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PESQUISA DE MERCADO Aula 6 Prof. Lucas Magalhães de Andrade 2 CONVERSA INICIAL De nada adianta uma pesquisa bem feita se os resultados e conclusões não forem compreendidos pelas pessoas responsáveis pela tomada de decisão. O papel do(a) pesquisador(a) é traduzir todo o complexo processo de pesquisa de uma forma que transmita, ao(à) responsável pela decisão, confiança nos resultados e clareza nas ações gerenciais para atingir os objetivos estabelecidos para a organização (Malhotra; Birks, 2007). A elaboração do relatório é a última etapa de um projeto de pesquisa, configurando o limite da responsabilidade do(a) pesquisador(a) sobre a decisão. Dito isto, vamos discutir como “fechar com chave de ouro” um projeto de pesquisa. CONTEXTUALIZANDO Imagine que uma montadora, ao finalizar o projeto de um novo modelo de carro de passeio, contrata uma equipe para realizar uma pesquisa de mercado, a fim de gerar insights sobre a percepção dos consumidores a respeito do design e do conceito do automóvel. Foi desenvolvida uma pesquisa de grupo focal, na qual a maioria dos participantes respondeu que o novo modelo parecia apresentar uma boa relação entre custo e benefício, e que, provavelmente, compraria o produto, mesmo que estivesse um pouco mais caro do que os veículos atuais. A pesquisadora responsável pelo projeto sabe que esses dados não podem ser generalizados para a população, mas, por outro lado, acredita que os tomadores de decisão podem ficar satisfeitos com a pesquisa, caso ela apresente esses resultados como uma evidência de que o veículo será um sucesso de vendas. Como esse resultado da pesquisa deveria ser relatado de modo a garantir a qualidade do relatório de pesquisa, ao mesmo tempo em que mantém a conformidade ética? Pesquise Leitura obrigatória: páginas 278 a 315 do livro da disciplina; Leitura sugerida: capítulo 23 do livro Pesquisa de Marketing: uma orientação aplicada (Malhotra, 2012). 3 TEMA 1 – PREPARAÇÃO E APRESENTAÇÃO DE RELATÓRIO De acordo com Mattar (2012), há dois momentos no processo de pesquisa de mercado em que a comunicação entre os interessados é essencial: 1) quando é feita a proposta da pesquisa e 2) quando são apresentadas suas conclusões e recomendações. Uma vez que já discutimos a importância e as características da comunicação na fase inicial da pesquisa (rota de aprendizagem 1), vamos nos ater à etapa final do processo, na qual a comunicação tem como foco apresentar os resultados da pesquisa de forma clara. Se retomarmos o objetivo básico de um projeto de pesquisa, você se lembrará de que ele consiste sempre em dar suporte à decisão de marketing. Portanto, a comunicação dos resultados, embora seja relativamente simples, é uma fase crítica para concluir o projeto de pesquisa de forma bem-sucedida. Há diversos cuidados que precisamos tomar ao apresentar os resultados de uma pesquisa para seus interessados; todavia, esses cuidados dependerão muito do público com o qual o(a) pesquisador(a) está lidando. Em primeiro lugar, é papel do(a) pesquisador(a) compreender os resultados da pesquisa e identificar o que eles revelam sobre o fenômeno estudado ou sobre o ambiente de mercado. Contudo, os resultados de uma pesquisa de mercado nem sempre estão em termos que podem ser facilmente compreendidos pelo público em geral. Em alguns casos, o(a) pesquisador(a) irá se deparar com gestores que não conhecem o que significam os termos “correlação”, “análise da variância” ou o grau de significância de um “teste de hipótese”. O primeiro cuidado que devemos ter ao preparar uma apresentação é o de conhecer o público que irá receber nossas informações. Quão familiarizadas as pessoas estão com as técnicas estatísticas utilizadas? Quão familiarizadas elas estão com a teoria que embasou o problema de pesquisa e até mesmo a interpretação dos resultados? Conhecendo o público-alvo, o(a) pesquisador(a) tem o dever de traduzir os insights vindos da pesquisa em termos compreensíveis, de forma a ser capaz de atrair e manter o interesse do ouvinte/leitor. Se apresentarmos o método de forma muito complexa, o entendimento pode ficar prejudicado. Por outro lado, devemos estar preparados para responder questões de cunho mais técnico, quando o(a) interlocutor(a) for mais qualificado. 