjunto de preceitos e instituições jurídicas que, garantindo os elementos definidores de um determinado sistema econômico, instituem uma determinada forma de organização e funcionamento da economia e constituem, por isso mesmo, uma determinada ordem econômica; ou, de outro modo, aquelas normas ou instituições jurídicas que, dentro de um determinado sistema e forma econômicos, que garantem e (ou) instauram, realizam uma determinada ordem econômica concreta” Nas lições do Professor JOSÉ AFONSO DA SILVA: “A constituição econômica formal brasileira consubstancia na parte da Constituição Federal que contém os direitos que legitimam a atuação dos sujeitos econômicos, o conteúdo e limites desses direitos e a responsabilidade que comporta o exercício da atividade econômica” Manoel Gonçalves, citado por Eugênio Rosa, conceitua Constituição Econômica como sendo “O conjunto de normas voltadas para a ordenação da economia, inclusive declinando a quem cabe exercê-la”. Ainda segundo o primeiro autor, a Constituição Econômica delimita os seguintes elementos: 1. O tipo de organização econômica (capitalismo ou socialismo); 2. A delimitação do campo da iniciativa privada; 3. A delimitação do campo da iniciativa estatal; 4. A definição dos regimes dos fatores de produção; e 5. A finalidade e os princípios gerais que devem gerir a ordem econômica. Dessa forma, vê-se que a Constituição Econômica se concretiza como a forma em que o Direito se relaciona com a Economia, corporificando tanto a presença do fenômeno “econômico” na Constituição como a forma em que o Direito conduz o fenômeno econômico. 6 Assim, a Constituição Econômica acaba por operar a conversão do regime econômico em ordem jurídico-econômica, estabelecendo os princípios e regras, informadores das normas que regerão as relações econômicas. A CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA BRASILEIRA As importantes mudanças constitucionais do século XX repercutiram no cenário brasileiro a partir da Constituição de 1934. 1. Carta Imperial do Brasil (1824) estabeleceu o direito à propriedade, assegurado o livre exercício da atividade profissional, desde que não atentasse aos costumes públicos. 2. Carta Republicana de 1891, por sua vez, trouxe o direito de liberdade de associação. 3. Constituição de 1934: Cujo título IV – “Da Ordem Econômica e Social”- enfatizava a justiça e as necessidades da vida nacional como limites à garantia da liberdade econômica, de modo que todos tivessem existência digna. Entre outras medidas, admitia-se o monopólio, pelo Estado, de determinada indústria ou atividade, das minas e das demais riquezas do subsolo de propriedade privada do solo em que se encontra, reconhecia-se a proteção social ao trabalhador, incluindo-se preceitos típicos da legislação trabalhista, como salário-mínimo, repouso semanal, férias anuais remuneradas, assistência médica e sanitária ao trabalhador e à gestante, etc. Foi instituída também no texto a Justiça do Trabalho. Por este relato, resumido ao essencial, pode-se avaliar o impacto da Constituição Econômica brasileira, que iria se expandir e aperfeiçoar nas décadas seguintes, fosse em períodos democráticos ou autoritários. Senão vejamos. 4. Constituição de 1937: legitimou-se a intervenção do Estado no domínio econômico para suprir as deficiências da iniciativa individual e coordenar os fatores de produção; proibiu-se a usura, passou-se a exigir maioria de brasileiros para as empresas concessionárias de serviços público, etc. 5. Constituição de 1946: dispôs que a Ordem Econômica deveria ser organizada conforme os princípios da Justiça Social, conciliando a liberdade de iniciativa com a valorização do trabalho humano. Foi admitida a intervenção do Estado no domínio econômico e o monopólio de determinada indústria ou atividade, com base no interesse público, tomando por limite os direitos fundamentais assegurados nesta Constituição. 6. Constituição de 1967:, emendada em 1969, seguiu a mesma tendência, exigindo a Justiça Social como fundamento, dando destaque à reforma agrária, permitindo o estabelecimento de “regiões metropolitanas”, prevendo a participação de trabalhador nos lucros da empresa e criando o seguro-desemprego, entre outras medidas. Permitiu ao Estado, no dispositivo de intervenção, “a organização de setor que não possa ser desenvolvido com eficiência no regime de competição e de liberdade de iniciativa”. . A Constituição (ou emenda) de 1969 teve como inovação o acréscimo do princípio da justiça social 7 7. Constituição de 1988: em vigor no país, aprofundou o conceito de “Constituição Econômica, inovando, quer na técnica e na abrangência da matéria, quer na própria substância. “Seu discurso ideológico original recebeu, posteriormente, fundamentais modificações por meio de emendas constitucionais voltadas sobretudo para o reforço da orientação nacionalista e intervencionista das Cartas que a antecederam”, conforme anotou o professor Washington P. Albino de Souza, no seu livro” Primeiras Linhas de Direito Econômico”. Liberalismo Político: Durante a vigência das Constituições de 1824 e 1891, acreditava-se que a força natural do mercado sem injunções estatais seria suficiente para assegurar as necessidades básicas e sociais exigidas pela sociedade brasileira. Dessa maneira, reservava-se ao Estado a prerrogativa de guarda da ordem e do funcionamento do livre mercado, as limitações das funções do Estado durante o liberalismo político e econômico foram melhor apresentadas por Adam Smith, que em 1776 listou exaustivamente os deveres do Estado, quais sejam: • A proteção da sociedade contra a violência e a invasão privada; • A proteção dos indivíduos contra opressão de outrem; e • A criação de infraestrutura para o desenvolvimento econômico. A atividade comercial e industrial no Brasil que era exercida pelos comerciantes, num primeiro momento de desenvolvimento brasileiro, sob um forte contexto ideológico do liberalismo político (constituições de 1824 e 1891), passou a ser influenciada por normas programáticas para a organização e planejamento econômico. Assim, a atividade produtivasubmete-se ao norteamento constitucional e passa a ser explicitamente um instrumento eficaz para a satisfação das necessidades básicas dos seres humanos. Consequentemente, por meio da disponibilização e troca dos bens produzidos, ela revigora o mercado, permite a extensão dos benefícios individuais à coletividade e exercita a justiça social. Justiça Social na Constituição Federal 1988. “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: ...” A liberdade econômica como uma forma de satisfação das liberdades individuais e da justiça social foi mantida em todas as constituições brasileiras pós-1934, mas somente com a atual Magna Carta de 1988 tornou-se um fundamento e, consequentemente, elemento central da ordem econômica constitucional. O legislador constituinte elegeu a “livre iniciativa” e a “valorização do trabalho” como fundamentos da ordem econômica, que sustentam a pretensão de garantir aos indivíduos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social. Sob essa perspectiva, a possibilidade