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1 IMUNOLOGIA DOS TUMORES O sistema imune representa fundamental importância na resistência aos tumores principalmente sob a forma de vigilância imunológica. Por vigilância imune compreende-se o conjunto de mecanismos que contribuem para impedir a instalação de um tumor ou qualquer outra patologia. Assim, em condições de supressão ou deficiência do sistema imune, fica facilitada a instalação de um tumor maligno. Exemplos são o aparecimento do Sarcoma de Kaposi, em aidéticos e neoplasias variadas em pacientes transplantados sob regime supressor. Células transformadas ou células mutantes, são geradas constantemente e normalmente são destruídas pelas células imunocompetentes. Assim, o sistema imune é normalmente eficiente em realizar a vigilância imunológica. Entretanto, para que se instale um tumor, é suficiente que uma única célula escape ao sistema de vigilância. Assim, o câncer pode corresponder a uma falha momentânea no sistema imunológico. Aparentemente este é o ponto comum à maioria dos tumores malignos que afetam a população normal. Os cânceres podem surgir a partir de qualquer tecido no corpo, recebendo diferentes denominações de acordo com o tipo de célula que lhe der origem de um modo genérico. Os carcinomas são células transformadas originárias de células epiteliais como o fígado, rim, epitélio gastro-intestinal e constituem os tipos mais comuns de tumores. Os sarcomas surgem a partir de fibroblastos, células musculares e adiposas. Linfomas são constituídos de massas sólidas de células linfóides, enquanto as leucemias representam a transformação malígna de linfócitos e outras células hematopoiéticas de origem medular e sanguínea (tumores em suspensão). DESENVOLVIMENTO DOS TUMORES A transformação de uma célula pode resultar de mutações espontâneas ou induzidas por agentes químicos, físicos ou virais. A indução de tumores por agentes químicos foi inicialmente descrita no século 18 quando se observou que limpadores de chaminé apresentaram uma freqüência anormal de carcinoma de escroto. Descobriu-se então que hidrocarbonatos aromáticos policíclicos, presentes na fuligem e alcatrão, constituiam as principais classes de carcinógenos químicos. Outra importante classe desses carcinógenos = as aminas aromáticas, cuja atividade foi descoberta a partir das observações da alta incidência de câncer de bexiga em operários das fábricas, que usavam corantes à base de anilina. Evidências de tumores induzidos por agentes físicos evoluíram após a descoberta do Raio X, no século 19. Muitos dos primeiros radiologistas desenvolviam radiodermatite e após longo período de latência podiam apresentar câncer de pele. A evidência mais dramática de que radiações ionizantes podem induzir câncer foi a dos sobreviventes da bomba atômica lançada no Japão, que por mais de 20 anos após o holocausto apresentaram tumores variados. A radiação ionizante provoca alterações no DNA, resultando em mutações, quebras cromossômicas e rearranjo anormal. Entretanto, o longo período de latência requerido para o aparecimento dos tumores sugere que a expressão de malignidade pode necessitar da presença de um promotor e eventos genéticos adicionais. Com relação à radiação ultravioleta, que induz câncer de pele em partes do corpo expostas à luz solar, os mecanismos de indução podem ser vários, incluindo a produção de radicais livres e possivelmente imunossupressão. A oncogênese viral é de interesse particular para a imunologia dos tumores devido à grande probabilidade de que a introdução de genes virais no genoma da célula hospedeira resulte na expressão de novos antígenos na superfície celular, que podem ser reconhecidos pelo sistema imune. Os vírus oncogênicos podem ser do tipo DNA ou RNA. A maioria das células infectadas por vírus DNA permite a replicação do vírus, resultando em lise a célula hospedeira. A infecção das células pode também ocasionar a integração do DNA viral ao genoma da célula e expressão dos chamados oncogenes virais. Exemplos de vírus tipo DNA que parecem ser oncogênicos são o vírus de Epstein-Barr (EBV), associado ao linfoma de Burkitt e carcinoma nasofaríngeo, o vírus do herpes simplex associado ao carcinoma de colo uterino, o vírus da hepatite B associada ao câncer hepático primário. 2 ANTÍGENOS TUMORAIS Para que o organismo desenvolva uma resposta imune contra o tumor é necessário que as células imunocompetentes interajam com estruturas reconhecidas como não-próprias na superfície das células tumorais. Células tumorais podem expressar antígenos com maior ou menor capacidade imunogênica. Estes antígenos podem ser basicamente de dois tipos, os antígenos tumor-específicos e os antígenos associados ao tumor. Os Ag tumor-específicos são encontrados apenas em células tumorais e representam um alvo ideal para o ataque imunológico. Ex: tumores induzidos por vírus apresentam antígenos específicos do vírus, que são expressos na célula tumoral. Em contraste, os Ag associados ao tumor podem ser encontrados em células tumorais e também em algumas células normais, porém em concentração muito mais elevada nas células tumorais. Ex: Ags que são expressos durante a fase fetal (embriogênese) são chamados Ags embrionários, que desaparecem posteriormente, não sendo detectados no tecido normal adulto. O antígeno carcinoembriônico (CEA) é uma glicoproteína presente no intestino fetal e no câncer de cólon humano, mas não no cólon normal. Pacientes com doenças inflamatórias envolvendo células de origem endodérmica como colite e pancreatite e pacientes com outros tumores também apresentam níveis séricos aumentados