4 Embora o relatório represente a exposição formal da pesquisa, ele não precisa – e nem deve – ser o primeiro contato dos tomadores de decisão com os resultados. Normalmente, espera-se que a apresentação da pesquisa traga propostas de intervenção pertinentes. Obviamente, espera-se que façamos apenas recomendações que sejam factíveis; por isso, Malhotra (2012) recomenda uma discussão prévia dos resultados da pesquisa com os tomadores de decisão. Essa discussão deve ajudar a entender as possibilidades da empresa e a disposição dos gestores para alinhar o discurso às necessidades do cliente da pesquisa, aumentando a receptividade às propostas. É possível que o(a) pesquisador(a) se depare com situações em que a pesquisa interesse a mais de um grupo dentro da organização, sendo que cada um desempenharia um papel no processo de decisão. Nesse caso, devemos nos perguntar se seria mais apropriado fazer um relatório único ou versões específicas para cada grupo (Malhotra, 2012). Caso se opte por versões diferentes, é importante que cada uma contenha recomendações específicas para cada público. Essa é uma decisão importante, por exemplo, no caso de pesquisas que são feitas para mais de um cliente. Você se lembra da pesquisa Top of Mind, tratada na rota de aprendizagem 1? Em geral, ela é realizada para ser vendida a várias empresas interessadas, frequentemente aquelas que estão mais preocupadas com estratégias para posicionar melhor sua marca perante ao mercado. Logo, uma empresa de pesquisa de mercado que decida fazer uma Top of Mind para vender a várias empresas deve se perguntar se os relatórios serão personalizados para cada uma que a adquirir ou se será feito um relatório genérico. É claro que isso implica custos diferentes para a oferta desse serviço. Se a empresa tiver expertise de consultoria, pode oferecer pacotes diferentes, como, por exemplo: somente o relatório genérico ou um relatório personalizado com sugestões específicas para a marca que contratou o serviço. Podemos abrir um parênteses para ressaltar que o relatório de uma pesquisa de mercado aplicada é diferente do relatório de uma pesquisa de marketing com propósito científico. O relatório de uma pesquisa aplicada tem seu foco na descrição da teoria por trás do problema de pesquisa, na metodologia usada para responder o problema e nas contribuições do estudo para o desenvolvimento do conhecimento da área. No relatório de uma pesquisa 5 aplicada, o foco está na descrição dos resultados e na forma como eles podem contribuir para a tomada de decisão. Em alguns casos, essa é a única parte do relatório que realmente será lida pelo(a) cliente da pesquisa. TEMA 2 – FORMATO DE RELATÓRIO Antes de abordarmos a estrutura propriamente dita de um relatório de pesquisa de mercado, é importante identificarmos algumas características diretrizes para a sua elaboração. Mattar (2012) sugere que um bom relatório deve ser: Completo: o relatório deve conter todas as informações necessárias para que o cliente entenda o processo de pesquisa, os resultados e como eles foram obtidos. Nesse ponto, não podemos perder de vista que o principal objetivo do relatório (e da pesquisa como umtodo) é dar suporte à decisão, portanto, não podemos dar margem a dúvidas ou a ambiguidades; Preciso: embora o que determine a precisão das informações esteja em um bom planejamento, todo o cuidado pode acabar se tornando inútil se os resultados não forem bem comunicados. Nesse caso, devemos dedicar atenção à linguagem, para somente dizer exatamente o que os dados suportam; Objetivo: em geral, tomadores de decisão têm pouco tempo disponível para compreender o relatório e usar as informações que ele contém. Deste modo, é essencial que a comunicação seja simples e direta. O(a) leitor(a) deve ser capaz de identificar o que a pesquisa mostra de relevante e identificar onde essa informação se encontra. Lembre-se de que a pesquisa de mercado é um serviço oferecido, portanto, a administração de marketing pode ser aplicada a esse processo. Com um relatório objetivo, que deixe clara sua contribuição para a tomada de decisão, é muito mais provável que o(a) cliente perceba a qualidade do seu trabalho; Claro: a clareza do relatório é outro atributo essencial para o bom entendimento da pesquisa. Enquanto a objetividade se refere a apresentar de forma enxuta e direta as informações necessárias, a 6 clareza se refere a apresentá-las de uma forma facilmente inteligível. Nesse ponto, é crucial que tenhamos cuidado para que haja um encadeamento lógico entre as