de organizar-se em sociedades para a exploração econômica, o direito de lançar-se em atividades produtivas de bens e serviços por sua própria conta e risco, o oferecimento de bens e serviços ao público consumidor, a participação nos 8 jogos concorrenciais para a conquista de clientela são compreendidas como expressões da livre iniciativa econômica e práticas fundamentais da liberdade individual. A expressão “constituição econômica” nasceu do momento em que as constituições modernas passaram a conter dispositivos sobre a organização econômica de ordem programática, tais como: • Fundamentos e princípios gerais da atividade econômica; • Delimitação básica entre o domínio da iniciativa privada e a intervenção estatal no mercado e • Bases jurídicas dos fatores de produção. Os limites da livre iniciativa e regulamentação da atividade econômica pelo Estado já foram objeto de análise pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) que assim ensinou: “A Constituição Federal, no seu art. 170, preceitua que a ordem econômica é fundada na valorização do trabalho e na livre iniciativa, tendo por finalidade assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os princípios que indica. No seu art. 174 pontifica que, como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento. Desses dispositivos resulta claro que o Estado pode atuar como atente regulador das atividades econômicas em geral, sobretudo nas de que cuidam as empresas que atuam em um setor absolutamente estratégico, daí ser lícito estipular os preços que devem ser por elas praticados.” (Ementário STJ, n. 9/303 – MS n. 2.887-1 DF; Rel. Mi. César Asfor Rocha, 1a Seção, unânime, Diário da Justiça, 13 dez. 1993). Desta feita, verifica-se que o próprio legislador constituinte, em pleno favor da eficiência, entendeu ser salutar para o mercado a competição, sendo certo que ela tende a reduzir os custos produtivos e, consequentemente, os preços para os consumidores. Isso é que se extrai do §4o do art. 173 da CF que investiu o Estado dos poderes de repressão às práticas empresariais específicas caracterizadas como “abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros”. Nesse mesmo sentido dispõe o §1o do art. 36 da Lei 12.529/2011, como segue: §1o A conquista de mercado resultante de processo natural fundado na maior eficiência de agente econômico em relação a seus competidores não caracteriza o ilícito previsto no inciso II do caput deste artigo.” Esse parágrafo afasta eventuais confusões decorrentes do inciso II do art. 36 da Lei 12.529/2011 que caracteriza como infração à ordem econômica os atos que visem a dominação de mercado relevante de bens e serviços. Pela leitura do referido inciso, entende- se que dominar um determinado mercado não é por si só um abuso do poder econômico, mas sim o abuso dessa dominação e os consequentes efeitos negativos na concorrência. 9 Isso significa, mais uma vez, que o aumento da clientela dos empresários e o crescimento mercadológico de uma sociedade empresária não são vedados pela ordem econômica e leis concorrenciais (mesmo quando em detrimento de competidores), mas tão somente os comportamentos nocivos que impliquem alteração da estrutura concorrencial de um mercado, que levem o exercício de posição dominante de forma abusiva e o aumento arbitrário de lucros. Cumpre salientar, aliás, que as regras incidentes à concorrência somente passaram a ser cogitadas a partir do momento que as condutas comerciais para a “conquista de clientela” foram acompanhadas de embustes, de práticas desleais com o fito de eliminar a concorrência e reduzir o livre arbítrio dos consumidores na escolha dos produtos e serviços. Ou seja, quando a concorrência ficou sem freios. A nossa Constituição Econômica, portanto, encarrega-se de estatuir os direitos e deveres daqueles que, em conjunto, são denominados agentes econômicos (Estado, trabalhadores, consumidores e empresários) e seu conteúdo engloba os princípios da atividade econômica (art. 170), bem como as políticas urbanas (art. 182), agrícola e fundiária (art. 184) e o sistema financeiro nacional (art. 192). A ordem econômica possui como principal documento a Constituição Federal, de forma que o seu conteúdo econômico é que compõe a Constituição Econômica. Num olhar superficial, parece que ordem econômica é a mesma coisa que Constituição Econômica, mas ambas não se confundem, pois a ordem econômica compreende outras leis que não apenas a Constituição Federal. Adverte-se, todavia, que as normas constitucionais é que determinarão os limites para a criação de todas as normas produzidas pela legislação infraconstitucional, o que ressalta a importância da Constituição Econômica como base para todo o sistema jurídico econômico. A Constituição de 1988 é qualificada como dirigente ou diretiva, o que significa que se dispõe constitucionalmente de uma programação para a realização de objetivos. O caput do art. 170 comprova tal condição quando dispõe: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre-iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social (...)”. Os fundamentos da ordem econômica ou seja, a base de sustentação do sistema econômico são: a liberdade de empreender ou de explorar a atividade econômica (livre- iniciativa) e a valorização do trabalho humano, que, de certa forma, é um limitador da livre- iniciativa, mas que com ela deve se relacionar para a construção do sistema econômico nacional. A existência digna é a principal finalidade da ordem econômica e existe, de acordo com o regulado pela Constituição, quando o objetivo da justiça social é alcançado. PRINCÍPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONÔMICA Inicialmente, importa notar que existem no art. 170, da CRFB/88, certos valores que tutelam a ordem econômica brasileira, os quais não se confundem com os princípios posteriormente elencados. São eles: 10 1. Valorização do trabalho humano; 2. Livre-iniciativa; 3. Existência digna e; 4. Justiça social. A CFRB/88 arrola os princípios da ordem econômica nos incisos do art. 170.Segundo José Afonso da Silva, alguns desses princípios se revelam mais tipicamente como objetivos da ordem econômica, como seria o caso da redução das desigualdades regionais e sociais e a busca do pleno emprego. Mas todos podem ser considerados princípios na medida em que constituem preceitos condicionadores da atividade econômica. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA ORDEM ECONÔMICA: Art. 170 CF/88 Soberania nacional; Propriedade privada; Função social da propriedade; Livre concorrência; Defesa do consumidor; Defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; Redução das desigualdades regionais e sociais; Busca do pleno emprego; Tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. Princípios explícitos Princípio constitucional econômico da soberania nacional A soberania nacional significa supremacia no plano interno e independência no plano internacional. Por sua vez, a soberania econômica significa que as decisões relativas à política econômica a serem adotadas pelo País devem levá-lo a estabelecer uma posição de independência em relação aos demais países, importando na possibilidade de autodeterminação de sua política econômica. A soberania nacional (Soberania Política) é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil e do estado Democrático de Direito (art. 1º, I). No art. 170, I da CF, temos novamente a Soberania Nacional, sendo que o que se trata no inciso I do art. 170 da Constituição é a soberania nacional econômica, visando estabelecer, no 11 plano externo, a independência, a coordenação e a não-submissão em relação à economia e tecnologia estrangeiras. A Soberania econômica é a atribuição de determinar seu sistema econômico e de dispor de seus recursos naturais. Registre-se, outrossim, que a soberania política (art. 1, I, CR 1988) não sobrevive sem a soberania econômica, havendo entre ambas uma relação de complementação. De sorte que a soberania política é assegurada na medida em que o Estado goza e desfruta da soberania econômica. Esse princípio está fortemente corroído em sua conceituação tradicional pelo avanço da ordem jurídica internacional e da globalização. A ação dos Estados é movida pela incessante busca de níveis de competitividade internacional. Porém, em atendimento a esse princípio, a colaboração internacional não pode chegar ao ponto de subtrair do país as possibilidades de autodeterminação. Princípio da Propriedade Privada A propriedade e o direito de propriedade não se confundem, sendo a propriedade um fato econômico, enquanto que este é, sob o aspecto subjetivo, o poder do proprietário sobre a coisa, o qual é um dos direitos fundamentais da pessoa humana (art. 5, XXII, CFRB/88). O conteúdo do direito de propriedade privada assume natureza complexa, sendo qualificado, por via disso, como um direito fundamental de dupla face ou de duplo carácter. Com efeito, o direito de propriedade privada assume no seu conteúdo constitucional uma vertente ou dimensão objetivo-institucional (derivada da função social que cada categoria de bens se encontra obrigada a cumprir) e, simultaneamente, uma vertente subjetiva-individual que integra o conteúdo essencial desse direito. Essas duas vertentes do direito de propriedade privada não se opõem uma à outra, antes pelo contrário, a determinação do aspecto objetivo não visa senão reforçar o aspecto subjetivo do mesmo. • Dimensão objetivo-institucional – Função Social da Propriedade • Dimensão subjetiva-individual – Domínio (liberdade de ação sobre a coisa) Esse princípio assegura aos agentes econômicos direito à propriedade dos fatores de produção e circulação de bens em seus respectivos ciclos econômicos. “Se a restrição ao direito de construir advinda da limitação administrativa causa aniquilamento da propriedade privada, resulta, em favor do proprietário, o direito à indenização. Todavia, o direito de edificar é relativo, dado que condicionado à função social da propriedade. Se as restrições decorrentes da limitação administrativa preexistiam à aquisição do terreno, assim já do conhecimento dos adquirentes, não podem estes, com base em tais restrições, pedir indenização ao Poder Público.” (RE 140.436, rel. min. Carlos Velloso, julgamento em 25-5-1999, Segunda Turma, DJ de 6-8-1999.) No mesmo sentido: AI 526.272-AgR, rel. min. Ellen Gracie, julgamento em 1º- 2-2011, Segunda Turma, DJE de 22-2-2011. 12 Princípio da função social da propriedade Introduzido no ordenamento jurídico brasileiro, pela primeira vez, com a CF/34, que assegurou o direito de propriedade com a ressalva de que não poderia ser exercido contra o interesse social ou coletivo. A partir de então, com exceção da CR/1937, o valor função social da propriedade incorporou- se de vez à nossa experiência constitucional, figurando em pelo menos quatro dispositivos da CF/88 (art. 5º, XXIII; art. 170, III; art. 182, §2º e no caput d art. 186), a evidenciar a preocupação em construir um Estado de Direito verdadeiramente democrático, no qual possuem a mesma dignidade constitucional tanto os valores sociais do trabalho quanto os da livre iniciativa. O princípio da função social da propriedade não é derrogatório da propriedade privada, mas sim parte integrante desta. O conteúdo da função social assume papel promocional. A disciplina das formas de propriedade e suas interpretações devem garantir e promover os valores sobre os quais se funda o ordenamento. O princípio econômico da função social da propriedade constitui o fundamento constitucional da função social da empresa e da função social do contrato. Busca-se, por meio da função social, conciliar o benefício individual com o coletivo. Assim, a função social da propriedade implica em uma limitação ao direito de propriedade, visando coibir abusos e evitando o seu exercício em detrimento do bem-estar da sociedade, de sorte que a propriedade, para bem cumprir seu papel econômico-social, deve compatibilizar os interesses do proprietário, da sociedade e do Estado, afastando seu uso egoístico e o uso abusivo do domínio. A propriedade é, portanto, um meio para a consecução de um fim comum: a busca do bem-estar social. A autonomia da vontade do proprietário sempre conotou uma plena e absoluta faculdade sobre os bens de sua propriedade. Agora, a relação do indivíduo com a propriedade, que antes lhe serviu os interesses apenas, passa a agregar também o interesse social. A função social é uma função limitadora da autonomia privada sobre os bens, o choque dos interesses pessoais do proprietário com os interesses gerais da sociedade limitará os direitos daquele. "Falência e recuperação judicial. Inexistência de ofensa aos arts. 1º, III e IV, 6º, 7º, I, e 170, da CF de 1988. (...) Inexiste reserva constitucional de lei complementar para a execução dos créditos trabalhistas decorrente de falência ou recuperação judicial. Não há, também, inconstitucionalidade quanto à ausência de sucessão de créditos trabalhistas. Igualmente não existe ofensa à Constituição no tocante ao limite de conversão de créditos trabalhistas em quirografários. Diploma legal que objetiva prestigiar a função social da empresa e assegurar, tanto quanto possível, a preservação dos postos de trabalho." (ADI 3.934, rel. min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 27-5-2009, Plenário, DJE de 6-11-2009.) Princípio da livre concorrência13 Este princípio está intrinsecamente associado ao princípio da livre iniciativa. Teve como marco jurídico e histórico o Decreto de Allarde (França -1791), Competition Act (Canadá – 1889) e Sherman Act (EUA – 1890). A livre iniciativa é a projeção da liberdade individual no plano da produção, circulação e distribuição de riquezas, assegurando não apenas a livre escolha das profissões e das atividades econômicas, mas também a autonomia na eleição dos processos ou meios de produção. Abrange a liberdade de fins e meios. Já o conceito de livre concorrência tem caráter instrumental, significando que a fixação dos preços das mercadorias e serviços não deve resultar de atos cogentes da atividade administrativa. Consiste, conforme Leonardo Vizeu Figueiredo, em proteção conferida pelo Estado ao devido processo competitivo, a fim de garantir que toda e qualquer