de CEA. A despeito das limitações, o acompanhamento dos níveis de CEA tem sido úteis na monitoração da progressão e resposta a terapia da doença (ocorrem em 75% dos casos de tumor colon-retal e 90% dos tumores de pâncreas. Outro ex. é a alfa fetoproteína, que é uma alfa globulina normalmente secretada pelo fígado fetal e células do saco vitelínico e presente no soro de paciente com tumor hepático e pode ser utilizado como marcador do estado da doença (70% dos tumores hepáticos, 80% dos carcinomas testicular e ovariano e presente também na cirrose e hepatite B). Mecanismos de Imunidade anti-tumoral Os mecanismos efetores contra células tumorais envolvem tanto a resposta imunecelular quanto a humoral e, seu desenvolvimento depende das características do tumor. De um modo geral, os mecanismos de imunidade celular parecem ser mais importantes do que os da resposta humoral. Células T. As células T são as mais importantes no combate aos tumores, atuando tanto na destruição das células malignizadas quanto na ativação de outros mecanismos efetores. Assim, há um grande envolvimento das células T helper, que atuam na resposta global pela geração de citocinas. As células T citotóxicas (Tc) também podem secretar citocinas, mas medeiam seu efeito, principalmente através de lise direta do tumor. Deve ser lembrado que as células T atuam de modo MHC restrito e que alguns tumores não expressam Ag associados ao MHC, escapando à ação destas células. Nestes casos, a ação de células como NK, não-restrita pelo MHC, pode ser fundamental. Células NK A atividade "natural killer" (NK) é desempenhada por células linfóides mononucleares não-aderentes, não T e não B, presentes no sangue periférico e em vários órgãos como o baço e pulmão. Estas células reconhecem antígenos tumorais de modo não- restrito pelo MHC e sem a necessidade de sensibilização prévia. Deste modo, atuam rapidamente e parecem constituir a principal linha de vigilância imunológica. Macrófagos Como em outrasocasiões de desenvolvimento da resposta imune, os macrófagos atuam em 2 momentos importantes. Na apresentação de antígenos e como células efetoras da destruição do tumor. Como células apresentadoras os macrófagos são particularmente importantes nas infecções virais, apresentando antígenos virais associados aos Ag de classe II aos linfócitos T helper. No caso de tumores induzidos por outros agentes, os macrófagos podem ser importantes na apresentação de antígenos solúveis secretados pelas células tumorais. Como células efetoras, os macrófagos precisam ser ativados por interferon gama produzido pelas células Th, para que desenvolvam sua atividade citolítica (tumoricida) e citostática, Estes efeitos são possíveis pela produção e secreção de produtos como enzimas 3 proteolíticas, água oxigenada (H2O2), óxido nitrico (NO) e fator de necrose tumoral (TNF). ADCC O fenômeno de ADCC ou citotoxicidade celular dependente de anticorpos é mediado por anticorpos específicos e células que apresentam receptores para a porção Fc de IgG. Assim, há uma integração entre a resposta adaptativa (Ig) e a natural (NK, K e M) na tentativa de destruição das células malignizadas. Mecanismos de Evasão Embora esteja claro que o sistema imune pode responder à células tumorais, o fato de que muitos indivíduos morrem a cada ano de câncer, sugere que a resposta imune ao tumor não é eficiente. Assim, o estabelecimento e desenvolvimento de um tumor, pode depender de falhas no sistema imune do hospedeiro ou de fatores inerentes ao próprio tumor, permitindo que as células tumorais consigam “escapar“ ao controle do sistema imune. 1. Baixa imunogenicidade. Alguns tumores são fracamente imunogênicos em alguns hospedeiros, por deficiência do próprio hospedeiro em processar e apresentar adequadamente os Antígenos tumorais. 2. Baixa expressão de moléculas MHC. A expressão moléculas do MHC pode estar sub- regulada nas células tumorais, dificultando o reconhecimento dos Ag-tumorais pelas células imunocompetentes, especialmente T citotóxicas. A ausência ou menor expressão de moléculas MHC classe I e II pode ser induzida durante a infecção por vírus oncogênicos. 3. Mutação e seleção de células tumorais que perderam a expressão de proteínas imunogênicas. 4. Modulação antigênica que implica em perda (shedding), inibição da expressão, ou endocitose dos Ags tumorais (p. ex. após interação com Ac) sem alterar as características de crescimento do tumor. 4.1. Liberação dos antígenos de superfície para o meio extra-celular, com formação de imunocomplexos circulantes. Os imunecomplexos podem bloquear células NK através da ocupação de seus receptores para Fc de IgG ou induzir a geração de células supressoras. 4.2. Endocitose de imunoglobilinas que se ligam aos antígenos de superfície e até mesmo do complexo de ataque à membrana (MAC) que se forma na superfície da célula após ativação do sistema complemento 5. Mascaramento antigênico por moléculas de superfície como o mucopolissacáride contendo ácido siálico, produzido em maior quantidade pelas células tumorais que pelas células normais. 6. Imunossupressão induzida por produtos do tumor. Certos tumores secretam TGF , prostaglandinas ou IL-10. Ex. tumores do sistema nervoso central. 7. “Enhancement” ou facilitação tumoral - A presença de anticorpos, além de ineficientes em combater células tumorais, pode facilitar o escape das mesmas, através da ligação aos Ags tumorais e bloqueio da apresentação dos antígenos para células Tc ou NK. Esses Ac são denominados bloqueadores ou facilitadores, uma vez que não levam à lise da célula tumoral.
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