informações apresentadas, para que o(a) leitor(a) não precise gastar muito tempo tentando entender o que queremos dizer, pois isso torna a leitura cansativa e diminui a percepção da qualidade da pesquisa; Conciso: embora o relatório deva ser completo, ele precisa conter apenas as informações relevantes para atender ao objetivo da pesquisa. Muitas vezes, o(a) pesquisador(a) gasta um precioso tempo do(a) leitor(a) explicando a metodologia usada quando, na verdade, ela já é conhecida – ou a pessoa simplesmente não tem interesse em saber como a técnica funciona. Normalmente, os elementos do relatório mais relevantes para tomadores(as) de decisão são o resumo executivo (ou sumário executivo), as conclusões, as recomendações e as limitações. O sumário executivo pode exercer um papel essencial de despertar a curiosidade e o interesse do(a) leitor, pois, muitas vezes, é a primeira parte do relatório a ser lida. É essencial que a relevância do estudo e seu valor para a tomada de decisão fiquem claros neste tópico. Não é necessário mostrar no sumário executivo todos os achados da pesquisa. Elenque apenas aqueles essenciais ou os que possuam maior potencial de conseguir a atenção do(a) leitor(a). Paralelamente, as interpretações do(a) pesquisador(a) sobre esses resultados e suas recomendações devem estar evidentes. A seção de conclusões é um complemento essencial à apresentação dos resultados. Na prática, a função dessa seção é demonstrar o que as informações encontradas no estudo dizem sobre o ambiente de mercado e a situação gerencial encontrada pela empresa. Não devemos esperar que o(a) leitor(a) tire suas próprias conclusões, afinal o(a) pesquisador(a) é quem está mais familiarizado com o problema de pesquisa e com as particularidades e pressupostos do método utilizado, bem como com as implicações e limitações da técnica aplicada para análise de dados (Mattar, 2012). 7 Os objetivos da pesquisa são o que norteiam a condução da mesma, por isso, devem estar presentes também na descrição das conclusões. Isso é uma forma de mostrar que a pesquisa conseguiu cumprir o que se propôs a fazer. O ideal é que se aponte como cada um dos objetivos foi atendido; se a pesquisa não ofereceu suporte suficiente para atender a algum dentre eles, este é um ponto que também deve ser explicado. As recomendações são uma parte particularmente delicada. Caso os gestores decidam implementar a decisão sugerida pelo(a) pesquisador, os resultados podem ser associados à pesquisa. Portanto, não devemos fazer nenhuma afirmação que não possa ser suportada pelos resultados. No entanto, como todas as decisões envolvem riscos, o ideal é que esses riscos sejam também levantados. O(a) pesquisador(a) deve ser capaz de identificar e esclarecer outros fatores que possam afetar a decisão (Mattar, 2012). Frequentemente, é necessário indicar, de igual modo, outras pesquisas para explorar melhor o cenário, a fim de melhorar a compreensão sobre o problema. Isso ajuda a esclarecer as limitações da pesquisa. Sobre estas limitações, é importante que, nas recomendações, elas estejam claras. Toda pesquisa precisa ter seus resultados vistos com certo cuidado, e um bom relatório de pesquisa deixa isso claro ao(à) leitor(a). Todavia, é preciso ter cautela para que não se comprometa a confiança na pesquisa. Dar muita ênfase às limitações pode dar a impressão de que a pesquisa não é relevante para a decisão (Malhotra, 2012). TEMA 3 – NORMAS Não podemos dizer que existe uma norma para a construção de um relatório de pesquisa de mercado. Existem, sim, conjuntos de normas. Entretanto, diferentes pesquisas com diferentes objetivos acabam pedindo por diferentes normas de apresentação dos resultados. Existem algumas diretrizes nacionais e internacionais para a elaboração de relatórios. Para escolher a mais apropriada, o pesquisador precisa levar em consideração o público que lerá a pesquisa. No caso de relatórios de pesquisa destinados a periódicos científicos, é comum que o(a) pesquisador(a) adeque seu texto às exigências do periódico em que deseja publicar. Existem diversos sistemas de formatação e padronização de relatórios, e cada periódico adota o que lhe for mais conveniente. Alguns 8 periódicos até pedem um sumário executivo, contendo os principais insights da pesquisa para os profissionais interessados. Muitos(as) pesquisadores(as) usam resultados de pesquisas feitas com o objetivo de dar suporte