pessoa que esteja em condições possa livremente entrar, permanecer e sair do ciclo econômico. Para Miguel Reale, a livre concorrência significa a possibilidade de os dirigentes econômicos poderem atuar sem embaraços juridicamente justificáveis, visando à produção, à circulação e ao consumo de bens e serviços. A CFRB/88 adota o modelo liberal do processo econômico, que só admite a intervenção do Estado para coibir abusos e preservar a livre concorrência de quaisquer interferências, quer do próprio Estado, quer do embate das forças competitivas privadas que podem levar à formação dos monopólios e ao abuso do poder econômico visando ao aumento arbitrário dos lucros. Paula Forgioni, efetuando breve histórico, assinala que a concorrência no Brasil se operou em momentos distintos de acordo com o ambiente político-econômico atuante na economia: a) Momento fiscalista. Do período colonialismo até a transferência da Coroa para o Brasil em 1808, vigorou uma política eminentemente fiscalista, quando então se buscava apenas a renda dos impostos decorrentes das atividades comerciais aqui existentes. Não havia concorrência. Havia controle sobre quais produtos deviam ser produzidos e as respectivas quantidades máximas. Além disso, todos os produtos eram entregues a Portugal pelo preço por este estipulado; b) Momento da orientação econômica e social. Com a vida da Família Real portuguesa iniciou- se um período de transformações sociais e econômicas, marcadas estas pela liberação dos portos aos Estados estrangeiros aliados. Foi a época da criação do Banco do Brasil. A vinculação à Portugal, contudo, ainda imperava. A intervenção estatal no domínio econômico era preponderante, considerando que até a produção era controlada pelo Estado. Havia uma limitação à concorrência. c) Momento Pós-independência. Com a independência do Brasil, criou-se um ambiente propício para se germinar o desenvolvimento liberal da economia, o que proporcionou a concentração de capitais, com, consequentemente, desnível social. O Brasil mantinha a intervenção estatal. Manteve-se a certa limitação à concorrência, mas por outro lado, a livre concorrência era essencial ao florescimento do novo país. 14 d) Período interventivo. Com a crise econômica americana de 1929, que atingiu o Brasil se estendeu durante toda a década de 30, foi necessária forte intervenção do Estado, principalmente na agricultura. Segundo Forgioni, durante esse período houve um aumento quantitativo da intervenção, objetivando a prevenção de novas crises com seus efeitos devastadores. No período, entretanto, não houve qualquer lei que regulasse o processo competitivo, sob a visão do antitruste, já que a regulação que existia entre a limitação sob a ótica individual, como é exemplo o Código de Propriedade Industrial. Ainda segundo essa autora, a política anti-concorrencial no Brasil cresceu não a partir da manutenção da liberdade econômica, mas como forma de limitação do abuso de poder econômico. e) Início da regulação do antitruste. Com a edição do Decreto-Lei nº 7.666/45, a regulamentação ao abuso do poder econômico tomou forma específica e sistemática. Com esse diploma foi criada a Comissão Administrativa de Defesa Econômica – CADE, órgão vinculado e subordinado ao Poder Executivo, circunstância que limitava e politizava o controle. Referida norma somente perdurou por 3 (três) meses. Pode-se dizer, portanto, que não havia limitação à concorrência, senão sob uma ótica individualista. f) O sistema brasileiro atual do antitruste. Iniciado sob a égide da Carta de 1946 foi paulatinamente sendo desenvolvido. Durante a Constituição de 1946, apesar de erigido a norma constitucional, não possuía a dimensão socioeconômica atual. Criou-se, em 1962 o CADE, Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Somente com a Constituição de 1988, contudo, a matéria foi alçada a princípio e o CADE passou a deter maior independência do Poder Executivo, mediante sua qualificação como autarquia. Assim, a fixação de preços e a percepção de lucros não devem ser, em regra, alvo de controle pelo Estado, dentro do Estado liberal vigente, considerando que as próprias forças de mercado são suficientes para a regularização de preços. Tais forças, evidentemente, pressupõem desigualdades entre as entidades econômicas. Destaque-se que apesar de o texto constitucional falar em livre iniciativa e livre concorrência, Paula Forgioni, citando Eros Roberto Grau, sustenta que aquela é gênero da qual é espécie a livre concorrência, juntamente com a liberdade de comércio e da indústria. No âmbito infraconstitucional, a Lei nº 12.529/2011 tutela a livre iniciativa (e consequentemente a livre concorrência). Ressalte-se que, porém, não é a simples concentração de mercado, por si só, a razão do controle. A concentração e a restrição à concorrência baseada nas melhorias técnicas e desenvolvimento tecnológico são permitidas (são as chamadas válvulas de escape, na nomenclatura adotada por Forgioni). Os dispositivos visam tutelar a livre concorrência, protegendo-a contra a tendência da concentração capitalista, cabendo ao Estado intervir somente para coibir o abuso, quando a concentração é exercida de forma antissocial, de forma a prejudicar a livre concorrência. Quando o poder econômico passa a ser usado com o propósito de impedir a iniciativa de 15 outros ou passa a ser fator concorrente para o aumento arbitrário de lucros, o abuso fica manifesto. Dessa forma, como assinala Paula Forgioni, a concorrência não deve ser perseguida como um fim em si mesma, podendo ser sacrificada para que seja atingido o escopo maior de todo o sistema. O texto da CFRB/88 não deixa dúvidas quanto ao fato da concorrência ser, entre nós um meio, um instrumento para o alcance de outro bem maior, de assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. Nesse passo, até algumas práticas estatais, apesar de aparentar regular determinados aspectos da atuação da sociedade, acabam por limitar a concorrência. A propósito, destaca-se o enunciado n. 646 da súmula do STF, convertida para Súmula Vinculante nº 49: Súmula Vinculante nº 49: Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área Os precedentes que embasaram a súmula se referiam às farmácias, representando uma indevida reserva de mercado. Havendo outros motivos igualmente relevantes, nada impede a estipulação de distância mínima, como ocorre comos postos de combustíveis, em razão do risco de explosões, sendo um setor fortemente regulado pelo Estado. Quanto a essas conversões em súmulas vinculantes, critica-se devido a ausência de controvérsia atual que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos, tal como exige a CR/88. Lado outro, importante observar também o enunciado n. 419 da súmula do STF: Enunciado n. 419 da súmula do STF: Os municípios têm competência para regular o horário do comércio local, desde que não infrinjam leis estaduais ou federais válidas. Essa súmula foi materialmente substituída (embora não formalmente cancelada) pela Súmula 645 do STF, recentemente convertida na SV 38, com a seguinte redação: “É competente o município para fixar o horário