à decisão, mas acabam percebendo que o problema abordado pode ter relevância também para a ciência. Neste caso, o relatório original, formulado para apresentar a pesquisa a tomadores de decisão, deve passar por uma grande adaptação, adequando-se aos moldes aceitos pelo novo público: a comunidade acadêmica. Se o público do relatório é composto por gestores, não há exigência de que o documento siga um padrão específico. No entanto, as normas de apresentação são criadas para facilitar a descrição e a disposição dos resultados, tornando-os de fácil compreensão. Por isso, o(a) pesquisador(a) pode adotar um desses sistemas. No Brasil, o processo de pesquisa de mercado é regido pela norma NBR ISO 20252, que estabelece procedimentos não somente para o planejamento e condução da pesquisa, mas para a elaboração de seu relatório. A conformidade com essa NBR não é obrigatória; assim sendo, o(a) pesquisador(a) pode optar por apresentar o relatório com a formatação que julgar mais conveniente. No texto do link a seguir você pode conhecer um pouco mais sobre o que é e para que serve uma NBR, observando que, para algumas normas, não existe obrigatoriedade de conformidade: http://www.abnt.org.br/normalizacao/o-que-e/o-que-e. Tendo em mente que uma das principais preocupações na criação de um relatório de pesquisa é que as informações sejam transmitidas de forma clara, as normas de apresentação costumam abordar de modo exaustivo a maneira como são apresentados gráficos e tabelas. Normalmente, a análise de dados é realizada por meio de softwares que emitem tabelas e gráficos próprios, porém, o(a) pesquisador(a) não pode simplesmente copiar esses itens da forma como são gerados. As tabelas emitidas por softwaresde análise estatística de dados comumente mostram muito mais dados do que os que realmente interessam ao(à) tomador(a) de decisão. É fato que esses dados são importantes para que o(a) pesquisador(a) interprete os resultados, mas, a fim de atender ao princípio da concisão, uma 9 tabela ilustrativa deve conter somente o necessário para que o(a) leitor(a) consiga acompanhar e compreender as conclusões do estudo. Nesse caso, seguir as normas de apresentação para o relatório de pesquisa pode ser muito útil, podendo garantir que a ilustração se mostre estética e simples de interpretar. Um dos aspectos mais relevantes da adequação do relatório de pesquisa às normas de apresentação é a sequência e o encadeamento lógico da estrutura da apresentação. Dependendo do tipo de pesquisa conduzido, pode haver uma sequência de elementos que, se presentes no relatório, facilitam muito a compreensão. Em geral, conseguimos montar um bom relatório de pesquisa com os seguintes elementos: Sumário: mostrando a localização de cada assunto e de cada seção no relatório de pesquisa; Resumo gerencial: responsável por prender a atenção do(a) leitor(a), mostrar a relevância da pesquisa e salientar os resultados mais significativos; Corpo do relatório: contendo a descrição de fato do processo de pesquisa, abrange a situação que deu origem ao problema, os objetivos estabelecidos, a metodologia usada e os resultados da análise; Conclusões, recomendações e limitações: representam a aplicação da pesquisa à tomada de decisão de fato. Devem salientar o que os resultados encontrados suportam com relação às decisões a serem tomadas, deixando claro os riscos envolvidos e possíveis erros; Anexos: quando pertinente, devem ser apresentadas informações adicionais sobre o processo de pesquisa. Expor o questionário usado para coleta de dados, por exemplo, pode ser muito útil para que o(a) leitor(a) avalie a qualidade dos dados obtidos. Especificamente no caso de pesquisas com interesse em contribuir para o conhecimento científico, apresentar a forma como os dados foram coletados é fundamental para preservar o princípio da replicabilidade (capacidade de que outros(as) pesquisadores(as) reproduzam o estudo), essencial para a ciência; Bibliografia: embora dificilmente o gestor faça questão de checar as fontes nas quais o(a) pesquisador(a) se baseou para fundamentar o 10 problema de pesquisa na teoria, é importante que haja referência a todos os trabalhos citados durante o relatório. Afinal, o(a) leitor(a) deve ter a liberdade de consultá-los se desejar compreender mais profundamente o assunto trabalhado. A apresentação da bibliografia costuma seguir normas mais rígidas para sua disposição. O(a) pesquisador(a) deve avaliar qual sistema de normas é mais apropriado para o relatório que está desenvolvendo. TEMA 4 – ÉTICA DA PESQUISA I Se considerarmos a função de uma pesquisa de marketing, o potencial de intervenção que ela gera e as questões envolvidas no processo de pesquisa, a preocupação ética deste é uma questão que deve permear todo o projeto. Existe um caso clássico que ilustra o risco de ignorarmos os princípios éticos da condução de uma pesquisa e as implicações disso para os envolvidos: o experimento da prisão de Stanford. A equipe que conduziu o experimento estava interessada em observar como se constroem as relações sociais quando pessoas são colocadas em posição de autoridade sobre outras. Para isso, foram selecionados alguns participantes que apresentavam traços psicológicos e de personalidade perfeitamente normais; estas pessoas deveriam simular o ambiente de uma prisão, situado dentro da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. Metade dos participantes assumiu o papel de “guardas” dessa prisão, enquanto, a outra metade, de prisioneiros. A priori, podemos imaginar que não haveria nenhuma violação ética, já que os participantes consentiram em participar voluntariamente da pesquisa sem serem induzidos a isso, podendo abandoná-la a qualquer momento. Além disso, foram estabelecidas algumas regras, as quais deveriam ser respeitadas durante a simulação, a fim de garantir que o bem-estar e a saúde física ou psicológica dos participantes seriam mantidos. O problema é que, conforme o andamento do estudo, essas regras começaram a ser violadas, e não houve intervenção dos pesquisadores. Conforme a simulação avançava, mais e mais práticas abusivas por parte daqueles que exerciam o papel de autoridade ocorriam, até o ponto em que os pesquisadores decidiram cancelar o estudo muito antes do previsto. Isso nos 11 leva a uma das principais questões de ética em pesquisa: a necessidade de preservar o bem-estar dos elementos de análise. Veja, no link a seguir, um breve resumo sobre o caso: https://www.youtube.com/watch?v=5XdYVbhPZKo. Há, também, um filme, que retrata com detalhes a história desse experimento. Caso você tenha interesse, pode ver o trailer do filme no link a seguir: https://www.youtube.com/watch?v=-_CUZdScCD8. Tanto as pesquisas de marketing com propósitos científicos quanto aquelas aplicadas a decisões gerenciais devem seguir algumas diretrizes definidas internacionalmente, os princípios essenciais para a ética em pesquisa. Estudos científicos, normalmente, devem ter um projeto submetido a um comitê de ética, aprovado antes de ser operacionalizado. O comitê de ética é composto por especialistas da área de pesquisa, os quais deverão avaliar se a execução não corre o risco de violar nenhum princípio de ética em pesquisa. Mas, afinal de contas, quais são esses princípios? Será que a conformidade ética de um projeto de pesquisa é uma questão de bom senso dos pesquisadores ou de quem a avalia? Na verdade, não. Existem recomendações bastante objetivas a respeito dos pressupostos que não devem ser violados durante a execução de uma pesquisa. Especificamente no caso da pesquisa em marketing, o código de ética mais amplamente aceito é o elaborado pela Sociedade Europeia para Pesquisa de Opinião e de Mercado (ESOMAR), junto à Câmara Internacional de Comércio (ICC), que tem sua última edição datada de 2008. Esse código tem três grandes preocupações: Conduta ética na obtenção, tratamento e análise dos dados, e nos resultados reportados, a fim de manter a credibilidade e a reputação da pesquisa de mercado; Respeito aos elementos de análise, para garantir que a pesquisa não trará nenhum tipo de consequência negativa para os(as) participantes; Solucionar diferenças de legislação e regulamentação entre países. 