de funcionamento de estabelecimento comercial”. Súmula Vinculante 38, com a seguinte redação: “É competente o município para fixar o horário de funcionamento de estabelecimento comercial”. Observe que o Supremo não exige mais a não contradição com leis estaduais ou federais. Isso porque o fundamento é a competência legislativa privativa para assuntos de interesse local (art. 30, I), não mera competência concorrente suplementar (art. 24, I c/c art. 30, II = direito econômico). De toda forma, há quem diga que a supressão na parte final não representou mudança. A exceção é o horário de atendimento bancário que, por necessidade de padronização nacional e por se tratar de atividade financeira, é 16 competência da União, consoante Súmula 19 do STJ. A fixação do horário bancário, para atendimento ao público, é da competência da União. Não obstante, a jurisprudência reconhece a competência do Município para estabelecer tempo máximo de espera na fila do banco, aproximando-se da proteção ao consumidor e não regulação da própria atividade econômica. Ressalte-se que o controle da concorrência atualmente empregado tem distinção com relação ao liberalismo clássico, na medida em que aquele é qualificado pela influência social enquanto este era marcado pelo simples aspecto econômico. Sobre o tema da livre iniciativa, ainda importa notar os importantes julgados do STF: Tributário. Norma local que condiciona a concessão de regime especial de tributação à apresentação de CND. Meio indireto de cobrança de tributo. Ofensa ao princípio da livre atividade econômica. (AI 798.210-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 8-5-2012, Segunda Turma, DJE de 24-5- 2012.) É INCONSTITUCIONAL a lei que exija que a empresa em débito com a Fazenda Pública tenha que oferecer uma garantia (ex: fiança) para que possa emitir notas fiscais. Tal previsão configura “sanção política” (cobrança do tributo por vias oblíquas), o que viola as garantias do livre exercício do trabalho, ofício ou profissão (art. 5º, XIII), da atividade econômica (art. 170, parágrafo único) e do devido processo legal (art. 5º, LIV). STF. Plenário. RE 565048/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 29/5/2014. Embora as condicionantes tributárias para o exercício da atividade empresarial sejam repelidas pelo STF, há precedentes quanto a indústria de cigarro, no qual legitima-se a cassação da autorização por não recolhimento do IPI. Segundo o STF, a sonegação reiterada e sistemática atenta contra a livre concorrência, permitindo a venda de produto em condição privilegiada frente aos demais agentes econômicos do setor. Nesse caso não se trata de sanção política. EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. ICMS. IMPOSSIBILIDADE DE IMPOR AO CONTRIBUINTE INADIMPLENTE A OBRIGAÇÃO DO RECOLHIMENTO ANTECIPADO DO TRIBUTO. FORMA OBLÍQUA DE COBRANÇA. VIOLAÇÃO AOS PRÍNCIPIOS DA LIVRE CONCORRÊNCIA E DA LIBERDADE DE TRABALHO E COMÉRCIO. AGRAVO IMPROVIDO. I – Impor ao contribuinte inadimplente a obrigação de recolhimento antecipado do ICMS, como meio coercitivo para pagamento do débito fiscal, importa em forma oblíqua de cobrança de tributo e em contrariedade aos princípios da livre concorrência e da liberdade de trabalho e comércio. Precedentes. 17 O princípio da livre concorrência impõe ao Estado abrigar uma ordem econômica fundada na rivalidade dos entes exploradores do mercado. Segundo esse princípio, o mercado deve ser explorado pela maior quantidade de agentes possíveis, não que se exijam quantidades exorbitantes de agentes, mas o Direito deve garantir a entrada e a capacidade de concorrer a quem queira explorá-lo. O mercado sem concorrência geralmente produz, entre outros, os seguintes efeitos: 1. imposição de preços; 2. imposição de produtos; 3. despreocupação com os custos de produção; 4. falta de investimentos em melhora do produto. A existência de concorrência, além de impulsionar a eficiência do mercado, permite ao consumidor a faculdade de comprar aquilo que melhor lhe convém, o que não ocorre nos mercados concentrados, nos quais resta ao consumidor apenas a alternativa de não comprar. Princípio da defesa do consumidor Segundo ensina Leonardo Vizeu Figueiredo, o princípio da defesa do consumidor é corolário do princípio da livre concorrência, sendo ambos os princípios de integração e de defesa do mercado, uma vez que este se compõe de fornecedores e consumidores. Há, pois, que se buscar equilíbrio entre as empresas que atuam no mercado e entre essas e os consumidores. A livre concorrência constitui relevante princípio da atividade econômica, propiciando a competição entre os agentes econômicos, sendo certo que essa competição tende a gerar inegáveis benefícios aos consumidores. "O princípio da defesa do consumidor se aplica a todo o capítulo constitucional da atividade econômica. Afastam-se as normas especiais do Código Brasileiro da Aeronáutica e da Convenção de Varsóvia quando implicarem retrocesso social ou vilipêndio aos direitos assegurados pelo Código de Defesa do Consumidor." (RE 351.750, rel. p/ o ac. min. Ayres Britto, julgamento em 17-3-2009, Primeira Turma, DJE de 25-9-2009). Vide: RE 575.803-AgR, rel. min. Cezar Peluso, julgamento em 1º-12-2009, Segunda Turma, DJE de 18-12-2009. Aparenta inconstitucionalidade a resolução de autoridade estadual que, sob pretexto do exercício do poder de polícia, discipline horário de funcionamento de estabelecimentos comerciais, matéria de consumo e assuntos análogos." (ADI 3.731-MC, rel. min. Cezar Peluso, julgamento em 29-8-2007, Plenário, DJ de 11-10-2007.) 18 “As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor. ‘Consumidor’, para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito." (ADI 2.591-ED, rel. min. Eros Grau, julgamento em 14-12-2006, Plenário, DJ de 13-4-2007.) No mesmo sentido: AI 745.853-AgR, rel. min. Luiz Fux, julgamento em 20-3-2012, Primeira Turma, DJE de 17-4-2012. Farmácia. Fixação de horário de funcionamento. Assunto de interesse local. A fixação de horário de funcionamento para o comércio dentro da área municipal pode ser feita por lei local, visando o interesse do consumidor e evitando a dominação do mercado por oligopólio.” (RE 189.170, rel. p/ o ac. min. Maurício Corrêa, julgamento em 1º-2-2001, Plenário, DJ de 8-8-2003.) No mesmo sentido: AI 729.307-ED, rel. min. Cármen Lúcia, julgamento em 27-10-2009, Primeira Turma, DJE de 4-12-2009. Princípio da defesa do meio ambiente Esse princípio diz respeito à utilização racional dos bens e fatores de produção naturais, escassos no meio em que habitamos, o que exigea conjugação equilibrada entre os fatores de produção e o meio ambiente, que é o que se tem designado por desenvolvimento sustentável. COP 21 (O foco é o aquecimento global e os eventos climáticos decorrentes, tenta obter adesão dos Estados para tornar as metas obrigatórias, ao contrário da soft law da RIO 92 e RIO+20). Ou seja, a exploração econômica há de ser realizada dentro dos limites de capacidade dos ecossistemas, resguardando a possibilidade de renovação dos recursos renováveis e explorando de forma não predatória os não renováveis. A proteção ao meio ambiente configura um dos princípios que bem demonstram a técnica legislativa utilizada na redação da ordem econômica na Constituição, na sua função de equilibrar princípios-liberdade da atividade econômica, como a livre -iniciativa e princípios- limitação da atividade econômica. O Estado deve regular a exploração econômica tendo a defesa do meio ambiente como uma das mais importantes formas de desenvolvimento social, principalmente dos recursos naturais esgotáveis. O direito ambiental, hoje, faz parte das discussões econômicas devido ao chamado crescimento sustentável, segundo o qual só há desenvolvimento se o resultado da produção econômica, principalmente a longo prazo, não venha a comprometer a existência de recursos naturais necessários e a própria possibilidade da raça humana sobreviver nos próximos tempos. “A atividade econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios destinados a tornar efetiva a proteção ao meio ambiente. A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses 19 empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a ‘defesa do meio ambiente’ (CF, art. <170>, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral. Doutrina. Os instrumentos jurídicos de caráter legal e de natureza constitucional objetivam viabilizar a tutela efetiva do meio ambiente, para que não se alterem as propriedades e os atributos que lhe são inerentes, o que provocaria inaceitável comprometimento da saúde, segurança, cultura, trabalho e bem-estar da população, além de causar graves danos ecológicos ao patrimônio ambiental, considerado este em seu aspecto físico ou natural.” (ADI 3.540-MC, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 1º-9-2005, Plenário, DJ de 3-2-2006.) Redução das desigualdades regionais e sociais O mandamento do princípio é o do desenvolvimento equilibrado das regiões brasileiras previsto, inclusive, como um dos objetivos fundamentais da República (art. 3.o da CF). O legislador parte de uma constatação, que é o subdesenvolvimento acentuado em algumas regiões brasileiras. A própria Constituição Federal possui institutos cuja finalidade é a redução das desigualdades sociais, como: o modelo cooperativo de federalismo (federalismo de cooperação), os fundos de participação, o planejamento e a criação de regiões administrativas A redução das desigualdades regionais e sociais constitui objetivo fundamental da república e deve ser perseguido pela política econômica adotada. Compete à União elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social (art. 21, IX, CFRB/88) e a lei de diretrizes e bases deve incorporar e compatibilizar os planos nacionais e regionais (art. 174, §1º). Dentre os mecanismos previstos na CFRB/88 para a redução das desigualdades regionais estão os incentivos tributários e orçamentários (art. 43 e 165, §1º). Os direitos sociais previstos no art. 6º da CF constituem parâmetros para a aferição da desigualdade no país. Princípio da busca do pleno emprego A busca pelo pleno emprego busca propiciar trabalho para aqueles que estejam em condições de exercer uma atividade produtiva, trata-se de princípio diretivo da atividade econômica que se opõe às políticas recessivas. Para Eros Roberto Grau, esse princípio consubstancia uma garantia para o trabalhador, na medida em que está coligado ao valor da valorização do trabalho humano e reflete efeitos em relação ao direito social do trabalho. Neste sentido, Eugênio Rosa de Araújo salienta que este princípio tem caráter de norma programática, contendo, no mínimo, eficácia negativa, no sentido de impedir a adoção de 20 políticas econômicas e salariais recessivas e geradoras de desemprego e subemprego ou que desestimulem a ocorrência de quaisquer ocupações lícitas, bem como impõem ao setor privado o respeito aos direitos sociais e trabalhistas (arts. 6º e 7º, CFRB/88). Princípio do tratamento favorecidos para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no país Cuida-se de princípio constitucional impositivo de caráter conformador. Por seu turno, o art. 179 determina que todos os entes da Federação dispensarão as M.E.s e E.P.P.s tratamento jurídico diferenciado. Às M.E.s haverá de se outorgar um tratamento mais favorecido do que às E.P.P.s e a essas, um tratamento mais favorecido que as empresas em geral. A LC 147/14 promoveu uma série de alterações legislativas. Na Lei de Falências (11.101/05), por ex., instituiu uma nova classe de credores para as deliberações da assembleia e ampliou o plano especial de recuperação judicial que antes admitia apenas créditos quirografários e agora pode todos (tem exceções, ex.: fiscais). Na LC 123/06, o acesso aos mercados; quanto às licitações houve ampliação, por ex. obrigando Estados e Municípios a aplicação imediata independente de regulamento próprio e extensão para as licitações dispensáveis em razão do valor; quanto ao mercado externo, criou um novo regime especial aduaneiro. “O Simples Nacional surgiu da premente necessidade de se fazer com que o sistema tributário nacional concretizasse as diretrizes constitucionais do favorecimento às microempresas e às empresas de pequeno porte. A LC 123, de 14-12-2006, em consonância com as diretrizes traçadas pelos arts. 146, III, d, e parágrafo único; 170, IX; e 179 da CF, visa à simplificação e à redução das obrigações dessas empresas, conferindo a elas um tratamento jurídico diferenciado, o qual guarda, ainda, perfeita consonância com os princípios da capacidade contributiva e da isonomia. Ausência de afronta ao princípio da isonomia tributária. O regime foi criado para diferenciar, em iguais condições, os empreendedores com menor capacidade contributiva e menor poder econômico, sendo desarrazoado que, nesse universo de contribuintes, se favoreçam aqueles em débito com os fiscos pertinentes, os quais participariam do mercado com uma vantagem competitiva em relação àqueles que cumprem pontualmente com suas obrigações. A condicionante do inciso V do art. 17 da LC 123/2006 não se caracteriza, a priori, como fator de desequilíbrio concorrencial, pois se constitui em exigência imposta a todas as pequenas e microempresas (MPE), bem como a todos os microempreendedores individuais (MEI), devendo ser contextualizada, por representar, também, forma indireta de se reprovar a infração das leis fiscais e de se garantir a neutralidade, com enfoque na livre concorrência. A presente hipótese não se confunde com aquelas fixadas nas Súmulas 70, 323 e 547 do STF, porquanto aespécie não se caracteriza como meio ilícito de coação a pagamento de tributo, nem como restrição desproporcional e desarrazoada ao exercício da atividade econômica. Não se trata, na espécie, de forma de cobrança indireta de tributo, mas de requisito para fins de fruição a regime tributário diferenciado e facultativo.” (RE 627.543, rel. min. 21 Dias Toffoli, julgamento em 30-10-2013, Plenário, DJE de 29-10-2014, com repercussão geral.) Princípios implícitos Princípio da subsidiariedade O Poder Público atua subsidiariamente à iniciativa privada na ordem econômica. A intervenção direta somente se dará em casos expressamente