12 Infelizmente esse código não possui uma versão oficial emitida pelo próprio órgão em português, mas existem traduções. As diretrizes principais desse código abordam oito fundamentos-chave (ICC/ESOMAR, 2008): Os procedimentos de pesquisa devem estar em conformidade com as leis locais; O(a) pesquisador(a) não deve fazer nada que possa danificar a reputação da pesquisa de mercado; Pesquisas com crianças ou pessoas jovens deverão ter cuidado especial; A participação do sujeito em uma pesquisa deverá ser sempre voluntária, e o mesmo deve conhecer o propósito real (não enganoso) da pesquisa. Somente com o consentimento explícito do(a) participante a pesquisa poderá ser realizada; A pesquisa deve preservar e respeitar a privacidade dos(as) participantes, e este direito não pode ser prejudicado por participar da pesquisa; A informação coletada para uma pesquisa deverá ser utilizada exclusivamente para essa pesquisa. Não é permitido usar dados coletadoscom uma finalidade para realizar pesquisas adicionais ou para outros fins; O projeto e as atividades da pesquisa de mercado devem ser planejados, executados, comunicados e documentados com precisão e transparência; A pesquisa não deve violar os princípios de justa concorrência. Embora esses princípios pareçam intuitivos e praticamente óbvios, muitas vezes, durante o processo de pesquisa, deparamo-nos com questões nas quais a distinção entre o que é ou não ético não é tão clara. É o que vamos discutir no próximo tema. TEMA 5 – ÉTICA DA PESQUISA II Uma das principais preocupações dos pesquisadores no momento da elaboração de um instrumento de coleta de dados é impedir que o participante descubra o objetivo da pesquisa, pois isso poderia gerar algum viés em suas respostas. Como vimos no tema anterior, uma das diretrizes do código da ICC/ESOMAR (2008) diz ser obrigatório ao pesquisador revelar aos participantes 13 o objetivo da pesquisa. Nesse caso, como podemos garantir a ética na pesquisa sem comprometer a validade dos resultados? Imagine, por exemplo, que um projeto de pesquisa pretenda avaliar se o envolvimento de uma marca com uma causa social é capaz de melhorar a avaliação do consumidor sobre esta marca. Se dissermos que o objetivo da pesquisa é esse, é bem possível que as pessoas avaliem a marca de forma mais favorável ou desfavorável, de acordo com o que acreditam que esperamos de sua reação. Nesse caso, podemos dizer que a pesquisa tem o objetivo de entender a reação das pessoas sobre as ações sociais das marcas ou sua percepção sobre esse tipo de prática. A seguir, vamos conferir um panorama sobre as recomendações mais específicas do código da ICC/ESOMAR (2008). Honestidade e transparência Leia a breve notícia do link a seguir: http://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2011/11/cientista-holandes- premiado-admite-fraude-em-pesquisa.html A manutenção da credibilidade da pesquisa de mercado é uma das maiores preocupações éticas. Por isso, o código estabelece que os(as) pesquisadores(as) devem atuar com extrema honestidade. Além disso, a rigorosidade da metodologia científica é essencial. Em hipótese alguma podemos ignorar procedimentos metodológicos considerados necessários para as análises que usamos. Além da honestidade com relação à condução da pesquisa, espera-se que o(a) pesquisador(a) seja honesto também com os(as) participantes. Ou seja, ele(a) não deve abusar da confiança da pessoa com base em afirmações falsas sobre a empresa que está conduzindo a pesquisa, ou mesmo com relação às habilidades da equipe. Existem, basicamente, dois públicos com os quais o(a) pesquisador deve agir com transparência: os participantes e os clientes. Para os participantes, a identidade do pesquisador não pode ser omitida. Já para os clientes, o(a) pesquisador(a) deve ser transparente com relação à metodologia usada, às técnicas de análise aplicadas e como elas funcionam. Os relatórios também devem ser transparentes, sem omissão de quaisquer informações relevantes, principalmente as limitações das conclusões do estudo. 14 Responsabilidade profissional O(a) pesquisador(a) assume responsabilidade sobre o bem-estar de seus participantes. Deve ficar muito claro a todos que a participação é completamente voluntária, e que a qualquer momento a pesquisa pode ser abandonada. O(a) respondente nunca deve ser levado a acreditar que é obrigado a finalizar o estudo. Se a pesquisa tiver como elementos de análises crianças ou pessoas muito jovens, o consentimento de participação na pesquisa deve vir do adulto responsável. Essa é outra questão bastante delicada, pois é muito comum a prática de oferecer um determinado valor em dinheiro em troca da participação da pesquisa. Nesse caso, é necessário tomar cuidado para que o valor não seja muito desproporcional, pois isso pode levantar suspeitas. Oferecer dinheiro aos respondentes de maneira nenhuma deve ser uma forma de obrigar o respondente a participar da pesquisa por completo. Mesmo que tenha recebido dinheiro, o participante continua tendo a liberdade de abandonar o