previstos no texto constitucional, ocorrendo por absorção, quando o regime for de monopólio ou por participação, em casos de imperativo para segurança nacional ou relevante interesse público. Sobre o tema, recentemente o STF decidiu que intervenção no domínio econômico (instituição de plano econômico), em que pese ser ato lícito, pode ensejar a responsabilidade civil do Estado – caso Varig (RE 571969/DF – info 738, STF). A responsabilidade do Estado pela prática de atos lícitos ocorre quando deles decorram prejuízos específicos, expressos e demonstrados. STF reconheceu que a União deve indenizar companhia aérea, que explorava os serviços de aviação, sob o regime de concessão, pelos prejuízos causados decorrentes de plano econômico que determinou o congelamento das tarifas de aviação. STF. Plenário. RE 571969/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 12/3/2014. Princípio da liberdade econômica A liberdade de iniciativa no campo econômico compreende a liberdade de trabalho e de empreender. Pressupõe o direito de propriedade e a liberdade de contratar. Decorre da livre iniciativa, prevista como fundamento da República (art. 1º, IV, CF). O direito ao livre exercício da atividade econômica é consequência do princípio da livre iniciativa. Limites: o Estado poderá, nos termos da lei, disciplinar o exercício desse direito. Citamos algumas formas de limitação: 1. Autorização para o exercício de determinadas atividades; 2. Intervenção direta na atividade econômica, nas hipóteses de relevante interesse coletivo ou em razão da segurança nacional; 3. Punição de atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular e reprimindo o abuso do poder econômico que visem à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros. Tais limitações têm por fim garantir a realização da justiça social e do bem-estar coletivo. Princípio da igualdade econômica É outra vertente da livre-iniciativa, sendo instituto garantidor da liberdade de concorrência. 22 O direito à liberdade, princípio do Estado de Direito e do sistema capitalista, quando inserido na Ordem Econômica, passa a ser encarado sob a forma de liberdade de iniciativa e liberdade de concorrência, delineados pelos princípios de similar denominação dispostos no Art. 170 da Constituição. Essa nova perspectiva se faz necessária para delimitar a esfera de liberdade privada nas relações econômicas, que passará a ser alvo de atuação do Estado Subsidiário regulador e fiscalizador. Princípio do desenvolvimento econômico Objetiva reduzir as desigualdades regionais e sociais, visando uma igualdade real. Princípio da democracia econômica Pode ser interpretado tanto para os agentes econômicos, quanto para os trabalhadores e consumidores. Informa que as politicas públicas devem ampliar a oferta de oportunidades de iniciativa e emprego, com chances iguais para todos. Outrossim, garante a participação ativa de todos os segmentos sociais na propositura das políticas públicas de planejamento econômico da Nação. Princípio da boa-fé econômica Consiste na aplicação do princípio da transparência e da publicidade nas relações de trocas comerciais dentro do ciclo econômico de cada mercado. É instituto garantidor da simetria informativa. 23 Pr in cíp io s C on st itu cio na is da O rd em E co nô m ica Fundamentos da Ordem Econômica Valorização do trabalho humano Livre Iniciativa Objetivos da Ordem Econômica Existência digna Justiça Social Princípios da Ordem Econômica Soberania nacional Propriedade Privada Função Social da propriedade Livre concorrência Defesa do Consumidor Defesa do Meio ambiente Redução das desigualdades regionais e sociais Busca do pleno emprego Tratamento diferenciado às empresas nacionais de pequeno porte 24 Sistemas Econômicos (Capitalismo e Socialismo) Introdução O sistema econômico compreende um conjunto coerente de instituições jurídicas e sociais, de conformidade com as quais se realiza o modo de produção e a forma de repartição do produto econômico. Os Sistemas hoje estudados praticamente se resumem, no capitalista (propriedade privada dos meios de produção e do resultado da produção, livre-iniciativa e concorrência dos agentes econômicos) e a sua negação (sistemas socialistas), mas numa rápida verificação histórica podemos constatar que por outros modos e por outras características os sistemas econômicos foram classificados ou nominados de acordo diversos pressupostos, para tanto, basta lembrar- se do sistema mercantilista, por exemplo. O Sistema Capitalista (livre-empresa) O modo de produção capitalista possui como características basilares a garantia ao direito de propriedade (propriedade privada) e a liberdade de iniciativa e de competição. De forma geral, o capitalismo é o sistema cujo mote é a “liberdade” dos agentes na tomada de decisões econômicas. O regulador natural da medida dessa liberdade é o mercado, daí a denominação sinônima: sistema de livre mercado. O agente econômico suportará, nesse sistema, os reflexos lucrativos ou não da atividade que desenvolver, garantindo o Estado o direito de propriedade sobre os bens de produção e o resultado da produção. Segundo André Ramos Tavares (2003, p. 36): É possível concluir, sinteticamente, que o modelo capitalista pressupõe a liberdade ou o liberalismo econômico e a propriedade dos bens de produção. O regime jurídico, portanto, deverá assegurar esses dois pressupostos com que trabalha o sistema capitalista de economia, sendo certo que esse núcleo normativo comporá (ao lado de outros elementos) o Direito Econômico. No sistema capitalista, a escolha compete ao agente econômico, o qual determinará o que produzir, como produzir e para quem produzir. Mesmo assim, essa escolha não será totalmente livre, pois o mercado influenciará na hora da decisão econômica. Da mesma forma, não existe liberdade plena nesses regimes, já que a intervenção do Estado na economia ocorre das mais variadas forma. PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO SISTEMA CAPITALISTA Propriedade privada dos meios de produção; Trabalho assalariado como base de mão de obra; Sistema de mercado baseado na livre-iniciativa e na liberdade de concorrência. 