estudo a qualquer momento, e isso deve ficar claro, para que ele(a) não sinta essa liberdade suprimida. O profissionalismo deve se estender à postura do(a) pesquisador(a) com relação a outros pesquisadores, por isso, ele(a) não deve emitir críticas injustificadas sobre o trabalho de outros. Privacidade e anonimidade dos participantes Você se lembra de como funciona a pesquisa de grupo focal (ou grupo de foco)? Nesse tipo, as reuniões são gravadas (por meio de vídeo e/ou áudio). Em entrevistas individuais, a gravação é extremamente útil, pois dificilmente o(a) entrevistador(a) conseguirá lembrar de toda a entrevista ou anotar todos os pontos relevantes. Essa é uma prática amplamente utilizada e aceita, mas jamais devemos gravar uma pesquisa sem consentimento ou sem que a pessoa saiba da gravação. Além disso, a identidade do(a) participante deve ser preservada, e somente deve ser divulgada se a pessoa explicitamente o permitir. Caso contrário, devemos camuflar a identidade real com um nome fictício. 15 Durante o processo de pesquisa, muitas vezes coletamos dados pessoais dos respondentes. No entanto, o princípio é o de que os dados coletados para a pesquisa devem ser usados unicamente no contexto da pesquisa. A posse desses dados não deve ser usada para nenhuma atividade comercial. Resultados Às vezes, não fica claro em um relatório a distinção entre o que são os resultados da pesquisa, as interpretações do(a) pesquisador(a) e as recomendações baseadas nessas interpretações. É importante que essa diferença esteja clara. Do contrário, as conclusões do cliente podem ser equivocadas, comprometendo a credibilidade da pesquisa. TROCANDO IDEIAS Uma das principais preocupações da conduta ética na pesquisa de mercado é garantir que o relatório de pesquisa seja honesto e transparente. Discuta com seus colegas a relação entre um relatório bem construído e a credibilidade da prática de pesquisas de mercado. NA PRÁTICA Analise o relatório de pesquisa no link a seguir: http://www.ibopeinteligencia.com/arquivos/antigos/estacaobrasil.pdf. Com base nesse documento: Interprete as informações obtidas pela pesquisa; Sugira implicações para as organizações desses resultados; Escolha um dos resultados da pesquisa para propor ações de marketing a uma empresa que possa ser afetada pela situação retratada pelo estudo. Solução proposta O objetivo dessa atividade é exercitar a reflexão sobre como uma pesquisa de mercado pode dar suporte à tomada de decisão em marketing, afinal, essa é sua função. 16 De uma maneira geral, o relatório da pesquisa aponta vários aspectos das preferências dos consumidores durante o período da copa. Isso pode ser usado por gestores de empresas dos setores que apresentaram melhor desempenho. Por exemplo, a pesquisa demonstra que as marcas mais associadas à Copa do Mundo são as marcas de produtos esportivos e de bebidas (p. 9 do relatório). Se o consumidor associa os eventos dos jogos ao consumo de bebidas, cabe às marcas dessa categoria direcionar sua comunicação e sua oferta de modo a sugerir ao(à) consumidor(a) que sua marca é uma boa opção para acompanhar os jogos. SÍNTESE Nesta rota de aprendizagem, abordamos dois aspectos da pesquisa de marketing: a finalização do projeto com a apresentação do relatório de pesquisa e os cuidados éticos que devemos ter no desenvolvimento da mesma.Vimos que, para elaborar o relatório de pesquisa, o(a) pesquisador(a) deve usar uma linguagem simples e a maior clareza possível na descrição. Afinal, o objetivo dessa fase é que o(a) tomador(a) de decisão entenda os resultados da pesquisa e sua contribuição para embasamento da decisão. Por último, vimos os principais aspectos éticos envolvidos na pesquisa de marketing: toda pesquisa deve ser respondida voluntariamente; precisa ter garantida a privacidade e o anonimato do(a) respondente, se assim o desejar, e prezar pelo bem-estar deste (não submeter o(a) participante a situações que gerem consequências nocivas). REFERÊNCIAS ICC/ESOMAR (2008). International code on marketing and social research. Disponível em <https://www.esomar.org/uploads/public/knowledge-and- standards/codes-and-guidelines/ICCESOMAR_Code_English_.pdf.> Acesso em 30 maio 2016. MALHOTRA, N. K. Pesquisa de marketing: uma orientação aplicada. 6. ed. Porto Alegre: Bookman, 2012. 17 MATTAR, F. N. Pesquisa de marketing: edição compacta. 5. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012.