25 O Sistema Socialista Neste sistema, as características básicas contrastam frontalmente com as do capitalismo, uma vez que o direito de propriedade privada é substituído pela propriedade coletiva dos meios de produção. A natureza contestatória dos infortúnios do sistema capitalista é clara no sistema socialista, sendo praticamentte a sua negação, entretanto, sem promover os cânones da sua forma de produção econômica, que passa a ser obrigação do Estado e o seu resultado dividido entre todos. O sistema socialista reúne, dessa maneira, aspectos gerais da forma de produção, o queserá determinado de modo específico de acordo com o modelo econômico adotado que poderá variar em algumas características. Como observa André Ramos Tavares (2003, p. 39-40): “Foi, contudo, com Karl Marx e Friedrich Engels que se construiu uma proposta mais acabada de socialismo. Para Marx, o proletariado aparecia como a única classe social capaz de destruir de uma vez por todas a exploração do homem pelo homem, ao destruir o capitalismo, chegando ao poder pelo caminho da revolução. No poder, os trabalhadores se encarregariam de eliminar as diferenças sociais, o que assinalaria a passagem do socialismo ao comunismo, incluindo o fim do Estado.” Leonardo Vizeu Figueiredo assinala que o socialismo é o sistema baseado na autoridade estatal, que centraliza e unifica a economia em torno do Poder Central. PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO SISTEMA SOCIALISTA Direito de propriedade limitado e, não raro, suprimido; Estatização e controle dos fatores de produção e dos recursos econômicos; Gestão política que visa a redução das desigualdades sociais; Remuneração do trabalho mediante a repartição do produto econômico por meio de decisão do governo central. Por fim, vale trazer à colação as noções do fenômeno da globalização e, também, de neoliberalismo. A globalização, segundo lembra Eugênio Rosa de Araújo, implica, basicamente e de forma simplificada, na eliminação de barreiras comerciais (possibilidade de aquisição de produtos em quaisquer países), liberação dos mercados de capitais (realização de transações financeiras interbancárias a nível planetário) e na possibilidade de produção independente de fronteiras, abolindo a distância e o tempo. 26 Já o neoliberalismo, segundo assevera o mesmo autor, tem por palavras de ordem: menos Estado, fim das fronteiras, desregulação dos mercados, moedas fortes, privatizações, equilíbrio fiscal e competitividade global. O aludido autor ensina que a globalização como fenômeno econômico e social em escala planetária deu respaldo à ideologia do neoliberalismo, que se baseia no argumento de que a liberalização do mercado otimiza o crescimento e a riqueza no mundo e de que a tentativa de controlar e regular o mercado apresenta resultados negativos, pois restringiria a acumulação de lucros sobre o capital, impedindo, assim, a taxa de crescimento. Por fim, saliente-se que, após a recente crise americana de 2008/2009, que atingiu também outros países, a discussão acerca da necessidade de uma maior intervenção do Estado na economia voltou a tona, surgindo, assim, críticas ao neoliberalismo. ORDEM JURÍDICO-ECONÔMICA. Introdução: Conforme aponta Gilmar Mendes, a regulação da atividade econômica é um acontecimento histórico relativamente recente, associado que está à passagem do Estado Liberal ao Estado Social. Isto porque somente ao final da I Guerra Mundial é que surgiu nas constituições escritas um corpo de normas destinado a reger o fato econômico. Compunham estas normas a chamada constituição econômica, que tanto podem estar agrupadas num só conjunto de normas, quanto virem dispersas no corpo da constituição, caso em que será chamada de constituição econômica formal; quanto, ainda, podem abranger, além destes preceitos constitucionais, também outras normas, infraconstitucionais, como leis ou até mesmo atos de menor hierarquia, compondo, então, a constituição econômica material. No Brasil, assim como se deu alhures, essa nova postura diante do fato econômico se fez sentir a partir da Constituição de 1934, na qual foi inserido um título autônomo (“Da ordem econômica e social”), que veiculava um discurso intervencionista bastante inovador em todos os sentidos, começando a introduzir os princípios da justiça social e das necessidades da vida nacional, de modo a possibilitar a todos uma existência digna, além de garantir a liberdade econômica dentro de tais limites, como elementos fundamentais para a organização da ordem econômica. É justamente essa “Ordem jurídico-econômica” que será nosso objeto de estudo. Já para Savatier, ordem pública é o "conjunto de normas cogentes, imperativas, que prevalece sobre o universo das normas dispositivas, de direito privado". Numa abordagem que se aproxima da jurídica, "o conceito de ordem se prende à correlação e correspondência hierárquica existente dentro do conjunto de normas existente dentro do conjunto das normas, ligando as normas particulares a uma norma fundamental". Explicado o sentido de “Ordem”, temos então que Eros Roberto Grau inicialmente definiu a ordem econômica, no mundo do dever-ser, como (...) conjunto de princípios jurídicos de conformação do processo econômico, desde uma visão macrojurídica, conformação que se 27 opera mediante o condicionamento da atividade econômica a determinados fins políticos do Estado. Tais princípios (...) gravitam em torno de um núcleo, que podemos identificar nos regimes jurídicos da propriedade e do contrato para, depois, percebendo que a ordem econômica engloba mais do que apenas os princípios, a descrever como (...) o conjunto de normas que define, institucionalmente, um determinado modo de produção econômica. Assim, a ordem econômica, parcela da ordem jurídica (mundo do dever-ser), não é senão o conjunto de normas que institucionaliza uma determinada ordem econômica (mundo do ser). Tal definição indica o conceito de Constituição econômica, definida por Vital Moreira como (...) o conjunto de preceitos e instituições jurídicas que, garantindo os elementos definidores de um determinado sistema econômico, instituem uma determinada forma de organização e funcionamento da economia e constituem, por isso mesmo, uma determinada ordem econômica; ou, de outro modo, aquelas normas ou instituições jurídicas que, dentro de um determinado sistema e forma econômicos, que garantem e (ou) instauram, realizam uma determinada ordem econômica concreta. Vital Moreira faz verificações bem interessantes quanto aos sentidos da expressão ordem econômica, quais sejam: a) modo de ser empírico de uma economia concreta, sendo um conceito de fato, e não um conceito normativo ou valorativo (ínsito às regras reguladoras das relações sociais), mas sim algo referente às relações entre fenômenos econômico-materiais, entre fatores econômicos concretos; b) conjunto normativo de diversas naturezas; e c) ordem jurídico-econômica, sendo esta a acepção que serve de objeto para esta pesquisa. Interessante mencionarmos que a Ordem Econômica é composta de um conjunto de normas de conteúdo econômico. Isto é, enquanto ramo do Direito, temos que o Direito Econômico se materializa em normas jurídicas, destacando-se, além das normas tradicionais, de conteúdo genérico e abstrato, as seguintes normas: 1. Normas-programáticas: mais uma vez evidencia-se a importância das normas programáticas, portadoras de enunciados e de orientações sobre a ordem econômica. 2. Normas-objetivo: a norma jurídica, enquanto instrumento de governo, ultrapassa as funções tradicionais de organização e ordenação para ter em vista a implementação de políticas públicas destinadas a cumprir fins específicos. Exemplo das normas que estabelecem um determinado plano econômico, como a Lei do Plano Real, cuja finalidade, em termos de política econômica, era acabar com a inflação e instituir a estabilidade econômica. 3. Norma-premiais: normas jurídicas que aplicam estímulos e incentivos. Por fim, importante registrar que consta na nossa CF, os fundamentos desta nossa Ordem Jurídico-econômica: a) valorização do trabalho